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DESAFIOS C URAIS

DA COMUNICAÇÃO A I I

internacionais

Inovações no Campo da Comunicação colocam desafios para a


Educação que não devem ser menosprezados quando se pretende
a construção da cidadania
A ausência tanto do mundo dos meios os colombianos, não tenhamos direito a um
massivos - exceção feita ao cinema, porque é canal cultural durante todo o dia, mas sim a
arte - quanto do mundo da educação na Lei da apenas alguns programas soltos e às três hori-
Cultura é o indício mais forte da pertinaz nhas de La Franja2 que, aliás, se transmite num
esquizofrenia de que padecem a concepção e as horário inconveniente para os colombianos
políticas oficiais de cultura. A mais ingênua que, no dia seguinte, têm de madrugar para ir
explicitação dessa esquizofrenia correu por con- ao trabalho. Para o Ministério da Educação,
ta de um membro da ComissãoNacional de Tele- o que acontece na cultura é assunto de outros
visão da Colômbia, quando perguntado acerca e o que acontece na mídia também, isso sem
do que pensava sobre a última programação de ignorarmos a retórica vazia sobre a mo-
SeÍíal Colombia', respondeu esse senhor que era dernização tecnológica da escola, ou esse
perfeita: educação pela manhã e cultura à tarde! angu de programação televisiva que se faz
Na Colômbia do fim do século, parece passar por educativa.
que as melhores relações entre cultura e educa- Pouco importa se a concepção de cul-
ção seriam aquelas que não lhes permitam en- tura que guia os currículos e os ensinamentos
contrar-se. Já as relações de ambas com a te- escolares é tão radicalmente anacrônica - e
levisão não podem ser mais anacrônicas e ins- socialmente perigosa - que nela não cabem
trumentais: a TV não é vista como um meio senão as artes e as letras, ficando de fora a
para fazerlcriar cultura, mas apenas para trans- ciência e a tecnologia. Os países ricos que in-
mitir, difundir, divulgar. Para o brilhante ventem, que criem e que a nós nos deixem con-
Ministério da Cultura, os meios massivos de tinuar copiando e aplicando.
comunicação continuam sendo qualquer coi-
sa menos cultura, embora seja pelo rádio e,
sobretudo, pela televisão que se efetuam, hoje
em dia, algumas das mais profundas transfor- jsofo. Asse ssor do Ins studos sob1
mações na sensibilidade e na identidade das is e Comuriicação da de Nacioni
maiorias. Por isso, não é de estranhar que nós, ibia.

I . Canal cultural e educativo estatal da Colômbia, criado em 1968, reformado em 1992, passando a denominar-se Canal 3, mais
para ver. Em 1995 lançou-se como uma alternativa para o público com nova programação e nova imagem corporativa Seiíal
Colombia, talento no ar. (www.scripto.com.co/inravision~lasenal.htm) (N. Ed.)
2. La Franja é o nome dado ao horário destinado ao conjunto de programas do Ministério da Cultura no canal educativo Seiíal
Colombia. Esse horário diário estende-se das 21 horas à meia noite. (N. Ed.)
52 Desafios culturais da comunicação a educação

Para o Ministério das Comunicações-com até a universidade - para que a escola se comu-
exceção do esforçado e desvalorizadotrabalho da nique com o país? Ou, de outro modo: o que
Divisão de Comunicação Social - a cultura pare- tem de mudar no sistema educativo para que
ce não ter nada que ver com o desenvolvimento este possa incumbir-se de mostrar o que a Co-
tecnológico dos meios; o que, no caso, importa é a lômbia está vivendo e sofrendo, produzindo e
divisão política e economicamente adequada das criando; para que a escola possibilite às crian-
permissões de transmissão. O mesmo acontece em ças e aos jovens uma compreensão do seu país
relação à educação: que pode ter a ver o que os capacite para ajudar a mudá-lo?
avançadíssimo e riquíssimomundo das telecomu-
nicações com a nossa atrasada e paupérrima edu-
cação? Não obstante, o que o país estájogando aí, Contrariamente aos que vêem nos
na ausência de políticas conjuntas de CulturalCo- meios de comunicação e na tecnologia de
municação/Educação, é sua própria viabilidade informação uma das causas do desastre
como nação, tanto política quanto cultural, tanto moral e cultural do país, ou seu oposto,
social quanto laboral, já que tudo isso passa pela uma espécie de panacbia, de solução mági-
necessidade de que o ecossistemacomunicacional ca para os problemas da educação, sou dos
se articule e se organize com as dinâmicas da cul- que pensam que nada pode prejudicar
tura e da educação. Isso, porém, não é possível a mais a educação que nela introduzir mo-
partir de políticas governamentais que são dernizações tecnológicas sem antes mudar
conjunturaise imediatistas; o que se necessita são o modelo de comunicação que está por de-
políticas de Estado de longo alcance. Dentre os baixo do sistema escolar.
múltiplos desafiosque verdadeiras políticas de Es-
tado carregam consigo, num campo de tal enver-
gadura, vou referir-me apenas a uma, configurada O modelo predominante é vertical, au-
pelos desafios culturais apresentados pela comu- toritário na relação professor-aluno e linear-
nicação para a educação. Para prevenir contra as mente sequencial no aprendizado. Introduzir
decepções, aviso que no segmento deste artigonão nesse modelo meios e tecologias moder-
se devem esperar fórmulas políticas, pois a única nizantes é reforçar ainda mais os obstáculos
maneira de escapar à acumulação conjuntural e que a escola tem para se inserir na complexa e
fragmentária de diagnósticosestá em arriscar-sea desconcertante realidade de nossa sociedade.
formular problemas. Ao colocar como ponto de partida as mudanças
que são necessárias à escola para que ela possa
interagir com o país e não simplesmente para a
DESENCONTRO DA utilização dos meios de comunicação, estou
EDUCAÇÃO COM O PAÍS enfrentando um mal-entendido que o sistema
escolar não parece interessado em desfazer: a
Comecemos pelo princípio: antes de fa- obstinada crença de que os problemas da esco-
lar do papel dos meios de difusão na escola, ou la podem ser solucionados sem que se transfor-
de como introduzir cultura e educação nesses me o seu modelo comunicativo-pedagógico,isto
meios, vamos ter a coragem de colocar o pro- é, com uma simples ajuda de tipo teconológico.
blema fundamental: o que é que tem de mudar E isso é um auto-engano. Enquanto permane-
no sistema educacional - do Ministério às fa- cer a verticalidade na relação docente e a
culdades de educação, do ensino fundamental sequencialidade no modelo pedagógico, não
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haverá tecnologia capaz de tirar a escola do formação e pela automatização dos processos.
autismo em que vive. Por isso, é indispensável Também no campo político, como tem
partir dos problemas de comunicação antes de sido demonstrado pelo Processo 8.0003, as
falar sobre os meios. coisas estão mudando de forma muito mais
acelerada do que supõem os politicólogos
deste país, cuja imensa maioria tem desco-
PAPEL DA INFORMAÇÃO nhecido a trama comunicativa da política e
E DO CONHECIMENTO relegado a ação dos meios televisivos a uma
função puramente instrumental. Entre outras
Falar de comunicação significa, em pri- coisas, o Processo 8.000 tem servido para que
meiro lugar, reconhecer que estamos numa o país comece a perceber que a informação e
sociedade em que o conhecimento e a infor- a visibilidade têm hoje um papel constitutivo,
mação têm tido um papel fundamental, tanto tanto na formação do discurso político (que
nos processos de desenvolvimento econômi- não é só o discurso dos políticos) como na
co quanto nos processos de democratização própria ação política. Isso quer dizer que a
política e social. informação passou a ter um papel tão estra-
tégico na política que, sem ela, dificilmente
teria sido possível desenvolver-se um julga-
A informação e o conhecimento são mento da corrupção dos políticos e da políti-
hoje o eixo central do desenvolvimento so- ca. Papel fundamental tanto por seus aspectos
cial, e isso ainda mais nos países do chama- positivos quanto negativos, tais como a trans-
do Terceiro Mundo, em países como a Co- formação de jornalistas em juízes que abusam
Ii>mbia,nos quais uma industrializaçãopre- do poder da informação para condenar ou ab-
cária não impede que estejamos entrando solver, prejudicando, às vezes irreparavel-
numa sociedade cuja competitividade pro- mente, as pessoas e o país.
dutiva depende mais da informação e do co- Mas é preciso reconhecer igualmente
nhecimento do que das máquinas, mais da que sem essa informação - às vezes mal-usa-
inteligência do que da força. da - não teria existido o Processo 8.000. Por-
tanto, o ponto de partida para se pensar as re-
lações da educação com a comunicação está
Isso está implicando uma transforma- aqui: na centralidade que o conhecimento e a
ção profunda das condições de trabalho, tanto informação têm ainda em países como o nos-
nas indústrias de ponta como na automobilís- so, nos quais existem outras necessidades es-
tica, ou mesmo em indústrias tão antigas como truturais, que consideramos básicas, como as
a indústria têxtil. As funções cumpridas pelos da moradia e saúde para as maiorias. Essa é a
operários neste tipo de indústria estão mudan- trágica peculiaridade desses países, que são
do radicalmente: da relação entre a força da atravessados pelas transformações da comu-
mão-de-obra com a energia produzida pelas nicação e da informação enquanto a divisão
máquinas estamos passando a um novo tipo social cresce e a precária classe média sofre
de relação, mediada, cada vez mais, pela in- uma forte crise, tudo isso afetando seu sistema

3. O Processo 8.000 foi o processo no qual a Fiscalia General de Ia Nación (Procuradoria Geral da Nação) investigou o presidente
Samper e outros políticos do Partido Liberal que receberam dinheiro do cartel de narcotraficantes de Cali para a eleição presiden-
cial. O Processo durou dois anos e culminou com a prisão de grande número de políticos do PL. (N.Ed.)
54 Desafios culturais da comunicação a educação

produtivo, político e educativo. novo. Novos modos de perceber e de sentir; uma


Desgraçadamente, algumas dessas trans- nova sensibilidadeque, em muitos aspectos, se
formações vieram aumentar a brecha entre paí- choca e rompe com o sensorium dos adultos.
ses ricos e países pobres, e entre pobres e ricos Um bom campo de experimentação des-
de um mesmo país, não só no que diz respeito a sas mudanças e de sua capacidade de distan-
bens materiais como a bens simbólicos. ciar os jovens de seus próprios pais está na
Há uma grande diferença entre as pes- velocidade e na sonoridade. Não apenas na ve-
soas que podem estar conectadas com a Inter- locidade dos automóveis, mas também na das
net, beneficiando-se de uma grande quantida- imagens, na velocidade do discurso televisivo,
de de informações, de experimentação, de especialmentena publicidade e nos videoclipes
conhecimentos ou experiências estéticas e a e na velocidade dos relatos audiovisuais. O
imensa maioria excluída, desligada desse mun- mesmo acontece com a sonoridade, a maneira
do de bens e experiências. Mas, não podemos como os jovens se movem entre as novas so-
permitir que nos baste a constatação e o la- noridades: essas novas articulações sonoras
mento. Precisamos compreender como essa que, para a maioria dos adultos, marcam a fron-
mesma sociedade dividida está sendo trans- teira entre a música e o ruído, são, para os jo-
formada pela centralidade das tecnologias e vens, o começo de sua experiência musical.
dos sistemas de comunicação. Uma segunda dinâmica, que faz parte
desse novo ecossistema no qual vivemos, e que
é a dinâmica da comunicação, liga-se ao âm-
ECOSSISTEMA COMUNICATIVO bito dos grandes meios, ultrapassando-os po-
rém. Ela se concretiza com o surgimento de
Para enfrentar esse desafio, devemos um ambiente educacional difuso e descentrado,
estar conscientes de dois tipos de dinâmica que no qual estamos imersos. Um ambiente de in-
movem as mudanças na sociedade de que formação e de conhecimentos múltiplos, não-
falamos. Num primeiro movimento, o que centrado em relação ao sistema educativo que
aparece como estratégico, mais do que a ainda nos rege e que tem muito claros seus dois
intervenção de cada meio, é a aparição de um centros: a escola e o livro.
ecossistema comunicativo, que está se
transformando em alguma coisa tão vital como
o ecossistema verde, ambiental. As sociedades centralizaram sempre
A primeira manifestação e materializa- o saber, porque o saber foi sempre fonte de
ção do ecossistema comunicativo é a relação poder, desde os sacerdotes egípcios aos mon-
com as novas tecnologias - desde o cartão que ges medievais ou, atualmente, aos assesso-
substitui ou dá acesso ao dinheiro, até as gran- res dos políticos. Dos mosteiros medievais
des avenidas da Intemet - com sensibilidades às escolas de hoje, o saber conservou esse
novas, muito mais claramente visíveis entre os duplo caráter de ser, ao mesmo tempo, cen-
mais jovens. Eles têm maior empatia cognitiva tralizado e personificado em figuras sociais
e expressiva com as tecnologias e com os no- determinadas.
vos modos de perceber o espaço e o tempo, a
velocidade e a lentidão, o próximo e o distante.
Trata-se de uma experiência cultural nova, ou, A essa centralização, que implicava a
como chamou Walter Benjamin, um sensorium circunscrição do saber a alguns lugares por onde
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circulavalegitimamente,correspondiampersona- grafia que seu próprio professor. Isso está tra-


gens que detinham o saber, tal como os sacerdo- zendo para a escola um fortalecimento do
tes, até a reforma protestante, que ostentavam o autoritarismo, como reação à perda de autori-
poder de ser os únicos com capacidade para ler e dade do professor, e não uma abertura para
interpretar o livro dos livros, a Bíblia. esses novos saberes. Em lugar de ser percebi-
Nós, pessoas que temos uma certa ida- da como uma chamada a que se reforrnule o
de, passamos a maioria da nossa vida junto modelo pedagógico, a difusão descentralizada
a uma igreja que falava latim, não só lingüís- de saberes, possibilitada pelo ecossistema co-
tica mas ideologicamente, isto é, que usava municativo, resulta no endurecimento da dis-
um discurso que tinha muito pouco a ver com ciplina do colégio para controlar esses jovens,
o mundo das gentes e da cultura da cidade. cada vez mais frívolos e desrespeitosos com o
Vem daí que uma transformação nos modos sistema sagrado do saber escolar.
de circulação do saber é uma das mais pro-
fundas transformações que pode sofrer uma
sociedade. E é aí que se situa a segunda di- ESQUIZOFRENIA CULTURAL
nâmica que configura o ecossistema comu-
nicativo no qual estamos imersos: o saber é A partir destas duas dinâmicas: a de uma
disperso e fragmentado e pode circular fora comunicação que se converte em ecossistema e
dos lugares sagrados nos quais antes estava a de uma forte diversificação e descentralização
circunscrito e longe das figuras sociais que do saber, manifesta-se cada dia mais a
antes o administravam. esquizofrenia cultural de que sofrem hoje mui-
tos cidadãos. Eles estão divididos entre aquele
saber que lhes outorga um diploma oficial e Ihes
A escola deixou de ser o único lugar vai servir para a inserção nos modos habituais
de legitimação do saber, pois existe uma de ascensão social e de consecução de um sta-
multiplicidade de saberes que circulam por tus, e aquele outro saber que vai lhes servir para
outros canais, difusos e descentralizados. introduzir-se nas novas modalidades do siste-
Essa diversificação e difusão do saber, fora ma produtivo e inovador da sociedade. Saber
da escola, é um dos desafios mais fortes que este que coincide com aquilo de que a socieda-
o mundo da comunicação apresenta ao sis- de necessita para formar um cidadão capaz de
tema educacional. autodeterminaçãoe, por conseqüência,capaz de
respeitar, conviver, harmonizar.
Infelizmente, nossa escola não é um es-
Diante do professor que sabe recitar paço para a autodeterminação, conseqüente-
muito bem sua lição, hoje, senta-se um alunado mente, não é um lugar para aprender a convi-
que, por osmose com o meio-ambiente comu- ver e a harmonizar. Então, muito do saber
nicativo, está embebido de outras linguagens, difuso e descentrado que hoje circula na socie-
saberes e escrituras que circulam pela socie- dade é a via de acesso a uma concepção mais
dade. Estes configuram os saberes-mosaico, democrática e eficiente, isto é, criadora e pro-
como os chamou A. Moles, porque são feitos dutiva. Não estou desconhecendo as buscas
de pedaços, de fragmentos, o que não impede pessoais de alguns professores e de algumas
os jovens de ter, com freqüência, um conheci- poucas instituições, estou falando do sistema
mento mais atualizado em física ou em geo- educativo colombiano.
56 Desafios culturais da comunicação a educação

Estou questionando uma escola que, no ilustrar o que se diz, de tomar menos aborrecida
seu dia-a-dia, não educa democraticamente, a lição, de amenizar algumas jornadas de traba-
por mais que dê cursos de educação cívica e lho, presas da inércia mais insuportável.
de urbanidade. Não se aprende a ser democrá-
tico em cursos sobre a democracia, aprende-
se a ser democrático em famílias que admitem A atitude defensiva da escola e do sis-
pais e filhos não-convencionais, em escolas que tema educativo esta0 levando-os a desconhe-
assumem a dissidência e a diferença como ri- cer ou disfarçar o fato de que o problema
queza, com meios de comunicação capazes de de fundo está no desafio que lhe é apresen-
dar, verdadeiramente, a palavra aos cidadãos. tado por um ecossistema comunicativo, do
Essa realidade produz uma defasagem qual emerge outra cultura, outro modo de
muito grande entre o modelo de comunicação ver e ler, de aprender e de conhecer.
que vigora, hoje em dia, fora da escola, na socie-
dade da comunicação e o modelo ainda
hegemônico de comunicação no qual se baseia A atitude defensiva limita-se a identifi-
o saber escolar. Qual seria, então, a reação do car o melhor do modelo pedagógico tradicional
sistema educativo a esta experiência cotidiana com o livro e anatematizar o mundo audiovisual
da defasagem ou, em outras palavras, qual é a como o mundo da frivolidade, da alienação, da
reação do sistema educativo da escola à brecha manipulação. Oxalá o livro fosse um meio de
cada vez maior que existe entre a cultura da qual reflexão e de argumentação, mas, infelizmente,
falam os professores e a cultura e sensibilidade não o é. Como demonstra uma pesquisa da
apreendidas pelos alunos? É certo que isto não Universidad de1Valle sobre hábitos de leitura e
é um problema colombiano, é um problema que usos sociais da televisão, a imensa maioria das
a própria Unesco não tem sabido enfrentar. pessoas, de todas as classes sociais de Cali, iden-
tifica livro com dever escolar. Desta forma, uma
vez terminado o período escolar da vida das
A Unesco, em boa quantidade de do- pessoas, o livro deixaria de ter função.
cumentos, mostra a visão que continua pre- Nossas escolas não estão sendo um es-
valecendo e que é puramente instrumental: paço no qual a leitura seja um meio de criati-
usar os meios televisivos para que mais gen- vidade e de prazer, mas sim o espaço no qual
te possa estudar, porém estudar sempre a leitura e escrita se associam a tarefa obrigató-
mesma coisa, ou seja, permitir, por exem- ria e chata. Castradora, inclusive.
plo, que os alunos vejam uma ameba numa Confundindo qualquer manifestação de
tela gigantesca. estilo próprio com anormalidade ou com plá-
gio, os professores sentem-se no direito de re-
primir a criatividade. É o efeito dos hábitos e
Estou fazendo uma caricatura, mas é fato da inércia do ensino legitimado pelo modelo
que muitos dos documentos da Unesco perpe- imperante de comunicação escolar.
tuam uma concepção incapaz de enfrentar os de- Um jovem psicólogo que está fazendo tese
safios culturais que o ecossistema comunicativo sobre essa situação em Ciudad Bolivar, falava-
apresenta ao sistema educativo em seu conjunto. me acerca de sua triste descoberta: nos setores
E é por isso que nossas escolas continuam vendo populares, o aprendizado da leitura, em vez de
nesses meios unicamente uma possibilidade de enriquecer,está empobrecendo o vocabulário das
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crianças, pois, ao tentar falar como se escreve, as diferenças étnicas, raciais ou de gênero, mas
crianças perdem grande parte da riqueza do seu também aceitar que em nossas sociedades con-
mundo oral, inclusive sua espontaneidadenarra- vivem hoje indígenas da cultura letrada com
tiva. Ou seja, temos um sistema escolar que não outros da cultura oral e da audiovisual.
só não ganha os jovens adolescentes para uma E isto ocorre num sentido forte, pois essas
leitura e uma escrita criativas, como também ig- três culturas configuram modos muito diferentes
nora a existênciade uma cultura oral que tem um de ver e de pensar, de sentir e de fmir. E, ao rei-
idioma próprio, especialmentenos setores popu- vindicar a existência da cultura oral e audiovisual,
lares, o que não pode ser, de modo algum, con- não estamos desconhecendo, de modo algum, a
fundido com analfabetismo.Essa é a outra cultu- cultura letrada, mas sim desmontando a sua pre-
ra que desafia a escola e diante da qual a escola tensão de ser a única cultura digna desse nome e o
está tão desprovida de modos de interação e tão eixo cultural de nossa sociedade.
na defensiva quanto ocorre com o audiovisual. O livro continua sendo chave, pois nos
abre para a primeira alfabetização, essa que
deveria possibilitar o acesso não só à cultura
SOCIEDADE MULTICULTUKAL letrada, mas também às múltiplas escritas que
hoje conformam o mundo da informática e o
O quadro não pode ser mais significativo: audiovisual. O paradoxo é que, se o livro foi o
enquanto o ensino transcorre através do mundo eixo cultural das sociedades européias, não o
do manual, o professor sente-se fortalecido; mas foi nunca das sociedades latino-americanas,
quando aparece o mundo da imagem, o profes- salvo como ingrediente de exclusão, muralha
sor perde a estabilidade, porque o aluno sabe que deixava as maiorias fora da cidade letrada.
muito mais e, sobretudo, porque maneja muito
melhor a língua da imagem que o professor.Ante
esse desmoronamento de sua autoridade frente Aos que pensam que o mundo do li-
ao aluno, o professor reage desautorizando os vro está se acabando, pode-se dizer que nun-
saberes que passam pela imagem. De outro lado, ca, neste país chamado Colômbia, publicou-
a oralidade cultural das maiorias também não se tanto e leu-se tanto. O livro não está aca-
cabe na escola, pois o mundo das piadas e das bando e não vai acabar, ao contrário, cada
narrativas orais, o mundo dos provérbios e dos vez se vão ler mais livros, incluídos aí os tex-
ditos populares, o mundo da música popular nar- tos de multimídia, que não são o contrário
rativa e do rap deslocam, também, a partir de do livro, mas sim outro modo de escrita e
suas próprias gramáticas, ritmos e prazeres, o outro objeto de leitura.
ascetismo triste do autismo livresco.
A escola desconhece tudo o que de cul-
tura se produz e transcorre pelo mundo O problema está em saber se a escola
audiovisual e pelo da cultura oral: dois mun- vai ser capaz de ensinar a ler livros não só como
dos que vivem, justamente, do hibridismo e da ponto de chegada mas também de partida para
mestiçagem, da mistura de memórias outra alfabetização, a da informática e das
territoriais com imaginários deslocados. En- multimídias. Isso implica pensar se a escola
frentemos o mal-entendido. está formando o cidadão que não só sabe ler
Reconhecer que vivemos numa socie- livros, mas também noticiários de televisão e
dade multicultural significa não só aceitar as hipertextos informáticos.
lesafios culturais da comunicação a educação

novo. Devemos aprenderjunto com os jovens a


forma de dar os próximos passo^"^.
O cidadão de hoje pede ao sistema Esta reflexão põe em cena um novo tipo
educativo que o capacite a ter acesso à de cultura. Aquela que é experimentada pela ju-
multiplicidade de escritas, linguagens e discur- ventude contemporânea da revolução eletrônica
sos nos quais se produzem as decisões que o afe- e à qual Mead chamapre$gurativa, por ser uma
tam, seja no campo de trabalho como no âmbito cultura que ainda não tem clara sua figura, tendo
familiar, político e econômico. Isso significa que começado a emergir apenas nos finais dos anos
o cidadão deveria poder distinguir entre um 60, caracterizando-se por ser aquela na qual os
telejomal independente e confiável e um outro pares substituem os pais, instaurando-se assim
que seja mero porta-voz de um partido ou de um uma ruptura sem correspondente na história. Esta
grupo econômico, entre uma telenovela que es- ruptura representa não uma mudança de velhos
teja ligada ao seu país, inovando na linguagem e conteúdos em novas formas ou vice-versa, mas
nos temas e uma telenovela repetitiva e simpló- sim uma transformação na natureza do proces-
ria. Para tanto, necessitamos de uma escola na so: a aparição de uma comunidade mundial, na
qual aprender a ler signifique aprender a distin- qual os homens de tradições culturais muito di-
guir, a tomar evidente, a ponderar e escolher onde ferentes emigram no tempo, todos partilhando as
e como se fortalecem os preconceitos ou se re- mesmas lendas e sem modelos para o futuro. Um
novam as concepções que temos sobre política, futuro apenas balbuciado pelos relatos da ficção
família, cultura e sexualidade. científica, na qual os jovens encontram narrada
sua experiência de habitantes de um mundo cuja
complexa heterogeneidade "não se deixa expres-
Precisamos de uma educação que não sar em seqüências lineares tais como as que eram
deixe os cidadãos inermes diante dos podero- ditadas pela palavra impressaw5.E que remete,
sos estratagemas de que, ho-je, dispõem os por conseguinte, a um aprendizado fundado me-
meios de comunicação para camuflar seus in- nos na dependência dos adultos que na própria
teresses e fazê-los passar por opinião pública. exploração, feita pelos habitantes do novo mun-
do tecnocultural, da visão, da audição, do tato ou
da velocidade.
Para ajudar-nos a entender a profundida- Daí a importância estratégica que adqui-
de da mudança cultural que hoje se dá no mun- re hoje uma escola capaz do uso criativo e crí-
do da comunicação e da transformação tico dos meios audiovisuais e das tecnologias
tecnológica, Margaret Mead afirma: "Nosso inforrnáticas. Isso, porém, só será possível numa
pensamento ainda nos amarra ao passado, ao escola que transforme seu modelo (e sua práxis)
mundo tal como existia na época de nossa in- de comunicação, isto é, que torne possível a pas-
fância e juventude; nascidos e criados antes da sagem de um modelo centrado na seqüência li-
revolução eletrônica, a maioria de nós não en- near - que encadeia de forma unidirecional
tende o que esta significa. Os jovens da nova graus, idades e grupos de conhecimentos - a
geração, ao contrário, assemelham-se aos mem- outro descentralizado e plural, cuja chave é o
bros da primeira geração nascida em um país encontro do palimpsesto e do hipertexto. En-

4. MEAD, Margaret. Cultura y compromiso. Barcelona: Granica, 1972.


5. MEAD, M. Cultura y .... op. cir.
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tendo por palimpsesto esse texto no qual um Um dos maiores desafios que o
passado que foi apagado emerge tenazmente, ecossistema comunicativo faz à educação é:
embora difuso, nas entrelinhas da escrita pre- ou se dá a sua apropriação pelas maiorias ou
sente; e por hipertexto uma escrita não se dá o reforçamento da divisão social e a ex-
sequencial, mas sim montagem de conexões em clusão cultural e política que ele produz.
rede que, ao permitirlexigir uma multiplicidade
de percursos, transforma a leitura em escrita.
Enquanto o tecido do palimpsesto nos põe Pois, enquanto os filhos das classes
em contacto com a memória, com a pluralidade favorecidas entram em interação com o
de tempos carregada, acumulada por qualquer ecossistema informacional e comunicativo a
texto, o hipertexto remete à enciclopédia,às pos- partir de seu próprio lar, os filhos das classes
sibilidades presentes de intertextualidade e populares - cujas escolas públicas não têm,
intermedialidade,duplo e imbricado movimento em sua imensa maioria, a menor interação com
que está exigindo que substituamos o lamento o ambiente informático, escolas que são para
moralista por um projeto ético: o do fortaleci- eles o espaço decisivo de acesso às novas for-
mento da consciência histórica, única possibili- mas de conhecimento - estão ficando excluí-
dade de uma memória que não seja mera moda dos do novo espaço laboral e profissional que
retrô, nem evasão às complexidadesdo presente. a cultura tecnológica propõe. Vemos, portan-
to, que há uma carência de demandas de
comunicação no espaço educativo e que o aces-
Só assumindo a tecnicidade midiática so a elas não é democrático.
como dimensão estratégica da cultura é que a É a partir do entendimento de que há
escola poderá inserir-se de novo nos proces- uma carência dessas demandas que se verá a
sos de mudança atravessadospela nossa soci- necessidade de diferenciar a televisão educati-
edade e interagir com os campos de experiên- va dos diversos modos de fazer educação pela
cia em que se processam essas mudanças. televisão. Se é necessário pensar num tipo de
presença da educação escolar nos meios
televisivos, são igualmente ou mais necessárias
Tais mudanças estão materializadas na outras modalidades de educação, entre as
desterritorializaçáolrelocalização das identi- quais, para a Colômbia, destacaria duas: uma
dades, hibridações da ciência e da arte, das lite- formação continuada de adultos, que os
raturas escritas e das audiovisuais, reorganiza- capacite justamente para colocar-se frente às
ção dos saberes e do mapa dos ofícios. A partir novas linguagens e saberes que circulam na
de fluxos e redes através dos quais se mobiliza sociedade e diante dos quais a imensa maioria
não só a informação como o trabalho, o inter- está desprovida de capacidade de leitura e de
câmbio e a concretização conjunta de projetos, seu aproveitamento. Esse desconhecimento
de pesquisas científicas e de experimentações está agravando a exclusão social, começando-
estéticas. Só encarregando-se dessas transfor- se pela do trabalho. Em segundo lugar, um
mações, poderá a escola interagir com as novas âmbito estratégico de educação de adultos que
formas de participação cidadã que o novo am- existe na Colômbia, e que é decisivo para
biente comunicacional abre, hoje, à educação. nossas possibilidades de convivência. Este
lesafios culturais da comunicação a educação

consiste na construção de uma história do país A educação tem de ajudar a criar


que articule suas múltiplas memórias, tanto nos Jovens uma mentalidade crítica,
étnicas como raciais, locais e de gênero, e em questionadora, desajustadora da inércia
cuja construção audiovisual deveriam trabalhar na qual as pessoas vivem, desajustadora
os melhores historiadores, os melhores da acomodação na riqueza e da resigna-
roteiristas e diretores de televisão, capazes de ção na pobreza.
proporcionar-nos os elementos básicos com os
quais construir identidades novas e, ao mesmo
tempo, arraigadas, porém sem narcisismo, sem É muito o que resta por mobilizar, a par-
provincianismo, identidades que possam tir da educação, para renovar a cultura política
dialogar e atuar entre si e com o resto das de maneira que a sociedade não procure salva-
identidades do mundo. dores, mas sim crie sociabilidades para convi-
Entre a educação, entendida de forma ver, harmonizar, respeitar as regras do jogo ci-
ampliada pelo ecossistema comunicativo, e o dadão, desde as do tráfego até as do pagamento
lugar da escola, o chileno Martin Hopenhayn dos impostos. E, em terceiro lugar, a educação
traduz em três objetivos básicos os códigos de é moderna na medida em que seja capaz de
modernidade6. Esses objetivos são: formar desenvolver sujeitos autônomos. Frente a uma
recursos humanos, construir cidadãos e sociedade que massifica estruturalmente, que
desenvolver sujeitos autônomos. Em primeiro tende a homogeneizar, inclusive quando cria
lugar, a educação não pode dar as costas às possibilidades de diferenciação, a possibili-
transformações do mundo do trabalho, dos novos dade de sermos cidadãos é diretamente pro-
saberes que a produção mobiliza, das novas porcional ao desenvolvimento de sujeitos au-
figuras que recompõem aceleradamente o campo tônomos, isto é, de gente livre, tanto interior-
e o mercado das profissões. Não se trata de mente como em suas tomadas de posição.
subordinar a formação à adequação de recursos
humanos para a produção, mas sim que a escola
assuma os desafios que as inovações tecno- Gente livre significa gente capaz de
produtivas e relativas ao trabalho apresentam ao saber ler a publicidade e entender para que
cidadão em termos de novas linguagens e serve, e não gente que deixa massagear o
saberes. Pois seria suicida para uma sociedade próprio cérebro; gente que seja capaz de
alfabetizar-se sem levar em conta o novo país distanciar-se da arte que está na moda, dos
que está aparecendo no campo da produção. Em livros que estão na moda, gente que pense
segundo lugar, construção de cidadãos significa com sua cabeça e não com as idéias que cir-
que a educação tem de ensinar as pessoas a ler o culam ao seu redor.
mundo de maneira cidadã.

6. HOPENHAYN, Martin. Ni apocalipticos ni integrados (Nem apocalípticos nem integrados). Santiago: F.C.E. 1994.
Comunicação & Educação, São Paulo, 1181: 5 1 a 6 1, maiolago. 2000

Resumo: Este artigo trata das preocupações de Abstract This article deals with Jesus Martín-
Jesús Martín-Barbero em relação a falta de Barbero's concerns on the lack of understanding
compreensão na elaboração de políticas culturais of the Colombian cultures policy elaboration, on
na Colômbia, sobre como o campo da comunica- how the communications field can perform when
ção pode atuar frente aos desafios que a Educação confronted with the challenges Education has to
tem de enfrentar para a formação de cidadãos confront to form free citizens that are capable of
livres e capazes de atuar de forma autônoma na performing autonomously in society. He discusses
sociedade. Ele discute as dificuldades e principal- the difficulties and, most especially, the inability
mente a incapacidade de a escola alterar sua the school has in order to change its relationship
relação com a produção e aquisição de conheci- with the production and acquisition of knowledge.
mento. O modelo de comunicação predominante The predominant communication model in school
na escola é vertical e autoritário na relação is vertical and authoritarian in the teacher-student
professor-aluno, e linear sequencial no aprendi- relationship, while linear and sequential in
zado, impedindo que se abra de maneira a learning, something that does not allowing it to
enriquecer-se com as novas linguagens dos meios be open in order to be enriched by the new means
de comunicação. Ele também descarta a mera of communication languages. He alço discards the
aquisição de equipamentos e tecnologias, por parte school's merely acquiring equipment and
da escola, para a transposição ilustrativa dos technologies for the illustrative transposition of
conteúdos. Salienta que a escola precisa alterar contents. The author stresses that the school
suas formas de relacionamento com os jovens, needs to change the way it relates to the young
com o conhecimento e com o conjunto da people, to knowledge and to the society as a
sociedade. Essas mudanças comportam entender whole. These changes involve understanding the
a centralidade dos processos de comunicação - centrality the communication processes have -
ao que denominou ecossistema comunicativo - which he denominated as the communicative
para capacitar o jovem para uma mentalidade ecosystem - to capacitate the young people to
crítica, fazendo-o ler o mundo de maneira cidadã. have a critical mentality, so they can read the world
as participant citizens.

Palavras-chave:Colômbia, cidadania, escola, mei- Key words: Colombia, citizenship, school, means
os de comunicação, ecossistema comunicativo of communication, communicative ecosystem

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