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Revista Filosofia Capital Vol. 5, (2010) - Edição Especial


ISSN 1982 6613 Novas Perspectivas Intelectuais
e suas Interfaces Existenciais.

MARTIN HEIDEGGER E HANS-GEORG


GADAMER: OS CAMINHOS DA COMPREENSÃO

MARTIN HEIDEGGER AND HANS-GEORG


GADAMER: THE WAYS OF COMPREHENSION

CRUZ, Raimundo José Barros 1

RESUMO
O projeto filosófico heideggeriano foi levado em frente guiado por uma hermenêutica da
faticidade, associada estreitamente ao questionamento sobre o sentido do ser. Para Heidegger,
o novo modo como deve ser compreendido o ser, passa, necessariamente, pelo caminho da
interpretação. O que torna possível a interpretação do Dasein é, portanto, a ontologia
fundamental, que para Gadamer corresponde ao lugar prévio da compreensão. O novo
conceito de compreensão cunhado por Heidegger passou a Gadamer, influenciando-o
determinantemente. Assim, num processo crítico de reconstrução que retoma a tradição,
Gadamer torna-se o primeiro teórico que, ao partir das contribuições heideggerianas, confere
à hermenêutica a capacidade de tematização a respeito da estrutura geral da compreensão.

Palavras-chave: Hermenêutica; Linguagem; Compreensão.

ABSTRACT
The Heidegger's philosophical project was brought forward guided by a hermeneutics of
facticity, closely linked to questions about the meaning of being. For Heidegger, the new
mode should be understood as being, necessarily pass by way of interpretation. What makes
possible the interpretation of Dasein is therefore fundamental ontology, which corresponds to
the place to Gadamer prior understanding. The new concept coined by Heidegger to
understand now Gadamer, influencing him decisively. Thus, a critical process of
reconstruction that continues the tradition, Gadamer becomes the first theorist who, by
contributions from Heideggerian, hermeneutic gives the ability of theme about the general
structure of understanding.

Keywords: Hermeneutcs; Language; Comprehension.

1
Graduado em Filosofia (URI/UPF), Teologia (ITEPA), Música (UPF) e Mestre em Educação pela UPF. Membro do Núcleo
de Pesquisa em Filosofia e Educação – NUPEFE/UPF. rajobac@hotmail.com.

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A essência reside na compreensão: a concretude tornou-se o equivoco da


perspectiva heideggeriana metafísica ocidental. Realizado esse
O projeto heideggeriano retoma de diagnóstico, a filosofia heideggeriana
forma extraordinária o caminho traçado ergueu-se com a ideia de que a superação
pela filosofia ocidental. Seu pensamento desse modo de filosofar reside na reposição
surge como crítica da filosofia, sendo que o da questão sobre o que é o homem e sua
programa desse pensamento é “superação” existência, questão que conduziria à
ou “transpassamento” da tradição filosófica reposição novamente da questão filosófica
denominada metafísica. Segundo sua de fundo que é o ser.
avaliação, essa tradição chegara ao seu A superação dessa situação
acabamento na instalação técnica atual do legitimada pela tradição só pode ser
mundo (FIGAL, 2005, p. 12).2 Martin possível com a reposição da pergunta sobre
Heidegger (1989 – 1976) teve sua formação o ser, que fuja ao objetivismo e estaticidade
filosófica na Universidade de Freiburg-im- históricos, como também à subordinação
Bresisgau, na qual foi aluno de Edmund técnica predominante na modernidade. A
Husserl (1859 – 1938), o criador do método crítica heideggeriana alerta-nos, portanto,
fenomenológico. Deste recebeu muitas para uma necessária reconsideração: o
influências que tiveram substancial homem existe inserido na história e na
importância para seu pensamento. Não sociedade, questão básica que deve nos
podendo tratar de todas nesse estudo, levar a entender que ele não pode ser
procuraremos nos concentrar no âmbito da considerado fora desse contexto. Para além
influência hermenêutica. Em Husserl, das explicações possíveis, o homem
Heidegger encontrou o ponto de partida necessita, antes, ser compreendido. Dessa
para sua crítica à metafísica ocidental. Para forma, uma “analítica existencial da pré-
Heidegger, ao deixar de ir “às coisas sença se coloca [...] dentro da ‘concreção’
mesmas” (zu den Sachen selbsz), os da própria existência lançada de fato, para,
sistemas metafísicos ocidentais aferraram- então, desentranhar a temporalidade como a
se a um conceito demasiadamente forte de sua possibilitação originária”
razão. Tal conceito mostrou-se em última (HEIDEGGER, 1990, p. 249).
instância, incapaz de tratar do ser humano e O esforço heideggeriano de
sua condição histórico-existencial. A transpassamento ou superação dos
especulação abstrata dos conceitos tratamentos dados ao ser, dominantes
metafísicos acabou por esquecer a esfera da historicamente no seio da filosofia
vida: o esquecimento do ser humano em sua ocidental, o faz chegar à hermenêutica. No
método hermenêutico, Heidegger encontra
2
Trata-se de destruição, conforme parágrafo 6 de Ser e as condições suficientes de recuperação do
tempo. Para Heidegger, à medida que, no curso da que a tradição esqueceu, ou seja, o
história, certas regiões privilegiadas do ser foram
focalizadas a ponto de guiar de maneira primordial toda a problema do homem, da vida, o problema
problemática do pensamento, as mesmas tornaram-se do ser; assim, recolocar a pergunta sobre o
inquestionáveis quanto ao ser e à estrutura do seu ser, tais ser compõe o núcleo central do projeto
como o ego cogito de Descartes, o sujeito, o eu, a razão, o
espírito, a pessoa. Tudo isso ocasionou o constante heideggeriano. A historicidade e
descaso com a questão do ser vivido pelo Ocidente. temporalidade do ser constituíram-se em
Nessas condições, caso a questão do ser pretenda adquirir seu ponto de partida, um modo de fazer
a transparência de sua própria história, faz-se necessário
que sejam abaladas a rigidez e o endurecimento de uma filosofia no qual a concretude ou faticidade
tradição petrificada e se removam os entulhos tornaram-se dimensões determinantes,
acumulados. Esta tarefa se constituirá na destruição capazes de superar o paradigma da
(Destruktion) do acervo da antiga ontologia, legado pela
tradição. (Heidegger, 1998, p. 50 – 51). consciência pura. Pelo método da

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hermenêutica filosófica ele desenvolveu sujeito, estando fundado na existência
uma hermenêutica do Dasein, procurando, [...] Esta se desentranha como a
dessa forma, tematizar os diversos historicidade da pre-sença [...] A
problemas próprios da existência humana. sentença: a pre-sença é histórica,
confirma-se do ponto de vista
A obra Ser e tempo (Sein und Zeit),
ontológico-existencial, como
publicada em 1927, foi levada em frente proposição fundamental. Ela está
guiada por uma hermenêutica da faticidade, muito distante de uma constatação
associada estreitamente ao questionamento meramente ôntica do fato de a pré-
sobre o sentido do ser. O novo modo como sença se dar numa “história mundial”.
deve ser compreendido o ser passa, A temporalidade da pre-sença é,
necessariamente, pelo caminho da porém, o fundamento de uma possível
interpretação. O que torna possível a compreensão historiográfica, que por
interpretação do Dasein é, portanto, a sua vez, comporta a possibilidade de
ontologia fundamental, que para Gadamer uma elaboração explícita da
corresponde ao lugar prévio da historiografia como ciência (1990, p.
127).
compreensão. Procede neste momento uma
reviravolta: o sentido do ser e o problema
Com Heidegger surge um novo
da compreensão ocupam um novo contexto,
compreender. Para além das formulações
“abandonando toda fundamentação natural
conceituais difundidas pela metafísica
ou teleológica” (HERMANN, 2002, p. 34).
tradicional e, da mesma forma, pela
Ao superar a metafísica tradicional
objetividade estática do proceder
Heidegger apresenta o compreender como a
metodológico, guiado pela relação sujeito-
existência em si, ou seja, o modo próprio de
objeto, o autor põe a compreensão na
viver. Nessa perspectiva, os conceitos
abertura infinita de possibilidades. O
perdem a autoridade sobre a essência do
mundo é novo lugar temático que nos
ser, que, posto em sua condição existencial,
oferece as condições de compreensão e pré-
torna-se impossível de ser conhecido
compreensão; é o fundamento ontológico
conceitualmente. No solo da existência
da hermenêutica filosófica, a ontologia
encontra-se o ser, e somente aí ele pode ser
fundamental, como pretende Heidegger: “O
compreendido.
mundo é a temporalidade que torna possível
Compreender, na perspectiva
o tempo, a espacialidade de onde percebo o
hermenêutico-fenomenológica
espaço, a historicidade que propicia a
heideggeriana, significa ver no mundo o
história, é a realidade que esclarece o real”
homem e a totalidades de relações que o
(ALMEIDA, 2002, p. 237). Compreender
submergem. O mundo é o lugar onde desde
adequadamente é tomar consciência de que
sempre nos encontramos; o lugar que nos
o mundo é o próprio, sendo o homem o ser-
molda, nos determina e onde se radicam
no-mundo. A mundanização da
nossas possibilidades. Por conseguinte,
compreensão determina a busca pelo
torna-se este o lugar por excelência onde
sentido do ser. Nesta perspectiva, ela
deve repousar nossa compreensão. No
abrange o homem em seus momentos,
parágrafo 66 de Ser e tempo Heidegger
relações e possibilidades. Posta a questão, o
expõe de forma clara seu novo
compreender exige a compreensão do
desenvolvimento temático:
contexto de onde surge o ser, portanto, do
A estrutura ontológica deste ente, que seu modo prático de ser no mundo. No
eu mesmo sou, centra-se na sentido de que “o homem não existe como
autoconsciência da existência. Porque um ‘projeto flutuante’ de uma mente”
o si-mesmo não pode ser concebido (LOPARIC, 2003, p.43), mas como o fato
nem como substância e nem como que ele mesmo é ao existir. Caracterizado

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por Heidegger como um ente modo de construir conhecimento, a postura
“intramundano” que pode ser que nos coloca como especialistas nos
compreendido como algo que, em seu determinados âmbitos do conhecimento. Ao
“destino”, está ligado ao ser daquele ente compreendermos hermeneuticamente, nossa
que lhe vem ao encontro dentro de seu postura justifica-se pelo entendimento sobre
próprio mundo (1988, p. 94). o “saber tratar sobre” as coisas, o mundo, o
Encontram-se superadas com o conhecimento, compreensão denominada
posicionamento heideggeriano todas as por Heidegger como existencial.
tendências que pretendiam o compreender Compreender, mais que conhecer de forma
como formas possíveis do comportamento dominadora, é um situar-se no mundo, ou
do sujeito, ou mesmo metodologias e seja, uma “estrutura projetiva, que não é a
formas cognitivas. Qualquer compreensão mesma coisa que a intencionalidade da
guiada pela pretensão de um encerramento consciência, como um ato da mente, mas
objetivo do ser, ou mesmo de um que destaca seu caráter pré-teórico, o seu
distanciamento investigativo, ‘lançar para frente’” (HERMANN, 2002, p.
caracterizando-o como limitado ou 35 – 36). Compreender, dessa forma,
determinado, não condiz com a pretensão significa retirar o ser homem de uma
heideggeriana; nem mesmo se encontrariam condição restrita (objetivista e cientificista)
com as suficientes condições para oferecer e tematizá-lo em sua historicidade e
respostas satisfatórias sobre o mundo e o temporalidade próprias.
homem. O parágrafo 32 de Ser e tempo A temporalidade do Dasein, sua
expressa precisamente o que pretende o localização no mundo e na história
autor. Heidegger entende que em toda e determinam-no e, da mesma forma, à nossa
qualquer compreensão de mundo a compreensão. A pré-compreensividade
existência também está compreendida, e oriunda da temporalidade própria do Dasein
vice-versa. Portanto, toda interpretação se incorre no problema do círculo
move na estrutura prévia já caracterizada; hermenêutico, o qual se encontra presente
logo, toda interpretação que se coloca no em toda compreensão. “O círculo
movimento do compreender já deve ter hermenêutico se abre com a consciência de
compreendido o que se quer interpretar finitude e se articula no diálogo que
(1988, p. 209). estrutura qualquer compreensão possível”
A hermenêutica da faticidade (ALMEIDA, 2002, p. 240).
heideggeriana carrega consigo a intenção de A possibilidade de compreensão
se tornar “uma interpretação da estrutura de constitui-se, portanto, na marca por
cuidado do ser-aí humano que se expressa excelência do ente compreendedor, uma
antes e por detrás de cada juízo e cuja vez que a abertura à possibilidade própria
forma mais elementar de concretização é a do Dasein confere suporte à sua capacidade
compreensão” (GRONDIN, 1999, p. 160). de compreender o mundo e manifestar
Entender-se sobre algo (sich auf etwas sentido em relação ao mesmo. “Nesse
verstehen) é a formulação de Heidegger sentido, a possibilidade não é uma entidade
caracterizadora de seu novo conceito de externa autônoma que se impõe de fora, aos
compreensão, “que indica menos um saber, entes do mundo, mas é uma marca
do que uma habilidade ou um poder. intrínseca do Dasein; só o Dasein é ser de
Entender-se de uma coisa significa estar possibilidades” (ALMEIDA, 2002, p. 241).
apto para ela, poder arranjar-se com ela” A novidade do círculo hermenêutico
(GRONDIN, 1999, p. 160). Por esse modo na perspectiva heideggeriana supera a
de compreender superamos em nosso modo tendência lógica que justifica um círculo
prático de vida, e principalmente em nosso vicioso. Para Heidegger, o círculo contém o

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que lhe é próprio, ou seja, “a circularidade (cuidado)3. Assim, negar o círculo na
de toda a compreensão remete à tentativa de escondê-lo, ou até de superá-lo,
dependência constitutiva do todo e das significa apenas consolidar,
partes” (HERMANN, 2002, p. 36). definitivamente, esse desconhecimento
Heidegger apresenta, no parágrafo 32 de (1990, p. 109).
Ser e tempo, a questão da seguinte forma: O autor alerta para a posição tomada
em relação ao círculo e sugere um salto
O decisivo não é sair do círculo, mas originário e integral para o interior do
entrar de modo adequado. Esse círculo. Esta nova posição possibilita um
círculo da compreensão não é um asseguramento “ao ponto de partida da
cerco em que se pudesse movimentar
análise da pré-sença, uma visão plena do
qualquer tipo de conhecimento. Ele
exprime a estrutura-prévia,
ser em círculo da pré-sença”
existencial, própria do ser-ai (Dasein). (HEIDEGGER, 1990, p. 109). Daí a tese
O círculo não deve ser rebaixado a um de que tanto a ideia de existência, como a
vitiosum [defeito perverso], mesmo ideia de ser devem ser dadas como
que apenas tolerado. Nele se esconde pressupostas, visto que a partir delas
a possibilidade positiva do “interpreta-se a pré-sença para, então, se
conhecimento mais originário que conquistar a ideia de ser” (HEIDEGGER,
decerto só pode ser apreendida de 1990, 107). Por este caminho estrutura-se a
modo autêntico se a interpretação busca pelo sentido do ente, que só se faz
tiver compreendido que sua primeira, possível quando acessível em seu ser. “O
única e última tarefa é não se deixar
ente só ‘tem’ sentido porque, previamente
guiar, na posição prévia e concepção
previa por conceitos ingênuos e
sem seu ser, ele se faz compreensível no
“chutes” (1988, p. 210). projeto ontológico, isto é a partir da
perspectiva do ser” (HEIDEGGER, 1990,
A estrutura circular da compreensão p. 118). O esclarecimento heideggeriano
para Heidegger é um modo próprio de o sobre as possibilidades de um método
compreender se articular. “A compreensão hermenêutico-fenomenológico, motivado
prévia reconduz ao círculo hermenêutico pela crítica à metafísica tradicional e pela
ontológico-histórico, que reconhece um reposição da pergunta pelo ser, nos conduz,
sentido antecipado e abre as possibilidades antes de tudo, a um novo modo de
de leitura do mundo” (HERMANN, 2002, interpretar e compreender. Compreender
p. 37). A circularidade do compreender hermeneuticamente o Dasein implica a
refere-se exatamente à necessidade de libertação da conceituação via consciência
apreensão do todo pela compreensão de pura e uma relação estática entre sujeito
suas partes. Na perspectiva heideggeriana, dominador e objeto dominado. O novo
compreender é situar-se no mundo; é caminho abre-nos a possibilidade de um
reconhecer que a experiência factual do estar no mundo; ao existir, somos seres que
ente, ao ser realizada, exige a pré- compreendemos ao nos
compreensão, contudo sem conceituá-lo. A autocompreendermos; compreendemo-nos
crítica de Heidegger em relação ao círculo 3
hermenêutico que prevaleceu na tradição Segundo Heidegger (1988, p. 257), a cura caracteriza não
somente a existencialidade, separada da faticidade e de-
aponta para um duplo equívoco: 1. que a cadência, como também abrange a unidade dessas
própria compreensão constitui um modo determinações ontológicas. A cura não indica, portanto,
fundamental do ser da pré-sença (ser-aí); 2. primordial ou exclusivamente, uma atitude isolada do eu
consigo mesmo. Enquanto totalidade originária de sua
que este ente é constituído pela cura estrutura, a cura acha-se do ponto de vista existencial a
priori “antes” de toda “atitude” e “situação” da pré-sença,
o que sempre significa dizer que ela se acha em toda
atitude e situação de fato.

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num mundo infinito em possibilidades de ontologia da compreensão. Assim, somente
relações. a habitação mundana nos oferece as
condições de interpretação e compreensão
necessárias e suficientes. Ao tratar da
Hermenêutica filosófica da faticidade: o questão, Ricoeur ajuda-nos no seu
lócus da compreensão entendimento ao afirmar que a primeira
Com Heidegger, a hermenêutica função do compreender é a de nos orientar
avança definitivamente para o centro da numa situação. O compreender não se
reflexão filosófica, processo que será dirige, pois, à apreensão de um fato, mas de
completado por Gadamer. Mostra-nos uma possibilidade de ser. A fidelidade ao
Heidegger que “o elemento organizador, modo de compreender heideggeriano exige,
estruturante, processual, transcendente ou assim, o entendimento de que o mesmo é
historial é introduzido a partir do modo de essencialmente um projetar ou, de modo
ser-no-mundo do ser-aí, no qual ele se mais dialético e paradoxal, um projetar
explicita e compreende em ser e assim num ser-lançado prévio (1988, p. 33).
compreende o ser como tal” (STEIN, 2004, O intuito de Heidegger funda uma
p. 80). Nesse fato reside, portanto, a hermenêutica filosófica na qual a
circularidade da compreensão sustentadora autointerpretação da faticidade cria as
do círculo hermenêutico nos moldes condições para o compreender, ou seja,
pretendidos por Heidegger. A analítica “uma interpretação da interpretação, para
existencial heideggeriana oferece à filosofia que o ser-aí possa tornar-se transparente a si
ocidental uma nova maneira de pensar, na mesmo” (GRONDIN, 1999, p. 167).
qual encontramos as condições de constante Somente a temporalidade do Dasein nos
relação entre o ser e o ser-aí. Por meio dela confere as condições de formular perguntas
constitui-se, portanto, o ponto de partida pelo seu sentido, pois, conforme Heidegger,
para a ontologia fundamental pretendida “o fundamento só se faz acessível com o
por Heidegger. sentido, mesmo que em si mesmo seja o
A nova tematização heideggeriana abismo de uma falta de sentido”
com a reposição da pergunta pelo ser (HEIDEGGER, 1988, p. 209). Ocorre que
também repõe todo o nosso modo de “na interpretação a compreensão se
compreender. A hermenêutica da apropria do que compreende” (ALMEIDA,
faticidade, como a pretende Heidegger, 2002, p. 256). Nunca fugimos ao mundo de
inaugura um novo lócus da compreensão. sentidos que nos rodeia. Por isso, segundo
Este novo lugar agora por nós ocupado, faz- Almeida:
nos perceber que no compreender o ser que
se põe à vista, “trata-se de um ser que se Estar no mundo é pertencer a uma
mostra no processo da compreensão totalidade de sentidos. Por isso, o
sustentado pelo ser-aí. Introduz-se, assim, Dasein é um ente mundano. E o
sentido do mundo não é algo
um modo de pensar o ser, desde o modo de
produzido subjetivamente e de forma
o ser humano ser no mundo” (STEIN, 2004, independente, mas se constitui na
p. 87). O ser como acontecer dá-se, relação entre o Dasein e os entes que
portanto, na compreensão, à qual confere lhe vêm ao encontro. Portanto, a
sustentabilidade. “É na relação com minha totalidade prévia de sentido se abre na
situação, na compreensão fundamental de projeção do Dasein para o mundo,
minha posição no ser, que está implicada, a onde ele encontra o “outro”; mas
título principal, a compreensão” nesse movimento o que ele vê é a si
(RICOEUR, 1988, p. 32). Ser-no-mundo é mesmo (Almeida, 2004, p. 256).
o ponto fundante no qual se apoia uma

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Pelo sentido alcançamos o compreender, que implica diretamente na
fundamento da compreensibilidade. histórica mudança do próprio modo de
Portanto, uma hermenêutica da faticidade proceder da hermenêutica. Seria muita
apresenta-se suficientemente capaz de nos pretensão nossa, procurar apresentar nesta
conferir o sentido das cosias, porque nos parte do trabalho todo o projeto
transporta para a existência mesma do heideggeriano, tendo em vista sua
Dasein, onde se constitui o próprio sentido. profundidade e densidade. Por isso,
Saibamos, portanto, que “o sentido é o que objetivamos apresentar alguns traços do
surge na relação estabelecida entre chão fecundo no qual tomou corpo a
decadência, faticidade, e existencialidade, hermenêutica gadameriana.
aquilo que pode articular-se na abertura da
compreensão” (ALMEIDA, 2004, p. 256). Compreender é pôr-se de acordo na
Nossa compreensão reside no sentido do ser linguagem: a perspectiva gadameriana
que se abre enquanto ser-no-mundo, O novo conceito de compreensão
descobrindo-se a si mesmo. Assim, cunhado por Heidegger passou a Gadamer,
compreender só se torna possível com o influenciando-o determinantemente.
estar-no-mundo, uma vez que “o Constitui-se no ponto de partida crucial,
fundamento da compreensão é anterior a com o qual Gadamer pôde conferir à
qualquer tematização, pois nossa visão das hermenêutica filosófica a universalidade
coisas é pré-dicativa” (HERMANN, 2002, suficiente. O novo caminho tomado
p. 40). conferiu à hermenêutica uma aura
A pergunta primordial pelo sentido do diferenciada, tornando-a diversa do que a
ser feita por Heidegger ao questionar a tinha justificado historicamente, desde sua
metafísica tradicional conduz a uma nova origem até o debate desencadeado pelas
maneira de compreender, inaugurando, ciências do espírito
dessa forma, o novo lugar da compreensão. (Geisteswissenschaften). Num processo
Neste novo modo de compreender, temos crítico de reconstrução que retoma
um ente que se abre em suas possibilidades, Schleiermacher e Dilthey, Gadamer torna-
ou seja, este “ente intramundano em geral é se o primeiro teórico que, ao partir das
projetado para o mundo, ou seja, para um contribuições heideggerianas, confere à
todo de significância em cujas remissões hermenêutica a capacidade de tematização a
referenciais a ocupação se consolida respeito da estrutura geral da compreensão.
antecipadamente como ser no mundo” Sua originalidade reside em ter ampliado as
(HEIDEGGER, 1988, p. 208). Como possibilidades mediante as quais se torna
abertura, a compreensão aponta para todo o possível a realização da compreensão;
ser-no-mundo. Compreender o mundo é melhor entendido, como um esforço
compreender, portanto, a própria existência. sistemático e concentrado em discutir o
Nesse âmbito reside a abertura da problema do conhecimento para além de
compreensão, e somente nela o ser pode uma subjetividade transcendental,
aparecer, possibilitando ser compreendido, reconhecendo que o mesmo se dá a partir
posto que “o que está à mão se explicita na de categorias que lhes são inerentes: a
visão da compreensão” (HEIDEGGER, historicidade e a linguagem.
1988, p. 205). Nesse aspecto, o esforço gadameriano
Concordemos, pois, que o esforço caracteriza-se como desconstrucionista. Seu
desconstrutivo heideggeriano resulta numa ponto de partida é uma retomada de Herder
alteração radical das categorias metafísico- e Nicolau de Cusa, apoiando-se
tradicionais que prevaleciam até então, propriamente em Humboldt. Não
sobretudo no que diz respeito ao desconsidera a consistente colaboração,

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principalmente de Humboldt, para a exige liberdade frente o que vem ao nosso
fundação de uma filosofia e ciência encontro a partir do mundo; liberdade que
moderna da linguagem, contudo defende nos ponha diante do mundo tal como ele se
que alguns aspectos precisam ser repostos nos apresenta. O alcance dessa capacidade
de maneira adequada. Assim, retomar esse tão indispensável significa para nós ter
processo para contribuir com o novo mundo e ter linguagem (GADAMER,
contexto em que nos encontramos exige “el 1991). Não podemos nos pensar desligados
reconocimiento de la unidad de lengueje y do mundo e de suas influências sobre nosso
tradición” (GADAMER, 1991, p. 529). modo de ser e viver, pois desconsiderar o
Tudo isso se dá em conexão com a mundo significaria desconsiderar a nós
tese de que o problema hermenêutico mesmos. Uma visão adequada de nós
possui um lócus diferenciado. Portanto, o mesmos exige nossa relação com o mundo
tratamento adequado da questão consiste e seu resultado (efeito) em nossa vida.
em saber que, ao tratarmos sobre a Afirma Gadamer:
concepção de linguagem, estamos tratando
de concepção de mundo. Posta a questão, Precisamente lo que caracteriza a la
Gadamer procura deixar claro que para o relacion del hombre com el mundo
problema hermenêutico a linguagem não é por oposición a la de todos los demás
seres vivos es su liberdad frente al
somente um dentre muitos dotes atribuídos
entorno. Esta liberdad incluye la
ao homem que está no mundo; antes disso, constitución linguística del mundo. Lo
constitui-se na base absoluta e necessária uno forma parte de lo outro y la
para que os homens tenham um mundo. A inversa. Elevarse por encima de las
prova disso é que o mundo que está aí para coerciones de lo que le sale a uno al
o homem; apresenta-se numa forma na qual encuentro desde el mundo significa
não está para nenhum outro ser vivo, tener lenguaje e tener mundo
porque apenas na linguagem o mundo se (GADAMER, 1991, p. 532).
encontra representado (2007, p. 71).
A linguagem possui o caráter Com a liberdade humana frente ao
originário de estar no mundo4, condição que mundo circundante surge a liberdade
justifica sua originária humanidade. Nessas lingüística, por meio da qual o homem
condições, apenas considerando a relação diversifica o que se encontra à sua volta,
linguagem e mundo poderemos chegar ao valendo-se da palavra, da conversação, tudo
horizonte suficientemente adequado para “porque el hombre está capacitado para
tratar do caráter da linguagem na elevarse siempre por encima e su entorno
experiência hermenêutica. Assim, ter casual, y porque su hablar hace hablar al
mundo significa um comportamento em mundo, esta dada dede el principio su
relação ao mundo, um comportamento que libertad para un ejercicio variado de su
capacidad lingüística” (GADAMER, 1991,
4
Sobre o conceito de mundo, Gadamer (2007, p. 572) p. 533). Por possuir linguagem o homem
esclarece que se opõe ao conceito de mundo circundante diferencia-se de qualquer outro ser vivo
(Umwelt), que se pode atribuir a todos os seres vivos.
Evidentemente, o conceito de mundo circundante foi presente no mundo circundante, o que
usado no princípio só para o mundo circundante humano. justifica sua própria humanidade.
O mundo circundante é o milieu em que vivemos e a Da relação linguagem e mundo surge
influência deste sobre o nosso caráter e sobre nosso modo
de vida é o que confere significação a esse mundo a objetividade (Sachlichkeit) da linguagem,
circundante. É exatamente isso que esclarece a diferença que reside na comunicação de conteúdos,
entre o homem e todos os demais seres vivos, a saber, que conjunturas e estruturas significantes, como
o homem tem “mundo”, na medida em que aqueles não
têm uma relação com o mundo no mesmo sentido, também os enunciados, que precisarão ser
ficando, de certo modo, confinados ao seu mundo necessariamente compreendidos por
circundante.

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outrem. Nesse sentido, o autor procura portanto, no vir à palavra, próprio da
mostrar que a linguagem só é possível no linguagem.
diálogo, na conversação; portanto, “importa
destacar frente a esto que el lenguaje sólo Compreensão como acontecimento de
tiene su verdadero ser en la conversación, e linguagem
el ejercicio del mutuo entendimiento” Gadamer demonstrou claramente
(GADAMER, 1991, p. 535). Na imbricação que o problema do entendimento está
entre mundo e linguagem e na mútua vinculado a um problema de linguagem:
relação resultante desse contexto deve “todos los fenómenos de entendimiento, de
prevalecer o entendimento como um comprensión e incomprensión que forman
processo vivo, que represente comunidades el objeto de la denominada hermenéutica
linguísticas dinâmicas. constituyen um fenómeno de lenguaje”
Vista por esse ângulo, a linguagem (GADAMER, 1992, p. 181). Mas neste
humana deve ser pensada como um ponto sua intenção adquire certa
processo vital específico e uno, justificado radicalidade. Neste novo momento, a tese
pelo fato de que no entendimento da central é de que, da mesma forma que
linguagem encontra-se manifestado o ocorre com o processo de entendimento
mundo. As comunidades de vida humana humano, o processo da compreensão
são verdadeiras comunidades de linguagem, constitui-se num acontecimento lingüístico;
possibilidade que se faz possível pelo fato “incluso cuando se dirige a algo
de a essência da linguagem constituir-se em extralingüístico o escuchamos la voz
conversação. Nesta perspectiva, podemos apagada de la letra escrita” (GADAMER,
entender a existência das diferentes visões 1992, p. 181)
de mundo, pois cada um possui a visão de A compreensão é desde já precedida
mundo herdada da tradição cultural e de pela linguagem e depende desta última para
linguagem nas quais se encontra submerso. existir; portanto, não há compreensão fora
A experiência da linguagem da linguagem. Assim, anteriormente ao
caracteriza a totalidade das experiências enunciado, necessário à conversação, a
humanas de mundo. Temos na linguagem o compreensão preexiste constituída na
mundo propriamente representado, o que linguagem. Compreendemos o outro apenas
para Gadamer implica uma experiência por coexistirmos na linguagem. Nesse
“absoluta”, que ultrapassa todas as entremeio, onde se procura justificar a ideia
relatividades referentes à colocação de compreensão como acontecimento
(posição) do ser (Seinsetzung), pelo fato de linguístico, toma corpo a tese central da
abranger todo o ser em si, hermenêutica gadameriana, a saber, de que
independentemente das relações possíveis. a existência estrutura-se na experiência
Encontramo-nos, portanto, precedidos pelo lingüística, que, por sua vez, determina o
caráter da linguagem no qual se dá nossa modo de ser da própria existência, dos
experiência de mundo: desde já ela nos sentidos dados ao mundo e das
ultrapassou (2007, p. 581). A concepção de compreensões possíveis geradas nesse
uma experiência de mundo que se dá na contexto finito-infinito. Daí emerge o
linguagem põe o homem em relação direta processo existencial mediado pela
e significativa com o mundo. Dessa forma, capacidade originária do homem de
tudo que existe o seria por meio da dialogar consigo mesmo e com o mundo
linguagem que vem à palavra; tudo que circundante.
chega até nós se reconduz à linguagem Gadamer alerta ainda para a
quando por meio dela compreendemos e amplitude e universalidade da
interpretamos. O mundo torna-se mundo, compreensão, encoberta pela tradição

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“después de haber absolutizado durant essencialmente um eliminar de mal-
algunos siglos el método de la ciencia entendidos, terminando por eliminar, em
moderna para nuestra própria última instância, o próprio elemento
autocomprensión” (GADAMER, 1992, p. essencial da compreensão, que se constitui
183). Seu passo seguinte consiste numa na estranheza entre o eu e o outro. Ao
retomada crítica do processo de incorporarem tal procedimento
cientifização vivenciado pela cultura metodológico, as ciências compreensivas
ocidental, procurando, pontualmente, suspenderam, pois, a possibilidade da
apresentar a inadequação do modo como o relação dialógica produtora dos significados
pensamento filosófico ocidental tratou do possíveis no domínio da linguagem. Com
fenômeno da compreensão. essa postura, a hermenêutica procura
A ciência moderna surgida no século mostrar às ciências naturais que tratar do
XVII tem como condição primária a fenômeno da compreensão significa ir além
importância do método para tornar possível da resolução sobre o mal-entendido guiado
a construção ou progresso do pelo modelo epistemológico sujeito –
conhecimento. Por meio delas moldaram-se objeto. Anterior a tal mal-entendido existe o
nossas estruturas de acesso ao mundo, entendimento originário que o permite, ou
predominando nesse contexto “el acceso seja, as estruturas mais profundas,
que prepara para nuestra acción, mediante localizadas no fenômeno originário da pré-
el aislamiento metódico y la encuesta compreensão.
explícita – en el experimento -, los âmbitos Gadamer parte, então, para o
particulares abordados com esse essencial residente nas comunidades vivas
aislamiento” (GADAMER, 1992, p. 182). de linguagens: o diálogo, que torna
Lembra-nos Gadamer que esse modo de verdadeiramente possível o fato da
intervenção no mundo foi a maior comunicação humana e, portanto, a
contribuição das ciências da natureza, como compreensão mútua. Contudo, não o
também da mecânica desenvolvida por diálogo como contraposições do eu em
Galileu. Afirma o autor: “La mecánica relação ao tu e vive-versa; sua força
construída por Galileo [...] es la madre de transformadora modifica essencialmente
nuesta civilización técnica” (GADAMER, essa situação dicotômica. “Un diálogo
1992, p. 183). Por conseguinte, da logrado hace que ya no se pueda reacer en
ortodoxia metódica prescrita por Galileu el disenso que lo puso en marcha”
surge a tensão entre o conhecimento de (GADAMER, 1992, p. 185). Na verdade, a
mundo não metódico – que abrange nossa opinião ou posição comum a todos só pode
existência – e o conhecimento propriamente ser construída via diálogo mútuo, pois
científico. somente assim se faz possível o
Perguntemo-nos, portanto: O que desenvolvimento da compreensão recíproca
significou esta retomada histórica do entre as pessoas.
conhecimento feita por Gadamer? O autor Em toda compreensão pré-existe a
está convencido de que o ideal metódico relação de linguagens, que possui como
originário das ciências da natureza primeiro objetivo viabilizar o entendimento
desfigurou todo o fenômeno da dos que se encontram inseridos nas
compreensão, e o motivo é simplesmente comunidades vivas de linguagens. Nesse
complexo: “También las ciencias que sentido, a universalidade da compreensão
emplean la comprensión se ajustaron cada implica uma pré-compreensão nossa no
vez más al concepto metodológico de este mundo. Assim, o diálogo parte sempre das
gênero” (GADAMER, 1992, p. 184). compreensões de mundo dos envolvidos na
Nessas condições, o compreender tornou-se conversação. Dessa forma, a superação do

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enunciado isolado se dá por meio da ______, M. Ser e tempo. Trad. Márcia de
palavra, que se converte em diálogo, Sá Cavalcante. Parte II. 2 ed. Petrópolis:
constituindo-se no modo originário de ser Vozes, 1990.
da linguagem, que, por sua vez, constitui HERMANN, N. Hermenêutica e educação.
nosso próprio modo de ser no mundo. Essa Rio de Janeiro: DP&A, 2002.
reflexão nos leva ao entendimento de que a LOPARIC, Z. Sobre a responsabilidade.
superação da compreensão da linguagem Porto Alegre: Edipucrs, 2003.
como enunciados isolados (próprios da RICOEUR, P. Interpretação e ideologia.
ciência moderna) transporta-nos para a Trad. Hilton Japiassu. Rio de Janeiro:
totalidade da nossa experiência concreta no Francisco Alves, 1988.
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