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eRe Ente Cet Res oc Cet et Oy Coes Se eR os Creu aed nacionais, transferindo para outras estruturas 0 CeO Ce es ona CPt eet ee Came eda De Ses ard oe Dee eae oa ee ee oct ieee Ce eRe ee eek re Ce ecu mcr See re eR aoe ay capitulos centrais de Caos e governabilidade no Deu RO aC ead et ee oe meat Ee eh eC Rec) OCR ae eee eee May CUCU. et CR en Ce hn Luce ens eet CC Cn Se cae emetic eoe s0 € profundo, que dé continuidade a tematica e & De ER en Caco Ca ane Poe care ke Grazia, Lars Mjéset, Frances Moulder, Ravi Palat, Frances Fox Piven, Mark Selden, Peter Taylor e Immanuel Wallerstein. ‘Quatro anos depois, apresentamos os resultados a Craig Calhoun, para esta série, Seus comentarios, extremamente iites, aliados aos de Bruce Fuller € Micah Kleit, levaram a novas grandes revisoes em 1997 — em especial, a uma reformulagao completa da introdugao e da conclusao. Gostariamos de agrade- cer A gabaritada e eficiente equipe da University of Minnesota Press por orien- tar 0 manuscrito durante as varias etapas da producto, assim como a D DeVoist, do Centro Fernand Braudel, cuja assisténcia durante todo o trabalho foi essencial para que concluissemos o projeto. livro & dedicado a meméria de Terence K. Hopkins. Como um dos coor denadores do Grupo de Pesquisa sobre Hegemonias Comparadas, e papel central na formulagao do projeto de pesquisa. Combinando discerni- mento ¢ generosidade, comentou os rascunhos iniciais dos capitulos, deixan- do uma marca indelével no produto final. Como colega, mentor, fundador € diretor do programa de graduagao em sociologia em Binghamton, sua in- fluéncia em gerasoes de estudiosos ¢ alunos de graduagao foi incomensurével Esperamos que este livro seja um digno memento a ele. INTRODUGAO Giovanni Arrighi e Beverly J. Silver Um mar de mudangas de grandes proporgdes vem ocorrendo no sistema so- cial histérico que forma o mundo moderno. Eric Hobsbawm chama as dé- cadas de 1970 € 1980 de “décadas de crise universal ou global”, a fase de en- cerramento de seu “curto século XX" (1914-1991). Na visio dele, 0 colapso dos regimes comunistas “produziu uma enorme zona de incerteza politica, instabilidade, caos ¢ guerra civil”. Pior do que isso, “também destri sistema que havia estabilizado as relagbes internacionais por cerca de quarenta anos (..) € revelou a precariedade dos sistemas politicos nacionais que se ha- vviam apoiado essencialmente nessa estabilidade” (1994, p. 9-10). independentes, inclusive os laceradas por forcas da econ: nacional e por foreas infranacionais das regides e grupos étnicos separa- tistas. Alguns destes — eis a ironia da histéria — reivindicaram para si o status ltrapassado ¢ irreal de “Estados nacionais” soberanos em miniatura. © futuro da politica era obscuro, mas sua crise, no fim do curto séeulo XX, era patente. (Hobsbawm, 1994, p. 10-11) Igualmente patente foi a crise dos pressupostos racionalistas e humanistas, compartilhados pelo capitalismo liberal e pelo comu damentara a sociedade moderna desde que os Modernos venceram sua fa: ‘mosa batalha contra os Antigos no inicio do século XVIII” (Hobsbawm, 1994, p. 11). No mesmo espirito, Immanuel Wallerstein afirmou que 1989 marcou “o fim de uma era politico-cultur taculares — em que os lemas da Revolugdo Francesa eram vistos pela maioria — uma era de avangos tecnolégicos espe- das pessoas como refletindo uma verdade hist6rica inevitével, a se re: agora ou em futuro préximo”. Como Hobsbawm, Wallerstein vulsées de 1989 no contexto da escalada da desordem auto-reforgadora das nterpretou essa desordem como uma forma de caos sistémico, causada “pelo fato de as cor \digdes do sistema [do duas décadas anteriores. Mas, em contraste com Hobsbawm, que nenhum dos mecanismos voltados para restabelecer 0 funcionamento normal do sistema consegue mais funcionar a contento” (Wallerstein, 1995a, 1, p. 268). Nessas condigées, considera-se que a crise atual marca o fim nao apenas de ‘uma era politico-cultural espectfica, inaugurada pelo Huminismo e a Revolu- sao Francesa, mas também do sistema mundial moderno que passou a existir no “longo” século XX. “Assim como [o sistema mundial moderno] passou a cexistir hd cinco séculos na Europa, como etapa derradeita do desdobramento da ‘crise do feudalismo’, este sistema hist6rico, que agora abarca todo o pla- neta e cujas realizagoes técnico-cientificas vao de triunfo em triunfo, est em uma crise sistémica” (Wallerstein, 1982, p. 11). Partindo de premissas dife- rentes, James Rosenau concorda com essa avaliagio. A seu ver, os pardimetros que moldaram a agdo no sistema internacional por varios séculos vem sendo tio fundamentalmente transformados “que provocam a primeira turbuléncia da politica mundial desde que mudangas compardveis culminaram no Tra- tado de Westfalia em 1648” (Rosenau, 1990, p. 10). Seja qual for a era que se julgue estar terminando — a era da Guerra Fria, ‘era mais longa do “liberalismo” e do lluminismo, ow a era ainda mais longa do sistema dos Estados nacionais —, percebe-se que a incerteza ¢ algo que inunda 0 presente eo futuro previsivel. “A medida que os cidadios do fin de sitele abriam caminho as cegas pela névoa global que os cercava, entrando no terceiro milénio”, comentou Hobsbawm (1994, p. 558-559), “tinham apenas uuma certeza, a de que uma era da historia havia terminado, Sabiam pouguis sima coisa além disso.” Alguns chegaram a achar que nao s6 uma era, mas a propria historia che- gara ao fim. E achavam que ela havia terminado nao com a crise, mas com a vitoria final do capitalismo liberal. Com 0 colapso do comunismo, declarou Francis Fukuyama, “a democtacia liberal permanece como a iinica aspiragio coerente que abrange regides ¢ culturas diferentes em todo o plant ‘Beragdes atrés, “muitas pessoas sensatas conseguiam antever um radiante fu- turo socialista em que a propriedade privada e o capitalismo teriam sido abo. lidos.(..) Hoje, ao contrério, temos dificuldade em imaginar um mundo que scja radicalmente melhor do que 0 nosso, ou um futuro que nao seja essen- (1992, p. xii, 46). Concebida no Departamento de Estado do governo Reagan, a versio ori- ginal dessa declaracao (Fukuyama, 1989) encontrou eco e aplicagao imediatos na visio de uma “nova ordem mundial” evocada pelo presidente Bush a0 enfrentar Saddam Hussein, que invadira o Kuwait. A vitbria espetacular dos ”. Duas cialmente democritico e capitalist EUAJONU na Guerra do Golfo deu credibilidade & idéia de que se estava for- ‘mando uma nova ordem mundial. Em pouco tempo, entretanto, essa idéia passou a ser vista, nas palavras de John A. Hall, “como uma piada de mau gos- to”, a luz da escalada da violencia étnica. A frase do historiador australiano Geoffrey Bainey de que “o otimismo recorrente é um prelidio vital da guerra” pareceu, mais uma vez, ser confirmada pelos fatos (Hall, 1996, p. xii). QUATRO CONTROVERSIAS SOBRE O FUTURO DA ECONOMIA POLITICA MUNDIAL objetivo deste liveo é dissipar pelo menos parte da “névoa global” que nos cerca, investigando a dindmica da mudanga sistémica em dois periods ante- riores de transformagao do mundo moderno que, em alguns aspectos funda- mentais, assemelham-se ao presente. Se 0 periodo atual, como pretendemos argumentar, é de decline crise da hegemonia mundial norte-americana, ele tem analogias importantes com os dois periodos anteriores de transigao he- gemOnica mundial: a transigao da hegemonia holandesa pata a britanica, no século XVII, a transigio da hegemonia britanica para a dos Estados Unidos, no fim do século XIX ¢ inicio do século XX. A comparacio das semelhangas e diferengas entre essas duas transigdes, hd muito concluidas, langara luz sobre a dinamica das transformagBes atua Quatro controvérsias inter-rela A primeira a mudanga no equilibrio de poder entre as nagbes, indagando, em particular, se hé probabilidade de surgir uma nova nagao hegemonica. ‘A segunda concerne ao equilibrio de poder entre as nacoes ¢ as organizagoes empresariais, indagando, em particular, se a “globalizacao” solapou ou no poder dos Estados, irremediavelmente. A terceira diz respeito ao poder dos ‘grupos subalternos, indagando, em particular, se estamos ou no em meio a uma irrefredvel “corrida para o fundo do pogo” nas condigoes de trabalho e de net mudanga do equilibrio de poder entre as civilizagoes ocidentais e nao ocidentais e, em particular, a saber se estamos chegando ao fim de cinco séculos de dominagao ocidental no sistema mundial moderno. Cada capitulo analisa as duas transigdes hegeménicas do passado, tendo em mente uma dessas quatro questdes. Assim, devemos comegar por expor com certa minticia as quatro controvérsias sobre o presente que inspiram nossa investigagio do passado, Na segunda parte desta introdugdo, esclarece- emos os conceitos centrais € 0 a mnadas emolduram nossa investigagao, vida, A quarta coneé bougo teérico em que nossa investigacao se baseia. Na conclusio, abordaremos essas questdes controvertidas a luz dos novos esclarecimentos adquiridos em nossa viagem ao passado. A geografia do poder mundial Ha um debate ¢ incerteza generalizados quanto a estar ou no despontan- do um novo Estado mundialmente hegeménico e, se estiver, que Estado de- sempenhard esse papel. Como observa Robert Gilpin (1996, p. 2), “[n]ao ha cconsenso quanto a quem venceu realmente a Guerra Pria, se é que alguém vencen”. Os canclidatos propostos pelos diferentes analistas incluem os Es- tados Unidos, a Unido Européia e 0 Japio, enquanto outros afirmam que to- dos os Estados perderam poder para as organizagoes econémicas e politicas supranacionais. As avaliagoes do poderio global dos Estados Unidos, na esteira da derro- cada de seu rival soviético, variam enormemente. “Agora é0 momento unipolar”, exulte um comentador triunfalist. “Existe ‘uma tinica poténcia de primeira linha e no hé perspect diato, de nenhuma poténcia que ri do departamento de politica externa dos Estados Unidos responde: “Sim- plesmente nao temos 0 poder, nao temos a influéncia, a inclinagao para usar 4 forca militar. Nao temos dinheiro para exercer o tipo de pressto capaz de prodzir resultados positivos em futuro proximo.” (Ruggie, 1994, p. 553) Tampouco existe acordo quanto a quem, nao sendo os Estados Unidos, tem o poder, a influéncia ¢ o dinheiro para exercer 0 tipo de pressao que pro- duz resultados positivos. Em 1992, Lester Thurow prognosticou que a inte- ‘gragao do Mercado Comum Europeu, em 1° de janciro de 1993, marcaria 0 inicio de uma nova competigéo econdmica, em lugar da antiga competigao entre capitalismo ¢ comunismo, Nessa nova competigio, “[n]a condigao de maior mercado mundial, a Europa estaré escrevendo as regras do comér- cio internacional do século XXI, o resto do mundo aprender a jogar seu jogo econdn semelhante, ver Burstein, 1991, p. 11-12). No entanto, chegado o més de janeiro de 1993, os europeus viram as coisas Por um prisma muito diferente, Escrevendo no Sunday Times de Londres, Martin Jaques descreveu a Europa como “um cont “deve ajustar-se a uma posi em Dicken 102). Quatro anos depois, o proprio processo da integragio péia pareceu corroborar essa visdo mais sombria (conforme citag A escalada dos custos para iF uma popuilagao em processo de envelheciment uuniio monetaria di bras distragao, adiando as sofridas mm Was necessirias para tornar a Europa ‘mais competitiva na economia global. Na pior, elas provocario um retro~ cesso na causa geral da unido européia, criando um: aK contréria a integragao, se a situagao econémica se agravar logo depois da introdugao do euro, (Passel, 1997, D2) A extensio do poderio mundial japonés também nao é clara. A influéncia do Japao na economia mundial parece ter chegado a0 auge pouco antes do colapso da URSS, na esteira da dristica revalorizagao do iene diante do délar norte-americano, arquitetada pelo Grupo dos Sete (G-7) na reunio de 1985 no Plaza. Destinada a conter os déficits comerciais dos Estados Unidos, a va- Jorizagao levou, em ver disso, a uma ascensao aparentemente irresistivel do “dinheiro japonés” nos mercados financeiros e imobilidrios do mundo inte! ro. Os bancos japoneses passaram a dominar 0 rankin nal € os investidores ins norte-americano de fernacio- nais nipdnicos ditaram o ritmo do mercado los do Tesouro, “Na Wall Street e na City londrina, assim como nas mesas-redondas das melhores universidades do mundo, havia ‘uma presenga nova e autoconfiante, que ninguém podia ignorar” (Nakao, 1995, p. 1). Essa presenga autoconfiante, juntamente com a assungio do con- trole de bens norte-americanos de grande valor simbélico, como o Rockefeller Center, a Columbia Pictures, os Seattle Mariners e grande parte do centro de Los Angeles, deram origem, nos Estados Unidos, a “sombrias adverténcias de que as decisdes sobre 0 futuro do pais seriam tomadas em Téquio, ¢ no ‘em Nova York e Washington” (Sanger, 1997a). Os prognésticos anteriores de ‘uma “superpoténcia japonesa emergente” (Kahn, 1970) ou do “Japao como xniimero um” (Vogel, 1979) pareciam estar acertando em cheio no alvo. No breve intervalo de sete anos, entretanto, essas “sombrias adverténcias” pareceram “quase risiveis”. Se tan eses “exerceram pougui controle sobre suas aquisigdes [norte-americanas]” ¢ “levaram um banho de ‘uitos bilhoes de délares na maioria de seus investimentos” (Sanger, 19974). Os prejuizos dos investimentos externos japoneses, decorrentes da variacao das taxas de cambio, foram ainda maiores (Hale, 1995, p. 148). mo resultado desses prejuizos, no inicio de 1990 os pregos despencaram na Bolsa de Valores de Téquio, perdendo quase 55% de seu valor no fim de 1992 Uapan Almanac, 1997). Logo depois do craque de 1990, a invasio do Kuwait pelo Imque deflagrou a crise do Golfo e expis a fra queza politica do Japio, Mesmo quando eclodiu a guerra, no inicio de 1991, 0 govern umir wina postura independente, leranga dos Estados Unidos, 0 Japio parecia ” na era pos- © poder de todas as nagdes estava em declinio, sob o impacto da intensificaglo da integragio econdmica, Isso nos leva a segunda contr O poder dos Estados versus 0 poder do capi A.salva de tiros inaugural do renovado debate sobre a relag§o entre os Estados “Estado na- dada a emer- Dicken, 19925 Ohmae, 1991; Reich, 1992; Barnet e Cavanagh, 1994; Waters, 1995). No intervalo entre esses dois ‘momentos, a expansio das operagdes estrangeiras das empresas multinacio- is disparou um processo de expansio ¢ integragio financeiras globais que ganhou impulso préprio e se tornou a prova mais forte no arsenal dos defen- sores da tese da globalizagao. Segundo Fred Bergsten, quando da reunio do G-7 em Halifax, em 1995, (8 “imensos fluxos de capital privado (haviam] intimidado as autoridades, impedindo-as de qualquer esforgo de se opor a eles”. Depois de citar Bergsten, Erik Peterson se pergunta se existe alguma pos: fluxos ¢ fala em uma “hegemonia vindos a a “competigao pelo ca Imente as empresas comerciais, igdes cada vez. mais rigorosas a pol a até mesmo das maiores nagdes, inclusive os Estados Unidos. a externa e de seguranga eficaz no exter que ponto Washington consegui Voltando a nossa primeira questdo controversa, os defensores d slobalizagao sust mente a Guerra que nao e da «a0 emergente, as agéncias privadas de avaliagao de crédito, como a Moody's Investors Serv alguns comentaristas co raram a das ares, Comentando a queda do valor do: «tise financeira do México em 1994-1995, ‘Thomas Friedman atriscou a hipérbole de que talvez estejamos vivendo outra vex. em um mundo de duas superpoténcias: “Existem os Estados existe a Moody's. Os Estados Unidos podem destruir um pats, arrasando-o com bombas; a Moody's também pode destruir um pais, baixando o valor de seus titulos” (citado em Cohen, 1996, p. 282). A tese da globalizagio, que afirma a perda geral de poder dos Estado: te de forcas econdmicas nao territoriais, supranacionais ou transnaci no deixou de ser contestada, mesmo em suas formas menos exageradas. Pou- ‘cos questionam a magnitude e velox les dos fluxos de capital que atravessam as fronteiras nacion: versivel nas relagdes Estado- Alguns criticos assinalar rho processo de los pelo governo. Além tem ocorrido sob a égide das dow a as quais, por sua ve7, foram propagadas por determinadas nagdes iglaterra de Margaret Visto que 0 apoio e o incer ao processo de glol afirma-se que os Estados verter esse processo, se assim desejarem (para versdes diferentes dessa critica, ver Block, 1990; Sobel, 1994; Helleiner, 1994, 1997; Hirst e Thompson, 1992, izaca elobalizagao possivel ou indesejavel que cla impeto que torna los Estados, dados os custos reversivel ou nao, re 1996, p. 280-293). Alguns chegam a do aumento do poderio dos Estados Unidos. Alids, vétios a do americanismo que se seguiu & derrocada da como a expressio seus aliados mais préximos, como o Conselho de Seguranga da ONU, a OTAN, 0 G-7, 0 Fundo Monetério Internacional (FMI), 0 Banco Internacional de Re construgio € Desenvolvimento (BIRD) e a Organizagio Mundial de Comércio (OMC). Menos amplamente reconhecida, mas também significativa, € a ascen- déncia de um novo r 1 juridico nas transagdes comerciais internacionais, dominadas por escrit6rios de advocacia norte-americanos ¢ pelas concepedes anglo-americanas do direito comercial (Sassen, 1996, p. 12-21; ver também Gill, 1990; Sklair, 1991). : ‘A tese de que a globalizagao reduz 0 poder dos Estados também tem sido contestada por critics que se concentram nos aspectos dle longo prazo desse fendmeno, e que discernem muito déja vu nas pretensas novidades das mu- dangas recentes nas relagdes entre o capital e 0 Estado. Wallerstein chegou a ponto de afirmar que a relagio bésica entre os Estados e o capital permaneceu a mesma durante toda a histéria capitalista, com “as empresas transnacionais (..) mantendo hoje, perante os Estados, a mesma postura estrutural assumida por todos os seus predecessores globais, desde os Fugger até a Companhia Holandesa das Indias Orientais ¢ os industriais oitocentistas de Manchester” (Wallerstein, 1995c, p. 24-25). Mais comum é a afirmagao de que as transfor: ‘mages incluidas na rubrica da “globalizacao” originaram-se no século XIX. * Se as teorias da globalizagao significam que temos uma economia em que to- das as partes do mundo sao ligadas por mercados que compartilham informa- ‘gbes quase em tempo real”, dizem Paul Hirst e Grahame Thompson, “isso nao comegou na década de 1970, mas na de 1870” (1996, p. 9-10) ‘Os mercados financeiros ¢ outros grandes mercados integraram-se muito de perto depois de instalado o sistema de cabos telegricos submarinos in- ternacionais, e de um modo que nio difere fundamentalmente dos merca- dos de hoje, igados por satéltes e controlados por computadores. Na ver~ dade, a diferenga entre uma economia internacional em que as informagoes ido mercado viajam em embarcagdes a vela € outra em que elas sto transmi- tidas pela eletricidade & uma diferenga de tipo. Os comentaristas &s vezes se esquecem de que a economia mundial aberta de hoje nao € tnica, (Hirst e ‘Thompson, 1992, p. 366) Depois de um levantamento dos i describes disponiveis dos mercados financeiros, no fim do século XIX ¢ inicio do século XX, sugerem que eles estavam mais plenamente integrados entao do que tinham estado antes ou do que estiveram depois” (1992, p. 51-52). De fato, no fim dessa onda anterior de globalizagao financeira, em 1920, a Moody's ja avaliava os titulos emitidos por cerca de cinqilenta governos — ‘um niimero que decresceu rapidamente na esteira da Grande Depressio ¢ da Segunda Guerra Mut (assen, 1996, p. 43). Essas analogias entre o perfodo atual de globalizagio ¢ o periodo do fim do século XIX ¢ infcio do século XX levaram algumas pessoas a indagar se a ten- I, € que s6 recentemente voltou a nfveis equipardveis déncia atual para uma economia mundial de mercado nao regulamentada ¢ tao irrefredvel quanto sustentam os defensores da tese da globalizagio. Essa questao foi levantada, recentemente, por uma das principais figuras das altas finangas cosmopolitas, 0 hiingaro George Soros. Comparando a era atual de triunfante capitalismo do laissez-faire com um perfodo semelhante, um sé- culo atras, Soros considerou a fase anterior no minimo mais estavel do que a atual, por causa da influéncia do padrao ouro ¢ da presenga de uma potencia perial (a Gra-Bretanha) disposta a mandar navios de guerra para repioes distantes a fim de manter o sistema. Mesmo assim, o sistema entrou em co- lapso, sob o impacto das duas guerras mundiais e da ascensio interveniente das “ideologias totalitérias”, Hoje, os Estados Unidos relutam em policiar © ‘mundo, “e as grandes moedas flutuam e se chocam umas com as outras co- ‘mo placas continentais”, tornando muito mais provével o colapso clo regime atual (1997, p. 48). Nossa sociedade global aberta carece das instituigdes © mecanismos neces- sitios para sua preservacdo, mas no hé vontade politica que as faca exist. A culpa disso, a meu ver, é de uma atitude vigente que afirma que a busca investita dos interesses pessoais acarretaré um eventual eq ‘onal (.). Do modo como estdo as coisas, nao é preciso muita imaginagao para perceber que a sociedade global aberta, que hoje vigora, tende a reve- Tar-se um fendmeno temporétio. (Soros, 1997, p. 53-54) Em sintese, a fix das altas financas privadas emergiu, sem divida, das cinzas de sua destruigao nas décadas de 1930 ¢ 1940, Mas continua questionével se, sem o apoio de nagies fortes, ela poderd cantar de galo mais eficazmente do que no passado, como fica implicito na idéia de Peterson de uma “futura he- ‘gemonia dos mercados globais’. Igualmente controvertido ésaber se € como a tlobalizagao e a transformacao concomitante das relagoes entre os Estados € 0 ico € econdmico dos grupos subalternos. ‘Uma tese-padrao d latilidade geogréficas crescentes do capital est8o criando um: ra 0 fundo do poco” nos sakitios e nas condigdes de trabalho, & medida que 0s trabalhadores do mundo sio levados a competir em um Gnico mercado iteratura sobre a globalizagao é que a n de trabalho. Embora os trabalhadores dos paises de baixos salérios ps jidade do capi: tal produtivo e financeiro tora realista e palatavel, por toda parte, a ameaga da “fuga de cay (0 resultado é um declinio global na capacidade de os trabalhadores protegerem e promoverem seus interesses (ver, entre outros, Frobel et al, 1980; Godfrey, 1986, p. 28; Ross e Trachte, 1990; Brecher, 1994/ 1994, p. 365-373; Appelbaum, 1996). yrda em que os trabalhadores vém enfrentando um “re- ‘trocesso devastador” na tendéncia secular & ampliacio de seus direitos, iniciada ‘em meados do século XIX. Mas, em vez de ligar diretamente o enfraquecimen- into da competigao econdmica global, ele enfatiza 0 papel intermediario desemp pelo impacto da globalizagio na capacida- io a globalizagdo como “um aumento do alcance geo- ‘grifico de interacdes sociais de importancia local, especialmente quando esse Ficativa de todas as interagdes que cruzam os (para uma definisao semelhante, beneficiar-se temporariamente dessa competigao, a hi ‘ver Giddens, 1990, p. 64), ‘ilénio (nos séculos XIII, XVI, XIX € no final do século XX). Em seguida, com- para o impacto que a atual onda de globalizagao causou sobre a capacidade com 0 impacto causado pela onda anterior, oc juanto, durante o século XIX, 0s Estados (a rigor, 0s Estados, 05 fluxos ¢, por consegui 0s direitos dos trabalhador medida que 08 direitos dos trabalhadores, mas todos os direi Thanga dele, John Markoff considera 0 poderio crescente das entidades trans- nacionais como um grande desafio & democracia, “Embora, em meados da década de 1990, haja mais pessoas vivendo sob governos nacionais que po- dem, com certo dit Iquer outra épo- © poder real dessas agradar 0 Fundo Monetitio Internacional quanto em seduzir 0 eleitorado”. Para Markoff, “no mundo emergente do proceso decis6rio transnacional o desafio de recriar a democracia s6 pode ser enfrentado pela organizagio de ‘movimentos democraticos tran: is capazes de arrancar “concessdes dos novos donos do poder transnacional” (Markoff, 1996, p. 132-135). Tilly con- corda quanto a direcao da solucdo, porém € mais pessimista, pelo menos curto prazo, quanto & pos le de isso acontecer (1995, p. 22) ‘Aafirmagao de que o enfraqueci imordial da debilitagdo do trabalho e da democraci ada sob diversas ale- gages, que slo paralelas aos debates examinados na seco anterior. Ha quem argumente que a atual organizacao da economia internacional € um efeito construido de negociagdes e contlitos politicos, e nao uma forca independen- te. O “alto grau de liberdade [atual] dos fluxos um aspecto necessrio ¢ inevitavel de uma economia mundial”. Se a politica poderosos se alterar, a globalizagao poderd ser revertida |. Vista por essa éptica, a retérica da globalizagao enco- bre a ‘esponsabilidade empresarial pelas dispensas macicas de trabalhadores (Gorden, 1996, p. 200-203) ou a responsabilidade governamental pela maciga 10 de beneficios do trabalho para 0 capital (Tabb, 19975 ver tam- 1995; Block, 1996), Outros tém contestado a ligagdo causal que relaciona Estados enfraqueci- itados, questionando até que ponto estamos em enunciou sua afirma- ‘0 de que a relagao bisica entre os Estados ¢ o capital permaneceu inalterada ia resposta direta d afitmagao de Tilly de as transna- fernacionais de capital nao zado a politica econdmica nacio pel IX (Zolberg, 1995, p. 33-34). Para Zolberg, 0 enfraquecimento do trabalho nio é a “variével’ dente, mas sim a independente, na explicagao do atual ambiente global 40 trabalho, Baseando-se em Polanyi cionais de uma economia de e de desastres, 5 movimentos de autoprotegao (sobretudo movimentos tra~ eres da ordem guerra cri Woods, que nevoléncia sem precedentes” no plano global. Mas esse proj 8 Pt ‘enevoléncia foi criado em resposta ao poderio social sem precedentes dos tra- balhadores dos paises ocidentais no fim da Segunda Guerra Mundial (Zolberg, gime firma Zolberg, mas ao enfraquecimento estrutural da propria classe traba- Thadora com o advento da “sociedade pés-indust Assim como o advento do capitalismo ind dda formacao social caracter rabalhadores” a cujas fecendo rapidamente. Hoje, uem uma espécie residual em extingao. (Zolberg, 1995, p. 28) ‘Apesar de sua discordancia quanto as causas Tilly ¢ Zolberg concordam em que 0 trabalho vem sendo enfraquecido. Mas essa afirmagio expressa a di- lagio entre a formagao das classes ¢ as global (van der Pijl, 1984; Cox, 1987; Gill, 1990, 1993; Mittelman, 1997; Hettne, 1995; Rupert, 1995; Mittelma 1996). A maior parte dessa literatura concentra-se na formasao de uma classe capitalista transnacional com sua propria consciéncia estratégica de classe. Em sera, esse processo € interpretado como vernos nacionais e as organizagdes trabalhistas. Mas os esforgos ¢ as atividades npondo novas restrigbes aos go- ges impostas ao capital por movimen tal como Zolberg, alguns desses est ¢ Mittelman, 1997) invocam a afirmagao de Polanyi de regulado- cos de itavelmente, a contramovimentos globais es} estabelecidas. Div de Zolberg, porém, eles véem esse contramovimento entrar em agdo do capitalismo do laissez-faire dos também como resposta i tentativa de ressuscité-lo na década de 1980. Pela explicagao do proprio Zolberg, foram precisos sessenta anos — da dé- ro plano da econom le que as respostas (clo contramovimento) a atual revivificagao do roduzam resultados compariveis no nivel global, dentro de vinte que, em ae dos de 1997, havia p 1a com ideas nebulosas” sobre com de governo em treze das quinze nagdes da Unido Européia? UA questo de a globalizasio estar ou ndo reduzindo o poder dos grupos su palternos torna-se ainda mais controvertida quando ampliamos nosso zonte para além dos paises ricas do Ocidente, em cuja experiencia baseia quase exclusivam Zolberg. Vitios estudos con- trastaram o declinio da ricos, em processo de desindu: ricagio da (Seidman, 1994) em pafses menos ricos, mas em répido processo de industria- lizago, como o Brasil, a Africa do Sul e a Coréia do Sul (ver também Silver, 1995; Evans, 1995, p. 227-229; Markoff, 1996, p. 20-31; Moody, 1997). Num espirito semelhante, Lourdes Ben que as atuais transformagbes da organizagao ‘os direitos, 20 mesmo tempo ei que 0s a (0 stirgiram novos movimentos trabal mo onde gragdo das mulheres da zona rural para o emprego na indistria (nas zonas de produgao para exportagio] pode promover seus di oma dividuais € iarcais opressivas” (Beneri p48; ver também Li 1987). Além disso, a criagao de um merca- 2s “pressbes pelo reco- hecimento dos direitos dos trabalhadores” em foros como as negociagoes da Rodada Uruguai (Benerfa, 1995, p. 48). vel se, e até que ponto, os direitos dos trabalhadores € 10 tempo € no esp: ert levado a cres teve por premissa a excl 1s e beneficios. A amy meio de uma estratégia de cooptagio. Ofereceu-se um pacote triplice — nacionalismo (das nagdes e do mesa do “desenvolvimento econdmico” no mundo nao ocidental. Permitir que o mundo ndo ocidental “ficasse com uma fatia do bolo era caro de- ss centenas de milhoes de trabalhadores ocidentais e, ainda assim, tornar o sistema lucra- tivo, Mas, caso se admitisse a entrada de varios bilhdes de trabalhadores do Terceiro Mundo, nao restaria nada para uma nova acumulagdo de capital” (Wallerstein, 19956, p. 25). Na década de 1970, de fato, ficou claro que o capitalisme mundial nao aco- Iheria “as demandas conjuntas do Terceiro Mundo (de relativamente pouco por pessoa, mas para muitas pessoas) e da classe trabalhadora ocidental (Para rente poucas pessoas, mas de muito por pessoa)” (Wallerstein, 1995c, p25). A tendéncia para redistribuigao e igualdade crescentes foi interrom- pida, Estio sendo tragados novos divisores de classes que, segundo a previsio de Wal ccntrais. mais para a economia mundial capitalista. Podia-se acolher va stein, itfo superpor-se cada vez mais 208 di is nos paises Na Europa e na América do Norte, teremos estruturas socials (..) em que 1 “classe trabalhadora” sera desproporcionalmente composta de trabalha~ ores nao brancos, provavelmente colocados fora das estruturas sindicais te, até mais provavelmente, sem direitos politicos ¢ sociais bésicos. Ao mes- to tempo, os filhos € netos dos atuais membros dos sindicatos serdo da “classe média” — talvez sindicalizados, alguns saindo-se bem, outros nem tanto (c, por isso, mais propensos a se engajar na politica de direita). (..) ‘os voltado A situagio pré-1848, uma situacio em que, dentro dos do Estado liberal, (..) 08“trabalhadotes” sero mal pagos ¢ ficario fora do ambito dos direitos politicos e sociais. Os trabalhadores oci- dentais ter-se-do tornado, mais uma vez, as “classes perigosas”, mas a cor de sua pele teré mudado, a luta de classes serd uma luta racial. O pro- bblema do século XX1 sera o problema do divisor da cor. (Wallerstein, 1995¢, . 26-27, rifo no original) equilibrio mutavel do poder civilizador [A previsio de que “o problema do divisor da cor” seré 0 problema do proxi- mo século foi feita pela primeiza vez por William E. Burghardt Du Bois, em 10 (Du Bois, 1989). A previsio de Du Bois dizia respeito & futura revolta das “ragas mais escuras” da Asia e da Africa contra as “racas mais claras” do Oci- dente, que acabara de concluir a conquista militar do mundo. “Foi”, nas pa- lavras de Geofirey Barraclough, “uma profecia notavel”. ‘Quando se inaugurou o século XX, o poderio europeu na Asia e na Africa a0 que parecia, seria capaz de enfrentar Sessenta anos depo re 1945 e 1960, nada a superioridade das ai restavam apenas vestigios da dominagao européia. menos de quarenta pafses (..) rebelaram-se {guistaram a independéncia, Em toda a histria humana, nunca antes sera uma reviravolta tio revolucionéria com tamanha rapidez. A mudanga w situagao dos povos da Asia e da Africa e em suas relagbes com a Europa foi o sinal mais seguro do advento de uma nova era, Quando a histéria da primeira metade do século XX — que, para a maioria dos historiadores Finda € dominada pelas guerras européias € pelos problemas europeus — (vier a ser escrita em uma perspectiva mais longa, nao ha dvida de que Neahum tema isolado se revelaré mais importante do que a revolta contra 0 Ocidente. (1967, p. 153-154) No esquema de Wallerstein, impacto dessa revolta foi neutralizado, na era da Guerra Fria, pela promessa de um “emparethamento” generaliza~ ddo com os padres ocidentais de riqueza e bem-estar. Mas o fracasso da ex- periéncia de modernizagdo ver criando condigbes para uma retomada da revolta, sob a forma de uma luta de classes “racializada” nos préprios paises ricos do Ocidente. Partindo de premissas completamente diferentes, Samuel Huntington (1993, 1996) também prevé uma nova revolta contra o Ocidente, sob a forma nio de uma luta de classes racializada, mas de um “choque de ivilizacoes", causado pelo sucesso da modernizagao em empobrecer pelo me- nos alguns povos e governos das civilizagBes nao ocidentais. Para Huntington (1993, p. 39-40), assim como para Fukuyama, a Guerra Fria terminou com uma vit6ria incontestavel das principais nagdes do capita~ ismo ocidental, antes de mais nada dos Estados Unidos. Diversamente de Fukuyama, entretanto, Huntington ndo antevé uma vitéria final da democra- ia liberal ocidental. Ao contrario, vé a quase absoluta dominagto ocidental sobre as instituigoes internacionais como 0 inicio de uma nova fase na evo- lugéo do conflito no mundo moderno. Desde a Paz. de Westfalia, ele diz, os conflitos entre as nagoes foram primordialmente confitos internos & civilizagio ocidental “guerras civis ocidentais", como os chamou William Lind. Iso tanto se aplicou 3 Guerra Fria quanto as guerras mundiais eae guerras anteriores dos sé fos XVI e XVIIL. Com o fim da Guerra Fria, a politica internacio: 0 de sua fase ocidental e seu centro passa a sera interagao das ‘endo ocidentais, assim como das civilizayses nao 0c! igton, 1993, p. 22-23) (Os conflitos entre civiizagdes surgem, em parte, porque a dominagio 0% dental sobre a economia politica do planeta fomenta o ressentimento, ainda ‘mais quando ela se torna vetculo de propagagao dos interesses, idéias¢ valores jdentais. Mas a forga mais importante por trés do futuro choque das civi- Tizagdes é a mudanga no equilibrio de poder cvilizador causada pela moder- nizagio continua do mundo no ocidental. Huntington nao interpreta essa tendéncia como algo que represente uma ameaga imediata a dominagao do Ocidente. Nao obstante, destaca “a expansio continua do poderio militar da China e de seus recursos para criar poderio militar” como sendo “[d]e im- portancia central para o desenvolvimento de capacidades militares contra Ocidentais”. Vista em conjunto com a disposicdo chinesa de exportar armas fe tecnologia armamentista para paises do Oriente Médio, essa tendéncia € percebida como capaz de criar uma “conexao confuciano-islamica” que pode representar tum sério desafio & dominagio ocidental. Para enfrentar 0 desafio, Huntington defende uma triplice estratégia ocidental, destinada a conter €, eventualmente, conciliar © poderio crescente das civilizagBes mio ocidentais: (1) maior cooperacao e unio no Ocidente; (2) manutengao da capacidade militar ocidental, como se a Guerra Fria néo houvesse terminado; € (3) maior atencio para com os pressupostos religiosos ¢ filoséficos subjacentes as outras civilizagdes (Huntington, 1993, p. 26, 40-41, 47-49). ‘A tese de Huntington foi submetida a uma saraivada de criticas, voltadas tanto para a natureza mal definida dos constructos analiticos em que se ba- scot quanto para o perigo de que suas previsdes se transformem em uma Pro- fecia auto-realizadora (para algumas respostas iniciais, ver Huntington et al, 1993; para uma resenha critica do debate, ver Alker, 1995). Como observou John Ikenberry, a imagem de uma civilizagao ocidental que “nos” separa do ‘jesto” proporciona tum substituto ideolégico, pronto ¢ facil de apreender, para a “liga” que manteve unida a alianga do Atlantico na era da Guerra Pria. “Assim como a alianga era apresentada, durante a Guerra Fria, como um re curso de defesa contra a agressto comunista, também sua renovagio é hoje apresentada como um recurso de defesa contra um futuro choque das civiliza- ses, movido pelo sucesso da modernizagao chinesa. Mas, “para outras potén- {ias como a China eo Japa, o fechamento do cerco das caravanas ocidentais se assemelharé a declaragao de uma nova Guerra Fria” (1997, p. 163). Essa significativa para os interesses norte-americanos ¢ ocidentais, ou, se represen- tar, haverd outros meios mais eficazes ou mais desejave ga do que declarar uma nova Guerra Fria contra um 1a diz que a modernizagio chinesa ndo representa uma ameaga de enfrentar a amea- jutro” mal definido. Mas é precisamente quanto a essas duas questdes que 0s observadores ¢ ana listas mais se dividem. Para alguns, a ameaga trazida pelo sucesso da moder- nizagao chinesa nos tltimos anos é muito maior que a do comunismo chinés na época da Guerra Fria, A ironia das relagdes sino-americanas € qt jugo do maoismo ideoldgico e exibia tamanha ferocidade ideotogica que os norte-americanos a julgavam perigosa e ameagadora, ela era, na verdade, tim tigte de papel, fraco e praticamente sem influéncia global. Agora que w'China liveou-se dos arreios do maoismo € embarcou em uma trajetéria ‘de desenvelvimento econdmico e comércio global, els parece Frenos ameacadora, mas, na verdade, esté conquistando meios para respal- dar suas ambicées e interesses globais com um poderio real. (Bernstein e Munro, 1997, p. 22) Para outros, o verdadero “tigre de papel” é 0 “milagre econdmico” do Leste dda Asia, do qual 0 milagre chinés € o episddio mais recente. Para Paul Krug- nan, o mais vigoroso defensor dessa afitmaglo, o fato de a expansio econd- mica do Leste da Asia, durante a década de 1980, haver dependido de investi- rmentos pesados ¢ grandes deslocamentos de mao-de-obra das fazendas para as fabricas, e nfo de ganhos de produtividade, fez com que ela se assemelhasse a expansto econdmica das nagbes do Pacto de Varsévia na década de 1950. “Da perspectiva do ano de 2010, as atuais projegoes da supremaciaasiética, ex: trapoladas a partir das tendéncias recentes, podem parecer quase to tolas quanto foram as previsoes feitas na década de 1960 sobre a supremacia indus trial soviética, pela perspectiva dos anos de Brejnev” (Krugman, 1994, p. 78) ‘Mas ui estudo do Banco Unido da Suiga (BUS) constatou que “o cresci- mento médio de 8% sobre a receita anual, exibido por diversas economias da ia [oriental] desde o fim da década de 1960, € Unico nos 130 anos de hist6- ‘econdmica registrada” (Banco Unido da Sufga, 1996, p. 1). Além disso, 1 que distingue mais claramente a expansio econdmica do Leste da Asia, na década de 1980, da expansao das nagoes do Pacto de Varsévia na década de 1950 é o avango extraordinério do primeito nas financas globais. A participa fo japonesa no pa total dos cingienta maiores bancos mundiais, se- igundo a revista Fortune, subiu de 18% em 1970 para 279% em 1980 ¢ 4896 em 1990 (Ikeda, 1996). Quanto as reservas de divisas, a quota do Leste da Asia centre os dez maiores bancos centrais subiu de 10% em 1980 para 50% em 1994 (Japan Almanac, 1993 ¢ 1997). Entretanto, os que levam a sério 0 milagre econdmico do Leste da Asia dis- cordam vivamente quanto ao tipo de ameaga, se & que existe, que ele repre- senta para os interesses norte-americanos ¢ ocidentais. A visio mais influente, expressa por Joseph Nye em um relatério que ele supervisionow do Departa- mento de Defesa e em um ensaio corroborative, concorda com Huntington can que, em siltima instancia, a ameaca é militar, eem que a expansio econd- mica da China € o acontecimento mais preocupante da era pos-Guerra Fria, ‘nga de Huntington, a principal receita politica de Nye € manter a capacidade militar norte-americana em geral ¢ sua presenga no Leste da Asia A semell gagao de superestimarem grosseiramente a capacidade chinesa de se equiparar a0 poderio naval ou aéreo dos Estados Unidos em futuro previsivel (Nathan ¢ Ross, 1997). Em termos mais fundamentais, Chalmers Johnson ¢ E, B. Keehn 1995) denunciaram que a andlise ¢ a solugdo propostas desconsideram que a do poderio militar tem declinado visivelmente como fonte de poder ‘Na opinido deles, depois de Hiroshima ¢ Nagasaki, 0 poderio militar norte-americano na regio teve um rendimento rapid: acabou por se tornar irrelevante, Os Estados Unidos, “quando muito, chegaram a um empate na Guerra da Coréia ¢ perderam a do Vietnam”. Em época mais recente, o fechamento das duas maiores bases norte-americanas no exterior, a Base Aérea Clark ¢ a da Baia de Subic, nas s, “no pro- ‘duziu nem mesmo um tremor de instabilidade”, enquanto “[o] regime mais codioso da Asia no apés-guerra, o do Khmer Vermelho de Pol Pot, no Cam- boja, nao foi eliminado pelos norte-americanos, mas pelos com nnamitas” (1995, p. 103-104, 111). ‘A medida que minguou 0 poderio ano, 0 poder €co- ndmico do Leste da Asia aumentou, A militancia comunista e nacionalista na regio, que foi instigada pelo mi arismo dos Estados Unidos, comegou a ismo nativo, “Embora os norte-americanos se finjam de confiantes, seus filmes, pelo rock, pelas calgas jeans ¢ pelos hambargueres do McDonald's significa que os Estados Unidos continuam a ser seu modelo, essa batalha in lectual esté encerrada. Ha alguma versio de capitalismo asiético no futuro da ‘maioria das nagbes” (Johnson e Keehn, 1995, p. 112). Segundo David Howell, presidente do Comité de Assuntos Exteriores da Camara Baixa da Gra-Breta. noha, até na Europa a “coca-colonizagao € coisa do passado”. As vésperas da crise financeira de 1997-1998, que fez estourar a bolha do entusiasmo ociden- ‘com 0s modelos econémicos do Leste da As A questao, hoje em ) nao € a ocidentalizagio do Oriente, mas a ‘Os europeus discutem agora cor io financeiro da Asia, a fim de escorar suas ce estabelecer aliangas com os novos gigantes ‘A influéncia das civilizagdes orientais sobre os europeus foi, é claro, 0 que moderno, hi cerca de quinhentos anos. Como assinalou William McNe} tese de Huntington é que ela desconsidera dois fat izagoes contemport ‘mesmo através de longas distancias”. © outro € fos empréstimos ¢ adaptagbes miituos, propagados por esses ram-se cada vez mais difundidos e importantes na ampliagio d: poder humanos. ‘Numa época em que cada uma das grandes ci va mini grande problema da liagoes asiéticas procura- mizar os contatos perturbadores com os estrangciros, 0s europeus lutar entre si, ao mesmo tempo em que exploravam 0 resto, ym uma ganancia avida e irrequieta de lucros materiais ¢ tam- ielectual. Como resultado, © Ocidente se expandiu (McNeill, 1997, p. 19, 21) proprio McNeil) em outro contexto, essa expansio € trans- tas dé Ocidente inseriram-se em um “ciclo auto-refor- ar [européia] sustentou ¢ foi sustentada pela expansio econdmica € politica, & custa de outros povos ¢ so- 143). Embora esse ciclo tenha sido rompido pela era metade do século XX, muitas das estru- turas conceituais com que procuramos aprender o mundo presumem tacita- mente que esse ciclo ainda esté em vigor. Essa, na verdade, talvez seja uma das raves por que nos parece tio dificil idemtficar a(s) direcao(es) da mudanga na economia politica global contemporanea. Como disse Janet Abu-Lughod (1999, p. 281-282), nos fixado tanto em “estudar a persisten- cia ¢ a evolugdo do sistema mundial 'moderno’, que ficamos despreparados para compreender 0 que intuimos como sta possivel ruptura, ou, pelo sua transformagio radical” ‘Ao concluir seu estudo sobre a asc revolta contra 0 Ocidente na io e queda do sistema de comércio mundial afro-curasiano do sécu ‘Abu-Lughod sugere que 0 declinio do poderio militar norte-americano na década de 1970 e inicio da de 1980, assim como a ascensdo simultinea do poderio econdmico do Leste da Asia na dé- cada de 1980, talver sejam um sinal de que “as antiges vantagens subjacentes a hegem gem, 1m jogador isolado tem uma vantagem espetacular”, imaginar” a superagdo da supremacia ocidental por uma nova fo Antes is provivel que haja um r ccentros los que era exibido pelo sisters isso requet na mudanga para outras regras do jogo, ov, pelo 0 fim das rege 1989, p. 370-371) roduzidas pela Europa no século XVI. (Abu-Luighod, ‘Abu-Lughod nao diz quais seriam essas regras nem quem as formularia € imporia. Pouco depois de ela terminar seu livro, o muro de Berlim caiu, vando a afirmagées contradit6rias de que as novas regras seriam formuladas ‘em Washington ou Braxelas, ou em Téquio, ou no sigilo das salas de diretoria ‘das empresas, das redes eletronicas silenciosas e dos mercados barulhentos, até que apareceu Huntington, conclamando ao cerco pelas caravanas ociden- tais, para que o Resto, sob a lideranga chinesa, nao viesse a fazer com o Oci- dente 0 que o Ocidente vinha fazendo com o Resto, Enquanto esperamos a pocira baixar, a sugestdo de Abu-Lughod de que o futuro podera ter certa semelhanga com um passado pré-moderno um palpite tao bom como qual- ‘quer outro. TRANSICOES HEGEMONICAS: CONCEITOS PARA ANALISE Parafraseando Hobsbawm, parece haver pouco consenso a respeito de qual- quer coisa, exceto o fato de que uma era da historia se encerrou. Nao ha con- senso quanto a qual das nagies, se € que ela existiu, beneficiou-se mais da Guerra Fria ¢ esta agora em condigao de substituir os Estados Unidos como jogador dominante na economia politica global. Nao ha consenso quanto a0 fato de a proliferacio da variedade e do ntimero de empresas multinacionais, €.a formacao de mercados financeiros globais estarem das nagoes ¢, nesse caso, com que generalidade e permanéncia. Nao hé con- senso em matéria de a classe trabalhadora do mundo ser ou nfo uma espécie em extingio, ou estar simplesmente mudando de cor e de pafses de residén- cia. Nao ha consenso em termos de a modernizagao estar erguendo divisores centre as civilizagies, desfazendo-os ou restabelecendo 0 equilibrio de poder I dos tempos pré-modernos. Acima de tudo, nao ha consen. 80 quanto ao tipo de ordem mundial, se € que haverd alguma, que podemos esperar que brote da combinacao de quaisquer mudangas que estejam real- ‘mente ocorrendo na contiguragao global do poder. inando a capacidade intercivilizaci As transigoes hegeménicas como mudanga sistémica Podemos tomar a falta de consenso quanto a diresio e ao sentido das atuais a global como um sinal de que estamos em meio a uma mudanga sistemica — ou seja, um processo de reorganizagio ra dical do moderno sistema mundial «| dos integrantes do sistema, sua mudangas na economia pi altera substantivamente a natureza ra de se relacionar uns com os outros, 0 modo como o sistema funciona e se reproduz. Nas épocas de mudangas sistémicas, como assinalou Abu-Lughod, “pequenas situagbes localizadas po- dem interagit com as adjacentes, criando resultados que de outro modo talvez no ocorressemi; 0s grandes distirbios as vezes causam certo alvorogo ¢ aca- ‘bam, enquanto os pequenos podem, vez por outra, ampliar-se impetuosa- mente, dependendo do que acontece no resto do sistema”. A ldgica de que “a mesma causa produz os mesmos efeitos”, subjacente a boa parte de nossa reflexo sobre o mundo, ¢ imprépria para aprender esse tipo de mudanga e, em ver dela, deveriamos buscar inspiracao na “teoria do caos” (1989, p. 369). Num espirito semelhante, Rosenau recorre a linguagem da teoria do caos ao conceituar as atuais mudangas na economia politica global como uma “bifurcagio” — termo cunhado hé quase um século por Henri Poincaré para designar o surgimento de diversas solugbes a partir de uma dada solugao, em sistemas de equagdes diferenciais (Bergé, Pomeau e Vidal, 1984, p. 271). Ao evocar essa imagem, ele sublinha que a ordem que acabari emergindo da atual turbuléncia da politica mundial nao est inscrita nos parimetros da or- dem que foi rompida. Mas também assinala que hé uma ordem no caos. Assim como os fisicos usaram 0 conceito de bifurcagio “para desvendar a ordem inerente & ruptura dos padrées estabelecidos”, também nés devemos nos esforcar “por desvendar os padrdes subjacentes do mundo aparentemente que emergiu para rivalizar com o mundo centralizado nos Es- tados” (1990, p. 58). Nossa investigngao procurow indicios do que poderiam ser esses padrdes subjacentes na atual turbuléncia, descobrindo padrées assim em situagdes comparaveis de mudanga sistémica no passado. O resultado é uma histéria da expansio do sistema mundial moderno até suas atuais dimensées globais, atra- vés de uma série de reorganizagdes fundamentais. Essas reorganizacoes ocor- Teram em periodos de transigio hegemOnica, definidos como momentos de mudanga do agente principal dos processos mundiais de acumulagao de capital € das estruturas politico-econdmicas em que tais processos esto insetidos. A formagio e expansio do sistema mundial moderno, portanto, sao conce- bidas como seguindo nao uma trajetéria tinica, estabelecida ha quatrocentos hentos anos, mas passando por diversas mudangas para novos trilhos, instalados por complexos especificos de Srgios governamentais ¢ empresa- Tiais. Tomando emprestada uma expresso de Michael Mann (1986, p. 28), x0 britanico do século € 0 complexo norte-americano do século XX — como “veiculos instaladores de trilhos” (cf. Taylor, 1994, p. 27). funcionay Ao conduzirem o sistema por uma nova direcio, eles também o transforma- ram, Sob a lideranca holandesa, o sistema emergente de Estados europeus foi formalmente instituido pelos is de Westfalia, Sob a lideranga britanica, © sistema eurocéntrico de Estados soberanos avangou para uma dominagio global. Sob a liderat sma perdeu seu 1ou mais alcance e penetragao (Arrighi, 1990b, 1994; Hopkins, 1990), particular e a transformacio sisté mitante sio atributos igualmente essenciais do conceito deheg mundial nossa investigagao, Como assinalou John Ruggie (1983) em nacional de Kenneth Waltz ‘ou mesmo a de Wallerstein, sio te-americana, 0 si (1979), as teorias sist corretivos importantes da falicia prese pelo estuco de suas partes. Cada todo te des sistémicas”) que funcionam, ceadora ¢ ordenadora sobre as unidade sistemas em si, portanto, sio “produtivo cessos rio (conforme car 0 equilibrio, entretanto, as teorias sistémicas podem facilmente ir longe de- mais e conceber 0s processos no nivel unitério como sendo produtos, todos eles, € no produtivos 10 uma forga cer- we 0 compoem”. Os ,€ nlo apenas o “produto” de pro- © problema da postura de Waltz & que, em qui pria mudanga estrutur 05 processos no nivel unit Waltz também torna exégena a fonte uer sistema social, a pré- at da: mudanga sistémica *sociedade” ci logica reprodutiva, mas nao uma légica transformacio: . 285, gifo no original; ver também Keohane e Nye, 1987) A critica de Ruggie & concepgio de politica internacional de Waltz também pode ser ralmente, & concep¢io wallersteiniana da hegemonia istema moderno de Estados soberanos. De acordo com essa concep¢io, permanente ent {que uma poténcia é realmente p) empresas iadas em outras grandes poténcias do mercado em geral, como também, especificamente ¢ em iniimeros casos, nos merea- dos internos das prdprias po 984, p. 38-39) ‘Em todos os trés casos — sgemonia é efeto de longos sulta] em uma concer curso dessas expansBes comp: decisiva de superioridade, comércio e, por idamente conquistada a 8 a 1648, as Guerras Napoledr ras eurasianas de 1914 a 1945, “A vantagem econémica do vencedor € am- pliada pelo préprio proceso da guerra, ¢ 0 acordo do apés-guerra entre as s6es destina-se a consolidar essa vantagem maior ¢ protegé-la do desgaste (Wallerstein, 1984, p. 39-44). Bsse acordo do apés-guerra consiste em uma ou lagio dos fatores por toda a economia mundial”. O li- pois torna mais dificil para a nagao heg “a disseminagio da capacidade tecnol6gica” entre as nagGes rivais. Além disso, acumulagao lobal” implica “a elevagéo furtiva da renda real das camadas trabalhadoras € dos quadros dirigentes situados na nagao hegeménica”. Com o correr do tempo, essas duas tendéncias solapam a vantagem comps sas da nagao heg Com isso, o sistema r RIVALIDADE. HEGEMONIA RIVALIDADE Expansio > competiva ee aie Bue S84 Ze BESe a2 b2eSa fe Auhs \4 au ii 4a $3 OUR a Te cly ally a SFacge e dirgentes da ‘naglo hegeménica tum climax Figura 1, O cielo hegemdnico de Wallerstein. faz a Waltz, ou seja, a de que torna exdgena a fonte éiltima da mudanga si témica. Os complexos particulares de Orgios governamentais ¢ empresariais tornam-se hegeménicos no decorrer das expansdes competitivas em virtude da eficiencia de suas agoes, comparadas as de todos os outros complexos vvais. Mas os atos relativamente eficientes so um mero reflexo das propri dades estruturais do sistema capitalista mundial, no qual ndo tém nenhum impacto. Todos eles sa0 produtos, e nao produtivos, Se € até que ponto os processos de nivel unitério — como a formagio de determinados complexos de drgios governamentais ¢ empresariais ¢ sua agio —‘implesmente cumprem um roteiro ditado por propriedades de nivel si ‘temico, ou se eles mesmos escrevem esse roteiro ¢, com isso, formam ¢ trans- formam o sistema, é uma questao que, emi iltima andlise, s6 pode ser decidida no plano empfrico-hist6rico. Alids, Foi com base nisso que consideramos falho ‘© modelo de Wallerstein. & que nossa investigagio revelou que a ascensio das rages hegemdnicas no mundo moderno nao foi um mero reflexo de pro- riedades sistémicas. As propricdades sistémicas agem, de fato, como forgas coercitivas ¢ ordenadoras na escolha dos Estados que se tornam hegeménicos. ‘Mas, em todos 0s casos, a hegemonia também implicou uma reorganizayio fundamental do sistema e uma mudanga de suas propriedades. ‘As hegemonias mundiais como lideranga e governo sistémicos Tal como um mimero crescente de estucliosos da politica e da sociedade mun- diais (ver, entre outros, Cox, 1983, 1987; Keohane, 1984a; Gill, 1986, 1993; Gill ¢ Law, 1988; Rupert, 1995; € Robinson, 1996), derivamos nosso conceito dde hegemonia da idéia de Antonio Gramsci de que a supremacia de um grupo soci “dominagao" e como “lideranga ‘mina grupos antagonicos que tende a “liquidar” ou subjugar, tale até pe~ la forga armada; ele p. 57-58) Enquanto a domin: apresentar-se como portador cle um interesse geral e de ser percebido assim. E verdade que o Estado 6 visto como instr voltado para criar condigaes favoraveis pai po. Porém, o desenvolvimento ca expansio do grupo p. dle um desenvolvimento de todas as 1971, p. 181-182) ", (Gramsci, A hegemo: ferente dela: tude de nas atende aos interesses desse grupo dominan pelos grupos subalternos como servindo a um interesse mais getal. Bo inverso da idéia de “deflagao do poder”, usada po t Parsons para designar as situages em que 0 controle governamental nao pode ser exercido, a nao ser pelo uso difundido ou pela ameaga de uso da forca. Quando os grupos subor- dlinados confiam em seus governantes, os sistemas de dominagio podem ser regidos sem recorrer a forga. Mas nao conseguem fazé-lo quando essa con- fianga diminui (1964). Por analogia, pode-se dizer que a idéia de hegemonia de Gramsci consiste na “inflagao do poder” que decorre da capacidade de os grupos dominantes apresentarem sua dominagio com credibilidade, como algo que atende nao apenas a seus interesses, mas também aos dos grupos subordinados. Quando falta essa credibilidade, falamos de “dominagéo sem hegemoni Enquanto falamos de lideranga no contexto nacional, como faz Gramsci hé pouca ambigdidade quanto a0 fato de que a sociedade como um todo, tal como definida pela jutisdigao de um Estado particular, € conduzida em uma direcio que amplia 0 poder do grupo dominante, Mas, quando falamos de lideranga em um contexto internacional, o termo € usado para designar dois fendmenos muito diferentes. Por um lado, ¢ empregado para designar o fato zagdes, um Estado dominante torna-se 0 “mo- propria via de portanto, é mais do que « dominagdo pura ¢ ler adicional que compete a um grupo dominante, em -apacidade de conduzir a sociedade em uma diregdo que n3o ape- mas é também percebida 1995). Isso pode aumentar o prestigio e, por conseguinte, 0 poder da nagdo (Taylor, 1996). Mas, na medida em que essa imitacao obtém al- {gum sucesso, ela tende a contrabalangar — e, portanto, a deflacionar em vez de inflacionar — 0 poder da nacio hegemdnica, fazendo surgir concorrentes @ reduzindo o “cardter especial” que ela tem ( 1981). Essa “lideranca ‘como a chamaremos, tomando emprestada uma cexpressio de Joseph Sel sempre presente nas situa bes hegemdnicas, mas por si s6 no {uago como hegemonica. Por outro lado, o termo lideranga € usado para designar o fato de que uma nagao dominante conduz o sistema de nagdes em uma diregao desejada e, a0 fazé-lo, ¢ largamente percebida como buscando um interesse geral. A lideran- ga, tomada nesse sentido, a adotare! teresse ger venta o poder do Estado dominante ¢ é 0 que como caracteristica d as hegemonias is dificil de definir no plano de um dos soberanos do que ‘ aumento do poder de uma nagéo perante outras é um componente impor- sma medida da busca bem-sucedida de um interesse i, 0 poder, nesse sentido, nao pode aumentar para 0 (0 interesse geral do sistema como um todo, no obstante, pode ser iden- tificado em se teformulando em uma perspectiva dos sistemas mundiais a dis- 1 0s aspectos “distributivos” e “coletivos” do poder. Os aspectos distributivos do poder referem-se a um jogo de soma zero no qual ‘um agente s6 pode adquirir poder se outros 0 perderem. A definigio de poder ‘de Max Weber como “a probabilidade de que um agente, em uma relagao social, esteja em condigdes de impor sua vontade apesar da resistencia” (1978, 1.53) concentra-se nesses aspectos distributivos do poder, Seus aspectos cole~ tivos, em contraste, referem-se a um jogo de soma posi qual a coope- raglo entre agentes distintos Ihes aumenta o poder em relagio a terceitos ou { natureza (Parsons, 1960, p. 199-225) A distingao entre poder distributivo e coletivo, tragada por Parsons com referéncia a sistemas sociais unidos por uma tnica j se também aos sistemas sociais que abrangem mi Nestestiltimos, o interesse geral representado por um agente hegemOnico nao pode ser definido cm termos de mudangas na distribuigto do poder entre jurisdigdes politicas. Mas pode ser definido em termos de um aumento .0 em relagio a terceiros ou a natureza, por parte dos grupos dominantes de todo o sistema, Em linhas gerais, pode-se esper ‘que as afirmagoes de estar representan- do um interesse sisté , definido dessa maneira, ganhem cred de e, com isso, ampliem 0 poder de um Estado pretensamente hegeménico, \digdes. Primeito, os grupos dominantes desse Estado devem ter lo a capacidade de liderar o sistema em direglo a novas formas de coioperagao e divisio do ti sistema romper com o que Ws 2 (1979, p. 108-109) chamou de “a tirania , superar a tendéncia de os Estados separados sm conta os problemas de nivel m que haver cfetiva de capa\ lidade mundial. Em segundo lugar, as solugdes de nivel sistémico oferecidas pela pretensa nagio hegemd- a devem enderegar-se a problemas de nivel sistémico que se tenham agra- vado a sntre os grupos dot ia” profunda e amplan sistema, uma Quando essas condicoes de oferta demanda sio simultaneam a pretensa nagao hegeménica pode desempenhar 0 papel de “sucedneo do governo”, promovendo, organizando e administrando a expansio do poder coletivo dos grupos dominantes do sistema (cf, Waltz, 1979, p. 196). Nossa investigagdo concentra-se nos processos que criaram reiteraclamen- te essas duas condigdes no moderno sistema de Estados soberanos desde ‘sua fundagao formal, sab hegemonia holandesa, em meados do século XVI (© modelo de transigao hegemOnica que surgiu da investigagio é resumido na figura 2. Como o modelo de Wallerstein, o nosso descreve um ciclo hegemd- nico, Ao contrério do dele, entretanto, torna endégena a mudanga sistemica. ‘Em nosso modelo, as expans6es sistémicas estdo inseridas em uma dada estrutura hegeménica que tendem a minar, $0 efeito da interagao dos dois tipos diferentes de lideranga que definem em conjunto as situagSes hegem6- nicas. A reorganizagio sistémica promove a expansio, ao dotar o sistema de ‘uma divisio do trabalho e uma especializagao de fungGes mais amplas ou mais profundas. A imitagio fornece aos Estados separados o impulso motivadar necessério para mobilizar energias ¢ recursos na expansio. ‘Sempre hé uma tensio entre essas duas tendéncias, porque uma divisso do trabalho e especializagao das fungdes mais amplas e mais profundas envolvem a cooperagdo entre as unidades do sistema, ao passo que a imitagao baseia-se fem stia competigao matua e a fomenta. A principio, a imitagao funciona em um contexto predominantemente cooperativo e, portanto, age como um motor da expansio. Mas a expansio aumenta o que Emile Durkheim (1964, 1. 115; 1984, p. 200-205) chamou de “volume” e “densidad dindmica” do sis- tema, isto 6 o niimero de wnidades socialmente relevantes que interager no sistema eo mimero, variedade e velocidade das transagbes que ligam as un ddades entre si. Com o tempo, esse aumento do volume ¢ da densidade dina- mica do sistema tende a intensificar a competigao entre suas unidades para além da capacidade reguladora das insttuigoes existentes. Quando isso acon- tece, a tirania das pequenas decisbes leva a melhor, 0 poder do Estado hege- ménico sofre uma deflagio e se instaura uma crise da hegemoni ‘Como mostra a figura 2, as crises hegem@nicas se caracterizam por trés processos distintos, mas estreitamente relacionados: a intensificagao da con- corténcia interestatal ¢ interempresarial; a escalada dos contflitos sociais; € 0 surgimento intersticial de novas configuragSes de poder. A forma assumida [por esses processos € a mat po variam de uma crise para outra. Mas pode-se identificar uma combinagao ira como eles se relacionam no espago ¢ no tem dos trés processos em cada uma das duas transigoes hegeménicas concluidas até hoje — da hegemonia holandesa para a britanica e da britinica para a [NOVA HEGEMONIA T_norruna nnvoxica ‘TRANSIGAO HEGEMONICA (CRISE HEGEMONICA HEGEMONIA Reonganizagdo sistémica pelo nov Estado hegeménico — Caos sistémico Rivalidades interesttaise ineerempresaial competigio Estado hegernico Rearganiago sitémica pelo Expansio Imitagto do Estado hegemdnico Confltos sociais Imitagto do novo Estado hegeminico — a 38 h bE 4 22 ges Figuia 2. A dindmica das transgdes hegemdnica.

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