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jralidade, >u e Educagao © 2013 by Janina Sanches, Rogério de Almeida e Soraia Chung Saura Coordenagio editorial: Rogério de Almeida e Kendi Sakamoto Revisao dos autores Capa: Davi Gomes Dados Internacionais de Catalogagio na Publicagao (CIP) SANCHES, Janina; ALMEIDA, Rogério de; SAURA, Soraia Chung (Organizadores) Interculturalidade, Museu e Educagao. Sao Paulo: Lagos, 2013. 184 p. ISBN 978-85-63541-65-9 1. Museus de arte - aspectos educacionais, 2. Arte na educagao. 3. Arte e literatura CDU 7.05:069 CDD 708 Editora Lagos Site: www.editoralacos.com.br Email: contato@editoralacos.com.br Candomblé de Ketu e Educagao: estratégias para o empoderamento da mulher negra®® Kiusam Regina de Oliveira Neste artigo, analiso a subjetividade de duas mulheres negras — Eliana ¢ Vera — adeptas do candomblé da nado Ketu. Elas sao, cm suas respcctivas casas, ebomis, isto é, possuem mais de sete anos dedicados ao culto a ancestralidade. Eliana exerce a fungao de ekedi, dedicando-se a cuidar de todas as necessidades da casa onde frequenta. Na época da pesquisa tinha 41 anos, era solteira, nascida no Vale do Paraiba em Cruzeiro, morava em Sao Paulo, coordenava projetos ¢ tinha formagao universitaria. uma filha de Oxum. Vera exerce a fungao de iyalorixa, isto é, mie de orixas ¢ se dedica a receber as mensagens diretamente deles ¢ assim, busca preservar as tradicdes ¢ conhecimentos africanos transmitindo-os aos seus filhos e filhas espirituais. Na época da pesquisa tinha 41 anos, era solteira, morava em Santo. André, cursava o nivel superior e trabalhava com vendas. E uma filha de Oxum, A subjetividade aqui ganha papel principal, porque através dos relatos dessas mulheres nos foi possivel saber como percebiam seus corpos antes do ingresso no candomblé e como passaram a perecbé-lo neste espaco social, educativo, religioso, hist6rico, cultural ¢ econdmico. Tais visdes do antes e depois siio possiveis, porque babalorixas (pais de santo) e iyalorixis recorrem a estratégias milenares transmitidas pela ancestralidade que tém se mostrado capazes de empoderar mulheres de forma geral, € mulheres negras de forma especifica. Quais sio essas estratégias? E possivel utilizi-las na educagio formal a fim de empoderar meninas negras € no negras que ocupam os bancos escolares? 25 Titulo da tese defendida por mim na Faculdade de Educacio da Universidade de Sio Paulo, em 2008, Este artigo trata-se de um excerto desta tese. 125 O fragmento social que escapa: o corpo da mulher negra Uma das contradigées que a mulher negra precisa lidar constantemente na sociedade brasileira € com a necessidade de firmar uma identidade positiva apesar de todo preconceito ¢ exclusao que vivencia. As letras de miisicas com conteudos que rebaixam as caracteristicas da mulher negra rapidamente viram sucessos, Um exemplo disso ¢ a musica que virou sucesso através de Lamartine Babo: © teu cabelo nio nega, mulata, porque é mulata na cor, Mas como a cor, nio pega, mulata, mulata eu quero © seu amor. ssa letra, a mulher negra esta relacionada apenas 4 satisfagao sexual, uma vez que a cor nfo pega, isto ¢, que a sociedade brasileira nao a vé com bons olhos. Relaciona-se ao fato de a sociedade elitista, machista ¢ branca acreditar que a mulher negra sirva, apenas, para a satisfagio dos desejos carnais dos homens, mas nao serve para o casamento. De acordo com Gomes (2003) é preciso repensar a dupla cabelo e cor da pele, Segundo ela, a dupla nao tem sido pensada no decotrer da histéria, afinal no periodo da escravidio essa dupla ajudava a definir a classifica¢io do negro escravizado no interior do sistema escravagista Da escraviddo até os dias atuais, o cabelo tem tido papel fundamental nos processos de socializagio entre as pessoas. Nas revistas femininas, ele é altamente valorizado e os discursos € imagens que tais revistas elaboram em relacao ao cabelo da mulher negra e suas caracteristicas quanto & textura e comprimento sao idealizados, nfio representam a maioria dos cabelos étnicos de mulheres negras: primeiramente, pelo fato de estas revistas clegerem como representantes da beleza negra mulheres que possuem @ pigmentacao da pele mais clara, as chamadas no senso comum 126 de “‘mulatas”, “mesticas” ou “morenas” com cabelos compridos e cacheados, ficeis para o alisamento, caso optem por fazer uma prancha “ou ferro quente, que os baianos apropriadamente denominam cabelo frito” (Santos, 2000, p. 56); em segundo lugar, porque a mulher negra, aquela que guarda em si as caracteristicas fenotipicas bem proximas dos negros ¢ negras africanos ¢ que Possui cabelos crespos no estilo black-power, nao representa sequer 0 orgulho da sociedade brasileira, que compreende tal estilo como fora dos padrdes estéticos de beleza. Deste modo, 0 uso de ferro quente, pastas quimicas ¢ alisantes € amplamente difundido nesse segmento. O que as Pessoas tém tido dificuldades em refletir é que alisar 0 cabelo pode apenas estar camuflando o contetido real do dilema pessoal que possam estar vivendo: a dilema entre aceitar ou recusar 0 proprio corpo. “Assim como a democracia racial encobre os conflitos raciais, 0 estilo de cabelo, o tipo de penteado (...) podem encobrir dilemas referentes ac processo de construgao da identidade negra” (Gomes, 2003, p. 137). Em contrapartida, muitas mulheres negras aderem 4 tranga ¢ ao cabelo natural étnico como formas de valorizar a estética africana, demonstrando posicionamento politico de denincia e resisténcia contra a invisibilidade de significantes da culrura negra € dos processos de branqueamento impostos pela sociedade. Nada aqui € despretensioso: tudo é didatico podendo estas mulheres, inclusive, divulgar a relacio das trangas rasteiras com a geometria 0s fractais africanos (Cunha Jr. e Menezes, 2003), cujos conceitos sao aplicados na etno-matemitica. Os fractais apresentados nos infinitos modelos de trangas rasteiras fazem parte da cultura africana e da cultura afrobrasileita, sendo usados pelos etnomatematicos Nos processos educativos formais ¢ informais. A mulher negra que tenta fazer parte do padrao estético estabelecido pela sociedade brasileira como bonito e adequado, pode experimentar uma angtistia voltada contra o préprio corpo, Quando uma mulher negra se recusa a ser do jeito que € buscando estratégias para se tornar diferente e socialmente mais aceitivel aos olhos dos outros aderindo a téenicas de alisamento, clareamento de pele ¢ cirurgias plisticas a fim de afinar nariz ¢ labios, esti 127 desejando deixar de ser, uma vex que a unica referéncia que tem de ser foi construfda a partir do referencial estético que esta desejando alterar. Em ultima instncia, esta mulher esta desejando sua aniquilagao fisica, a fim de ressurgir mesmo que num arremedo de gente, gente. No intuito de sentir-se parte integrante de um todo, o nivel de investigagao facial que as mulheres negras podem se impor diariamente, leva-nos a crer que ela nio se olha simplesmente, mas sim, passa 0 rosto por um minucioso inventirio, Tal investigagao inventariada pode se tornar patolégica na medida em que nao se accita do jeito que é vivendo “cotidianamente a experiéncia de que sua aparéncia pde em risco sua imagem de integridade” (Nogueira, 1998, p. 43). Ista se da como conseqiiéncia do desprezo social da sociedade brasileira em relagao 4 mulher negra e de acordo com Oliveira (1999, p. 30), a mulher negra: [.] munca foi vista em sua forma glamourosa; afinal, quem € capaz de conceber que exista glamour naquela que € nacionalmente reconhecida como um instrumento de trabalho, 2 mola propulsora das cozinhas, 0 motor de tracio dos tanues ¢ privadas vergonhosamente silenciada ¢ mumificada para executar tais obrigagdes? [...] Sabe-se que esse jogo tem feito, cm nossa sociedade, imimeras vitimas, pois propde as jogadoras que participcm de uma farsa metafisica que procura separar 0 que esta ligado. © problema € que nio se percebe esta incoeréncia, ¢ a aderéncia ao jogo di-se de fornia quase que letirgica. O perigo € que a mulher negra pode ser convencida a jogar 20 contrario, isto é, aceitar ‘os termos do jogo, ineorporando 0 preceito bisico da nio- cexisténcia, mergulhando, de cabeca, no pracesso sofride da auto-rejeigao. ‘A farsa metafisica da qual nos fala a autora esta presente em nosso cotidiano e o corpo da mulher negra, desta forma, sofre com as vis6es, conceitos e preconccitos de uma sociedade que o agride constantemente; o rosto desfigura-se diante de si prépria no espelho e passa a se configurar como objeto persecutério, sendo preciso reconhecer que “eu estou no meu corpo, sou meu corpo negro que os brancos, 0s que nao se dizem negros, no sustentam, 128 negam’” (Lima ¢ Romio, 1997, p. 40). Contudo, as mulheres negras chegam a este ponto, pois “seus corpos foram submetidos ao processo de cauterizagio das experiéncias” (Oliveira, 2001, p. 118). Tal cauterizagao € utilizada no sentido de aplicar castigos enérgicos para corrigir ou extirpar certas atitudes consideradas improprias ¢ ousadas dos corpos negros que se rebelaram contra uma ordem imposta. [..] uma estratégia de ago imposta por mulheres ¢ homens brancos e consiste na aplicacio de meios enéngicos para corrigir ou extirpar certas atitades dos corpos negros que se rebelam contra as ordens impostas ¢ que, normalmente, vem acompanhada da famosa frase “vou colocar essa preta em seu devido lugar”, Foi uma estratégia utilizada no periodo da escravidio, é uma estratégia utilizada nos tempos atuais. Detalhando: quem imps a ordem e a vé contrariada, sente a necessidade de erradicar aquela atitude rebelde, fazendo com que © reivindicador internalize sua propria acio, inclusive sentindo toda a culpa que nao lhe pertence, mas que o fizeram acreditar que sim. Recorrendo a uma metifora, é fazer com que o vulcio ao invés de vomitar sua lava, a recolha, o que nao conseguira evitar que mais tarde ocorram intimeras implosées (Oliveira, 2007, pp. 143-144). Milton Santos (2002, p. 159) afirmou que para superar a exclusio é preciso ampliar as discussGes observando “trés dados de base: a corporeidade, a individualidade e a cidadania”. Para cle, a corporcidade tem valor central porque 0 corpo é capaz de trazer dados objetivos, ainda que sua interpretacao possa ser subjetiva; a individualidade traz dados subjetivos, ainda que se possa discuti-la objetivamente; a cidadania iguala todos os seres humanos, sejam eles quem for, pois “a cidadania pode efetivamente dispor, acima e além da corporeidade e da individualidade, mas, na pratica brasileira, ela se exerce em fungao da posigao relativa de cada um na esfera social” (idem, ibidem, p. 159). A cidadania para a mulher negra tem sido algo dificil de ser sengida, isto porque, no Brasil, a pobreza tem afetado mulheres ¢ Sbomens, negros ¢ brancos, de diferentes formas. As mulheres sao “aezis pobres que os homens porque exercem fun¢ées infermais, “Gece baixos salirios. Além disso, 129 [..] a divisdo sexual do trabalho esti na base da pobreza das mulheres, devido as menores oportunidades que ¢las tém de acesso aos recursos materiais sociais, assim como aos de tomada de decisées em matérias que afetam a ” (OIT, 2005, p. 28). A OIT aponta também alguns determinantes estruturais de genero na pobreza das mulheres, que sao: a maior responsabilidade que tem pelo cuidado da familia ¢ pelo trabalho doméstico. Isto quer dizer que, apesar de trabalhar fora, em fungGes insalubres e de baixa remuneracgao, ao chegar em casa ela devera dar conta da educacio, satide ¢ cuidado dos filhos, do marido ¢ dos idosos, Tudo isto gera a dificuldade de conseguir desenvolver capital humano, isto é, formar-se profissionalmente, o que a impede de concorrer a vagas para funcdes melhores remuneradas ¢, assim, conquistar a autonomia econdémica. No Brasil, para que se compreenda a situagio de pobreza, € preciso, inexoravelmente, levar em consideragéo a questao racial, uma vez que a mulher negra esta mais suscetivel 4 pobreza do que a mulher branca; afinal, para a OIT (2005, p. 44): [...] a situagdo de dupla discriminagao — de género e raga — vivida pela mulher negra freqiientemente se agrava pela discriminagio derivada da sua origem social. Essa situagio nao pode, portanto, ser analisada como uma simples somaréria—mulher, negra e trabalhadora. Assim, refcrida, cla nao expressa a complexidade do fenémeno, © que resulta do entrelagamento entre classe social, género e raga. E importante analisar sistematicamente as desvantagens das mulheres negras no mercado de trabalho e na sociedade, tanto em comparacio com os trabalhadores em geral quanto com as mulheres brancas os homens negros em particular. Tais indicadores revelam a gravidade da situacdo socioeconémica da mulher negra brasileira, mostrando que, para além do teérico, faz-se necessario buscar estratégias de superagao da baixa qualidade de vida da mulher negra, inclusive, para que ela fique bem com o seu proprio corpo, tendo em vista a vida numa sociedade racista; além disso, € preciso que a mulher negra consiga perdoar seu corpo negro ¢ seus ancestrais de todo édio ¢ 130 de toda culpa, adquiridos por sofrer as conseqiiéncias do racismo, reaprendendo a pensar e a sentir o prdéprio corpo, afinal, “o pensamento do negro ¢ um pensamento sitiado, acuado e acossado pela dor de pressio racista” (SOUZA, 1983, p. 152). Agregar-se a grupos negros para tentar reaprender o caminho da autoestima talvez seja fator elementar para a sobrevivéncia da individualidade da mulher negra. Asubjetividade numa propostahist6rico-cultural: seu significado para o campo da educagao A proposta de utilizar um referencial histérico-cultural busea “‘explicar os pensamentos ¢ comportamentos existentes considerando a histéria do sujeito, e a subjetivagio de suas experiéncias” (Dobranski, 2007, p. 30), Isto quer dizer que todas as atividades das quais os sujeitos participam acarretam numa producio subjetiva extremamente complexa ¢ fundamental para a comprceensao das agdes de um individuo, porque tais agdes carregam pressupostos culturais, sociais, econdmicos e politicos de um grupo populacional e que se expressario de um modo peculiar sobre as modos de pensar e agir por conta da produgio subjetiva social e particular, Com isso o autor de referéncia quer dizer que subjetividade social ¢ individual fazem parte da mesma moeda, uma influencia a outra. Ele ainda afirma que é possivel dizer que nenhuma experiéncia torna-se subjetiva de forma imediata: ela se torna subjetiva num processo que pressupde constancia, recorréncia e no linearidade. Gonzalez Rey (2003, p. 78) afirma que “trata-se de compreender que a subjetividade nao é algo que aparece somente no nivel individual, mas que apropria cultura dentro da qual se constituiuo sujeito individual (...) representa um sistema subjetivo”. A cultura, para esse autor “no se determina pela cultura, a culnura € em si mesma subjetiva, o desenvolvimento do homem como subjetividade, e a cultura, so processos constitutivos complexos que avangam de forma simultanea. A cultura nao haveria aparecido com um homem desubjetivado (idem, ibidem, p. 48). 131 Enquanto método, o estudo se fundamenta na Epistemologia Qualitativa proposta por Gonzalez Rey (1997) com énfasc no carater construtivo-interpretativo, dialégico ¢ singular do conhecimento. Nao existem categorias, mas zonas de sentido subjetivo como ideias de carater especulativo elaboradas pelo/a pesquisador/a, a partir de seus repertérios ¢ conhecimentos tendo como base 0 referencial escolhido. Tais ideias por fim, sio agrupadas a partir dos indicadores de sentido subjetivo. Vale ressaltar que para Oliveira (2008) a subjetividade numa proposta histérico-cultural torna-sc um desafio para o campo da educagiio quando seus profissionais buscam, superando seus preconceitos, reconhecer as trajet6rias dos estudantes que sio unicas ¢ merecem reconhecimento. © Candomblé de Ketu Cada vez mais os candomblés tém sido considerados organizagoes que extrapolam a religiio. Siqueira (1998, p. 34) afirma que estar no candomblé significa “comprometer-se com um mundo politico ¢ culturalmente plural, em muitos momentos negados até aqui por razGes historicamente conhecidas propésitos do sistema colonial-escravagista em parte reatualizado no sistema capitalista de produgao e seus desdobramentos”. Os candomblés estao divididos por nagGes: jeje, nago, ketu, angola, fon, entre outras e, cada uma, guarda em si formas e€ expresses proprias de cultuar os orixdés (protetores das nossas cabecas), mas estao todas ligadas pelo culto e reveréncia 4 ancestralidade, No Brasil, 0 tipo de candomblé que possui maior ntimero de adeptos é 0 de ketu, Nigéria. A crenca é de que existem dois espacos de convivéncia: o drun e o aiyé. Orun “é um mundo paralelo ao mundo real que coexiste com todos os contetidos deste” (Santos, 1986, p. 54). © aiyé ¢ 0 espago da via concreta, cotidiana, onde os seres naturais habitam. Os espacos sao qualificados como urbano ¢ o mato (idem, ibidem, p. 54). O espa¢o urbano (doméstico) esta associado aos espagos publico « privado, onde as pessoas transitam e/ou adentram com ou sem restricdes nas casastemplos, nas casas dos orixas, nos quartos para 132 feituras, no barracao onde as festas sao realizadas e os convidados recebidos, nas habitagSes temporirias ou permanentes para os membros daquele candomblé. Esta relacionado as arvores e plantas sagradas cujo propésito esta associado as praticas litirgicas, como os banhos e beberagens. O mato éa reserva natural que tem a fungao de abastecer a casa-de-santo com as ervas, bem como abrigar os rituais que devem ser efetuados no mato. As pessoas responsiveis pela organizagio de todas as fungoes ¢ da distribuicdo do axé (forga, energia vital) sio as sacerdotisas (iyalorixis; mies-de-santo) eos sacerdotes (babalorixas; pais-de-santo) que, cercados por mies e pais pequenas(os) e outras pessoas hierarquicamente importantes, trabalham pela estabilidade do grupo. Tal distribuicgao pode ocorrer pelas palavras, gestos, movimentos corporais, cantigas. A palavra tem papel fundamental porque carrega o sangue branco (saliva, halito); cla, entio, é sagrada, tem axé, tem forca, energia vital ¢ emocional. A linguagem oral toma forma para transmitir os conhecimentos ancestrais por meio de férmulas nem sempre inteligiveis para quem a escuta. Corpo, curriculo, identidades O corpo é sua estrutura sio fundamentais no candomble. Isto porque, as agGes, os aprendizados ¢ o trabalho dependem dele, @ corpo. Um corpo saudavel, com uma estrutura dssea perfeita traz, em si, a possibilidade do movimento em prol da comunidade sdcio-religiosa. O osso, também ¢ uma parte do corpo considerada sagrada assim como a construgio de um curriculo vivo para a educagio capaz de dar sentido e significado a todos os grupos de pessoas que compdem nosso pais e retrate nossa realidade, sem mentiras, sem ocultamentos; um curriculo que considere as histérias diversas das vidas dos sujeitos ¢ suas culturas; um curriculo que parta da realidade local para compreender o mundo, enfim, um curriculo que seja o esqueleto, o alicerce ¢ a estrutura de todo ser humano. Sagrado! Segundo Oliveira (2008) a educagio brasileira tem testemunhado de forma dramatica as conseqiiéncias desastrosas provocadas por seu olhar restrito sobre si mesma, naoincorporando 133 na pauta das discuss6es as mudangas drasticas ocorridas no mundo inteiro, a partir de violéncias como racismo, sexismo, violéncia doméstica contra a mulher, xeno fobia, luta religiosa, droga, trabalho escravo, homofobia, prostituigio, exploragio sexual entre tantos outros temas que se fazem presentes nas salas de aula de todo o pais, mas que continuam sendo tratados pelos/as educadores/as como assuntos tabus. Nao encarar esses temas tem impossibilitado uma agio pedagdgica necessdria que possibilive a busca de estratégias capazes de provocat mudancas nos comportamentos dos profissionais da educagao e dos proprios estudantes. Nesse sentido vale lembrar a lei 10.639/03 que alterou a Lei de Diretri ¢ Bases Brasileira, ao estabelecer como obrigatérios 0 ensino da Histéria da Africa e da Cultura Afrobrasileira nas escolas do pais. Tal lei procura colocar na pauta do dia novos temas, como: identidade, racismo, preconceito, branquitude, branquidade, identidades negras, diversidade, idiossincrasias, empoderamento, discriminagao, estigma, género entre tantos outros. Nesse sentido, pensar um curriculo ligado 4 dimensao politica faz-se necessario, porque além dele ser uma tecnologia dos governos, pode ser contestado a fim de atender a diversos interesses, Nao existe curriculo neutro. Encarar o curriculo como um documento repleto de narrativas é uma mudang¢a de paradigma fundamental. De acordo com Silva (1994, p. 195) “as narrativas do curriculo contam histérias que fixam nogoes particulares sobre género, raga, classe = nogées que acabam também nos fixando em posigGes muito particulares ao longo desses eixos’’. Ese narrativas curriculares sio transmitidas através dos/as profissionais da educacio aos estudantes é possivel pensar que tanto estudantes como os/ as profissionais s4o capazes de produzir diferentes narrativas com © propésito de repensar as praticas ¢ teorizar as acdc, isto porque revelam acoes, subjetividades e formas peculiares de vidas humanas. Oliveira (2008, p. 99) afirma que “a educagéo no tem levado em consideragdo as relagGes etnicorraciais como possiveis narrativas”, isto porque tais profissionais fazem uma autoimagem de pessoas “idéneas, neutras e sem preconceitos” (idem, ibidem, p. 99), Também existe a ideia de que a crianga nao tem preconceitos e que tratar de tais questoes a despertaria para esse tipo de situagio, 134 De acordo com a OIT (2005) empoderamento diz respeito ao aumento do poder sobre as decisées que afetam a vida das pessoas. “Fala-se de cmpoderamento das pessoas cm situag’o de pobreza, das mulheres, dos negros, dos indigenas ¢ de todos aqueles que vivem em relagGes de subordinagio ou sio excluidos socialmente” (idem, ibidem, p. 105). Esta ligado, tal conceito, 4 satide, Portanto, é possivel na educacao, buscar estratégias para que os/as estudantes encontrem, recuperem ou reforcem a autocstima ligada 4 saride emocional, desde que hajam estratégias elaboradas, tendo em vista tais pressupostos. Essa é outra mudanca de paradigma importante porque considera o corpo de cada pessoa como Gnico e que merece respeito. Segundo Carneiro (2000, p. 22): - [..] falar de satide é dar expressio ao corpo. E escuti-lo como corpo expressivo, sensivel, vulnerdvel, transcendente. Falar da satide da mulher negra é também falar do corpo estético- politico, pois, é do corpo —_marcado por experiéncias pessoais singulares de exelusaa, pelos poderes sociais hostis - de onde parte o poder ¢ a ética da mulher negra, Designar a diferen¢a racial como dircito afirmado nas lutas das mulheres por acesso @ atendimento digno A satide, integridade corporal, autonomia ¢ respeito a valores ¢ crencas é apontar formas diversas ¢ criativas de inclusda. Zonas de Sentido Subjetivo A referida pesquisa apresentou as zonas de sentido subjetivo apresentadas abaixo. Em cada zona de sentido subjetivo apresentarei ideias chaves das duas entrevistadas. Ressalto que nao analisarei tais ideias nesse momento: deixarei para que o leitor ¢ a leitora as analisem, porque as palavras das entrevistas, alam. As subjetividades de Eliana e Vera e seus Impactos em relagdo ao Candomblé de Ketu A primeira vez gue em tomei contato com o candomblé for a mnite tempo atrés, na década de 1980, mas eu figuei com medo diivida se de fato era meu momento de se iniciar no candomblé. Af en jie conbecendo aos powcos, fui me aprovcimando (.). Ai ae afastel por motivos bem pestoais; ew era muito nova, eu queria ir para baile ¢ en 135 se afaste nm pouco do candombl¢ eu retoran para ele na década de 1990(...) porgue en reencontro sem anriga (-..). Men amiga ane disse que meu corpo estava retraido, insegiro & quis saber se eu estate sentinda algumea coisa. Ai ele me convida para ir & casa dele tomar ura café ¢ en cancordei, Na casa dele (..) ele me fala que era pairde-santo (..) que tinha montado sma casa de candomblé. Achei interessante ¢ ele me conviden para aparecer lé a qualquer momenta, (...) Une belo dia, sviria “fester (x) Osrum me chanrou para dangar coon ele mo salto, fo a primeira sensapaa de danca mesma de candamblé, de energia que é vocé estar dentro daguela reda, porgue s6 as mulheres dancam ¢ os orixcis, que ew tome a dimensdo do que era aguile na vida de wma mulber. Quando cheguei no axé estava muito deprimida (..) media 1,82 e prantinha os omibros aides que era sma maneira até de en esconder men tamanho e pascar despercebida pelas pessoas...) Hoje men corpo esté mais trangitila, relascade, suave, sex, ardemte, lherte, Minka corporeidade atual jot possivel porgite eu entre’ em contato com wm mounco que en tite sme ideatificario muito forte (..). (Eboumi Eliana d'Oxan) a Sti gue minha bisavé era do santo, a minha avé foi feita em Cachocira de Sao Fétix, na Babia, as filbas dela, nenbuuma seguite ¢ eu sou a primeira neta dela ¢ a timiza no mamenta que siga a religiao dole, Ela tem hoje 87 anos, tem 0 sem espags, cultua seu orircd, ela & de Oxgum ¢ ia passow todos os conbecimentes que ela teve para a minha (pesséct. Passow cone amor, ex aprendi a gostar dos onixés no diaua-dia da minha avé, Sé que o costume das reigites de matrizes africanas cadinadas aqui no Brasil tem comro negative parentes carnais eolocarem a mio em netas ¢ filbas, «eu te que sair d pracura de wni(a) xelador{i) de santo A minha mie nao queria que ex participasse, ela achava que eit ia carregar 0 softiorenta de minha avd, porgue mtinka avd detscou mario, toda unsa vida para seguir a religida dela, © a minha mile nio queria, queria que en fosse estudan, ter minba vida, A dana é uma das coisas mais importantes no Candomblé porque danca é 0 movimento da vida, fou) Quando ew chegited no axcé ext era muito timida (..) corpo duero, neo gostava de me morimentar (..) A danca muda o corpo e en media 1,80 ¢ gosto de dancar para meu orixd, & a ligagdo. Mudei meu comportamento, men jeito de ser onixd sucor (...) en tenbo prem corpo como sm tengpla (ou) mio bebo, nao fino, nunca used drogas em respeito aa mew ori. (Ebomi Vera d Oxum) A identidade negra como aspecto do sentido subjetivo desconhecido dos brasileiros Quando ex descobri que era de Occum, “Imaging, 64 nna naulber de Oxsom, poderosa”. Al, acabor de vex ¢ ningnémy mre siportava « digiami: “Por que foram falar para essa muer que ela era de Oxam? 136 Agora ninguére agiienta ele”. Ee falava assim: "Gente, ext nao tenbo culpa, ea tenbo Oxum na minha cabega”, Ai, através de Oxum en comecei a descobrir varias ecisas ¢ muitas coisas, a minha identidade, né, est muito relacionada a beleza, a waidade, ex san uma muther que adora perfume, ew adoro andar de salto, En teubo 1,82 m e ainda eofoco nm salta de 8 co gue é aguela coia poderosissinea, “cheguel, em eston agit, me respeitem, ex chegnei, olbewr para maint, Quando ex descobri gue onixd, que as mulheres, as tabs eraw mulberes negras (...) pensei: ‘eu represemio uma deusa negra, a minha enengia este ligada a eka, (...) Procurei ter cada mito das iabas (..) via a identidade das mulheres de Oxnni. (ou) Quando woot percebe que essas mulheres poderasas so oulberes negras, aguita te dé umea forga ¢ vocé fala ‘en sei agora conde en Busco men referencial de idenridade, en nd preciso estar ligada a nenbume santa nda negro, en tenbo as minhas proprias deusas, nda é sma, sao vanias mulberes que vio se desdobranda"”. (Ebori Eliana d’Oxtun) stipe fisico da mutber negra é onde ew me identifi: beiruda, gordas mulher de candombld tem que ser gorda porque é onde se encontra 0 xt wma filba de Oxanme ce nao for gorda nde tem axé, tem que ser gordona, forte, fartura, tem que mostrar gue tem axé, que tem comida e gue ela tem aguela comida e que sabe distribnir. Muitas veres en nd tinker aonde buscar forca, axt, ¢ Oscaum sinha mye trazer esse axé. Entéo isso é importante porque wna filha de Oxuna tem gue por seus brincas, seus balangendas, sua sata ¢ sair assine linda ¢ maravithosa, se sentindo 4 mais bela das mulheres. “En son filba de Oxcunn, entio tenbo que farer bonito, En sou soma negra de 1,80 m ¢ gosto de dangar para mew orisd. (n) Na Osun eu tenbo nina amiga, unia mae, uma companteira, ex Jenbo no orixd tudo, a energia que preciso; até no momento de tristexa, a gua que escorre de mieus obbos, € a dgsia de Oxum, Men corpo precisa dessa dgua. (Eboi Vera d'Oxum) A mulher negra contemporanea E a tiniea religito que a mulber, em geral, € muito valorizada dentro des cultor afros (4) E a tinica religido que a lideranga é de suther, ela pode dar as cartas, ter seus fillos, governar todo um povo, porque dentro da casa de candemblé se torna um povo independente das pessoas ld fora: é um povo que a mae tem que cuidar, fem que saber a bora de dar comida, a bora de dar o banbo; ela tem que ter responsabilidade com a vida de outra pessoa, porgue se a gente falbar, falba toda uma situagio, um sistema...) Temas exempplos de mulheres cantemporineas que carregam essas tantas mulberes [orixds) dentro delas: en, por exensplo, minha rade biolégica que é uma mulher guerreira, minha ialoviced, Sueli Carneiro, que & guerreira ¢ gue esti na guerra e ela é de Ogwum(...). Exntiio, 2 muciber contempordnea no candemblé hoje se 137 apropria muito mais da energia da casa de candomblé que ela freqiienta (a) pear 9 seu cotidiana. (Ebon Eliana) A iyalorixai, a chon, a ia6, elas tos musto valor dentro da religio porque tim comidas que.o bomen ma pode meescer nem fazer essa dé wma autoestioa para a mulher smito grande. (...j Fazer a comida e dé-la para quem ter fome é uma caracteristica da candomblé, A mutber é salorizada dentro do culte porque quando a gente bate a cabega no chia «a batemes para nossa ancestralidade, mas quem comegou 9 éandomblé aqui no Brasil foram as mulberes, elas que vieram da Africa e tinkam (que dar continuidade para aguele powe ¢ pana as coisas que fiearam li na Africa. (...) Entao as mutberes so as grandes guerreiras. O candomblé tent que valerizar muito a mutber, principalmente a mulber negra, a anlber negra nao pade deixar eair, nao pade deixar que desvalorizem a igueza que ela fem nas anos, ¢ a nutter negra tem gare diver “en som de tal oriscd” «deve falar com orgulba. Nao estou discriminando nenhuma outra pessoa, nao, mas foi a mutber megra que den continnidade para 6 candomblé, para a onixd aqui no Brasil, entéo isso é wo dugar que ninggéna tnt (..) Ent, ew ache que todas as rowlberes tinham que se basear nas propostas das orixis femininas, (Ebomi Vera) As subjetividades de Eliana e Vera voltadas para os impactos em relac&o a educacdo formal e a crianga negra. 138 Se eu tivesse @ oportunidade de trabaibar isso com os édiitadores en acho quie uma das primeinas coisas que et trabatharia seria a qneshio dessas densar que sie mulberes € 0 quanto elas sito hanitas, fortes © poderasas. Trazer para dentro da sala de aitle a mitologia de cada wna delas ¢ trabalbar com 0 grupo, a identificagio dessas meninas com cada uma dessas mnberes poderasase, através disso, buscar resgatar essa identidade gute todas nds tenros, (..) trabalbar esse reseate, a auleestima, a ualorizagao « a respeitabilidads, porgue existe dentro da candomblé... dentro do mito de cada na dessas mulberes existe sempre um mito que est ligado aa respeite, @ dignidades que té figada @ belexa; que ti Hgado aos poderes da matureza.n (..) Entio, en buscaria sempre trabalbar trazendo a mitologia ¢ a diversidade, (..) Dentro da mitologia vocé tem varios processos educacionais que podem: ser adotados pela escola. A danpa seria ontra coisa bem legal, porque como ela esta ligada autonvaticamente ao corpo, ela fax a corregio da postira, ¢ quando vocd dana para os onixds, quando voc! once o som dos atabagues, automaticamente seu corpo ja vai exquentanda (...) vock tui pereebendo que o seu corpo estd se entregando dguele batuaue, toque, € 1350 fax com que 0 sex corpo wa crescendo, que sua pastira mude, que ové saia daguele processo de encolbinento « que vocé se pouba em pé para o mundo ¢ de uma mancira positive, digna. A danca tem esse poder, & 0 tegne africans, ketu, de Angola, voc morimenta 0 corpa e traz a anteestiona, Imagina vod pegar uma menine negra na sala de aula, dar usa referénca para ela de Oscum, de lansa, de lemanyja, e voct explicar, ensinar para ela, como se danza para Oxum on para lemanjée cla poder se identificar con wma densa negra to bonita, poderosa, cheta de energia; quer dizer, isso muda a postura da mening, isco vatoriga, resgata, mexe com a axtoestima dela, empodera ela para enfrentar 0s processes de discriminacia que a gente sabe que tem dentro da cotidiano escolar, porque ela sé teon uma veferéncia que é da weulber eserava. Enntao quer dizer, a menina poder ser capaz de diver “olba, mrinka bistiria nao é sé de escravidéo, nao € sé de apanhar de chicote, nao é so ficar na laveura, nao é sé de fivar sendlo escrava dentro de wn engewho: en tenho tia outra historia que esté relacionada a poder também, que td relacionada di belexa, que td relacionada a uma religido ¢ que fem wma forma é sentida, quer dizer, é sma outra coisa. Ela ndo vai ficar envergonhada na sala de aula quando se conta ¢ a professora fica falando que oF negros eraim escravess nao, "nds fomios outras coisas también” @ ct mransformarao no ambiente escolar en acho que vem da, comecar a falar outnas historias que nao sejam as que aprendemos até baje nas eseolas ¢ que favorecam a diversidade, (Ebon Eliana) Os educadores precisam saber que aguela menina negra que esté em sale de aula tem toda uny conbecimento, tem toda um ascé, é uo pove de qutem tiraram tudo, sua cultura, fanvila, seu modo de pensar € river, ovais.a sua fe, seu jeite de viver, de sen, mas 0 tors dat pele ninguént tira, ¢ isso tem que ser respeitado, porgue tudo tiraram da gente; mas 0 orgutho gne muitas vezes entregamos mossos flhos nas miias de oxtra pessoa (a professora), é necessdrio devoluer esse orgntho para a erianga ¢ diga a ela que tem cultura, pove, religizo, familia, veio da Africa, mas no é mais nem menos que ninguém e sins un ser humans, € a partir do momento que as pessoas olbarem para outras como pessoas, serido negra, branca, loira au japonesa, olbe come uma pessoa e atrds de rma pessoa tem wm monte de coisas: tem a cultura, seu jeito de ser, mas a igente nts pade deiscar ser discrinsinads on waler menos gue outro. pelo tom da pele. («.) En acho que ox edacadores tim que aprender sobre @ cultura, a religi#o do pove negra, para poder transmitir. Sdo poucos gue lim, Se falar da mitologia grega om romana todo mundo sabe. Se Salar da mitologia africana, at woct € racista, preconceituosa e é sé comtar ‘ama historia direito, ¢ sb isso que em quero... A estratigia #0 educador perceber que precisa lntar por wnva tida, nunca desistir, ¢ isse é atrawds de ‘mostrar o waler do pove negro, de sua cultura, seus denses, sua linbagem real, sic vide, @ isso tem que ser respeitads numa sala de asila. (...) O professor tem que pensar “ew sou somt instramento sex, eu pasco te 139 transformrar, mas voct tambine tem que se transformar valorizande o que vocé tem — sua cor, sen cabelo, sen jeito de ser, sua enitura, sua religida. (m) O professor precisa incentivar a crianca negra no parar, lidar. (Jue mas 0 professor coloca mites barreinas, desde a preconceite, ele sé acredita no que esta colscado nos kivros ¢ nao vai atnis de outra verdacle, nado vai saber como € wina familia negra: ele sé enserga 0 que colocam para ele, Os professores ficam presos nesses preconctitos, nessa falta de comunicarao-e informagia porque ele sé rive alt fecbade mo mando dele ¢ terw que ampliar. (..) Professor quando vai para a sala de atta tere que saber dissor que ele é a dedinbo gue sai empnrranda a pessoa. (...) Tem gute ter tiny pacto entre professor e altmo, porque sendio a coisa nio pega, ndo anda, se néo tiver essa cumplicidade, essa amarragie, as evisas ndo andam. (Ebomi Vera) Conclusao A énfase dada pelas entrevistadas ao candomblé de ketu © aponta como utero-cabaca, com o propésito de gestar novas identidades negras. Espaco sécio-politico-religioso é compreendido como um recurso comunitario onde orixas, sacerdotisas e sacerdotes se utilizam de estratégias bem definidas capazes de aglutinar ¢ empoderar pessoas na comunidade. Mostram, também, que nao s6 0 candomble de ketu pode exercer a funcao de utero-cabaga, mas também as pessoas iniciadas mais velhas. Tais estratégias tem. no territério corporal seu campo de batalha, por este ser sagrado, ¢ revela que a mulher negra pode conquistar tranqililidade e libertar- se de preconceitos a partir do reconhecimento de sua linhagem familiar ancestral de matriz africana, onde 0 corpo nao é um tabu porque se joga no mundo, mergulha em novos conceitos, seguindo os caminhos apontados pelos mestres ¢ mestras-orixds, para que, mais tarde, de forma independente, caminhe por novas searas. O encontro com a religiosidade de matriz africana levou os corpos das mulheres negras enirevistadas ao encontro da satide espiritual, corporal, mental, emocional e religiosa, porque 0 corpo é considerado 0 sagrado. Se o corpo é considerado um templo, entio o sagrado nao esta fora desse corpo, mas sim dentro de cada uma, Nesse sentido, a Danza Mitica dos Orixds, que envolve as dimensées politica, social, religiosa, hidica, 140 organizacional e popular, surge como o movimento da danca capaz de recriar a prdpria vida, cuja energia que favorece tal tecriago pode ser plantada no corpo de cada mulher. O centro de toda esta ago ¢ recriag¢ao corporal encontra-se no poder da identificacao com um espaco, pessoas, situagdes ou lutas, chave nos processos educativos ¢ na relagao indissociavel ¢ visceral que esse corpo estabelece com a natureza. No caso, a identificagao com os orixas femininos foi fundamental, Tais mulheres, no Brasil consideradas orixas, no Nigéria, fazem parte da historia da realeza daquele povo, sao suas rainhas. Para que toda essa aprendizagem ocorra, € importante reconhecer as estratégias que partem da valorizagao e perpetuagao. dos mitos e ritos de iniciagao com a fungio de transformar a vida €a postura dos iniciados e simpatizantes em busca do tao sonhado empoderamento da mulher negra, A maturidade é fundamental para que o processo auténomo de desenvolvimento, aprendizagem e transformagio. ocorram por parte das iniciadas, porque o candomblé de ketu procura suturar psiquicamente e renovar as identidades da mulher negra a partir dos mitos dos orixas, a empoderando. Tais mitos trazem sempre aspectos arquetipicos e psicolégicos dos orixas, onde se privilegia dois grandes grupos possiveis de andlise: a forma (formato, aparéncia dos orixas) e a esséncia (aspectos emocionais € psicolégicos do orixa). A estratégia de suturaciio da identidade das mulheres negras que adentram o espaco sdcio-religioso do candombleé se da através dos agentes sacerdotisa e/ou sacerdote que buscam se aprofundar na forma ¢ esséncia dos orixas de cada neva iniciada e em todos os processos e niveis de percepcaio das iniciantes. Sendo assim, é valido dizer que a sacerdotisa ¢/ ou sacerdote sao os responsaveis pela sutura psiquica em relacao as identidades das mulheres negras através dos mitos capazes de liberar o anima como componente importante para a tealizacao dos impulsos criadores. Mas nao s6: a sacerdotisa e/ou sacerdote sio responsaveis pela territorializagio dessas mulheres, tendo visao proativa do territorio onde essas mulheres constroem suas relagées de amizade, trabalho, enfim, de vida das e com as pessoas para, depois, buscarem caminhos necessatios de agio. 141 ADanga Mitica dos Orixas surge, entio, como possibilidade real para o empoderamento da mulher negra, tendo ela, acesso direto com os prdprios orixas; essa danga reconstitui a autocstima a partir de uma identidade redescoberta na ancestralidade. E. a danga que possui o poder de reconectar a mulher negra as experiéncias afro-expressivas de natureza plastica, ritmica, corpdérea ¢ emocional. No tocante 4 mulher negra contemporanea, a tese revela que seu poder reside no fata de conhecer sua linhagem real e ancestral de matriz africana, reconhecendo o poder advindo através da manipulacio das energias da natureza, colocando-a em situagéo de vantagem diante das demais pessoas. A produgio de sentido subjetivo das entrevistadas mostra que a mulher negra contemporanea s6 pode ser reconhecida pelas demais pessoas se reconhecer, primeiramente, sua ancestralidade africana: essa é a via Icgal para seu empoderamento. Em relaggo aos profissionais da educagio, aponta para a falta de informagGes sobre a tematica racial que professoras € professores possuem. Afirma que € necessario os/as profissionais da educagao conhegam outas versGes da historia do negro. brasileiro, valorizem os mitos africanos e afro-brasileiros ¢ desenvolvam nova filosofia ¢ metodologia de trabalho. A pesquisa mostrou que os profissionais da educagao devem se reconhecer nas figuras dos sacerdotes ¢ sacerdotisas, bem diferentes da visio trazida pela Igreja Catdlica ao Brasil, longe de estarem associados a uma visao crista de benfeitores, doadores © catequizadores, mas sim resignificando 0 conceito, Tém, agora, a especificidade de ajudar © sujcito a buscar sua propria libertacao, reforcando sua autonomia diante de sua propria vida, fundamentando essas agdes na divulgacio dos processos histérico-culturais. dos sujeitos que compuseram o Brasil, colocando-se como instrumentos dos/as estudantes em prol da vida digna, respeitando a diversidade étnico-racial ¢ revelando a interligagao entre seres humanos e a natureza, entre educadores/as e estudantes. Assumem, portanto, a responsabilidade social pelos processos de iniciagao de seus estudantes. Os aspectos metodolégicos desta educagaéo, de acordo com a producio de sentido subjetivo das entrevistadas, estariam 142 centrados no que chamei de “teoria da intencionalidade para 0 empoderamento negro feminine”, centrada nos valores afrobrasileiros presentes no candomblé de ketu, ¢ voltada as alunas negras que ocupam os bancos escolares das escolas brasileiras. Nessa teoria, a intencionalidade seria compreendida como uma virtude a ser ‘buscada, porque as agGes estariam voltadas para o reconhecimento de que a origem étnico-racial da aluna negra brasileira tem sido determinante para que continue a ocupar espacos que nao representam poder ¢, sendo assim, faz-se necessario ampliar a visio, no nivel nacional, de como se dao as relagées entre negros ¢ brancos, entte mulheres negras ¢ brancas, entre a mulher negra ¢ o homem negro, entre a mulher negra e o homem branco, entre outros possiveis cruzamentos. Sfo as professoras € professores responsaveis pela sutura pedagdgica e psiquica de suas alunas e alunos (assim como os pais ¢ maes de santo) sendo que a escola deve se reconfigurar como 0 grande Uitero-cabaca capaz de gestar novos sujeitos matriculados, Portanto, a intencionalidade para o empaderamenta negro feminina estaria voltada para o aprimoramento das agées conscientes € planejadas per parte dos profissionais da educagao capazes de proporcionar as alunas negras a ampliacao da liberdade de agirem ¢ de escolherem sobre os recursos ¢ decises que afetam as suas vidas e sua satide, a partir de um trabalho pautado nas formas e esséncias dos orixas/avatares presentes na mitologia afrobrasileira e no interior do candomblé de ketu que tem na desconstrugao reconstrucao do corpo, a partir da Danga Mitica, fundamentos necessdrios que favorecam tal transformacio. Nessa perspectiva, a metodologia central seria chamada de “pacto de amarrapao”, onde educadores/as ¢ estudantes estariam, como num pacto de ancestral, unidos, interligados, sentindo-se um responsavel pela ampliacao da liberdade do outro. E uma pesquisa que aponta para a necessidade de se estudar as identidades das mulheres negras no interior das instituigoes que buscam o fortalecimento delas através dos processos de construgao ¢ desconstrugao de seus corpos ¢ reconstrugao das histérias de vida de seus antepassado, a fim de tazer contribui¢ao maior, a compartilhando nos espagos escolares. 143 Referéncias CARNEIRO, Fernanda (2000). Nossos passos vém de longe. In: © livro da satide das mulheres negras.[organizagao] Jurema Werneck, Maisa Mendonca, Evelyn C. White; tradugio de Maisa Mendonga, Marilena Agostini ¢ Maria Cecilia MacDowell dos Santos. Rio de Janeiro: Pallas: Criola. CUNHA JR, Henrique; MENEZES, Marizilda dos (2003). 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Tornar-se negro: as vicissitudes da identidade do negro brasileiro em ascensio social. Sao Paulo, Graal. 145 Interculturalidade, Museu e Edugaeag ee RetR lars altce in) ce) oa PCH msr Ue |ive eee) ofa Ne Lemar ree Meee me Me Tual ile 2° )hi) c-Rel es lag oom sleet hier que estao em jopo nesses espagos-conceitos. Debatem-se sobre enamel ee ey ur CMe arte + le maT Me B Dorel rsLerloM Mune MED TLL Colne] 11a]: oN ates 1sy gil t-te) (os celop Peewee temas Metadata ent ts iors ere tan nie alse ista desse didlogo? Coma se resolvera simbolopia das Meyer acyl leckn eee rt iar ls el 4 pontos de vist Onze autores se lancam ao desafio de dialogar com essas questoes. Tee MCU PER EE i icter or er eee losla ull -te)[a)s1 9 educadores da arte, comunicadores, socidlogas, filosofos, psicolagos, OCC ems ele aE eres 311541659) Lagos oi78856

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