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LUIZ PAULO DA MOITA LOPES IDENTIDADES FRAGMENTADAS [A CONSTRUGAO DISCURSIVA DERAGA, GENERO E SEXUALIDADE EM SALA DE AULA ARADO LETRAS 'DADOS INTERNACONAIS DE CATALOGAGAO A PUBLICAGAO (1 (CAMARA BRASILIA DO LVHO, $7, 5RASH Taka pes, tz Pao os leone fogrertade a conti dearshadaag, gh ese ‘ads masa da UsrPatdota eps Dargis, SP: Marat te Lev 202 (Colo Lerma, Etcaar Seabed) sorte Aine do Sacre 2, ented scl 5, Laramento 4. Peg ‘caconal Sal de ula = Ore . Seong edcacon catego LernaMenro, oucacAoe soceDsDe Cournot: gl. Kenan Bic) Cap Vane Na Game nage 6a caps Ap tet ano, frmato2 11m Cdesqve LHe Loox Wal ‘REITOS RESERVADOS PARA UNGUA PORTUGUESA: ‘@MERCADODE LETRAS EOICGES E UNRARA LTDA. Talfn (0) 920.7614 ‘72ab0 Campin SP rstereadodeiazes come 2006 soma saaapnpebi Est Oao ‘ceva pene pene a Para Marlene Soares dos Santos elo carinko, pelo esttmulo consiante, pela imensa bondade’em compartilhar conhecimento e, especialmente, pelo exemplo de integridae Cepftulo 1 DISCURSOS DE IDENTIDADE EM SALA DE AULA DE LEITURA: ACONSTRUGAO DA DIFERENGA. [Nés somos diferenga...nossasidentidades so as diferengas das mdscaras. Foucault 1972, p.131 Liza: (..)Sabe, na verdad, além das coisas que ‘qualquer um pode aprender (0 modo de vest ¢0 modo certo de falar), cadiferenga entre uma dama e wma vendedora de flores 120 & como ela se comporic, mas como ela €tratada. Ex sempre serei uma vendedora de flores para o Professor Higgins, porque ele sempre me trata como uma vendedora de flores, sempre tratard; mas eu sei que eu posso ser uma dama para o senhot, ‘porque 0 senhor sempre me rato como wma dam, e sempre raiard, ‘Shaw, B., Pygmalion. Londkes: Penguin, 1971, p. 127 29 Introducto ‘Uma nogdio bésica que subjaz este liv ¢ a compreensio de que o que étipico do discurso é a sua natureza social: uma visio do discursocomo uma forma de co-participagio social. Os participantes diseursivosconstzoem o significado ao se envolverem ¢ ao envolve- ‘calegorias bésicas para compreender como o significado ¢ ela- borado na sociedade j4 que, como diz Bakhtin (1981, p. 12), “uma palavra é dirigida a um interlocutor: ela € fungo deste interlocutor" E € por meio desse processo de constnugio do significado, no qual 0 interlocutor é crucial, que as pessoas setomamconscientes dequem so, construindo suas identidades sociais 20 agir no mundo por intermédio dalinguagem. Este capitulo investiga como esse processo de construc da identidade social é desenvolvido em uma aula de leitura de Iingua rmatema a0 analisar os discursos de identidade da professora e dos alunos, com interesse particular em como a nogdo de diferenga é gerada nainteragaoem sala de aula, Primeiramente, comego aapresentara visio de discurso e de identidade social que seré desenvolvida em outros capftulos e, a seguir, analiso os dados. Finalizo o capitulo chamando tengo para o papel central que os professores desempenham na construgdo da identidade social em aulas de leitura devido: a) a sua posigdo como lider nas assimetrias interacionais da sala de aula; eb) 20 ‘papel de autoridade textual que desempenharnem salas deaulade leitura ‘em relagfo & construgdo social do significado, Discurso ¢ identidade discurso tem sido cada vez mais representado como um processode construct social tendo em vista que: a) o significado 0 ‘Guin cousteuto negociado pelos participantes, isto é, nlo ¢ intri seco 2 linguagem (Bakhtin 1981; Duranti 1986; Nystrand e Wie~ melt 1991; Cicourel 1992 etc.); e b) a construgo social do significado é situada em cirounstancias s6cio-his ‘ese é mediada por praticas discursivas especificas nas quais.os ‘participantes est posicionados em relagdes de (Eoucault 1971; Fairclough 1989, 1992, 1995; Lindstrom 1992 ete. 0 discurso como uma construgao social é, portanto, perce- bido como uma forma de ago no mundo. Investigar 0 discurso a partir dessa perspectiva é analisar como os participantes envolvi- dos na construgao do significado estio agindo no mundo por meio da linguagem e esto, desse modo, construindo a sua realidade social e a si mesmos: “através da comunicagio social as pessoas definem e constroem sua realidade social, dio formae agem sobre ela” (Markova 1990, p. 3). Inspirado pela abordagem s6cio-hist6- rica de Wertsch (1991), 0 foco deste capitulo é colocado na ago discursiva: “os seres humanos so vistos como entrando em con- tato com, ¢ criando, seu mundo social tanto quanto a si mesmos através das agées nas quais seengajam” (Wertsch 1991, p. 8). Isso quer dizer que a unidade bésica de andlise a interacdo, jd que é por meio dela que as pessoas constroem os significados com os guais vivem. Portanto, a anilise da dinémica da interago torna possivel compreender “quem tem responsabilidade por qual ativi- ‘dade na construgio social dos significados de qualquer eomunica- G40" (Shotter 1989, p. 133). Nessa perspectiva do discurso como ago, a andlise dos diferentes meios usados pelos participantes para agir no mundo através do discurso ¢ tio importante quanto a andlise dos significados construddos nesse processo, j& que dé acesso 2 como os participantes véem o mundo ¢ a si mesmos no ‘mundo (Shotter 1989, p. 149). 31 Se osignificado é uma construgao social, duas questdes s40 centrais nessa visio: alteridade e contexto. Seguindo a visio bakhtiniana de linguagem, o fato de que toda enunciacao envolve pelo menos duas vozes é central aqui: a voz do ewe a voz do outro, {sto é, os pares na interlocugao. Como diz Bakhtin (1981, p. 113): (.-)essa ovientagZo da palavraem relasio ao interlocutor é muito importante. Na verdade, toda palavra contém dus faces. Isto & determinado pelo fato de que ela procede de alguém assim como pelo fatode que édirecionada aalguém. Eo produto dainteracio centreo falante © o ouvinte. 6, portanto, a presenga do outro com o qual estamos engajados no discurso (tanto no modo oral quanto no modo escrito) que, em ‘ltima andlse, molda o que dizemos,e, portanto, como nos percebe- ‘mos a Iuz do que 0 outro significa para nés: “o individuo tom: -consciente de si mesmo no processo de tomar-se consciente dos “outros” (Markova 1990, p. 3). O que somos, nossas identidades ais, porianto, so construfdas por meio de nossas préticas discur- sivas com 0 outro: “as pessoas tém suas identidades construidas de “acordo com 6 modo através do qual se vinculam a um discurso —no seu prdprio e nos discursos dos outros” (Shotter e Gergen 1989, p. ix), Esta € arazio pela qual os processos envolvidos no discurso, isto 6,naelaboragao do significado, tomaram-se tdo centrais nas Ciéncias Sociais em geral (Markova 1990, p. 3): pesquisadores de diversas freas de investiga (psicologia, educacdo, sociologia, lingtistica aplicada etc.) tm cada vez mais discutido a necessidade de focalizar 2 interagaovo discurso para entender a vida humana (Moita Lopes 1995ae 1996). Como j& apontei acima, a outra nogéo crucial nessa visio do significado como construgio social é 0 contexto. Com a fina- 2 Jidade de construir significados com o outro, os participantes discursivos criam contextos mentais (Edwards e Mercer 1987) ou. ‘enquadres interacionais (Tannen € Wallat 1987) ao interagirem e os projetam na interac4o para indicar como pretendem queo ‘significado seja construido: “o contexto nao é um trago material, has uma producdo dos préprios participantes, isto é, uma cons- trugiio interpretativa através da qual definem a situago com 0 ‘Objetivo de resolver tarefas préticas’* (Bange 1992, p. 18) ou ‘uma propriedade dos entendimentos gerais entre as pessoas que se ‘corrunicam” (Edwards ¢ Mercer 1987, p. 63). Nesse processo de contextualizagao, os participantes fornecem “as pistas de contex- tualizagao” que indicam como um enunciado particular deve ser contextualizado ou interpretado (Gumperz 1992). Esses processos de construgao de significado, em que alteri- dade e contexto sao cruciais, sio “situados cultural, institucional e historicamente” (Wertsch 1991, p. 8). Os participantes discursivos esto agindo no mundo em condigGes s6cio-hist6ricas particulares, inas quails operam (Fairclough 1989). Essa € a razio pela qual Markova (1990, p. 3) indica que’“todas as agGes individuais sio fendmenos sociais ¢ histéricos”. Os participantes estio cientes de sua vinculagdo a eventos sécio-hist6ricos jé que “nés todos escrevemos e falamos de um lugar e momento particulares, de uma histéria e de ‘uma cultura que séo espectficas. O que dizemos esta sempre ‘em contexto’, posicionado” Hall 1990, p. 222). Portanto, sabemes que no podemos dizer o que quer que queiramos em quaisquer circuns- tincias. Nesse sentido, como mostrei em Moita Lopes (1996b), a projego de enquadres interacionais ou contextos mentais na intera- ‘cdo € dirigida pela posigao que os partcipantes ocupam em relapOes simétricas/assimétricas na sociedade (Lindstrom 1992) ou, como. Foucault (1971, p. 11) diz, “sabernos muito bem que no somos livres para dizer qualquer coisa, que nao podemos falar qualquer coisa quando e onde queremos, e que uma pessoa, em resumo, néo pode falar qualquer coisa”. ‘Nessa visdo do discurso como construgao social por meio da qual 0s participantes constroem a realidade social ea si mesmos através do discurso (Murray 1989, p. 176), soonsnielo da iden: tidade social é vista como estando sempre em proceso, ‘dependent da realizacio discursiva em circunstéins and “es: os signficados que 0s patcipantes dio ast mesmos © Hos “outros engajadosno discurso, Nesse sentido, ‘conforme Hall (1990, ‘p. 222) indica, “ao invés de pensarmos sobre identidade como um fato jé conclufdo, (...) devemos pensar sobre identidade como uma “produgfo’, que nunca esté completa, que esta sempre em proces- ‘so, sempre constituida dentro e ndo fora da representaco”, isto €, do discurso, Ou ainda, como diz Parmar (1990, p. 101): “ identidades nunca so fixas, mas complexas, diferenciadas ¢ cons {antemente reposicionades”, Essa é a razlo pela qual, seguindo ‘Shotter (1989) acima, chamei atengo para a importancia de focalizar os significados que os participantes constroem quando em interagdo — 0 que ocorre entre as pessoas — com 0 fim de investigar os discursos de identidade, conforme minha anélise dos dados abaixo mostrard. Essa visio da identidade como construgo social também. implica 0 fato de que “somos criados da forma que somos pelos outros a nossa volta” (Shotter 1989, p. 144). Ao antecipar como s patticipantes podem responder na interaeo,com baseem quem les So, nos compomos de formas diferentes (Shotter 1989, p. 145), ito_é nos posicionamos de modo diferente. Isso quer dizer que “a3 pessoas so essencialmente seres produizidos por outros seres" (Shotter 1989, p. 146), Os que ocupam posicSes de maior ‘poder nas relaghes assimeétricas si0, conseqilentemente, mais ap- 34 tos a serem os produtores de outros seres, por assim dizer. Devido ‘a0 seu papel mais predominante na proje¢ao de contextos mentais (Edwards e Mercer 1987) ou enquadres interacionais (Tannen e Wallat 1987) no discurso, esses participantes so mais aptos a definir a construg&o social do significado, exercendo, portanto, poder na construcdo social de identidades (Moita Lopes 2000). Conforme Johnston (1973, citado em Kitzinger 1989, p. 82) indica, “a identidade é o que vocé pode dizer que vocé é de acordo ‘com 0 que dizem que vooé é”. Pode-se dizer também que identi- dades “nio so propriedades dos individuos, mas sim construgdes sociais, suprimidas ou promovidas de acordo com os interesses ‘politicos da ordem social dominante” (Kitzinger 1989, p.94). Esse € um t6pico crucial na andlise de dados interacionais da sala de aula, como mostrarei a seguir. Esses pontos, portanto, chamam aten¢ao para o fato de que 0 modo como o poder é distribufdo na sociedade é uma caracte- ristica central da visio de identidade como construg&o social. Foucault (1972) argumenta que as identidades nfo sio escolhidas, ‘mas s&o inscritas em relagbes discursivas de poder especificas nas _quais so construfdas. Ele também chama atengao para o modo ‘como o poder disciplinar tem-se instalado nas instituigSes (em escolas, por exemplo) a ponto de que os individuos nessas préticas discursivas so construidos para exercer poder sobre si préprios (Foucault 1977). Seguindo essa linha de argumentagdo, vérios pesquisadores (Foucault 1977; Freire Costa 1992; Gardner 1994; Andersen 1994; Hallam 1994; Crawford 1995 etc.) tm mostrado ‘como as Ciéncias Sociais tém construido identidades particulares (criminosos, gays, mulheres gravidas etc.) por meio dos discursos de especialista, que, muito freqiientemente, funcionam como uma forma de controlar 0s individuos. Chamando atengio para a rela- ‘go entre poder e conhecimento, Foucault (1977 e 1979) mostra 35 como as Ciéneias Sociais tém criado “regimes de verdade”, refle- tidos nas préticas discursivas nas quais os individuos esto insori- tos: “muito do que parece ser diferengas ‘naturais’ (...) é criado na interago e se toma real nas priticas de pesquisa das Ciéncias Sociais” (Crawford 1995, p. 3). Portanto, os processos discursivos constroem certas iden- tidades para terem voz na sociedade embora estas alterar em épocas e espacos diferentes. Como Foucault (1979, p. 217) indica, o poder gera resisténcia; portanto, nas praticas discur- sivas, identidades na posiea: ia sfo também construf- das: “embora uma pessoa possa estar posicionada de certa forma em um discurso especifico, ela pode resistir a esta posigao ou mesmo criar um contradiscurso que a coloque em uma posicaio de sujeito e nao de marginal” (Peirce 1995, p. 16). Isso quer dizer que 0 “poder nao € monolitico e que n&o vai somente em uma direciio” (Cameron et al. 1992, p. 19). Além disso, como varios pesquisa dores (Cameron etal. 1992; Rutherford 1990; Stuart 1990; Mercer 1990; Weeks 1990; Parker 1989; Crawford 1995; Peirce 1995 etc.) tém indicado, as pessoas tém identic jociais multiy na sociedade. As mesmas pessoas so inscritas em préticas discursi- vas diferentes por meio de identidades sociais diferentes e contra ditérias. O poder atravessa a sociedade em diferentes diregdes, dependendo das relagbes sociais nas quais as pessoas se envolvem por meio de diferentes priticas discursivas; “as identidades so ‘so estruturadas ‘como uma lingua’ no sentido de que podem ser articuladas em uma gama de posigSes contraditérias de um con- ‘texto discursivo ao outro” (Mercer 1990, p. 57). As identidades Socials de classe social, género, sexualidade, raca, idade, profissio etc. sio simultaneamente exercidas pelas mesmas pessoas nas ‘mesmas ou em priticas discursivas diferentes. Uma pessoa pobre nao € s6 pobre, mas também é uma mulher ou um homem, 36 heterosexual ou gay/lésbica, preto ou branco, jovem ou velho, deficiente fisico ou nao, norte-americano ou sul-americano, falan- te de uma variante hegem6nica ou néo, professor ou aluno ete.: “a poder emrelacées sociais diferentes” (Cameron et al. 1992, p. 20) ‘ou “nossas subjetividades de classe social nfo coexistem simples- mente lado a lado com nosso género. Ao invés disso, nossa classe € mareada por nosso género, e este por nossa classe” (Rutherford 1990, p. 19). A escolha de nossas miiltiplas identidades nao depende de_nossa_vontade, mas é determinada pelas préticas discursivas, impregnadas pelo sr, Nas quais agimos embora Possamos resistir a essas préticas. Em resumo, as identidades sociais sao construfdas no dis- ‘curso. Portanto, as identidades sociais nao estiio nos individuos, mas emergem na interagdo entre os individuos agindo em préticas discursivas particulares nas quais esto posicionados (DeNora e ‘Mehan 1984, p. 160). Também fica claro aqui que o mundo social. © as identidades nao so fixos. Estio em construgio, isto é, no processo de tomar 0 significado inteligivel ao outro (Shotter ¢ Gergen 1989, p. x). Portanto, est implicita neste capitulo a idéia de que as identidades esto sujeitas a mudangas, isto é, podem ser reposicionedas. Essa é uma questo crucial neste livro em virtude de sua preccupagdo com a educaco: um processo social em que transformagGes podem ser geradas. Considerando a relevancia da escola na vida dos individuos, ainda que, por nenhuma outra razfo, pelo menos em termos da quantidade de tempo que passamy/passaram na escola, pode-se argu- mentar que as préticas discursivas nesse contexto desempenham um papel importante no desenvolvimento de sua conscientizagao sobre ‘suas identidades e a dos outros. Além disso, tendo-se em mente o fato de que as escolas sZ0, em iltima anélise, instituiges socialmente v7 {justificdveis como espagos de construgio de conhecimento/aprendi- ‘zagem, pode-se argumentar que 0s significados gerados em sala de aula tém mais crédito social do que em outros contextos, particularmente, devido ao papel de autoridade que os professores desempenham na construsao do significado (Moita Lopes 1995b) (veja o capitulo 5). As identidades sociais construidas naescola podem desempenhar um papel jimportante na vida dos individuos quando depararem com outras prti- cas discursivas nas quais suas identidades so reexperienciadas ou reposicionadas. [sso justifica 0 interesse deste livro pelos discursos de ‘dentidade em aulas de leitura. Andlise dos dados Nesta andlise, focalizo os primeiros 20 minutos da aula como constituindo uma primeira macrocena dessa aula, com base no propésito pedag6gico da professora: ativagtio de pré-conheci- ‘mento do leitor-aprendiz para facilitar seu engajamento na leitura. Essa macrocena serd subdividida em microcenas com base nos tipos de significados em construgio. No capitulo 2, as quatro microcenas seguintes aquelas estudadas aqui so analisadas quan- do se focalizam os 15 minutos seqtienciais da mesma aula. Como mencionado acima, 0 foco da anélise colocado no processo de construgao da identidade em sala de aula a partir de ‘uma visto socioconstrucionista do discurso e da identidade social na medida em que é voltado para os significados que a professora eos alunos constroem em relago & identidade. Considero as cenas estudadas aqui como discursos de identidade porque os participan- tes esto, na verdade, tratando de questdes referentes & identidade a0 discutirem problemas de diferengas na sociedad. Macrocena A: Ativacao do Pré-conhecimento Microcena I: Diferenga classe e opiniao (1 P: Olha s6/gente,/ Hoje n6s vamos trabalhar com um texto! que tem esse titulo aqui 02 *Respeito is Diferengas" /eerto? Ba gostariade saber, por exemploy do Alex /o 03. quequeessetitulo/Alex /sugere pra voc#"/I0 que que voce entende por ese Ubulo%! 04 A: Que ele diferencia uma coisa daoutrai! 05 P: Como 6 que! 06 A: Que ele diferencia uma coisa da outra// 07 P: Difecenciar uma coisa da outray Monique, vocé podia dtalhar! um pouco mais 08 issofou voed tem outraopinito’! 09 A: Sim/ Tem gente que € pobre/e tem muita gente que & ricaf e fica 2ombando 10 assim dizendo que é melhor! 11 P: Entio/ voot tf dando um exemplo de diferengas/ né/ Pobres ericos/ voe8 achal - 12 queo tico despreza o pobred! 13. A:Gnaudtvel) 14 P: Bntdo, essa af € uma diferenga / Que mais, woot! 15. Ai Bu acho que quem desrespeita a diferenga So duas| pessoas que tém diferencas/ 16 eno serespeitams! 17 PO; 18 A: Eu acho que sio duas pessoas que esti unidas/ mas tm diferengas/ e nfo 19) respeitam essas diferengas./! 20 P: Voc’ pode me dar um exemplo dessas diferengas! que io so respeitadas?/! 21 A Uma pascon gosta da trahalhar! mas outra nfo acha que ‘aquilo ali € certo! e 39 22. quec pois! 23. P:Entio/ voct ex falandoemtermes pofssonis/Que ama pessoal 24 A: B/ pofissonas,/pssons/em tudo /! 25. P:Pessons/né? Existem dferengas profisionsis./ 26 A: Decasal também 27. P:Nocasode um casal/ qu pode iferenga ocomeriat! 28 A: Briges/ : 29. P: Bessa brigas acontecem po: qué! 30 A:Ah/ porque les nfo serespitam/ no em mais aquele Iago de amor, at 31. comesama surgi as diferengas 32. Enifo/vejam bem/Voc$ exté dando outro exemplo/ Aiterenga de opnies/ ne 33. isso/De forma de tratar um mesmo problema seria uma Aiterenga/ Alessandro $4 colabore com um io de difrenga./fAquinasalade aula existem dferengastt7 35 Assim! Namicrocena 1, professora comeca ativando o pré-conhe- cimento dos alunos, que constitui 0 propésito pedagégico da macrocena como um todo, ¢ que se estende, portanto, pelas outras seis microcenas seguintes. Referindc-se ao titulo, ela tenta trazer a tona a questio da diferenga que vei ser o tema da histéria que vvdo ler (linhas 1.1, 2€ 3). O primeito tipo de diferenga mencionado ‘elaciona-se 2 diferenga de classe (1.9 e 10) e o segundo parece ‘er a ver com pontos de vista diferentes (I. 24-32). A professora e ‘0s alunos ainda esto construindo ursa base comum de conheci- mento sobre a qual podem elaborar o significado nas préximas microcenas. A professora conduz a interagio, o que & tipico de aassimetrias em sala de aula, solicitando que os alunos exemplifi- quem tipos de diferengas. Esses so, na verdade, definidos pela professora (classe social na I, 11 ¢ opinides na 1. 3), conforme esperado em assimetrias interacionais em sala de aula. Ou seja, a professora esté explicitando 0 que os alunos querem dizer. As diferengas de classe social parecem estar sendo tomadas como diferengas entre as pessoas expressas em diferentes pontos de vista, jd que sio listadas pelos participantes como se fossem diferencas ao mesmo nivel. O fato de que a diferenca de classe relaciona-se & identidade social da pessoa, que € posicionada diferentemente no discurso por causa de sua classe, néo é considerado. Isso no quer dizer, porém, que diferentes pontos de vista no colaborem para posicio- nar as pessoas de forma diferente no discurso; contudo, suas identidades sociais nao sio tio obviamente afetadas na repre~ sentagdo discursiva que os participantes fazem uns dos outros a0 interagirem, como € 0 caso da classe social. Em outras palavras, sto diferengas em nfvel diferente, e que tm fungdes diferentes na representagdo que as pessoas fazem umas das outras. Por outro ado, pode-se argumentar que, nesse ponto da aula, a professora pode estar meramente tentando ativar a nogo de diferenga como uma questo geral, e que os discursos de identidade que esto sendo gerados tomario outra direcdo. Veiamos o que acontece nas microcenas seguintes. ‘Mierocena2: Localizando adiferencanaculaprofissionalecliente 36 P: Sim De que tipo! 37 A: Os professores eos alunos.// 38. P: Voc’ acha que hi uma diferenga de trtamento/ entre professores e alunos./ Dé 39 pra voct /s6 um instantinho,/(eixe eu ver aqui o Alessan- 10. ds pra voe8 especificas! a 40 um pouco mais isso/ detalhar um pouco maisJque tipo de liferenga vocé v8 4L Ask) 42. P: Heia?/ $6 ura minutinho/ que eu quero ouvir Alessan- rol Alisson!/ Alisson € 43 Catlos Eduardo! // Pala Alessandro, algum exemplo dessa diferenga/ qual €a 44 diferengatt! E de idade a que mais! 45° A:finaudtvel) 46. P: AbY/Voct diz que hauuma diferenga de tstamento/ entre alunos e professores./ 47. ‘Tanbém,/pode servamo ver/f/! Rafzel/Monique’! engatl! Tambémn/ né2H/ O ‘Aqui, 2 diferenga em discussio refere-se as identidades de profissionais e clientes, isto é, professor e alunos (1, 36-37), tomadas como um outro tipo de diferenga ao mesmo nfvel dos outros jé mercionados. A questo da assimetria discursiva entre alunos e professores, que os faz agir socialmente por meio do discurso de forma diversa, néo é considerada. Na verdade, a professora neturaliza (Fairclough 1989) as diferengas entre pro fessorese alunos ao caracterizé-las como diferenca de idade (1.43) ede tratamento entre eles (1, 46), em vez de chamar atencdo para_ como professores e alunos esto posicionados diferentemente no iscurso, tendo em vista, entre outros aspectos, os papéis di Sivos que exercem. Essas diferencas parecem ser tomadas como intrinsecas as identidades sociais de professores e alunos e no como sendo cons- trufdas no discurso. De feto, 0 discurso nessa cena € usado para construir a identidade social de ambos em dois niveis: a) os préprios significados em construgdo que naturalizam a diferenga entre 0 professor ¢ os alunos, como jé apontei; ¢ b) 0 padrao iniciago-res- 2 posta-avaliagio usado, tipico da interagio em sala de aula (como jé indicado na andlise da microcena 1), em que profes- sores sto posicionados como Ifderes da assimetria interacional de sala de aula (1. 36 e 37, por exemplo) por causa de seus papéis como iniciadores dos processos de construgio de signi- ficados em sala de aula (Cazden 1988; Moita Lopes 19952). elo fato de que, em geral, os professores controlem 0 t6pico em sala de aula (Moita Lopes 1995a) e os enquadres interacio- nais (Moita Lopes 2000), eles mais provavelmente controlam 0 significados em processo e, por extenséo, as identidades sociais que estio sendo posicionadas em sala de aula. Esse padro interacional é detectado nas demais mictocenas e é tipico desse grupo, como j4 demonstrei em Moita Lopes (1994a), no qual a abordagem etnogriifica era macro. Pode-se argumentar que, devido ao fato de a professora estar posicionada em um papel de maior poder em relagio aos alunos, pode estar controlando as identidades sociais possivei serem desempenhadas pelos alunos em aula. Assim, ¢s visdes que ‘ds alunos esto construindo em relagao as suas identidades sociais, podem estar sendo influenciadas pelos discursos de identidade gerados na sala de aula, Néo estou dizendo, contudo, que as identidades de resisténcia dos alunos em relagdo ao modo como estio sendo posicionados em sala de aula niio podem estar em desenvolvimento, ainda que nao sejam explicitadas neste momen- to. Além disso, teria que se considerar o fato de que as identidades dos alunos estio sendo influenciadas por outras forgas discursivas contraditérias das quais participam na escola (em outras aulas, no recreio etc.) ¢ fora da escola. As identidades sociais nfo sio ‘monoliticas, conforme j4 apontei. 8 Microcena 3: Diferenga ~ gosto e religido 48 A: B/também tem assimJ/por exemplo eu gosto de wvaJat Jofio gosta de magiaf eu 49. falo:/ Ah/ eu nfo gosto de ma gostar/ maga é muito 50 ruim/ voc tem que gostar de wva/ uva € gostosou/! SIP: AhJ é uma diferenca de gosto/ né isso! HA uma iferenca nas pessoas do gostod '52_n62// Gosto de cores de sabores/! Perteito/ Lilian 53. A: Das eoligises também ‘54 P: Difecengas rligiosas/As pessoas respeitam,/LflianJes- voc tambérnio tem que sas diferengasreligiosas?// 55. A:NuoJ! 56. P: Nao respeitam as diferengas religiosas/! Bom nds ja vimos aqui/ alguém mais, ST Alexandred! Na microcena 3, a questo da diferenga parece ser trivia- lizada ao focalizar o tema “gosto” (I. 48-49) e é reduzida pela professora ao fato de que as pessoas gostam de coisas diferentes ~ uma questo de escolha (1. 51). Ou seja, a diferenga é vista de forma semelhante como a questo de opiniGes diferentes na microcena 1, As diferengas religiosas também parecem ser representadas como uma escolha ¢, na verdade, parece estar implicito que podem ser comparadas com preferéncias diferen- tes por comida e cores (I. 51-53). Dessa forma, as identidades religiosas parecem estar sendo entendid Ihi _das por pessoas em vez de construfdas em préticas discursivas ‘especificas onde essas pessoas agem. O que estou indicando é que novamente aspectos do sujeito social nao so problemati- zados em sala de aula. 44 -Microcena 4: Diferenga ~ tamanko e condisofisica 58 A: Olha 56, por exemplo, o Sandro é magro e a Vanessa 6 sol! (0 alunos rem]. ‘59. P: Entio,/nos eres humanos! existem diferengas nos tipos| fisicos iP 60 A: Gnauvel) 61 P: Entdo, hd diferengas de atitudes/ de comportamentos./ 62. A: Umaé excepcional/ a outra 6 pecfeita/! 63. P: Olha/ ele lembrando aqui ele t lembrando aqui uma diferengal que existe entre 64 a5 pessoas, o problema do deficiente fisico/ algumas pessoas sho perfeitas 65. fisicamente/ e outras tm deficiéncias fsicas/ Bom/ en- o/ os deficientes// 66 :Professora/temoutratambém, diferengas de tamanho/ porque em nossa 67 tociedade/ 0 grande gosta muito de abusar do menor até aqui no colégio tem {68 exemplos/ Tem card da 505/ ou da $04/ que quer abusar dos da 501 € S02 ‘Aqui, 0 foco & em diferengas em termos de tamanho & condigao fisica, que parecem ser construfdas como dadas, isto é, as pessoas sto assim (1. 58-61), e as diferengas so, portanto, naturalizadas (1. 61). Desse modo, tais diferencas no sio_cons _deradas da perspectiva de como as identidades sociais des “pessoas sic construfdas em priticas discursivas. Veja, por exem- plo, a diferenga de constituigao fisica entre as pessoas: a do gordo, que provoca risos na 1. 58, € construfda de modo negativo nas préticas discursivas contemporineas (quando magreza é um ideal de beleza), em oposigao a outros momentos da histéria quando a identidade do gordo nao seria construfda da mesma forma. ‘ss Microcena 5 + Avaliando a diferenga o 0 n n B " 15 6 n 8 np 80 8 8 8 ey 85 86 87 88 P: Entlo/ & uma diferenga de poder vamo dizer as- sim/Agora uma outa pergunta/ {Jf que a gente listou aqui uma série de diferencasy/ na ‘opinio de voces, eu vou pedir que um faled n€2// Que levanteo brag e fale um de cada ver n€E a gente vai ‘ouvir af um admero que for possvel Na opinis de voces as diferengas so coisas boas! ‘00 ruins?/ E bom que no mundo existam diferengas! ox ‘02H Ou existem certas liferengas que atrapalham! Alisson../! A: Tem diferengas! P: Alisson/ olhas6/ Vocétérespondendo aminha pergun- 9 2/ Eu 16 perguntando se 1s diferengas so coisas boas! ou ruins/! Monique. ‘A: Ruined | P: Ruins? Fala Moniqued! ‘A; Sim, porque as diferengas/ 0 rico/ de qualquer jeito um dia um rico pode ficar pobrey ele ndo pode levaro dinheiro dele pra ual porque ‘um bandido pode roubard/! P: Ainda acho que vocés ainda no responderam a minha, pergunta// ‘A: Bu acho que seria bom tr diferengas/ porque jé pensou se todo mundo gostasse dda mesma coisa?! Prissol/! ‘A: Comoiaser/todo mundo gostando do mesmo trabalho’ todo mundo gostando das mesmas coisas, da mesma roupa/ ia ser chatod! P: O mundo‘ ser chato/ monétonoy! ia ser sempre tudo Jgual/ Entio, a ciferenga./! 46 89 A:Todo mundo tem sua opinidou! 90 Pr Issol/ A diferenca € uma coisa boa/ A natureza/ ela ‘gosta da diferenga ou ndo2it 91 Als: Gostall! 92 P: Sim/Nés vemos af a variedade de espécies no mundo snimal/ no mundo vegetal! 93. no.eino vegetal/ néissoI/ As diferencas dos seres huma- nos, como é bom cada um 94 aqui ter uma carinha/ ter um tipo de corpo/ um tipo de cabelo/ ter uma altura/ n€2i! 95 Cada um aqui tem um comportamento diferente do outro. ‘A microcena 5 comega com a avaliagéo da professora a respeito de diferengas de tamanho (o foco da microcena anterior) como poder (1. 69). Essa linha poderia ser parafiaseada como: algumas pessoas so mais fortes, assim elas deveriam ser mais poderosas. Novamente, adiferenga parece ser construfda como sendo Intrinseca i natureza fisica dealgumas pessoas, A seguir, professora ‘continua pedindo aos alunos para avaliarem as diferengas na socie~ dade, que parecem ser novamente construfdas como atributos natu- raisdas pessoas. Alguns tém algumas caracteristicas enquanto outros, possuem outras (I. 83-88). Esse ponto de vista ¢ confirmado adiante pelas palavras da professora,nas 192-95, nas quais aponta claramen- te a natureza intrinseca das ciferengas entre as pessoas a0 comparé- las a diferengas entre espécies da fauna e da flora. ‘A professora ndo considera 0 fato de que os seres humanos, como usuarios da linguagem, constroem a si préprios ¢ aos outros assim como a realidade socizl por meio do discurso, isto ‘ujeitos a0 discurso, Portanto, a questi relativa-a-como-essas diferencas so representadas no discurso ¢ como isso afeta.o mado ‘comoaas pessoas agem na sociedade. Como argumentei anteriormen- ‘fe, as identidades sociais nfoestZo nos individuos, mas so construi- a das nas interagdes com as pessoas. A questo aqui, ¢ nas outras microcenas, esté relacionada ao modo como o discurso & concebido pela professora e, portanto, a como essa concepgao define: a) sua prética pedagégica; e b) como os alunos constroem suas identidades sociais nas préticas discursivas na escola. ‘Microcena 6: Localizando, novamente,adiferenganaaula~alunos 96 P: Agora/pergunto eu aqua curma SOU: na $01 pra sete tentarfcitar um pouco 97. mais 0 nosso racioenio/ na S01 n6s observamos 0 5° peta iterenga/ Kérciat/ O 98 queue voce sche?! Aqui na S01 hé um respit a diferen- ‘g22/ Cada colega respeita 0 99. fito de ser diferente do outa ou n807/ © que que voot cbservst 100 A Mais ou menos/P TOL F:Mais ou menos/ Voct poderi darum exempo2tl 102 A: Tem alguns que/ por exemplo/ 0 Alex todo mundo teign com o Alen porque 103 schamquecle€pequenninho/ Quando aprofessorabiza! ele comegaachora © 104 todo mundo fala que ele & chro 105 F Esto as pessoas nfo repeitam 0 Alex/ 106 A: Nemo Alessandrot? 107 42:Nema Alexandeay 108 43: Nema Apaeciday 109. F Entio/ no ho res

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