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Paulo Leminski
a ditadura da utilidade
A burguesia criou um universo onde todo gesto tem que ser til. Tudo tem que
ter um para qu, desde que os mercadores, com a Revoluo Mercantil, Francesa
e Industrial, substituram no poder aquela nobreza cultivadora de inteis
herldicas, pompas no rentbeis e ostentosas cerimnias intransitivas. Parecia
coisa de ndio. Ou de negro. O pragmatismo de empresrios, vendedores e
compradores, mete preo em cima de tudo. Porque tudo tem que dar lucro. H
trezentos anos, pelo menos, a ditadura da utilidade unha e carne com o
lucrocentrismo de toda essa nossa civilizao. E o princpio da utilidade
corrompe todos os setores da vida, nos fazendo crer que a prpria vida tem que
dar lucro. Vida o dom dos deuses, para ser saboreada intensamente at que a
Bomba de Nutrons ou o vazamento da usina nuclear nos separe deste pedao
de carne pulsante, nico bem de que temos certeza.
alm da utilidade
Vivemos num mundo contra a vida. A verdadeira vida. Que feita de jbilo,
liberdade e fulgor animal.
Cem mil anos-luz alm da utilidade, que a mstica imigrante do trabalho cultiva
em ns, flores perversas no jardim do diabo, nome que damos a todas as foras
que nos afastam da nossa felicidade, enquanto eu ou enquanto tribo.
Quem quer que a poesia sirva para alguma coisa no ama a poesia. Ama outra
coisa. Afinal, a arte s tem alcance prtico em suas manifestaes inferiores, na
diluio da informao original. Os que exigem contedos querem que a poesia
produza um lucro ideolgico.
Existe uma poltica na poesia que no se confunde com a poltica que vai na
cabea dos polticos. Uma poltica mais complexa, mais rarefeita, uma luz
poltica ultra-violeta ou infra-vermelha. Uma poltica profunda, que crtica da
prpria poltica, enquanto modo limitado de ver a vida.
o indispensvel in-til
As pessoas sem imaginao esto sempre querendo que a arte sirva para alguma
coisa. Servir. Prestar. O servio militar. Dar lucro. No enxergam que a arte (a
poesia arte) a nica chance que o homem tem de vivenciar a experincia de
um mundo da liberdade, alm da necessidade. As utopias, afinal de contas, so,
sobretudo, obras de arte. E obras de arte so rebeldias.
Com o radical incmodo de urna coisa in-til num mundo onde tudo tem que
dar um lucro e ter um por qu.