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STONEWALL MAGAZINE

SYRZIA NO COMANDO
Quais as consequências da “reestruturação” da dívida pública que o
partido eleito está propondo.

PRIORIDADES NA SAÚDE
Explicamos os vários tipos de sistema de saúde e analisamos os prós
e contras de cada um.

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2
STONEWALL MAGAZINE

EDITORIAL 5

6 POLÍTICA

ECONOMIA 10

14 SAÚDE

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4
EDITORIAL
I
gento dest, nem quo ducidem iliquas magnat.
Sed ut a santiones unt, conse doluptiunt fuga. Ibus
illa quiatis doluptate parcipsanto quaectus enimusapiti
testrum ut aut eum faciis dolupic turesequas ea dolessin
reiciaesto odipsus qui dus denis volorpore atur aut harum
EDITOR CHEFE quam qui duntion ex explabo. Abo. Et faceatquam quis ex
eatium autaquae. Ehenihi litae. Et eat.
João Claudio Arendt, Universidade de Pudis ea dio. Nequis que pa quosam cupis dolorem ol-
Caxias do Sul, Brasil lectasped magnime ndebiti sciligendis dolestr umquunt
usdaecus eum is doluptas dolora quae venihit omnimi, ali-
CONSELHO EDITORIAL gentios dest aces es dentium quisque dusciis earcit rer-
ferit, unt, occusandi doloreic to is voluptis sam eum as as
Antonio Dimas, Universidade de São
voluptatibus voluptature aut eserum dolorit am quam do-
Paulo, Brasil;
Ruben George Oliven, Universidade
loreria escienisit esequo denesto offici dolorrovit optatet
Federal do Rio Grande do Sul;
asim rem fugia nem cullore hendus doloresci qui blam nu-
Beth Brait, PUC- São Paulo; sam estem volorempor sequam voluptat aut ut et et volo-
Cecil Jeanine Albert Zinani, Universi- ria cum quo experum quibusae parchitatur, sit at amendi
dade de Caxias do Sul, Brasil; conecte mporpor simus et et as apercim eario est et om-
Cinara Ferreira Pavani, Universidade nisquis ea de conse earcilis que dia qui offici vent et essi
Federal do Rio Grande do Sul, Bra- core dolorendam et porerit aspeles cipsumquo invent, sit
sil; ea vollorrum a prae. Lorem dessund endam, utemporeri te-
Marlene Teixeira, Universidade do Vale cum fugia qui dolor aute omnihit, cus, cum quis este ipsam
do Rio dos Sinos, Brasil ; ea plit parum sitis intur sequam fuga. Neque nis voluptas
Gentil Faria, Universidade Estadual
es aliae ium re nonsequunt.
Paulista, Brasil, Brasil;
Germana Maria Araújo Sales, Universi-
Nat lam, quistius quae sum aut et vent eni dolupti se-
dade Federal do Pará;
quist et et optatqui atis doles sant alit officia volectur, sa-
Jens Wolff, Universidade de Hambur- menda dit accusapicae parum, apis eaque voluptaquiam
go, Alemanha; rem quundi que liaeprae ducius de aceaquodi conse vita-
Jürgen Joachimsthaler, Universidade tem none qui si ditae labo. Ibus, volut alit, temodio quisque
de Heidelberg, Alemanha; odit ad quid esti cus ut as quibusandus ut quam enduciam
Lisana Teresinha Bertussi, Universida- fuga. Rundae si rerrovid que simagnam resciento dipsum
de de Caxias do Sul, Brasil; quaectatest dolorem si reprecus.
Luciana Murari, Universidade de Ga. Paruptu rempor aut andignam et laccus sit vit vo-
Caxias do Sul, Brasil; lent la volendam aut eos aborro ipsum sed quae. Et liatius,
Marcel Vejmelka, Uni-Mainz - Alema-
sam ium rerunt et quiat alit eum ulpa sit omni coreptaquae
nha, Alemanha ;
Marilia Conforto, Universidade de
eum faccae laccustisci tem et quis et as duscil et quaspiet
Caxias do Sul, Brasil;
pra prem landae serum eos dolorro ipit explacia volupta-
Rafael J Santos, Universidade de tenis aborrum fugitata dolecero quibus et pere autenis es
Caxias do Sul, Brasil; rehenis archill upturibeat aspicitiur? Quis nis eationest, co-
Regina Zilberman, Universidade Fede- neture volesciis estius posam et pe periasperior ad ut ali-
ral do Rio Grande do Sul, Brasil ; bus. Nam res eumquas doluptae. Eniet, oditate mporis ea
Roberto Henrique Seidel, Universi- nobit, nossit ut eliquas pistrum re porum hitatur.
dade Estadual de Feira de Santana - Udae alibus soles andebis incient rerumque pliquia
UEFS, Brasil; vene que inullam accum invellu ptasperis experiberis ius
Valéria Neto de Oliveira, Universidade eicienet restia culliquamet estist, sa duntur?
Federal do Rio Grande do Sul, Brasil;
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O ESPÓLIO
GREGO

COMO O GOVERNO
GREGO ESTÁ
ESPOLIANDO OS
PAGADORES DE
IMPOSTOS DA UNIÃO
EUROPEIA
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O triunfo do Syriza, que muitos consideram “histórico”, representa um fato político de primeira ordem na Europa.

O
principal objetivo do novo gover- equivalentes a 7,3% do seu PIB. Esta era,
no grego, sob comando do partido de fato, a carga mais alta da Europa e difi-
Syriza — que é um acrônimo para cilmente era sustentável. No entanto, hou-
“Coligação da Esquerda Radical” —, é ve uma reestruturação da dívida grega —
“reestruturar” o insuportável fardo da dí- orquestrada pela Troika — em 2012, o que
vida pública grega, que atualmente é de fez com que o país conseguisse reduzir o
175% do PIB do país. fardo dos juros para 4% do PIB.
Segundo os integrantes do novo gover- Embora tal valor não seja baixo, ele
no, a Grécia não tem como pagar essa dívi- tampouco é insustentável. Com efeito, paí-
da, o que faz com seja imprescindível uma ses como Irlanda, Itália e Portugal — que
profunda reestruturação da mesma. Mais até o momento ainda não pediram rees-
especificamente, o novo truturações de suas dívi-
governo quer alargar os “Boa parte do discur- das — estão enfrentando
prazos de vencimento, re- custos financeiros muito
duzir as taxas de juros que
so sobre a insusten- maiores que os da Grécia.
incidem sobre a dívida to- tabilidade da dívida E, se levarmos em conta
tal, e até mesmo simples- que o PIB da Grécia está
mente reduzir o valor total total da Grécia é in- no subsolo (já caiu 23%
da dívida, o que significa fundada.” desde seu pico), e que cer-
um calote parcial da mes- tamente está muito abai
ma. xo do que poderia ser caso
A realidade, no entanto, é que boa par- houvesse uma liberalização e uma estabi-
te do discurso sobre a insustentabilidade lização econômica, é difícil concluir que a
da dívida total da Grécia é infundada. Nas reestruturação de sua dívida seja uma ab-
economias modernas, caracterizadas por soluta e inexorável necessidade.
governos expansivos e moedas inflacioná- Para completar, o prazo de vencimento
rias, o principal da dívida pública nunca é da dívida grega é, disparado, o mais eleva-
quitado; tudo é refinanciado. A dívida não do de toda a zona do euro, e também de
se paga; ela é rolada. toda a União Europeia.
Sendo assim, o custo de o governo es- O mesmo ocorre com a taxa média de
tar endividado depende exclusivamente juros sobre a dívida, que é a quarta mais
das taxas de juros que o estado paga sobre baixa da zona do euro. É, inclusive, mais
o conjunto de sua dívida pública. baixa do que a da Alemanha.
Em 2011, a Grécia tinha de pagar juros Em outras palavras, os cidadãos eu-
7
POLÍTICA
ropeus estão, por meio de
seus impostos, subsidiando
o governo grego. Seus im-
postos estão sendo utiliza-
dos para estender crédito
ao governo grego, por meio
da Troika, a condições bem
mais vantajosas do que a
que eles próprios usufruem.
É como se você se endivi-
dasse a 10%, me emprestas-
se e me cobrasse 5%: você,
obviamente, está perdendo
dinheiro com essa opera-
ção.
E o governo grego ain-
da quer mais privilégios. Gráfico 1: total de juros que incidem sobre a dívida pública em relação ao
Então, se não há muita PIB, 2013. Fonte: Eurostat
margem nem para aumentar
os prazos do vencimento da
dívida grega (que já são os
maiores da União Europeia)
e nem para reduzir as taxas
médias de juros, o que mais
pode ser feito em termos de
reestruturação da dívida? A
única hipótese que resta é
um calote da dívida.
Quanto a isso, convém
lembrar que a dívida do
governo grego em mãos
de credores privados já foi
submetida, em 2012, a uma
redução de 53,5% do seu
valor nominal. E, se a isso
somarmos o alargamento
do prazo de vencimento e a
redução dos juros inciden- Gráfico 2: vencimento médio da dívida pública em 2013 (anos)
tes sobre a dívida total, a dí- Fonte: OCDE
vida grega já sofreu uma re-
dução de nada menos que
75% do seu valor nominal.
Sendo assim, por que
os pagadores de impostos
da União Europeia devem
conceder ao governo grego
mais uma rodada de privilé-
gios?
Para completar o ultraje,
vale lembrar que o governo
grego é um dos mais perdu-
lários da União Europeia.
Seus gastos totalizam
nada menos que 58,5% do
PIB. Esse valor é maior até
que o da Dinamarca (57,2%
do PIB), da França (57,1%)
e da Suécia (52,8%). Será
Gráfico 3: taxa média de juros sobre a dívida pública em 2013.
que é realmente impossível Fonte: Eurostat
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o governo grego cortar gastos? Reduzir verno grego; além de dar o calote, o novo
um gasto público que chega a soviéticos governo grego também quer continuar re-
58,5% do PIB é impor “austeridade draco- cebendo empréstimos para aumentar de
niana”? maneira substantiva seus gastos (estão
No entanto, convém não dramatizar a prometendo mais benefícios sociais, ener-
questão do calote. Toda e qualquer pessoa gia gratuita para 300 mil gregos, e mais
que investe nos títulos da dívida pública de moradias populares) sem ter de aumentar
um país tem de estar ciente de que, em impostos.
algum momento, esta pode ser caloteada Ou seja, ele não quer pagar sua dívida,
pelo estado emissor, sem que o investidor mas quer continuar emitindo dívida e sen-
possa forçar o estado e lhe pagar (uma do livremente financiado.
vez que a soberania estatal impede que Essa quadratura do círculo é impossí-
ele seja forçado a executar seus próprios vel, obviamente. Se o Syriza de fato optar
contratos). Sendo assim, a amortização da pelo calote, aí sim é que ele terá de enfren-
dívida pública no prazo acordado se torna tar uma verdadeira austeridade. Sem aces-
uma mera questão de boa fé. Nada mais so ao financiamento de credores externos,
do que isso. o governo grego não mais poderá incorrer
Portanto, os investidores — privados e em déficits; ele só poderá gastar exclusi-
estatais (80% da dívida grega está em pos- vamente aquilo que arrecadar por meio
se de organismos oficiais) — que aplicaram de impostos. Logo, e ironicamente, a “as-
nos títulos do governo grego têm de acei- fixiante ultra-austeridade” contra a qual o
tar as consequências e assumir os riscos Syriza diz lutar irá realmente ocorrer caso
que voluntariamente correram ao empres- o partido dê o calote. E a Grécia terá de
tar para o governo grego. vivenciar essa austeridade por vários anos,
Por outro lado, do mesmo modo que até que o governo eventualmente recupere
os investidores devem arcar com a respon- sua credibilidade perante os investidores
sabilidade de ter concedido crédito a um estrangeiros.
governo que a qualquer momento pode Em suma, se o Syriza não quer pagar a
calotear impunemente sua dívida, o gover- dívida do governo grego, não pague. Mas
no grego também terá de aceitar as con- que sofram as consequências. Assim como
sequências de decretar um calote unilate- os gregos têm o direito de votar em quem
ral em sua dívida: no caso, será impossível quiserem, os demais pagadores de impos-
continuar financiando seu déficit público. tos da União Europeia também têm o di-
A plataforma do Syriza não é simples- reito de não mais financiar o perdulário e
mente a de não pagar as dívidas do go- caloteiro governo grego.
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ECONOMIA

O DEVER DE EMP
Por: Ricardo Escobal

O
assunto é aborrecidamente óbvio, de de uma economia, assim como um alto
mas infelizmente é necessário repri- nível de energia pode ser um indicativo de
sá-lo constantemente, pois ele apa- um corpo saudável. Mas assim como subs-
rece na imprensa quase que diariamente. tâncias nocivas podem artificialmente dar
Afinal, desemprego baixo é sinônimo de ao viciado aquele impulso energético que
economia robusta? Ou, colocando de outra nada tem a ver com saúde, empregos arti-
maneira, pode uma economia fraca apre- ficialmente criados e mantidos apenas exa-
sentar baixos índices de desemprego? cerbam os problemas.
Ao contrário da crença da grande maio- Você pode dar a alguém um “empre-
ria das pessoas (leigos e até mesmo econo- go” de cavar um buraco num dia e tapá-lo
mistas), o objetivo de uma economia não é no dia seguinte — ou talvez o equivalente
criar empregos. O objetivo de uma econo- a isso, porém executado em uma escrivani-
mia saudável é ter uma produtividade cres- nha. Mas isso não trará benefício nenhum a
cente. Empregos serão uma consequência ninguém. Da mesma maneira, seria possível
positiva da produtividade. reduzir o desemprego a zero por meio de
Empregos podem ser um sinal de saú- uma regressão compulsória na tecnologia:
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de vida de todas as pessoas.

Um exemplo

Um país de economia fechada pode


ter — e certamente terá — um desemprego
menor do que um país de economia aberta.
No entanto, a questão é: será que tais em-
pregos estão realmente gerando valor e ri-
queza para esse país de economia fechada?
Vamos a um exemplo prático. Suponha
que uma economia tenha várias pessoas
empregadas na indústria automotiva, des-
de as linhas de montagem até as cadeias de
distribuição e de peças de reposição. Isso é
bom para a economia como um todo? De-
pende.
Se a indústria automotiva deste país
está sujeita à concorrência de carros es-
trangeiros, os quais podem ser livremente
comprados pelos cidadãos deste país, sem
tarifas de importação, então essa indústria
automotiva é eficiente, e os empregos que
ela consegue manter certamente são de alta
produtividade e geram um produto de alta
qualidade. Afinal, se mesmo com a concor-
rência de carros estrangeiros a população
nacional ainda assim segue comprando os
carros fabricados nacionalmente, então é
porque o produto é bom, a indústria é efi-
ciente e os produtos fabricados por seus

PREGAR
trabalhadores satisfaz os consumidores lo-
cais.
Porém, e se essa indústria automotiva
emprega muita gente simplesmente porque
ela é protegida por altas tarifas de impor-
tação, as quais impedem os consumidores
nacionais de terem acesso barato aos car-
ros estrangeiros?
Nesse caso, há uma grande chance de
os empregos mantidos por essa indústria
serem artificiais e ineficientes, pois ela agora
poderíamos abolir completamente o uso de está operando em um ambiente semelhante
caminhões e trens, e obrigar toda a carga a uma “reserva de mercado”. No mínimo,
a ser transportada de carro. Isso criaria mi- esses empregos não existiriam na quantida-
lhões de novos empregos. Ou poderíamos de que existem atualmente caso a aquisição
também abolir o uso do carro e criar ainda de automóveis importados fosse mais fácil.
mais empregos, pois agora as pessoas só No primeiro exemplo, os trabalhadores
poderiam transportar carga nas costas. da indústria automotiva de fato estão crian-
Em cada um desses casos, o número de do um produto valoroso para a sociedade, e
empregos criados iria superar com ampla isso é nitidamente demonstrado pela prefe-
margem o número de empregos perdidos rência voluntária dos consumidores. Dado
na indústria de caminhões e na automotiva. que eles têm a opção de comprar carros im-
Mas fica a pergunta: essa criação de empre- portados baratos, mas ainda assim optam
gos por acaso nos deixou mais ricos? Por por comprar maciçamente os carros nacio-
acaso aumentou o nosso bem-estar? A res- nais, então isso é um sinal de que o produto
posta é óbvia. Essa criação de empregos, é satisfatório aos preços a que estão sendo
na prática, gerou uma redução no padrão vendidos, o que significa que os trabalha-
11
ECONOMIA
dores dessa indústria estão sendo eficientes apenas um homem com uma máquina seria
em criar um produto de valor para a socie- capaz de fazer não é um exemplo de econo-
dade. mia pujante ou rica, mas sim de desperdício
Já no segundo exemplo, os trabalhado- de recursos. Você terá uma baixa taxa de
res da indústria automotiva estão operando desemprego, mas não estará criando rique-
dentro de um mercado protegido pelo es- za de forma eficiente.
tado. Isso é uma receita certa para a ine- Consequentemente, o objetivo de se al-
ficiência. Devido às altas tarifas de impor- cançar uma baixa taxa de desemprego não
tação, que praticamente proíbem a compra deve ser apenas a criação de empregos per
de carros importados, os carros nacionais se; o objetivo tem de ser a criação de em-
poderão ser de pior qualidade e vendidos pregos produtivos e economicamente viá-
a preços mais altos — e ainda assim serão veis.
comprados, pois a população não tem mui- Empregos só são valiosos quando as
ta escolha. pessoas trabalham com o intuito de forne-
Consequentemente, ao ter de desem- cer bens e serviços que são genuinamente
bolsar valores mais altos para adquirir esses valorizados e demandados pelos consumi-
carros, a população terá um renda disponí- dores. Se não há uma real demanda pelos
vel menor para adquirir outros bens de con- produtos fabricados, ou se a demanda é ar-
sumo. tificialmente criada por barreiras à importa-
Os trabalhadores dessa indústria auto- ção ou por outras regulações governamen-
motiva terão salários acima dos de mercado, tais, tais empregos representam um grande
ao passo que o restante da população ficará desperdício de recursos escassos.
com um poder aquisitivo Ao contrário do que
menor do que teria caso “Empregos só são va- alegou Keynes, se todos
pudesse comprar carros
mais baratos do exterior.
liosos quando as pes- os desempregados atuais
fossem compulsoriamente
O exemplo acima soas trabalham com empregados na constru-
abordou apenas um se- ção de pirâmides, isso não
tor da economia. Se você o intuito de fornecer traria benefício nenhum
expandir esse raciocínio bens e serviços que são para a sociedade. No en-
para todos os outros se- tanto, seria ótimo para as
tores — eletroeletrônicos, genuinamente valori- empresas que ganhassem
utensílios domésticos, zados e demandados os contratos do governo
produtos tecnológicos, para fornecer os tijolos e o
vestuário, siderurgia etc. pelos consumidores.” cimento. E seria péssimo
—, começará a ter uma para os reais empreende-
noção de como o seu poder de compra dores, que agora teriam de lidar com pre-
pode ser afetado apenas para garantir que ços mais altos para o tijolo, para o cimento
estes setores tenham mais emprego do que e para a mão-de-obra, o que poderia invia-
o normal. bilizar vários outros empreendimentos mais
O raciocínio econômico só é completo demandados pelos consumidores.
quando ele é capaz de contemplar não ape-
nas o que está ocorrendo com um determi- Conclusão
nado grupo (desempregados e indústrias),
mas sim o que está ocorrendo com todos
os grupos da sociedade. E não apenas no A única maneira de criar e manter em-
curto prazo, mas também no longo prazo. pregos que não produzem realmente aquilo
que o consumidor quer é utilizando o go-
Baixo desemprego, por si só, não verno.
quer dizer nada Seja por meio de subsídios diretos, seja
por meio de regulações que criam um cartel
e proíbem a concorrência, seja por meio de
Por tudo isso, um país ter uma baixa tarifas de importação que criam um reserva
taxa de desemprego não quer dizer nada. de mercado — apenas o governo pode man-
O que tem de ser olhado é o quão produti- ter operante empresas que produzem algo
vo são esses empregos e se eles realmente que não é genuinamente demandado pelo
estão produzindo aquilo que o consumidor consumidor.
quer. Você ter um canteiro de obras repleto E, ao fazer isso, empregos são gerados.
de peões que fazem o mesmo serviço que E eles podem custar muito caro.
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v SAÚDE

O MÉDICO
E O MONSTRO
UM BREVE MANUAL SOBRE OS
SISTEMAS DE SAÚDE - E POR QUE
É IMPOSSÍVEL TER UM SUS SEM
14
FILA DE ESPERA
A
ntes de começar qualquer discus- a analisar as consequências ocultas das
são mais aprofundada sobre os sis- diversas ações que podem ser tomadas,
temas de saúde, é necessário fazer lembrando que boas intenções nem sem-
uma revisão sobre os tipos de sistema de pre geram bons resultados.
saúde que existem. Toda política pública possui efeitos im-
A ideia é simples: mostrar que cada previstos ou indesejados. Sempre vale a
um tem pontos que podem ser positivos e pena perguntar: o que não estamos ven-
pontos negativos, ou seja, não há uma es- do?
colha perfeita e absoluta, mas sim a neces- A definição usada aqui para sistemas
sidade de uma constante avaliação sobre de saúde terá como foco basicamente
as prioridades de um determinado lugar e duas coisas: o ente pagador e o nível de
seu real estado das coisas. Entender as regulação. Esses elementos estão ampla-
diferenças significa abrir portas para me- mente associados, visto que mesmo em
lhores avaliações do que está acontecen- um sistema com gasto totalmente privado
do e do que se deseja para o futuro, seja — como o de planos de saúde —, o estado
próximo, seja no longo prazo. pode ser o grande definidor da qualidade
Nesse sentido, é bom relembrar o eco- de tratamento que as pessoas estão rece-
nomista americano Thomas Sowell, que, bendo, ao reduzir a oferta e aumentar os
ao comentar sobre qualquer política pú- preços com excesso de regulamentações
blica, lembra que devemos sempre pen- — Anvisa, ANS, FDA, HHS, PHEA.
sar nos trade-offs que estão presentes Dessa forma, analisando tanto o as-
na hora de escolher qual caminho seguir. pecto de pagamento como o de regula-
As escolhas devem ser baseadas em uma mentações, não corremos o risco de defi-
análise cuidadosa de prós e contras, e não nir erradamente o que é um livre mercado
em narrativas ou discursos ideológicos. de saúde, como Paul Krugman geralmente
Juntamente a Sowell, temos a análise faz.
do filósofo francês Bastiat, que nos clama Segundo a combinação destes crité-
15
v SAÚDE
rios — fonte de financiamento e tipo de regulamentação
—, três grandes tipos de sistemas de saúde são observa-
dos ao redor do mundo. A medicina socializada, em que
há financiamento e provimento públicos; o sistema misto,
em que o provimento é privado, mas amplamente regu-
lado pelo estado, podendo ter seu financiamento público
ou privado; e o livre mercado, financiado e regulado por
agentes privados.
É importante lembrar que em um mesmo país mais de
um sistema de saúde pode estar presente e ser autoriza-
do pelo governo, como é o caso do Brasil e El Salvador,
em que há o sistema público e também os serviços pri-
vados.
A escolha do modelo de saúde a ser adotada por um
país passa por diversos fatores que vão além da econo-
mia, como características geográficas e sociais, além de
estruturas legais e históricas. Algo que funciona relati-
vamente bem em uma localidade pode falhar em outra.
Entretanto, é essencial lembrar que a escolha presente
vai impactar principalmente as gerações futuras, que vão
colher os frutos das virtuosas ou péssimas decisões to-
madas pelos governantes.

A medicina socializada

O sistema socializado de medicina, como o Sistema


Único de Saúde brasileiro, parte geralmente de duas pre-
missas: saúde é um direito que deve ser fornecido pelo
estado; e o governo consegue controlar o fornecimento
deste serviço de forma a ter uma cobertura ampla para
toda a população evitando discriminação econômica,
geográfica e social.
A partir destas premissas, temos a construção de mo-
delos de cobertura e organização de serviços totalmente
diferentes, podendo ser amplamente centralizados, como
no caso da extinta URSS e do Brasil — por mais que, no
papel, os municípios tenham uma responsabilidade maior,
o Ministério da Saúde tem sido o grande determinante
das políticas públicas brasileiras —; ou descentralizados,
como o visto durante os anos 2000 nos países nórdicos e
parcialmente no Reino Unido.
A característica em comum é o estado ser fornecedor
da saúde, dono de hospitais, clínicas, ambulâncias e em-
pregador dos profissionais que trabalham na área de saú-
de (desde o limpador de chão até o neurocirurgião espe-
cialista em microvasculatura). Na prática, com a intenção
de ampliar o atendimento a todos, não é o rico que paga
pelo pobre, mas o saudável que paga pelo doente.
Mas este sistema é politicamente popular porque
ele fornece a ilusória vantagem de que as pessoas não
precisam desembolsar diretamente o dinheiro para ter
acesso ao sistema de saúde, já estando cobertas quan-
do de qualquer necessidade. Isso diminui a necessidade
de poupança para pagar possíveis tratamentos médicos,
impede que uma pessoa vá à falência por causa de uma
internação e também libera as pessoas para incorrer em
riscos, como a compra de um apartamento, ou o investi-
mento em uma empresa — visto que os gastos com saúde
16
“A escolha do modelo
de saúde a ser adota-
da por um país pas-
sa por diversos fato-
res que vão além da
economia, como ca-
racterísticas geográ-
ficas e sociais, além
de estruturas legais e
históricas. Algo que
funciona relativa-
mente bem em uma
localidade pode fa-
lhar em outra.”

17
v SAÚDE

já estão garantidos pela sociedade.


Há uma alegada cobertura universal igualitária — presente normalmente só no papel
e não no fornecimento do serviço —, em que ricos e pobres têm acesso aos mesmos
tipos de médicos.
Teoricamente os mecanismos de seleção para tratamento se baseiam em critérios
como ordem de chegada ou gravidade da doença. Assim, a promessa é de que o esta-
do vai cuidar das pessoas sempre que elas precisarem, sejam ricas ou pobres, estejam
relativamente saudáveis ou em situações gravíssimas.
O financiamento desse sistema pode se dar basicamente de duas formas:

Contribuição igualitária individual, em que cada pessoa paga um valor fixo para o
estado por ano, e o governo aloca os recursos conforme achar necessário. Seria algo
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similar a um plano de saúde estatal. diátrico, medicamentos em dosagens que
não são condizentes com o que os pacien-
Pagamento por meio de impostos, tes necessitam, excesso de um tipo de li-
sendo mais ou menos progressivos con- nha de sutura e falta de outros, e assim
forme o país. Esses impostos podem estar por diante.
sobre a renda, o consumo ou a proprieda- Esse contexto incentiva o crescimento
de. Sendo essa a forma de financiamento do mercado negro, onde medicamentos
do SUS. são revendidos e pessoas conseguem ter
acesso a serviços não ofertados pelo go-
Assim, o clamor de que os ricos pagam verno — muitas vezes de qualidade duvi-
pelos pobres não é necessariamente fac- dosa.
tual, visto que um pobre saudável que não Como os burocratas não precisam as-
use o sistema de saúde financiará um rico sumir os custos de suas más decisões, vis-
doente. Nesse modelo, os custos são divi- to que muitas vezes permanecem no cargo
didos por toda a sociedade e a lógica de mesmo depois de várias escolhas erradas,
transferência de renda é feita dos saudá- há pouco incentivo interno para melhorias.
veis para os doentes. Além disso, o público paga pelo serviço
Recursos são alocados segundo um independentemente do seu uso e da sua
planejamento estatal, com pouca partici- qualidade, o que leva a custos desconexos
pação do mercado, seja na com a realidade, corrup-
definição de preços, seja no
fornecimento de serviços
“Em muitos casos, ção, tráfico de influência e
cartelização impostas pelo
concorrentes. Um burocra- as pessoas che- mecanismo de planejamen-
ta define quantos e quais to central.
profissionais são necessá- gam a morrer es- Inovações tecnológicas
rios para cada grupo de ha- perando pela sua demoram a ser adotadas e
bitantes, e faz as compras o ambiente não cria incen-
de suprimentos conforme vez, enquanto os tivos para investimentos
modelos econômicos que mais ricos conse- privados diretos, visto que
ache razoáveis. há restrição governamental
Pode até haver maior guem fugir do sis- para entrada no mercado.
ou menor controle social No longo prazo, o resul-
do sistema, com a existên- tema pagando por tado de todo sistema socia-
cia de conselhos comuni- fora para médicos lizado de saúde é o racio-
tários de saúde, mas as de- namento do atendimento,
cisões são em si estatais. ou viajando para com longas filas se forman-
Normalmente, critérios téc- outros países.” do e com tempo de espe-
nicos são usados para de- ra significativo. Em muitos
finir quais serviços serão casos, as pessoas chegam a
cobertos pelo sistema de saúde, definidos morrer esperando pela sua vez, enquanto
comitês de análise de custo e efetividade os mais ricos conseguem fugir do sistema
— como o NICE do Reino Unido —, que de- pagando por fora para médicos ou viajan-
terminam patamares de preços aceitáveis do para outros países a fim de conseguir
de se pagar por um tratamento ou um me- seu atendimento médico — vide o caso de
dicamento. Hugo Chávez e Fidel Castro, que recorre-
Adicionalmente, mecanismos como ram médicos espanhóis, e de brasileiros
licitações são usados para definir os for- que buscam tratamentos médicos na Eu-
necedores e geralmente o preço de um ropa e nos EUA.
produto — e não a sua qualidade ou real Vale ressaltar que, no curto prazo, esse
necessidade futura — acaba sendo o prin- sistema pode sim gerar um ganho em
cipal fator para determinar qual será o ga- número de atendimentos. Isso acontece
nhador do processo. quando pelo menos uma de duas coisas
Dessa forma, vemos muitas vezes sen- se faz presente: excesso de profissionais
do usados no sistema de saúde produtos e equipamentos subutilizados no sistema
genéricos que não atendem às necessida- de saúde vigente antes da socialização; ou
des específicas dos pacientes, apesar de preços pagos pelo governo acima daque-
estarem de acordo com o determinado les de mercado. Nesse caso, pessoas que
pela licitação. Isso causa situações como antes não tinham acesso ao sistema de
falta de material cirúrgico-hospitalar pe- saúde passam a desfrutar de atendimento
19
v SAÚDE
médico.
Entretanto, esse desequilíbrio de oferta ou de preços
dura pouco tempo e, em alguns anos, a escassez come-
ça devido à inevitável contenção de gastos governamen-
tais e à incapacidade de a oferta atender a uma demanda
sempre crescente, visto que o preço monetário do serviço
será artificialmente definido como zero.
Um exemplo desse fenômeno está no Reino Unido,
que implementou o NHS no pós-Segunda Guerra e vê o
número de leitos hospitalares cair desde então.
Outro caso notável de perda de qualidade com o pas-
sar do tempo é Cuba. A ilha caribenha apresenta um dos
índices mais altos de médicos por mil habitantes das Amé-
ricas, que se mantém nesse patamar devido ao número de
vagas em faculdades de medicina e à baixa seletividade
dos alunos no processo de entrada — além de um nível de
formação dos médicos considerado deficiente por muitos
especialistas. Mesmo com muitos médicos, hoje já há fi-
las para atendimentos, principalmente especializados, e
a corrupção já é o meio mais eficaz de se garantir a sua
consulta. Além disso, materiais básicos como aspirinas e
utensílios hospitalares são escassos, obrigando pacientes
a comprá-los no mercado negro ou adiar seus tratamen-
tos.

O sistema misto

Um sistema misto apresenta alta carga de regulamen-


tações, fornecimento de serviços por entes privados, e
pode ser financiado pelo estado ou por agentes privados.
Diferentemente do modelo puramente socializado,
nos sistemas mistos o estado não é o dono dos hospi-
tais nem o empregador dos profissionais de saúde. Entre-
tanto, o estado atua definindo quais serviços podem ser
ofertados, quais tipos de profissionais são autorizados a
trabalhar no país e muitas vezes até tabela os preços con-
siderados aceitáveis.
A saúde continua sendo um direito, mas não cabe ao
estado o seu fornecimento, seja porque agentes privados
são mais eficientes, ou porque os sistemas privados já fa-
ziam um bom trabalho antes de o governo decidir entrar
na jogada.
Esse sistema apresenta vantagens em relação ao for-
necimento de saúde pelo governo: menores custos dos
serviços aos pagadores de impostos; competição entre
os fornecedores; maior possibilidade de inovações; mais
liberdade de escolha em relação ao provedor do serviço.
Além disso, há uma garantia teórica de que todo o
serviço oferecido deverá atender a características míni-
mas definidas por regulamentações, o que significaria
uma qualidade básica de atendimento. Pode ainda exis-
tir uma universalidade da oferta do serviço, desde que
dentro de uma cobertura mínima — isso acontece tanto
no sistema com pagamento público, como naquele com
pagamento privado.
O exemplo mais famoso de fornecimento de saúde
por agentes privados e pagamento pelo governo é o Ca-
nadá. Nesse sistema, o governo federal define algumas
20
diretrizes que devem ser seguidas pelas províncias e for-
nece um seguro nacional de saúde que todo canadense
ou residente legal tem acesso. Cada província pode am-
pliar a cobertura definida nacionalmente, o que implicará
mais custos para os governos locais, ou atender apenas
o mínimo nacional. Além disso, as províncias negociam
com os hospitais os valores que serão repassados para o
tratamento de cada doença, e atuam também definindo
quais preços serão reembolsados quando da compra de
equipamentos e suprimentos médicos.
No modelo canadense há certa concorrência entre os
fornecedores dos serviços de saúde, visto que o gover-
no paga conforme o número de pacientes tratados e os
resultados dos tratamentos. Um hospital mais eficiente
tende a ter um fluxo maior de pacientes com menor gasto
de pessoal/equipamento, gerando assim um maior lucro.
Entretanto, como os preços dos repasses não são de-
finidos pelo mercado e sim por burocratas, há um con-
siderável descolamento entre o valor pago e aquele que
deveria ser repassado em uma situação de real mercado.
Assim, os recursos são alocados em áreas que são con-
sideradas lucrativas segundo os repasses estatais e não
naquelas realmente necessárias para população.
Vale a pena lembrar que no modelo canadense, por
mais que as pessoas não estejam pagando abertamente a
conta do hospital, elas continuam desembolsando anual-
mente uma quantidade significativa de dinheiro para sua
manutenção, utilizem ou não os serviços de saúde, e têm
pouco controle sobre a qualidade e tipos de serviços que
lhes são ofertados.
A outra forma comum do sistema misto pode ser vista
no Brasil com os planos de saúde privados, amplamen-
te regulamentados pela Agência Nacional de Saúde Su-
plementar (ANS). Esse órgão do governo federal define
quais tratamentos de saúde os planos devem oferecer —
a chamada cobertura mínima —, além de estabelecer o
número de consultas em cada especialidade a que os se-
gurados têm “direito”.
A Agência ainda controla os valores que podem ser
cobrados pelos prestadores privados, restringindo au-
mentos de tarifas e repasses de custos aos consumidores.
Ela determina como os planos podem cobrar dos seus
clientes e como eles devem pagar os provedores dos ser-
viços. Por fim, os planos de saúde ou seguem as diretri-
zes da ANS ou são legalmente suspensos do mercado.
Como a ANS não consegue em hipótese alguma sa-
ber os dados da condição de saúde de cada segurado
para definir suas regulamentações, trabalhando apenas
com estudos genéricos sobre grupos de pacientes, ela
acaba sendo um grande balcão de negócios para grupos
de interesse. Um exemplo disso é quando associações de
profissionais vão fazer lobby para inclusão obrigatória de
seus serviços no portfólio dos planos. Elas apresentam
casos comoventes de pessoas que sofrem por não terem
acesso a um determinado serviço porque o plano não o
cobria, ou mostram estatísticas de quantos pacientes “se
beneficiariam” caso os seus serviços fossem ofertados
pelas seguradoras.
Juntamente à pressão política, esses grupos buscam o
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v SAÚDE
apoio da mídia — seja em campanhas pu- pela agência. Na prática, regulamenta-
blicitárias diretas ou em inserções da te- ções excessivas encarecem os serviços,
mática em novelas, séries e programas de dificultando o acesso dos mais pobres ao
variedades —, com o objetivo de comover atendimento de saúde.
as pessoas a comprarem a história. Não ra- As regulamentações são, portanto,
ramente, elas conseguem o desejado. uma forma de o governo controlar os ser-
Dessa forma, a ANS muda as apólices viços de saúde, sem precisar ser o seu
mínimas e, por exemplo, obriga uma pes- fornecedor. Elas atuam diretamente redu-
soa que só quer pagar pelo tratamento de zindo a competitividade e podem até ser
sua doença do coração a contratar con- baseadas em boas intenções — como re-
sultas anuais de um serviço de psicologia, duzir a “cobrança abusiva” por um deter-
por mais que esse paciente nunca vá ao minado provedor, ou aumentar o acesso a
psicólogo, ou de pediatria, por mais que coisas que são boas, como fisioterapia e
não tenha filhos. reeducação alimentar —, mas acabam por
Um exemplo de como esse tipo de lob- onerar significativamente o consumidor.
by é perverso se vê no caso do Obamacare No processo há sempre aqueles que se
americano, em que o HHS — Ministério da beneficiam, como os pacientes que veem
Saúde Americano — define que homens agora suas consultas subsidiadas pelos
solteiros devem pagar por serviços gine- outros membros da rede que não fazem
cológicos e obstétricos em seus planos de o uso do serviço, ou os líderes de grupos
saúde. Assim, os planos de saúde ficam profissionais que conseguiram uma boqui-
mais caros, por causa dos requerimentos nha a mais e serão reeleitos em suas as-
mínimos, e as agências têm de fazer um sociações. Mas em vários casos, há mais
controle de preços cada vez mais forte. prejudicados do que beneficiados, e os
No longo prazo, a competição fica ab- custos não compensam o que foi feito.
surdamente reduzida, visto que apenas Serviços mais caros levam a menos
grandes seguradoras conseguem fornecer pessoas podendo pagar por eles, o que
todos os serviços minimamente exigidos gera maior pressão por novas regulamen-

22
tações — dificilmente as pessoas enten-
dem que foram as “soluções” anteriores
que geraram os novos problemas. Com
isso, o clamor por medidas cada vez pio-
res se torna presente, como no caso dos
Estados Unidos, em que os fantasmas da
medicina socializada e do single-payer
estilo canadense voltaram a assombrar o
país devido ao número considerável de
pessoas que ainda não têm seguro saúde,
mesmo depois da adoção do Obamacare.

O sistema de livre-mercado

A saúde, assim como qualquer outro


serviço ou bem no mercado, pode ser ofer-
tada com a mínima interferência estatal —
as únicas restrições se aplicando a alguém
“A saúde, as-
que deliberadamente afeta a integridade
física de outrem e retira a vida de um pa- sim como
ciente sem o seu consentimento.
Um sistema de livre mercado de saú- qualquer ou-
de consiste em pessoas fazendo aquelas
escolhas para seus tratamentos que mais
se adéquam a alguns princípios simples:
tro serviço ou
seus valores pessoais, sua disponibilidade
de tempo, sua disponibilidade monetária. bem no mer-
Desse modo, os custos de uma decisão in-
dividual não podem ser transmitidos a ou- cado, pode
trem sem o seu consentimento (escolhas
individuais, custos individuais).
Esse tipo de sistema está parcialmente
ser ofertada
presente nos serviços privados de saúde,
principalmente naqueles de caráter estéti- com a mínima
co, como cirurgia plástica e dermatologia;
cirurgia para correção de miopia; serviços interferência
odontológicos; e treinamento físico; mas
não é adotado amplamente por nenhum
país.
estatal.”
As grandes vantagens deste modelo
são a sua adaptabilidade às necessida-
des individuais de cada paciente, a rápida
capacidade de adoção de inovações (e o
incentivo às mesmas), o baixo custo para
aqueles que não estão fazendo uso dos
serviços (a menos que optem pela parti-
cipação voluntária em um plano de saúde,
no qual escolhem os termos, eles não pa-
gam nada), e a individualização das esco-
lhas e de seus resultados.
Médicos e outros profissionais de saúde
se organizam da forma mais eficiente para
o atendimento aos pacientes e não seguin-
do modelos pré-estabelecidos por outras
pessoas que pouco entendem do sistema.
Pacientes têm a liberdade de se consultar
com o médico que querem, arcando com
os custos disso — seja esperando muito
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v SAÚDE
por uma consulta, seja pagando valores década de 1990 se tornasse acessível para
mais caros por ela. E empreendedores são um trabalhador de classe média.
motivados a oferecer novos produtos e Mantendo-se esse padrão de redução
serviços para atender às necessidades do de custo, a tendência é que em 2020 um
mercado, seja competindo em áreas que trabalhador que ganhe um salário mínimo
já apresentam soluções, seja oferecendo nos EUA (cerca de 16 mil dólares por ano)
alternativas para determinados procedi- possa pagar a cirurgia sem comprometer
mentos e modelos organizacionais. significativamente seu orçamento anual.
Um dos melhores exemplos atuais do O grande problema da abordagem de
livre mercado nos serviços de saúde está mercado está no fato de que ela entende
no caso das cirurgias para correção de que recursos são escassos e não visa a
problemas de visão nos EUA. Esse tipo distribuí-los igualitariamente, visto que é
de procedimento é pouco regulado: ba- impossível atender todas as demandas ao
sicamente o que se tem é a necessidade mesmo tempo com uma quantidade fini-
de o médico respeitar o contrato estabe- ta de recursos. Durante um tempo, algu-
lecido com o paciente e fazer todo o pos- mas pessoas podem ficar sem a suposta
sível para não causar dano. Essa cirurgia garantia de acesso ao serviço dada pelos
não é coberta pela maior parte dos planos modelos mais regulados ou socializados
de saúde, então a escolha do médico que por não terem o dinheiro necessário para
realizará o procedimento não se dá pela pagar pelo atendimento médico, pelas ci-
cobertura da seguradora e sim por análi- rurgias, pelos equipamentos — lembran-
se dos preços e dos resultados que aquele do que mesmo nos sistemas socializados,
profissional apresenta. não há nenhuma certeza
Além disso, existem al- “O interessante é do atendimento médico em
gumas diferentes técnicas si; há apenas um pedaço
que foram desenvolvidas ao que mesmo aque- de papel dizendo que há
longo dos últimos 30 anos
para permitir uma recupe-
les que não teriam asem possibilidade de obtê-lo
o pagamento posterior
ração mais rápida, diminuir o acesso inicial po- pelo serviço.
o desconforto do paciente, Entretanto, não há ne-
ter um procedimento mais dem se beneficiar nhuma barreira legal im-
rápido etc. Ou seja, é uma da abordagem de posta à entrada de novos
área que apresenta os pila- players no mercado e nem
res do livre mercado: a re- mercado.” ao acesso dos serviços de
gulamentação se dá pela saúde. Qualquer um pode
escolha dos consumidores, há uma real financiar seus tratamentos, pode se juntar
concorrência dos fornecedores do serviço em grupos para comprar “pacotes de ci-
e há competição pela clientela. rurgias ou de consultas médicas” — estilo
Analisando o que ocorreu com o pas- Groupon ou Peixe Urbano, como é comum
sar do tempo, vê-se que menos de 15 anos com vários procedimentos dermatológi-
depois do início de sua popularização, o cos —, ou mesmo aderir voluntariamente
preço das cirurgias de redução de miopia a seguradoras de saúde, que devem ser
caiu significativamente. Em 1997, o proce- transparentes e fornecer planos que aten-
dimento custava US$8.000, ao passo que dam a seus clientes e não a grupos de in-
em 2012 ele saía por US$3.800 — isso sem teresse.
considerar a diferença de poder de com- O interessante é que mesmo aqueles
pra devido à inflação. que não teriam o acesso inicial podem se
Lembrando que, na década de 1990, beneficiar da abordagem de mercado, vis-
a correção de visão era realizada por um to que médicos conseguem ter mais tem-
cirurgião com instrumentos como bisturis po livre ao fugir das burocracias impostas
para cortar parte do tecido do olho e cor- pelos reguladores e assim dedicar parte
rigir as imperfeições, ao passo que atual- do seu horário a atividades pro bono.
mente o procedimento é feito com um la- Empresas também têm o interesse de-
ser guiado por computador. promover ações sociais para se beneficiar
Além disso, é possível ainda encontrar no mercado, e há a possibilidade de en-
médicos que cobrem menos de US$1.000 tidades de caridade e da sociedade civil
pelo procedimento. Ou seja, o mercado, surgirem para o fornecimento de saúde
a inovação e a concorrência fizeram com para os mais pobres — Santas Casas e Be-
que algo que era restrito a uma elite na neficência Portuguesa já atendiam inúme-
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ros pacientes bem antes de alguém imaginar o SUS.
Além disso, as inovações geradas em áreas mais competitivas são exportadas para
outros serviços mais regulados, ou mesmo para países que apresentam sistemas de
saúde mais restritivos.

Conclusão

Existem diversos modelos de sistemas de saúde adotados ao redor do mundo e


mesmo dentro de um dado país. Cada sistema tem suas particularidades, advindas dos
agentes responsáveis por sua implantação. Não há um sistema que possa ser conside-
rado perfeito, visto que todos apresentam determinadas falhas. Entretanto, há aqueles
que conseguem apresentar mais prós do que contras, principalmente no longo prazo
— o caso do livre mercado.
Assim, um país como a Suécia, que apresenta uma população pequena, amplamente
urbana e muito homogênea, consegue implantar um modelo socializado de medicina
que demorará anos para começar a apresentar fadiga. Enquanto isso, o SUS brasileiro
é problemático desde sua implantação.
O mesmo vale quando comparamos os sistemas baseados em seguro obrigatório
individual, que funcionam muito bem na Suíça, mas apresentam vários problemas em
estados americanos, como Massachusetts. Assim, alegar que algo é muito bom e que
vai dar certo caso seja implantado no nosso país porque parece funcionar em outro país
não é um caminho razoável.
Por fim, além dos aspectos práticos e econômicos, alguns questionamentos morais
e filosóficos devem ser feitos, principalmente no tocante a como seria o acesso aos tra-
tamentos e se é justo fazer outras pessoas pagarem pela sua conta, seja no presente,
seja no futuro, entre outros. Nenhuma discussão ampla deve esquecer esses aspectos e
cada sociedade lidará com eles de uma forma diferente.
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