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70 Educagio 4 SHEILA DE CASTRO FARIA Coldnia sem pacto Referéncia obrigatéria nos livros diddticos, teoria de Caio Prado Junior ganha criticas que revelam um Brasil mais complexo e dindmico A DECADAS A OBRA DE CAIO PRADO JUNIOR (1907- 1990) é divulgada em livros didaticos e cobrada nos vestibulares. Considerado um dos mais importantes intérpretes do Brasil — ao lado de Gilberto Freyre e Sérgio Buarque de Holanda -, ele produziu classicos fundamentais de nossa historiografia, como Forma- ¢do do Brasil Contemporaneo, publicado em 1942. In- terpretacdo marxista que explica as relac6es e trans- formacées sociais por meio das bases materiais, mas sem cair em simplismos, a obra se destacou em seu tempo por tratar a Histéria como um processo, su- perando a versao entao vigente de que haveria ci- clos econdmicos que se sucediam. Depois 10 Educacao f i! y , SHEILA DE CASTRO FARIA Coldnia sem pacto Refe a obrigatoria nos livros diddticos, teoria de Caio Prado Junior ganha criticas que revelam um Brasil mais complexo e dindmico A DECADAS A OBRA DE CAIO PRADO JUNIOR (1907- 1990) é divulgada em livros didaticos e cobrada nos vestibulares. Considerado um dos mais importantes intérpretes do Brasil - ao lado de Gilberto Freyre e Sérgio Buarque de Holanda -, ele produziu classicos fundamentais de nossa historiografia, como Forma- gio do Brasil Contempordineo, publicado em 1942, In- terpretacao marxista que explica as relagées e trans- formagées sociais por meio das bases materiais, mas sem cair em simplismos, a obra se destacou em seu tempo por tratar a Histria como um proceso, su- perando a versio entiio vigente de que haveria ci- clos econémicos que se sucediam. Depois de dezenas de reedig&es, livro continua a serlido € comentado. Mais recentemente, passou também a ser criticado. Formagio do Basil Contempordneo conta a histéria de nossa persistente dependéncia estrutural. do pe- siodo colonial ao século XDK.A triste sina do Brasil é explicada por seu passado de colonia, mesmo que de- pois tenha se libertado de Portugal, transformando- se em Império (1822) e em Republica (1889) Caio Prado Jinior ajudou a consolidar a Histéria hhoje conhecida pelo senso comum. Para comecar, a expansio maritima européia do século XV resut tando na criagio de vastos impérios coloniais, sen- do ode Portugal um dos primeiros e principais. £m terras do Brasil, criow-se uma estrutura que tinha 0 “sentido da colonizagio”,tese central do livro, que impediria o pais de completar a “evolugio da eco- nomia colonial para a nacional”. A estrutura econd- mica, dependente desde o nascimento do mercado europeu, nio poderia ser rompida, e assim teria permanecido até o século XX. Na interpretacao do autor, 0 avanco para o estigio de uma economia nacional dependia de um mercado interno e de uuma classe empresarial fortes, o que no ocorva, Colonizado por Portugal, 0 Brasil tomouse pro- dutor de artigos tropicais para exportagio, sobretudo agticar. A “grande lavoura’ era deserita em suas ca racteristicas bisicas:atifindio, monoculturae escra- vidio. Esse modelo econdmico seria autosuficiente, produzindo alimentos necessirios para sustentar 05 proprietirios e os escravos. 0 iinico produto a ste plantar 0 agicar na pauta de exportagio foi o café, ‘mas s6 no século XIK e baseado nos mesmos princt pios da “grande lavoura". Mantinha-se, portanto, a “maldiglo" da col6nia, com o café sendo a pedra de toque da economia brasileira pelo século XX adentro. Educacad ‘A colonia do Brasil fo criada para atenderas ne- cessidades te Portugal em suas relagdes comerciais com a Europa. Por isso nio gozava de qualquer au tonomia. No livro, Caio Prado enfatiza 0 conceito politico de *pacto colonial", em que a metrépole detinha 0 monopélio de tudo que fosse produzide ‘na Colonia, sendo proibido aos colonos comercial zar com qualquer outra nacio. Disso resultaria ‘uma corrente de mio tnica: a riqueza colonial era, em sua maior parte, drenada para a metr6pole, f- cando 56 uma pequena parcela para os senhores de terras e escravos, grupo que deveria se manter pro- duzindo riquezas. Como conseqiiéncia, a sociedade € vista como bipolar: de um lado, 0 pequeno grupo dos grandes senhores: de outro, os numerosos es- cravos. Os que no estivessem num ou noutro pélo estariam fora do “Sistema Colonial”. As teorias ce Caio Prado Jinior obtiveram um su- cesso esmagador nas décadas seguintes, influencian- do outras obras fundamentais da historiografia bra- sileira, como Formagdo Econémica do Brasil, do economista Celso Furtado (1958), e Portugal e Brasi!na Crise do Antign Sistema Colonial (1777-1808), do historia dor Fernando Novais (1979). Foram, por fim, incor- poradas aos livros diditicos, onde permanecem até haoje, 3s vezes expostas de forma simplista. Mas a Hist6ria nao para, e novas interpretagées, baseadas em outras teorias e documentos foram elaboradas, Considera-se hoje que o Brasil colonial teve um desenvolvimento bastante diferente daquele apre sentado por Caio Prado. f que mudou a ética de ob- servagio: os historiadores passaram a analisar 0 funcionamento da Colénia. Nao que a intengo da politica metropolitana fosse diferente do que pro- Be o autor. Mas, na prética, Portugal no conse- ‘guiu realizar essa politica. A realidade se revelava 1m ae ara Cain Prado ode eco que orem Perabo n Apes dis inieras reer em exolis@ cniversiades Quadro Boal Crtanbordre. Educacgao Psst? ~eaeeenanes (ot 3 ; ae —— (CostadAtrca = ad Ctanecl tavatre eomercio muito mais complexa. No lugar da imagem de co- Jonos engessados pela metrépole, vem a tona um grande dinamismo nas relagées comerciais dos principais portos do Brasil com o Rio da Prata, no sal da América, com Angola, Costa da Mina e Mo- cambique, na Aftica, e com fndia, Goa e Macau, na fia. O que salta a vista € que muitas dessa dreas no eram de dominio portugues. Colones do Brasil, portanto, comercializavam diretamente com ou- tras regis, furando a idéia de “pacto colonial’. A sociedade é vista por Caio Prado como bipolar: de um lado, 0 pequeno grupo d outro, os nume Simca coin s grandes senhores; de vos Por outro lado, os comerciantes que forneciam escravos para o Brasil no século XVII negociavam i- retamente com traficantes e chefes locais da Africa. Bram esses comerciantes, residentes no Brasil, que no auge do Sistema Colonial detinham 0 monopétio. do lucrativo tréfico negreiro ~e nao a metr6pole. AS negociagies ocorriam mesmo em portos dominados por outros reinos, como era o caso da Costa da Mina Wrerttime ‘Ao contrario do que afirma Caio Prado, esses co- ‘merciantes eram infinitamente mais ricos do que os senhores de terras e escravos. Era aquelle grupo ‘mercantil residente no Brasil que se colocava como a elite econémica da Colénia. Havia riquezas sendo geradas na produgio agréria, na pecuaria e na ex- tragio de metais preciosos, mas quem abocanhava a fatia mais grossa eram justamente os comercian- tes. E suas prticas mercantis no se restringiam a0 ‘fico negreito, participando do comércio interno de alimentos, de préticas de agiotagem e da aquisi- io de contratos da Coroa portuguesa para a co- branga de impostos. Esses contratos foram um importante ponto de encontro nas relagGes entre metr6pole e Col6nia 0 sistema adotado era relativamente simples € fi- cititava a administracio portuguesa: havia uma sé- rie de taxas, impostos e negécios exclusivos de al gum produto (como a exploragdo do sal e do pau-brasil) que nunca eram cobrados ou explora- dos diretamente pelos funcionérias ou agentes da ‘metrépole. Os contratos eram leiloados, ganhando 6 individuo ou a sociedade que desse o maior lan- ce. O vencedor pagava a quantia oferecida e tinha © direito de, no periodo estipulado (média de tres anos), explorar as cobrangas. Dessa forma, a Coroa se desonerava dos gastos de manter um exército de funcionérios para cobrancas e do risco de corrup- ho inerente a essa pritica. Além disso, leiloando as a particulares, recebia antecipadamente e podia planejar melhor suas finangas, Por sua vez, 0 arre- ‘matante (ou contratador ficava com todos 05 ris os, pois poderia ter ou no sucesso na tarefa. Se a arrecadagio fosse menor do que a quantia que ha- via desembotsado, tinha de arcar com o prejuizo ‘Mas seus lucros deviam ser significativos, pois um ‘mesmo arrematante concorria repetidas vezes nos leildes. Pode se dizer, em linguagem atual, que Por ‘ugal “terceirizou” a cobranga dos impostos. Outro ponto ajuda a ampliar a interpretagdo so- bre a sociedade colonial. Documentos trouxeram & Juz uma vasta camada populacional, situada entre os ‘grandes senhores e os escravos, que se inseria de for- ma decisiva na dindmica do setor exportador. Eram. homens e mulheres de variadas origens, exercendo atividades que iam desde a produgio de alimentos, com miodeobra escrava ou familia, até o trabalho em diversos setores das principais cidades portustias. A grande lavoura, portanto, ndo era autosuficiente. Havia um importante mercado interno que relacio- hava 0s mais diversos setores de proclugao ¢ de servi- 08 20s negociantes que faziam as vezes de patrocina- dores da empresa colonial agroexportadora. A esses setores alia-se o contrabando, feito sob as vistas benevolentes dos agentes da metrépole, numa politica permissiva e corrupta. Por outro la- do, mesmo que diversas leis ou alvards tenham si- do criados de modo a preservar o comércio para os prdprios portugueses, necessidades politicas da Co- roa — como alianga com a Inglaterra desde 0 sécu lo XVII ~ fizeram com que se permitissem conces- ses a alguns estrangeiros. A presenca de navios, cestrangeiros no Brasil, fossem eles flamengos, fran- ‘ceses ou italianos, sempre foi corriqueira. A metré- pole podia até tentar implantar uma politica como aquela apresentada por Caio Prado Jinior, mas no tinha controle absoluto sobre sua eficéci © duradouro e amplo comércio de negociantes residentes no Brasil com variados agentes estrangei: ros e diversos portos e a cobranca de impostos por parte de arrematantes particulares péem em xeque as teorias do “pacto colonial” e do “exclusivo metro- EducacdoP 9). politano”, O sistema que vigorou no Brasil se reve- Jou bastante maledvel. As novas perspectivas sobre a dindmica dos impérios coloniais mostram que 0 acto parece ter sido mais um projeto, um ideal a ser perseguido, do que uma realidade de fato que restou desse ideal, segundo visbes hist6- cas mais recentes, foi uma heranca portuguesa de cunho conservador, segundo a qual o comércio era culturalmente desprestigiado, pois equivalia a0 trabalho bracal, considerado um “defeito mecini- co”. Isso explica por que os poderosos comercian- tes, em vez de investir cada vez mais em neg6cios ‘mercantise, por meio da acumulacéo de capital, al- cancar alguma atividade industrial, abandonavam © comércio e adquiriam terras ¢ escravos, na tenta- tiva de obter prestigio social. Em um mundo cada ‘ver mais burgués e capitalista, a opcio redundou em fracasso econémico. Hoje sujeitas a crticas que as tornam mais ricas € complexas, as idéias de Caio Prado Jinior conti- ‘nuam uma referéncia fundamental para quem quer compreender as causas de nosso atraso socioecond- ‘ico, Seja para concordar ou criticar, ele & 0 ponto de partida para as andlises atuais. A verdade é que poucos conseguiram, como ele, instigar tantas e tio variadas investigacGes por tanto tempo. H SHEILA DE CASTRO FARIA £ PROFESSORA TITULAR O» PAULO: EDITORA MODERNA 2002). eS oF Sciba Mais CALDERA re. A a FGOSO Jo & L0- RENTING Mira, Oe eon: ee ame een ae NOW, Fenda eo tire Hanepa 0 Pra Conch 205 ic Bre. epee: Open, 2000 Forrtne, Sl de cob bie cer colonia Rages. Profesor ¢ RHBN Gite do Mes, um eh sugestes pera {orem ele de ele. Ec sugestes pore witadehitoro@re etadehteia.com, betas informogsor ote wntreite. ehisoracombe

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