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0 adolescente e a violéncia 4. INTRODUCAO A violéncia urbana praticada pelos jovens, sobretudo nas dltimas décadas, invadiu 0 espaco do imagindrio social ajudando 8 propagacao de uma representacdo social da adolescéncia enquanto idade violenta. Esta representacao social da adolescéncia é, do meu ponto de vista, mistificadora e leva a uma atitude social, quanto a mim errada, de condenacao dos adolescentes, e nao 4 compreensio do fendmeno. 0 meu propésito neste capitulo é contribuir para essa compreensao, através duma reflexao a partir dos modelos psicanaliticos. A primeira questo que se coloca é a da clarificac3o do proprio termo de violéncia, usado indiscriminadamente na linguagem comum, mas sem que os elementos psicodinamicos envolvidos no acto de violéncia sejam compreendidos. 0 que se entende por violéncia? Uma adequada compreensao de um comportamento tao hete- rogéneo pede uma abordagem multidisciplinar. Limitar-me-ei a fazer uma abordagem do conceito de violéncia a partir da perspectiva psicanalitica e, uma vez definido o con- ceito, passarei ao tratamento da questdo do fenémeno da violéncia na adolescéncia, estabelecendo a articulagao entre a violencia e as questdes respeitantes a psicologia do adolescente. 2, SOBRE A VIOLENCIA Uso o termo violéncia para significar uma acco consciente, intencional, envolvendo 05 corpos quer do agressor quer da vitima, com o objectivo de infligir mal numa outra pessoa. Excluo portanto desta abordagem a violéncia verbal ou outras formas da vio- léncia simbéltica. _ Entre 0 medo e 0 desejo de crescer ~ Psicologia da Adolescéncia Quero também, ¢ no sentido de clarificar meu pensamento sobre o assunto, afirmar desde ja que entendo a violéncia ndo como evidencia de psicopatologia; em si mesma, a violéncia nao deve ser entendida como um sintoma mas como um comportamento, ou mais precisamente, como um padrao de reaccao que prepara o ser humano para se defender na presenca de perigo. Neste sentido, todo o ser humano € capaz de ser vio- lento ou de usar de violéncia. Na perspectiva psicanalitica, podem caracterizar-se todos os actos de violéncia em dois tipos: a violéncia autopreservativa e a violéncia sadomasoquista. Esta categoriza- do tem-se mostrado valida, quer do ponto de vista teérico, quer do ponto de vista cli- nico (veja-se, por exemplo, a ilustrativa descricao de casos clinicos de pacientes vio- lentos em Mervin Glasser, 1998). 2.1. A violéncia autopreservativa A biofisiologia mostrou que a natureza da violéncia 6 fundamentalmente bioldgica. De acordo com Cannon (1953), 0 corpo dispde de um padrao de reaccdo que o prepara para «lutar ou voar» na presenca de perigo, entendendo-se por perigo tudo o que ameace a sobre- vivencia do individuo. Nessa circunstancia, o ser humano activa um largo conjunto de alte- rages corporais coordenadas e integradas que o preparam para atacar e destruir o perigo ou para escapar dele - 0 que os biofisiologistas designam por resposta «lutar-voar». Este tipo de violencia, designada por violencia autopreservativa, é, de acordo com a teoria psicanalitica, a ferramenta basica do narcisismo primario (Freud, 1914, 1920). Ela caracteriza-se por usar um foco muito fino de ataque, tal como um raio laser: 0 seu alvo é a fonte de perigo, mais do que o sujeito atacante. Ou seja, se o perigo surge de um othar agressivo 0 alvo de ataque so os olhos, mas se o perigo surge de palavras intoleraveis entao é a boca do sujeito que é atacada. Numa situacao extrema é 0 sujeito que € atacado indiscriminadamente e passa a ser globalmente o alvo. Este tipo de violéncia é visto como um padrao de reaccao priméria desencadeada pelo perigo. € considerada como uma resposta muito primitiva, como um instinto, em termos etol6gicos (Lorenz, 1963). Do ponto de vista psicanalitico, a violéncia auto- preservativa é entendida como uma resposta fundamental e imediata, desencadeada por todo e qualquer estimulo que ameace 0 self ou por algo que se constitua como uma ameaca ao equilibrio psicolégico do sujeito. Por exemplo, podem-se considerar esti- mulos ameacadores: ataques a identidade de género, o perigo da castracio, infligir uma ferida na auto-estima, a frustracao, a humilhacao, o insulto ao self ou a um ideal a que a pessoa se sente vinculada. A violéncia também pode ser desencadeada por aconteci- mentos psiquicos internos, tais como uma perda de identidade provocada quer por sentimentos internos de confusao, quer por sentimentos de desintegracio, quer por ataques sadicos oriundos de um superego tiranico. O adolescente De acordo com o pensamento de Freud (1926), agressdo e ansiedade séo dois aspec- tos de uma Gnica reaccdo, na medida em que 0 que desencadeia ansiedade também desencadeia agressividade (a violéncia emerge sempre que o medo entra em accao). Violéncia autopreservativa e agressdo, de natureza primitiva, constituem-se por- tanto como os ingredientes basicos de qualquer tipo de violéncia. 2.2. A violéncia sadomasoquista Este tipo de violéncia, observada mais frequentemente, deriva da anterior em resul- tado da libidinizagao da agressio sob a forma de sadismo, sendo que a sexualizagio da agressao tem como resultado a perversio. A principal diferenca reside na relacao estabelecida com o objecto. No caso da vio- lencia sadomasoquista 0 objecto agredido deve sofrer e 0 agressor tira prazer de o ver sofrer (embora o prazer possa nao ser manifesto). Na violéncia autopreservativa nao se encontra © componente de prazer; 0 objecto apenas ganha significado para o sujeito em funcao da sua perigosidade e a sua resposta a violéncia nao é importante. Neste sentido podemos dizer que a violéncia autopreservativa é uma resposta fisica ao perigo enquanto que a violéncia sadomasoquista é uma resposta psiquica. 3. SOBRE A QUESTAO DA VIOLENCIA NA ADOLESCENCIA Os adolescentes constroem a sua identidade social face aos modelos identificatérios que a sociedade lhes oferece, quer por observacao directa quer na observacao mediati- zada pelos mass media (televisdo, cinema, jogos de computador). Os adolescentes sao observadores e sdo expostos a violéncia social e a figuras com quem se identificam. ‘Alguns dados vindos dos E.U.A., cultura dominante e modelo de referéncia para a grande maioria dos adolescentes portugueses, so disso ilustrativos. De acordo com um inquérito realizado junto de alunos duma escola elementar de Nova-Orledes (E.U.A.), verificou-se que: ~ 80% dos adolescentes testemunharam um acto de violéncia; ~ 60% viram armas a ser utilizadas; ~ 40% viram um cadaver, Um outro estudo realizado nos Hospitais de Boston (E.U.A.) indicou que: ~ Antes da idade de 6 anos, uma crianca em cada dez admitidas nas urgéncias foi testemunha de um crime (em sua casa ou na rua). ST Dados oriundos de uma outra realidade social, regida por valores culturais diferen- tes, a cultura japonesa, sao igualmente preocupantes e indicam que: ~ as familias japonesas submetem os seus filhos adolescentes a exigéncias altissi- mas relativas ao sucesso escolar e sua competitividade ao mesmo tempo que os educam para a dependéncia e exercem sobre eles uma superproteccio; ~ um grande nimero de adolescentes foge a escola (60.000 em 1993); ~ os adolescentes tiranizam os seus pais e manifestam comportamentos violentos face a eles. Os adolescentes so portanto expostos a violéncia quer num contexto quer no outro. De acordo com os modelos expostos acima, uma das formas de reagir a violncia, & inseguranga, pode ser procurando reftigio no grupo organizado, no grupo que assequra a proteccio, a autopreservacao, mesmo que a lei desse grupo seja responder a violén- cia com a violéncia, numa l6gica de «olho por olho, dente por dente». A identidade vai entao construir-se na rejeicao do social, na negatividade. Outra forma de reaccio pode ser pela desisténcia (de acordo com 0 modelo exposto, Jight-fight, 0 escape pode ser a resposta encontrada). Com efeito, mithares de jovens Japoneses, os otaku, «emparedam-se» num mundo autista e sem janelas para o exte- rior. Apaixonam-se por passatempos fiiteis do mundo irteal, dos jogos electronicos ¢ da ficcdo video, onde passam a maior parte do seu tempo... Shuichi Kato, um filésofo Japonés muito conhecido, comenta o fendmeno afirmando que os jovens de hoje, emba- lados pelo conforto material mas perdidos no plano das ideias, so afectivamente ima- turos, vivem longe do mundo real e tém dificuldades em comunicar. Perdidos no plano dos valores, perdidos no plano do Ideal do Eu, a instancia da per- sonalidade que confere sentido a vida, resta a desilusio, 0 concreto, e o concreto é 2 mofte do pensamento transformador, da fantasia... E, ou pode ser, o terror sem nome, porque sem dispor da capacidade de o pensar é transformar 0 adotescente s6 consegue responder ao terror ou com a violencia (fight), Como forma de atacar a fonte insuportavel de perigo, ou com a fuga (flight), procurando: © refiigio numa realidade virtual mais suportavel, Esta @ a face da violencia destrutiva, que podendo até ser usada como mei defesa, ataca e destréi a relacdo com 0 outro, os fios da rede comunitéria e fam 08 quais, ao mesmo tempo que prendem, servem também de suporte. Sem rede, sem estatuto social, na margem, o sofrimento de se sentir de fora e da lugar a raiva, ao édio, ao desejo de destruir. Na verdade os adolescentes vitimas da violencia social. Sao também eles autores e protagonistas. __O adolescente ¢ a violén: 4, ADOLESCENTES VIOLENTOS Mas quem sao e o que caracteriza estes adolescentes, autores e protagonistas de cenarios de violéncia? Os estudos socioldgicos indicam que provém sobretudo dos bairros mais desfavore- cidos, normalmente situados na periferia das grandes cidades, onde se observam situa- ‘goes de precaridade e onde os lacos sociais sdo frageis ou inexistentes, De acordo com o documento consultado (W. AA., 1995) so maioritariamente rapazes (dos 16 aos 25 anos), frequentemente em situagio de fracasso e de exclusio (escolar, Profissional), que «atimentam um certo culto da forca e da virilidade (imagem do “duro”, como um desafio langado a si mesmo). A sua vulnerabilidade a flor da pele transforma- -se rapidamente em violéncia. Muitas vezes passivos e inibidos, reagem no entanto aos outros, aos de fora da sua zona como atacantes potenciais» (op. cit., p. 17). No entanto, contrariamente ao que se pensa, «estes jovens nao estdo ligados a cri- minalidade organizada (grande delinquéncia, fileira do trafico de droga) que exige esta invisibilidade e discricéo» (op. cit., p. 17). Reagem de forma muitas vezes imprevisivel e explosiva face as figuras de autoridade, que personificam as instituigdes das quais se sentem excluidos ou em vias de exclusao. Esta violéncia ligada a exclusdo tem por pano de fundo um sentimento de vazio associado & auséncia ou a procura de um sentimento de existir que se traduz pela inter- rogacao sem resposta: «Quem sou eu? Qual 6 o meu valor? Que esperanca pode dar sen- tido 4 minha vida?» De acordo com um Relatério Técnico produzido em Franca (1995) sobre a «violén- cia dos jovens em meio urbano», é possivel identificar «um conjunto de elementos que caracterizam e constroem uma situacao global de excluséo, interiorizada muito cedo pelas criangas e vivida pelos adolescentes como uma injustica e uma falta de esperanca grave» (p. 29). Esses elementos sdo os seguintes: 4 a auséncia de relagdes de amor e de exigéncia entre criangas e adultos; ~ a discontinuidade e o fracasso do seu percurso escolar; = a impossibilidade de aceder a uma formacao e a um emprego; ~ a inexisténcia de lugares ou de espagos de que se possam apropriar para experi- mentar novas relagdes sociais; ~ a desconfianca, a rejeicao ou até a agressividade dos adultos para com eles; ~ a suspeigao permanente das forcas da ordem; ~ a ilusao das palavras e das promessas tao depressa enunciadas como esquecidas; ~ as frustragdes ligadas a sociedade de consumo; ~ a evanescéncia dos modelos identificatérios (“a demissio dos pais” ou ento “as suas dificuldades”) e dos modelos de referéncia e sociais» (p. 29). Entre 0 medo e 0 desejo de crescer ~ Psicologia da Adolescéncia Identifico neste conjunto de elementos uma falha do meio familiar e social em prover as necessidades basicas do adolescente. As conclusées dos peritos permitem-me situar a violencia dos adolescentes na pro- blematica das relacdes entre geracdes, como uma relacdo de forcas onde os lugares os poderes esto em disputa. Os jovens opdem-se aos adultos e agridem-nos na sua autoridade, no seu poder, mas rndo sera essa uma forma de conseguirem reconhecimento, de conseguirem um lugar e de assegurarem o estabelecimento de limites e de regras estruturantes entre as geragées? Winnicott (1971), psicanalista, viu na origem da tendéncia anti-social da crianca um problema de privacao, uma falha grave do meio na satisfacao das necessidades basi- cas do ser humano. De acordo com Winnicott a crianga que sofreu grandes privacées por parte do meio provoca de novo este meio no sentido de the pedir uma segunda oportunidade, ou seja, reclamando que o meio the dé aquilo que ela sente que nao the deu e que ela tem direito. «€ sobretudo devido a este pedido que a crianca provoca reaccées totais do meio, como se procurasse um quadro mais vasto, um cfrculo, cujo primeiro exemplo sdo os bracos ou o corpo da mae» (Winnicott, 1971, p. 179). Tentemos agora um outro angulo de visdo sobre a questao da violéncia: a violéncia esta ligada a vida e a vida é violencia. No acto do nascimento do bebé humano, 0 Gtero materno rejeita activamente o feto, contrai-se violentamente e, na dor, forca a expulsao, ao nascimento de uma nova vida. A origem etimolégica da palavra é sobre isso bastante elucidativa: violo em latim significa catentado» e também «fonte de vida». ‘A mudanga pode conter, do meu ponto de vista, uma violéncia que visa a transfor- magio duma condigdo numa outra condigao. Permito-me servir-me aqui duma imagem que vi recentemente num filme e que me impressionou: em determinada altura da sua vida, a lagosta precisa de largar comple- tamente a sua crosta, a sua capa protectora, para poder continuar a crescer... Desligar-se da crosta protectora é um acontecimento que os bidlogos descrevem como doloroso, violento que a deixa completamente «nua» e indefesa perante o ataque dos predadores durante algum tempo... Mas é também isso que permite ao crustaceo crescer e continuar o seu ciclo de vida. 5. ADOLESCENCIA, VIOLENCIA E COMUNICAGAO SIMBOLICA A adolescéncia, do ponto de vista da Psicologia do Desenvolvimento, é também uma passagem que implica alguma dor, alguma violéncia: tendo a vé-la, tal como Mahler ou Blos, como um segundo nascimento, como um segundo processo de séparaco que implica varios lutos, condicao basica para a mudanca e o devir maturativo... O adolescente e a violencia Viver a adolescéncia & também ousar desligar-se gradualmente da capa de protec- Gao da infancia, da pele infantil, antes que ela se torne demasiado apertada e que se fragmente em pedagos, deixando o adolescente completamente indefeso, vulneravel. No processo de renascimento, na vulnerabitidade narcisica e na fragilidade emocio- nal adolescente, surge a procura avida de simbolos que o confirmem na sua nova rou- pagem, na sua identidade... Nesta procura avida de simbolos (marcas, brincos, tatua- gens, grupos musicais) 0 adolescente pie a agressividade da diferenca, as vezes até a violéncia criadora (0 body piercing) que the confere o sentimento de ser diferente e por- tanto de existi “Entre a'Torca pstquica que puxa para as primitivas ligagdes - 0 desejo e o amor aos pais ~ e a forca psiquica que puxa para a procura de novos objectos nao incestuosos, joga-se uma problematica densa e complexa de afectos contraditérios que geram ine- vitavelmente agressividade e culpa. A proibicao do desejo no interior da familia organiza uma violéncia que salva o ado- lescente do desejo incestuoso, e o incita a procurar novos amores fora da familia. Olhar para a violéncia a partir deste vértex permite compreender a violéncia nao como uma violéncia destrutiva, ligada ao édio e portanto 4 morte, mas enquanto ligada a vida, inerente e necessaria aos processos vitais, Nao é por acaso que se utiliza a expresso «firia de viver». Em todo o acto violento existe um agir, um acting-out que pode ser mais ou menos destrutivo. Ora o adolescente usa a accdo como forma de pensamento. Qual o sentido e o significado do agir violento é o que vamos abordar. De acordo com a perspectiva psicanalitica, assiste-se a partir da puberdade a um reactivar duma conflitualidade pré-genital arcaica, bem como ao reactivar da tendén- cia_para o agit, presente ao longo da adolescéncia, com maior ou menor intensidade. Oadolescente tem dificuldade em controlar a sua motricidade e em exprimir ver- balmente as suas emogées... A externatizacao pelo agir, ou seja, a transposicgo para 0 comportamento das dificuldades e conflitos internos, permite ao adolescente nao s6 lidar duma forma defensiva com as suas pulses, que nesta altura atingem uma grande intensidade, como também experimentar um sentimento de omnipoténcia, que geral- mente acompanha as condutas agidas, face a um ego fragilizado e por vezes até amea- ado de fragmentacao. 0 adolescente sente-se incapaz de exprimir em palavras os sentimentos e as emo- Ges que o invadem e que por vezes submergem brutalmente o seu ego. Nao conseguindo explicar-se perante os adultos, tem tendéncia a exprimir-se atra- vés de actos muitas vezes impulsivos e violentos. Ha portanto uma probabilidade maior de passagem ao acto, o que coloca o adoles- cente em situacao de risco actescido, j4 que a violancia nao é entendida como uma forma de expressio aceitavel nem tolerdvel pelas instituices onde decorre a maior parte do seu quotidiano, muito menos como uma mensagem que precisa de ser desco- dificada, Estou de acordo com Giret (1991) quando ele afirma: «0 adolescente age mais do que fala, mas o seu agir é para ser descodificado como um discurso» (Giret, 1991, p. 71). Para ilustrar esta ideia recorro novamente ao exemplo do Bruno, o adolescente de 15 anos ja atras evocado. Este adolescente, que se sente e se admite fragil junto de mim, tem simultanea- mente um comportamento violento, agressivo em casa e na escola. Diriamos que ele mostra uma forca directamente proporcional ao seu sentimento de fragilidade, ao seu medo de a mostrar, 0 que na sua ideia poria em risco a sua imagem junto dos outros... Esconder a fragilidade passa também por procurar reftigio no grupo, fundindo-se de forma mimética na identidade grupal. Esconder a fragilidade pode passar também por mostrar 0 contrario do que se sente, obrigando o adulto que esta interessado em enten- der e em comunicar a descodificar o sentido dos comportamentos... Que significados ou que cédigos de leitura adoptar perante Bruno? Um dos significados possiveis jé foi formulado no ponto anterior. A agressividade pode ser necessaria ao adolescente para levar a cabo 0 seu processo de autonomia e neste contexto ela adquire um valor maturativo. O adolescente pode precisar, na sua luta pela autonomia, de provocar conflitos ine- vitaveis que visam remodelacées nas regras e nos padrées de comportamento na fami- lia, no sentido de conquistar 0 seu préprio espaco, 0 seu novo lugar. 0 agit pode ainda adquirir o significado duma tentativa de controlo dos conflitos psiquicos internos, invasores e sentidos como perigosos para um Eu fragil, adquirindo a violéncia um valor magico porque da a ilusdo de que se tem um controlo omnipo- tente sobre a realidade. Na adolescéncia, a violéncia tem essencialmente a funcao de proteger o Eu (é sobre- tudo autopreservativa), quer seja face 2 um sentimento de identificagao - e neste caso visa marcar um limite entre o Eu e o Outro ~ quer seja face a uma ameaca de perda de ‘identidade. 0 agir pode ainda adquirir 0 valor de sintoma dentro dum quadro de desorgani- za¢do psicopatologica, nomeadamente nas patologias borderline, psicéticas ou depres- sivas. Enquanto que para Lacan «bo acting-out apela a interpretacdo) o sintoma na sua esséncia ndo 6 um apelo ao Outro, nao é 0 que se mostra ao Outro» (Giret, 1991, p. 72). Um pequeno destaque: no mecanismo da passagem ao acto sob a forma externa do assassinio praticado por adolescentes encontra-se na maior parte dos casos clinicos que vi descritos o sentimento de vergonha. A vergonha aparece como a tomada de consciéncia dum defeito, duma falha em referéncia a um corpo ideal e sobretudo a vergonha que provoca no adolescente o olhar do Outro. 0 adolescente e a violén« Na humithacao 0 adolescente vive-se entdo como um objecto de gozo do outro, sob uma ameaca interna de perigo, tal como vimos. Pessoalmente e enquanto psicanalista, a questo principal que se me coloca 6 a seguinte: Que tipo de sofrimento se evoca qu se comunica através dum acto violento? Como interpretar e transformar em palavras o sofrimento agido, a mensagem em codigo? Se nao é aceitavel nem justificével a passagem ao acto, também néo é justifica- vel a sua pura condenacao pelo castigo sem que o adulto procure par as palavras onde existiu o acto. A maior parte dos actos violentos praticados, 0 adolescente responde com uma”) negacao: «nao fiz nada», «ndo fui eu» ou entao «foi por causa de...», tentando nao se confrontar, nao tomar consciéncia dos afectos e das emocdes que estiveram contidos No seu agit, esquivando-se a procura do sentido. ~ Onde a fala e portanto o simbolo e a capacidade de simbolizar nao se inscreve & preciso crid-la, Nomear, dar nome a coisa, outorgar significados mesmo que isso passe pela dor da tomada de consciéncia de si proprio, parece-me (Fleming, 2003) a condi¢ao indispen- savel para que o adolescente nao fique prisioneiro dos seus proprios actos e nao fique ‘no agir cego, incapaz de lhe atribuir o sentido que ele nao vé, mas que ao ser visto e admitido permite a atribuiggo de um sentido, e dai a sua transformacao em pensa- mentos ou em sentimentos susceptiveis de ser comunicados e entendidos. «Fazer outra coisa» era para Picasso o sentido da arte, o sentido da criatividade. Interpretar, outorgar significado no quadro psicanalitico, 6 também conseguir fazer outra coisa com aquilo que os pacientes nos trazem. . Ajudar os adolescentes violentos a fazer outra coisa dos seus medos, dos seus édios, das suas revoltas, oferecendo-thes uma escuta que os reconheca na sua individuatidade, 6 0 desafio que se coloca ao educador e ao terapeuta. taeal 4 REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS CANNON, W. B. (1953), Bodily Changes in Pain, Hunger, Fear and Rage, Boston, Charles Banford Company. FLEMING, M. et al. (1992), «Adolescéncia e Perturbagées do Comportamento: A Passagem 20 Acto Sobre a Forma de “Roubo” e "Destruigéo"n, Revista de Psicologia e de Ciéncias da Educacéo, 3/4: 67-82. FLEMING, M. (2003), Dor Sem Nome. Pensar o Sofrimento, Porto, Edigées Afrontamento. FREUD, S. (1914), On Narcissism: An Introduction, S. E., 14, Londres, Hogarth Press. FREUD, S. (1920), Beyond the Pleasure Principle, S. E., 18, Londres, Hogarth Press. ‘28 . . Entre 0 medo ¢ 0 deseja de crescer ~ Psicologia da Adolescéncia FREUD, S. (1926), Inhibitions, Symptoms and Anxiety, S. E., 20, Londres, Hogarth Press. GIRET, G. (1991), Violence Neutre d Adolescence, Paris, Ed. Universitaires. GLASSER, M. (1998), «On Violence. A Preliminary Communication», Int. J. Psycho-Anal, 79: 887- -902. WINNICOTT, D. W. (1971), De La Pédiatrie é La Psychanalyse, Paris, Payot. W. AA, (1995), «La violence des jeunes en milieu urbain, Conseil Technique des Clubs et équi- pes de Prévention Spécialiséen, Direction de (Action Sociale, Ministére du Travail et des Affaires Sociales, France.

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