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Quando a África é visualizada, a primeira visão que permeia a mente de muitas pessoas
é a imagem de fome, miséria, conflitos e marginalização. Um continente tomado pela violência
tribal, assolado pela epidemia da AIDS, pela corrupção e pela sacramentalização de um futuro
que só reproduz a idealização de um passado pobre e infeliz.
No entanto, os últimos anos vêm pintando uma imagem muito distinta deste vasto
continente. O número de países africanos com conflitos armados internos caiu de 13 para 52,
apesar da crise humanitária no Darfur3 (SARAIVA, 2008). A África subsaariana, ou África
negra, considerada a região mais pobre do mundo, cresce entre 5% e 6% ao ano desde 2003 –
ou seja, o equivalente à América Latina e superior à média brasileira (SARAIVA, 2008).
Embora ainda atravessando um difícil período de estabilização, o continente africano vem
cada vez mais atraindo investimentos externos, sinalizando um período de mudanças. Da
concessão de ajuda humanitária a países vulneráveis, hoje o mundo volta-se à África para
participar e aproveitar o seu crescimento, visto agora como um parceiro político e comercial.
Esta seção visa a analisar os desdobramentos recentes que reconduzem o continente
africano ao cenário internacional. Num primeiro momento, estudaremos a importância
estratégica do continente africano e as ações que vêm dirigindo-o para o caminho do
desenvolvimento. Em seguida, buscaremos analisar os interesses da China, dos Estados
Unidos e dos países europeus, à luz dos valiosos recursos que detém a África. Por fim,
analisaremos a política externa brasileira para o continente, sobretudo nos governos FHC e
Lula.
principalmente os milicianos janjawid (tribos nômades africanas de língua árabe e religião muçulmana) e os
povos não-árabes da área. Rebeldes majoritariamente não árabes pegaram em armas contra o governo do
Sudão, acusando-o de negligenciar os interesses da etnia.
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4 Produtos primários, ou com baixo grau de industrialização, que possuem cotação e são negociáveis nas bolsas
de valores (ie. Petróleo, soja, tabaco e etc.).
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e europeus, postura semelhante à adotada por países emergentes de peso, como o Brasil e a
Índia.
A importância estratégica do continente vai além do espectro comercial. A África é
vista como um importante aliado – que deve ser conservado – na luta contra o terrorismo.
Extensas células terroristas há alguns anos já operam no continente, sendo os casos mais
conhecidos os ataques da rede terrorista Al Qaeda às Embaixadas dos Estados Unidos no
Quênia e na Tanzânia, em 1998; os atentados contra turistas israelenses no Quênia em 2001 e
a tomada da capital somali Mogadíscio por insurgentes islâmicos.
A questão demográfica também demanda a atenção internacional. Afinal, tratamos de
um continente que está sobre quase um quarto da superfície do planeta (22,5% das terras do
globo, sendo o terceiro continente mais extenso, com 30 milhões de quilômetros quadrados) e
detém mais de 10% da população mundial, a qual deverá dobrar até 2050 (SARAIVA 2008).
Além disso, também a questão da saúde global passa pela África, pois depende do
desenvolvimento e da ampliação da capacidade de controle da pandemia da AIDS, que tem o
continente como seu epicentro. A África sofre com mais de 28 milhões de infectados pelo vírus
no planeta (num total que gira em torno dos 40 milhões). A malária vitima um milhão de
africanos por ano, e a ameaça da gripe aviária está sempre latente. Uma soma expressiva de
dólares internacionais e nacionais é destinada ao combate dessas doenças, em grande parte
fruto da pobreza.
No entanto, apesar desse quadro, o que se prega na nova postura internacional adotada
para a África, mas também na nova postura que os próprios líderes africanos vêm assumindo,
é o crescente estabelecimento de parcerias e acordos de cooperação, para além da ajuda
humanitária tradicional. A África não mais quer ser tratada como objeto de caridade, mas
como a contraparte de programas de cooperação focados e de longo prazo.
O papel de crescente importância estratégica (política, econômica e social) da África
demanda uma melhor compreensão da sociedade brasileira sobre esse continente, para que
saibamos aproveitar de forma pragmática e sábia as oportunidades que nossos irmãos de
sangue nos abrem. Passemos, então, ao estudo das origens da inserção internacional da África
contemporânea para, em seguida, apresentarmos os interesses das grandes potencias e de
países emergente que estão em jogo no tabuleiro africano.
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político-militar direto entre as principais nações (França, Inglaterra, Itália, Bélgica, Alemanha,
Portugal e Espanha) e esteve por detrás de disputas territoriais que acirrariam a escalada do
mundo à Primeira Guerra Mundial.
As lutas pela independência dos países africanos dos laços do colonialismo europeu é
que marcariam o compasso da atuação internacional do continente ao longo do período da
Guerra Fria. Para além do discurso ocidental de defesa da igualdade formal no sistema
internacional, a década de 1960 veria a aproximação da África ao terceiro-mundismo do
Movimento dos Não-Alinhados5 (MNA), na luta por princípios mais justos da participação no
sistema econômico capitalista liberal e pela modificação das regras desiguais do comércio
internacional. A Conferência de Bandung, que deu origem oficial ao MNA, tornou-se um marco
para o processo de descolonização que se processava na África e na Ásia, sinalizando o
interesse em participar de forma ativa e propositiva no sistema internacional, recusando o
alinhamento prévio aos blocos existentes na Guerra Fria (Capitalista e Socialista, liderados,
respectivamente, pelos Estados Unidos e pela União Soviética) (RIBEIRO, 2007) e tornando-se
reativos e defensivos ao ideário, com a criação de um socialismo africano (DÖPCKE, 2002).
Ao mesmo tempo, vê-se evoluir no continente o movimento pan-africanista, surgido
com o fim do esclavagismo americano e da II Guerra Mundial, bem como com a afirmação do
movimento negro pelo mundo. Na década de 1950, o desafio da descolonização do continente
e o confronto entre o Leste e o Oeste na Guerra Fria já abalavam o cenário político e
diplomático africano, dando origem a duas formas de pan-africanismo6. Por um lado, surgiu
um pan-africanismo dito “maximalista”, por se tratar de uma estratégia que visava a recompor
a geopolítica anterior à criada pela Conferência de Berlim. O objetivo último era a fundação
dos Estados Unidos da África, que fariam do continente negro um ator de peso no cenário
mundial. Segundo o líder ganense Kwame Nkrumah, “a África deve se unir” 7, a unidade
econômica, política e militar do continente seria fundamental. No entanto, esse ideal não
encontrou respaldo das antigas potências coloniais, que desejavam manter sua influência na
região, tampouco nas potências progressistas (URSS, EUA e China), promotores da liberdade
individual e do direito à autodeterminação, que limitaram seu apoio à forma verbal.
Já a outra corrente foi a de um pan-africanismo “minimalista”, baseada no direito
inalienável de cada país a ter uma existência independente. Sua idéia basilar era de que as
fronteiras herdadas da colonização eram intocáveis e tinha como princípio o respeito à
soberania e a não-ingerência nos assuntos internos dos Estados. Essa corrente que inspiraria
a criação da Organização da Unidade Africana, em 1963, em Adis Abeba, capital da Etiópia e
foi apoiada pelos interesses das potências colonizadoras.
5 Movimento surgido na conferência de Bandung (1955), que buscava uma via alternativa à bipolaridade entre
Estados Unidos e URSS na política mundial da Guerra Fria. O movimento hoje conta 115 membros e segue
buscando uma via independente para as relações internacionais.
6 O pan-africanismo é um movimento que propõe a união de todos os povos de África como forma de potenciar a
8 A primeira guerra civil da Libéria (1980-89) opôs o então presidente Samuel Doe e as forças rebeldes de Charles
Taylor, em um conflito também de caráter étnico, dada a opressão da etnia do presidente, khran, sobre as demais
– sobretudo as ligadas aos ex-escravos norte americanos. O segundo conflito (1999-2005) é derivado dos
questionamentos ao governo truculento de Charles Taylor.
9 Quando os colonizadores belgas chegaram à região em 1916, produziram carteiras de identidade classificando as
pessoas de acordo com sua etnia. Os belgas consideravam a etnia tutsis superiores a dos hutus. Dessa forma,
durante cerca de 20 anos os tutsis desfrutaram de empregos e oportunidades de educação melhores do que os
dos vizinhos hutus. Quando a Bélgica deixou o poder e deu independência a Ruanda, em 1962, os hutus
assumiram o governo. Refugiados tutsis em Uganda - com o apoio de hutus moderados - começaram a formar o
movimento Frente Patriótica Ruandense (RPF), o objetivo do grupo era de derrubar o Presidente Habyarimana
hutu e retornar à terra natal. Em 1994, um ataque ao avião presidencial acabou matando o dirigente, o que deu
início a uma grande onda de assassinatos em massa de tutsis e hutus moderados por militares, políticos e civis
apoiadores do líder hutu morto. 800 mil pessoas foram mortas no episódio que ficou conhecido como
“genocídio de Ruanda” e mais de 2 milhões tornaram-se refugiados. A comunidade internacional pouco atuou
para cessar a guerra civil.
10 Conflito que também opõe tutsis e hutus desde a independência do país frente a Bélgica. Em 1993 e 1994,
assassinatos de presidentes de etnia hutu, por tutsis, agravaram o conflito, refletindo na vizinha Ruanda.
11 A guerra civil no República Democrática do Congo, remonta à distribuição de poder no período colonial do país
rico em minerais. Entre 1997 e 1999, forças oposicionistas tomaram o poder de Mobuto, que já o havia feito
em 1970, contando com apoio belga.
12 A OUA não conseguiu evitar os inúmeros conflitos que assolaram o continente, nem promover de forma efetiva
o seu desenvolvimento. O Marrocos acabou abandonando a organização em 1984, visto que a OUA aceitara o
Saara Ocidental como membro da organização em 1982. A região do Saara Ocidental – ex-colônia espanhola –
desde 1975 era motivo de disputa entre Marrocos e a Frente Polisario.
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13 A crise do petróleo foi provocada pelo embargo dos países membros da Organização dos Países Exportadores de
Petróleo (OPEP) e Golfo Pérsico de distribuição de petróleo para os Estados Unidos e países da Europa – o que
acabou elevando subitamente o preço do combustível mais importante da economia capitalista mundial.
14 Pela teoria do economista John M. Keynes, o capitalismo teria tendências cíclicas de ausência de uma demanda
que promovesse o crescimento. Assim, o Estado deveria intervir na economia provendo a garantia de um
mínimo de demanda (e, portanto, de empregos) e de bem-estar à população (serviços públicos de qualidade,
garantia do nível de renda).
15 Após romper a conversibilidade dólar-ouro, em 1971, o Presidente Richard Nixon, passou a implementar uma
política de altas taxas de juros durante a década de 1970, o que refletiu diretamente nas economias dos
países subdesenvolvidos, que detinham grande montante de dívidas contraídas no exterior e calculadas com
base nos juros estadunidense. Dessa forma, o valor a ser pago pelos empréstimos elevou-se enormemente,
prejudicando a capacidade de pagamento dos governos.
16 Tendo criado uma enorme dívida, assim como o Brasil, para promover seu crescimento econômico, o México
viu-se seriamente endividado quando da elevação das taxas de juros economia norte-americana, tendo de
interromper os pagamentos em 1982.
17 Prática político-econômica que preconiza a redução do Estado na condução do país, interferindo o menos
FMI e o Banco Mundial condicionaram seu crédito a países subdesenvolvidos, sobretudo nas décadas de 1970 e
1980, quando das crises das dívidas externas após choque do petróleo e aumento dos juros internacionais.
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parte das elites” (VISENTINI, 2007: 199). O continente havia perdido a sua inserção
internacional junto às instituições financeiras internacionais, aos governos ocidentais e a
atores não-estatais, como as ONGs.
Como resultado, aos olhos ocidentais, instaurou-se o período do "afro-pessimismo" e a
visão de “um continente perdido, não reformável, incapaz de se desenvolver, sobrevivendo
somente através de esmolas externas” (DÖPCKE, 2002, p. 149).
A situação africana seria agravada na década de 1990, com o fim da Guerra Fria e o
desmoronamento da ideologia socialista. Tomava força o processo de globalização, jogado aos
quatro ventos, defendendo (e impondo) àqueles que desejassem se inserir na Nova Ordem
Mundial o ideário liberal econômico19 e político20 (DÖPCKE, 2002). Após um breve período de
tentativa de adequação ao sistema liberal multipartidário – com a independência da Namíbia
(1991), os acordos de paz em Angola (1991) e Moçambique (1992) – novos regimes ou
mesmo velhos ditadores autoritários retomaram o poder, e houve a escalada de conflitos civis,
como em Sierra Leoa21, Libéria e Somália22 (VISENTINI, 2007). Nesse período é que se
revelaria a grave marginalização mundial do continente, em termos políticos e econômicos
(DÖPCKE, 2002), agravada pela Guerra do Golfo23 (1990-1991) que reorientou os esforços
ocidentais para Oriente Médio (VISENTINI, 2007).
Conseqüentemente, os Estados africanos foram poucos, para não dizer quase nada,
atrativos aos investimentos externos. Ao adentrar a década de 1990, 44,6% da população da
África subsaariana contava com menos de US$1 por dia para se manter. Passada mais de uma
década, esta cifra praticamente não se alterou, registrando-se que 44,0% da população
mantêm-se no mesmo patamar socioeconômico (RIBEIRO, 2007). A taxa de mortalidade de
crianças com menos de cinco anos de idade é de 140 ‰, e a esperança de vida ao nascer é de
apenas 54 anos. Apenas 58 por cento da população têm acesso à água potável. A taxa de
analfabetismo de pessoas com mais de 15 anos é 41% (NEPAD, 2007).
A deterioração da situação econômica contribuiu para o aumento do fluxo de
refugiados e migrantes, agravando as condições de higiene, segurança e habitação. Neste
ambiente, o continente africano transformou-se em palco para o crescimento desenfreado de
uma série de doenças, ainda que muitas delas totalmente passíveis de controle (como
poliomielite, sarampo, dengue etc.), com milhões de vitimas por ano. No caso da epidemia de
que perdurou de 1991 à 2002, quando da consolidação do presidente Kabbah no poder. Grande parte desses
rebeldes eram meninos-soldados.
22 Na Somália, oito clãs disputam o poder numa guerra civil que dilacerou completamente o país. A guerra se
intensificou com o envolvimento de forças militares etíopes no conflito entre o governo interino somali e a
milícia islâmica que controla boa parte do país.
23 A Guerra do Golfo foi um conflito militar iniciado em 1990 na região do Golfo Pérsico, com a invasão do Kuwait
por tropas do Iraque. Esta guerra envolveu uma coalização de forças de países ocidentais liderados pelos Estados
Unidos. Foi possivelmente um dos maiores massacres da história do Oriente Médio.
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24 Apartheid ("separação" em africânder) foi um regime de segregação racial adotado legalmente em 1948 pelo
Partido Nacional na África do Sul segundo o qual os brancos detinham o poder e os povos restantes, em sua
grande maioria negros, eram obrigados a viver separados dos brancos, de acordo com regras que os impediam
de ser verdadeiros cidadãos. Este regime foi abolido por Frederik de Klerk em 1990 e, finalmente, em 1994
eleições livres foram realizadas, vencidas por Nelson Mandela.
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A NEPAD surgiu em 2001, na onda da criação da União Africana, como mais um plano
de desenvolvimento no continente africano. Esse, no entanto, tem sido considerado mais
promissor do que seus antecedentes e tem recebido ampla aceitação interna e externamente.
O plano é bastante ambicioso. Suas metas compreendem, entre muitos outros objetivos, um
crescimento econômico de 7% anual durante os próximos 15 anos, a redução pela metade da
taxa de pobreza absoluta até 2015 e a matrícula de todas as crianças em escolas primárias no
mesmo período.
Ao contrário das abordagens das instituições financeiras internacionais (Banco
Mundial e FMI), a NEPAD desconhece pré-requisitos ligados à concessão de recursos. Para
participar da NEPAD, os Estados assumem um forte e explícito compromisso com seus
valores, cuja realização é vista como pré-condição de qualquer desenvolvimento (DÖPCKE,
2002).
A NEPAD tem sido vista com bons olhos por aliar democracia, direitos humanos, paz e
governabilidade, de um lado, e o desenvolvimento econômico, de outro, num plano concebido
“pelos africanos e para os africanos”. Ao reivindicarem a capacidade de construção do seu
futuro, os líderes africanos estão atraindo para si a responsabilidade de superação da
marginalização a que foi relegado o continente na década de 1990. A NEPAD visa, assim, a
“buscar um lugar mais altivo, menos subsidiário na globalização assimétrica atual” (SARAIVA,
2008).
Com efeito, tão logo a cúpula dos países do G7 em Tókio, em 2000, a reunião dos países
do G8 em Gênova, em 2001, bem como o FMI e o Banco Mundial expressaram apoio à
proposta. Chefes de Estado ocidentais endossaram a iniciativa e a cúpula dos países do G8 de
2002, no Canadá, e alguns países ocidentais já deram seu apoio financeiro ao NEPAD.
No entanto, apesar do otimismo criado com o lançamento da União Africana e da
NEPAD, as críticas existem colocando questões quanto à viabilidade das iniciativas. Por parte
da União Africana, questiona-se qual a legitimidade e capacidade da organização em combater
os velhos problemas africanos, visto sua baixa institucionalização, fraca capacidade técnica e
caráter voluntarista dos seus documentos, ou seja, que não obriga os Estados-membros
(RIBEIRO, 2007). A incapacidade de lidar com a crise humanitária do Sudão25 é um exemplo
do desafio que se impõe à União.
Já no tocante à NEPAD, as críticas recaem sobre a adoção do velho discurso globalista
liberal (receitando privatizações, mais integração no mercado mundial, atração de capital
financeiro e investimentos e a participação do continente na revolução da comunicação e da
informação) ao mesmo tempo em que busca a explicar os males do subdesenvolvimento
26 Composta por diversos nomes, entre os quais o ex-presidente do Brasil Fernando Henrique Cardoso. Propunha a
noção de que o modelo de desenvolvimento capitalista era pautado pela dependência entre o centro, moderno e
detentor de tecnologias, e a preferia, atrasada e dependente do centro. Essa perspectiva analítica obteve ampla
repercussão na a América Latina no final da década de 1960 e começo da década de 1970.
27 Substituição de importações é um processo que visa ao desenvolvimento da produção interna de um país
através da diminuição das suas importações. É geralmente obtido por controle de taxas de importação e
manipulação da taxa de câmbio.
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28 Expressão cunha da pela revista The Economist (‘A new scramble’, The Economist, 27 November 2004.), em
referência á política externa chinesa de recursos naturais, nominalmente petróleo, para África.
29 Fonte: United Nations, United Nations Statistics Division, National Accounts Main Agregates Database, Basic
30 Episódio em que protestos pró-democracia na China foram sufocados por forças militares do Partido
Comunista, o que resultou em aproximadamente três mil mortos.
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exigências políticas. “a China dos últimos anos buscou a África sem truculência, violência ou
presunção de superioridade, traços da diplomacia européia e norte-americana” (SARAIVA,
2008: 99). A postura do governo Chinês frente aos problemas locais dos países africanos
reflete a expressão “resolução de problemas africanos pelos africanos”, pois a China tem
procurado não intrometer-se nos assuntos internos dos seus parceiros, deixando sua
resolução para os governos locais ou para uma arbitragem da própria região como a União
Africana, que vem sendo respaldada pela China na resolução dos conflitos em Darfur.
Além disso, a China tem investido também no processo de reconstrução pós-guerra
civil de diversos países africanos, como Angola, através da concessão de crédito facilitado,
investimentos em infraestrutura, cooperação técnica e manutenção de superávits pró-
africanos (PAUTASSO, 2009). É interessante notar, ainda, que muitos governos locais têm
visto o modelo de desenvolvimento chinês como um receituário a ser seguido em busca da
superação da pobreza e da construção de um crescimento sustentável em um curto espaço de
tempo – o que merece maior atenção da comunidade internacional.
No entanto, a aproximação China-África, como toda relação, não está livre de atritos. O
principal ponto de discussão reside no impacto fortemente negativo da inundação de
produtos manufaturados chineses sobre a incipiente indústria africana – o que, promete-se,
vem sendo controlado por Pequim (OLIVEIRA, 2007).
produtos pelos Estados Unidos, a tendência é de crescimento, devendo passar dos 25% na
próxima década34.
Como visto, no imediato pós-Guerra Fria, o governo estadunidense relegou à África um
lugar menor em sua política internacional (sobretudo após o fracasso da operação de paz na
Somália). Na década 1990, o afro-pessimismo difundido pela mídia internacional levou à
formulação de uma política externa “humanitarianista” para a África, sobretudo no governo
Clinton (1993-2000), cunhada de “política externa de Madre Tereza de Calcutá” (ALDEN,
2000).
No entanto, afirmar que a política estadunidense para a África na década de 1990 era
desprovida de um conteúdo estratégico seria uma ingenuidade. Através de sua política
humanitária, ou somando a ela, os Estados Unidos inseria o continente africano na doutrina da
“ampliação da democracia” (no original, democratic enlargement), no sentido de criar nos
países africanos as raízes da economia de mercado neoliberal e de um Estado com ela
condizente, disseminando a ideologia vitoriosa da Guerra Fria entre “a nova geração de líderes
africanos” (ALDEN, 2000).
No governo Bush (2001 – 2008), a política externa para a África passou a englobar a
idéia da “Doutrina Bush35” de combate ao terrorismo. Nesse sentido, as políticas de auxílio e
investimentos no continente são retomadas sob o entendimento de que a pobreza e a
ausência de democracia seriam os fertilizantes da insegurança (TAVARES, 2008). A primeira
experiência do governo Bush na África foi através da Corporação dos Desafios do Milênio, que
tinha o objetivo de fornecer amplo aporte de recursos a países, majoritariamente africanos.
Apesar do insucesso desse projeto, que liberou menos de 5% das verbas previstas (TAVARES,
2008), o aporte de recursos para ajuda direta na África cresceu significativamente no Governo
Bush: as verbas do USAID36, principal programa estadunidense de assistência ao
desenvolvimento, cresceram de US$ 650 milhões em 1997 (ALDEN, 2000), para US$ 5,4
bilhões em 2007 (TAVARES, 2008). No entanto, tanto um como outro programa de assistência
vieram não sem a pré-condição de que os governos beneficiários promovessem reformas que
os conduzissem à economia de mercado e à democracia, ajustando suas políticas domésticas e
reconduzindo suas políticas econômicas. As verbas de auxílio à boa governança, em 2007,
chegaram a US$ 175 milhões, com um alto grau de presença política estadunidense na
resolução de diversas crises políticas, como no Sudão e na Etiópia, em 2005, e no Quênia em
2007 (TAVARES, 2008).
setembro de 2001, no combate ao terrorismo. Entre essas medidas estão as intervenções militares no
Afeganistão (2001) e no Iraque (2003).
36 O USAID é a agência governamental estadunidense que financia projetos de cooperação técnica e auxílio a
Ponto positivo dessa relação é que uma das principais vertentes da relação
estadunidense com a África continua sendo o auxílio em temas de saúde pública. O principal
programa de ajuda ao continente africano inclui-se nessa área: o PREPFAR, que visa amenizar
os impactos epidêmicos da AIDS37. Esse programa contou em sua primeira fase (2003-2008)
com um aporte de US$ 18,8 bilhões e conta, na sua segunda fase (2008-2013), com 48 bilhões
(TAVARES, 2008). Entretanto, diante de sua dimensão, esse programa tem se mostrado
ineficiente, em parte devido a uma má leitura das sociedades africanas e a um alto caráter
ideológico do programa, na medida em que dois terços do seu orçamento são destinados a
“abstinência pré-matrimônio e a fidelidade conjugal”, claramente não condizente com a
realidade atual (Ibid). O programa de combate à malária, esse desprovido de apelo ideológico,
é focado na profilaxia38 e na imunização, por sua vez obtendo resultados muitos mais
eficientes, mesmo com um aporte financeiro bastante inferior (US$ 1,2 bilhões) (Ibiden).
Apesar da dimensão dos projetos citados, a iniciativa estadunidense que é realmente
emblemática do novo papel geoestratégico destinado pelos EUA à África é a US African
Command (AFRICOM), criada em 2007. A iniciativa projeta-se como a versão acabada da
“Doutrina Bush” de combate ao terrorismo, não se restringindo à ação militar, mas
abrangendo um amplo campo de ações voltadas ao desenvolvimento regional – como a
cooperação técnica, em agricultura, saúde e educação –, além do incremento do comércio e
das relações diplomáticas. Outras iniciativas dos EUA na luta contra o terrorismo no
continente africano comportam dois programas de cooperação bilateral, como é o caso da Pan
Sahel Initiative, no Sahel39 ocidental, e do Programa Anti-Terrorismo para a África Oriental,
em detrimento de iniciativas multilaterais. Dado o fracasso das ações no Iraque e no
Afeganistão, o governo norte-americano vem mantendo uma postura de não intervenção
militar direta no continente, buscando formas aperfeiçoadas de combate ao terrorismo.
Essas políticas estadunidenses, enfim, reconhecem a necessidade de uma presença
política mais intensa dos EUA na região, dada a “nova corrida” pelos recursos naturais
africanos, somadas à necessidade de inclusão da África na esfera de combate ao terrorismo,
diante de indícios de suporte de países africanos à Al Qaeda e da venda de urânio enriquecido
ao Iraque de Saddan Hussein, ambos na década de 1990 (TAVARES, 2010).
Apesar do incremento da importância dada pela política externa norte-americana à
África nos últimos dez anos, essa política mantém um caráter consideravelmente
ideologizado, que por vezes acaba não atendendo as demandas do povo e das elites africanas.
É justamente no caráter mais pragmático de sua política para a África que a China tem obtido
vantagens relativas.
37 Fonte: UNAIDS. 2008 Report on the Global AIDS Epidemic. Nova York: Joint United Nations Program on HIV
/AIDS (UNAIDS), 2008.
38 Medidas que procuram impedir o contato entre o agente causador de uma doença e seu vetor.
39 O Sahel é uma faixa de transição entre o deserto do Saara e as áreas mais férteis do sul.
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40 A França estabeleceu uma série de colônias na África: Marrocos, Tunísia, Guiné, Camarões,Togo, Senegal,
Madagascar, Benin, Níger, Burkina Faso, Costa do Marfim, Chade, Gabão, Mali, Mauritânia, Argélia, Comores e
Djibuti.
41 Fonte: Trade Map, International Trade Centre. Disponível em
mais a Rússia.
43 Conjunto de Metas estabelecidas pela ONU para serem atingidas até 2015, quais sejam: 1) Erradicar a fome e
a pobreza; 2) Conseguir educação fundamental para todos; 3) Promover igualdade entre os sexos; 4)
Reduzir mortalidade infantil; 5) Melhorar a saúde de gestantes; 6) Combater AIDS, malária e outras doenças;
7) Garantir desenvolvimento em equilíbrio com a natureza; 8) estabelecer uma parceria global para o
desenvolvimento.
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povo, quanto nas elites africanas, uma rejeição que contamina a todo o continente europeu,
materializando-se em um grande entrave às relações entre os dois continentes.
44 Referente ao Movimento Antropofágico, na década de XX, que propunha uma uma arte congregando os
diversos aspectos herdados dos povos que formaram nossa população, na leitura dos elementos estrangeiros,
lhes dando uma cara de brasileiro.
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benguelas, congos e moçambiques). Apesar de sua maioria ter sido prontamente catequizada
quando desembarcada em solo brasileiro, algumas religiões afro-brasileiras ainda hoje
mantém quase que totalmente suas raízes africanas, como é o caso do Candomblé e do Xangô
do Nordeste, bem como do Batuque, do Xambá e da Umbanda. A música popular brasileira
também é fortemente influenciada pelos ritmos africanos (sendo os ritmos mais conhecidas o
samba, o maracatu, o carimbó, a lambada e o maxixe) e os instrumentos como o atabaque, a
cuíca, a marimba e o berimbau foram difundidos para outros estilos musicais. A arte marcial
da Capoeira já é exportada como produto nacional. A tecnologia da mineração e da agricultura
das plantações de cana originais é de origem africana. A própria língua portuguesa brasileira
comporta termos como batuque, moleque, benze, macumba, catinga, e muitos outros de
origem afro.
Embora a África esteja intrinsecamente presente na nossa formação sócio-cultural,
para a diplomacia, o continente representou o espaço de menor interesse ao longo da política
externa brasileira. Ao longo do século XX, sobretudo com os presidentes Jânio Quadro (1961)
e João Goulart (1961 – 1964) houve uma maior aproximação, mas condicionada ao
fortalecimento das nações africanas, em pleno processo de descolonização (REIS, 2010). Com
o lançamento da Política Externa Independente, por Jânio Quadros e seu chanceler Afonso
Arinos, o Brasil lançou uma política africana e tomou posição em favor do direito à
autodeterminação dos povos coloniais, especialmente das colônias portuguesas, que
iniciavam a luta armada (VISENTINI e PEREIRA, 2007). No entanto, as capacidades brasileiras
mais se limitavam ao discurso.
Nos anos 1970 e 1980, a África foi visada a partir de um projeto de inserção
internacional brasileiro que buscava o continente tanto como meio de expansão dos mercados
externos, quanto como ponto de apoio para as demandas brasileiras nos fóruns
internacionais, sobretudo nas Nações Unidas. No entanto, a crise da dívida externa dos países
subdesenvolvidos golpearia tanto a América Latina quanto a África, o que, somado a conflitos
internos nessa última, minguariam as relações brasileiras com o continente negro.
Na conjuntura da militarização do Atlântico Sul (sobretudo como resultado da Guerra
das Malvinas45), o Governo Sarney logrou constituir nas Nações Unidas a Zona de Paz e
Cooperação do Atlântico Sul (ZoPaCAS), num esforço de definir um regime de coordenação
política Sul-Sul para proteger as rotas de comunicação marítima que passam pelo Atlântico
Sul, em direção ao Índico e Pacífico46 (PENHA, 2000; VISENTINI, 2007).
45 A Guerra das Malvinas ou Guerra do Atlântico Sul ou ainda Guerra das Falklands foi um conflito armado entre a
Argentina e o Reino Unido ocorrido nas Ilhas Malvinas (em inglês Falklands), em 1982 pela soberania sobre o
arquipélago, que foi tomado a força em 1833 e dominados a partir de então pelo Reino Unido.
46 “A importância do Atlântico Sul como rota marítima permanece como variável estratégica importante
decorrente das facilidades de comunicações inter-oceânicas e pela presença de inúmeras ilhas que servem de
base de apoio aero-naval para projeções sobre a África, América do Sul e Antártida, e para proteger o fluxo de
matérias-primas e petróleo oriundo do Golfo Pérsico. Devido às suas características geográficas e náuticas, a
bacia do Atlântico Sul, permite o transporte marítimo rápido de grandes volumes comerciais, sobretudo pela
rota do Cabo por onde passam 66% do petróleo europeu e 26% norte-americano”(PENHA, 2000: 5).
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Como herança do governo Itamar, as relações bilaterais com a África do Sul ampliaram-
se, normalizadas com o fim do regime apartheid. Na área multilateral, a parceria era relevante
ao Brasil, uma vez que os dois países compartilhavam de uma postura reativa à política
protecionista dos países em desenvolvimento, principalmente na área agrícola. Ademais,
Pretoria era vista como uma possibilidade de atrair investimentos para o Brasil.
Por outro lado, as relações com Angola visaram à realização de investimentos num país
que prometia crescer ao ser finda sua guerra civil47. Além de uma comitiva empresarial, o
governo FHC enviou à Luanda mais de mil soldados para auxiliar as forças de paz da ONU. Já a
Nigéria estabelecia-se como a maior parceira comercial do Brasil na África Negra, tendo-se
firmado um contrato de exploração de petróleo pela Braspetro no delta do Rio Níger (REIS,
2010).
Em 1996, a CPLP toma corpo como entidade institucionalizada na primeira Cimeira de
Chefes de Estado, congregando Brasil, Portugal e os cinco Países de Língua Portuguesa
africanos (os PALOPS): Angola, Cabo Verde, Guiné Bissau, Moçambique e São Tomé e Príncipe.
O Timor-Leste se somaria ao grupo em 2002, quando de sua independência. Porém, pouco
mais se avançou. De fato, o período foi caracterizado por certo imobilismo, seja pela situação
interna de muitos dos países africanos (que estavam ainda sofrendo com conflitos civis), seja
pela própria ausência de um conteúdo político e econômica prático – para além da língua
portuguesa – que realmente viabilizasse uma cooperação. No entanto, o relacionamento foi
pragmaticamente mantido, uma vez que a diplomacia acreditava que a CPLP permitia manter
vivo não só o africanismo brasileiro, mas também outros espaços perdidos no continente. Na
prática, a CPLP viabilizaria ao Brasil uma plataforma atlântica de atuação triangular: Portugal
(Europa) numa ponta, Brasil e África nas demais (REIS, 2010).
Foi o lançamento da NEPAD, em 2001, e a criação da União Africana, em 2002, que
reposicionaram a África aos olhos do Ocidente e, portanto, do Brasil. E, com a chegada ao
poder do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a política externa brasileira para a África ganha
maior intensidade (RIBEIRO, 2010), indo muito além do discurso (VISENTINI e PEREIRA,
2007).
Embora não haja consenso sobre se houve ou não inflexão na condução da política
externa brasileira com a troca de governo em 2003, o fato é que houve a adoção oficial e o
dispêndio de esforços na construção de alianças preferenciais com parceiros no âmbito das
relações Sul-Sul, superando a perspectiva Norte-Sul de projeção internacional do país,
observada no governo FHC. Nesse sentido, o continente africano passou a jogar um papel
importante nas relações internacionais brasileiras – como se pode notar com as diversas
viagens do Presidente Lula ao continente, resultando em inúmeros acordos de cooperação e
na abertura e reabertura de embaixadas e representações consulares.
47 Entre 1975 e 2002, o país viveu uma guerra travada majoritariamente entre o MPLA, que conduzira a
independência, e a UNITA, de fortes ligações com a África do Sul do Apartheid e com os EUA. Em 2002, com a
morte do líder da UNITA, Jonas Savimbi, o conflito teve fim.
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49 Movimento Pela Libertação da Angola, partido de tendência marxista, que conduziu o processo de independência
angolano e governa o país desde 1975.
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lado de inegáveis interesses econômicos, traz também aspectos novos. Dentre eles, destacam-
se os acordos de cooperação para o combate à pobreza e às epidemias (especialmente da
AIDS), a introdução e geração de tecnologias adaptadas aos problemas do Terceiro Mundo, a
cooperação na área da educação (com a ampliação do intercâmbio de jovens africanos para as
universidades brasileiras) e a aliança ativa nos fóruns multilaterais em defesa de interesses
comuns na busca do desenvolvimento e da construção de um sistema mundial multipolar e
pacífico (VISENTINI e PEREIRA, 2007).
Nesse sentido, a criação e consolidação do IBAS (Fórum de Diálogo Índia, Brasil e África
do Sul), o chamado G-3, de iniciativa sul-africana, tem se apresentado como um espaço
importante para projetar esses países para além de seus contextos regionais, atingindo o
cenário internacional, na busca por uma ordem multipolar (VISENTINI e PEREIRA, 2007). O
IBAS tem coordenado suas políticas em diversas áreas: agricultura, mudança do clima, cultura,
defesa, educação, energia, saúde, sociedade de informação, ciência e tecnologia,
desenvolvimento social, comércio e investimento, turismo e transporte. Diante da
Organização Mundial do Comércio, compondo o G-20, esses países têm feito frente aos
Estados Unidos e à União Européia na batalha da questão agrícola50. Ademais, o Fórum
apresenta-se para o Brasil como um plataforma de viabilização de uma maior cooperação
entre o Brasil (e o Mercosul) e os blocos econômicos regionais encabeçado pela África do Sul,
como a SADC51, e pela Índia (a SAARC52).
Apesar de ainda não ser possível detectar quais os resultados imediatos dessa política
adotada pelo governo Lula, não devemos esquecer que se está pensando no interesse nacional
em longo prazo, em consonância com a tradicional postura do Itamaraty53. Ademais, a maior
intensidade dada às relações com a África atende não só a um interesse econômico que se
promete frutífero, mas também à legitimação da alternativa de inserção internacional
assumida pelo Brasil, buscando a diversificação dos seus parceiros político-econômicos,
50 A União Européia vem adotando barreiras tarifárias e não-tarifárias no sentido de preservar os mercados
agrícolas europeus, em claro prejuízo aos países exportadores de produtos agrícolas, como os africanos, que
buscam regras mais justas junto à Organização Mundial de Comércio (OMC).
51 A Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC) remonta ao bloco político de luta contra os
países racistas (África do Sul e Rodésia), denominado Países da Linha de Frente, e o bloco econômico
equivalente, Conferência de Coordenação do Desenvolvimento da África Austral (SADC), fundados em 1980.
São membros da SADC atualmente: África do Sul, Angola, Botswana, Lesoto, Malauí, Maurício, Moçambique,
Namíbia, Suazilândia, Seychelles, Tanzânia, Zâmbia e Zimbábue e República Democrática do Congo. O bloco
SADC possui um PIB de quase 750 bilhões de dólares (CIA FACTBOOK, 2004) e também uma população total
de 235 milhões de pessoas (CIA FACTBOOK, 2004), sendo considerado o maior bloco de toda a África.
52 A Associação Sul-Asiática para Cooperação Regional (SAARC) foi estabelecida em 1985 pelos chefes de estado
ou governo de Bangladesh, Butão, Índia, Maldivas, Nepal, Paquistão e Sri Lanka. Esta associação busca criar
um ambiente amigável e de confiança entre os parceiros, na busca de um crescimento econômico acelerado,
do progresso social e do desenvolvimento cultural da região. Compreende uma população de quase 1,5 bilhão
de habitantes e um PIB de pouco mais de 4 trilhões de dólares (CIA FACTBOOK, 2004).
53 Nome pelo qual é conhecido o Ministério das Relações Exteriores do Brasil, em referência ao Palácio do
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primando pela cooperação Sul-Sul – mas sem negligenciar as relações já estabelecidas com
parceiros mais tradicionais – na defesa por uma ordem multipolar.
É, portanto, momento do Brasil aproveitar a dinâmica do renascimento e da
autoconfiança do continente africano para propor diálogo de interesses mútuos e valores
abrangentes (SARAIVA, 2008). Ademais, “estamos construindo uma cultura própria, onde o
elemento africano tem uma contribuição decisiva e que necessita ser reconhecida, e as
desigualdades sociais, que penalizam especialmente os negros, têm de ser eliminadas. E,
mesmo em meio a tantas injustiças, temos uma enorme tolerância, que poderia ser um
modelo para um mundo de intolerância” (VISENTINI e PEREIRA, 2007).
Por fim, por mais otimistas que sejam as perspectivas que se desenham para o
continente africano, as críticas quanto a sua instabilidade e imprevisibilidade ainda se fazem
presentes. Entretanto, devemos estar conscientes que a África está atravessando hoje um
processo semelhante pelo qual tanto a Europa como as Américas passaram nos séculos
passados: a construção de seus Estados-nação. E tal como ocorrido em solo europeu e
americano, esse processo é impregnado por disputas e conflitos étnicos e entre elites
políticas, onde muitas vezes os Estados utilizam a força para esmagar os regionalismos que
dificultam a unificação (vide o extermínio dos indígenas nos Estados Unidos ou os inúmeros
regionalismo ainda presentes na Europa e que ainda causam distúrbios na região, como os
bascos na Espanha – para citar apenas um exemplo) (VISENTINI, 2007).
As heranças do imperialismo europeu, do tráfico de escravos e da descolonização
tardia, com forte presença das metrópoles européias e do privilegio concedido às elites
tradicionais no processo de reorganização após as independências acabaram distorcendo um
processo que naturalmente julga-se que ocorreria no seio africano. Isso acabou agravando
disputas internas e ainda hoje coloca obstáculos à formação dos Estados nacionais africanos
(VISENTINI, 2007).
Ademais, há de se ter em mente que esse processo está ainda na sua infância: “a
retomada da história da África pelos africanos recém-atravessa uma etapa comparável à
Europa dos séculos XVI e XVII, ou as Américas do século XIX, mas num mundo com os
problemas ainda mais complexos” (VISENTINI, 2007: 221) que os experimentados pelos
outros continentes. Está mais que na hora de deixarmos que os africanos conduzam seu
presente e seu futuro, apostando no continente e evitando que se concretize uma nova
“partilha” entre os que, ao fim e ao cabo, são filhos desta mesma terra54.
54 Alusão ao fato de que residem na África, mais precisamente do Quênia e na Etiópia, os fósseis da espécie
humana mais antigos que se tem registro.
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LEITURAS COMPLEMENTARES55
Leitura obrigatória
SILVA, André Luiz Reis da. África contemporânea: os novos desafios da segurança, desenvolvimento e
autonomia (1960-2005). Monographia, Porto Alegre, n. 1, 2005.
Leitura complementar
RIBEIRO, Cláudio Oliveira. A política africana do Brasil no pós-guerra fria. In: Revista de Sociologia
Política, Curitiba, v. 18, n. 35, fev. 2010.
PAUTASSO, Diego. A China na África e a cooperação sul-sul. Porto Alegre: Núcleo de Estratégia e
Relações Internacionais, 2007.
LINKS ÚTEIS
1. Correio Internacional
Blog de notícias nacionais e internacionais, voltado para o público jovem brasileiro.
Disponível em: http://www.correiointernacional.com/
2. Boletim Meridiano 47
Boletim de Análise de Conjuntura em Relações que publica análises breves sobre temas
candentes da agenda internacional contemporânea.
Disponível em: http://meridiano47.info/
5. Blog Pé na África
Blog do jornalista Fábio Zanini, do jornal Folha de São Paulo sobre diversos fatos da realidade
política, social e econômica do continente africano.
Disponível em: http://penaafrica.folha.blog.uol.com.br/
FILMES
Invictus (Estados Unidos, 2009), de Clint Eastwood
Invictus acompanha o período em que Nelson Mandela sai da prisão em 1990, torna-se presidente em
1994 e os anos subsequentes. Na tentativa de diminuir a segregação racial na África do Sul, o rugby é
utilizado para tentar amenizar o fosso entre negros e brancos, fomentado por quase 40 anos. O jogador
Francois Pienaar é o capitão do time e será o principal parceiro de Mandela na empreitada.
Trailer disponível em:
http://cinema.uol.com.br/ultnot/multi/2009/10/29/04023270D8A16366.jhtm?who=0
Hotel Ruanda (Canadá, Reino Unido, Itália e África do Sul, 2004), de Terry George
Em 1994 um conflito político em Ruanda levou à morte de quase um milhão de pessoas em apenas
cem dias. Sem apoio dos demais países, os ruandenses tiveram que buscar saídas em seu próprio
cotidiano para sobreviver. Uma delas foi oferecida por Paul Rusesabagina (Don Cheadle), que era
gerente do hotel Milles Collines, localizado na capital do país. Contando apenas com sua coragem, Paul
abrigou no hotel mais de 1200 pessoas durante o conflito.
Trailer disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=aUjawg5IZ4Q
Sugestão de prática em aula: http://educacao.uol.com.br/planos-aula/ult3907u95.jhtm
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Um Grito de Liberdade
A história de uma amizade memorável entre dois homens inesquecíveis. A tensão e o terror da
atualidade da África do Sul do regime Apartheid é retratada através da história de um ativista negro
Stephen Biko e de um editor liberal de um jornal branco que arrisca a sua própria vida para divulgar
ao Mundo a mensagem de Biko.
Trailer disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=zT5H13-O4Rk (em inglês)
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terrorismo. Na prática, dominar a Argélia assegurou vultosos lucros aos grupos privados franceses. No
plano político, visava recuperar o prestígio internacional da França, abalado pelas derrotas
napoleônicas.
LEITURAS SUGERIDAS
DIALLO, Alfa Oumar. A nova parceria para o desenvolvimento da África: NEPAD, paradigma para o
desenvolvimento. Tese (doutorado) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Faculdade de
Direito. Programa de Pós-Graduação em Direito, Porto Alegre, BR-RS, 2006.
VISENTINI, Paulo, RIBEIRO, Luiz, e PEREIRA, Analúcia. Breve História da África. Porto Alegre:
Leitura XXI, 2007.
BIBLIOGRAFIA
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African Affairs, 99, p. 355 – 371: 2000.
ALVIM, Francisco. Embaixador José Aparecido: in memória. Brasília: Revista Juca, (p. 28 -33). FUNAG/IRBr, 2010.
BRAGA, Marcela M. Novo Acordo Ortográfico: língua e poder. Brasília: Revista Juca, (p. 56 – 62) FUNAG/IRBr,
2010.
CORNELISSEN, Scarlett. Awkward Embraces: Emerging and Established Powers and the Shifting Fortunes of
Africa’s International Relations in the Twenty-First Century. Politikon, 04/ 2009, 36(1), 5–26. South African
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DIALLO, Alfa Oumar. A nova parceria para o desenvolvimento da África: NEPAD, paradigma para o
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