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Este documento discute as características do novo constitucionalismo latino-americano, destacando três ciclos distintos e as Constituições do Equador e Bolívia como exemplos de um novo paradigma constitucional "transformador" e "descolonizador", fundado nos direitos dos povos indígenas e em sua cosmovisão.
Este documento discute as características do novo constitucionalismo latino-americano, destacando três ciclos distintos e as Constituições do Equador e Bolívia como exemplos de um novo paradigma constitucional "transformador" e "descolonizador", fundado nos direitos dos povos indígenas e em sua cosmovisão.
Este documento discute as características do novo constitucionalismo latino-americano, destacando três ciclos distintos e as Constituições do Equador e Bolívia como exemplos de um novo paradigma constitucional "transformador" e "descolonizador", fundado nos direitos dos povos indígenas e em sua cosmovisão.
No ano em que se completam 20 anos da Constituio colombiana, o tema do novo constitucionalismo latino-americano parece ter encontrado uma especial ateno. Mas justamente sobre sua caracterizao ou periodizao que existem profundas divergncias, algumas de cunho epistemolgico. Segundo Viciano Pastor e Dalmau Martinez, este novo constitucionalismo seria caracterizado por: a) substituio da continuidade constitucional pela ruptura com o sistema anterior, com fortalecimento, no mbito simblico, da dimenso poltica da Constituio; b) capacidade inovadora dos textos, buscando a integrao nacional e uma nova institucionalidade; c) fundamentao baseada em princpios, em detrimento de regras; d) extenso do prprio texto constitucional, em decorrncia tanto do passado constitucional, quanto da complexidade dos temas, mas veiculada em linguagem acessvel; e) proibio de que os poderes constitudos disponham da capacidade de reforma constitucional por si mesmos e, pois, um maior grau de rigidez, dependente de novo processo constituinte; f) busca de instrumentos que recomponham a relao entre soberania e governo, com a democracia participativa como complemento do sistema representativo; g) uma extensiva carta de direitos, com incorporao de tratados internacionais e integrao de setores marginalizados; h) a passagem de um predomnio do controle difuso de constitucionalismo pelo controle concentrado, incluindo-se frmulas mistas; i) um novo modelo de constituies econmicas, simultneo a um forte compromisso de integrao latino-americana de cunho no meramente econmico. A anlise dos dois autores ora parece indicar o incio do ciclo com a Constituio colombiana (1991), ora com a venezuelana (1999). Com isto, acaba por colocar dentro de um mesmo processo trs ciclos distintos de constitucionalismo pluralista, bem caracterizados por Raquel Yrigoyen: a) constitucionalismo multicultural (1982/1988), que introduz o conceito de diversidade cultural e reconhece direitos indgenas especficos; b) constitucionalismo pluricultural (1988/2005), que desenvolve o conceito de nao multitnica e Estado pluricultural, incorporando um largo catlogo de direitos indgenas, afro e de outros coletivos, em especial como reflexo da Conveno 169/OIT, ao mesmo tempo em que se implantam polticas neoliberais, com reduo de direitos sociais e flexibilizao de mercados; c) constitucionalismo plurinacional (2006-2009), no contexto da aprovao da Declarao das Naes Unidas sobre os direitos dos povos indgenas e que prope a refundao do Estado, com reconhecimento explcito das razes 1
Mestre em Direito (ULBRA/RS), doutorando Universidad Pablo Olavide (Espanha),
servidor do TRF-4 Regio desde 1989, organizador do livro Direitos humanos na sociedade cosmopolita (Ed. Renovar, 2004).
milenares dos povos e discutindo o fim do colonialismo. E justamente a
instaurao de um novo paradigma constitucional, a partir do modelos equatoriano e boliviano, que os constitucionalistas citados no parecem reconhecer. Neste sentido, razo parece assistir a Raquel Yrigoyen, Bartolom Clavero e Ramiro vila Santamaria quando destacam a especificidade destes dois processos em relao ao anterior constitucionalismo latino-americano. Um modelo que no dizer do ltimo seria um constitucionalismo transformador, porque fundado em outros parmetros. Destaquem-se apenas alguns. Primeiro: a refundao do Estado a outra face do reconhecimento tanto do colonialismo quanto das origens milenrias dos povos e naes que foram ignoradas. Uma refundao que necessita reinventar instituies e processos de organizao, de que so exemplos, no caso boliviano, do Tribunal Constitucional Plurinacional, da eleio dos juzes, dos quatro nveis distintos de autonomia, e, no caso equatoriano, de funes (e no poderes), includas a de transparncia e controle sociale a eleitoral, bem como os regimes especiais de organizao territorial. Segundo: um catlogo de direitos que rompe tanto com o geracional (civis e polticos; econmicos, sociais e culturais; terceira gerao) quanto o eurocentrado. Isto fica mais evidente no caso do Equador, que reconhece sete categorias de direitos: do buen vivir; de pessoas e grupos de ateno prioritria (velhos, jovens, gestantes, pessoas com deficincia, privadas de liberdade, usurios e consumidores, mobilidade humana, enfermidades catastrficas); de comunidades, povos e naes; de participao; de liberdade; da natureza; de proteo; alm de um apartado de responsabilidades. Mas pode ser visto no caso boliviano com a introduo de direitos das naes indgenas e um catlogo de deveres constitucionais. Terceiro: no somente tais constituies recebem influxo da Declarao da ONU, mas fundamentalmente se constroem a partir do protagonismo indgena, de que so resultado, tambm, um papel diferenciado da justia indgena (no caso boliviano, sujeita apenas ao Tribunal Constitucional) e um novo lxico baseado na prpria cosmoviso indgena (de que o reconhecimento de direitos a pacha mama no Equador e dos princpios- de cunho aimar- da nao boliviana so alguns exemplos). E ressaltam a necessidade de combate ao racismo (tambm em relao aos povos indgenas e no somente em relao a comunidades negras, como usual). Quarto: a insistncia tanto na descolonizao (mais evidente no caso boliviano, que destaca a prpria educao como descolonizadora), quanto no processo intercultural (desenvolvido de forma mais consequente no caso equatoriano). Disto se segue, tambm, que a plurinacionalidade acaba por questionar os limites do Estado constitucional e obriga a uma nova institucionalidade. Ignorar determinados parmetros inovadores das duas Constituies e querer colocar no mesmo parmetro a Constituio colombiana de 1991, que reconhecia de forma limitada a diversidade cultural (inobstante o desempenho
da Corte constitucional ser um dos mais avanados captulos do
constitucionalismo do continente), obscurecer o evidente protagonismo indgena e a luta por um padro descolonizador e plurinacional de Estado. E, assim, questionar fundamentalmente os parmetros eurocentrados do constitucionalismo.