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Processo: 07P4640
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: SANTOS CARVALHO
Descritores: OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA AGRAVADA PELO
RESULTADO
OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA SIMPLES
PARTICIPAÇÃO EM RIXA
NEXO DE CAUSALIDADE
FALTA DE DISCRIMINAÇÃO DOS FACTOS PROVADOS
INSUFICIÊNCIA DA MATÉRIA DE FACTO
VÍCIOS DA SENTENÇA
Nº do Documento: SJ200801100046405
Data do Acordão: 10-01-2008
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: RECURSO PARA NOVO JULG.
Sumário :
MATÉRIA DE FACTO
FACTOS PROVADOS
1- A hora não concretamente apurada, na noite de 17 para 18 de Maio de
2002, os arguidos A e B encontravam-se no Snack-Bar "Alternativa", sito na
Rua ................, em Setúbal.
2- Nesse estabelecimento, para além de outros clientes, encontravam-se C
acompanhado de um outro indivíduo de nacionalidade brasileira.
3- A dada altura, por razões não apuradas, verificou-se uma contenda, com
agressões físicas entre vários dos clientes que se encontravam naquele
estabelecimento.
4- Nessa sequência o arguido A colocou as mãos no peito do C e empurrou-o.
5- Entretanto, o C saiu do bar e dirigiu-se à sua residência, que dista poucos
metros do local, sita na Rua do .........
6- O arguido A encaminhou-se na direcção de C, logrando alcançá-lo já no
exterior do estabelecimento, tendo-se agarrado e agredido mutuamente, de
forma não apurada, até que foram separados por D.
7- No momento em que foram separados, o C encontrava-se no chão, de
joelhos, agarrado à cintura do arguido A, com as costas encostadas a uma
viatura automóvel estacionada a poucos metros da porta da sua residência.
8- C deslocou-se de seguida para a sua residência, sita na Rua do .........,
cerca das 00h52m do dia 18 de Maio de 2002.
9- C foi encontrado já cadáver, na sua residência na manhã do dia 19 de
Maio de 2002, apresentando o seu corpo as seguintes lesões:
- equimose de cor roxa ocupando a pálpebra superior do olho esquerdo;
- ferida contusa situada no supracílio esquerdo medindo 4 cm;
- duas escoriações situadas na face anterior do joelho esquerdo medindo,
cada uma delas, 1 cm;
- laceração do mesentério, infiltração hemorrágica do mesentério;
- hemoperitoneu que originou hemorragia interna com derramamento de
3000 cc de sangue para a cavidade peritoneal;
- peritonite; e
- edema cerebral acentuado.
10- As quais foram causa directa e necessária da morte do mesmo, ocorrida
no dia 19 de Maio de 2002.
11- O arguido A agiu livre, voluntária e conscientemente, com o propósito de,
com as actuações descritas, molestar fisicamente C.
12- Sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.
Mais se provou relativamente à personalidade e condições sociais/pessoais
dos arguidos:
13- O arguido A:
a) Em 29.05.2003 foi condenado na pena de oitenta dias de multa à taxa
diária de três euros, no âmbito do proc.° nº 134/02.7PTSTB-2° Juízo
Criminal do Tribunal da Comarca de Setúbal, pela prática de um crime de
condução sem habilitação legal, praticados em 28.02.2002.
b) Em 14.06.2005 foi condenado na pena de 9 meses de prisão, suspensa por
dois anos, no âmbito do proc.° nº 1516/03.2TASTB, da Vara de Competência
Mista do Tribunal da Comarca de Setúbal, pela prática de um crime de
ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art.º 143° do Código Penal,
praticado em 31.10.2003.
c) Completou o 5° ano de escolaridade, tendo tirado um curso de formação
profissional em construção civil no C.E.F.P de Évora
d) Trabalha na construção civil, como carpinteiro de cofragens, auferindo
mensalmente cerca de € 650,00.
e) Vive com a mulher e a filha de ambos, de 2 anos, em casa arrendada.
14- O arguido B:
a) Em 01.07.2004 foi condenado na pena de cinquenta dias de multa à taxa
diária de três euros, no âmbito do proc.° nº 117/04.2PTSTB-3° Juízo
Criminal do Tribunal da Comarca de Setúbal, pela prática de um crime de
condução sem habilitação legal, praticados em 16.06.2004.
b) Completou o 5° ano de escolaridade.
c) Trabalha na construção civil, auferindo mensalmente cerca de €700,00.
d) Vive sozinho em casa arrendada, pagando cerca de 0200,00 de renda
mensal.
e) Envia para o filho e para a mãe, que se encontram em Angola, cerca de €
150,00 mensais.
Verifica-se, contudo, pelo acervo dos factos provados e dos não provados que
o Supremo Tribunal de Justiça não pode decidir se assiste razão ao tribunal
recorrido ou ao recorrente.
Com efeito, do acervo dos factos provados não consta um nexo de causalidade
entre as agressões praticadas pelo arguido A (facto provado n.º 6) e as lesões
encontradas na vítima (facto provado n.º 9), o que aparenta ser um suporte
fáctico suficiente da decisão recorrida.
Mas, também do conjunto dos factos não provados não se indica que não está
provado que haja tal nexo de causalidade, o que, de algum modo, não exclui
que ao recorrente possa assistir certa dose de razão.
Na realidade, nos factos não provados indica-se como não provado no ponto S
que “Com tais actuações, os arguidos provocaram as lesões
apresentadas pelo corpo de C, quando este foi encontrado já
cadáver, no dia 19.05.2002...”.
Mas, se com tais actuações [descritas como não provadas nos pontos J a R]
não se provou que se produziram as lesões na vítima, não impede que as
lesões tenham sido uma consequência das agressões provadas no n.º 6, onde
se diz que “O arguido A encaminhou-se na direcção de C, logrando alcançá-
lo já no exterior do estabelecimento, tendo-se agarrado e agredido
mutuamente, de forma não apurada, até que foram separados por D”.
O facto de não estarem apuradas que agressões foram as que vêm referidas no
ponto 6 da matéria de facto provada não exclui que se possa relacioná-las
directamente com as lesões encontradas no cadáver da vítima.
Com efeito, se for possível determinar que a vítima - que se “deslocou de
seguida para a sua residência, sita na Rua do ..........., cerca das 00h52m do
dia 18 de Maio de 2002” - não mais saiu de casa nem foi visitado por alguém
até ser encontrado já cadáver, na sua residência na manhã do dia 19 de Maio
de 2002, apresentando o seu corpo as referidas lesões, e se for viável
demonstrar, por perícia médica, que tais lesões podem ter sido provocadas por
acção ocorrida mais de 24 horas antes da morte e que não podem ter sido
causadas por um acidente doméstico, como uma queda dentro de casa, então é
possível concluir, face às regras de experiência comum, que as agressões do
arguido A, mesmo que executadas por forma não apurada, causaram as lesões
encontradas no cadáver da vítima.
Por isso, o tribunal recorrido devia ter considerado como provado ou como
não provado se entre os factos descritos sob o n.º 6 e as lesões do n.º 9 existe
um nexo de causalidade.
E, no caso afirmativo, se o arguido A agiu com negligência no que respeita à
previsibilidade do resultado “morte”, isto é, se o representou como possível
face à sua provada conduta, mas com ele não se conformou [se o resultado
fosse desejado pelo arguido, ainda que a título de dolo eventual, o crime seria
o de homicídio e não o preterintencional].
Mas, ainda que não venha a ser possível provar um nexo de causalidade entre
os factos descritos sob o n.º 6 e as lesões do n.º 9, tal nexo de causalidade
pode, todavia, verificar-se entre a “contenda, com agressões físicas entre
vários dos clientes que se encontravam naquele estabelecimento” (facto n.º 3)
e as ditas lesões descritas no n.º 9, caso em que, estando demonstrado que o
arguido A participou activamente nessa “contenda” entre os vários clientes e
que, inclusivamente, também agrediu a vítima, poderíamos estar perante os
factos constitutivos do crime de participação em rixa, p. e p. no art.º 151.º, n.º
1, do C. Penal.
Com efeito, “quem intervier ou tomar parte em rixa de duas ou mais pessoas,
donde resulte morte ou ofensa à integridade física grave, é punido com pena
de prisão até dois anos ou com pena de multa até 240 dias”.
Neste tipo criminal, “O resultado morte ou lesão corporal grave - «donde
resulte morte ou ofensa à integridade física grave» - é uma condição objectiva
de punibilidade do tipo legal do crime de participação em rixa...Trata-se de
uma condição objectiva de punibilidade relativa ao facto, exigindo-se que
entre este e aquela haja uma relação de adequação causal, ou seja, que a morte
ou lesão corporal grave seja objectivamente imputada a actos praticados no
decurso da rixa...Pertencendo embora ao tipo legal, ela não integra o conteúdo
do ilícito da participação em rixa” (“Comentário Conimbricense”, I, 321).
“O tipo subjectivo de ilícito da participação em rixa exige o dolo em qualquer
das suas formas contempladas no art. 14.º: directo, necessário ou eventual.
Mas este dolo refere-se exclusivamente à perigosidade (para a vida ou
integridade física substancial de qualquer um dos participantes, incluindo o
próprio participante cujo dolo se procura determinar) da rixa e não ao
resultado morte ou lesão corporal. Assim, é indiferente a representação ou não
da eventualidade do resultado; indispensável e suficiente é a representação e
conformação com a perigosidade da rixa: dolo do perigo concreto. Sendo a
morte ou a lesão corporal grave uma condição objectiva de punibilidade,
evidente se torna a irrelevância da não representação ou da não conformação
com um tal resultado” (idem, I, 322 e 323).
Os Juízes Conselheiros