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O documento discute o suicídio de Getúlio Vargas em 1954 e seu impacto na política brasileira. Segundo o texto, o suicídio de Vargas adiou o golpe militar por 10 anos e permitiu a manutenção da democracia, com a eleição de Juscelino Kubitschek em 1955. O suicídio também transformou o equilíbrio político ao bloquear o golpe que se articulava contra Vargas e seu governo na época.
O documento discute o suicídio de Getúlio Vargas em 1954 e seu impacto na política brasileira. Segundo o texto, o suicídio de Vargas adiou o golpe militar por 10 anos e permitiu a manutenção da democracia, com a eleição de Juscelino Kubitschek em 1955. O suicídio também transformou o equilíbrio político ao bloquear o golpe que se articulava contra Vargas e seu governo na época.
O documento discute o suicídio de Getúlio Vargas em 1954 e seu impacto na política brasileira. Segundo o texto, o suicídio de Vargas adiou o golpe militar por 10 anos e permitiu a manutenção da democracia, com a eleição de Juscelino Kubitschek em 1955. O suicídio também transformou o equilíbrio político ao bloquear o golpe que se articulava contra Vargas e seu governo na época.
Vivo ou morto, Getlio o grande mito poltico da nossa histria recente. Seu suicdio foi um golpe de mestre. Imobilizando os inimigos, ele possibilitou a manuteno da ordem democrtica e a eleio de Juscelino, em 1955.
O suicdio de Getlio Vargas, ocorrido h
cinqenta anos, foi um acontecimento trgico e nico na Histria do Brasil, razo pela qual vem sendo recordado e reforado por mltiplos mecanismos da memria. No fosse isso suficiente, o ano de 2004 tambm assinala os quarenta anos do golpe civil-militar de 1964, outro evento traumtico da poltica nacional, que guarda com o suicdio um lao fundamental. No s os analistas polticos profissionais, como tambm grande parte da populao que tem acesso a informaes, sabem e repetem que o suicdio adiou por dez anos o golpe. Ou seja, se Vargas no tivesse dado um tiro no corao, a conspirao que ento se armava contra ele dificilmente seria evitada. O segundo governo Vargas (1950-54) no transcorreu em clima de tranqilidade, tendo o presidente sofrido, sistematicamente, a oposio da maioria da imprensa e de grande parte de setores polticos e militares. Mas, em agosto de 1954, uma grave crise se instalara com o atentado ao jornalista Carlos Lacerda, desencadeando um impasse de graves propores, onde se opunham um presidente eleito, gozando ainda de grande popularidade, e uma ferrenha e aguerrida oposio civil e militar, que acusava o governo, especificamente o prprio Vargas, de estar envolvido em um "mar de lama". Tudo isso, bom lembrar, tendo como cenrio a Guerra Fria, que alimentava o medo aos comunistas e tambm aos sindicalistas. A tenso chegou a tal ponto que a renncia do presidente foi pedida, ficando claro que, se ele no se afastasse, seria deposto mais uma vez. Foi nessas circunstncias que Vargas se matou, num derradeiro golpe poltico que visava reverter uma situao que vinha beneficiando os antigetulistas. Lanando sobre eles seu cadver, Vargas, como escreveu na carta-testamento, oferecia seu corpo em defesa do povo e da ptria, saindo da vida para entrar na Histria. Nunca se saber o que teria acontecido no Brasil caso Vargas no tivesse se matado. Mas certo que sua morte transformou o equilbrio das foras polticas vigente, bloqueando o golpe que se armava e possibilitando a manuteno da legalidade constitucional, com a realizao das eleies para presidente, em que saiu vitorioso Juscelino Kubitschek. Importa assim ressaltar o "sucesso" imediato do suicdio para a manuteno da democracia no Brasil. Trata-se de
uma excelente janela para se adentrar chamada
Era Vargas (1930-45), e a, particularmente, para se pensar nas razes que tornaram possvel a construo da figura desse presidente como um mito da poltica nacional. bom assinalar que a memria de 2004 reconstri os acontecimentos de 1954 na perspectiva dos quarenta anos do regime militar e de todas as frustraes que o pas viveu a partir da. Frustraes que, de certa forma, ainda vive, at porque sob o governo de um outro presidente que possui imensa popularidade, Luiz Incio Lula da Silva, e que, como Vargas, tambm conseguiu mobilizar as crenas e esperanas do povo brasileiro. Quando Vargas se matou, no era mais o chefe de um governo ditatorial, como o fora durante o Estado Novo (1937-45), mas um presidente eleito pelo voto popular, em disputado pleito ocorrido em 1950. Sua vitria foi uma surpresa para os opositores, reunidos na Unio Democrtica Nacional, a UDN. Estes acreditavam que um exditador no poderia ser eleito, e, se o fosse, no poderia tomar posse. Tanto que questionaram as eleies e a consideraram, como freqentemente os derrotados fazem, uma prova cabal de que o povo brasileiro no sabia votar. O povo, contudo, como evidencia a marchinha campe do carnaval de 1951, "Retrato do Velho" ("Bota o retrato do velho outra vez/ Bota no mesmo lugar/ O sorriso do velhinho faz a gente trabalhar", de Haroldo Barbosa e Marino Pinto), parecia no se haver enganado quando votou em Vargas para presidente. Foi esse mesmo povo, alis, que saiu s ruas de vrias cidades do pas, em agosto de 1954, chorando, gritando, provocando incndios e quebra-quebras, tudo para deixar claro seu apreo ao presidente morto e, mais uma vez, para assustar a UDN e os antigetulistas. Esses tiveram que fugir ou se recolher, reconhecendo a fora do ltimo golpe de Vargas: um golpe de mestre. Mas, como os historiadores sabem muito bem e insistem em ensinar, nada na histria "natural". sempre preciso entender que h responsveis por um acontecimento. No caso, que a popularidade de Vargas tem uma histria: quando e como ela comeou? Em que contexto nacional e internacional? Quem esteve especialmente envolvido na construo dessa figura? E que recursos, humanos e materiais, foram mobilizados? E por que, afinal, Vargas se torna um mito? Essa histria, em termos nacionais, certamente comeou em 1930. Nessa ocasio, Getlio Vargas j era um lder conhecido da poltica do Rio Grande do Sul e experimentara cargos a nvel federal, como o de deputado e mesmo o de ministro de Estado. Embora para os gachos fosse uma importante figura poltica, no conjunto do movimento "revolucionrio" de 1930 era apenas uma das lideranas. Assumiu a chefia do Governo Provisrio apenas por ter sido o candidato derrotado no pleito que motivara a sublevao. Ou seja, em incios da dcada de 1930, Vargas era um dentre outros nomes que poderiam ascender na poltica nacional. Se seu prestgio cresceu ao longo dessa dcada, isso se deveu a um conjunto de
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fatores prprios quele contexto e, tambm, a um
cuidadoso investimento poltico, no qual se envolveram diferentes rgos do Estado, alm, claro, do prprio Vargas. Nos anos 1930-40 vivia-se um tempo no qual a emergncia de lideranas personalizadas era considerada uma estratgia poltica moderna e operacional para se enfrentar os desafios de uma nova e desconhecida sociedade de massas, bem como para se gerenciar os problemas "tcnicos" que ela trazia em seu bojo. A produo de um mito poltico - o personalismo na vida de um Estado nacional - no era entendido como um sinal de "atraso" ou de menor "evoluo poltica".Ao contrrio, o personalismo, combinado com novos arranjos das instituies estatais, era proposto como a forma mais bem-acabada para se governar uma sociedade de massas com segurana, eficcia e legitimidade. Em relao aos investimentos polticos mobilizados, pode-se ver que a figura de Vargas comea a ser mais sistematicamente trabalhada, como o modelo exemplar de presidente, quando ele ainda o chefe do Governo Provisrio (193034) e o candidato eleio indireta, realizada pela Assemblia Nacional Constituinte, em 1934. Foi nessa ocasio e com o objetivo de divulgar os feitos da Revoluo de 30 e de seu maior lder que foi criado o programa radiofnico "A Voz do Brasil", existente at hoje. A partir da, a propaganda em torno do nome de Vargas e das realizaes de seu governo no pararam de aumentar, em quantidade e qualidade. Entretanto, foi s aps o golpe do Estado Novo, em novembro de 1937, que a preocupao com a construo do mito Vargas chegou a seu auge. Propaganda e represso eram, nesse perodo, faces de uma mesma moeda. Esse presidente, cuja figura se construa como um exemplo a ser seguido, inaugurava um novo tempo, em que o Estado intervinha legitimamente em esferas at ento intocadas da vida social, promovendo tanto o desenvolvimento econmico a industrializao, especialmente no setor das indstrias de base - quanto o desenvolvimento sociocultural, entendendo-se sempre que do primeiro dependia o segundo. Um presidente que podia e devia comunicar-se diretamente com o povo, sem quaisquer intermedirios partidrios, desejando tambm que "seu" povo com ele mantivesse contatos efetivos: em cerimnias cvicas, por carta etc. Dessa forma, sua figura devia estar no centro de todas as iniciativas encetadas pelo Estado brasileiro: tudo nele tinha incio e tudo, para ele, convergia como fim. Vargas, por conseguinte, era uma grande sntese. Ele reunia em sua personalidade todas as qualidades de nossas maiores figuras histricas, sendo reconhecido por sua clarividncia, sabedoria e coragem polticas. S que para fazer um bom governo, ele tambm precisava possuir as qualidades de "seu" povo, apresentando-se como um homem simples, ardiloso e matreiro, cujo sorriso se tornaria uma autntica marca registrada. Era justamente essa delicada combinatria que lhe permitia uma "proximidade de sentidos" com a
populao; uma proximidade que no eliminava
distncias hierrquicas, mas que possibilitava uma relao, at ento no experimentada, de confiana e respeito. Baixinho, meio barrigudo, sorrindo ou no, fumando charutos ou tomando chimarro, ele era o Geg, presente em marchinhas de carnaval e textos de literatura de cordel. Discursando em grandes ocasies, encontrando-se com os maiores lderes de seu tempo e defendendo os interesses da nao no difcil contexto da Segunda Guerra Mundial, ele era Vargas.Uma construo mtica exemplar, meio verdade, meio fico, feita para ser acreditada e querida pelo povo. Para o sucesso da empreitada, inmeros recursos foram mobilizados, tendo em vista a divulgao de sua imagem e de suas realizaes governamentais. Muitas cerimnias foram realizadas durante o Estado Novo. Nelas, em geral, Vargas se encontrava com e discursava para o povo, tendo ampla cobertura da imprensa escrita e falada. O Dia do Trabalho a mais conhecida, mas havia outros momentos, como as paradas militares do 7 de setembro; o 10 de novembro, quando se comemorava a instalao do Estado Novo; o dia da Raa; os festejos de Natal, por exemplo. Cartazes, bandeirinhas e santinhos com sua imagem eram fartamente distribudos nessas ocasies e em diversas outras. Seu retrato povoava no s reparties pblicas, como estabelecimentos comerciais, escolas, clubes e at casas de famlia. Cartilhas e livros didticos foram escritos, com ampla tiragem, sendo distribudos nas escolas. Assumindo caractersticas no oficiais e at ganhando tons irnicos, embora sempre sob censura, muitas charges de Vargas eram veiculadas por jornais e revistas ilustradas, insistindo em sua esperteza e malandrice polticas. Na mesma linha, eram tolerados personagens do teatro de revistas nitidamente referidos a Vargas, tendo ele mesmo assistido a algumas dessas peas. De maneiras muito variadas, uma srie de recursos propagava as mltiplas faces e facetas do presidente. Muitos outros exemplos poderiam ainda ser citados para caracterizar o inequvoco empenho e cuidado com que a burocracia varguista gerenciava os mltiplos aspectos que envolviam os contatos do povo com o presidente. E nesse sentido que um ltimo e fundamental ponto ainda deve ser destacado. Ele diz respeito ao fato de essa propaganda se fazer em torno de polticas pblicas, em grande medida efetivamente implementadas, pela primeira vez, por um governo no Brasil. Quer dizer, a propaganda varguista, como estudos recentes tm evidenciado, s teve boa recepo entre a populao porque, alm de ser macia e bem cuidada, articulava-se a uma srie de iniciativas governamentais que materializavam o que se anunciava, ainda que com muitas insuficincias e sem atingir a maior parte da populao, como ocorria no caso dos direitos do trabalho, que no alcanavam o homem do campo. A despeito da enorme distncia entre o que se prometia e o que se fazia de imediato, havia um vnculo efetivo entre
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o que se dizia e o que a populao experimentava
concretamente de forma direta ou indireta. por essa razo bsica que a populao em geral, mesmo a que no estava sendo alvo dos benefcios naquele exato momento, vivenciou tais iniciativas como respostas a demandas h muito veiculadas, mas sempre ignoradas e que, finalmente, comeavam a ter algum atendimento. Justamente por isso, essa populao passou a utilizar o prprio discurso produzido pelo Estado para cobrar a aplicao desses novos direitos, para garanti-los e para expandi-los, durante e aps o fim do Estado Novo. No casual, por conseguinte, que as ameaas liderana de Vargas, particularmente em meados dos anos 1950, tenham sido entendidas pela populao brasileira, especialmente pelos pobres e trabalhadores, como uma ameaa aos direitos sociais com os quais sua imagem sempre esteve ligada. Em muitos aspectos, portanto, tanto o ditador como o presidente eleito Getlio Vargas realizaram reformas na economia e na sociedade brasileiras, sendo que muitas de suas diretrizes alcanaram sucesso e continuidade no tempo. Essa constatao, contudo, no o torna, de forma alguma, um exemplo de lder democrtico, nem o afasta das violncias praticadas durante o Estado Novo, especialmente contra polticos e trabalhadores que a ele se opuseram. O que se precisa aceitar, para lidar com a poltica e com os mitos polticos, que eles no cabem em esquematismos simplistas e maniquestas, e que sempre perdemos muito ao tentar fazer isso. dessa complexidade e ambigidade, inclusive, que nasce muito de sua fora e permanncia. Vargas , nessa perspectiva, um grande mito. Tanto que continua sendo estudado e discutido como um referencial, provocando, at hoje, alguns sustos e surpresas. ngela de Castro Gomes pesquisadora do CPDOC/FGV e professora titular na Universidade Federal Fluminense.