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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS FACULDADE DE FILOSOFIA E CIENCIAS HUMANAS Ie CICLO DE CIENCIAS SOCIAIS LOGICA DO PENSAMENTO CIENTIFICO Caderno de Textos (Circulagéo Interna) 1981 Serene APRESEWTACKO Este caderno apresenta o resultado de alguns senestres de \ trabalho. A partir de 1975, quando da reformulagio do Prineiro Ciclo de Ciancias Soctais da FAPICH-UFHS, a equipe de professores de Léai- ca do Pensamento Cient{fico vem tentando encontrar un programa que, sen estar distanciado das preccupagées dos alunos, apresente as ques tGes mais pertinentes da Epistenologis das Cigncias Sociais. Proferimos evitar, de safda, © caminho tradicional, isto &, recusamos transpor para as cléncias sociais as discusses da File sofia da Ciéncia fundada nas ciéncias fisicas. Efetivado quase sen- pre em nome do rigor e da unidade da cincia, este transplante néo fe minimizar questies do campo so- eas ERAS faz mais que obscurecer problen: cfal. E sendo os nossos alunos da area de Cincias Soctais", este fa to significa um incitamento para pensar a especificidade desta irea. © caderno, além de una introdugdo (que serve a propésitos @iditicos), inclui os textos que conpiem as trés unidades do progra~ ma. A primeira unidade procura mostrar as conexSes existentes entre as idéias ea vida social, criticando qualquer perspectiva que defen 4a una autonomia abscluta do canpo intelectual. Na sequnda unidade, os textos dizem respeito diretanente & epistemologia das ciéncias eo clas tentando mostrar, sobretudo, a aua radical originalidade. Na Gitima unidade procurancs explicitar as interagdes entre ciéncia e soctedade. © todo do programa apresenta a intengio clara de ver a cién cia social e, de resto, a ciéncta em geral, enquanto compronetida com a realidade a que pertence © na qual é produzida. Contra os que véem na ciéncia un agradével jogo intelectual ou una forma de exerci elo ou de suporte do Poder, tentanos ver nela o lugar de debate © do confronto, 0 mesmo debate © o mesmo confronto que deven caracterizar as sociedades em que se inseren e a que ge referen. Lina glunoe-celouron_de Sociologia ¢ Antropologia, nicagao Sociat, Mstéria, Direito, Economit, Admi- nintrasdo, Ciencias Contabels, Bibiioreconomia, Letra e Educa Gao de UPC. 03 textos deste caderno ndo possuen unifornidade teSrica. 8 costune lanentar o fato das ciéncias sociais apresentaren tantas ai vergéncias entre seus pesquisadores, atribuindo-se isto 4 imaturidade destas ciéncias. No entanto, acreditamos que a inexisténcia de unani- odo ckenti midade no se deve tanto & auséncia de aplicagdo de un mi fico, mas sim & natureza mesma das questées tratadas nas cigncias so ctais © As diferengas e conflitos existentes nas sociedades sobre as quais se debrugam os cientistas sociais ©s textos no so originais; procuranos recolher © agrupar aqueles que mais auxiliassen em nossos propSsitos. Belo Horizonte, janeiro de 1981 Alexandre $.8.¢. Vivacqua Fernando Portela de Carvalho Léa Ferreira Laterza Maria Aparecida Andr Manoel de Souza Barbosa Ricardo Valério Fenati Ribeiro Carlos Roberto Drawin Miicia Regina de las Casas Paulo R, Margutt Pinto Pedzo Athos Rache Moreira PROGRAMA DE LOGICA pO PENSAMENTO CIENT tPICO 1, Conbecimento ¢ Sociedade: a vinculagio social das tavias 1.1, 0 saberes © @ vida social 1.2, Ox condicionantes histdricos-sociais dos conhecimentos 1.3, 4 velagio conhecimento-interesse 2. A especificidade das Cidncias Sociais 2.1, Bleaentos constitutives das cigncia: 2.2. Os processes histSrico-sociais ¢ as cigncias 2.3, 0 campo das cifnet sociais: pressupostos tedricos, pecull rigades de objeto © nétodos 3. Cigeeia e Sociedade: @ insergio social da ciéncia 3.1, Cidneia © poder 3.2. A pritica cientf fica 3.3, Clneia, Tecnologia © Sociedade 000 mexto 2 crfucta, soctenane & racrtswo'”? (Geteori Glezernan) * desenvolvimento desigual dos povos & produto da histéria, ndo da nature: Raga © opressio racial sio conceitos totalmente diferen- tes: as origens da raca estio na natureza, as da opressio racial so de carter social. de uma forma ou de outra, os idedloqos do racis: mo tendem a negar essa diferenca e a elevar a desigualdade racial A categoria de lei natural. Mas a antropologia, as ciéncias histéri cas € a scctologia refutan tais teorias cono anticientificas. As diferencas naturais entre indivfduos nio produzem por si 5 diferencas sociais. Sonente ecb certas condigdes sociais — & que cabe relacioné-los com a desiqualdade social. Nem a cor da pele, nen a natureza do cabelo, nem qualquer outra caracterfstica de raga pode explicar un nivel desigual de desenvolvinento sécio-econémico ox Easa desigualdade @ cultural entre indivfduos de ragas diferente: produto da histéria, nfo da natureza. Neste aspecto & importante definir corretanente a relagao entre os fatos biolégicos e 08 socials. Néo se pode negar 2 influén- cha dos fatores biolégicos na vida social. Existem relagées biolégi- umanos unidos en sociedade (como as de reprodu- gio da hunanidade, por exenplo), mas ndo sio estas as relagdes que deterninan a estrutura da sociedade © suas formas. A relagao do ho- mem com a natureza é diferente da do animal. 0 honen produz os mesos Ge sua propria existéncia e por este simples fato torna-se inadmis~ afvel estender & sociedade hunana leis apliciveis & esfera da vida animal. 6 ctentfeta russo Kliment A. Timiriazev, aiscfpulo de Dar~ win, observava com rasio que “a doutrina da luta pela existéncia de~ ter-se-d as portas da histéria 4a cultura. Toda atividade cultural 10 razoivel do honen no senio una luta contra a luta pela extetén= cla". A soctedade se desenvolve em consonincia com suas préprias leis soctais, e por isso a influéncia dos fatores btolégicos sempre se refrata através do prisma das relagSes sociais. Alén disso, préprias relagSes biclégicas mda sob a influgncia e em fungio das relagdes sociais. 0s antropSlogos denonstraran claranente que as diferencia- Ses raciais se referem apenas a caracterfsticas de menor importin- cha (por exemplo, a cor da pele e outras andlogas), que nio permitem tragar una linha divisGria definida e taxativa entre as diversas par tea da humanidade. De acordo com as estinativas de J. Lewis no i= ‘vo 0 Homen e a Evolugio, apenas 18 do nimero total de genes trans- mite caracterfeticas que éiferenciam una raga da outra. Bn outras Spocas, estas caracteriaticas realmente desempe- nharam certo papel na adaptagiio do homen As condicées naturais, mas foram gradativanente perdendo a importéncia 3 medida que 0 honen tronsformava a natureza com as suas atividades @ a0 nesno tempo nodi ficava © seu modo de vida; nunca chegaran a determinar 0 curso da pistria. © destino diverso dos povos na histéria nio se explica por caracterfsticas biolégicas, mas sim por condigées concretas de vida, por circunstincias histéricas, Nunerosos clentistas, entre os quais Gordon child, acreditam que o desenvolvimento social da humanidade io se identifica com o desenvolvimento biolégico. Desde que © honem apareceu na sua forma stual, seu desenvolvimento soctal transcorreu sem mudangas significativas na sua anstonia. o ritno desse desenvol- vimento nio foi determinado por fatores biolégicos. com 0 decorrer da histéria, a evolujio das condigdes s0- chats exercou influéncia cada vez maior sobre os aspectos biolégi- cos do desenvolvimento das ragas. 0 tamanho das diferentes popula- Ses raciais, sua migragéo, sua\mestigagem dependen princtpalnente das condigdes da vida social, cono denonstra,entre outr: fato de ndo existiren hoje em dia racas *puras". coisas, 0 n Apesar dos obsticulos eriados pela segrecagio racial impe~ rante em cortos pafses, a mesticagem segue 0 seu curso. Cabe supor que — aponta Nikolai P. Dubinin, famoso geneticista soviético — atualnente mais ou menos metade da pepulagio mundial € produto de © ano de 1492, quando Colombo descobriu a Ang mesticagem racial « rica, foi 0 ponto de partida do atual processo ger expaneio, em virtude do qual o patrinénio hunano se amalgama numa Ginica e gigantesca populagio. As dificuldades que representa a definigio de ragee a Anexisténcia de ragas "puras™ levaram muitos cientistas a renunctar esse conceito e a substituf-lo pelo de "grupos Stnicos". 0 prof. M. Fried, da Columbia University, propSe que nos livrissenos dese agressive palavrio". Em todo caso, na vida real as ragas existen mes, mo, € 08 grupos &tnicos (tribes, povos, nagdes) diferencian-se essen clalnente das ragas © slo, historicanente, formas sucessivas da comz aidade humana. fal como a conhecenos hoje, a humanidade foi integra- da por cerca de 2.000 nagées, povos e tribos diferentes. Esse mos co & reflexo fiel das diversas fases de desenvolvinento das diferen- tes partes da hunanidade, algumas das quais permanecem durante mais terpo na etapa da tribo relativanente pequena, enquanto outras pro- grediren até formas as grandes nagdes de hoje. (0 modo de gestagio das nagdes inplicou na unificagao de di versas terras povoadas por tribos ¢ povos afins e na formagéo de um territério nacional conn, assim cono na aparicio de uma comunidade econémice baseada na criazao de un mercado nacional Gnico, de Lingua nacional e de certas caracterfsticas comuns de estrutura men- tal, expressas em formas concretas de cultura. ‘todos esses elementos da nagio evolufram historicanente, mas nio de forma rigorosanente similtanea. Fundiram-se primero numa Spoca ben determinada, a saber, a da decadéncia do feudalisto e da aparigio do capitalismo. Assim, pois, tanto no plano histérico como do ponte de vista do squ contetide social, o desenvolvimento de tri- bos, povos e nagSes & um processo totalmente diferente do da forma das ragas. 2 certos cientistas opinam que « cultura é\o atribute béeico a raga, partindo do princ{pic de que a evolugio, a continuidade @ estabilidade de una cultura tém rafzes no patrininio genético de ume raga. J& por volta de 1920 essa tese fot refutada por virios chentes tas, particularmente por 0. Burke, no livro CULTURA E RENASCIMENTO, fe por F. Boae na obra O CEREBRO DO HOMEM PRE-ISTORICO; tanbém pelos autores dos trabalhos (alguns publicados originalmente pela Unesco) ave compen a antologia intitulada 0 PROBLEMA RACIAL E A SOCTBDADE, que apareceu pouco antes de 1950. £ verdade que o fato de herdar uma cultura e de conservar as caracterfaticas proprias e as tradigdes culturais ten grande im porténcia no desenvolvinento dos povos, ao suscitar neles 0 senti- mento de sua dignidade. Mas o mecanisno da continuidade na hiatéria & mutto diferente da continuidade do patrinénio genético. No mundo orgnico a acumulagéo @ a transmiseio de informs Bes de una geracio a outra faz-se principalmente por meio 40 neca~ nieno da hereditariedade, e entre os animate superiores também medi~ 0 aoe filhos dos habitos adquiridos pelos pais ante a transmi A transmissio das caracterfsticas blolégicas Linit Anformagio acunulada no cSdigo genético: a transmissdo da experti cha, pelo contrério, nfo tem limites. Entendida no gentido mais ge ral, a cultura 6 a encarnagio dessa experigncia, A soma dos tesou- ros nateriais e espirituais criados no cureo da histéria da hunanida ae. cone a cultura e sua maneira de transnissio néo estdo rela clonadas como mecanismo do patrinénio genético, 6 evidente que tan- bém no possuem conexio organica con a raca, J& que as caracterfsti- cas especiticas destas cio transmitidas geneticanente. A cultura e sua eingularidade néo eatio vinculadas & raga, maa sim a comunidades Stnicas de diversos tipos: tribos, povos ¢ na Qualguer que seja © modo de definir as ragas (mongélicas, negréide, caucisica ete.), nem todos os povos que podem ser classifi cados numa delas tém una cultura comun, Os negros dos Estados Unidos 13 aa Anérica possuem certa fonte de tradiges culturais e de caract rieticas proprias, herdadas dos negros africanos, mas sua cultura th relacionada com muito maior proporgio com as condigées de sua vi- aa atual. Os povos da Europa (de raga caucisica) so portadores de oulturas nactonais diferentes. una certa comunidade de cultura que ‘existe entre os povos da Europa Ocidental depende da comunidade do seu conteddo social e no de una comunidade racial dos povos bran= Costuna-se associar as vezes 0 desenvolvimento culturalam qualidades psicolégicas de tipo diverso, por exenplo, com a inteli- géncia, que na opiniie dos ideSlogos do raciamo depende da rag: J.Johnson e outros autores que excreveran sobre o assunto, mesmo ad- mitindo formalnente a igualdade das ragas, relacionan certas caracte riaticas da psicologia e dos complexos psicopatolégicos nactonaisam a raga. Cono resultado disso, deliberadarente ou néo, atribuem a cer tos povos una inferioridade mental, como que de fato chegam a con= cludes racistas. No entanto todas tentativas efetuadas vez ou outra para tabelecer experimentalnente una conexio entre raga e inteligénctatr cassaran na spresentagéo de provas convincentes. 0 préprio método on pregado nos testes & muito discutivel. £ inpossivel avaliar sultados sem levar em conta fatores sockais que ndo dependen da ra- ga: a posigéo social dos indivfduos, sua renda, a experiéncia e in trugio prévias, o grau de dominio da Lingua em que so apresentados 08 testes, of costunes e tradicdes culturats etc. Comparados os 1 eultados com os obtidos por outras pessoas em condigdes sociais mais ou menos similares, fica deamentido o mito da superioridade ou inf (ver 0 artigo de Otto Klineberg sobre Hloridade inatas dé una ra raga e inteligéncia publicado en "Le Courrier de novenbro de 1971). Mas a negagio decieiva do racismo ndo se encontra nos te tes psicolégicos e sim na experiéncia histérica dos povos que se 1i- fo racial ou nacional. Seu desenvolvimento acelers bertaran da opre do, sua capacidade de alcangar, em desenvolvinento cultural, os po- vos mais adiantados, a répida melhora na qualidade de sua educagio e © aunento do niimero dos seus especialistas constituen convincente gagio pratica das conjeturas reactonarias dos racistas. 4 ©8 povos da Unido Soviética e de outros paises onde reina © espirito de internacionalieno contam J com essa experténcia préti ‘ea. Conforme os dados do censo de 1970, 0 progresso mais répido do nivel de instrugéo da populagdo correspondeu as Repiblicas de Tadzi- quistio, Xirghizistio, Uzbequistio, Turkentstio e Kazquistio eis egies do Extreno Norte, nas quais una parte consideravel da popula gio se diferencia da populagio russa pela origem racial. Na luta pela Libertagio as nagSes e racas oprimidas do. ‘Terceiro Mundo defenden seus direitos e sua dignidade. néo costunan se inspirar em idéias nacionalistas, invocadas em oposigéo ao nacio- nalisno das ragas ou nag3es dontnantes. Mas um nactonalieno desse ti. po tem certa significagao progressista: contribut para a unificagio das diversas forgas denocriticas que estéo en condigées de combater pela libertagio nacional, pois desconhece ou subestina a diferenca entre as forcas sociais no seio do préprio povo oprimido. Entre os que lutan contra a opressio racial ¢ nacional nf 8 que invocam 0 racismo dos oprimidos para contrap3-10 ao dos oprt sores. Mi caminho da igualdade passa pela integragio, que exclui toda veleiaa, de de julgar os néritos das pessoas em funcio da cor de sua pele. © dirigente negro Martin Luther King insistia em que 0 0s problemas raciais © nacionais néo podem ser soluciona~ dos pelo chogue ou pela divisio dos povos, mas sim pela uniio das suas forgas progressistas. Esta tese & apoiada por Shery Taki, de- Legado da Tanainia,que, na conferéneia cient{fice internacional con- tra o racteno, realizada em dezenbro de 1971 en Moscou, negou energi, camente 2 idéia de que se deve opor una supremacia “negra” & “bran- Conparando a situagio da minoria negra em Cuba coma dos negros aitianos, que sio majoritérics no seu pafs, Shery Taki res- saltou que & um erro os povos de cor aspirarem a criar Estados gover nlo levarem em conta'as condi- objetivo. ‘nados apens Bes sociais ac Por pessoas de cor, stabelecer e: B afirmou: *Notanos em principio enormes diferencas entre 4 violéncia dos opressores e a violéncia dos que se defenden. Maso 18 pode ser resolvido deste modo. Procurar una solugéo para rosiens nfo : vrevnlenn racial sen lover om consideraglo az condigSes socists ea, fle a ge seter nun beco sem aafda..." 00 a dtico, 3 & pockéloge « filSs0to sovtéttces ¢ prot 0 ss tcadentande cidnciae da URSS. Por seus Ere Splines sheer es 0 Premio do Estado So~ feunterns see eae eet wigtico. Fer parte de Ge UNESCO = 1972 SETI EES SEILES aenre's meterialions nisegrice eo desea SEGUE Gabe dociaiteta, eratusido pera o francis, 0 ine Texto 2 ‘MOSCULOS No CORPO OU No ESPTRITO? MARTA MORAES A questio feminina ~ 0 trabalho fora de casa, 0 aborto, 0 aivér cio ea pfiula. "Pode uma mulher tornar-se igual ao honem, sentir cono um omen, agir cono um homen? E se pode, vale 2 pena o esforgo?” A questi‘ @ evidentemente metafisica e parte do principio. absurdo de que todos os homens efo iguais en nossa sociedade. Talvez todos os aninais de una mesma espécie - ureos ou leSes, por exemplo - comporten-se como tal, permitinic que se fale em "sentir como leio" oa “agit como urso". Mas no caso da espécie humana, o problema colo~ ca-se diferentenente, 0 escravo “sentia* e “agia” como 0 cidadio na Grécia antiga? 0 servo medieval era igual ao proprietério feudal,"sen tindo” @ “agindo” como este? 0 operirio “sente" e “age” como o empre- sirio? Eu todos esses casos, as diferencas impossibilitam que of “ho- mens possam ser pensados cono una totalidade sdéntica por oposigio as "mulheres". A condigio de proprietiria permitia que una mulher ti- 1¢ dominio absolute sobre seus escravos (fossen eles homens ou mi~ + © que indica que a condigio social de cada individuo mate eante para definir sua forma de “sentir” ¢ “agiz™ do que sua con @igio sexual. Por outro lado, @ evidente que além de compartithar da fora de “pensar @ agir™ de seu grupo social, as mulheres sofren os consequéncias de una opressio sexual. Fé a partir dessa dupla deter- minacio (a origer social eo sexo) que as mulheres se situario na o- chedade. Isso implica, portanto, em conteldos diferentes para a opres ‘io da milher: @ mulher dos proprietirios & oprinida enguanto as sonente as mulheres dos trabalhadores serio duplanente oprimids enquanto classe @ sexo. Logo, tanbém as mulheres, entre si, "pensan ¢ agen" i ferentenente. ther ‘Além disso, as diferencas sexuaie implican diferengas £fei que ninguém de bom senso jamais pensou om negar. B evidente,pots. que quando se fala em igualdade entre homens @ mulheres, se eaté pen- ” .ndo em iqualdade de condicées econtmicas, soctais © politicas e nio de eparéncia Fisica, cono pretende o duvidoso senso de hunor da auto- za a0 indagar:tnio sei ben porque no nos sugeriran ainda, o desen- volvinente da musculatura f{sica pelo exercfcio de halteres ou mesmo fa pritica obrigatéria do judé nos curriculos universitérios” 0 que podenos sugerir-lhe, © com urgéneia, 6 que tente des nvolvinento a capacidade mental ... cobrir um halteres-para 0 de: EXISTE UMA "NATUREZA FEMININA"? © principal argunento do pensanento conservador em relagao a0 problema feminino reside na identificagio das "caracterfsticas fe- mininas" que nossa sociedade atribui e inmpde s mulheres (passivid: de, desprendimento, inteligéncta tntuitiva, abnegagio, conformismo,au sancia de eapfrito 1égico, ete) A imposicdes de orden natural, isto Assim, a articulista garante que: aiferengas &, por determinagio da Natureza. ‘Wo, a mulher no pode, nem que quetra, virar honen. As Hleicas, f1stoldgicas, pefquicas e afetivas que os distinguen Antransponiveis, imposs{veis; apesar do esforgo que "em & feito para aproxini-los,confundi-ios, deforni~1o: ote reauefves Nada mais f8cil do que atribuir a seus adversirios racio- cfnios absurdos ¢ depois provar que o absurdo 6 absurdo... Que corren ‘te do movimento feminista levantou como programa transfornar a mulher por demais evidentes ea Ciéncta A qquestio de fun- fem honen? As diferencas ffsicas s ‘ainda nio conseguiu © imlante de Srgios sexuats... do esth en que @ tipclogia masculino-feminino de nossa sociedede (1s- to &, a divisic sexial entre os que devem ter autoridade © participar da vida piblica e as que deven ser sustentadas, desincunbir- tarefas donésticas ¢ ter cono horizonte a vida privada, entre as qua~ tro paredes de sua casa) néo corresponde a nenhuna determinacio 4a natureza, mas tio simplesnente a imposicées da sociedade. Nada menos chentifico do que a confusio entre caracterfsticas fisicas e psiqui- cas: a leitura de estudos antropolSgicos, como Margaret Meade Mali- nowski , por exemplo,pode ajudar a denonstrar que os papéis © caracte atribufdos a honena e mulheres varian encrnenente de forse os homens que apresentan a "tipologia* rfetic que, em muitas soctedades 18 feninina tipica de nossa sociedade ocidental e crista. (0s Tehamboult do ago Chanberi — entre eles os honens passam o dia a dangar, pin tar @ esculpir, enfeitados com flores e conchas, enquanto as mulheres usen 4 cabega raspada © nenhum ornanento, véo & pesca, executan todos 08 trabalhos duros e detém a iniciativa eo poder dentro das relagies 0 casal, etc.). Neste sentido, € abeurdo pensar em "psiquismo inatd! con se 8 honens fossen todos, por inperativo de orden genética, "for kes, violentos, de inteligéncta critica", etc., enquanto as mulheres se destacarian por serem "pacific: Submissas, anorosas", etc. A edu cago diferenciada que cada individuo recebe desde o nascimento ea agio conjunta das diversas instituigdes de transmissio da ideologia doninante ( jcola, igreja, etc.) 6 que vio dar origen — e reproduzir continuamente — 0 comportanento “magculino" @ “feminino" de forma que cada individuo esteja condicionado a cumprir o papel que a socte: dade ihe inpée. Finalmente, nunca & demais lesbrar que concepgdes do tipo "o destino esti na anatonia" tem servido tanto para justificar una deterninada orden sexual (0 predonfnio do homem), cono tanbém uma da~ a8 orden social (o predoninto de una classe sobre as outras) © una oF Gem racial (a "raga" branca como superior e dentro dela os "ariancs", etc), pois caimos no reino da arbitrariedade dos “mais aptos, mais Anteligentes e mais fortes"... ‘A EMANCIPAGKO DA HOLMER Forém,o aspecto ideol6gico mais importante de: Adentidade entre *natureza" e "caracterfsticas feminin, pretensa " esti na ne- gagéo da prépria questio feninina. com efeito, se ser *mulher" (isto 4, dedicar-se exclusivanente as tarefas donésticas, & procriagio e 4 educagio das criangas e ser subniesa, abnegada, etc.) corresponde a luna necessidade natural, da mesna ordem da necessidade do ou comer, seria un absurdo exigir transformagé respirar na situagio da mu her, assim como & absurd pedir a alguém que nio respire ou nko co- ma. Este 6, evidentenente, o ponto de vista da articualista, que cri- fica veenentenente a 1dé1a de que a mulher deva garantir sua enancipa }© econénica — pelo exercicio de una atividade remunerada — pots stonificaria "Libertar-se de seu papel de mie ¢ educadora, de garan- 19 esis tude "que 86 on- fe ine, 0, con tno, a mather starts ne te siragi, seu preter ave felicidae, pala simples Fa tio era a nua spiragio, = fio de responder plenanente & sua naneira de ser, ao jeito que Deus he den". Je mules & por ‘esnfncia e naturesa? a enpoee, a nie a dona de canny para gee ia ponnt se reshiar & inpresinaivel ase Senne tiinoe. 0 que guer diter que aqueles ue io 9. fLae~ ctntcingindo wo iat tnavorn w *alvine',wesindo # 169 de etérie sprewentat inna fe poligenta masculine ou feninina ren esta: ca da articulista. Além disso, ap ras formas de matrinénio, que A monogania, ficamos informados que: "0 casanento monocinico e inéLesolivel é uma instituig dizer que, para o honen ser feliz @ se desenvol- ela seural @ isso quer ver plenanente, tem que amar una mulher, ter filhos, viver com a vida inteira e juntos educarem os filhos que tiverem. Se brigaren, nfo tem importincia, nas quanto menos brigaren melhor, para eles © Pi ra os filhos." cobrir una "natureza feminina Tato &, nfo contente em ae 2 i Amutivel" a articulista descobre tanbém a existéncia de instituiges sociais, ou seja, correspondem a normas que Byevi (aoe nor detiniefo suisse comortanents ce ua doteninada sociated) satura Gentenente, como & inegivel o fato de que cada vez mais as pei “ , além de su- efor aa feparagSen e divéreioe) a arguta articuliete en ques Guess que ees prigas ado ten inportancia" e gue € preciso °fe Ge, reyer a plantinha do anor todos or dias con a aguinta fresca . ", enfatiza a necessidade ae eo eo rancia e do perdi compreensio, da tolerinct ese ‘una lei civil sadia e forte” para manter a "instituigio natural’ easanento nonoginico © indissolGvel. fm outras palavras: se honens @ mulheres ndo se comportaren “naturalente" azar deles; 0 que nic se sreto, pois com ele "fecha-se © pote permitir que se instaure 0 divércio, » oe cfroulo da destruigio da malher e com ela a da fanflia e 4a ae". 2 Da mesma naneire, sio assinaladas as duras consequéncias © @ivércio para a milher na medida en que: “Geralmente, o divércio ven Jum pouco tarde, pega a mulher mais velha, gasta pela vida e pela doa Go de s1 mesma. Resta-Ine, portanto, a solidio. Perde o seu pasado © 0 seu futuro, © um diploma de solteira em nada melhoraré a sua si- tuaglo, J como honen diferente: quando arreia a trouxa, ji esta pensando en cantar noutra frequesi. Poderfanos retrucar na base de outro dito popular: “antes 96 que mal aconpanhada” pots sonente uma masoquista vai preferir 0 inferno de una vida conjugal desacertada (quantas mulheres ngo soften quase cotidiananente violéncias fisicas, para nio falar de outros ti. pos de violéncia?) & tranquilidade da solidio. 0 problema est na ri Lldade, naquelas mulheres (nies dedicadas © esposas submissas) que, nao obstante cumprirem com todas as exigéncias da articulista, sie abandonadas pelo marido (e apesar de nio existir divércio, todos sabe os que © marido pode abandonar a mulher ...) quando J estio "gastas pela vida e pela doagio de si mesmas" (e si0 trocedas por una de vin- te anos...). Assim, aquilo que nio se pode negar § que o triste qui Gro descrito acina corresponde As consequéncias 16gicas da alienagio econémica @ social da mulher; ele & 0 futuro daquelas ue, caindo na amadiiha "da mulher dedicada exclusivanente so lar", néo consegui~ Fam, por mais tolerantes", "anorosas", ete. que fossem, "segurar seu homen". Esse, pots, 8 © prego da inexisténcia de projetos pessoateprs Prios, dando insergio em atividades piblicas, da redugio da vida acs estreitos limites do "lar". Sem se dizer que a base material de una afetividade equilibrada ects na relagio de igualdade om que os dol Parceiros sejan capazes de suprir a propria subsisténcia endo num gontrato de servidio em que a mulher, em troca de sua fidelidade e de trabalhos donésticos, recebe do marido seu sustento econémico. Todos sabemos que quando nio existe una eituagio de igualdade a lei que se impte & a do mais forte: ou o Estado passa a garantir a sobrevivéncia Ge todas as mulheres (cuja profissio seja "prendas donésticas") abando nadas pelo marido ou o que continuarenos ter & “o arbitrio" da lei na 34 consagrada expressio do governador Paulo Esyaio. a . OUPRAS CONDIGDES PARA A EMANCIPAKO FEMININA 0 exercfcio de una atividade remunerada significa una con Aigdo sine qua non para a emancipacdo 4a mulher, no sonente por im plicar em s%a autononta econdmica, cono também por permitir una toma da de conscincia social. Mas 0 trabalho, sendo una condigéo necesss- ria no constitu condigio suficiente para a completa emancipagio fe~ minina. Primoiranente, porque a opressio da mulher no se refere a0 aspecto econdmico da dependéncia financeira, mas diz respeito ao con- Junto de fungdes que a mulher deve cunprir ao nivel da procriagao, de educagio das criangas e das tarefas domésticas, isto , A soma de atribuigées da mulher dentro da fanflia. Nese sentido, © constante progresso dos contraceptivos permite que se concretize a distingio en tre sexualidade e procriagdo; possibilita que a mulher domine seu cor Po ; que decida da oportunidade ou nio de ter filhos, etc. Nessa medi a, a contracepsio por métodos seguros (e no perniciosos & saiide) cor responde a un dos grandes momentos do proceso de emancipagio da mu- ner (© todos os esforgos devem ser feitos no sentido de melhorar a qualidade dos contraceptivos ¢ garantir sua difuséo para as mulheres de menores recursos econdmicos\ Na Franga, por exerplo, a contracep- gio & inteiramente paga pele assisténcia piblica. eas tarefas do- Adenais, enquante a educay nésticas forem realizadas pelas mulheres, entre as quatro paredes de ua casa, terenos uma sobrecarga de trabalho — una dupla jornada_de trabalho — para aquelas mulheres que trabalnam fora de casa. f neces lo, portanto, que a sociedade em seu conjunte encarregue-se das ta das crtangé refas que hoje pesam sobre os ombros das mulheres. Creches, eacolas fen regine de semi-internato, restaurantes e lavanderias coletivas #80 reivindicagses hoje J§ conquistadas em muitos pafses do mundo. As diferengas gritantes entre a educagio dada acs meninos @ meninas, a auséneia de uma orientagdo profissional para as mulhe- Fes, as discriminagées legais, as disparidades salariais, as distor ses veiculadas diarianente pelos neios de comunicagio (com os dots protétipos de mulher: a dona de casa e 2 mulher objeto sexual), 30 entre outros exemplos, alguns dos problemas que as mulheres tém de en 2 fxentar a0 longo proceso de luta pela conquista de seus direitos. 0 témmino das discriminagdes sexuais 6, portanto, um dos aspectos do término das desigualdades sociats ¢ a garantia de una vida melhor pa- ta mulheres @ honens. 000 In Jornal MOVIMENTO. N¢ 34 - Fevereiro de 1976 TExTO Ne 3 (GARTA DO INDIO SEATTLE AO PRESIDENTE pos ESTADOS UNZDOS A carta abaixo fot escrita em 1855, por um {ndio norte-ane ricano de nome Seattle, cacique da tribo Duvanish. Ele dirigiu este documento ao entio Presidente dos Estados Unidos, Franklin Pierce. "0 Grande chefe de Washington mandou dizer que deseja com prar a nossa terra, 0 Grande Chefe assegurou-nos tanbén de sua amiza- de © benevoléncia, Isto & gentil de sua parte, pois sabenos que ele no precisa da nossa anizade. Varos, porém, pensar em sua oferta, pole sabenos que se nfo o fizermos, 0 honem branco vird com arnas e tomar nossa terra. 0 Grande chefe de Washington pode confiar no que 0 Chefe Seattle diz, com a mesma certeza com que nossos irnios brancos pode confiar na al teragio a: nto empalidecem. tages do ano. Minha palavra & cono as estrelas — elas como podes comprar ou vender 0 céu, 0 calor da terra? Tal 4d6ia é-nos estranha. Se no somos donos da pureza do ar ou do. re: Plendor da Sgua, como entdo podes compré-los? cada torrio desta terra 6 sagrado para meu povo. cada fo~ tha reluzente de pinheiro, cada praia arenosa, cada véu de neblina na floresta escura, cada clareira e inseto a zunbir séo sagrados nas tra @igdes © na consciéncia do meu povo. A seiva que circula nas arvores carrega consigo as recordagées do honem vermelho. (© homem branco esquece a sua terra-natal, quando — depois de morto vai vagar por entre as estrelas. Os nossos mortos nunca es- quecen esta formosa terra, pois ela é a mie do honem vermélho, Somos Parte da terra e ela é parte de nds. Ae flores perfunades sio nossa Arnis; © corvo, a grande guia — sio nosso iznios, As cristas ro- chosas, os unos das canpinas, o calor que emana do corpo de um mus- tanga, © 0 honen — todos pertencem & mesna familia, Portanto, quando o Crande Chefe de Washington manda dizer ue deseja comprar nossa terra, ele exige muito de nés. 0 grange che- 28 fe manda dizer que ir& reservar para nés un lugar em que possanos vi- ver confortaveinente. Ble sera nosso pai e nds serenos seus filhos. Portanto vamos considerar a sua oferta de comprar nosea terra. Mas ado vai ser flcil, ndo. Porque esea terra é para nés sagrada. Beta Agua brilhante que corre nos rios @ regatos nao é ape nas gua, mas sin o sangue de nossos ancestrais. Se te vender-nos a terra, ters de lenbrar que ela & sagradae teris de ensinar a teus filhos que 6 sagrada © que cada reflexo espectral na Sgua limpida dos Lagos conta os eventos © as recordagées 4a vida de meu povo. 0 runo- rejar a’Sgua é a vor do pai de meu pai. 08 rios so irméos, eles apagan nossa sede. os rics trans~ portam nossas cancas e alinentam nossos filhos. Se te vendernos nos- sa terra, tors de te lenbrar @ ensinar a teus £41hos que os rios sio Armios nossos @ teus, © terds de dispensar acs rios a afabilidade que @arias a um irnio. Sabenos que © honen branco néo compreende o nosso modo de viver. Para ele um lote de terra & igual a outro, porque ele & um fo rasteiro que chega na calada 4a noite @ tira da terra tudo o que ne- cessita. A terra nio 6 sua irl, mas sim sua inimiga, e depois de a conguistar, ele vai embora. deixa para tris os timulos de seus ante- passados © nem ce importam, arrebata a terra das mios de seus filhos @ no se importan. Ficam esquecidos @ sepultura de seu pai e o direi~ to de seus filhos A heranga. Ele trata sua mie — a terra — e seu ir mio — 0 céu — cono coisas que podem ser conpradas, saqueadas, vendi as cono ovelha ou miganga. Sua voracidade arruinar& a terra deixando para tris apenas um deserto. NBo sei. Nossos modos diferen dos teus. A vista de tuas ci @ades causa tormento aos olhos do honem vermelho. Mas talvez isso se- Ja assim por ser o homem vernelho um selvagen de que nada entendk Nao hf sequer lugar calno nas cfdades do honem branco. Nao nd lugar onde se possa ouvir o desabrochar da folhagem na prinavera ou © tinir das asas de um inseto, Mas talvez assim seia por ser un selva gem que nada compreende. 0 barulho aparece apenas insultar os ouvi- dos. E que vida & aquela se un honem nio pode ouvir a vor olitéria 40 curiango ou, de noite, a conversa dos sapos em volta de un brejo? i ae, he is, 2s ur ‘Sou un honen vermeino e nada conpreendo. 0 Indio prefere o suave su- ao ssurro do vento a sobrevoar a superficie de una lagoa eo cheiro préprio vento, purificado por una chuva do meio dia ou rescendendo @ pinhetro. © ar & precioso para o honen vernelho, porque todas as cri, aturas respiren em comum — 0s aninais, as Arvores, o honem. 0 homem branco parece nao perceber © ar que respira. Como un moribundo em Pro, Longada agonia ele & insensivel ao ar fétido. Mas se te vendernos @ nossa terra, ters que te lenbrer que o ar & precioso para nés, que © ar reparte 0 seu espfrito com toda vida que sustenta. 0 vento que deu ‘ao nosso bisavd o seu primeiro sopro de vida, também recebe o seu Gl- tino suspiro. E se te vendernos nossa terra, deveris manté-1a reserve da, feito santuiric, como un lugar em que o proprio honem branco pos Ar saborear 0 vento, adogado com a fragincta das flores camp tre: Assim pois, vanos considerar a tua oferta para comprar nos a terra. Se dicidirnos sceitar fare1 una condigio: 0 homen branco de terra cono se fossen seus irnios. Ve tratar os animais des! Sou um selvagen © desconhego que possa ser de outro jei- to. Tenho visto milhares de bisées spodrecendo na pradaria, abandona- Gos pelo honen branco que os abatia a tiros disparados do trem em no- vimento. Sou un selvagem e nio compreendo como um fumegante cavalo de ferro possa ser mais importante do que um bisio que (nés — os fn- ios) matanos apenas para o sustento de nossas vidas. 0 que & © homem sem of animate? Se todos os animais acabas ‘sen, 0 honem norreria de una grande solidio de espirito. Porque tudo quanto acontece aos animais, logo acontece ao honem. Tudo esti relacio Rado entre si. Deve ensinar a teus filhos que 0 chio debaixo de seus és Para que tenhan respeito 20 as vida da paren jo as cinzas de nossos antepassado: pafs, conta a teus filhos que a riqueza Ga terra tela nossa. Ensina a teus filhos 0 que tenos ensinado aos nossos; que a nie. Tudo quanto fere a terra — fere os fiihos da préprios. a terra & a no nossa terra. Se os honens cospem no cho cospem sobre e: 26 De uma coisa sabenos: a terra néo pertence ao homem; & 0 homen que pertence & terra. Disto tenos certeza. Todas as coisas es- tio interligadas, cono o sangue que une una fanflia, Tudo esta re- lacionado entre st. Tudo quanto agride a terra, agride aos filhos da terra.Nio fot o homen que teceu a trana da vida: ele & meranente un fio da nes- ma, Tudo que ele fizer A trana, a si préprio faré. 00 (ranscrito do Jornal "PASQUIM®.) MENSAGEM Do DIA po tnpto ‘*? “Hoje, dia 19 de abril, 3 0 dia que no pafs inteiro se de- ica a0 Indio. No sabenos quando fol criado © Dia do Indio e nem de ua especificagio, mas aproveitanos a oportunidade para levarmos — & opiniio piblica nossa mensager do Dia do Indio. Primeiro querenos di- ger que no dia 23 de abril do ano de 1.500, quando Pedro Klvares ci bral, pela prinetra vez, pisou nestas terras, foi o comego da expan- sio da civilizagio ocidental ¢ comego do fim das sociedades indige- nas. Com 0 passar dos anos, intensificou-se a nossa destruicdo, que fot acarretada pela civilizagio ocidental. Eeta usou os mais diversos Anstrunentos de degradagio,que foi o massacre de grupos indigenas. Ruxiliam neste nétodo as doengas trazidas pelo branco e por ns nun- ea antes conhecidas; a espoliagdo de nossas terras; a aplicacio de mé todos de educagic colonialista etnocéntrica, que nio respeitou a no ea estrutura pol{tica, econdnica e religiosa. Tanto assim 6 que até 0 adcule XVI 0 Indio era considerado animal irracional e precisou que © papa Paulo IIT declarasse 4 opinido piblica da época que Sranos se- res hunanos dotados de corpo e alma. Mas, apesar disso, a destruigio 40 povo indfgena continuow. Foi com a alarmante situagio e aos clano- res de alerta de pessoas de outros pafses que ent&o fot criado o SPI, Bervigo de Protegéc a0 Indio. A corruptividade desta entidade fez con que ele forse dissolvida, ao menos no nome, ¢ fot eriada a atual Fun— Gagio Nacional do Indio, Funai. No querenos deixar de reconhecer ant © esforgo que a Funai tem feito no campo de aseisténcia A saide, mas por outro lado, tenos a dizer que fatos comprovam também a omissio deste Srgio nas resolugSes eficazes na defesa dos nossos interesses, ‘0 ponto de auxiliar na espoliagio do patrindnio indigen: Portanto, estamos aqui tentando mais una vez ser ouvidos pelos Srgios oficiais e a opiniéo piblica. Sio inineras viagens dos representantes indigenas até Bras{lia, tentando resolver seus pro blenas. Nunca sons consultados pela Funai no que diz respeito aos pla Rejanentos. Tudo & decidido em Brasilia, gem a presenga ou sugestio 4e qualquer Indio. Se a Funai quer realmente ajudar o Indio em seu de senvolvimento, ela & que daveria pronover ¢ possibilitar este tipo 28 @e encontro, onde aos Indios fosse permitido se expressar livrenente fe Juntos buscar as solugées para os problemas. A Funai existe ni dez anos ¢ os problemas continuan os mesnos. Os {ndios sio povos livres que vivem hi milhares de anos nestas terrae. Néo podenos aceitar que ‘outro pove decida os caminhos que deveros trilhar. Dia do Indio deve ria ser o dia de escutar o Indio. As pessoas entendidas de problenas Andigenas e que fazem as decisdes em Brasflia slo antropSlogos e gen- te alta da Funai que ndo vive a realidade do {ndio brasileiro, por tanto ndo sentem o problema. Eeta gente parece que nio quer ouvir o Indio. Néo seria o momento de ligar a Funai diretanente & Presidén- che? Para nio nos acusarem de que estamos sendo teleguiados, somos francos em dizer que esta idéia surgiu hd alguns anos atrds, por pes- s0as sinpatizantes com a causa indfgena e que, no monento, & estudada Pelos {ndios como Gitima alternativa vidvel, porque como esti,a FUNAL Jamais terd autonomia em suas decisdes a favor do {ndio. como se pode conciliar divergéncias de interesses dentro da propria fanf lia? Enancipago © integragio sio termos antropolégicos. Que re Presentan estas palavras para o {ndio? Acaso foram termos criados pe- lo Indio? cono as sociedades indfgenas interpreta estes ternos ctpagéo @ integragio na sociedade © civilizagio ocidental? Acaso esta mos pedindo emancipagéo © integragdo na sociedade dos brancos? No, nbs quarenos apenas reconhecimento e respeito A nossa integridade ff- sica e cultural. Que nossa emancipagio © integrago sejan feitas den- tro de nossos padrdes culturais. Querenos, na oportunidade, declarar que a Tgreja, na sua totalidade, por muitos anos se manteve no silén~ clo ante a dostruigéc dos povos indiyenas. uitisianente se vem notan- 0 mais énfase da Igreja no campo da pastoral indigena. Como una nova Juz no proceso de libertago dos povos ind{genas, quen aparece com Gnfase neste campo é 0 Cimi - Conselho Indigenista Missionario. As Misses catdlicas ou protestantes, ou seja, de outros credos _ teréo que remodelar sua estrutura de agsisténcia ao Indio, despojando-se de sua {deologia colonialista e reconhecendo os nossos valores culturais Para que dentro de um trabalho con base na antropologia possam nos dar forga para que possanos ter una sobrevivéncia fleica e cultural, Portanto, hoje, reunidos em assenbléia de caréter nacional, somos Porte-vozes dos grupos indfgenas que néo puderam estar presentes. Nos 908 irmios de sangue se espalhan pelos quatrocantos desta imensa na- slo com a esperanga de verem seus problemas solucionados, principal- 2 mente © problema da terra, Sonos porta-vores daqueles nossos irnios que até hoje se mantém isolados, portanto, inocentes dos malefictos que civilizagio ocidentel pode acarretar a eles. Aproveitanos =a oportunidade para protestar contra qualquer ato ou intengio de manipy lagio, desprezo, imposicao, exploragao e destruigac dos povos indtge- ‘Que sejanos respeitados cono pessoas @ como sociedade. Portanto, anseios qualguer ato de imposigio e proibigdo vat contra os nossos mais elenentares. Nés, povos indfgenas, dentro deste contexto, nos omitinos de nossa responsabilidade de procurarmos, no esforgo Gnk 0, soluctonar os nossos* problenas ¢ atingir nossos anseios como po- ‘aque nos oprimen que somos dota: de fato, procurams dentro dos valores vos. Querenos mostrar a todos aquell dos de capacidade de raciocinic ¢ que, neios legais solucionar os problemas sagen do Dia do Indio, querenos oferecer um pouco dos nossos, pirituais @ humanos. E, para finalizar a noi a esta sociedade que esti despida dos valor Estes valores vooés encontrario na nossa forma simples de vivermos a vider. 000 (#) Teanscrito do JORNAL DE CASA - Belo Horizonte, 24a 30 de abril @e 1977. A presente Mensagem do Dia do Indio fol aprovada por 26 caciques das trios: Xavante, Bororo, Parect, Apiaka, Guarani, Kaigong, Kaaibi, Teena @ Kalows, reunidos na Ta, Assemhléia Wa cional (17 a 22 de abril), em Tjuf, 85, @ lida nas ruinas da mis~ ‘so de Sio Miguel (um dos sete povos das misses), em 19 abril. PRIMEIRA UNIDADE ‘CONMECTHENTO E SOCTEDADE: A VINCULAGHO SOCIAL DAS 1DEIAS. tEx70 No 5 ONTDADE I - CONHECIMENTO E SOCTEDADE: A VINCULAGKO SOCIAL DAS IDEIAS. (trecho do Capftulo 1 do Livro “Atma glussas SoctolSgiea™, de CH." WiTie7 Bx oi Bdttores = Rio de Sanciro (la. edigao original em 1959) ‘TEXTOS TiTRODUTORIOS © conjunto de textos aqui reunidos ten por finalidade fornecer alguns elenentos para que possanos iniciar una reflexdo sobre as relagdes entre as idéies, pensanen- tos, conhectmentos ¢ 0 meio social. Bate tema dever& ser trabalhado @ aprofundado no desen- volvinento de nosso curso. Hoje em dia os homens sentem, freqiientenente, suas vidas privadas como una série de armadilhas. Percebem que dentro dos mun- dos cotidianos, no podem superar suas preocupagées, ¢ quase sempre tém azo nesse sentinento: tudo aquilo de que os honens comuns tém consciéncta direta ¢ tudo o que tentan fazer esté Linitedo pelas Srbi tas privadas em que vivem. Sua viedo, sua capacidade, esto limitadas pelo cendrio préxino: 0 emprego, a fanflia, os vizinhos; em outros an bientes, movimentan-se cono estranhos, € permanecen espectadores. FE quanto mais consciéncia tém, mesmo vaganente, das ambigies © aneacas que transcendem seus cenirios imediatos, mais encurralades parecem ntir-se. Subjacentes a essa si anges aparentonente impessoais na se estenden por continentes inteiro temporinea constituem também realidades para o éxito e © fracasso de homens ¢ mulheres, individualmente, Quando uma sociedade se industria Liza, © canponés se transforma em trabalhador; © senhor feudal desapa sagio de estar encurralados estio my jtrutura mesma da soctedade © que As realidades da histdria con- rece, ou passa & ser homem de negicios. Quando as classes ascendem ou caem, © honem ten emprego ou fica desempregado; quando a taxa de in- vestimento se eleva ou desce, 0 homem se entusiasma, ou desanina-Quan 40 hd guerras, © corretor de quetes; 0 caieiro de loja, em honem de radar; a mulher vive 85, 4 .guros se transforma no langador de fo \ 3% erianga cresce sen pai. A vida do indivfdue ¢ a historia da soctedade no podem ser conpreendidas sen compreendernos essas alternativ: B apesar disso, os homens néo definem, habitualnente ansiedades om termes de transfomagio histérica e contradigio instity clonal. 0 ber-estar que desfrutam, no o atribuem habitualnente 20s yarandes altos e baixos das soctedades em que viven, Raranente — tén | consciéneia da complexa ligacdo entre suas vidas e 0 curso da histéria mundial; por isso, os homens comuns no saben, quase sempre, o que es sa ligagio significa para os tipos de ser em que estéo transformando fe para o tipo de evolugio histérica de que podem participar. Nao dis dem da qualidade intelectual bisica para sentir o Jogo que processa entre os homens e a sociedade, a biografia e a histéria, o eu e o mn a0, Nao podem enfrentar suas preocupagdes pessoais de modo a contro- lar sempre as transformagées estruturais que habitualnente estio atrés cies. Isto néo causa curpresa. Em que perfodo da histéria tantos homens estiveram to expostos, e de forma tio total, a transformagées tdo ripidas e completas? A hist6ria que atinge todo honem, hoje, 6 hist6ria mundial. Dentro deste cenirio e deste perfodo, no curso de luna Gnica geragio, um sexto da humanidade passou de tudo o que era feudal e atrasado para tudo o que @ moderno, avangado, terrivel. As colénias polfticas estio Libertadas; instalaran-se novas formas de i= perialismos, menos evidentes. Ocorrem revolugées; 06 honens sentem de perto @ pressio de novos tipos de autoridade. Surgem sociedades tota~ Litérias, e #%0 esmagadas desfazendo-se em pedagos ~ ou obtém éxito fa buloso. Depots de dois séculos de ascendéncia, 0 capitalismo € visto ‘apenas como un processo de transformar a sociedade num aparato indus~ trial. Depots de dois séculos de esperangas, até mesmo a democracta formal esté Limitada a uma peguena parcela da humanidade. Bn todo 0 mundo subdesenvolvido, 0s velhos modos de vida se rompem e esperangas antes vagas se transfornan em exigéncias prenentes ‘mundo superdesenvolvido, os meios de autoridade e violéncia tornam-se tais no alcance e burocriticos na forma, A prépria humanidade se des- dobra hoje A nosea frente, concentrando cada supernagio, em seu pective polo, seas esforgos coordenados ¢ macigos na preparagio da ‘Tercera Guerra Mundial. Em todo o A propria evolugio da histéria ultrepassa, hoje, a capacida de que tém os honens de se orientarem de acordo com valores que aman. % Jo esses valores? Mesno quando néo séo tomados de panico, eles quais véem, com freqiéncia, que as volhas maneiras de pensar ¢ sentir so anbigues até o pon traran em colapso, ¢ que as formas inciptent to da insensibilidade moral. Seri de espantar que os honens sintam sua incapacidade de enfrentar os horizontes mais extensos 3 frente dos quais foram tio subitamente colocados? Que néo possan com preender o sentido de sua época e de suas préprias vidas? Que.- om de fesa do eu - se tornem moralnente insens{veis, tentando permanecer co no seres totalmente particulares? Serf de espantar que se tornem pos- sufdos de uma sensagio de encurralanento? Mio & apenas de infornagéo que precisam - nesta Idade do Fa to; @ informagio Ihes domina com freqiéncla a atengio © esmaga a capa cidade de assimié-1a, Nio @ apenas da habilidade da razio que cisam - embora sua luta para conguista-la com fregiléncia ihe: ‘a Linitada energia moral. pre- esgote sntom precisar, 6 una qualidade de © que prectsam, ¢ 0 que espfrito que Ines ajude a usar a informagio e a desenvolver a a fim de porceber, com lucidez, © que esti ocorrende no mundo ¢ 0 que pode estar acontecendo dentro deles mesmos. £ essa qualidade, aftr, que jornalistas ¢ professores, artistas @ piblicos, cientistas edi- ores estao comegando a esperar daquilo que poderemos chamar de "I (2) A dmaginagio soctolégica capacita seu possutder a com preender 0 ceniric histérico mais anplo, em termos de seu significado para a vida fntina ¢ para a carreira exterior de numerosos — indivi- duos. Permite-Ihes levar em conta como os indivfauos, na agitagio de sua experigncta didria, adguizen freqentemente una consciéncia fal- a de suas posigées sociais. © prinoiro fruto dessa imaginacio - ¢ a primeira ligéo da cténcta social que a inoorpora - & a idéia de que o indiviauo 35 pode compreender sua propria experiéncia e avaliar seu proprio destino 1o- calizando-se dentro de seu perfodo; 86 pode conhecer suas possibi lida Ges na vida tornando-se cSnscio das possibilidades de todas as pes: soas, nas mesma circunstincias em que ele. Sob muitos aspectos, & una Ligdo terrivel; sob muitos outros, magn{fica. Bm nossa época che: ustadoranen ganos a saber que os limites da "natureza humana" so a: 36 te amplos. cheganos a saber que todo indivfduo vive, de una geragio até a seguinte, numa deterninada sociedade; que vive una biografia, & que vive dentro de una seqiiéncia histérica. £ pelo fato de viver, con ‘tribul para o condicionanento dessa sociedade e para o curso de sua histéria, ao mesno tempo em que condictonado pela sociedade e pelo a proceaso histérico. A Amaginagio sociolégica nos permite compreender a histd- ria ea biografia e as relacées entre anbes, dentro da sociedade. Es- ea a sua tarefa ea sua promessa. Un estudo social que no se volte para o problema da biogra fa, da histéria e de suas interligages dentro de una soctedade nio completou sua jornada intelectual. Quaisquer que sejam os problemas espectficos dos analistas soctais clissicos, por mais limitados ou am plas as caracterfsticas da realidade social que examinaran, os que ti veram consciéncia imaginativa das possibilidades de seu trabalho for- mularam repetida e coerentenente trés séries de perguntas: 1, Qual a estrutura dessa sociedade como un todo? —quais, seus componentes essenciais, e cono se correlacionan? Com difere de outras variedades de orden social? Dentro dela, qual o sentido de qualquer caracterfstica particular para a sua continuagio e para a sua trans formagio? 2. Qual a posigio dessa sociedade na histéria hunana? Qual @ mecinica que @ faz modificar-se? Qual é seu lugar no desenvolvinen- to da humanidade como un todo, e que sentido tem. para esse desenvolvi mento? Como qualquer caracterfstica particular que exaninemos afeta o perfodo histdrico em que existe, ¢ como é por ele afetada? E quanto a esse perfodo - quais as suas caracterfeticas essenciais? Com difere de outros perfodos? Quaie os seus processos caracterfaticos de fazer a histéria? 3. Que variedades de honens predominam nessa sociedade 1e perfodo? = que variedade irdo predoninar? De que fornas sio se- lecionadas, formadas, iberadas e reprimidas, tornadas sensfveis 0% Ampermesveis? Que tipos de “natureza humana* se revelam na conduta e carter que cbservanos nessa sociedade, nesse perfodo? E qual o sen ‘tido que para a *natureza humana” ten cada una das caracterfeticas da soctedade que exaninanos? a” . Seja.o objeto de exane de una grande poténcia, ou uma passa geira moda literéria, uma fanflia, uma prisdo, um exedo - slo estas a perguntas que of melhores analistas sociais formularan. Sio o¢ cen~ tros inteloctuais dos estudos classicos do homen na sociedade - © sic perguntas fornuladas inevitavelnente por qualquer espfrito que possua luna imaginagio scciolégica, Pois essa imaginagio é a capacidade de passar de uma perspectiva a outra, da polftica para a psicolégic. fxane do una nica fanflia para a anilise comparative doe organentos nacionais do mundo; 4a escola teolSgica para a estrutura militar; de constacragSee de una indisteia petroiffera para estudes aa poesia con tenporinee. fa capacidade de ir das mais impessoaie « renotes trans fornagies para os caracterfaticas mais intinas do ser hunano - ever aa relagdes entre as uss. Sua utilizegio se fundanenta sempre n4_he~ cessidade do conhecer 6 sentido social ¢ histérico do individuo na so ciedade © no perfogo no qual sua qualidade @ seu ser se nant ‘estan. 8 por isso, em suma, que por meio da imaginacio sociolégica 08 homens esperan, hoje, perceber o que esti acontecendo no mundo, ¢ compreender 0 que esté acontecendo com eles, enguanto minisculos pon tos de cruzanento da biografia © da histéria, dentro da sociedade. Em grande parte, a visio auto-consciente que o homem contemporaneo tem de si considerando-se pelo nenos un forasteiro, quando nao um estran= geiro permanente baseia-se na comproensio da relatividade social e da capacidad= transformadora da histéria, A imaginagio sociolégica é a forma mais frutffera dessa consciéncia. Usando-a, homens cujas menta- Lidades descreviam apenas uma série de Srbitas limitadas passan a sen tLr-se coo ge subitanente acordassem nuna casa que apenas aparentemen te conhecia. Com freqiéncia passan a sentir que nio podem proporcio- nar-se siimulas adequadas, andlises coesas, orientagées gerais. As de cisées anteriores, que pareciam eS1idas, passam a ser, entio, como Produtos de una mente inexplicavelmente fechada. Sua capacidade de Surpresa volta a existir. Adguirem uma nova' forma de pensar, experi~ mentan outra avaliagio de valores: muna palavra, pela sua reflexio © pela sua sensibilidade, conpreendem 0 sentido cultural das Ciénetas, Soctais. (2) Talver uma das distingées mais proveitosas usadas pe 1a imaginagao soctolégica seja a entre “os problemas pessoais origina dos no meio mais préximo" ¢ "a questdes piblicas da estrutura so- cial” que afetan os indivfduos na soctedade. Essa distingio 6 um ins- 38 trunento essencial da inaginacio sociolégica ¢ una caracterfstica de todo trabaiho classico na cigncia social. Os problemas pessoais ocorrem dentro do caréter do inaivt- uo e dentro do ambit de suas relagies imediatas com os outros; es- tio relacionados con o seu eu e com as Sreas linitadas da vida s0- etal, de que ele ten consciéncia dizeta © pessoal. Assim, a formula~ go © a resolugio destes problenas se enguadran, adequadanente, no im bite do indi viduo cono entidade biogrifica © dentro do alcance de seu neio inediato ~ 0 ambiente social que esti aberto diretanente 3 sua experténcia pessoal ¢, em certas proporgées, a sua atividade conecien te. Um problema pessoal & un problema privado: a pessoa sente que of valores por ela estinados estic aneagados As questées estroturais relacionan-se com assuntos que transcendem esses anbientes locais do individuo e o alcance de sua vi da Intima, Relacicnan-se com a organizagio de muitos desses anbientos sob a fora de instituigdes de uma sociedade histdrica como un todo, com as maneiras peles quais os varios ambientes de pequena escala so confunden © se interpenetram, para formar a estrutura mais anpla da vida social e histérica. Una questo & um assunto piblico: é um valor estimado pelo piblico que esté aneagado. Com fregiiéncia, hé um debate sobre o que esse valor realmente representa ¢ sobre o que realmente © ameaga. 0 debate freqlentenente 6 imprectso, pois 6 da propria naty reza de uma questo nio poder ser bem definida em ternos dos anbien- tes imediatos © cotidianos do homem comun. A questo, na verdade, en- volve quase sempre uma crise nas aispocigées inetituctenaia, © com freqléncia também aquilo que os marxistas chaman de "contradicées* ou "antagonianos" Nessas condicies, considerems o desemprego. Quando, numa cidade de com mil habitantes, sonente um honem eat desempregado, is- 50 seu problema pessoal, ¢ para sua solugio examinanos adequadanen- te 0 carter do hone, suas habilidades e suas oportunidades inedia- tas. Mas quando numa nag%o de 50 milhdes de empregados, 15 milhdes de homens no encontran trabalho, isso é una questio piblica, e nio pode Ros esperar sua solugio dentro da escala de oportunidades abertas is Pessoas individualmente. A estrutura mesma das oportunidades entrou fem colapso, Tanto a fomulagio exata do problema como a gama de solu Ges possiveis exigem que considerenos as instituigdes econdmicas e 9 polfticas da sociedade © nio apenas a situagio pessoal © 0 cardter de jum punhado de indivfduos.. Considerenos a guerra. 0 problema pessoal da guerra, quando ela ocorre, pode ser Sdbreviver ou morrer com honra; ganhar dinheiro con ela; elevar-se a alta seguranga do aparato militar; ou contributr para o seu término. En sua, segundo os valores de cada um, encontra- ren un ambiente e dentro dele sobreviverem & guerra, ou dotarem de sentido a morte por ela provocada. Mas as questées estruturais da guerra,relacionan-se com suas causas; com que tipor de homens ela ele va ao comando; com seus efeitos sobre as institulcdes econdmicas, po- Afticas ¢ soctais; com a irresponsabilidade desorganizada de un mundo de Estadoe-nagies. Considerenos 0 casanento. No casanento, o honene a mulher poden ter problemas pessoais; mas quando a taxa de divércios durante 08 primairos quatro anos de casanento & de 250 por cada 1.000, isso mostra que existe uma quostio estrutural relacionada com as institut Ses do casanento e famflia, e outras correlatas. Ou consideremos a metrépole - a horrfvel, bela, feia, mag- affica cidade grande. Para muita gente da classe superior, a solugao pessoal para o “problema” da cidade é ter um apartanento com garagen, no centro, da cidade, @ a 60 quilémetros una casa projetada por Henry HILL, com Jardim de Garrett Eckbo, em com acres de terras particula~ kes. Nesses dois ambientes perfeitanente controlados - com una peque- a criadagem em cada @ um helicéptaro particular para fazer ligagio - 2 maioria das pessoas poders resolver muitos dos problenas dos contex tos pessoais, acusados peles condigses da cidade. Mas tudo isso, por mias espiéndido, niio resolve as questées piblicas que a realidade es- trutural da cidade eria. Que fazer com essa naravilhosa monstruosida- 40? Diviaf-1a em unidades esparsas, combingndo residéncia e trabalho? Renovi-1a tal como se encontra? Ou, depois e evacuada, dinanité-la ¢ construir novas cldades de acordo con novos plancs, em novos lugares? Quats deverian ser esses planos? F quem decide © quen pée em pratica as decisdes tonadas? Sio questies estruturais; para enfrenti-las © so luctonflas & necess&rio considerar as quest3es polfticas e econdmi- cas que afetan nunerosos anbientes. Quanto a estrutura econénica & tal que provoca depresses, 40 © problema de desemprego foge A solugio pessoal. Na medida om que a guerra é inerente a0 sistema do Estado-nagdo © a industrializagio ir- regular do mundo, 0 indivfduo om seu anbiente linitado é impotente - com ou sem ajuda peiguistrica - para resolver os problemas que esse sistema, ou falta de sistema, lhe cria, Na medida en que a fanflia, cono instituigio, transforma as mulheres em adoriveis escravas © 0s homens em seus principais mantenedores e ao mesmo tempo dependentes. © problena de un casanento satisfatério continua @ fugir a una solu- ao exclusivanente pessoal. Na medida em que a superdesenvolvida nega Lépole © 0 superdesenvolvide autonével sio caracterfeticas int rinse cas da soctedade superdesenvolvida, as questdes piblicas da vida urba na no serio resolvidos pela engenhosidade pessoal e pela riqueza par ticular. Aqutlo que experimentanos em virics ¢ especfficos anbientes de pequena escala, j8 0 observei, 6 con freqiéneta causado pelas rodi, fcagdes estruturais. Assim, para compreender as modificagées de mui, toe anbientes pessoais, tenos necessidade de olhar alm deles. Eo ni mero ¢ variedade dessas modificagées estruturais aunentan 3 nedida que as instituigées dentro das quais vivenos se tomam mals gorais ¢ mais complicadanente ligadas entre si. Ter consciéncia da idéia da es trutura social ¢ utilisé-La com sensibilidade é ser capaz de identi- ficar as Ligagdes entre una grande variedade de ambientes de pequena fescala. Ser capaz de usar isso 8 possuir a imaginacic soctoléaica”, 5:2 (ad (Manheim, #. Ldeologia e Utopia. pig. 30 2.33. Zahar Ealtores, Rio de Janes~ Po. original ecrite ae’ 1929 21933) “A nossa principal tese € que existen modes de pensanento que no poden ser compreendidos adequadanente enquanto se mantiveron obecuras suas orfgens sociais. Realnente, é verdade que s6 0 indiv: duo & capaz de pensar. Nao hi entidade motaffsica alguma tal como una mente de grupo que pense acima das cabecas dos individues, ow cujas, AdSias © individuo meranente reproduza, Nio obstante, seria falso daf deduzix que todas as idéias ¢ sentihentos que motivan o individuo te- ahan orfgens apenas nele, e que possan ser adequadanente explicados topando-se unicanente por base sua experigncia de vida. Da mesma forma como seria incorreto tentar derivar wna Lin- guagen apenas da observagio de un sé indivfauo, que fala una Lingua- a . gen qve niéo & sonente dele, mas, antes, & a de seus contenporinecs © predecessores que para ele preparam o cantnho, & casbém incorreto ex- plicar-te a totalidade de una perspective com referéncia exclusiva i Sua génese na mente do individuo. Sonente num sentido muito limitado © individuo eria por st mesmo un modo de falar e da penser que ihe atrtbufnos. Ele fala a Linguagem de seu grupo; pensa do modo que eeu grupo penea. Encontra A sua disposigao somente certas palavras seus Signiticades, Eetas no apenas deterninan en um sentido mais axplo o8 Caninhos de sbordagen 20 mundo que o envolve, mas igvalnente nostra, f a0 pesno tempo, de que ingulo e en,gue contexte de atividedes o# ob Jetos foram anvertormence perceptiveis © acessiveie a0 grupo ou #0 4n aivfauo. © prineiro ponte ser por nés enfatizado & que, intencio- nalmente, a nossa abordagem nao parte do individuo isclado e de seu pensar a fim de prosseguir dixetanente até as alturas abstratas do “pensamento em si". Ao contrario, buscanos compreender 0 pensanento no contexto de una aituagio histérico-social, de onde 6 muito grada- tivamente emerge o pensanento individualnente di'ferenciado, Assim, ‘quem pensa nao sio os homens em geral, nom tio pouco individuos isola dos, mas os horens em certos grupos que tenhan desenvolvido un estilo de pensanento particular em uma interminavel série de respostas a cer tae eituagdes tipicas caracterfsticas de sua posiggo comin. Estritanente falando, & incorreto dizer que um individuo iso Lado pensa. Antes, é mais correto insistir em que ele participa no Aividuo se encontra em una situaclo herdada, com padrées de pensanen- to a ela apropriados, tentanto reelaborar os modos de reagio herda- dos, ou suhatituindo-os por outros, a fim de lidar mais adequadanente con novos desafios surgidos das variages e midangas em sua situagao. Cada indivfduo é, dessa forma, predeterminado om un duplo sentido pe- Jo fato de crescer em sociedade: encontra, por um lado, una situagao definida e por outro, descobre om tal situagio padrées de pensanento @ de conduta previanente formados. A segunda caracterfstica & mitodo proposte 6 nto separar 06 nodos de pensanento concretanente existentes do contexto da agao coletiva por meio do qual, em um sentido intelectual, descobrimos ink, cialmente © mundo, Homens vivendo em grupos, ndo apenas coexistem fi- 2 sicamente enquanto individuos, distintos. Nio se confrontan os obje- ton do munto a partir de niveis abstratos de una mente contenplativa em si, nem tampouco o fazem exclusivanente enguanto seres solitirios. Pelo contrério, agem com ou contra os outros, em grupos diversanente organtzados, ¢, enquanto agen, pensam com ou contra os outros. Estas essoas,-reunidas em grupos, ou ben se enpenham, de acordo con o cars ter e a posigéo dos grupos a que pertencem, en transformar o mundo da natureza e da sociedade & sua volta, ou, entio, tentam manté-lo em uma dada situagio. A direcio dessa vontade da atividade coletiva de transformar ou manter @ que pratuz o fic orientador para a emergéncia de seus problemas, seus conceitos ¢ suas formas de pensamento. De acor o com 0 contexto particular da atividade coletiva de que participam, 08 homens tenden sempre a ver diferentenente o mundo que os circunda, Bn certas 1 feras do conhecinento & 0 impulso para a ago que inicialmente torna os objetos do mundo acessiveis a0 sujeito que age, © além disso, & esse fator que determina a selagio daqueles ele- mentos da realidade que participam do pensanento. £ nko 8 inconcebf- vel que, se se exclufese inteiranente to (na medida en que isto fos: ¢ fator da vontade do sujei- possivel), 0 conteiido concreto desapa completanente doe conceitos, © se perdesse o princfpio organi tador que possibilita una colocagio compreensivel do problema. Nio querenos dizer que nos donfnios onde a adesio 46 grupo @ « ortentagio para a a Parecam ser essenciais & situagio seja va qualquer possibilidade de autocontrole crftico e intelectual. Talver Precisamente quando se tornem visivets a dependéncia oculta do pense mento & existéncia do grupo e seu enraizanento na agéo, 6 que seja Possivel, pela primeira vez, obter-se um novo modo de controle sobre fatores do pensanento anteriormente incontrolados". 5a (Prechos dos livros A Idsologia _Ale- mg (1845) e Pretacto a "ina contribat jo 8 crftica da Economs Polteica™ a pe "Bis portanto, os fatos: individuos determinados que tém wie atividade protutiva segundo un modo determinado entran em rela. es sociais © polfticas deterninadas. £ preciso que, en cada caso Asolado, a observagio empirica mostre nas fatos (e sem nenhuma especs Lagdo nen mistiticagio) 0 lago que une a estrutura social e politica 4 produgic. A estrutura social e o Estado resultam constantenente ao “3 proceso Vital de indivfduos determinados; mas destes individuos, nao fe na sua propria representacig ou aparecer na idade, ou seja, tal como operan bases © nas cone podem apresentar: de outrem, mas tal cono sic na re produzen materialmente: portanto, tal cono agem sobre condigdes © limites materiais deterninados ¢ independentes da sua von tage. A produgio das 1déias, dae representages e da consciéncia esti, om primetro lugar, direta e indiretanente ligada § atividade material e ao conércio natural dos homens, cono a linguagem da vida real. As representacdes, 0 pensamento, © conércio intelectual dos ho- mens, aparece aqui ainda como a emanagio direta do seu comportamento mate?ial. DS~se 0 mesmo com a produgo intelectual tal com se apre~ senta na Linguagem da polftica, das leis, da moral, da religiio, da metafieica, etc., de um pafs. Sio os honens ‘os produtores das suas re PresentagSes, das suas idéias, etc., mas homens reais, ativos, condi- clonados por deterninado desenvolvimento das suas forcas produtivas © a elas correspondentés, incluindo as formas mais largas pode ser senio 0 Ser consci- das relagée que estas poten tomar. A conscténcia ente, © 0 Ser dos honent $ 0 seu processo da Vida real. B se, em toda a Sdeclogia, os homens @ as suas relagSes nos aparecen colocados de ‘cabega para baixo cono muna cfnara escura, este fenémeno resulta de seu proceso de vida histérico, abeolutanente como a inversio dos ob- Jetos na retina provém do seu processo de vida diretamente ffsico. Ao contrério da filosofia aleni que desce do céu a Terra, & da terra ao céu que aqui se sobe. Ou seja, nio se parte do que os ho- mene dicom, inaginam, repre Lavras, no pensanento, na inaginagio e na representaao de outren, pa Fa chegar em sequida aos honene de carne e osso; parte-se dos homens na sua atividade real: @ a partir do seu processo de vida real que se envolvimento dos reflexos, dos ecos ideolégi- representa tanbén 0 a cos deste processo vital. & mesmo as fantasnagorias do cérebro hunano tio sublimaydes que resultan necessarianente do processo da sua vida Material que se pode verificar enpiricanente @ que aasenta en bases ateriais.oestes fator, a moral, a religiio, a netaffaica e toto ° resto da ideciogia, assim cono as formas da consciéneta que Ines cor esponden, perden imedlatanente qualquer aparéncia de autononia. Ela nio tin histéria, nio tém desenvolvinentor aio, pelo contririo, os he rene que, desenvolvend6 a sua produgio material ¢ as suas relagées ma teriais, transforman, com esta realidade que 1hes & prépria, quer 0 44 seu pensamento, quer os produtos do seu pensamento. Néo & a conseién- cha que determina a vida, mas a vida que determina.a conscténcia, No primeiro modo de considerar as coisas, parte-se da consciéneia como Sendo © indivfduo vive; no segundo, que corresponde & vida real, par- terse dos individuos reais © vivos e considera-se a consciéncia unica mente como a sua conscténcia. Este método de andlise nio @ desprovido de pressupestos.Par te de promis Rissas S80 os homens, no isolados ¢ inobilizados de qualquer maneira Amagindria, mas tonados no seu proceso de desenvolvimento, este empl, ricanente visivel. Desde que se represente este processo da atividade vital, @ histéria deixa de ser una colegio de fatos sem vida, como pa ra os empiristas, que sio eles proprios ainda abstratos, ou a ago Amaginéria de sujeitos imaginirios, como para os idealistas. .S reais endo as abandona un nico instante. Estas pre- Desde o principio que una maldig3o pesa sobre 0 “espfrito"; a de ser manchado por una matéria que se apresenta aqui sob a forma de canadas de ar agitadas, de sons, nuna palavra, sob a forma de Lin- guagem. A Linguagem & tio antiga cono a consciéncia - a linguagen é a consciéncia real, pratica, que existe tanbém para outros honens, que existe tambén para mim préprio e pela primeira vex por que, como a consciéncia, a Linguagen nio aparece. senio com a necessidade de in- tercinbio com outros homens. Onde existe uma relagio, ela existe para mim. 0 animal no tem relagSes com coisa alguna, nio conhece nenhuna Felagio. Para o animal, as suas relagées com of outros nio existem co mo relagées. A conscigncia & portanto, de infeio, um produto social e gontinua a sé-lo enquanto existiren homens". Ji) 08 pensanentos 4a classe dominante sio também, em todas as Spocas, os pensanentor doninantes, 04 #038, a classe que ten 0 poder naterial dontnante nuna dada sociciade tanbém:a poténcia dominante espiritual, A classe que dispse dos neios de produgio material dtepse iguaimente dos neice de produgio intelectual, de tal modo que 0 pensa nento daqueles a quen 80 recusados os neios de produgio intelectual estio submetidos iqualmente A classe doninante. Os pensamentos domi - nantes so apenas a expressio ideal das relagies materiais dominantes concebidas sob a forma de idéias e, portant, a expresso das rela~ Ses que fazen de una classe a classe doninante; dizendo de outro mo- do, sio as idéias do seu dominio. Os indivfduos que constituen a clas se dominante possuem entre outras coisas uma consciéneia, e & em con- 4s sequéncia disso que pensam; na medida en que doninan.enquanto, classe e determinan una Spoca histérica en toda a sua extenséo, & 1égico que esses individuos daninen em todos os sentidos, que tenham, entre ou- tras, una posigio dominante cono seres pensantes, como produtores de Aaéias, que regulanentem a produgdo e a distribuig#o dos pensamentos a sua época; as suas idéias so, portanto, as idéias dominantes da sud Spoca. Coneideremos por exenplo um pafs e um tempo em que o poder real, a aristocracia e a burguesia disputan.o poder e onde este por, tanto partilhado; venos que pensamento dominante @ af a doutrina da Aivisio dos poderes, por isso enunciada cono “lei etern: Agualmen Reencontranos aqui a divisio de trabalho que ante ramos como una das forgas capitais da histéria. Mani festa: te no seio da classe doninante sob a forma de divisio entre o traba- tho intelectual e 0 trabalho material, a ponto de encontrarmos duas categories diferentes de individuos nessa mesma classe. Uns serdo os pensadores dessa classe (ot ideSlogos ativos, que refleteme — tiran ‘a sua substéncia principal 4a elaboragio das ilusées que essa classe tem por si prépria), © os outros tém una atitude mais passivae mais 6 ilusdes porque sio, na receptiva face a esses pensanentos © a et realidade, os merbros ativos da classe sobre as suas proprias pes~ soas. No seie dessa classe, essa cisio 6 pode dar orfgen a uma certa oposigio e a una certa hostilidade entre Mas quando surge um conflito pritico em que toda a classe & ameacada, essa oposigdo desaparece e cai a Lluslo de que as idéias dominantes no ado as idéias da classe doninante e de que tém um poder distinto fs classe! A exintincta de (4élan revolucionarias — numa revolucio- duas partes em presenca. ao poder as Spoca determinada pressupse 34 a exsténcia de una clas! Aiscenos antericrmente tudo o que era necessrio referir scer- niria: ca das condigdes prévias de uma tal situagio. Adnitanos que, na maneira de conaeber a marcha da historia, se destacan as idéias da classe dominante dessa mesma classe dominan- te e que se consideran aquelas como una entidade. Suponhanos que $6 nos interessa o fato de determinadas idéias dominarem numa certa ép0- ca, .abstraindo portanto dos individuos © das circunstincias mundiais as idéias. Poder-se-5 entdo dizer, POF que possan estar na base dei exenplo, que no tempo em que reinava a aristocracia, estava-se em ple no reinado dos concestot de honra, de fidelidade, etc., ¢ que no ten~ po em que reinava a burguesia existia o reinado dos conceites de 1i~ 46 berdade, de igualdade, ete te. Fata concepgio da histéria, comm a todos os historiadores, prin= chpalmente como fato de of pensanentos reinantes serem cada vez mais abstratos, adquirindo cada vez mais una forma universal. Con efeito, cada nova classe no poder 6 obrigade, quando mais néo seja para atin Gir os seus fins, a representar o seu interesse como sendo o interes- ne comin a todos os membros da sociedade ou, exprimindo a coisa no plano das idéias, cbrigada a dar aos seus pensanentos a forma da uni- versalidade, de os representar como sendo os finicos razoivels, 08 Gnicos verdadeiranente vilidos. Do simpié com outra classe, a classe revolucioniria surge-nos prineiranente nio como classe mas como representante da sociedade inteir massa da soctedade en choque con a Gnica classe doninante. Isto 6 pos sivel porque, no infeto, o sew interesse est ainda intimanente liga- do ao interesse comun de todas as outras classes nko dominantes © por que, sob a pressio do estado de coisas anteriores, este interesse ain a nio se pide desenvolver conc interesse particular de una classe par ticular. Por este fato, a vitéria dessa classe é itil tanbén a muitos individuos das outras classes que ndo conseguen chegar ao poder; mas So unicamente na medida em que coloca os indivfduos am estado de po- derem chegar & classe dominante. Quando a burguesia francesa derrubou © dominio da aristocracia, permitiu a muitos proletérice subir acima do proletariado, mas permitiu-o apenas no sentido de que fez . deles burgueses. Cada nova classe apenas estabelece portanto © eeu dominio una base mais: vasta do que a classe que dominava anteriormente; por eutro lado, a oposigio entre a nova classe dominante e as que nio do- minam torna-se ainda mais profunda e atual. Dagut’se depreende que o combate que @ necessirio efetuar contra a nova classe dirigente teré por fim negar as condigdes sociais anteriores de una forma mais deci- -siva e mais radical do que aquela que fora empreque por todas as clas aes que antes detiveran © poder. 8 0 que pensa a prépria classe dominan- fato de ela ee defrontar cone toda a Toda a Llusio que consiste em pensar que © donfnio de una classe detesninada @ apenas o domfnio de certas idéias, cessa natu- ralnente delde qug o dominio de un classe deixa de ser a forma do re ine social, isto &, quando deixa de ser necessirio representar un 19 terense particular cono sendo o interesse geral ou de repreaentar 0 universal" cono doninante. Depots de separar as idéias dominantes dos indivfduos que “7 exercen © poder e sobretudo das relagdes que decorren de um dado thaio do modo de produgio, & fcil concluir que sic sempre as idéiae que doainan na histéria, podendo-se entio abstratr, dessas diferentes sdéiag, @ "Taéia", ou seja, # idé1a por excelénesa, ete., fazendo de- 1a 0 elemento que domina na histéria © concebendo enti todas as ¢ conceitos isoledos como “autodeterninagdes” do conceito que saése se desenvolve ao longo da histéria. Bm seguida, é igualnente natural fazer derivar todas as relagdes humanas do conceito de honem, do ho- men representado, da esséncia do honem, numa palavra, de o Homen. fo que faz a filosofia especulativa. (...)". (a conelusio geral que cheguei - e, uma ver alcangada, ser viu de guia a meus estudos - pode ser resunida da seguinte maneira: a produgao social de seus neios de existéncia, os homens ingressam en relagdes definidas, indispensiveis ¢ alheias a suas vontades, rela ges de produgio correspondentes @ una determinada etapa do desenvol= rele vimento de suas forgas produtivas materiais. 0 agregado dessas Ses de produgio constitui a estrutura econémica da soctedade, 0 ver- dadeiro alicerce sobre o qual se ergue una superestrutura jurfdica © politica e ao qual corresponden deterninadas formas de consciéncta so ela. 0 sistema de produgdo dos meios materiais de existéncia condi- clonam todo o processo da vida social, polfticae intelectual. Nio & a conscténcia dos honens que determina sua existéncia, porém, pelo con trério, & a cua existéncia social que lhes determina a conscincia. fm certo estigio de sua evolugic, as forgas produtivas materiais da Sociedade entran em choque con as relacdes de produgio esixtentes,ou, ‘© que & mera expressio legal disso mesmo, com as relagées de propric~ dade dentro das quais elas havian ingressado anteriormente. De formas de evolucio das forgas produtivas, essas relagdes passam a ser entra- ves delas. Inaugura-se, entio, una Spoca de revolugio soctal. con a midanga das fundag3es econénicas, toda a imensa superestrutura trans~ forma-se maie ou menos rapidamente. Ao apfeciar essas revolugdes, ne~ cessirio se torna sempre distinguir entre a revolugio material das condigdes econdmicas da protugio, suscetiveis de seren deterninades con exatidao cient{fica, e as formas jurfaicas, polfticas,religiosas, estéticas ou filos6ficas - em una palavra, ideoldgicas = pelas quais os homens toman conhecimente desse conflito e lutan para resolvé-lo. Assim cono no podenos julgar um indivfduo baseadcs na opintio que ele tem de si mesno, tanpouce podenos julgar una deseas pocas revoly clondrias pela sua prépria conscigncia; pelo contrério, porém, essa 43 conseiéncia ten de ser explicada a partir das contradicées da vida ma terial, do conflito existente entre as forgas produtivas sociais © as relagdes de produgio. Um sistena social nunca perece antes de se te- rem expandido todas as forgas produtivas que nele cabem; © novas rela ges de produgio, mais elevadas, nunca aparecem antes de as condi gies materiais para sua existéncia teren anadurectgo no ventre da propria Sociedade antiga. togo, # hunanidade sempre se propée apenas os pro- blemas que @ capaz de resolver; e mais, quando olhams o ascunto mais de perto, sempre constatanos que © problena #6 desponta quando as co @igées materiais para sua solugéo J& se achan presentes ou, pelo ne- os, em vias de concretizar-se (trecho do 1¢ capftulo do Livo Dials tica do Concrete de Karel Kosik, Ed> Pare Terra, RJ, 1976) "A atitude primordial ¢ imediata do homen em face da reali- @ade no 8 a de um sujeito abstrato que conhece, de una mente pensan te que examina a realidade especulativanente; @ a de un ser que age objetiva e praticamente, de um individuo histérico que exerce a sua atividade pritica no trato com a natureza e com os outros honens, ten do em vista a consecugio dos préprios fins e interesses, dentro de un determinado conjunto de relagdes sociais. Portanto, a realidade nio se apresenta aos honen: que cumpre instituir, analisar e compreender teoricanente, cujo polo poste © complenentar seja justanente aquele sujeito que conhece, que existe forave separado do mundo; apresenta-se como 0 campo en que se exercita a sua atividade pratico sens{vel, sobre cujo fundanento sur- gird a intuigio pritico-imediata da realidade. No trato priticomuts li 3 prinetra vista, sob 0 aspecto de un objeto tBrio com as colsas - em que a realidade se vevela cono o mundo dos neios, fins instrumentos, exigéncias ¢ esforgos para satisfazer a es- tas - 0 individu "em situagio” cria suas préprias representagées das coisas @ elabora todo um sistena de nodes que capta e fixa o aspec- to da realidade a que tem acesso imediato. Todavia, as formas sob as quais a realidade parece - e que sio reproduzidas, na mente dos in- @ividuos com un conjunto de categorias do “pensanento comun" - podem Ser diferentes © muitas vezes contraditérias com a estrutura das coi- sas, com as leis dos fenémencs @ con seus conceitos correspondentes. Assim, por exemplo, o8 homens usam o dinheizo e com ele fazen as transagées mais complicadas, sem a0 menos saber, nem serem obrigates “9 a saber, o.que & 0 dinheiro. Por isso a praxis utilitiria imediata © senso comum a ela correspondente colocam © hone em condigées do ortentar-se no mundo, de faniliarizar-se com as coisas e manejé-las, mas nid proporcionam a compreensio das coisas e da realidede” (Suzanne K. Langer ~ Filosofia em No- va Chave. Ed. Perspectival. “cada era ten as suas préprias preccupagées. Seus problemas Se nosso olhar remontar por sobre a lenta forma— Ane sio peculiare: Hoe” acumulagio de doutrinas que marcam a histéria, poderemos distin guir em seu transcurso certos agrupanentos de idias, nio segundo 0 assunto, mas segundo um fator comum mais siti que cabe denominar sua “técnica”. £ mais 0 modo de tratar os problemas, do que aquilo sobre juntos poden fo qual versan, que of refere a deterninada época. Seus ser fortuites, ¢ dependen de conquistas, descobertas, pragas ou gover nos; seu tratanento deriva de una fonte mais constante. Ata primeira expressio cono pergunta. 0 modo pelo qual una pergunta & pro posta limita e assenta os meios pelos quais qualquer resposta a ela Jer dada. Se nos indagam: “Quem fez 0 mun- nica", ou tratanento, de um problema conega com sus = certa ou errada ~ pos: 402", podenos contestar: "Deus 0 fez, "0 acasoo fez, "0 anor @ 0 Sato fizeram-no", ou tudo o que se quetra. Podenos estar certos ou e1 tar errados. Mas se replicarmos: "Winguém 0 fez", acusar-nos-io de tentarnos ser obscuros, espertos ou “pouco simpiticos”. Pots no lth mo exemplo, 56 na aparéncia denos una resposta; na realidade, rejeita mos a questio. © inguiridor vente-ne solicitado a repetir o probleme. *Entio como 0 mundo #e tornou com 87". Se agora redargiixnos: Ele io ‘ge tornou’ de modo algun", 0 interlocutor ficari realmente per~ turbado. Tal "resposta” repudia claramente a prépria estrutura de seu pentanento, a orientagio de sua ménte, as suposigées bisicas que sen- Pre considerou cono nogées de bom senso acerca das coisas em geral. Tudo se tornou o que é; tudo possui una causa; cada midanga deve - vi- sar algun fin; 0 mundo & una coisa, ¢ fol certamente produsido por eso de alguna agdo, de alguna matéria-prima original, por alguna ra~ tio, Estas so viae naturais do pensanento. Tais "vias" implfcitas aio so confessadas pelo hone médio, porém simplesmente seguidas.£le no tem conscigneia de assumir quaisquer principios bisicos.Estes sic © que um alenio chanaria de eltanschawung, de mua atitude de expiri- 50 to mais do que artigos de £8 espectticos. constituen seu modo de vers so mais profundes do que os fates que ele talvez nio possa ou propo- sigdes que talvez quetra discutir. Mas, conquanto nio declarados, encontram expressio ni as de sua questées. Uma questio na realidade una propocigio ambi- gua; a resposta & sua determinagio, Pode exiatir apenas determinado nimero de alternativas que hio de lhe completar o sentido. Destarte, © tratamento intelectual de qualquer dado, de qualquer experiéneia, Ge qualquer objeto 6 determinado pela natureza de nossas indagacées, sendo apenas levado a cabo em nossas respostas. for Na ELlosofia, essa disposicio de problema é a coisa mais im portante com que uma escola, um movimento, ou una época contribul. Af Feside 0 génio de una grande filosofia; & sua luz, os sistemas sur gem, dominan @ morrem. Una filosofia, portanto, caracteriza-se mais pela formulagao de seus problemas do que pela solugio que Ihes ofere- ce. Suas respostas estabelecen un ediffcio de fatos; mas suas pergun- tas compen 2 moldure-dentro da qual o seu quadro de fatos é delinea- @o.-las Constituem mais do que a moldura: proporciona © Angulo de perspectiva, a paleta, 0 estilo em que o quairo tragado - tudo me- nos © objeto. Bn nossas perguntas encontran-se nossos princfpios de @ nossas respostas podem expressar tudo o que esses princf- de adnitir. andlis pios sejan capaze HA uma passagem em Cigncia ¢ 0 Mundo Moderno, de Whitehead, expondo essa predeterminagio do pensanento, que € ao mesno tempo sua arnagio e seu limite. "Quando estiver criticando a filosofia de una dpoca", diz o Professor Whitehead, “no dirija a atengio principalnen te para aguelas posigées intelectuais que seus expoentes julgam neces, sirio defender de maneira expifeita. Haver§ sempre algunas euposigées fundanentais que os adeptos de todos of virios sistemas da Spoca in- conscientemente pressupdem. Tais supcsigées parecen to dbvias que as pessoas nio saben o que estio assumindo, porque nenhun outro modo de colocar as coisas jamais lhes ocorreu. Com essas suposigées certo ni- mero limitado de tipos de sistenas filoséficos so possiveis, e esse grupo de sistemas constitut a filosofia da época". MA alguns anos, o Professor C.D. Burns publicou un pegueno @ excelente artigo denominado “0 Sentido do Horizonte", em que efe- 51 tuou uma aplicagio algo mais anpia do mesmo princ{pio: pots assinal: va af que toda civilizago tem seus limttes de conhecinento - de per~ cepgées, reagées, sentinentos © idéias. Para citar suas préprias pal "A experiéncia de qualquer momento possui seu horizonte. A expe Fidncia de hoje, que ndo a de amanh’ no horizonte de hoje. A expe- r4éncia de cada homem pode somar-se & experiéncia de outros homens , gue vivem em seu tempo ou viveram antes; e assim um mundo comum de experiéncia, maior do que o de sua prépria observagio, pode ser viven ctado por todo homem. Todavia, por mais amplo que seja, este mundo co mun também possut seu horizonte; © neste horizonte esth aparecendo no va experténcia...", 00 SEGUNDA _UNIDADE A ESPECIFICIDADE DAS CIENCIAS SOCIATS TERTO NO 6 © UNIVERSO 0 Discurso crpNttPIco “Gr+) 08 conceitos da cténcia sio criagies do espfrito hy ynano, @ no, como possan parecer, coisas determinadas pelo nundo exte rior, No nosso esforgo para compreender a realidade, nossa situagio lombra a de un honem tentando compreender mecanisno de un relégio fectiado. Ble vé o mostrador e os ponteiros em movimento, cwve o seu taue-taque, mas nio ten meio algun de abrir a caixa. Se for engenho~ so, poder formar a idéia de ux mecaniano responsivel por tuto 0 que gbserva exteriornente, mas ndo paleré munca ter a certeza de que 0 ne eantano que imagina seja o Gnico capaz de explicar suas observagies dos novinentos exteriores. Nio poder nunca comparar a idé1a que forma do necanisno in terno com 0 mecanisno real, nen sequer pode imaginar a possibilidade ou 0 significado de tai comparagio mas certanente cré que, A medida que 0 seu conhecimento cresce, a sua representagéo da realidade se tornaré mais simples e mais explicativa de um némero cada vez maior de coisas. E pode crer na existéncia de limites para o conhecinento e aanitir que © espfrito human deles se aproxima, Podera chamar esse Limite ideal de *A verdade objetiva” (Einstein , Ave Infeld, L.- A Evo lugio da Fisica, Trad. de Giasone Rebuk, Zahar E4., pag. 35/36.) 00 ExT wo 7 O QUE 8 cxBNCrA? (+) 1, Introdugio Enquanto os animais inferiores 85 estio no mundo, © trata de entendé-lo e, sobre a base de sua inteligéncia inperfeita, mas perfect{vel do mundo, © homem procura asaenhoraar-se dele para tor nf-lo mais confortével. Neste processo constréi um mundo arti ficta esse crescente corpo de idéias chamado “Ciéncia" que pode caracteri~ zar-se como conhecimento racional, sistemitico, exato, verificivel e, por conseguinte, falivel. Por meio da investigago cient{fica o honem ten alcangado una reconstrugio conceitual do mundo que € cada vez mais anpla, profunda e exata. tn mundo & dado a0 honem; sua gléria nio & suportar ou de- preciar este mundo, mas enriquecé-lo construindo outros universos. Anansa ¢ renodela a natureza submetendo-a a suas préprias necessida- des; constrét a soctedade e &, por sua vez, construfdo por ela; trata logo de renodelar este anbiente artificial para adapti-lo a suas pré- prias necessidades animais ¢ espirituais, assim com a sous sonhos: ceria, dessa forma, 0 mindo dos artefatos © 0 mundo da cultura. A ida cia enguanto atividade - enquanto investigagio - pertence § vida so- cial; quando & aplicada ao aprinoranento de nosso meio natural e arti ficial, & invengio e produgo de bens materiais e culturais, a cién- cla se converte em tecnologia. A Ciéncia, nio obstante, aparece para nds cono a mais deslunbrante e assonbrosa das estrelas da cultura quando a consideranos um bem em si mesmo, isto &, como um sistema de Adias estabelecidas provisorianente (conhecimento cient{fico) e como uma atividade produtora de novs tenos de caracterizar 0 conhecinento © a investigagio cient{ficos tal como io conhecidos atualnente. Adéias (investigagio cientffica) .2ra (*) Tradugio do capftulo 1 go livre "La Ciencie. su setogo Y su file sofia" de MARIO BUNGE. Ediciones Sigle Veinte, Buenos Aires ,1973 37 2. Chdneia Formal e Ciéncia Pética Men toda investigagio cientified procura © conhecimento ob jetivo, Assim a légica e a matenitica - isto &, os diversos sistemas de légica formal e os diferentes capftulos da natematica pura - so sistendticos, © verificivets, mas nio so objetivos, nic ecupam ractonais, nos dio informagées. acerca da realidade: simplesnente nao se dot fatos. A lovica ea matenStica tratan de entes ideais; estes en- tes, tanto os abstratos como os interpretados, 96 existem na mente hu nana. Aos légicas e mateniticos no so dados os objetos de estudo: eles constréen seus prépriot objetos. £ verdade que, freqilentemente,o fazen por abstragio de objetos reais (naturais e sociais); mesmo as~ ‘sin 0 trabalho do légico ou do matemético satisfaz amifde as necessi- dades do naturalista, do eoctSlogo ou do téenico, e & por isto que @ soctedade os tolera e, atualmente, até os estimula. Mas a matéria pri, ma que empregan no & fitica, mas ideal. Por exemplo, o conceito de ninero abstrato nasceu, sem divi, da, da coordenagio (ecrzespondéncia biunfvoca) de conjuntos de obje~ tos nateriais, taie como dedos, por una parte, © pedras, por utr: mas nem por isto aquele conceito se reduz a esta operagao manual, nem aos que se empregan para representi-1o. Os nimeros nao existem fora Ge nossos cérebros, ¢ mesmo ali dentro existem ao nivel conceitual © sempre nao ao nivel fisiolégico. 0s objetos materiais sdo nuneraveis que sejam descontinuos; mas no so nlineros; tanpouco so nimeros pu- ros (abstratos) suas qualidades ou relagdes. No mundo encontranos 3 Livros, no mundo da fiegio construfmos 3 @iscos voadores. Mas quem j& vin um 3, um simples 37 A légica © a matemitica, por se ocuparem de inventar entes formais © de estabelecer relagées entre eles, se chanam com freqiién- cia Cigncias Pormats precisanente porque seus objetos nao sio coisas nen processos, mas para emprgar a linguagem pictérica, formas nas, quais se pode verter una mistura ilimitada de conteGdos tanto faticos com. empfeicos. Isto 8, podenos estabelecer correspondéncias entre 3 sas formas (cu objetos formais), por una parte e coisas e proceso pertencentes a qualquer nivel da realidade, por outra. B assim com 2 fisica, a guimica, a fisiologia, 2 psicologia, a economia e es denats ciéncias, que recorren & matenitica, enpregando-a como ferramenta pa- ra realizar a mais precisa reconstrugdo das complexas relagées que s€ sa encontran nos fatos; ditas ciéncias no identificam as formas ideats sndio que interpretam as prineiras em ter- com 08 cbjetos concretos, mos de fatos e de experiéncia (ou o que é equivalente, formalizam enun clades faticos). O nesno vale para a 15gica formal: algunas de suas partes - en particular, mas ndo exclusivanente, a Légica proposicional bivalen te = poden corresponder Squelas enti¢ades pafquicas que chananos pen= sanentos. Senelhante aplicagio das cincias formals & compreensio a0 mundo dos fatos ae efetua atribuindo diferentes interpretagses aos ob jeton formals. Eatas interpretagses sio, dentro de certos limites, az bitririas, isto 4, justificancne pelo dxito, a conventéncia ou igno- Fineia, Ba outras palavras, 0 significado f8tico ou empfrico gue se atribut aoe objetoe formals ado § una propriedade intrinseca domes fos. As ciénciae fomaie, desta maneira nunca entran em conflito com a realidade: a rigor nlo sio aplicadas,aas enpregadas ia vida coti~ tana © nas ciéncias feicas con a condigio de que se Ihes ten regras de correspondéncia adequada. A Logica e a matenitica, en suma, estabelecen contato com a realidade através da ponte da lingua gen, tanto a conun como a cientffica ‘Tonos, assim, uma primeira grande divisio das ciéncias: For mais (ou ideats)_e Féticas (ou materiais). Esta ramificagio inictal Leva em conta o objeto ou o tena das respectivas disciplinas; leva em conta também a diferenca de tipo de enunciados que as ciéncias for~ mais ¢ fiticas propden estabelecer. Bnquanto os enunciades formals consistem em relacdes entre sfmbolos, os enunciados das cléncias f8ti cas se referem, em sua maioria, a entes extra-cient{ficos: a eventos ¢ processos. Nossa divisio também leva em conta o nétode pelo qual se pSe & prova os enunciados verificdveis: enquanto as cténcias formais se contentam com a 1égica para denonstrar rigorosamente seus teorenas (os quais, contudo, poderian ser advinhados por indugio comum ou por outzas formas), as cléncias fiticas necessitam algo mais do que a 16 gica formal: para confirmar suas suposigées precisan de observagio e/ ou experimento. Em outras palavras, as cléncias faticas tén de tar is cotsas e, sempre que Ihes seja possivel, deven deliberadanente procurar midé-las para tentar descobrir em que medida suas nipsteses ‘se adequam aos fatos. Quando se denonstra um teorena légico ou natemtico ndo se 9 recorse & experiéncta: o conjunto de postulades, definigoes, regras de formagio das expressées dotadas de significades, © regras de infe- Féncia dedutiva - em suna, a base da tooria dada - @ necessiria © su- se propésito. A denonstragio dos teorenas 6 uma dedu- confinada & esfera tedrica, ainda quando 3s vezes fs proprios teorenas (njo suas denonstragées) sejam sugeridos en algu na esfera extra-natendtica, e ainda quando sua prova (mas no seu pri moiro descobrimento) posea se realizar com ajuda de calculadoras ele- Hictente para gio: & uma opera exénicas: por exenplo, qualquer denonstragio rigorosa do teorena de Pitagoras prescinde de medigges © emproga figuras somente como psicolégica ac proceso dedutive; que o teorena de Pitagoras haja si- ajuda 0 0 resultado de um longo proceaso de indugdo 1igado a operagdes pri ‘eicas de medigdes de terras, objeto da histiria, sociologiae 4a patcologta do conhectnento. A matendtica ea légica slo, em suna, cléncias dedutivas. 6 processo construtivo no qual # experiéncia desempenha un grande pa- pel de sugestées se limita asformacio dos pontos de partida (axioms). Na matematica a verdade consiste, por isso, na coeréncia do enunctado adnitido previanente: daf que, a verda- ste sistema, no sentido dado com um sisteme de 1d8t de matenitica nio & absoluta, mas relativa a ‘de que una proposigio que & vlida nuna teoria pode deixar de (Por exenplo, no sistena de go dia, vale a propos mateniticas abstratas, is- 0 se ateh, ee gicanente verdadetra en outra teorta. aritnética que enpregaaos para contar as gio de 24+ 1= 1). Mais ainda nas teors to &, que contés terms nio interpretados (signos aos que but un significado fix0 e que, portanto, poden adquirir distintos sig nificados) poden desenvolver-se sem dar atengio ao problena da verda- nora considere-se 0 seguinte axiona de certa teoria —_abstrata (ndo interpretada): "existe pelo menos un x tai que é "P*. Pode dar~ ge um niimero Llinitado de interpretages (modelos) de axionas, dando- ia convengao tea "x" @.a "P" outros tantos significatos. Se dizenos que “5” 4 na ponto, obtenos um modelo geonétrico dado: se adotamos de que "LY" designa nimero, obtenos ur certo modelo aritnético, © as- aim sucessivanente. X medida que “enchenos" a forma vazia com 0 teido especifico (mas ainda matenStico), obtenos un sistema de LBgicos que tém o privilégio de ser verdadeiros ou falsos dentro 40 sistema dado de proposigdes: a partir daf temos que nos haver com 0 cy problema da verdade matonitica, Ainda assim, somente as (teorenas) terdo que ser verdadeiras: mesmos os axionas podem ser es- colhides & vontade. A batalha serd ganha se se respeita a coeréncia Légica, isto &, se nio se violan as leis do sistema de légica que se aeciaiu usar. concluses Nas ciéncias f&ticas, a situagio é inteiramente diferente, Bm prineiro lugar, elas nio empregam e{mbolos vazios (varLiveis 1égi- cas), mas tio somente s{nbolos interpretades; por exemplc, nao envol- vem expresses tats como "x é £*, que nio sio verdadeiras nem falsas. Em segundo lugar, a racionalidade - isto &, a coeréncia com um siste- a de idéias aceito previanente - @ necessiria mas nio suficiente pa- Fa 08 enunciados faticos; em particular, a submissio a algun sistema de légica & necessiria, mas nao una garantia de que se obtenha a ver- dade. Além da racionalidade, exiginos dos enunciados das ciéncias fa- ticas que sejam verificiveis na experiéneia, seja indiretanente (no caso das hipéteses gerais), seja diretanente (no caso das consequén- clas singulares das hipdteses). Unicanente depois que se tenha passa do pelas provas de verificago empirica poderd considerar-se que um enunciado fatico adequado ao seu objeto, ou seja, que @ verdadeiro €, mesmo assim, até nova ordem. Por isso que 0 conhecimento fitico verificivel se chama commente cigncia empfrica. A coéréncta, om resuo, necessiria mas no suficiente no campo das cigncias de fatos: velnente) verdadeiro se requerem dados empiricos (proposicées de_observagies ou experinentoa) ridncia pode nos dizer se una hipst para afirmar que um enunciado & (prova~ fe relativa a um certo grupo de materiais & adequada ou io. 0 melhor fundanento desta regra me, todolégica que acabamos de enunciar é que a experiéncia ensinou & hu- manidade que o conhecimento de fato no & convencional, que se se bus 8 @ compreensio € 0 controle dos fatos deve-se partir da experign= cha. Mas a experiéncia ndo garantiré que a hipStese em questio s Gnica verdadeira: somente nos dir que § provavelmente adequada, sem excluir por isto a possibilidade de que un estudo ulterior possa dar melhores aproximagées na reconstrugio conceitual da parte da realida- de escolhida. 0 conhecimento £8tico acinda que racional, € essencial- mente provivel; dito de outro modo. a inferéncia cientffica é uma re~ de de inferéncias dedutivas (denonstrativas) e proviveis (inconelu- gentes) . 6 As cténcias formais denonstram ou provan; as cléncias fati- verifican (confirman ou desconfirmam) hipoteses que, em sua maio- ria, eo provisdriae. A denonstragio & completa e final; a verifica: gio & incompleta e por isso temporaria. A natureza mesma do método ci, entifico impede a confirmagio final das hipSteses fAticas. com efei~ to, o# clentistas ndo somente procuran acumular elenentos de prova de suas suposiges multiplicando 0 nimero de casos en que elas se reali zam; tanbim tratam de obter casos desfavorivels as suas hipdteses, fundando-se no princfpio 16gico de que uma s6 conclusio que nao con corde com os fatos tém mais peso do que mil confirmagées. Por isso, enquanto as teorias formais podem ser levadas a um estado de gio (ou estagnagio), os sistemas tedricos rélativos aos fatos sio es~ para perfei~ senclalnente defeituosos; cumprem, pois, a condigio necessaria seren perfectiveis. Bn consegléncia, se o estudo das ciéncias formais. pode fortalecer 0 hibito do rigor, o estudo das ciéncias fatieas pode Andusix-nos a considerar 0 mundo como inesgotivel e 0 honen como una ‘empresa inacabada ¢ interninivel. As diferengas de método, tipo de enunciados e referentes que separan as ciéncias fAticas das formais, impedem que elas sejam exami nadas conjuntanente além de certo ponto. Por ser una ficgéo séria, ri, gorota ¢ freqiientemente Geil, mas, no fundo, ficgio, a ciéncia formal requer um tratanento especial. No que se segue nos concentrarenos na chancia ftica. Darenos una répida olheda nas caracterfsticas peculia res das ciancias da natureza e da cultura em seu estado atual, com e: peranga de que a ciéncia futura enriquega suas qualidades ou ao menos de que ae ofvilizagiee que vizio fagam nelhor uso do conhecimente tz enti fico. 3. Conhecimento Comum ¢ Conhecinento Cientf fico A Anvestigagio clent{fica parte da percepgao de que o Junto dos conhecimentos disponiveis & insuficiente para manejar deter, minados problemas. Nio conega do “ponto zero" visto que a investigagao Je ocupa de problemas ¢ no & possfvel formular uma pergunta - e mui- to menos reapondé-la - fora de algum corpo de conhecinentos. uma porgio do conhecimento prévio do qual parte toda inves, tigagio & conhecimento comum isto &, conhecimento néo-especializador cutra porgie § conhecinento cient{fico, ou seja, conhecimento obtide 6 Rediante © nétodo da ciéncia que pode ser subnetide a prova, enrique eer-se &, se for 0 caso, ser abandonado. A investigagio cientffica na Redida em que progride, corrige ou até mesmo nega partes do acervo do conhecinento comum. Este Gitino, ° + POF sua vez, incorpora alguns resul- tados da ciéneta uma parte do conhecimento comin de hoje @ resultado © conhecimento cientifico de ontem. A chéncia cresce a partir do oo nhecimento comun e, no crescer, se distencia dele: de fato, a investi gage clentftica comega onde a experiéncia © 0 conhecimente comum dei xan de resolver problemas ou até mesmo de coloci-1os. ~ A cténcta ndo & um mero refinamento ou una prolongagdo do conhecimento comum, no sentido em que, por exenplo, 0 microscSpio an Plia 0 campo da nossa visio. A cléncia & um conhecimento de naturera especial: trata sobretudo, ainda que nio exclusivamente, de aconteci. Rentos ndo-observaveis © insuspeitados pelo leigo; exemplos de tals acontecimentos so a evolugio das estrelas e a duplicagio dos cronos. somas; a cigncia imagina © arrisca conjecturas que ultrapassam 0 co- nhecimento comin, tais cono as leis da mecinica quintica e dos refle. x08 condicionades, © submete estas hipSteses 4 contrastasio experimen tal com a ajuda de técnicas espectais, como a espectroscopia ou o con trole do suco gistrico, técnicas que, por sua vez, requeren tecriaa espectat Conseailentemente, © coriectmento comum ndo pode ser julz ay torizado do conhecimento cientf fico, ¢ © propésito de valorizar as Adéias © os nétodos clentfficos a partir do conhecimento comum apenas & absurdo: a ciéncia elabora seus préprios eritérice de validadee. fem muitos casos, encontra-se muito longe do conhecinento comum. Imagi Remos a esposa de un ffsico recusando una nova teoria de seu marido sobre as particulas elenentares porque esta teoria nio é intuitiva on lun bidlogo que se’ prende: fe & hipdtese da natureza hereditaria dos ca Factéres adquirides porque esta hipétese coincide com a experiéncia comum no que diz respeito 4 evolugio cultural. Parece clara a conclu sto que 0s f118s0f08 deven inferir de tudo isto: nio tentar redusts Sonhecimento cient{fico a conhecimento comum, mas aprender um pouco de cdéncias antes de f1osofar sobre ela. % descontinuidade radical entre conhecimento conum ¢ conhe- cimento clentifico ea numerosos aspectos, scbretudo no que diz respeito 6 0 método, no deve ocultar-nos a sua continuidade em outros aspectos, ‘20 menos se fazenos coincidir 0 conhecimento comum com o que s¢ chana 120 quanto a ciéncia desejam ser "hom-senso". De fato, tanto o bom racionais @ objetivos: séo crfticos e vieam ser coerentes (racionali- dade) ¢ tentam adaptar-se aos fatos om ver de permitiren-se especula- ges sem controle (objetividade) « Mas o ideal de ractonalidade, isto &, a eistenatizagio coe rente de enunciades fundados e contrastiveis, 8 conseguido por meio de teorias @ as teorias so 0 niicleo do conhecimento‘ cientifico: 0 62 mhecimento comin, por seu lado, & una acumulagio de informagées forte mente vinculadas entre si- 0 ideal de objetividade, isto &, a constry gio de imagens da realidade que sejam verdadeiras impessonis, no pode ser atingido se no ultrapassarnos os estritos limites da vida cotidiana © da experigncia provada, abandonando 0 ponto de vista an- tropocéntrico, formulando a hipéeese da existéncia de objetos £feicos alén de nossas limitadas e cadticas impressies © contrastando tats, conjecturas por meio da experiéncia inter-subjetiva, planejadae in- terpretada com a ajuda de teortas/ 0 conhecimento comum née pode con- “seguir mais do que uma reduzida objetividade visto estar denasiadanen, ‘te vinculado na percepgio @ na ago; apenas o conhecimento cient{ fico Anventa teorias que, ainda que no se limitem a condensar nossas expe riBnctas, podem ser contrastadas com esta para serem veri ficadas falsiticadas, Um aspecto da objetividade compartidos pelo bon-senso 2 a clancia #0 naturalienn, ou seja, 2 negazio da antidades nio-naturais (por exemplo: um pensamento desencarnado) & fontef ou modos de conhe- cimento nao-naturais (por exemplo: a intuigio metaffeica). Porém 0 bom-senso, reticente como & diante do nic-observvel, tem, Bs vezes, tun efeito paralizador sobre a inaginagio clent{fica. 0 conhecimento chentftico de sua parte, lida com entidades nio-observaveis ¢ nic as afasta desde que possa manté-Las sob controle; a ciéncia con efeito Possui meios muito peculiares - nem esotéricos, nem infalfvess - para suineter a teste tats entidades. luna consequéncia da vigilancia crftica e da recusa dos mo- dos de conhecimento esotéricos 0 falibilisno, ou seja, o reconheci- mento de que nosso conhecimento do mundo & provisério e incerto, fato 6 que no exclui o progresso cientffico, mas antes, o exige. Os enuncta dos cientificos, do mesmo modo que os enunciados do conhecimento co- mum, sao opinides, mas opinides fundadas e contrastiveis em'vez de in formagies arbitririas endo suscet{veis de contrastagao ou prova. Ape as os teoremas da 1égica ou da matenStica ou enunciados triviais, co mo “este volume @ pesado", poten ser provados para além de toda divi- aa razoivel. 0s enunciados referentes 3 experiéncia inediata nic sio e: sencialnente incorrigiveis, mas raranente sio dignos de divida: ainda que sejam conjecturas, na prética née os manejanos cono s¢ fossen cer tezas. Precisanente por esta razio sio cientificamente irrelevante: se podem ser manejados com seguranga pelo conhecimento comum porque re correr & cigncia? £ esta a razdo pela qual lo existe uma ciéncia de mecanografia ou da conduta de autondveis. Ao contrario, os enunciados que se referen a algo alén da experiéncia imediata sio duvidosos e, portanto, vale a pena subneté-los varias vezes & contrastagio e ar~ hes um fundanento. Na cignesa, porém, a divida mais criadora do que paralisadora: a dlivida estimula a investigagao, a busca de hipdte 05 que explique os fatos de um modo cada vez mais adequado. Assim se produz um conjunto de opinies cientfficas de peso desigual: algu- mas delas esto melhor fundadas ¢ mais detalhadanente contrastadas do que 4s outras. Em vista de tudo isto, 0 eético tem razio quando duvi- 4a de una coisa em particular mas erra quando duvida de tudo na mesma nedida. As opinises cientificas, mais do que as do bon-senso,si0 ra cionais € objetivas. Enfim, o que ~ se 6 que existe algo - torna 0 oo, nhecimento cientifico superior ao conhecinento comin? Nao 4, certamente, a substancia ou o tema, visto que um mesmo objeto pode ser considerado de modo cient{tico, de modo no cientifico e até nes~ mo de sogo anti-cientifico. A hipnose, por exemplo, pode ser estudada de modo nio-cientifico quando se descrevem casos sem a ajuda de teo- Fias de experinento: considerada un fato sobrenatural que nio implica nenhuma razio dos sentidos nem do sistema nervoso: enfim, pode ser estudada de um modo chentifico, se se constroen hipéteses a respeito dos mecanismos fisio ASgicos subjacentes ao comportanento hipnético ¢ se estas hipéteses so controladas e contrastadas no laboratério. Bn princfpio, pots nko pode ser estudada de modo anti-cientffico, se é 6 & nem 0 objeto nem o tema que distingue © conhecimento cientffico do conhecimento nfo-clentifico, atnda que alguns problemas deterninados , Por exemplo, estrutura da matéria, dificiinente podem ser formula~ dos fora de um contexto cientftico, Portanto, se ndo & 0 objeto o que caracteriza 0 conhecimen- to cient£fico, deverd sé-lo a forma e 0 objetivo: a especificidade da esénela consistira no modo como opera para alcangar algun objetivo de teminado, isto , no método cientifico e na finalidade para a qual este nétodo & aplicado. = in Bunge Mario, La Investigacion Clentifica a, Ariel, Barcelona, 1972, pgs 19-22. 4. Assim, os tragos essenciais do tipo de conhecimento que alcangan a chéncia da natureza © da sociedade sio a facionalidade e a objetivi dade. Por conhecinento racional entende-% a) que est constitufde por conceitos, jufzos e — ractocf- ios, © no por sensagdes, imagens, pautas de conduta, ete.. Sem diivida, o cientista percebe, forma imagens (por exenplo: modelos visualizaveis) e faz operagdes: mmas tanto 0 ponto de partida como o ponto final de seu trabalho séo idétas; b) que essas idéias podem ser combinadas de acordo com al~ vas idéias (inferéncia dedutiva). Estas néo sao inteira~ mente novas do ponto de vista estritamente légico, posto gue estio implicadas pelas premissas da dedugio; mas $0 gnoseologicanente novas na medida em que expressam conhe cimento dos quats ndo se tinha consciéncia antes de se efetuar a dedugior c) que essas idéias nio se anontoan cacticanente ou simples mente em forma cronolégica, mas que se organiza om sis~ temas de idéias, isto é, en conjuntos ordenados de pro- posigdes (teorias) Que 0 conhecimento cientf fico da realidade @ objetive, sig- aificar a) que concorda aproximadamente com seu objeto; vale dizer, que busca alcangar a verdade fiticar b) que verifica a adaptagéo das idéias aos fatos recorrendo 2 unm comércio peculiar com os fatos (observagio © expert mento) troca que controlada e até certo ponte reprodu- tfvel. Ambos aspectos da ciéncia f8tica, a ractonalidade © a obje- Antimamente ligados. Assim, por exemplo, o que’ usual- mente se verifica por meio do experimento alguna conseqiancia - ex- trafda por via dedutiva - de alguna hipStese; outro exemplo: o cflcu- (0 que sempre & indispensdvel pa- observa lo no #5 se segue ra planeja-la ¢ registré-La. = in Bunge Mario, "La clencia. Su metodo ¥ Su fLlosofia", Bd. Siglo Veinte, Buenos Ayres, 1973, 00 Texto Ne 8 ‘A FUNGKO D0 DOGMA NA INVESTIGAGKO CIENTIFICA (*), (#*), (1) 7. 8. KUHN. Bstou certo de que cada um dos participantes deste simpésio / a dada altura de sua carreira, & 1déia do chentiste cono o. verdade: ¢explorader da se expé: Anvestigador_sem preconceitos w'Eatan slo ce caracterfaticns que faten 40 tes munbo dos cientistas um valioso elenento na propaganda de produtos variados e om exclusivo nos Estados Unidos. Meamo perante una audién cia internacional néo & preciso esclarecer mais. Ser ctentf fico «. entre outras coisas, ser objetivo e ter espirito aberto. Provavelnente nenhum de nés acredita gue o clentista da_ vi, 4a_real na pritica consegue preencher tal ideal. A experiéncia pes- Re! Gneia: do livre Scieatific Change, A. C. Crombie, mn, 1953. Reproduzido com autortesjao dx Editora Eéveational Books Led. fe artigo foram extraid: (08) Ae id@iag desenvolvidas ai drasticamence condensada, do priseiro Tle (KOM, 1962). Algumes eles foram c volvidas num eneaio aneerior (KUN, 1959); bm COREN (1952) _« re 0 assunto consultar & Agradego «BARBER je tudo, Como uma necersidade para una inv gacao cientifica produtiva deverao consultar 44 obras de POLAD WyL, en parcicular (1958) « (1951). A discusedo que aparece ai tigo wostre que POLANYI e eu diverginor de #ldus ter a larga sergem de concordénc!: plicitamente no que se segues Acrfetcn das cliscies, Rio, Zaher, 1974, GQ) im DEUS, Jorge Dial aig. 54/79. cy goal, as novelas de Siz CHARLES SNOW ou o estudo da histéria da ci- Zncia fornecem nunerosos desmentidos. Enbora a atividade cient{fica posea ter um espirito aberto, e nfo precisando 0 sentido em que to- nar esta frase, o cientista individual mito fregientenente nio 0 tem. Quer 0 seu trabalho seja predominantenente tedrico, quer seja ex perimental, o cfentista nornalnente parece conhecer, antes do proje- to de investigagio estar razcavelmente avangado, pormencres dos re~ suitados que se vio alcangar com tal projet. Se o resultado aparece depressa, Stimo. Se no, ele lutard com os seus instrumentos e com suas equagées até que, se for possivel, lhe fornegam os resultados que sejam conformes com o seu nodelo e que ele tinha previsto desde © comego. Nao @ $6 como seu trabalho de investigagéo que o cientis- ‘a mostra a sua convicgéo firne rel tureza Ihe apresenta e relativanente & maneira como poden ser encat- ivamente aos fenénenos que a na xadas na teoria. Com freqléncia, as mesmas convicgdes evidenciam-se mais claranente ainda nas reagdes ao trabalho dos outros. Desde a re cepgio de GALILEU a0 trabalho de KEPLER, & recepgio de NAGELI ao tra balho de MENDEL, & rejeigio dos trabalhos de GAY WSSAC por DALTON, A rejeigdo de MAXWELL por KELVIN, as novidades inesperadas nos fatos @ nas teorias tém, 0 que & significativo, encontrado resisténcias @ com fregiiéncia tem sido rejeitadas por muitos membros, dos mais cria tives, da comnidade profissional ctentffica. 0 historiador, pelo ne nos este, de fato néo preciea que soja PLANCK a lenbrar-Ihe que soma verdade cient{fica nova nio & geralmente apresentada de maneira A convencer os que se open a ela... Simplesmente a pouco e pouco eles morren, @ nova geragio que se forma faniliariz: de desde o princfpio". (PLANCK, 1948). se com a verda~ Patos familiares como estes - © eles poderian faci lmente ser multiplicades - no parece ser reveladores duna atividade cujos praticantes sejan pessoas de espiritos especialmente aberto. Poderio eoses fatos integrar-se na nossa imagem habitual da investigagao ci- enti fica produtiva? Se, no passado, um reajustamento nfo parecia apresentar dificuldades de fundo, isso devia-se, provavelmente, 20 fato de que tais resisténcias e preconceitos eran geraimente conside rados cono elenentoe estranhos & ciéncia. Esses fatos aberrantes riam, € 0 que nos tém ensinado muitas vezes, ndo mais do que o produ to das inevitaveis LimitagSes humanas; num verdadeiro método clenti- fico nao hd lugar para tal; @ esse método & de tal modo poderoso que 44 mera idiossincracia hunana no pode por muito tempo impedir o seb 6 dxito. com essa mancira de ver, os exemplos de parti pris ctent{ti- con sic redusides 20 estatuto de anedotas ¢ justanente com este en- alo tentarse atacar tal ponto de vista. A verossimithanga, por st te, ugere que se inpe um atague desse tipo. Preconcetto e reatatén cla patecem sex nats a regra do que a excegio no desenvolvinento ci- entffico avangado. Além disso, en condigdes eles caracterizan a me- Inor investigagio © a mais criativa e também a mais rotinetra. Nio ‘esté om questo qual a sua origen. Nido se trata de caracterfeticas aberrantes de individuos, mas de caracterfsticas da comnidade com ralzes profundas no processo cono os cientistas sio treinados para trabalhar na sua profissio. As convicgées fortes que existen antes da propria investigagéo freqlentenente aparecen como precondigdes so das cténcias. 2 claro que estou a adiantar-ne demaie na minha histéria, mas com isso fiz destacar o meu tema principal. Enbora 0 preconceito aténcia is inovagdes possam muito faciimente por um freto a0 10 cient{ fico, a sua onipresenga & porém sintomitica como ca~ racterfstica requerida para que @ investigagdo tenha continuidade ¢ vitelidade, Caracterfaticas desse tipo, tomadas coletivamente, eu eu cAgncias maduras, e nas plginas que fico como © dogmatisno 4: jeguen tentarei precisar alguns dos seus aspectos. A Educagio ci~ entifica “seneia" o que a comanidade cient{fica, com dificuldade, al — yuna maneira particular de ver io profunda eangou até af - una ad o mundo e praticar a ciéncia. Tal adesio pode ser, e &, de tempos em ‘tempos, substitufda por outra, mas nunca pode ser facilmente abando- nada. £, enquanto caracterfeticas da comunidade dee prattoant fissionais, tal adesio nostra-se fundanentalmente, om dots aspectos, para a investigagao produtiva. Definindo para cada cientista indivi- dual os problemas suscet{veis de ser analisados ¢ ao mesmo tempo & natureza das solugées aceitéveis para eles, a adesio @ de fato un elemento necessirio & investigagao. Normalnente o cientista 6 um so- Luctonador de puzzles como un jogador de xadrez, @ a adesio induzida pela edycagio & o que Ihe dé as regras do jogo que se pratica no seu tempo. Na auséncia delas, ele no seria um fisico, um quimico ou 0 que quer que fosse aguilo para que fora preparado. prow Além do mais, essa adesio tem un segundo papel na investiga gio que & algo incompativel com o primeiro. A forga que ela tee @ unanimidade com que & partilhada pelo grupo profissional fornecem a0 70 clentista individual um detector imensanente sens{vel dos focos ae aificuldades donde surgen inevitavelmente as inovagdes importantes nos fatos e nas teorias. Nas ciéncias a mator parte das descobertas de fatos inesperados ¢ todi respostas a um fracai Portanto, enbora una adesio quase sempre dognitica 40, una fonte de resisténcia e controvérsia, & tanbém um ingtrunento Anestimivel que faz das cléncias a atividade humana mals consisten- toma pessoa nio precisa de fazer da reaistén- ja, por um La: temente revoluctoniria cla ou do dogma uma virtude para reconhecer que ae ciéncias maduras no poderian viver sen eles. Antes de continuar a exaninar a-natureza © as consequén- has do dogma cientifico, vejamos o esquena de educagdo através do qual ele & transmitide por una getagio de profissionais & seguinte. 5 clentistas nio forman, claro esta, a nica comnidade profiasio~ pal que adquire pela educagio um conjunto de padres, instrumentos usam no seu préprio trabalho eriativo. Po- ja da pedagogia cientffica sugere que ela pode induzir uma rigidez profiesional praticanente imposefvel de al- cangar noutros campos, exceto talver na Teologia. Admito que essa ex posigio esteja deformada pelo esquema anericano que é 0 que conhego melhor. Os contrastes que tenho om vista, porém, deven ser visiveis Aguaimente nas devidas proporgées na educagio européia e britanica, Talvez que a caracterfstica mais extraordiniria da educagio clentifica, caracterfstica que & levada a um ponto desconhectdo now tros campos de atividade criativa, seja ade se fazer, através de m: nuais, obras escritas especialmente para estudantes, Até que ele es teja preparado, ou quase preparado para fazer a ua dissertagio, 0 estudante de guinica, Fisica, Astronomia, Geclogia, ou Biologia, ra- ranente & posto ante.o problema de conduzir um projeto de investiga~ go, ou colocado ante os produtos diretos da investigagio conduzida Por outros - iste &, as comnicagées profissionais que of cientietes escreven para os seus colegas. As colegées de “textos originate” jo~ gam papel limitado na educagio cient{fica. Igualnente o estudante de chéncias nio & encorajado a ler os classicos da histéria do seu can- po - obras onde poderia encontrar outras maneiras de olhar as ques~ _BBes discutidas nos texto: mas, conceited e solugSes padronizadas que a sua futura profissio hi mas onde tanbém poderia encontrar proble, n muito pds de lado e substituiu. (1) WHETENEAD apanhou esse aspecto bastante espect fico das ciéncias quando algures escreveu: “Una ctén- cia que hesita em esquecer os seus fundadores esta perdida”. © ser baseado quase exclusivenente em manuais nio € tudo o due hk de especitico na edicagio clentitica. os estodantes de outros doninios aio, so fine s0 cabo, tanbén expostos 3 agdo de tals i= won, enbora raranente depois do segundo ano de universidade, € mes= nos prinesros anos, nifo de forma tio exclusiva, Mas, enquanto que, nas clgncias, s0 né manuais dizerentes & porque expéem assuntos dife Fentes, nas hunanidades © en varias cigncias soctais, hi manuals que apresenton diferentes tratanentos para una nesna problendtica. Hesmo Liveos que esto en concorréncia para ser adotadoe num neem curso cientifico diferen sopretado #5 no nivel de apresencagio © nos porm _nores pedasSyicos.@ nao no conteido ou no conjunvo Econ Aiticaldade que se pode inaginar um ffeico ou um quinico afimar que fol obrigado a comegar a educagio dos seus alunos de terceiro ano quase a partir de prineiros princfpios porque a exposigio prévia do assunto a que eles tinham sido subnetidos se fizera por livros que violavan consistentemente a idéia que ele tinha da disciplina. obser vagdes desse tipo nio sio, pelo contrario, pouco usuais em varias ef ancias sociais. Aparentenente os cientistas estio de acordo sobre 0 que 6 que cada estudante deve saber da matéria, asa a razio que explica. Por que, na preparagio dum currfculo pré-profisaional, ele: podem usar manuais em vez duna combinacio eclética de originais de Anvestigagio? Tgualmente a técnica de apresentagdo dos assuntos, caracte- Fisticas dos manuais cientfficos, ndo é da mesma que nos outros can pos. Exceto nas introdugé Aéem, os leigos nao fazem grande esforgo para descrever o tipo de problemas que 0 profissional sera chanado a resolver ou discutir, a 6 ocasionais, que os estudantes raranente (2) cada cigncia individual apresenta algueas variagies no que res- peta a esta quertao. Oe estudantes das cléncias novar ¢ também das menos tedricas = isto &, alguns aspectos da Biologie, Geolo- Bia @ Clncias Médicas - tGm aais oportunidade de deparar com trabathos originais canto histaricer cone modernar do que, POF exeaplo, os estudantes de Astronomia, Mateastica ou Fisica n sEsidade de técnicas que a expertincia pée & dieposigic para a sua resolugio. Pelo contrério, esses livros apresentam, desde 0 come go, solugées concretas de problenas que a profissdo aceita cono para digmas, © entio ped quer servinde- 6 aos estudantes, quer usando um lapis © papel fe dum laboratério, que resolvam por si mesmo proble~ mas modelados & senelhanga, na substincia e no nétodo, dos que 0 1i- veo lhes deu a conhecer. 6 na instruc elenentar de 1fnguas ou no treino de um instrunento musical & to importante e essencial a pri- tica de “exercfcios de dedo". E estes sio justanente os campos em que o objeto da instrugdo & produzir como mixim de rapidez "gua ros mentais" fortes ou Einstellungen. sugiro que nas ciéncias 0 efeito dessas técnicas & exatamente o mesno. Enbora o desenvolvinen- to clentffico seja particularnente produtivo em novidades que se eu coden, a educagZo cientffica continua a eer uma iniciagio relativaren (hte dogmética a una tradicio preestabelecida de resolver problenas, para @ qual o estudante nfo 8 convidade © nio esté preparado para aprectar. © esquema de educagio sistenitica dos manuais que acabanos de descrever nao existia em nenhuna parte e em nenhuna ciéncia (exce* to talvez a Matenitica elenentar) até 0 comego do século XIX. Mas antes dessa Spoca 34 um certo nimero de cléncias mais desenvolvidas claramente evidenciava, e en certos casos desde hi Po, a6 caracteristicas especiais indicadas acima. Onde nao existiam gymanuais, havia com frogiéncia paradigmas universais aceitos para a P Bram constitufdos pelos feitos cientf fi, cos descritos em livros em que todos of praticantes num dado campo conheciam intimanente © adniravan, feitos que davam os modelos para as suas préprias investigages © os padrées para avaliar os seus prd prios resultados. A Physica de ARISTOTELES, o Almagesta de PTOLO- MEU, os Principia e a Opticks de NEWTON, a Eletricidade de FRANKLIN, ‘2 Quinica de LAVOISIER e a Geologia de LYELL - estas obras © muitas outras foram todas utilizadas implicitanente durante algun tempo, pa ra definir os problemas legitimos e os métodos de investigagio para sucessivas geragées de praticantes. No seu tempo cada un desses 1i- vros, juntamente com outros eseritos segundo 0 modelo iniciado por eles, teve no seu dominio mais ou menos a meana fungio que tem hoje os manuais duna cléneia. bastante tem ca das varias ciéncia: Todas as obras indicadas acina so, com & sabido,clissicos 73 da ciéncia, Assim sendo, poder-se-ia pensar que clas se asseneihan aos grandes clissicos noutros campos criatives, un REMBRANDT, ou um ADAM SMITH. Tratando essas obras, ou os feitos que estio por tris de tae, como SiPEefymas em vez de clissicos, quero sugerir que hé algo especial nelas, algo que as coloca parte tanto dos outros classi~ cos da ckéncia como de todos os classicos de outros dominios de cria Cr parte desse “algo especial” € 0 que chanarei a exclusivida- de dos paradignas. mm qualquer época os praticantes duna dada espect alidade poderio reconhecer nunerosos cléssicos, alguns dos quais -tal cono acontece com as obras de PTOLOME © COPERNICO ou NEWTON @ DES- CARTES - praticamente inconpativeis entre si. Mas um dado srupo, se tem'mesno un paradigma, s5 pode ter um. Ao contririo da comunidade dos artistas ~ que se pode insptrar simultaneanente nas obras de,por fexenplo, REMBRANDT © CEZANNE e que portanto estuda une outro- a cominidade dos astrénonos nfo tinha alternativas senio escolher en ttre of modelos em conpetigo fornecides por COPERNICO © PTOLOMED. Alén disso, una vez feita a escolha, os astrénomos passavan a esque- cer a obra que tinham rejeitado. Desde 0 século XVI 66 houve — duas edigdes completas do Almagesta, anbas produzidas no século XIX e di- rigidas exclusivanente aos acadénicos. Nas ciéncias maduras parece no existsr una fungio equivalente & de un museu de arte ou una bi~ biicteca de clissices. os clentistas sabem quando é que os livros, ¢ mesno of jornais cient{ficos, esto ultrapassados. Embora nio os des truam, eles of transferem, como qualquer historiador da ciéncia pode testeminhar, das bibliotecas ativas a especialidade para o nunca usa do depésito geral da universidade. As obras atualizadas que vieram tomar 0 seu lugar so tudo © que o progresso da ciéncia exige. keea caracterfstica dos paradignas esté estreitanente liga da a outra, que tem particular importancia na minha utilizagio to terno. Ao aceitar um paradigna, a comnidade cient{fica adere toda ela, conscientenente ou nio, & atitude de considerar que todos of problemas resolvidos, o foran de fato, de uma vez para semre. Tal % 0 que LAGRANGE tinha em vista quando dizia de NEWTON: "No hi se~ no um universo @ nio pode haver senfo um honem na histéria univer . Os exemplos, quer de ARISTOTE~ sal para interpretar as suas leis” (2) Referide nesta forms por MASON (1956). 0 original @ senethante em Espitite, mas nde sae palavras, parece provit dum elogis de epoce Feito por OELAMBRE (1815). ™ LES, quer de EINSTEIN, provam que LAGRANGE estava errado, mas tal no altera a importincta que teve a sua convicgio para 0 desenvolvi- mento da ciéncia. Acreditando que o que NEWION fizera no precisava de ser feito outra vez, LAGRANGE nio se deixava atrair por novas re~ Anterpretagdes fundanentais da natureza. Pelo contrario, ele poderia conegar onde os homens que partilhavan 0 meso paradigna newtoniano tinham ficado, esforgando-se uns e outros por chegar a uma formula~ 0 mais clara do paradigma © a una estruturagio que o aproximasse cada vez mais das chservagées da natureza, Esse tipo de trabalho 35 pode ser feito por pessoas que sentem que 9 modelo que usa é intei- ramente seguro. Nao hd nada que se assenelhe nas arte los nas Ciéncias Soctais so, no melhor dos casos, parciais. Os para @igmas determinan todo um esquema de’ desenvolvimento para as cias maduras que nio se assenelha ao esquena usual noutros donfnios . 1 @ 08 parale- ctén- Tal diferenga poderia ser ilustrada conparando-se desenvol- vinento duma chéncia hsseada em paradigna como, por exemple, a Filo~ sofia ou a Literatura, 0 mesmo objetivo pode porém ser alcangado de maneira mais econémica, contrastando-se o esquena de desenvolvinento Amtetal de qualquer cténcta com o esquena caracterfetico da mesma ci Sncia quando 34 na maturidade. Néo consigo deixar de por a questio demasiado esquenitica, mas o que tenho em vista & isto. Exceto em do nfnios cono a Bioqu{mica, com origem na conbinagio de especialidades 48 existentes, os paradignas so uma aquisigio a que se chega relati vamente tarde no processo de desenvolvimento cientffico. Durante os seus primeiros anos uma ciéncia trabalha sem recurso a eles, pelo me noe no de forma tio inegufvoca © Limitedera com nos casos dos atrés. A dptica fisica antes de NEWTON ou o estudo do calor an- tes de BLACK @ LAVOISIER sao exemplos de esquemas de desenvolvimento Pré-paradigmiticos cono o que examine: adiante com a histéria da ele txicidade. Enquanto esse desenvolvimento continua, isto é, até que se chega a um prineiro paradigma, o desenvolvimento duna cigncia apro xima-se mais do desenvolvimento das artes © da’ maior parte das Cién- has Sociais do que do esquena que a Astronomia, por exemplo, tinha 38 adquirido na antigtidade e que hoje & comm a todas as ciéncias. Para perceber a éiferenga entre desenvolvimento cientf fico pré- e pés-paradigma, considerenos un exenplo simples. No comego do século XVIII, cono no século XVII e antes dele, havia quase Pontos de vista sobre a natureza da eletricidade como o nimero de ex 6 perinentadores importantes, homens como RAUKSBEE, GRAY, DESAGULIERS, DU FAY, NOLLET, MATSON © FRANKLIN, Todos os diversos conceitos que eles possufan sobre a eletricidade tinhan qualquer coisa em comum - tinham em parte origem nas experiéncia e observagies e também numa ou noutra das versdes da Filosofia mecdnica - corptscular que orien- tava toda a investigagio cient{fica da Spoca. Contudo, esses elenen- tos comuns davam aos seus trabalhos sé uma vaga senelhanga. Sonos forgados a admitir a existéncia de varias escolas @ subescolas em conpeticio, cada una indo busear a sua forga § aua ligagio a uma ver si particular (cartesiana ov newtoniana) da netaffeica corpuscular, fe cada una dando relevo especial a0 conjunto de fendmencs elétricos mais facilmente explicado por ela. As outras observagies eran expli- cadas usando construgées "ad hoc” ou eram deixadas cono problemas in portantes para investigagio futura.? Un dos primeiros grupos de teSricos da eletricidade seguia ‘a pritica usual do século XVIT, ¢ tomava portanto a atragio @ go de eletricidade por fricgdo cono os fenémencs elétricos fundanen como um efeito secun- tais. Tinham tendéncia a considerar a repul: @ario (no século XVII ela era explicada por uma espécie de efeito de ressalto mecinico) e a adiar tanto quanto possfvel a discussdo e a investigagio sistenitica sobre 0 efeito de GRAY, que se acabara en- to de descobrir, a condugdo elétrica. Outro grupo estreitamente 1i- gado a este considerava a repulsio como 0 efeito fundamental, enquan to outro ainda tomava ao mesmo tenpo a repulsio e a atragdo como na~ nifestagées elenentares da eletricidade. Cada um destes Gltinos gru- pos alterava a sua teoria © # sua investigaggo da maneira que — the convinha, mas acabava por ter tanta dificuldade como o prineiro, pa~ ra explicar o mais elenentar dos efeitos de condugio. Esses efeitos serviam de ponto de partida para um terceiro grupo, grupo que tinha tendéncia a falar de eletricidade como dum “fluido", vercorrendo of condutores © no como um “eflivio" emanado dos corps nio-conduto- (3) bastante docunentagio sobre 4 histiria do desenvolvinento da ole, tricidade pode encontrar-se a partir de ROLLER e ROLLER (1956) No que respeita a andlise de pormenor, porém, devo muito 8 um ar tige nio publicado (1963) do men aluno Joha L, Keilerony que ae 6 res. Esse grupo, por sua vez, tinha di ficuldade em reconciliar a sua teoria com un nimero razolvel de efeitos de atragio © repulsio.4 Em Spocas diferentes, cada uma dessas escolas trouxe contri buigdes significativas para o corpo de concertos, fenémencs @ técni- cas de onde FRANKLIN extraiu o primeizo paradigna para as ciéncias elétricas. Uma definicao do cientista que exclua os membros de: sscolas deverd excluir igualmente os seus sucessores modernos. Conty do, alguém que se debruce sobre o desenvolvimento da eletricidade an tes de FRANKLIN pode muito ben tirar a conclusio de que, enbora os praticantes no officio fossem cientistas, o resultado inediato da sua atividade era algo menos do que cigncia. Cada experinentador en ele- tricidade era forgado a construtr 0 seu donfnio de novo a partir da base, uma vex que 0 conjunto de convicgdes que ele podia tomar como certas era mito Limitado. Ao fazer isso, a sua eacolha de experién~ cias e observagées fundamentais era relativanente livre, porque 0 conjunto de métodes, padro e fendnenos que cada tedrico da eletrici dade podia utilizar @ explicar era extraordinarianente reduzido. Co- mo consequéncia, durante a primeira metade do século, ss investiga- Ses en eletricidade tendian a andar en cfreulo, voltando sempre a0 mesmo ponto. Novos efeitos eram descobertos repetidas vezes, mas mui tos deles perdian-se rapidanente de novo. Entre os que se perderan, havia muitos efeitos causados pelo que hoje se chana a carga induzi- ae também a famosa dercoberta de DU FAY dos tipos de eletricida- de. FRANKLIN ¢ KINNERSLEY ficaram surpreendidos quando, cerca de guinze anos depois, o segundo descobriu que uma esfera carregada que (4) Beta divisdo em escolas % ainds de algum aodo sieplista, Depois jo fundamental far-ee entre a ence Francess ‘que baseava a sue teoria em efeitos de cola ingiesa (DESAGULIERS, MATSON, etc) ja'nos efeitos de conducac. Cada um dor grupos ificuldade em explicar of fendmenos que © “outro icos. (Ver, por exeaplo, o trabalho de” NEEDHAM inventigagses de’ LEMONIER (1746)). Dentro de cada um ‘een particular no inglés, @ possivel distingyir jes dependendo da consideragac, quer da atragao, Quer da repuledo, com efeito elgerico de saicr importincia. ” fosse repelida pelo vidro friccionado era atrafda.pelo lacre ou pelo anbar.'°) Na auséncia duna teoria bem articulada e amplanente aced ‘ta (uma propriedade que nenhuna ciéncia possui de infcio-e que pou- cas das Chéncias Soctais, se 6 que algura, possuem atualnente), a si tuagio 86 muito difictimente podia ter sido diferente. Para os teéri cos de eletricidade, durante a prineira metade do século XVIII nio havia maneira de distinguir consistentenente entre efeitos elétricos € nio-elétricos, entre acidentes de laboratério e novidades chats, ou entre exibigdes brilhantes © experiancias que revela aspectos essenciais da natureza da eletricidade. Esta & a situagdo que FRANKLIN mdou.'6) A aua teorte ex- plicava tantos - enbora nio todos - efeitos elétricos reconhecidos pelas varias escolas anteriores que no perfodo de una geragio todos 08 tedricos da eletricidade foran convertidos a maneiras de ver qua~ se idénticas. Mbora nfo pusesse fim a todos os desacordos, a teorie GG) A degcoberta de DU FAY das duas eapicien de eletricidade que use Z ovtra, je auto-repeliaa, @ ai a com bastante pormenor na quarta parte da 8 rias sobre eletricidade (1735); Tais mendris serum bem conhect dase nuitas vezes citadas, porém DESAGULIERS (1741) parece ter sido o unico tesrico de eletricidade que, durante um perfedo de GQuase duas dgcades, chega a dizer que alguns corpor carregados Sletricamente se atraem uns aos outror. No que respeite, & foure presa” de FRANKLIN e KINNERSLEY, ver COHEN (1941). £ de aotar ue, enbora KINNERSLEY tenha produrido o efeite, nem ele new FRANKLIN parece tere recouhecido que dois corpos resinosos car~ regados se repelism um a0 outro, um fendmeno diretamente em con- (6) A sudanga io se deve, @ claro, somente a FRANKLIN, nem ocorrey dum dia para o outro. Outros tedricos da eletricidade, muito, ex cial WILLIAM WATSON, anteciparsa a KLIN. Mais importante ainda, fol a3. dep: cisis feitas principalmente por AEPINUS, que a ceria de KLIW se tornou de uso corrente, condigad aeceasaria para ser us paredigna. £ sesao entao continuaram a subsistir dues. foraula~ Goes de ceoria: a de tipo "us fluido” de PRANKLIN-AEPINUS @ a de Epo “dois fluids" devida principalnente s SYHMER. Or tedricos da eletricidade rapidanente chegaran @ conclusio de que genhu teste poderia talver discrimina entre at duat teoria. Ate & Gescoberta da bateria, quando a escolha entre # teoria de, “om Huido" ea Ceorla de’ "dole fluidos” comegou fazer sentido de~ vido a originar diferenges de vez em quando, no projeco ou be das experignci, ceorias eran equivalences % de FRANKLIN constituiu o primeiro paradigna da eletricidade © a ex periéncia dele di um tome um sabor novo 3s investigagies em eletri- cidade nas Gltimas décadas do século XVIII. 0 fim dos debates inter escolas pas fim 3 constante reavaliagao dos fundanentos; a, convicsie ae estarem a seguir 0 caninho para se langarem em trabalhos de maior envergadura, mais exatos © exotéricos. Liberte das preccupagées ge~ ais levantadas com os fenémenos elétricos, 0 novo grupo agora uni~ do podia orientar-se para fenémenos elétricos selecionalos e estudi- os com muito mais pormenor concebendo aparelhagen especializada pax ra seu trabalho e utilizando-a com uma persisténcia e um grau de sie tenatizagio desconhecidas dos anteriores teéricos da eletricidade. Nas nos dun CAVENDISH, dum COULOMB ow dum VOLTA, a verificagéo dos os fendmenos elétricos © a articulagio da teoria da eletricidade tornaran-se, pela primeira vez atividades altamente orientadas. Como consequéneia, a eficténcia © a eficicia da investigacéo em eletrici~ @ade aunentaran extrsordinarianente, comprovando ao nfvel social 0 Preceito netodolégico de FRANCIS BACON. "A verdade emerge mais rapi- danente @ partir do erro do que da confusio". Esté claro que estos exagerando tanto a repider com 0 ora de acabunanto con que se faz a traneigio para un poradigea. Mar ieee mio torna 0 préprio acontecisento menos real. 0 anadurecinento, de fleteicidade com ciéncia rio acompanha o desenvolvimento geral da fletricidade, os autores sobre eletricidade durante 30 prineteas qua tro décadae do século AVIII porautan bastante mais infornagio acerca dof tendnenos elétrices do que os seus antecesuores dos séeulon XV2 @ HVIZ. Durante 0 neto século depois de 1745, multee poucoe tendmence eiétricos se vieran acrescentar i Lists dos Ji existences. vorée, noe aspectos importantes of textos eobre eletricidade Jas Glténae dvas Gécadae do século parecian nats Gistantes de GRAY, OU FAY e mesmo FRANKLIN do que estavan essas teortan da eletricidade do comeso”” do Boule XVIIT dos seus antecessores de ni mais de cen onos. Durante © perfodo de 1740 © 1780, os tebricos da eletrieidade, com un aren 0, alcangaran o que os astrSnonoe tinhan conseguiio na antigtidade, os estudiovos da nectnica na Idade Wédia, os da Sptica ffeica no fin do wiculo XVII © 08 da goolosia nistérica no comego do séeulo XIX, Tinhan chegado a un paradigna, # « poste deste pernitia-ines tomas 08 fondanentos 40 seu canpo de atividade coro ben eetabelecidon © envere np @ar para problemas mais concretos ¢ mais complexos.(7) gas foi conceber outro critério que estabelega tio claranente o canpo de ati vidade duma oténeta. Bscas observagées devem j4 conegar a esclarecer 0 que 6 que considero ser un paradigna. £, om primeiro lugar, um resultado cien- ‘{fico fundamental que inclui ao meso tempo uma teoriae algunas aplicages tipo acs resultados das experiéncias © da observagio.Mais importante ainda, & um resultado cujo conpletar esti em aberto ¢ ve deixa toda espécie de investigagio ainda por ser feita. E, por fin, @ um resultado aceito no sentido de que & recebido por um grupo cu 308 membros deixam de tentar opor-the rival ou de criar-Ihe alterna- tivas. Pelo contrario, tentam desenvolvé-lo ¢ exploré-1o numa varie~ dade de formas a que voltarei a seguir. A discussio do trabalho que 08 paradignas deixam para ser feito tornaré ainda mais claro tanto o ‘seu papel como os motivos para a sua especial eficdcia. Antes,porém, & preciso frisar um aspecto bastante importante, Enborao _acolher dum paradigna parega historicamente una precondicao para investiga- go cientifica mais eficaz, os paradignas que aumentan a eficacla da Anvestigagic-nao necessitam de ser, e geralnente néo sio, pernanen- tes. Pelo contrario, no esquena de desenvolvinento das ciéncias mda Vai~se pasando, em regra, de um paradigna para outro. Esse es~ quema diferencia-se do esquema caracterfstico dos perfodos de comeco ou de pré-paradigna nao por causa da eliminagio total do debate en torno dos fundanentos, mas pela restrigio drastica de tal debate, ‘208 perfodos ccasionais de mudanga de paradigna. ‘ © "Almagesta" de PTOLOMEU, por exemplo, aio deixa de ser um Paradigna pelo fato da tradicio de investigagio que partia dele aca- bar por ser substitufda por outra incompat{vel baseada nos trabalhos de COPERNICO @ KEPLER. Nem 0 Opticks de NEWTON deixou de ser um pa Fadigna para os estudantes dos fenénenos da luz no século XVIII, por (7) E de notar que este prigeiro paradigna da eletricidade foi com Pletamente efica s6 até 1800, quando a descoberta da bateria © 8 aultiplicar dos efeitos eletroquisicos iniciaran una revolu ha teoria da eletricidade, Ate que Um novo paradigne, aparecesse dessa revolugao, a literatura sobre a eleteicidadey particulars Bente na Inglaterra, retornou en varios sspectos #0 estilo carac terfetico de primeita aetade do seule XVIII 80 ter sido depois substitufdo pela teoria ondulatéria do éter de YOUNG ¢ FRESWEL, un paradigma que por sua vez cedex lugar & teoria do a locanento eletronagnético que se constitul a partir de MAXWELL. Nio hi vida de que o trabalho de investigacio que un dado paradigna permite torna-se una contribuigio duradoura para o corpo do conhect~ mento clentifico e técnico, mas os paradignas eles préprics sio com freqléncia postos de lado e substitufdos por outros bastante incompa tlveis com eles. Nic podenos recorrer a nogées como "verdade" ou "va Ligaa pecial eficicia da investigagio que a sua aceitagio permite. a propésito dos paradignas na tentativa de compreender a es- Pelo contrario, o historiador com freqiéncia ten de reco- nhecer que con a rejeigdo da perspectiva proposta por dada__ escola pré-paradigna ura conunidade cient{fica rejeitou o embriio de una im portante idéia cientffica a que seria forgada a voltar mais tarde. Mas ost longe de ser Sbvio que a profiseio atrasou o desenvolvinen- to cientffico com esse procedinento. Teria a mecinica quantica nasci do antes, se os cientistas do século XIX mais facilmente estivessen poderia prontos a adnitir que a visio corpuscular da luz de NEWTON ainda ter algo de significativo a ensinar-lhes sobre a natureza? Penao que nio, enbora nas artes, nas humanidades, e en varias Cién- clas Sociais uma tal visdo menos doutrinéria & adotada com freglén- cia en relagio acs efeitos clissicos do pasado. Ou terian a Astrong mia © a Dindmica avangado mats depressa se os cientistes tivessen r conhecido que tanto PTOLOMEU come COPERNICO tinhan escolhido proces 0s igualmente legftinos para descrever a posigio da Terra? Tal po- sigo fol, de fato, sugerida durante 0 século HVIT @ fol depois con- firmada pela veoria da relatividade. nas até 18 ela fot, juntanente ‘com a Astronomia de PTOLOMEU, vigorosanente rejeitada, vindo ao cine de nove 86 no fim do século XIX quando, pela primeira vez, se rela ctonava concretanente aos problemas insoliveis postos pela pritica usual da Pleica néo-relativieta. Poder-se-& argumenter, © fa-1o-ei, Fealnente, que una atengéo denorada durante os séculos XVIII e XIX, quer para as obras de PTOLOMEU, quer para as posigSes relativistas de DESCARTES, HUYGENS e LEIBNIZ, teria atrasado en vez de acelerar a revolugéo na Pfsica com que conegou 0 século XX. 0 avangar de para igna em paradigma, om vez de perpetuar uma concorréncia entre clée~ sicos reconhectdes, deve ser una caracterfstica funcional e un fate inerentes ao desenvolvimento cientifico naduro. a aigna diz-Ihes qual o tipo de entidade com que © universo esta povoa ao © qual a manetra cono essa populagio se comporta; além disso, in- forma-os de guais as questées sobre a natureza que podem legitinamen te ser postas e das técnicas que podem ser devidanente aplicadas na busca das respostas a essas questes. De fato, um paradigna diz tan tas coisas aos cientistas que as questées que ele deixa para inv tigar raramente tén algun interesse intrinseco para os gue estio fo~ ra da profissio. Embora pessoas cultivadas cong um grupo possam f4~ car fascinadas a0 ouvir descrever o espectro das particulas elenen~ rapidamente fica exaust com uma apresentagio das convicgées que antenio estio na base da investigacio desses problemas. 0 resultado 40 projeto de investigagao individual G-2hes indiferente, © 0 seu in teresse tem pouca probabilidade de voltar a ser despertado outra vez ou 08 processos de réplica molecular, em regra o seu interesse até que, como aconteceu com a nio-conservagio da paridade, a investi, gagio inesperadamente leve a mudangas nas convicgées que guiam a in vestisagio. Sem divida essa 6 a razdo pela qual tanto og historiado~ Fes como os divulgadores devotaran tio grande parte de sua atengio "008 episGdios revoluciondrios de que resulta uma mdanga de para @igna © desprezaran tio completamente 0 tipo de trabalho que 08 clentistas necessarianente fazen durante a maior parte do tempo. A minha posigdo ficera ainda mais clara se eu agora pergun- tar o que 6 que fica para a comnidade clentifica fazer quando exis~ te un paradiona, A resposta - tendo en vista a resisténcia a snova Ges que existe © que & escondida fregllentemente debaixo do tapete - @ que, dado un paradigna, os cientistas esforgan-se, usando todas as Btas_cepacidades © todos os seus conhecirentos para o por cada vez FAIS de acordo con a natureza. mito do seu esforgo, principalmente RAS Eases iniciais de desenvolvimento do paradigma, tornando-o mais Preciso em Areas en que a formulagio original fore, como nio podia Geixar de ser, vaga. For exenplo, conhecendo j& que a eletricidade eF@ um f1uigo com partfculas em interagio miitua A distancia, 08 teé- Ficos da eletricidaie apSs FRANKLIN podian tentar discrininar a lei Gantitative da forga entre as partfculas elétricas. cutres podiam 2 buscar as inter-relagdes entre o conprinento da fafsca, deflexio do eletroscépio, a quantidade de eletricidade, ¢ a geonetria dos condu- sadas do encontranos tores. Foi sobre problenas desse tipo que nas Gitimas culo XVIIE, trabalharam COULOMB, CAVENDISH, e VOLTA, © lum grande paralelismo com o desenvolvimento de qualquer outra ctén- cha. 08 esforgos atuais para determinar as forgas quinticas que go- vernan as interagSes dos nicleos pertencen precisanente 4 meena cate goria de problenas de articulagio dum paradigna. Esse tipo de problemas no constitul o Gnico campo a con- quistar que um paradigna propde & comunidade que o aceita. Ha sempre muttos outros campos onde o paradigma supostanente funciona, mas en que néo foi, de fato, ainda aplicado. 0 ajustanento do paradigna 3 patureza em tais ¢ asos con freqiiéncia ocupa os melhores talentos ci entificos duna geragio. As tentativas no século XVIII de desenvolver a teoria de NEWION das cordas vibrantes constituem um exenplo signi- ficativo, © os trabalhos atuais sobre a teoria quintica dos slides 10, existe sempre trabalho imenso, fascinante outro exemplo. Além adi a ser feito para melhorar 0 acordo nun campo onde se demonstrou 38 existir um certo acorde aproxinado. Trabalho tedrico em problemas esse tipo & ilustrado no século XVIII com a investigagio das per- turbagées que fazen desviar os plantas das suas Srbitas Kieperianas @ iguainente no século XIX com a elaboragio duna teoria refinada dos ‘spectros dos atomos conplexcs © das moléculas. E aconpanhando todos es problenas ¢ muitos outros coloca-se toda uma série ininter- rupta de barreiras experinentais. Aparelhagen especial teve de ser inventada e construfda para pernitir a deterninagio de COULOMB da Novos tipos de telesedpics cram oxigiges para lat da forge elétrica, observagées que uma vez efetuadas, iam exigir una teoria das pertubagdes melhorada. 0 projeto © construgio de mais potentes sio necessidades cuja falta se faz continuanente newtoniana aceleradores tir en ligagio com o esforgo de articular teorias das forgas nuclea res mais eficazes. Esses so os tipos de trabalho em que quase todos 08 cientistas passam a maior parte do seu tempo. (®) (B) A discussio deste parigrato © do prixino esti desenvoivida ao seu artigo (KUHN, 1961). consideravelseate a Tenho a impressio de que o resuno que fiz da investigagio cdentifica normal néo precisa agui de ser mais aprofundado, mas hs dois aspectos que devem ainda ser destacados. Primeiro, todos os pro blemas referidos atras eran dependentes de paradigna, com freqiéneia ae varias maneirss. Alguns deles - por exemplo, a dedugio dos termoz de perturbagdo na teoria planetiria de NEWTON ~ néo podia sequer ser colocada na auséncia dum paradigna. Con a passagen da teoria de NEK~ TON para a teoria relativista, alguns deles transfornara-se en pro blemas iferentes @ nem todos foram ainda hoje resolvidos. Outros problemas - por exenplo, a tentativa de determinar a lei das forgas elétricus ~ podian ser e eran, pelo menos duma forma vaga, ser resol vidos. Mas, na sua forma primitiva, nio podiam ser atacados con éxi= to. Aqueles que descrevian as atragées © as repulsées elétricas em termos de “eflivios” tentaram nedir as forgas resultantes colocendo lum disco carregado a uma disténeia determinada por baixo do prato de uma balanga. Neseas condigies néo se conseguiu chegar a resultados consistentes susceptiveis de interpretagio. A precondigio para o su~ e880 acabou por ser un paradigma que reduzia a agio elétrica a una ago do tipo gravitacional, ago 4 distincia entre partfculas pon tuais. A partir de FRANKLIN 05 teéricos da eletricidade passaran a pensar a ago elétrica nesses termes; tanto COULOMB como CAVENDISH 08 tinhan en vista ao conceber as suas aparelhagens. Finalmente, em an- Bos esses casos ben cono en todos os outros era necessiria una ade~ so a0 paradigma para fornecer uma motivagio com sentido. Quen esta~ ria para conceber e construir conplicados aparelhos de uso altanente especifico, ou quem estaria para passar meses a tentar resolver de~ ferminada equacio diferencial, sem a garantia segura de que 0 3eu esforgo, se tivesse éxito, daria o fruto desejado de antenio? Esse referéncia a0 resultado de um projeto de investigagao ue € desejado de antenio leva & segunda caracterfstica notével da~ Tuto a que estou agora chanando de investigagiio normal, de base pa~ radigndtica, 0 cientista que trabalha nela de modo algun ae ajusta & antiga Amagem do cientista como um explorador ou um inventor de no- vas ¢ luminosas teorias que permitem previsdes briihantes e inespera a8. Pelo contrério, em todos os problemas discutidos atras todo o Fesultado mest en pormenor era conhecide desde 0 infeio. Nenhum ci- entista que aceitasse o paradigna de FRANKLIN podia duvidar da exis Séncta duna lei de atragio entre partfculas minisculas de eletrici~ Gade, © era razoivel cupor que essa lei se poderia exprimir por una Telagdo algébrica simples. Alguns deles, mesmo previan que teria de #r una lei envolvendo © inverso do quadrado da distancia, Nunca os Hisicos nem os astrénosos newtoniancs duvidaram que es leis do novi- mento © da gravitagio de NEWTON acabariam por reproduzir os movinen- tos observados da Lua © dos plenetas, embora, por mais de um século, @ complexidade matemdtica inpedisse que fosse obtido um bon corde fem todos os casos. Sn todes esses problemas, cono na naioria dos que 05 cientistas abordam, o ataque ao airigido como fim de desven~ dar 0 desconhecido, mas de obter 0 conhecido. A fascinagio deles 6 causada no pelo resultado que poderdo vir a descobrir, nas pela di- ficuldade em conseguir mesmo 0 resultado. fn vez de se assenelhar a una exploragdo, a investigagio normal apresenta-se antes cono 0 es~ forgo de juntar um cubo chings cujo aspecto final & conhecido desde © prinefpio. Estas so as caracterfeticas da investigagio normal que eu tinha em vista quando, no conego deste ensaic, descrevia @ pessoa en volvida nela cono um sclucionador de puzzles, § maneira dun jogador Ge xadrez. 0 paradigna que ele adguiriu gragas a una preparagio pré~ via fornece-ihe as regras do jogo, descreve as pecas con que se deve’ jogar @ indica 0 objetivo que se pretende alcancar. A sua con ante en manipular an pagas sogundo as regrao de naseica Gus select ado 0 objetivo om vista. Se the falha, como acontece con a neler 4a dos clentistas, polo menos na prineita tentative de atecar an ‘Problera, one tracasso 06 revela a aua falta de hatilidede, ne "Zee gras fornecidas pelo paradigna nio potem entdo ser postas en causa, uma vez que sem essas regras conecaria por nio Haver puzzles para re Solver. Ndo haja portanto dividas de que ce problenas (ou puzzles), pelos quais o praticante da ciéneia madura normalmente se 4: Pressupien a adesio profunda a um paradigna. E & una sorte que essa adesio nfo seja abandonada com faci lidade. A experiéncia mostra qu Andivfduo guer 0 grupo profissional, acaben finalnente por reproduzir, dentro fen quase codes os cases, 08 esforgos repetides, quer do ibito do paradigna, una solugio mesmo para os problemas mais di- ficeis. Esta una das maneiras cono a eiéncia avanga. Nessas condi- Ses devenos surpreender-nos com a resisténcia dos cientistas 2 mun Ganga de paradigmas? © que eles estio defendendo é, no fim de con tas, nem mais nem menos do que a base do seu modo de vida profissio 8s Chegando aqui, una das principais vantagens do que come= ees chamando 0 dognatisno cientffico deve ser evidente, Como uma vis ta de olhos répida a qualquer histéria natural baconiana ou a descr do do desenvolvinento pré-paradigndtico de qualquer ciéneia — mos~ tram, a natureza & demasiado complexa, para ser explorada ao acaso mesmo de maneira aproxinada. Ten que existir algo que diga ao cien- ‘tista onde procurar e por que procurar, ¢ esse algo, que pode muito ben ndo durar mais que essa geragio, @ © paradigna que 1he foi forne eldo con a sua educagdo de cientista. m_virtu da_necessiria confianga nele, o cientista en grande parte deixa de e desse paradigna ser um explorador, ou pelo menos de ser un explorador do desconhect- 4a, in vez disso, ele luta por articular e concretizar 0 conhecido, e.e8se objetivo especifico leva-o a conceber diversos aparelhos e va riadas versdes da teoria. Desses puzzles que o levam a projetar e a adaptar, ele tira o seu prazer. A menos que tenha uma sorte extraor- @iniria, & do Gxito em resolver os puzzles que ir depender @ sua reputagéo. A tarefa em que ele esté empenhado caracteriza-se a dada altura, @ inevitavelmente, por una visio drasticanente reduzida. Mas dentro do campo para que esta focada a sua visio o esforgo continua do para ajustar os paradignas & natureza produz un conhecinento luna conpreensio de pormenores exotéricos que no poderian ter sido alcangados de nenhuna outra maneira. Desde COPERNICO e o problena da Precessio de EINSTEIN ¢ 0 efeito fotoelétrice, 0 progresso Ga clén- cha tem senpre dependido precisamente desse aspecto exotérico. Una das grandes virtudes da adesio a paradignas consiste.em que ela i= berta os cientistas para que se possan ocupar com os pequenos puz- sea. Porém, essa imagen da investigagio cientifica cone resolu ‘so de puzzles ou ajustamento de paradignas deve estar, en Gtina andiise, bastante inconpleta. Enbora o cientista possa néo ser um explorader, os cientistas estdo sempre descobrindo tipss novos e Anesperados de fendmenos. Exbora o clentista néo se esforge normal- mente por inventar novos tipos de teorias fundanentais, tals teorias eon fregigncia tén surgido da pritica continuada da investigagio.Mas Renhuna inovagio desse género apareceria se a atividade a que chanel de ctancia normal tivesse sempre éxito. De fato con muita fregléncia © Sndividuo envolvide na solugéo de puzzles oferece resisténcia is Rovidades que se apresentan, ¢ £4-lo por razSes muito aceitivels. Pa Fa ele trata-se de alternar as regras do jogo e qualquer alteragio de regras & intrinsecanente subversiva. Esse elenento subversive tor 36 na-se, claro esti, mais aparente em inovagées teGricas de grande in portancia como as associadas acs nomes de COPERNICO, LAVOISIER ou EINSTEIN. Mas a descoberta dun fendmeno néo antevisto pode ter o mes mo efeito destrutivo, enbora geralmente num grupo mais reduzido ¢ Por um perfodo de tenpo mais curto. Una vez realizada a primeira das © Beran luminoso de RONTGEN deftonstrava que a anterior aparelhagem standard de raios catédicos se conportava de maneira que inguém tinha antevisto. Havia una variivel nio-provista a ser con- trolada; as investigagdes anteriores, j8 a caninho de se constituir fen paradignas, necessitavan de ser reavaliadas; velhos puzzles ti- han de ser resolvidos de novo, recorrendo-se a um conjunto de re= gras algo diferente. Mesno sendo facilnente assimilivel, una desco- berta cono a dos raios x pode violar um paradigna que previanente orientara a investigagdo. 0 que se segue & que, se a atividade nor- mal de soluctonar puzzles tivesse sempre éxito, 0 desenvolvinento da ciéncia néo poderia conduzir a qualquer tipo de inovagio fundanen- tal. experiénes! Mas claro f@ a0 reconhecer esse fato deparanos com a segunda grande vantagen da Anvestigagéo de base paradigmitica. Ao contririo de muitos dof anti- gos tedricos da eletricidade, 0 praticante duna ciéncia madura sabe com precisio razofivel a que tipo de resultado pode chegar com a sua Anvestigagio. im conseqliéncia disso, esti em posigio especialmente favorivel para detectar um problema de investigagio que sata fora do esperado. Por exemplo, como GALVANI ou RONTGEN, ele pode deparar con lun efeito que sabe nio ter razio pare ocorrer. Ov, por exemplo, cono COPERNICO, PLANCK ou EINSTEIN, pode conciuir que Os fracassos repeti dos des seus antecessores, ao ajustar o paradigna & natureza, & evi- déncia inescapivel da necessidade de mdar as regras con que se ten- ta fazer esse ajustamento. Ou, por exemplo, como FRANKLIN o& LAVOI~ STAR, pode concluir depois de repetidas tentativas que nenhuna dai teorias existentes pode ser articulada de forma a explicar determina do efeito recentenente descoberto. Cono se vé por ess6s' exemplos & POF muitos outros, a pritica ctentffica normal de solucionar puzzles que @ cléncia normal nen sempre tem &xito pode levar, e leva de fato, ao reconhecimento © isolanento de una anoalia, Um reconhecimento desea natureza &, penso eu, precondigao para quase todas as descobertas de novos tipos de fenémenos e para todas as inovagdes fundanentais da teoria cientffica. Depots que un Primeiro paradigna fot alcangado, wna quebra nas regras do jogo pre~ estabelecido & o prelédio habitual para una inovagio cient{fica im j 87 portante. Vejanos primetro o caso das descobertas. Huitas delas, co no a lei de COULOMB ou a descoberta de un novo elenento para preen- cher um espago vazic no quadro periédico, no levantan dificuldades. No Levan a "novos tipos' de fenémence", sio sim descobertas antecipa das gragas a um paradigna e obtidos por soluctonadores de “puzzles: experientes: essa espicie de descobertas @ um produto natural do que asset @ chanar de ciéncia normal. Mas nem todas as descobertas per- tencem a essa categoria; muitas delas ndo poderian ter eido antecipa @as por extrapolagio do conhecido; de certa maneira, tinham de ocor- rer "por acidente". Por outro lado o acidente donde elas surgiram nio poderia ter ocorrido a uma pessoa qualquer que simplesmente passasse na ocasiio. Nas cténcias maduras a descoberta requer equipanento mis to especializado, tanto do ponto de vista da concepgio como instru mental, © esse equipanento espectalizado tem vindo a ser constante- mente desenvolvido e aplicado com 0 fim de resolver os puzzles de in se equipanento dei- vestigagio normal.!A descoberta aparece quando va de funcionar da forma como deveria. Além disso, como falhas tempo Farias de varias espéctes ocorren en quase todos os projetos de ine vestigagio, a descoberta 83 surge quando 0 fracasso & particularnen- te persistente ou eapetacular ou quando pareza por en questio convie Ges, e maneiras de proceder aceitas! Os paradignas estabelecidos slo portanto mitas vezes duplanente precondigdes para descobertas. Sem eles 0 projeto que sai fora do espersdo nunca poderia ter side ini~ clase. F nesno depois que o projeto saiu fora do esperado, como acon tece con a maior parte deles durante algun tempo, o paradigaa pode ajudar a determinar se 0 fracasso merece mais investigagio. & respes ta normal ¢ adequeda a um fracasso na resolugio de puzzles consis fm langar a culpa nos talentos ou aparelhos de elguén © mudar a sutr para outro problema. Se nio quex perder tempo, 0 clentista de fer capaz de discerntz entre na anonalia essencial e un fra acidental. Ease esquema - descoberta gragas a uma anomalia que pie 2 diivida convicgées © técnicas estabelecidas - tem vindo sempre a S@E repetido ao longo do desenvolvimento cient{£ico. NEWTON desco- briu a composigio da luz branca por néo ser capaz de reconciliar a Aiepersio observada con a dispersio prevista pela entio recente let de SNELL da refragio (ver KUHN, 1958). A bateria elétrica foi desco- Berta quando os detectores de carga estitica entio esistentes deixa 8 ram de se conportar cono o paradigma de FRANKLIN fazia prever (ver GALVANI, 1954). 0 planeta Netuno fot descoberto em virtude do esfor- g0 desenvolvido para explicar ag anonalias na rbita de Urano (ver ARMITAGE, 1950). 0 elemento cloro e 0 composto monéxido de carbono surgtran quando das tentativas de reconciliar a nova Quimica de 1A VOISIER com as observagées de laboratSrio. Os chanados gases nobre foram o produto duma longa série de investigagdes originadas na pre senga duna pequena, nas persistente, anonalia na medigo da densida~ de do azoto atmos férico (ver RAMSAY, 1896). 0 eléctron fol introdurs 4o para explicar algunas propriedades anémalas da condugao de eletri, eldade dos gases, © 0 seu spin fol sugerido para esclarecer apoma- Lise doutro tipo observadas no espectro atémico. Nas cténctas_madu- ras as inovagSes inesperadas sio descobertas principalnente depois de algo ter corrido mal. Porém, se una ononalia & significative ne preparagio do caninho pare novas descobertes, ela ten un papel ainda mais inportan te na invengio de novas teorias. Contrarianente a una convicgio esta belecida, enbora néo universal, as novas teorias nio so inventadas para explicar observagSes que néo tinhan antes sido ordenadas por ne nhuna outra teorsa, Pelo contrErio, praticanente en qualquer époce do desenvolvinento duna e1éneia avangada, todos os fates cuja rele- vincia & aceita apresentan-se cono ajustando-se ben & teoria existen te ou estando en via de se ajustar. 0 proceaso de fazé-los ajustar melhor 2G origen @ mitos dos problemas “standard” da cféncka —nor~ nal. E quase senpre clentistas convictos conseguen rescivé-i0s. Pom rém nen sexpre consesuen, e quando falnan repetidas vezes © cada vez mais, entio o sex setor da comunidade cientifica depara con que aigures chanet ae *erise” 4 fundanental- Rente errado na teorla con gue trabalhan, os clentistas tentar toulagdes da teoria mais fundanentais do que as que eran adnitidas antes. ( efpico, nos tempos de crise, encontrar nunerosas verses Asferentes da teoria paradigna). Ao meso tempo, iro conegar mais ou Renos ao acaso experiéncias da zona da dificuldade, na esperanca de descobrir aigun efeito que sugira a naneiza de pér a situagio a claro. Unicanente en situagses desse génezo, sugizo eu, & una inove- glo fundanental na teoria clent{fica nio a6 inv entada, mas aceita. + Ro reconhecer que algo © estado da Astronomia de PTOLOMEU era, por exemple, uma catistrofe reconhecida por toda a gente antes de COPERNICO propor 29 tua midanga de base na teoria astronémica, ¢ 0 prefécio onde COPER- NICO apresonta as suas razées para inovar constitui uma descrigao cligeica duma situagio de crise (ver HUHN, 1957). As contribuicoes de GALILEU para o estudo do movimento tonaran por ponto de partida aigiculdades ben conhecidas da teoria medieval, e NERTON reconct liu ‘a mecinica de GALILEU com a teoria copernicana. A nova guimica de 1A VOISTER era um produto de anonalias criadas simultaneanente con proliferagdo de novos gases ¢ os primeiros estudos sisteniticcs das relagdes entre os pesos. A teoria ondulatéria da luz fol desenvolvi 4a num ambiente de crescente desconforto devido &# anomalies: surgi- das nos efeitos de difracio e polarizagic para a teorla corpuscular de NEWTON. A termodindmica, que depois veio a aparecer cono una su- perestrutura para as ciéncias existentes, fol estabelecida unicanen= te & custa da rejeigéo das prévias teorias paradigniticas do caléri, co. A mecdnica quintica nasceu de una série de dificuldades que en- volvian a radiagio do corpo negro, 0 calor especifico e 0 efeite fo telétrico. De novo a lista podia ser alargada, mas a questio que in teressava dave 34 estar ben clara. As novas teorias surgen do traba ho conduzide de acordo com as velhas teorias, ¢ isso #5 acontece quando se observa alguna coisa que no esti indo certa. 0 prelidio a0 seu aparecinento & una anonalia anplanente conhecida, © tal conhe cimento $8 pode existir nun grupo que sabe mito bem o que seria te- rem as coisas seguido 0 caninho certo. ono as limttagées de espago e de tempo me forgam a parar aqui, a minha exposigao sobre o dognatisno tem de ficar esquenitic No tentarei sujuer Cratar ayui da estruture fine gue, en qualyuer momento, 0 desenvolvimento cient{fico apresenta. Mas ha cutra conse~ quéncia da minha tese que necessita de um comentario final. Enbora a Anvestigagd susceptivel de ter éxito requeira una adesdo profunda a0 "status quo", a inovagdo continua a ocupar uma posigio central.os clentistas sio "treinados" para funcionar como solucionadores de puz zles dentro de regras estabelecidas, mas séo também “ensinados” —& considerar-se eles préprios cono exploradores e inventores que ndo conhecen outras regras alén das ditadas pela natureza. 0 resultado é 40 @ aquisigio duna tensic, en parte ao nfvel da comunidade, entre habilitagées profissionais de un lado ¢ a ideologia profissional outro. # quase certo que a tensio e 2 capacidade de a manter sio ele entos importantes para o éxito da ciéncia. At@ aqui tratei exclusi- Vamente da dependancia da investigagio da tradigdo, a minha atscus-

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