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29 de maio de 2010

OS ESTADOS UNIDOS E A ASCENSÃO


DE NOVOS PÓLOS: OS BRICS

RÚSSIA
Prof. Gabriel Pessin

Apoio institucional: Apoio logístico:


Projeto “Relações Internacionais para Educadores” – 29 de maio de 2010
OS ESTADOS UNIDOS E A ASCENSÃO DE NOVOS PÓLOS: OS BRICS – RÚSSIA

OS ESTADOS UNIDOS E A ASCENSÃO DE NOVOS PÓLOS: OS


BRICS – RÚSSIA
Prof. Ms. Gabriel Pessin1

Após ter tido grande relevância no cenário internacional durante grande


parte do século XX, notadamente durante o período da Guerra Fria, o qual
compreendeu os anos desde o final da Segunda Guerra Mundial (metade da década
de 1940) até o início dos anos 1990, a Rússia passou por momentos difíceis -
momentos esses que tiveram forte vinculação com os efeitos gerados pela queda
do comunismo no país. Apesar disso, os anos 2000 vêm mostrando uma
significativa melhora da Rússia, no sentido de inserir-se na ordem mundial atual e
de aderir ao capitalismo após quase oitenta anos de regime socialista.
A fim de entender mais claramente tal melhora, está sessão trará,
primeiramente, um breve histórico da Rússia, em que os momentos derradeiros do
regime comunista soviético, ocorridos entre os últimos anos da década de 1980 e o
início dos anos 1990 serão retomados e analisados em detalhes. Buscaremos
entender quais causas levaram à queda da antiga União das Repúblicas Socialistas
Soviéticas (URSS) e quais consequências tal queda trouxe para a Rússia nos anos
1990 e 2000. Por fim, daremos destaque à atual estratégia de inserção
internacional do país, caracterizada pelo multilateralismo em detrimento do
unilateralismo protagonizados pelos Estados Unidos. Por fim, algumas das
maneiras pelas quais a Rússia busca promover tal multilateralismo (tais como a
criação de entidades como a Organização de Cooperação de Shangai e o próprio
BRIC) serão analisadas em detalhes, dando destaque para as relações entre Rússia
e Brasil.

ANOS 1980: AS SEMENTES DO FIM DA UNIÃO SOVIÉTICA

A Revolução Russa de Outubro de 1917, coordenada pelos bolcheviques2,


situou a Rússia em uma posição de destaque no cenário internacional, ao passo que
foi o palco da primeira revolução popular capaz de derrubar, efetivamente, um
governo. Embora o regime absolutista russo, o czarismo, fosse um regime já
esgotado, incapaz de sustentar o país, a burguesia russa também não obteve êxito

1 Elaborado por Mariana Willmersdorf Steffen e Sílvia Carolina Sebben (alunas de Relações
Internacionais da UFRGS).
2 Partido político comunista da Rússia, cujo principal objetivo era realizar a Revolução Socialista

Russa, no menor espaço de tempo possível. Em http://educaterra.terra.com.br/voltaire/.

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em assumir o poder. Dessa forma, diferentemente das outras revoluções


antecedentes no mundo, a Revolução Russa foi a primeira a pôr o povo, na figura
do proletariado unido, à frente de um governo.
A Rússia viria a assumir uma posição de destaque no cenário internacional
sobretudo devido ao cunho socialista de sua Revolução, que, em 1922, criou a
União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). A URSS era composta pela
Rússia e por outras 14 repúblicas3 (ver Figura 1), é foi primeira materialização em
regime político da teoria socialista no mundo.

Fig. 1: União das Repúblicas Socialistas Soviéticas

Fonte: Colégio Objetivo.

No entanto, seria apenas após a Segunda Guerra Mundial que a participação


central da Rússia no cenário mundial iria concretizar-se: uma vez vitorioso na
guerra contra o nazismo alemão, o regime socialista russo iria atrair as atenções no
cenário internacional, e começaria a apresentar perigo ao capitalismo do Ocidente,
estabelecendo a URSS como um dos pólos do sistema bipolar4 - em oposição,
portanto, ao pólo capitalista, liderado pelos Estados Unidos.

3 Em 1956, tamanho máximo atingido pela potência em toda a sua história. As Repúblicas eram:

Armênia, Azerbaijão, Bielorrússia, Estônia, Geórgia, Cazaquistão, Quirguistão, Letônia, Lituânia,


Moldávia, Rússia, Tadjique, Turcomenistão, Ucrânia e Uzbequistão. Em
http://historia.abril.com.br/politica/urss-uniao-fez-forca-435817.shtml.
4 Sistema dividido em dois pólos opostos, cujas potências líderes vêem na vitória do pólo oposto sua

própria derrota. (DONALDSON & NOGEE, 2005)

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Durante grande parte do século XX, Estados Unidos e URSS estabeleceram


uma acirrada competição entre si, por meio de corridas armamentistas,
econômicas, político-ideológicas e espaciais, ainda que jamais tenham se
enfrentado diretamente no campo de batalha. Esse período inaugurado ao final da
II Grande Guerra ficou conhecido como Guerra Fria e perdurou até o início dos
anos 1990 (1991), quando ocorreu a queda da União Soviética.
Durante os anos 1970, a URSS aumentou sua presença internacional,
participando direta e ativamente de revoluções no Terceiro Mundo – a citar,
intervenções nas revoluções vietnamita, cubana, iraniana e afegã (HALLIDAY,
1989) –, bem como se empenhou em elevar o nível de vida de sua população, a fim
de adquirir vantagem frente ao mundo capitalista (VIZENTINI, 1990). Na década
de 1980, no entanto, economia soviética extenuou-se, de forma que o crescimento
extensivo realizado até o momento havia atingido o seu limite (VIZENTINI, 1990).
O governo Brejnev (1964-1982) estava também esgotado: a ele haviam sido
vinculadas ideias de corrupção, incompetência e, principalmente, de estagnação da
política e econômica, dado que o padrão de crescimento econômico vinha
mantendo-se no mesmo patamar há anos, e havia o sentimento, dentre os
membros do Partido Comunista, de que o governo Brejnev havia se distanciado de
seus ideais de essência (HOBSBAWN, 1995).
É nesse contexto que Mikhail Gorbachev chega ao poder, em 1985. A fim de
resgatar o socialismo e, assim, recuperar o prestígio e resolver os problemas
internos pelos quais passava a URSS, Gorbachev instituiu reformas, no intuito de
adequar o socialismo às características da sociedade internacional ao final do
século XX - diminuindo a competição com os Estados Unidos e obtendo maior
aceitação do Ocidente.
As mais conhecidas reformas instituídas por Gorbachev foram a Perestroika
e a Glasnost. A primeira estava diretamente ligada à esfera econômica, visando a
estabelecer uma economia de mercado socialista, com empresas autônomas e
cooperativas públicas e privadas (HOBSBAWN, 1995), baseada na descentralização
e na associação ao capital estrangeiro em determinadas áreas da produção. A
Perestroika foi, na realidade, uma tentativa de aproximar a economia socialista
soviética das economias capitalistas. Por sua vez, a Glasnost também estabelecia a
descentralização do sistema, dessa vez na área política, visando à reintrodução de
um Estado democrático, constitucional e transparente, a fim de desvincular a URSS
da imagem de corrupção que se tinha dos governos anteriores, como o de Brejnev.
Isso seria possível apenas com a separação do Partido Comunista e do Estado, o
que acabaria por fragmentar a autoridade central agregadora do sistema
comunista, que era o Partido (HOBSBAWN, 1995).
Para a infelicidade de Gorbachev, suas reformas saíram de controle. A
Perestroika acentuou a já existente crise no sistema soviético – herdada da política
econômica equivocada do governo Brejnev e do próprio esgotamento do modelo
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socialista russo5 –, uma vez que a ausência de planejamento das reformas


propostas não previa a forma de transição da economia de comando estatal
centralizado6 para o novo sistema que se propunha (HOBSBAWN, 1995). No campo
econômico, fatores externos também contribuíram para a derrocada do socialismo,
tais como a nova corrida armamentista e espacial norte-americana e os embargos
comerciais instituídos por Washington, bem como o descompasso soviético frente
à Revolução Técnico-Científica ocidental – a qual posicionou o capitalismo em uma
“dianteira inalcançável pela URSS” (VIZENTINI, 2000). Segrillo (2000) observa,
ainda, que a potência socialista não foi capaz de se adaptar aos novos padrões
organizacionais da economia capitalista, advindos desta Revolução Tecnológica,
sem “solapar os pilares do seu próprio sistema”.
Ademais, a desestruturação, determinada pela Glasnost, da autoridade do
regime socialista (personificada no poder do Partido Comunista), contribuiu para
que os chefes de Estado pouco ou nada pudessem fazer para contornar a crise
econômica instaurada. A partir daí, as restrições financeiras da URSS influenciaram
sua política para com suas próprias Repúblicas e repúblicas satélites, uma vez que
o já diminuto (financeira e politicamente) aparelho estatal não mais podia intervir
nessas unidades, que acabaram abandonadas à própria sorte (VIZENTINI, 1990). A
perda de legitimidade do comando soviético nas Repúblicas também estava
associada à fragmentação do governo centralizado, que não mais destinava ordens
rígidas para os governos dessas unidades. Por outro lado, as próprias Repúblicas,
assistindo à paulatina derrocada soviética, desenvolveram a percepção de que não
mais precisariam obedecer aos russos – o Movimento Solidariedade na Polônia7, ao
assumir o governo com o consentimento Fig. 2: Afeganistão
soviético, é exemplo disso.
Além das questões econômicas e políticas
internas, a tensão militar sobre a economia
soviética aumentara consideravelmente durante
os anos 1980 (HOBSBAWN, 1995),
especialmente com a Guerra no Afeganistão (ver
Figura 2). O envio de tropas para apoiar e dar
estabilidade ao governo comunista lá instalado,
em 1978, estender-se ia até o fim dos anos 1980
consumindo considerável parte dos recursos
financeiros da URSS. Originalmente, a Fonte: Colégio Objetivo.

5 Estado concentrado na mão do Partido Comunista e decisões políticas fortemente influenciadas


pela disputa bipolar.
6 Todas as decisões a cerca da esfera econômica – divisão de áreas de produção, alocação de

recursos financeiros, etc – eram tomadas pelo governo central, isto é, o Partido Comunista, e depois
transmitida para todas as Repúblicas. Não havia livre mercado nem iniciativa privada na URSS.
7 Movimento criado nos anos 80 com o objetivo de reconquistar as liberdades da Polônia,

suprimidas pelo governo soviético da época.

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intervenção soviética direta no Afeganistão ocorreu com a intenção declarada de


estabilizar o governo do Partido Democrático Popular comunista, estremecido por
divisões internas em facções conflitantes. Os Estados Unidos, considerando a
intervenção soviética uma ofensiva militar ao mundo livre, destinou grandes
quantias de dinheiro e de armamentos para os guerrilheiros contrários ao governo,
obrigando a URSS a permanecer em território afegão por uma década, a fim de
sustentar o comunismo na pequena república (HOBSBAWN, 1995).
A drenagem de recursos econômicos para o conflito afegão comprometeu o
setor militar soviético. Uma significativa parte dos recursos que seriam alocados
no aperfeiçoamento da capacidade militar do país (pesquisas e desenvolvimento
de novas tecnologias e aquisição de novos equipamentos militares) foi destinada
para a manutenção das tropas e dos equipamentos em solo afegão, condenando o
aparelho militar soviético ao atraso e conseqüente sucateamento, ao passo que,
nos Estados Unidos, os avanços na área militar eram expressivos – a citar, o
programa de defesa estratégica do espaço, lançado em 1983 pelo presidente
estadounidense Ronald Reagan, e popularmente conhecido como Guerra nas
Estrelas8.
A URSS foi, então, sugada para um ciclo que, em poucos anos, a
consumiria. A reforma política não conseguiu fazer com que a autoridade central
resolvesse os problemas da área econômica, e a reforma econômica comprometeu
o Estado a tal ponto que este não mais tinha condições políticas de reerguer-se. A
diminuição do poder absoluto do Partido Comunista (CANO, 2000), em contraste
com a época stalinista9, não permitia que os dirigentes utilizassem de medidas
unificadas e de rígido controle para combater a crise econômica. Simultaneamente,
a precária situação da economia causava grande insatisfação popular, o que
dificultava a direção política do país. Vale observar que, desde a Glasnost,
passaram a ser permitidas críticas abertas ao Partido e, na medida em que as
políticas adotadas pelo governo não satisfizessem a população, esta poderia
desestabilizá-lo a ponto de que o grupo no poder tivesse de ser substituído.
Somando-se a isso a crise militar que atingiu a URSS durante a década de 1980,
temos, enfim, todos os elementos que, em 1991, foram responsáveis pela
derrocada da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas.

8Disponível em http://www.dw-world.de/dw/article/0,,484692,00.html.
9O regime socialista de Joseph Stalin foi caracterizado pelo alto grau de centralização dos processos
de tomada de decisão, nas mãos do Partido Comunista, acompanhado pelo culto aos líderes do
Partido e por fortes medidas totalitárias, tais como intensa repressão a dissidentes políticos e
censura a meios de comunicação.

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ANOS 1990: O FIM DA UNIÃO SOVIÉTICA E O ESTABELECIMENTO DE


NOVOS PARADIGMAS PARA A INSERÇÃO INTERNACIONAL DA RÚSSIA

A década de 1990 surge acompanhada por novos paradigmas para a Rússia:


a desintegração da URSS implicou na reinserção do país no cenário internacional,
que deixou de ser caracterizado pela bipolaridade, mas sim, de início, pela
unipolaridade dos Estados Unidos, que saiu da Guerra Fria como a única grande
potência do cenário internacional. Despida do viés socialista, a Rússia buscou
manter o status de grande potência quando na determinação das novas relações
com o Ocidente e com as próprias ex-repúblicas soviéticas, ao passo que assumiu a
necessidade de inserção na economia capitalista mundial.
A substituição de Gorbachev por Boris Yeltsin, em 1991, vem a altera
substancialmente a postura internacional da Rússia: mais do que um entrosamento
com os Estados Unidos, o novo presidente russo desejou o estabelecimento de
parcerias entre os dois países, por dois motivos principais: 1) a busca por uma
maior aceitação da Rússia na comunidade internacional e 2) a busca pela ajuda
estadunidense para a consolidação da transformação econômica do país
(DONALDSON & NOGEE, 2005).
Esta postura pró-Ocidente, no entanto, era acompanhada de um desejo
político russo de que o país fosse reconhecido como uma grande potência,
baseando-se, principalmente, em heranças residuais do respeito internacional
obtido durante a época da URSS (VIZENTINI, 2002). Assim, embora verificássemos
uma maior coordenação das ações estadunidenses e russas na ONU durante os
anos 90 –diminuição da utilização do veto no Conselho de Seguramça e articulação
de missões de paz10 conjuntas, como, por exemplo, a enviada para a Somália
(UNOSOM), em 1992 –, a expansão da OTAN11 encontrou forte resistência do
governo russo. Esta expansão, sustentada pelo governo norte-americano de Bill
Clinton, visava a absorver as repúblicas da antiga União Soviética, bem como
algumas das que costumavam ser suas repúblicas satélites (República Tcheca,
Hungria e Polônia). Por parte do governo russo, a resistência em relação à OTAN
encontrava-se na insatisfação com a aproximação ao seu território e ao que
considerava sua zona de influência de uma organização considerada rival durante
os anos de Guerra Fria, – o que significava uma afronta aos seus interesses como
potência. Em oposição, a Rússia buscava estruturar a segurança do continente
europeu a partir da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa

10 PERSICI, Rossana. As operações de paz da ONU: uma reflexão sobre as mudanças ocorridas após a
Guerra Fria.
Em:http://www.politicaglobal.com/politicaglobal/Rossana/Entries/2010/4/1_As_operações_de_p
az_da_ONU:_uma_reflexão_sobre_as_mudanças_ocorridas_após_a_Guerra_Fria.html
11 Criada no contexto da competição bipolar, a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN),

de 1949, consistiu em uma aliança militar entre os países do mundo ocidental, frente à ameaça de
um possível conflito com o regime comunista soviético.

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(OSCE)12, tal que pudesse garantir seu reconhecimento como potência na sua
reintegração ao continente europeu. Diversas negociações ocorreram para
solucionar a questão da expansão da OTAN. Entretanto, a Rússia, claramente com
menos elementos de barganha, não teve condições de contrapor os argumentos
ocidentais, e teve de contentar-se com a criação de um Conselho Rússia-OTAN13,
cujo principal objetivo seria estabelecer um foro de diálogo sobre as questões de
segurança no continente europeu, o qual operaria baseado no consenso entre os
membros, mas que ainda poderia agir sem o consentimento russo (DONALDSON &
NOGEE, 2005).
No episódio da Guerra do Kosovo, ocorrida entre os anos de 1996 e 1999,
ficou ainda mais clara a indisposição russa em ceder às questões ocidentais,
principalmente quando estas iam de encontro às suas próprias preferências. Em
1989, o presidente sérvio, Slobodan Milosevic, revogou a autonomia da província
do Kosovo, impondo um governo fortemente repreensivo sobre seus habitantes.
Isto provocou uma resposta armada do Exército de Libertação do Kosovo, dando
início a uma sangrenta guerra civil, em 1996. Conforme se acentuaram as medidas
repressivas do presidente sérvio sobre os kosovares, o Grupo de Contato14 reuniu-
se e definiu um plano para combater a Sérvia, sem, no entanto, obter sucesso.
Quando o Grupo sugeriu a intervenção militar em território sérvio, a Rússia alegou
que apenas as Nações Unidas possuíam o direito de utilizar a força militar contra a
soberania de um país (DONALDSON & NOGEE, 2005). Nesse caso, a resistência
russa justificava-se no fato da Sérvia ser um antigo aliado do país, em relação ao
qual a Rússia não poderia adotar uma postura efetivamente contrária. Uma vez que
as tentativas russas de persuadir Milosevic a capitular não obtiveram êxito, tal
como se ocorreu aas tentativas de dissuadir a OTAN quanto ao ataque militar –
apelos ao Conselho de Segurança da ONU, ao Conselho Europeu e aos Estados
Unidos –, restou aos russos aceitar e participar das negociações de paz, desde que
essas ocorressem sob a égide da OSCE.
Os bombardeios aéreos da OTAN sobre a Sérvia iniciaram-se em março de
1999 e, em junho deste mesmo ano, a Rússia, conjuntamente à OSCE, teve êxito em
persuadir Milosevic a aceitar o plano ocidental para pôr fim ao conflito.
Sumariamente, a Guerra do Kosovo demonstrou não apenas as inabilidades

12 A Organização para a Segurança e Cooperação na Europa é composta por 56 países de diferentes


continentes (Europa, América e Ásia), o que a torna a maior organização intergovernamental do
mundo. Subordinada à ONU, debate assuntos relacionados à economia, política e segurança. Em
http://www.osce.org/.
13 Fundamentado no “Ato Fundador das relações mútuas de cooperação e de segurança”, de

iniciativa russa, em 1997, e efetivamente criado em 2002. Em http://www.nato-russia-


council.info/htm/EN/news_41.shtml.
14 “Contact Group”: grupo de países especialmente interessados no desenrolar político na região

dos Bálcãs, quais sejam: Rússia, Estados Unidos, Grã-Bretanha, França, Alemanha e Itália. Essa
região era estrategicamente importante por ser considerada: fronteira entre o Ocidente e a religião
ortodoxa; limite entre a União Europeia e a OTAN expandida; e retaguarda da Turquia, entre
Europa, Ásia e Oriente Médio (HUNTINGTON, 1996).

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diplomáticas da nova Rússia, mas também a postura de manutenção da parceria do


governo Yelstin com o Ocidente (DONALDSON & NOGEE, 2005). Assim, ainda que
não compactuasse completamente com a postura ocidental, a Rússia jamais apoiou
formalmente a Sérvia, seu antigo aliado.
No tocante à relação com as ex-repúblicas soviéticas, a Rússia tentou
preservar a área de influência da antiga potência socialista com a criação da
Comunidade dos Estados Independentes (CEI). A CEI foi criada em 1991, por Yeltsin,
a fim de que fosse a sucessora da antiga URSS. A CEI tinha como objetivos a
manutenção dos vínculos econômicos e políticos das antigas Repúblicas, mas
preservando a unidade e a soberania dos Estados-membros. Atualmente, a CEI
conta com 11 membros, todos ex-repúblicas da URSS: Armênia, Arzebaijão,
Bielorrússia, Casaquistão, Quirguistão, Moldávia, Rússia, Tajiquistão, Ucrânia. Os
países bálticos (Lituânia, Letônia e Estônia), por sua vez, embora pertencessem ao
Estado Soviético, adotaram uma postura nas relações internacionais voltada para a
Europa e Ocidente; não se associando, portanto, à CEI. Tais países foram
incorporados à União Europeia em 2004. Atualmente, embora considerada por
alguns um organismo com pouca consistência material e institucional (VIZENTINI,
2000), a opinião prevalecente é a de que a importância da CEI vem diminuindo,
tendo sido gradualmente substituída por outra organizações, tais como a Eurasec
(Comunidade Econômica da Eurásia), cujo objetivo é o da criação de um mercado
comum entre seus países-membros (depois de a CEI ter se mostrado incapaz de
promover a integração econômica na região), e a já mencionada OSCE
(Organização para a Segurança e Cooperação na Europa). A saída da Geórgia da CEI
em 2008 (devido aos desdobramentos dos conflitos na Ossétia do Sul e na
Abkházia, sobre os quais falaremos adiante) é um exemplo do fato de que, na
atualidade, a CEI vem tendo um papel cada vez mais acentuadamente simbólico e
menos prático (WEITZ, 2008).
Além dessa questão de afirmação política da Rússia no contexto
internacional do pós-Guerra Fria, a inserção do país na economia capitalista
também representou um grande desafio para o governo Yeltsin. A falta de
planejamento da Perestroika, bem como sua precária instituição, legou uma série
crise econômica para o Estado russo. A necessidade de extinguir totalmente o
sistema planificado e passar para o sistema de mercado levou à associação ao
capital estrangeiro, impondo uma dependência externa a uma economia sequer
completamente formada (POMERANZ, 1998). Outros fatores que prejudicaram a
transição econômica do país foram as dificuldades de realizar as privatizações,
resultantes da complicada reinserção da propriedade privada no país; a falta de
pagamentos de salários e aposentadorias; a necessidade de modernização
empresarial – estritamente ligada à revolução tecnológica e à atração de
investimentos –; o desemprego; e a urgência com a qual a população cobrava a
criação e a manutenção da estabilidade econômica (Ibid).

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Dessa forma, a liberalização econômica, promovida de maneira equivocada


pelo governo Gorbachev e acentuada durante os anos Yeltsin, levou o país ao
desastre econômico (TODD, 2005). A crise pela qual a Rússia passou em 1998
comprovou a ineficiência das políticas econômicas iniciadas com a Perestroika,
materializada na falência de milhares de empresas e no fracasso da reestruturação
de diversos setores da produção. Em 1998, a pressa russa em se adequar ao
sistema capitalista acabou por demonstrar-se fatal: a redução da oferta de crédito
internacional e a desvalorização do preço das commodities15, resultados da crise
asiática de 199716, combinadas com os fatores críticos internos da economia russa,
resultaram em uma forte desvalorização do rublo (moeda corrente na Rússia) e na
declaração de moratória17 por parte do país.
A crise russa de 1998 provocou o encolhimento do PIB do país em 4,9%
neste ano, e sua inflação atingiu 84%. Estava instalado um periódico de
turbulências econômicas ainda mais acentuadas, cuja principal conseqüência seria
a eleição de Vladimir Putin, em 2000, após a renúncia do presidente Boris Yeltsin
final de 1999.

ANOS 2000: A BUSCA POR UM SISTEMA MULTIPOLAR

A ascensão de Vladimir Putin ao cargo de presidente da Rússia, em 2000,


implicou em uma série de mudanças na organização da política interna e externa
do país. Em termos de política interna, Putin buscou continuar as reformas
proposta por Gorbachev nos anos 1980, ao mesmo tempo em que passou a aplicar
uma série de medidas macroeconômicas a fim de sanar a crise econômica que
assolou a Rússia no final dos anos 1990.
Em seu primeiro mandato, Putin implementou uma série de reformas que
buscaram reorganizar diversas instituições russas. Entre tais reformas, é
importante mencionar a criação de novas leis trabalhistas, administrativas,
criminais e comerciais. O objetivo era adequar o Estado às exigências do
capitalismo moderno, retomando aquilo que havia sido inicialmente proposto por
Gorbachev e que, devido a oposições internas, não pode ser continuado durante a
gestão de Boris Yeltsin (SHARLET, 2005).

15 Commodity é o termo utilizado para fazer referência a produtos em seu estado bruto (matérias-
primas), ou com pequeno valor agregado, tais como soja, café, petróleo, gás natural e açúcar, entre
outros.
16
Período de crise financeira, iniciado em 1997, que atingiu os países do continente asiático, em
especial aqueles que haviam apresentado altas taxas de crescimento econômico nos anos
anteriores, como Tailândia, Indonésia e Coréia do Sul (CANUTO, 1998).
17
Ato unilateral de um Estado declarando a suspensão do pagamento dos serviços da sua dívida
externa.

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Putin também promoveu uma reforma fiscal na economia russa,


concomitante à favorável conjuntura internacional de alta dos preços do petróleo
(devida, em parte, ao aumento da demanda mundial pelo produto e às ingerência
dos Estados Unidos no Oriente Médio, como a Guerra do Iraque de 2003). Uma vez
sendo grande produtora do combustível, importantes fluxos de capital acabaram
entrando no país. Esta conjunção de fatores deu aos russos a chance de sair da
crise na qual estavam imersos desde a década anterior. O Produto Interno Bruto
russo aumentou significativamente (entre 1992 e 2007, o aumento foi de quase
80%), a pobreza foi diminuída e os salários da população aumentaram, fazendo
com que, desde os primeiros anos de seu governo, Putin obtivesse grande
aprovação popular (FMI, 2008). Assim, é possível afirmar que, depois da crise do
fim dos anos 1990, uma conjunção de fatores colaborou para a recuperação
econômica russa. A desvalorização do rublo conjugada com o início do aumento
dos preços do petróleo fez com que as vendas do produto no exterior gerassem
maior capital na economia doméstica russa. Isto se deu porque os dólares captados
no exterior valiam mais rublos a partir de então. Outro fato significativo foi a
relevância que o primeiro-ministro da época, Evgeni Primakov, deu ao
setor produtivo russo, em detrimento ao capital especulativo, o que colaborou
sobremaneira com a recuperação de várias empresas russas.
Em termos de política externa, enquanto o governo de Boris Yeltsin buscou
uma aproximação com o Ocidente e estabeleceu laços amigáveis com os Estados
Unidos, a política de Putin visou a uma direção diferente, mais autônoma. Com
Putin a Rússia voltou a atuar de maneira unilateral e a buscar consolidar seus
próprios interesses no campo internacional, sem dar tanta atenção para atuações
coordenadas com as potências ocidentais.
Como visto, o fim da Guerra Fria testemunhou a transformação de uma
estrutura internacional caracterizada pela bipolaridade em um mundo de difícil
caracterização. Apesar de não haver dúvidas de que, em relação à esfera militar, os
Estados Unidos ocupam a posição de destaque; em relação a questões de
diplomacia, interações econômicas e relações transnacionais, entretanto, o mundo
atual é de tendência multipolar (DONALDSON & NOGEE, 2005). Tal que uma
característica importante da guinada dada pelo governo Putin na política externa
russa foi justamente a busca por uma maior multipolaridade no sistema
internacional, em oposição à ideia de unipolaridade, que privilegiaria os Estados
Unidos. Assim, houve a tentativa de vincular o país aos demais países que
despontavam no mundo, visando a dar ao sistema internacional um caráter mais
diversificado, em que os norte-americanos não mais fossem vistos como a única
potência dominante.
O argumento russo em favor do estabelecimento de um sistema
internacional multipolar baseia-se em tendências atuais (como a globalização e a
crescente interdependência dos Estados) e no conceito de soberania estatal,

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conformante com o principio de não ingerência de terceiros países ou


organizações internacionais nos assuntos que são de responsabilidade única e
privativa dos Estado. Conforme essa visão, nenhum país ou bloco de países deveria
ser hegemônico.
Diante disso, ao invés da existência da OTAN, a Rússia propõe a utilização
da ONU como modelo para manutenção da segurança internacional. Além das
Nações Unidas, o governo Putin propôs que a OSCE (Organização para a Segurança
e Cooperação na Europa) passasse a ser o órgão determinador da segurança
continental europeia (DONALDSON & NOGEE, 2005). Tal postura de combate à
ordem mundial unipolar e de preferência pela ONU e pela OSCE em detrimento da
OTAN é um aspecto que têm colocado a Rússia frente aos Estados Unidos, o que
demonstra que a coordenação de posições entre os dois em relação a temas
internacionais já não é mais o foco da agenda de política externa russa (embora
tampouco seja a confrontação direta).
Além dessa proposta, durante a década de 2000, a Rússia buscou formas de
defender a criação de uma ordem mundial de caráter multipolar via, por exemplo,
o estabelecimento da Organização para Cooperação de Shangai (OCS). A OCS foi
criada em 2001 pelos antigos membros do Shangai Cinco (China, Cazaquistão,
Quirgistão, Tadjiquistão e Rússia). Com a entrada do Uzbequistão, a organização
trocou seu nome para Organização para Cooperação de Shangai.
A criação de tal instituição pode ser vista como uma tentativa russa de, ao
mesmo tempo, aproximar-se da China- país que vem demonstrando grande
capacidade de crescimento econômico, e cuja importância internacional aumentou
de forma significativa nos anos 2000 –, bem como manter sua influência sob os
outros países membros da organização, localizados na Ásia Central e detentores de
recursos naturais estratégicos, como petróleo e gás natural. Além disso, a criação
da OCS é também uma forma que a Rússia encontrou para frear os interesses
chineses nos países centro-asiáticos, mantendo-os sob sua influência econômica e
política (WEITZ, 2008)18.
Ademais, a expectativa russa perante a OCS é a de, juntamente da presença
chinesa, buscar diminuir a presença de atores ocidentais na Ásia Central, o que
mostra a inserção da OCS dentro do plano russo de estabelecimento de uma ordem
mundial multipolar (MARAT, 2008). Há de se observar, no entanto, que a
Organização ainda não é uma aliança militar, como a OTAN, por exemplo. A
princípio, os objetivos principais da organização são os de combater o terrorismo e
o separatismo dentro dos territórios de seus países-membros. O separatismo é
uma questão de grande importância tanto para a Rússia quanto para a China, já
que ambas enfrentam problemas com grupos separatistas dentro de seus
18
A presença de dois colossos, no caso, Rússia e China, dentro da Organização para Cooperação de
Shangai é, entretanto, um fator interessante, já que dá mais margem de manobra para os países da
Ásia Central, que podem jogar entre as duas potências (WEITZ, 2008).

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territórios19. Recentemente, a OCS vem buscando expandir suas atividades a fim de


englobar projetos bilaterais e multilaterais em áreas como economia, energia e
cultura, não apenas se limitando ao combate ao terrorismo e ao separatismo.

Em relação ao terrorismo e ao separatismo dentro do território russo, é


interessante mencionar dois conflitos que tiveram grande destaque durante o
governo Putin: o conflito da região da Tchetchênia (que veio desde os anos 1990
até os primeiros anos da década de 2000) e o conflito com a Géorgia, pelas regiões
da Abkhasia e da Ossétia (ocorridos em 2008). Ambos os conflitos tiveram lugar
em regiões que são (ou foram) parte do território russo e que buscaram
independentizar-se, gerando guerras civis que deixaram grandes números de
mortos.
No caso da Tchetchênia (ver Figura 3), que é uma pequena região do
território russo localizada no Cáucaso, perto do mar Cáspio, ocorreu um
movimento na primeira metade dos anos 1990 que declarou a independência do
país, anunciando, inclusive, a criação de
Fig. 3: Tchetchênia
um novo parlamento. Tal declaração de
independência, entretanto, não foi
reconhecida pela Rússia, o que acabou
por gerar uma guerra civil na região,
deixando mais de 150 mil mortos. A
região da Tchetchênia é rica em recursos
naturais, como o petróleo, sendo, além
disso, ponto de passagem de diversos
oleodutos de importância estratégica
para a Rússia. Este é um dos principais
motivos que fazem com que a Rússia não
queira abrir mão da região (SCHILLING,
2004). Além disso, é inaceitável para o
governo russo ter que recuar das
margens do Cáspio para deixar outros
países, tais como os norte-americanos, Fonte: Folha Online.
por exemplo, afirmarem-se na região.
A guerra com a Tchetchênia foi um fator que acabou por, de certa forma,
fragilizar a Rússia perante o cenário internacional. Essa maior fragilidade, por sua
vez, provocou além do levante dos tchetchenos, o afloramento de antigas paixões
separatistas dos povos da região do Cáucaso, gerando uma série de pequenas
guerras e graves enfrentamentos entre os povos que recém conseguiam sua

19No caso da China, há grupos separatistas que buscam a independência da região de Xinjiang. No
caso da Rússia, as regiões da Tchetchênia e da Ossétia do Sul são os movimentos separatistas mais
conhecidos hoje (MARAT, 2008).

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independência - como é o caso da luta travada entre a Geórgia (ver Figura 4)


contra a província rebelde da Abkházia e da separação da Ossétia do Norte da do
Sul (SCHILLING, 2004).
Durante a guerra da Tchetchênia, a República da Geórgia foi acusada de
apoiar os grupos rebeldes tchetchenos contra a Rússia. No caso da Ossétia, é
importante mencionar o fato de que o território do povo osseta (de origem persa)
foi administrativamente dividido entre Rússia e Geórgia durante os anos de
vigênica da URSS. Nos anos 1990, a
Ossétia do Sul declarou sua Fig. 4: Abkhasia e Ossétia do Sul
independência da Geórgia, a fim de
poder integrar-se à Ossétia do Norte,
pertencente ao território russo. A
Geórgia foi contra tal movimento de
independência, lançando uma ofensiva
militar contra os rebeldes ossetas. Os
choques terminaram com a mediação
russa, ainda nos anos 1990.
Recentemente, em 2008, o conflito
envolvendo a Ossétia do Sul voltou às
páginas dos noticiários internacionais, Fonte: Folha Online.
quando a Géorgia voltou a invadir
território osseta, o que forçou a ocorrência de uma intervenção da Rússia na
região, que justificaram suas ações afirmando estarem apoiando a Ossétia em seu
direito à independência em relação à Geórgia. A tal intervenção se opuseram forças
da União Europeia e dos Estados Unidos, que veem a Ossétia como sendo parte do
território georgiano. Tais forças apoiaram a decisão por parte da Geórgia de
invadir o território da Ossétia do Sul. O apoio militar russo à Ossétia do Sul levou o
parlamento georgiano a aprovar com unanimidade, em agosto de 2008, a saída da
Geórgia da Comunidade dos Estados Independentes, da qual o país fazia parte
desde 1994.
A questão envolvendo a província da Abkházia e suas relações com a
Geórgia é bastante similar à questão da Ossétia do Sul. No início dos anos 1990, a
Abakházia passou a buscar sua independência em relação à Geórgia, o que gerou
severos conflitos na região, levando, inclusive, à necessidade de estabelecimento
de operações de paz na região, controladas tanto pela ONU quanto pela
Comunidade dos Estados Independentes (e, dentro deste âmbito, sendo lideradas
pela Rússia). O conflito entre Ossétia do Sul e Geórgia, em 2008, reavivou as
pretensões de independência da Abkházia, e a província entrou em confronto com
a Geórgia mais uma vez. Desta vez, porém, o resultado foi favorável para a
Abkházia, que teve sua independência reconhecida pela Rússia, ação que foi

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fortemente criticada pelos Estados Unidos e pela União Europeia e que não teve
respaldo por parte de outros países.
Em relação a ambos os conflitos, é interessante mencionar a posição da
Geórgia, que acusou a Rússia de tentar desestabilizar seu governo, fomentando
movimentos separatistas dentro de seu território. A Rússia, por sua vez, acusou os
Estados Unidos de terem provocado o conflito, alegando que a atuação do governo
americano na região tinha objetivos eleitorais. Alguns analistas creem que as ações
da Rússia na Geórgia possuem um objetivo principal: impedir que o país ingresse
na OTAN.

Outro aspecto importante a ser mencionado em relação à Rússia da


primeira década do século XXI é seu grande poder de barganha internacional
vinculado aos recursos energéticos presentes em seu território. A Rússia é o maior
exportador mundial de gás natural e o segundo maior exportador de petróleo. Em
função disso, mudanças nos preços e na disponibilidade desses recursos são de
grande importância para a economia russa, já que grande parte das exportações do
país correspondem a tais produtos. Em relação a esse fato, vale observar, em
primeiro lugar, a relevância que a alta dos preços do petróleo nos anos 2000 teve
para a economia do país. Desde o início da década, os preços internacionais do
petróleo vinham subindo acentuadamente, em razão de uma série de fatores, tais
como a existência de uma demanda cada vez maior pelo produto (por parte de
diversos países do mundo, especialmente a China). A grande instabilidade no
Oriente Médio (acentuada com a Guerra do Iraque de 2003), importante região de
produção petrolífera, fez com que os preços internacionais do barril de petróleo
subissem às alturas, o que foi imensamente favorável para a Rússia, que pode
vender seu petróleo a preços muito maiores do que antigamente o fazia.
O gás natural também é deveras importante para a inserção e para a
retomada do poder internacional da Rússia. Diversos países da Europa são
dependentes da diponibilidade do gás russo, o que faz com o que o produto se
torne um importante fator de barganha para os russos em suas relações com a
Europa Ocidental (e também com a OTAN, da qual grande parte dos países
europeus faz parte). Ainda em relação ao gás natural russo, é interessante
mencionar o fato de que ele é em grande parte extraído pela Gazprom, que á maior
empresa responsável pela extração de gás no mundo e também a maior das
empresas russas. Apesar de ter tido parte de suas ações privatizadas, a Gazprom
ainda tem como principal acionista o governo russo que, com isso, controla suas
atividades.

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RÚSSIA E BRASIL: UMA PARCEIRA PARA O FUTURO

Vladimir Putin deixou a presidência russa no ano de 2008, quando essa foi
assumida por Dmitry Medvedev. Apesar disso, a influência de Putin no governo
russo ainda é grande, já que, desde o início do governo de Medvedev, ele vem
atuando no cargo de Primeiro Ministro da Rússia. Em função disso, o governo de
Medvedev, pelo menos até a presente data, não demonstrou grandes mudanças em
termos de sua estratégia de inserção internacional, que continua sendo baseada na
ideia da criação de uma nova ordem mundial caracterizada pelo multilateralismo.
Em relação a isso, o grupo dos BRIC é uma importante arma, através da qual a
Rússia (e os outros países do grupo) busca instaurar essa nova ordem.
Nesse sentido, pode ser esperada para o futuro uma coordenação maior de
ações entre Brasil e Rússia nos foros internacionais, falando em favor dos países
em desenvolvimento. Além disso, através da formalização do BRIC, espera-se que
as relações entre Brasil e Rússia fiquem mais fortes, tanto em termos diplomáticos
(um exemplo de tal fortalecimento diplomático foi a recente passagem do
presidente Luiz Inácio Lula da Silva pela Rússia) quanto em termos de relações
comerciais e econômicas.
Entretanto, cabe aqui destacar algumas diferenças importantes entre Rússia
e Brasil. Enquanto o Brasil ainda se caracteriza como potência em ascensão, é
notável o fato de que a Rússia ainda é, apesar de todos os problemas que enfrentou
desde o fim da Guerra Fria, uma grande potência. O aparato militar russo só perde
para o dos Estados Unidos, e seus recursos energéticos lhe dão capacidades
econômicas e diplomáticas notáveis. Cabe ao Brasil aproveitar a oportunidade de
ter um aliado tão forte para fazer com que suas reivindicações sejam ouvidas nas
discussões e foros internacionais.

Por fim, quanto às relações entre Rússia e Estados Unidos, pode ser dito que
houve uma significativa melhora desde que Barack Obama assumiu a presidência
norte-americana, em 2009. Um fato notável desde então foi o estabelecimento de
projetos para diminuir os estoques de armas nucleares de ambos os países.

Diante do exposto, portanto, é possível concluir que, apesar das dificuldades


político-econômicas enfrentadas pela Rússia durante os últimos anos do século XX,
desde o início dos anos 2000 o país vem recuperando seu prestígio no cenário
internacional, possuindo ainda grande poder de barganha em relação aos países
ocidentais e em organizações internacionais como as Nações Unidas (onde a Rússia
é membro permanente do Conselho de Segurança). Esse poder de barganha
internacional é acentuado pelo fato de o país possuir grandes reservas de recursos

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energéticos, tais como gás natural e petróleo, de importância fundamental para a


Europa.
Apesar dessa margem de manobra considerável, é importante lembrar que
o país sofre com problemas como o terrorismo e o separatismo dentro do seu
território, fatores que debilitam a imagem da Rússia no cenário internacional e
impõe limites a sua atuação (caso no não reconhecimento da independência do
Kosovo, por exemplo). Cabe aos próximos governos do país tentar lidar com tais
problemas da melhor forma possível, a fim de manter a posição de maior prestígio
internacional conquistada pelo país na década de 2000.

LEITURAS COMPLEMENTARES20
Leitura obrigatória
ADAM, Gabriel Pessin. A Economização da Política Externa Russa. Belo Horizonte, I
Fórum Brasileiro de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade Federal de
Minas Gerais, 2009.
Leitura complementar
QUINTELLA, Thereza Maria Machado (org.) Brasil – Rússia Fortalecimento de uma
Parceria. Brasília: Funag, 2005.
ZHEBIT, Alexandre. A Rússia na Ordem Mundial: Com o Ocidente, com o Oriente ou
um Pólo Autônomo em um Mundo Multipolar? Brasília: Revista Brasileira de
Política Internacional, Int. 46, p. 151-183, 2003.

QUESTÕES PARA DISCUSSÃO


1) O recomeço das relações com a Rússia proposto pelo Governo Obama pode
efetivamente levar os dois países a desenvolverem relações baseadas mais na
cooperação do que no conflito?
2) A retomada de poder da Rússia no sistema internacional balizada nos recursos
energéticos do país é sustentável no longo prazo?
3) O Brasil poderá vir a ser um dos pólos da ordem mundial multipolar defendida
pela Federação Russa?

20Disponível no site do Projeto “Relações Internacionais para Professores”:


http://www.cursoripe.blogspot.com/.

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LINKS ÚTEIS
1. OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte): em inglês
Disponível em: http://www.nato.int/cps/en/natolive/index.htm

2. OCS (Organização para Cooperação de Shangai): em inglês


Disponível em: http://www.sectsco.org/EN/

3. OSCE (Organização para a Segurança e Cooperação na Europa): em inglês


Disponível em: http://www.osce.org/

FILMES
- Tulpan (2008), de Sergei Dvortsevoy.
Resenha disponível em:
http://www.cinemaemcena.com.br/Ficha_filme.aspx?id_critica=7341&id_filme=79
36&aba=critica

- A Arca Russa (2002), de Aleksandr Sokurov


Resenha disponível em:
http://www.cinemaemcena.com.br/Ficha_filme.aspx?aba=critica&id_filme=2089

LEITURAS SUGERIDAS
HOBSBAWN, Eric. Era dos Extremos. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
SEGRILLO, Angelo. O Declínio da URSS: Um estudo das causas. Rio de Janeiro:
Record, 2000.
TODD, Emanuel. Depois do Império: A Decomposição do Sistema Americano. Rio
de Janeiro: Record, 2003.

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HALLIDAY, Fred. Génesis de la Segunda Guerra Fria. México: Fundo de Cultura
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MARAT, Erica. The SCO and Foreign Powers in Central Asia: Sino-Russian
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http://www.politicaglobal.com/politicaglobal/Rossana/Entries/2010/4/1_As_ope
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