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A Literatura de Horror e o Doppelgängerscheu (Temor Ao Duplo)

Pedro Heliodoro de Moraes Branco Tavares, Dr.


Psicanalista – Psicólogo [CRP 12/04085]
Doutor em Psicanálise e Psicopatologia – Université Paris VII – Denis Diderot
Doutor em Teoria Literária – Universidade Federal de Santa Catarina

Tel. (48) 9991 14 30

pedrohmbt@hotmail.com

Publicado originalmente em Acheronta - Revista de Psicoanalisis y Cultura no. 16


ISSN 0329-9147 Dezembro de 2002, Psicomundo: Buenos Aires. Acheronta,
Buenos Aires, v. 16, 2002.

“(...)Vio su sombra tendida y quieta

en el blanco diván de seda.

Y el joven rígido, geométrico,

com un hacha rompió el espejo.

Al romperlo, un gran chorro de sombra

inundó la quimérica alcoba”

Federico García Lorca – (Suicídio)

Estabelecer paralelos entre a Arte e a Psicanálise nos faz trilhar caminhos


tortuosos. Fato é, que a psicanálise se coloca como uma forma de saber/fazer
singular, “não se situando (epistemologicamente) em continuidade com saber algum,
apesar de arqueologicamente estar ligada a todo um conjunto de saberes sobre o
homem” (GARCIA-ROZA, 1998), o que não nos livra das tentações de aproximá-la
das demais formas, buscando, sobretudo como Lacan, aprimorar o entendimento e a
prática desta.
A Psicanálise se estrutura como um campo de saber que não é da ordem da
Religião, mas segue seus próprios “dogmas”; não é da ordem da Filosofia, mas se
propõe à uma crítica de seus próprios dogmas, é dogmático-crítica como definiria
Freud (FREUD, 1919). Não é da ordem da Ciência, apesar de um compromisso com
uma verdade, a verdade do sujeito. Também não é a psicanálise uma categoria
artística apesar de ser “um fazer criador que engendra realidades, ou sentimentos de
realidade” e é à noção de “engendrar“ que virei a me remeter adiante.(KON, 1996) É
a criação de realidade fato notório, sobretudo na beletrística. Nesse espaço entre
Ciência e Arte, Lacan propõe, em se tratando da temática, a preocupação com um
“... terceiro que não está ainda classificado, que se apoia na Ciência por um lado e
se inspira na Arte por outro ” (LACAN, 1974)

Pode-se dizer, portanto, que as relações frutíferas que podem ser


estabelecidas entre a Psicanálise e outros campos do saber seriam da ordem da
polifonia (clave intertextual), onde nos interessam as “consonâncias” existentes entre
estes em prol da teoria e clínica psicanalítica. No tocante à Arte e mais exatamente a
literatura de ficção, essas consonâncias nos remetem a um aficcionado por literatura
que citava longos extratos de Goethe ao longo de sua obra. Era ele seu herói
particular, e a ele, Freud, foi conferido um prêmio com o nome do poeta. Mérito
conferido ao talento literário manifesto em sua ensaística. Freud atribui ao “Ensaio
sobre a Natureza” que hoje sabemos não ser de Goethe, sua opção pelos estudos
médicos (FREUD, 1924-25).

Em se tratando de artistas da pena, além de Goethe, torna-se curioso e digno


de investigação o temor ao duplo (Doppelgängerscheu) expresso por Freud em carta
a Arthur Schnitzler, escritor e dramaturgo, seu contemporâneo (In KON, 1996). Por
que duplo? Bom, não eram poucas as semelhanças entre o autor da Traumdeutung
e o da Traumnovelle; (1) com seis anos de diferença de idade Schnitzler era judeu,
vienense, médico, e controvertido escritor (KON, 1996). Na carta, Freud afirma seu
espanto ao perceber na prosa de Schnitzler, que este trata de modo intuitivo aquilo
que ele mesmo percebe: “...sob a superfície poética, as mesmas suposições
antecipadas, os interesses e conclusões que reconheço como meus próprios.” Ele
continua dizendo tocar-lhe com uma “familiaridade estranha” (unheimlichen
Vertrautheit) “sua profunda apreensão das verdades do inconsciente, da natureza
pulsional do homem, a ruptura das certezas convencionais-culturais, o apego de
seus pensamentos sobre a polaridade do viver e morrer...” (In KON, 1996).

Mas de que Duplo pode ele estar falando? Bom, o de que falo é o Duplo
trazido em “Das Unheimliche” artigo para qual esse trabalho converge. “O duplo
originalmente era uma garantia contra a queda/ocaso (Untergang) do Eu, um
enérgico desmentimento do poder da morte” (FREUD, 1919a) Isso, ressalta Freud, é
o que se dá originalmente mas, superado o narcisismo primário, este outro volta-se
contra o sujeito de forma assustadora.

Chegamos aqui a um ponto onde não avançaríamos sem mencionar o


advento do eu (je) em vista do estádio do espelho. Ora é no espelho justamente que
temos a entificação do duplo, não seria ao acaso que Freud o cita em sua
experiência na cabina do trem.(FREUD, 1919a). O espelho é o fornecedor da imago
fundamental do eu. Lacan define este estadio como um “drama cujo impulso interno
precipita-se da insuficiência para a antecipação – e que fabrica para o sujeito,
apanhado no engodo da identificação espacial, os fantasmas que se sucedem desde
uma imagem despedaçada do corpo até uma forma que chamaremos de
ortopédica”. (LACAN, 1966)

Na ânsia de estruturar sua personagem há algo que resta do sujeito, algo


que retorna engendrado como um estranho, porém é justamente esse “estranho”,
que determina seu ser e fazer.

Vê-se que o duplo, cuja primeira aparição se faz na idéia de alma (FREUD,
1919a) é algo do sujeito que se volta contra ele como horrendo que vem nos
assombrar. Poderíamos dizer que a alma, o duplo tão heimlich (familiar, doméstico,
natal, pátrio), torna-se o fantasma, a assombração, algo umheimlich (inquietante,
sinistro, lúgubre, medonho, numinoso) (IRMEN, 1968).

Cabe ai ressaltar que o processo identificatório passa, primariamente, pelo Eu


ideal (fruto do narcisismo) e, secundariamente, pelo Ideal do Eu (ligado as figuras
parentais, no que aqui nos toca, principalmente ao pai). (ROUDINESCO & PLON,
1998). O duplo não pode estar isento destas duas instâncias. Em se tratando das
personagens de literatura, vemos isto no tão citado Hamlet, no fantasma de seu pai.
Ali estão magistralmente fundidas, a imago paterna e a própria imagem do príncipe
dinamarquês nesta assombração que retorna após a morte (SHAKESPEARE, 1937).
É certo que o fantasma aí não assusta, mas atormenta.

Num artigo que trata da temática das personagens psicopáticas Freud traz
que “...os heróis são rebeldes que se voltaram contra um Deus.” (FREUD, 1942)
Deus que, em Freud desde Totem e Tabu é o Pai que matamos (FREUD, 1913). Um
engendramento de uma personagem, esse Deus, por que não dizer? Confortante
isso? Talvez num primeiro momento, mas não esqueçamos que “Deus e o Demônio
eram originalmente idênticos, uma única Gestalt - uma figura posteriormente
decomposta em duas com características opostas” (FREUD, 1923). O demônio, pai
das figuras de horror, é o anjo caído (que cayó bajo la repression), pois o unheimlich
do duplo é o horror, o estranhamento ao familiar que foi recalcado.(HARARI, 1998)
.Na palavra Unbewußt, Lacan vê o prefixo de negação un_ como a entificação do
reprimido, é o que marca a cisão (LACAN, 1974a).

Sabemos que na neurose, criam-se, engendram-se fantasmas, já o escritor


pela sublimação engendra-os sobre a folha, no caráter e nas atitudes de suas
personagens,. “O artista afastara-se, assim como o neurótico, de uma realidade
insatisfatória para esse mundo da fantasia/fantasma (Phantasie); mas,
diferentemente do neurótico, encontrou o caminho de volta deste para mais uma vez
alcançar um firme apoio na realidade. Suas criações, obras de arte, eram
satisfações de fantasias de desejos inconscientes, da mesma forma que os sonhos,
com os quais tem em comum o caráter de compromisso”. (FREUD, 1924-25)

O escritor encontra, pôr assim dizer um meio de savoir y faire diverso da


análise para lidar com seus fantasmas. “Como o neurótico, angustiado por seu
sintoma recorre ao psicanalista, assim o escritor, querendo livrar-se dessa placa
retida, começa suas campanhas de redações não implelido, mas atraído pôr pelo
desejo.” (WILLEMART, 1993).

Freud se utiliza da figura do Sandmann o Homem da Areia de E. T. A.


Hoffmann, o precursor da literatura fantástica ou de horror, para abordar o tema do
unheimlich. (FREUD, 1919a) Mas autores britânicos da época criaram entes que
fixaram-se no nosso imaginário de tal forma que não podemos negar sua
importância para a compreensão de nosso psiquismo (STEVENSON, STOKER,
SHELLEY, 1978). A primeira personagem de horror em que vemos as marcar dessa
Spaltung é a figura cindida de Dr. Jekyll & Mr. Hyde de R. L. Stevenson. Onde o
respeitável e exemplar médico oculta em si o temível monstro, capaz das maiores
atrocidades. Esse monstro recebe o nome de Hyde, não pôr acaso, homófono a hide
ocultar em inglês, heimlich halten em alemão – (- If he be Mr.Hyde, I shall be Mr.
Seek. - Dr.Jekyll and Mr Hyde, Stevenson}

É o testemunho da cisão que vemos também no misterioso Dracula, the Un-


dead (não-morto) de Bram Stoker. Não só uma personagem, mas um ente folclórico,
este que recalca a morte, é imortal pelo fato de não-viver, mortificando seu desejo. É
o fantasma do obsessivo personificado perguntando “Quem sou? Estou vivo?” E
tendo o desejo condicionado ao contrabando (QUINET, 1991), sorrateiramente
sugando a vitalidade, o sangue, e anulando o desejo do Outro.(QUINET, 1991) Este
nobre conde, atraente, de alta estirpe, encarna na mesma figura o animal
hematófago, asqueroso. É um sedutor-repugnante, um bruto-civilizado, fascinante-
odiável, como a maioria destas figuras da ficção fantástica o são. Paradoxos estes,
que não são incompreensíveis desde a Interpretação dos Sonhos onde Freud diz
que no que se refere à categoria de contrários e contradições, essas tendem a
ignorar o “não” combinando contrários numa unidade (FREUD, 1900). Essa temática
é retomada no artigo sobre a significação antitética das palavras primitivas, o que se
manifesta, as avessas, no unheimlich.(FREUD, 1910).

No Frankenstein de Mary Shelley, no entanto, fez-se uso de duas


personagens, o criador e o monstro, para a polarização. O determinado cientista é o
desaventurado herói, o gênio que cria o monstro bizarro de “corpo esfacelado” (tal
qual nossa identificação imaginaria primitiva) (LACAN, 1966) Por falar em “Monstro”
seria interessante uma incursão pela etimologia da palavra . Do latim temos
(FERREIRA, 1873):

Monstro: mostrar com o dedo, ensinar, declarar, manifestar, acusar, delatar,


malsinar, denunciar

Monstrum: o monstro, prodígio, a coisa extraordinária, ou contra a natureza

Monstruosus: deformado
Pois ao longo do romance, o que testemunhamos é o monstro demonstrando,
acusando, incansavelmente a falta, a imperfeição no cientista, tal qual faz uma
histérica com seu amo sobre o qual passa a reinar (QUINET, 1991). O criador vê-se
assujeitado à criação. O que horroriza é pôr fim o que “nos de-monstra a nós” ainda
que sobre o disfarce da alteridade. L’enfer sont les autres (O inferno são os outros)
disse o romancista do existencialismo, talvez poderíamos inferir que são os non-
autres ou, les nôtres, os nossos, nossos próprios fantasmas.

Notas:

(1) - Refiro-me respectivamente à Interpretação de Sonho obra mestra de Freud e à


Novela do Sonho de Arthur Schnitzler. Esta última, um de seus principais romances,
foi recentemente filmada por Stanley Kubrik sob o título de Eyes Wide Shut (De
Olhos Bem Fechados).

(2) – “Ihr Ergriffensein von den Wahrheiten des Unbewußten, von der Triebnatur des
Menschen, Ihre Zersetzung der kulturell-konventionellen Sicherheiten, das Haften
Ihrer Gedanken an der Polarität von Leben und Sterben...” Carta de Freud a
Schnitzler em 14 de Maio de1922.

(3) - É digno de nota, a partir daqui, o fato da Escola Francesa utilizar as palavras
fantôme/fantasme (fantasma) como traducão da Phantasie (fantasia) de Freud.

(4) “Sendo ele o Sr. Hyde (esconder), serei pois, o Sr. Seek (procurar)”

Referências

- FREUD, Sigmund, Gesammelte Werke – Chronologisch geordnet, Frankfurt am


Main ALEMANHA; Fischer Verlag, 1999:

- Band II / III - Die Traumdeutung (1900)

- Band IX - Totem und Tabu (1913)

- Band XII – Das Unheimliche (1919a)


- Band XIII – Eine Teufelsneurose im siebzehnten Jahrhundert (1922-23)

- Band XIV – Selbstdarstellung (1924-25)

- FREUD, Sigmund, Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas


Completas; Rio de Janeiro, Imago, 1996

- Volume - VII – Personagens Psicopáticos no Palco (1942 {1905-06})

- Volume – XVII - Sobre o Ensino da Psicanálise nas Universidades (1919)

- LACAN, Jacques - Escritos, Rio de Janeiro; Jorge Zahar Ed., 1966 [1998]

- LACAN, Jacques - O Seminário – Livro 2 – O Eu na Teoria de Freud e na


Técnica da Psicanálise, Rio de Janeiro; Jorge Zahar Ed., 1985

- LACAN, Jacques - O Seminário – Livro 21 – Les Non-Dupes Errent, (Inédito)


1974

- LACAN, Jacques - O Seminário – Livro 24 – L’insu que Sait de l’une-Bevue s’aile


à Mourre, (Inédito), 1974a

- GARCIA-ROZA, Luiz, Alfredo – Freud e o Inconsciente, Rio de Janeiro: Jorge


Zahar Ed., 1998, p.22

- KON, Noemi Moritz – Freud e seu Duplo: Reflexões sobre Psicanálise e Arte,
São Paulo: Edusp, 1996

- QUINET, Antonio – As 4+1 Condições da Análise, Rio de Janeiro: Jorge Zahar


Ed., 1991

- ROUDINESCO, Elisabeth & PLON, Michel – Dicionário de Psicanálise, Verbete:


“Ideal do Eu” Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed., !998
- WILLEMART, Universo da Criação Literária, São Paulo, Edusp, !993 em Insight,
São Paulo, Lemos Ed. Ano X -N 110 – Setembro de 2000

- STEVENSON, Robert Louis; STOKER, Bram & SHELLEY, Mary – Three


Classics of Horror – Frankenstein, Dracula & Dr Jekill and Mr Hyde, Londres
INGLATERRRA, Penguin Books, 1978

- SHAKESPEARE, William – Hamlet, Londres, INGLATERRA, Penguin Books,


1937

- HARARI, Roberto – Polifonías del Arte en Psicoanálisis, Barcelona, ESPANHA:


Ediciones del Serbal, 1998

- IRMEN, Friedrich – Langenscheidts Taschenwörterbuch – Portugiesisch


ALEMANHA, Langenscheidt KG, 1988

- FERREIRA, Emmanuelis Josephi – Magnum Lexicon Novissimum Latinum et


Lusitanum, Paris: FRANÇA Emmanuellis Josephi Ferreira, 1873

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