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32 JORNAL DE NOTÍCIAS sexta-feira, 3 de janeiro de 2003

UM LIVRO POR DIA


A DIMENSÃO DO VAZIO: OS JOVENS E O SUICÍDIO / PAOLO CREPET
O livro analisa as dificuldades associadas ao crescimento que, quando leva-
das ao extremo, podem conduzir à tentativa de suicídio. Repleto de exemplos
quotidianos, “A dimensão do vazio” aborda essa problemática nas suas diver-

Cultura
sas vertentes, procurando analisar fios condutores que explicam a ocorrência
daqueles casos em todo o Mundo. O autor, Paolo Crepet, é um psiquiatra e
sociólogo especializado na investigação sobre o suicídio. (AMBAR)

ENTREVISTA LUIZ PACHECO

“Há gajos que só


querem ser ídolos “ CÉSAR SANTOS

CRISTIANO PEREIRA Mudando de assunto: conti-


nua a vender livros por corres-

L
uiz Pacheco é um dos pondência?
mais controversos escrito- Já não tenho capacidade. E ti-
res da história da literatura nha um ficheiro bastante bom.
portuguesa. Autor e editor, Mas isso agora acabou tudo. Ó
mal-dizente e feroz cronista, aque- pá, não há hipótese: um gajo de
le que assinou alguns dos textos repente vê-se perante um gran-
mais malditos em português tem de divórcio entre mim e o novo
hoje 77 anos e vive “rodeado de sistema de fazer livros. Agora é
fantasmas”num pequeno quarto tudo por computador. Comecei
da Liga dos Amigos dos Hospi- a editar em 1950. E 50 anos já
tais, em pleno Jardim do Principe chega. Havia gajos que não me
Real, Lisboa. pagavam os livros. Também
Escassos dias após a reedi- nunca mais receberam. Mas,
ção do texto “Os doutores, a sal- agora, esta edição ficou boa,
vação e o Menino Jesus”, o JN não ficou? Isto é um texto mui-
passou uma tarde à conversa to antigo. Na altura foi apreendi-
com este homem que não tem do. E não foi só este texto. Fo-
medo da morte depois de uma ram coisas do Mário Ruivo e do
vida passada a “dar porrada em Ferro Rodrigues, o pai desse
muita gente”. Em discurso direc- gajo que anda agora por aí. Ó
to, fica a transcrição possível. pá, isto naquela altura era dificil.
Hoje as pessoas têm o que qui-
JORNAL DE NOTÍCIAS – Sen- serem. Antigamente um gajo fa-
te-se feliz neste lar? zia uma laracha qualquer num
LUIZ PACHECO – Isto aqui é ou- jornal e a censura cortava logo.
tro mundo, é só patarecos. Um Mas eu tive dois casos ainda
gajo não cria alegria. Já estou piores. Aquele gajo que morreu
nesta merda dos lares há quase e a quem eu dediquei o livro – o
dez anos. Já nem vou lá fora. Te- Fernando Ribeiro de Mello –
nho aqui a minha companhia: a teve muitos processos e uma
rádio. Há pouco estava ali a ver série de edições apreendidas.
uma merda qualquer na televi- Agora, esta editora (Oficina do
são mas nem sei o que era aqui- Livro) tem livrarias e aquela...
lo. Pelo menos, aqui, há assis- como é que ela se chama? Re-
tência dia e noite. Há uns anos belo Pinto, não é? Faz edições
atrás, fiquei um bocado chatea- enormes de não sei quantos mil
do com estas casas mas agora já exemplares. Isso é uma espécie
consigo ver que não há outra so- de vaga. Eu nunca li nada dela.
lução. Já não há casas para ve- Trouxeram-me aqui um livro
lhos: é tudo T1 ou T2, para casais mas eu dei-o a uma rapariga aí.
e filhos que não querem ter ve- A gaja viu lá umas passagens e
lhos em casa. E há velhos que quis levar aquilo para casa. Acho
não podem ficar sozinhos. Aqui que era o “Sei lá”. Mas ela é
há um sistema de protecção e vi- muito bonitinha...
gilância. Mas isto não dá para re-
lações... naquela sala ali ao lado Tem escrito ultimamente? Al-
(a da tv), só há fantasmas. Há ga- guma vez usou computador?
jos que nem sequer saiem dos Nem vê-los! Já nem à máquina
quartos. Eu também não vou lá. escrevo. Consigo ver as teclas
Para quê? mas não vejo as letras no papel.
Mas não é só isso. Um tipo já
Podia ser que arranjasse uma está fora do seu tempo. Um
namorada... gajo tem uma fase de mocidade
Nem penses! Com a minha e curiosidade – e aí quer conhe-
idade? cer o mundo. Depois tem a fase
de maturidade que é a fase cria-
E qual é o problema? Diga lá: tiva por excelência. Só que mais
há quanto tempo é que não...? tarde vai-se vendo mal, ouvindo
O quê? mal, pá, enfim, o que é que es-
“ANTIGAMENTE, UM GAJO FAZIA UMA laracha qualquer num jornal e a censura cortava logo...” peras quando tiveres a minha
Enfim, há quanto tempo é que idade? No Bairro Alto há a livra-
não está com uma mulher? importante? Não faço ideia. As Ó pá, o que calhou, o que ca- nha a franjinha. Havia um pro- ria “Ler Devagar”. Aqui é mais
Ó pá, sei lá, há uns 30 anos! Já pessoas têm o seu tempo. Não lhou! Tive oito filhos. Ou me- grama dedicado à luxúria. Apa- “Morrer Devagar”. Ao menos,
nem sei como é que se faz! estou muito preocupado com lhor: tiveram elas. Mas os meus receu lá uma rapariga muito de- um gajo aqui está protegido –
isso. Já tive os meus dezoito filhos não costumam aparecer sinibida e vivaça a dizer “Cá co- não lhe cai um carro em cima.
Essas coisas nunca mais se es- anos. Que idade tens? aqui. Não podem. Têm outra migo é assim”. Eu fixei-a. Uns Só que essa protecção é tam-
quecem... vida. Mulheres, filhos, trabalho. tempos depois apareceu lá em bém uma forma de apagamen-
Isso é como a bicicleta, não é? Vinte e oito. Os filhos são como os pássa- Setúbal. Ela era muito trabalha- to. Aqui pode ser sossegado
Mas espera aí... a função se- A tua efervescência é diferente ros: ganham asas e voam sozi- dora. Para fazer essa cronologia mas um gajo vai-se alheando do
xual.... há gajos que a levam lon- da efer vescência de um gajo nhos. Mas essa biografia é um até foi aos arquivos da PIDE. Só Mundo. A minha ligação com
ge. Há um cabrão de um amigo com a minha idade. Tens que bocado aldrabona. Nunca mais que depois começou a querer ele é através da rádio – a TSF e
meu – que tem mais dois anos aproveitar agora! vi a rapariga que a escreveu. Ela mandar em mim, armada em a Antena 2. Mas é um bocado
que eu – que se gaba de foder é um bocado passada da mona. minha mandona e eu mandei-a ilusório. Eu estava a ver que não
todos os dias. Porra! Ele era um A julgar pela sua biografia, o A primeira vez que a vi foi na te- à merda. Não tenho feitio para chegava vivo ao lançamento
grande fodilhão, de facto, lá isso Luiz Pacheco era muito efer- levisão, no programa da Paula aturar mulheres a mandarem- deste livro. Afinal cheguei. E já
era. Mas será que isso agora é vescente... Moura Pinheiro, aquela que ti- me. Essa gaja é demais. não é mau.
JORNAL DE NOTÍCIAS sexta-feira, 3 de janeiro de 2003 CULTURA 33

UM LIVRO ESCRITO HÁ 57 ANOS AGORA REEDITADO “LÍNGUA PORTUGUESA MUDOU COM ASTELENOVELAS”
Não sendo a sua prosa mais brilhante, “Os doutores, a salvação e o “A literatura é uma coisa que envelhece muito depressa. Num qua-
Menino Jesus” é uma “parábola bíblica” publicada em 1946 e logo dro, o amarelo é sempre amarelo. Na música, o dó é sempre dó.
apreendida pela PIDE. Agora reeditada pela Oficina do Livro, trata-se Mas, na literatura, a base são as palavras – e é tudo muito precário.
de um conto que, “escrito vai para 57 anos”, ainda mantém “a sua Por exemplo: um gajo usa o calão, porque é a língua viva. Mas, daí a
aguda oportuna presciência, talvez mais desesperada, talvez mais ir- uns poucos anos, já esse calão morreu. A língua portuguesa, desde
respirável”, segundo palavras do autor. que há telenovelas, mudou muito”. Luiz Pacheco dixit.

“Não se vende prosa a granel”


CÉSAR SANTOS

O texto deste livro já é anti-


go. Partiu de si a ideia de ree-
ditá-lo?
Foi um acaso. Nunca ia reeditar
isto. Foi por causa de uma peça
de teatro - os gajos não me liga-
ram nenhuma, nem me paga-
ram nenhum. Então, de repen-
te, achei que devia publicar
isto. É chato um gajo sentir-se
esquecido ou desprezado, as-
sim de repente. Não é agradá-
vel. Um gajo está aqui metido
neste buraco, isolado. Às ve-
zes, vinham cá amigos e ami-
gas e eu desabafava. Lá me ar-
ranjaram uma editora para este
texto. E ele saiu. Não vem mal
ao Mundo. Vou receber 10 por
cento sobre cada livro vendido.
Já não é mau. Agora há um gajo
que eu não gramo – o Vasco
Graça Moura – quer dizer, não é
não gramar, eu nem tenho ra-
zão de queixa do homem até
porque nunca o vi mais gordo –
mas acho que ele é um gajo
muito reaccionário. Ele vai lan-
çar agora uma coisa chamada
“Os melhores contos e novelas
portuguesas”, com um texto
meu. Vão ser dois volumes en-
cadernados e dentro de um es-
tojo. São 900 páginas. Vão pa-
gar-me 500 euros. Dá cem con-
tos. É dinheiro. E ainda me dão “DEI PORRADA A MUITA GENTE e dei porrada com gosto...”
quatro livros.Na altura do “Diá-
rio Popular”, comecei por ga-
nhar 300 paus, depois 500 e, “E o gajo morreu oito dias depois...” Perfil
mais tarde um conto e duzen-
tos. Não era mau. Conheces o
BB? Apesar de ser o próprio a cha- giro para gajos da tua idade,
mar “Conto de Natal” a “Os muita foda, muita comida, mui-
Quem? doutores, a salvação e o Meni- ta bebida, muita viagem, muita
O Baptista Bastos. É um gajo no Jesus”, o texto agora reedi- leitura, muito prazer”, questio-
muito giro, um belíssimo cama- tado pela Oficina do Livro, Luiz nando-se, de imediato: “Agora,
rada. Mas eu mandei-lhe uma Pacheco é firme na sua convic- para um gajo que está aqui a
porrada e o gajo ficou pior que ção: “Nunca liguei ao Natal”, olhar para ontem?”. NOME LUIZ PACHECO
estragado. Ficam sempre muito sustenta, ao mesmo tempo “Não acho que se deva de- IDADE 77 ANOS
chateados. Nunca se pode dizer que considera a data que assi- sanimar um velho, mas estou a PROFISSÃO ESCRITOR E EDITOR
nada... nala o nascimento de Cristo ser realista”, afirma Luiz Pache- NATURALIDADE LISBOA
como “um dia como outro co, que, do alto da sapiência
Ai é? qualquer”. dos seus 77 anos, confessa
É, é! (gargalhada mefistofélica). Repugnando qualquer cele- passar tardes sozinho junto de De libertário a libertino, de
Não se pode dizer nada. Estes bração especial (“eu detesto um pequeno rádio no mesmo marginal a alcoólico, de crava
gajos são muito susceptíveis. essa merda”), o acutilante es- quarto onde recebeu o JN. É a abjeccionista – não há con-
Eles têm a consciência de que criba sustenta que “é um simu- por aí que sente o Mundo girar: senso na adjectivação que o
fazem muita merda, mas de- lacro de festa”. “Às vezes fico aqui a rir-me, so- designe. Há cinco décadas
pois querem cercar aquilo de E, na sequência desse racio- zinho, a ouvir o trânsito na TSF; que Luiz Pacheco deixa um
arame farpado contra alguma cínio, lembra-se de um episó- era muito velho. O gajo lá fez eles dizem: fila de não sei rasto de controvérsia e aten-
piadita. Um gajo arranjava mui- dio passado no lar de Palmela: anos e toda a gente cantou-lhe o quantos quilómetros muito va- tados aos bons costumes.
tos inimigos, mas também al- “Havia lá um gajo que estava hino dos “muitos anos de vida”. garosa devido a um desastre. E Pelo meio, ficam edições, pri-
guns leitores. Havia sempre sempre muito preocupado com Ora, o gajo morreu oito dias de- eu digo para mim: “Ai é? Então sões, desatinos e alguns dos
uma série de gajos todos a a di- o dia tantos. Eu não percebia pois!”. está bem!”, graceja o escritor textos mais geniais do século
zer muito bem e se aparecia porquê, mas depois lá vi que “É um bocado macabro”, maldito entre gargalhadas como “O teodolito” ou “O Li-
um gajo a desatinar... era o dia de anos dele. Ele nem prossegue, até porque, “isso é diabólicas. bertino passeia por Braga”.

...também levava porrada.


Dei porrada a muita gente e dei To rc a to (S e p ú l veda) fez um jornais. Depois chegam a certa Tu queres é guerra! Mourão Ferreira fez um prefá-
porrada com gosto. Um gajo g ra n d e e l o g i o a o gaj o. E u l i altura em que agarram nesses Po i s q u e ro. Vo c ê t a m b é m cio contra o Sade. Eu fiz um
tem um fundo malévolo, maldi- aquilo, aproveitei e dei porrada textos que têm lá no computa- ch e go u a te r u m a s é ri e d e prefácio que enaltecia o Sade.
zente, e enquanto estiver para no Torcato e no Agualusa. Esse dor em casa e publicam em li- problemas com as autorida- Depois, havia o João Rodrigues
ali a mandar vir, anda todo satis- gajo deve ter-me um pó! vro. É ilusório: uma coisa para des... – que se matou – fazia os dese-
feito. (pausa) De repente, um um jornal geralmente morre ali Tive problemas com a PIDE por nhos, e o Herberto Hélder que
gajo pegava num livro e via que Acha que levavam as suas crí- mesmo, são coisas do momen- causa do “Libertino” e também traduzia. Apanhei uma grande
aquilo era uma merda, mas os ticas demasiado a sério? to. Se um gajo, ao fim de um por causa da antologia erótica porrada: insultei o juiz no prefá-
g aj o s j u l g ava m s e m p re q u e Não é nada disso. Só que eles ano ou dois, faz uma selecção da Natália Correia. Numa vez cio, um gajo que já me tinha jul-
eram génios ou os supra-su- não gramavam. Mas um gajo de crónicas e quer pô-las em li- até éramos oito réus: eu, o Ary gado no tribunal. Foi uma vin-
mos. Então não dava vontade quando está a escrever não vro, tem que ser muito cautelo- dos Santos, a Natália, o Ribeiro gança minha. Mas essas coisas
de dar porrrada? É um acto de pode estar dependente dessas so. Não pode vender aquilo a de Mello, Francisco Esteves, na altura têm a sua graça.
justiça. Há uma série de gajos reacções. Há gajos que querem granel. Nem tudo o que se es- Melo e Castro e outro gajo que
que nunca mais se esquecem ser ídolos e adorados. São figu- creve é para aproveitar. já morreu. Com o Marquês de Qual é, na sua opinião, o seu
d e m i m . C o n h e c e s o Jo s é ras públicas e criticáveis. Agora Sade e a “Filosofia de Alcova”, grande texto?
Eduardo Agualusa? Ele publicou andam por aí gajos que escre- Mas as reacções que os seus apanhei uma grande porrada Não é “A comunidade”. Talvez
um livro – “Nação Crioula” – e o vem crónicas semanais para os escritos desencadearam... por ter ofendido o juíz. O David “O teodolito”.

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