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Solidão arrasta nove idosos para a morte em 12 horas

DN 2010-01-05

http://dn.sapo.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=1461899

Entre as 10.00 e as 22.00 de domingo foram encontrados mortos nove


idosos, sete homens e duas mulheres, que viviam sós

"Janeiro e Fevereiro levam e o velho e o cordeiro", diz o adágio popular a admitir


que aqueles meses são os mais ameaçadores para a vida dos idosos. Mas as nove
mortes, sete homens e duas mulheres, que a PSP registou entre as 10.00 e as
22.00 de domingo apresentam características que violam a ordem natural da
existência humana. Uns morreram abandonados, outros em situação de solidão,
outros provavelmente às mãos de gente criminosa, e outros porque o desespero
ditou o fim da linha.

"Não, não é normal. São muitas mortes em poucas horas", disse ao DN a sub-
comissária Carla Sofia, do gabinete de relações públicas do comando de Lisboa da
PSP. A situação chamou a atenção dos agentes, sendo que nunca antes a carrinha
de transportes de cadáveres da corporação tinha sido tão requisitada para levar
tantos idosos ao Instituto de Medicina Legal de Lisboa.

A situação mais estranha talvez seja a que se registou em Benfica, junto ao Centro
Comercial Colombo, no domingo à noite. Um casal, ele com 76 anos e ela com 75,
apareceram mortos no apartamento. Não se trata de uma situação de indigência. A
qualidade do prédio indicia que se trata de pessoas com algum poder económico.
Só não se sabe porque morreram. A hipótese de ter havido ali uma mão criminosa
não está descartada. Mas, de acordo com fonte policial, só a autópsia poderá
revelar algumas pistas.

Albertina morreu em Alfama. O alerta foi dado às 11.00 de domingo. Não pode ser
considerada uma pessoa idosa. Afinal, tinha apenas 53 anos. Vivia há um ano e
meio num quarto de um apartamento arrendado pela Santa Casa da Misericórdia, e
que serve para acolher quem não tem um lar, ou uma estrutura familiar de apoio.
Mas Albertina era doente, contou-nos Maria do Carmo, residente naquele mesmo
espaço juntamente com mais duas outras mulheres. Já por várias vezes a falecida
estivera internada no hospital Pulido Valente com problemas nos pulmões. E
acabado o internamento regressava sempre àquela casa que não era a sua, e onde
também ninguém existia que fosse seu. "Tinha várias filhas e acho que a mais nova
a visitava", contou-nos Fernanda, proprietária do restaurante situado na rua ao
lado e onde às sextas e sábados canta o fado.

Foi Fernanda quem chamou o INEM. " A D. Carmo chegou aqui, aflita, e disse:
'Acho que a Albertina morreu. Está tão fria'...".
Albertina, ao que parece, era reformada devido à doença. Maria do Carmo não
soube explicar porque foi ela ali parar. Também sobre o seu próprio fado poucas
explicações tem. Existe há 59 anos. Garante que tem família e a passagem por
várias empregos. Um dos últimos foi no Jardim Zoológico, como tratadora de
animais. "Não me renovaram o contrato", justificou assim a sua nova condição de
indigente a viver numa casa arrendada pela Misericórdia de Lisboa. No bairro, as
quatro residentes são conhecidas como "as senhoras da Santa Casa". Por Albertina
não se jorrou nem uma lágrima. "Vivem juntas sem se escolherem e morrem sem
se chorarem". Nem as filhas irão chorar, quem sabe. "Nem a mais nova a visitava.
Ninguém a visitava", garantiu. Aquele quarto vai ser ocupado por alguém que se
encontra em lista de espera.

Meia hora antes do alerta para Albertina, a PSP tinha ido à Praça D. João da
Câmara ver o que se passava com um homem de 49 anos, alcoólico. Estava na rua
e tombou para o lado, morto. "Foi morte súbita", segundo fonte policial.

Por volta das 13.00, a PSP de Massamã foi alertada para a morte de um homem de
61 anos. Vivia sozinho. As causas da morte serão reveladas com a autópsia, mas
até lá fica ficam no ar as questões das solidões urbanas em expansão.

À mesma hora, na Avenida Estados Unidos da América, em Lisboa, morria um outro


homem de 66 anos. Vivia com um amigo. As circunstâncias da morte estão ainda
por apurar, mas trata-se de uma situação em que faltam os apoios e a família.

Durante a tarde de domingo a PSP foi ainda chamada para transportar o cadáver de
um idoso encontrado numa área geográfica da competência da GNR. Não foi
possível ontem apurar em tempo útil pormenores sobre este caso.

O dia acabaria, por volta das 22.00, de forma ainda mais trágica. Um idoso, cuja
idade não foi possível apurar, escolheu o momento para o seu fim. Com uma corda.

Os idosos de Lisboa são sobretudo mulheres, vivem em casas da autarquia, numa


situação de isolamento e com baixos níveis de escolaridade e rendimento, de
acordo com o Plano Gerontológico Municipal, a que o DN teve acesso.

Este Plano, do pelouro da Acção Social, faz um diagnóstico inédito sobre a


população idosa da capital e propõe medidas a concretizar entre 2009 e 2013.

Entre a população inquirida, 60 por cento são mulheres e 40 por cento homens,
sendo o escalão etário mais representado o que compreende as idades entre 65 e
79 anos.

As mulheres estão em esmagadora maioria (69 por cento) entre os idosos com
idades iguais ou superiores a 80 anos, o que é explicado pela sua maior esperança
de vida. A maioria dos idosos vive em casas municipais (44 por cento), seguindo-se
a habitação em casa arrendada (23 por cento), casa própria (21 por cento) e lares
ou residências (11 por cento).
O acesso às habitações apresenta degraus em 73 por cento dos casos, sendo
também expressiva a existência de barreiras arquitectónicas dentro das casas. Por
isso, poucas vezes saem à rua.

700 funerais por ano para indigentes

A empresa funerária Servilusa realiza anualmente, no país, uma média de 700


funerais de pessoas falecidas que ou não têm família ou pertencem a estratos
economicamente carenciados. Esses serviços são praticados gratuitamente.
Nalguns casos, a Misericórdia de Lisboa comparticipa com 160 euros, "o que nem
chega para uma parte de uma urna", disse ao DN Paulo Carreira, da Servilusa,
frisando que se trata de uma iniciativa no âmbito da responsabilidade social da
empresa. Só em Lisboa, em média, realizam-se anualmente cerca de cem funerais
a pessoas que viviam na solidão.

Cem mil apoiados pelo Banco Alimentar

Em Portugal, há um milhão e trezentos e cinquenta mil idosos que vivem com a


pensão mínima, que não chega aos 420 euros. Por isso, muitos precisam de outras
ajudas para sobreviver. O Banco Alimentar contra a Fome apoia, actualmente,
quase cem mil idosos, através de cabazes mensais ou de refeições servidas nas
instituições

"Pessoas válidas não devem ser admitidas em lares"

FRANSCISCO CRESPO

Como explica que haja milhares de idosos à espera de um lugar num lar muitos
deles a viverem e a morrerem sozinhos?

O Estado português não acompanhou durante muitos anos a evolução do


envelhecimento da população do país. Não criou as estruturas de apoio necessárias
para os idosos e hoje são poucas para tanta procura. Hoje, o Estado tem cada vez
menos possibilidade de subsidiar novos equipamentos.

Que medidas deveriam ser tomadas para resolver o problema?

Ainda estava na Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade e já


defendia a necessidade de se criar uma medida para impedir a admissão de
pessoas com 65 anos ou pouco mais e perfeitamente válidas nos lares privados ou
públicos, porque estas retiram vagas a quem precisa, quando o apoio domiciliário
completo poderia ser mais útil para estes idosos.

O investimento que o Governo está a fazer hoje ainda é insuficiente?

Sim. E a política de apoio ao idoso tem de ser revista, desde a de subsídios às


instituições, até ao apoio domiciliário.
Quinze mil à espera de encontrar lugar num lar

RITA CARVALHO

Há milhares de idosos que vivem sozinhos, sem protecção da família nem cuidados
básicos, e nem sequer estão sinalizados pela rede social, não beneficiando de
qualquer apoio. Mas para os que procuram lugar num lar, o Estado também não
tem resposta. "Estima-se que haja 15 mil pessoas em lista de espera", adianta ao
DN Lino Maia, presidente da Confederação Nacional das Instituições de
Solidariedade (IPSS).

Para acolhimentos temporários, as solicitações das famílias são cada vez maiores,
nomeadamente em tempo de férias. Mas para estes casos não há sequer hipótese,
diz Lino Maia, pois a maioria das IPSS não disponibilizam este serviço. A resposta
pode ser apenas encontrada nos privados, e não sai barata, pois a maioria não
precisa só de alojamento, mas de cuidados de saúde específicos.

O abandono nas alturas festivas resulta por isso, muitas vezes, na morte dos mais
frágeis. O delegado regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo, António Tavares,
confirma que há sempre um elevado número de mortes de idosos nesta época. Mas
a causa não está apenas no frio e nos problemas de saúde que se agravam com
ele. Às vezes uma simples queda não socorrida a tempo pode resultar na morte. O
problema é um misto de vários factores: solidão, falta de cuidados básicos de
alimentação e de enfermagem, dificuldades de locomoção ou de visão. E muita
tristeza, acrescenta. Um sentimento que se agrava numa época como o Natal, em
que os mais velhos se sentem ainda mais rejeitados pela família.

"Há situações de desespero. As pessoas desistem, deixam de comer, de se levantar


da cama. Algumas suicidam-se", acrescenta o técnico que, enquanto delegado de
saúde, acompanhou vários casos de enforcamento. "Há muitos casos dramáticos
que não são sinalizados porque as pessoas escondem até ao limite", acrescenta
Eugénio Fonseca, presidente da Cáritas, sublinhando o aumento da pobreza
envergonhada. "Há um enorme espírito de sacrifício de muitos idosos que recusam
queixar-se, mesmo quando são abandonados pelos filhos e netos".

Em Lisboa, por exemplo, as carências da terceira idade não são apenas realidades
em bairros antigos e degradados. Em zonas como Alvalade, há famílias com casas
boas, até com tapetes de Arraiolos na parede, mas cujos donos não têm dinheiro
para comer, denuncia a responsável de uma instituição que presta apoio na capital.
Muitas vezes, amigos e familiares nem sabem das dificuldades.

O presidente da Cáritas critica ainda o que diz ser um modelo de sociedade que só
defende os que são "produtivos e competitivos" para o produto interno bruto do
País e abandona os que "são considerados uma despesa supérflua". Há histórias
dramáticas, conta. De familiares que ficam com o complemento solidário para
idosos dos filhos ou se recusam a deixar que a instituição onde estes estão lhes
preste os cuidados adequados.
Mas este não é só um problema de pobreza nem de falta de recursos financeiros,
diz o presidente da Cáritas. Há pessoas que têm relações cortadas com os
familiares mais próximos ou vivem fechadas em si. Os casos de saúde mental
também são cada vez mais preocupantes, diz Eugénio Fonseca. Para doentes com
alzheimer ou parkinson não há quase resposta na rede pública. O número de idosos
apoiados pelos serviços sociais tem vindo a crescer, seja através da rede de
cuidados continuados, dos lares ou do apoio domiciliário. "Mas ainda não temos
uma política de apoio à família", lamenta, acrescentando que a solução tem de
passar pela recuperação das relações de vizinhança e de proximidade.

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