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Questões sobre a (in)admissibilidade do chamamento ao processo no

direito processual do trabalho

Marcelo Alexandrino da Costa Santos


~ Julho de 2004 ~

Introdução

Este estudo foi idealizado a partir da observação do tratamento usualmente


dedicado ao fenômeno da intervenção de terceiros por estudiosos e utilizadores do direito
processual do trabalho, que revela abordagens nitidamente despreocupadas com as
características ontológicas das modalidades interventivas e, portanto, divorciadas de rigor
científico. Esta constatação é especialmente flagrante em relação ao chamamento ao
processo, cujo cabimento no processo do trabalho tem sido investigado sem, ao menos,
atentar-se para as finalidades daquele instituto.

Em nossa tarefa, investigamos a finalidade do chamamento ao processo e


revisitamos as teorias sobre sua natureza jurídica, submergindo no mar de controvérsias e
dali emergindo com a idéia de que, a par de autorizar a formação de litisconsórcio passivo
ulterior, essa modalidade de intervenção também implica ação declaratória exercida pelo
réu em face daqueles a quem é imputada a qualidade de co-obrigados. Assim, debelam-se, a
um só tempo, crises de certeza e adimplemento, desvelando-se o chamamento em um
instrumento apropriado para o processo de resultados.

Em um segundo momento, demonstramos que, em razão dos diferentes


vínculos processuais configurados a partir da admissão do chamamento ao processo e dos
estreitos limites de competência material da Justiça do Trabalho, o processo trabalhista não
o alberga.

Também demonstramos que o princípio da igualdade material, que


historicamente anima o processo do trabalho, revela a incompatibilidade entre o
chamamento e esse ramo do direito processual.

A posição conciliadora, então, emerge da constatação de que, ao se pregar o


cabimento do chamamento ao processo no direito processual do trabalho, se está, na
verdade, defendendo a mitigação da regra de estabilização subjetiva da demanda por
iniciativa do réu originário, o que se enquadra apenas parcialmente na moldura daquele
incidente típico do processo civil.

Generalidades

Chamamento ao processo é modalidade de intervenção de terceiros


provocada1, inspirada no direito processual lusitano2, por meio da qual faculta-se ao réu –
fiador ou devedor solidário - trazer o “devedor principal”, o co-fiador ou co-devedor
solidário à relação processual, com o objetivo de, desde logo, definir-se a situação interna
do débito e possibilitar àquele que satisfizer a prestação objeto da condenação que prossiga
na execução em face dos demais co-obrigados.

O Código de Processo Civil ostenta três hipóteses taxativas3 de cabimento do


chamamento ao processo: (a) a do devedor, sendo réu o fiador - art. 77, I; (b) a de co-
fiadores, quando citado apenas um deles - art. 77, II; e (c) a de devedores solidários, quando
o credor exigir de um ou de alguns deles, no todo ou em parte, a dívida comum - art. 77, III.

Conforme salienta Cândido Rangel Dinamarco, em todas as hipóteses do art.


77 do CPC, o réu originário teria direito a receber do terceiro o que viesse a pagar ao autor:
“a) integralmente, no caso do fiador que, sucumbindo, venha a satisfazer a obrigação pelo
afiançado; b) deduzida a sua quota, nas hipóteses do fiador que paga por todos os co-
fiadores, ou do devedor solidário que paga a dívida comum”4.

É também Dinamarco quem ressalta que “o chamado ao processo tem,


perante o direito substancial, um nexo obrigacional com o autor”5: é esse o ponto que o
separa da disciplina peculiar à denunciação da lide, uma vez que, nesta, não existe
vinculação jurídico-material direta entre o denunciado e o autor da demanda originária, ao

1
A intervenção é voluntária quando o terceiro ingressa espontaneamente no processo; provocada ou coata,
quando é inserido no processo por ato de quem já é parte.
2
Correspondia-lhe a figura do “chamamento à demanda”, suprimida do CPC português como modalidade
autônoma de intervenção de terceiros no final de 1995 (Decreto-Lei 329-A/95).
3
Cf. DINAMARCO, Cândido Rangel. Coisa julgada e intervenção de terceiros. Disponível em
<http://www.tj.ro.gov.br/emeron/revistas/revista1/04.htm>. Acesso em: 26 jun. 2004, 16:35.
4
DINAMARCO, Cândido Rangel. Intervenção de terceiros. São Paulo: Malheiros, 1997. p. 160.
5
Idem.
passo que, naquele, afirma-se um nexo obrigacional que une o credor ao chamado 6. Vale
dizer: enquanto lá tratava-se de garantia própria (formal) ou imprópria (relativa à
responsabilidade civil), trata-se aqui de garantia simples (ligada à idéia de co-obrigação),
uma vez que o garantidor está diretamente vinculado ao credor da relação dita “principal”7.

Costuma-se atribuir uma série de inconvenientes ou desvantagens à


modalidade de intervenção de terceiros de que estamos a tratar, tais como: a) o fato de ela
mitigar a regra pela qual o credor pode exigir a satisfação da dívida, parcial ou
integralmente, de qualquer um dos devedores solidários (art. 275 do Código Civil); b)
elastecer o procedimento; c) obrigar o credor a ver-se em litígio com devedores em face dos
quais poderia haver motivos relevantes para não demandar, tais como relações de negócios,
amizade, parentesco; d) obrigar o credor a litigar contra devedores sabidamente insolventes
e assim por diante8.

Para Cândido Dinamarco, contudo, tais desvantagens somente poderiam ser


consideradas perniciosas se “se partisse da nefasta premissa inerente ao método do
processo civil do autor, hoje repudiado por todos que buscam um processo de resultados”9.

Finalidade

Tem-se dito que, em razão dos vínculos de direito material, o efeito útil a
justificar o chamamento do terceiro ao processo é, para o réu (chamante), a obtenção de
título para promover, sem a necessidade de se instaurar novo processo de conhecimento, a
6
Na primeira metade do século passado, já observava o professor Alberto dos Reis, ao discorrer sobre a
diferença entre os regimes do chamamento à demanda e do chamamento à autoria - cujos traços hoje
remeteriam à denunciação da lide do processo civil brasileiro - que “a posição do chamado perante a relação
jurídica substancial, objecto da lide movida pelo autor,é completamente diferente. No caso do chamamento à
demanda, o chamado tem a posição de co-obrigado, isto é, de sujeito passivo da obrigação cujo cumprimento
o autor exige; no caso de chamamento á autoria fundado em direito de regressa, o chamado não está vinculado
directamente para com o autor, não tem, perante ele, a posição de co-obrigado, não é sujeito passivo da
relação jurídica controvertida: é sujeito duma relação jurídica conexa com ela”. Daí arrematar o mestre de
Coimbra que “cada um dos incidentes tem, pois, o seu campo de aplicação próprio. Não é lícito ao réu servir-
se arbitrariàmente de um ou de outro”. REIS. Alberto dos. Intervenção de terceiros. Coimbra: Coimbra
Editora, 1948. pp. 78-79.
7
CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. 1 vol. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1998.
p. 196.
8
Neste sentido, CARNEIRO, Athos Gusmão. Intervenção de terceiros. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p.
114.
9
DINAMARCO, Cândido Rangel. ob. cit. p. 163.
execução forçada perante o chamado (terceiro), caso aquele venha a sucumbir perante o
autor e a cumprir a prestação objeto da condenação10.

Tal afirmação deve passar por uma análise crítica. Afinal, o modelo abstrato
do chamamento ao processo prevê a possibilidade de qualquer um dos co-devedores ser
ressarcido pelo pagamento realizado, deduzida, obviamente, a sua cota-parte11. E mais:
nada garante – nem a lei o prevê – que a prestação venha a ser espontaneamente cumprida
pelo chamante. Na verdade, poderá sê-lo por qualquer um dos co-responsáveis e, tratando-
se de obrigação solidária, na hipótese de nenhum dos co-devedores tomar tal iniciativa,
poderá o credor direcionar a execução forçada a qualquer um deles.

É pertinente, aqui, a observação de Flávio Cheim Jorge, para quem “aquele


que pagar a dívida se sub-rogará nos direitos do credor e, usando a mesma sentença, de
acordo com o art. 80, exigirá dos demais a sua cota-parte”. E continua: “[...] se o chamado
pagar a dívida, ficará sub-rogado nos direitos do credor, e os papéis se inverterão, ou seja, é
o chamado que usará a sentença para receber sua cota-parte do chamante”12.

No mesmo sentido, salienta Athos Gusmão Carneiro que, no chamamento ao


processo, “nem sempre o título executivo será formado em favor do chamante e contra o
chamado; poderá sê-lo, até, em favor do chamado e contra o chamante, tudo dependendo de
quem vier, ao final, a satisfazer a dívida”13. E mais: se o devedor principal satisfizer a
prestação, nada terá a exigir do fiador.

Portanto, não se pode reconhecer que o interesse do chamante repouse


primariamente sobre uma condenação para o futuro14, já que o modelo legal não lhe
assegura, senão eventualmente, qualquer posição de vantagem em virtude do provimento
condenatório, assegurando-a, sim, a quem, em concreto, satisfizer o crédito do demandante.

10
Idem, p. 32. Para Luiz Fux, a “sentença do art. 80 [...] é a causa finalis dessa espécie de intervenção”. Cf.
FUX, Luiz. Intervenção de terceiros: aspectos do instituto. São Paulo: Saraiva, 1990. p. 45.
11
Excetua-se obviamente o devedor principal, que, pagando a prestação, nada terá a cobrar do fiador.
12
JORGE, Flávio Cheim. Chamamento ao processo. 2. ed. São Paulo: RT, 1999. p. 37.
13
CARNEIRO, Athos Gusmão. ob. cit. p. 121.
14
Condenação para o futuro é aquela que enseja execução subordinada ao implemento de condição ou à
ocorrência de termo (CPC, art. 572). Sobre o tema, consulte-se MOREIRA, José Carlos Barbosa. Execução
sujeita a condição ou a termo no processo civil brasileiro. In: _____ Temas de direito processual. 7. série. São
Paulo: Saraiva, 2001. pp. 111-118.
Partindo-se da premissa de que o interesse é a principal mola propulsora do
processo15 e considerando-se que, de um lado, ao demandante não é dada a iniciativa do
chamamento e, de outro, a condenação para o futuro não se revela, por si só, interessante
para o réu originário, deve-se prosseguir na busca de um fundamento que legitime a
provocação da intervenção do terceiro.

Como observa Luiz Fux, “na solidariedade passiva há uma relação interna
entre os devedores que lhes impõe um rateio da cota de cada um na dívida comum” 16. Isto
quer dizer que, a despeito de a obrigação solidária afigurar-se una perante o credor
(perspectiva externa), vista do ponto de vista dos devedores fragmenta-se em cotas
autônomas e nem sempre iguais17 (perspectiva interna)18. Assim, se A e B assumem dívida
solidária de 100 unidades perante C, faculta-se a este cobrar de qualquer um daqueles, no
todo ou em parte, o montante global a que obrigados. Porém, nada impede que, entre A e B,
estipule-se que, ao primeiro, cabe uma cota de, por exemplo, 80, e ao último, 20.

Ora, dispõe o art. 78 do CPC que o demandado deve requerer a citação do


chamado para que o juiz declare, na mesma sentença, as responsabilidades dos obrigação.

Em que pese ao prestigiado segmento doutrinário que vê no verbo “declarar”


o oculto significado de “condenar”19, é justamente a possibilidade de se obter sentença
declaratória que defina a situação interna do débito, delimitando a responsabilidade de cada
um dos co-obrigados, que desvela o interesse do chamante. Isto porque, uma vez revestida
a decisão da autoridade da coisa julgada e satisfeita a pretensão do demandante, estará
aberto e bem definido o caminho do ressarcimento, tal como indicado pelos artigos 283 do

15
DINAMARCO, Cândido Range. Fundamentos do processo civil moderno. 3. ed. II vol. São Paulo:
Malheiros, 2000. p. 851.
16
FUX, Luiz. ob. cit. p. 43.
17
A presunção de que trata a parte final do art. 283 do Código Civil é intuitivamente relativa.
18
Na lição de Sílvio Rodrigues, “se encararmos a solidariedade através do lado externo, o conjunto de
devedores se apresenta como se fosse um devedor único, pois dele pode o credor exigir a totalidade do
crédito. Todavia, encarado o problema através de seu ângulo interno, encontram-se vários devedores cujas
relações são relevantes; uns responsáveis para com os outros, por fração menor ou maior do débito, ou mesmo
pela sua totalidade, todos, entretanto, ligados pelo vínculo da solidariedade que os prende ao credor e os
sujeita aos seus caprichos e conveniências. As obrigações de cada devedor são individuais e autônomas, mas
se encontram enfeixadas numa relação unitária, em virtude da solidariedade”. RODRIGUES, Sílvio. Direito
civil: teoria geral das obrigações. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 1993. p. 77.
19
Sobre o tema, consulte-se BUENO, Cássio Scarpinella. Partes e terceiros no processo civil brasileiro. São
Paulo: Saraiva, 2003. p. 282.
Código Civil (art. 913 CC/16) e 80 do Código de Processo Civil: poderá o devedor que
satisfizer a dívida por inteiro, sub-rogando-se na posição do credor, exigir de cada um dos
co-devedores a sua cota, sem necessidade de instaurar-se novo processo. E o efeito útil
hipotético, visto por este ângulo, está em que, satisfazendo ele próprio a dívida, já saberá o
chamante, desde logo, o quantitativo a ser exigido de cada um de seus pares na relação
interna; não a satisfazendo, somente lhe poderá ser exigida de quem cumpriu a prestação a
cota que, consoante o capítulo declaratório da sentença, lhe caiba.

Obter sentença declaratória que defina a situação interna do débito: eis onde
primariamente se ancora o interesse processual do chamante20. À luz exclusivamente do
interesse primário do chamante, soa correta a afirmação de que “a finalidade do
chamamento é a liquidação da responsabilidade recíproca dos devedores”.21

No entanto, considerada a quebra de princípios que é subjacente ao


chamamento ao processo22, esse interesse parcial não basta à sua legitimação, mormente
porque a declaração, por não afetar a esfera de interesses do credor, deveria ser objeto de
ação autônoma.

Ora, é certo que a execução das cotas que cabem aos demais atores da
relação interna é eventual e auferida em concreto, na medida em que sua admissibilidade se
subordina à satisfação da prestação objeto da condenação. É lícito, pois, encontrar-se aí
hipótese de sub-rogação legal do devedor, que pagou a dívida, na posição do credor (art.
567, III, do CPC)23, e, nela, outra faceta da finalidade do chamamento ao processo.

Ocorre que essa sub-rogação, sem a necessidade de instaurar-se novo


processo de conhecimento, pressupõe o trânsito em julgado do capítulo de sentença

20
Daí carecer de interesse aquele que pretende chamar ao processo quem, posto seja devedor solidário, não
tem qualquer responsabilidade na relação interna, tal como apresentada na causa de pedir ou na documentação
que acompanha o requerimento do chamamento.
21
GRECO FILHO, Vicente, MACHADO, Antônio Cláudio da Costa. Da intervenção de terceiros. 2. ed. São
Paulo: Saraiva, 1986. p. 98.
22
Tenha-se em mente que o chamamento ao processo vai de encontro ao princípio de direito processual
segundo o qual cabe ao autor escolher em face de quem a demanda será proposta, assim como ao princípio de
direito material segundo o qual o credor poderá escolher o devedor solidário contra quem dirigirá sua
pretensão.
23
Cf. FERNANDES, Sérgio Ricardo de Arruda. ob. cit. p. 353.
declaratório da situação interna do débito24, evidenciando que a intenção do legislador foi a
de resolver, desde logo, mais de um litígio, utilizando-se da mesma base procedimental 25 e
dos mesmos autos26. E aqui revela-se o interesse supra-individual, da própria jurisdição,
consubstanciado na celeridade processual: considerada a igualdade formal dos atores das
relações cíveis27, impõe-se um pouco mais de espera ao credor para que, aproveitando-se do
mesmo esforço da máquina judiciária, se possam solucionar crises de certeza e de
adimplemento, reconduzindo-os, todos, à paz social.

Note-se ainda que o chamamento ao processo – que, a par de agredir o


direito que tem o credor, de cobrar a totalidade da dívida de qualquer um dos devedores
solidários, e elastecer o tempo do processo e seus deletérios efeitos – amplia o pólo
subjetivo da relação processual instaurada pela ação originária e, conseqüentemente, os
limites subjetivos da coisa julgada, facultando ao autor direcionar a execução, pelo
montante global da dívida, a qualquer um dos devedores cuja responsabilidade for
declarada em resposta à ação do réu originário28. Feriria o princípio do acesso à ordem
jurídica justa privar-se o credor – a quem o regime do chamamento ao processo impõe
óbvias agruras – de, após o trânsito em julgado da decisão favorável, finalmente exercer o
direito material de que é titular, cobrando de qualquer um dos co-réus a satisfação do
crédito agora documentado no título executivo (CC, art. 275). Note-se que tal privação

24
Afinal, o art. 80 do CPC é expresso no tocante à execução da cota que cabe a cada qual dos co-devedores, e
a sub-rogação ocorre em relação a todo o quantitativo do crédito, excetuada a cota que caberia ao próprio sub-
rogado. Assim, o capítulo declaratório da sentença já apresentaria as cotas liquidadas (i.e., certas quanto à
existência e determinadas quanto ao objeto – art. 1533, CC/16), restando, quando muito, a conversão em
valores monetários do crédito do sub-rogado perante cada um dos demais condenados.
25
Marcelo Abelha, para quem o chamamento tem natureza de “ação condenatória”, sustenta que não há
inserção do chamado na relação jurídica processual pré-existente. Destarte, afirma que, “no chamamento ao
processo, há dois processos (relação jurídica processual), uma base procedimental, duas ações e duas
pretensões”. RODRIGUES, Marcelo Abelha. Elementos de direito processual civil. 2. vol. 2. ed. São Paulo:
RT, 2003. pp. 303-306.
26
Isto evidencia, também, que a declaração de que trata o art. 78 do CPC não é meramente incidental; se o
fosse, não se revestiria da coisa julgada (CPC, art. 469), impossibilitando a execução nos moldes do art. 80
27
Sobre a orientação individualista, tecnicista, elitizada e conservadora do direito processual civil pátrio até a
década de 1980, com o predomínio da igualdade formal sobre a material, “mesmo com o notável avanço
científico e apuro técnico do Código de Processo Civil de 1973”, confira-se CARNEIRO, Paulo Cezar
Pinheiro. Acesso à justiça: juizados especiais e ação civil pública. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p.41.
28
Também para Alexandre Câmara, “a sentença condenatória eventualmente proferida atingirá diretamente a
todos eles [chamante e chamados], tendo assim o credor a formação de título executivo em face de todos os
co-devedores”. Cf. ob. cit. p. 198.
implicaria, também, a definitiva separação dos direitos material e processual 29, deixando a
descoberto o autor que deduziu pretensão fundada, a quem, em última análise, a ordem
jurídica promete tutelar.30

Logo, à luz do interesse social, pode-se afirmar que a finalidade do


chamamento é a de debelar, desde logo, qualquer crise de certeza e de adimplemento que
possa se instaurar entre os atores da relação civil, obtendo-se o máximo de resultado com o
mínimo de esforço processual.31

Natureza jurídica:

A doutrina diverge quanto à natureza jurídica do chamamento ao processo,


alguns vendo nele verdadeira “ação condenatória” exercitada pelo demandado originário32,
outros entendendo-o como mera ampliação subjetiva do pólo passivo da relação processual
por iniciativa do réu originário33. 34

Ao se buscar uma solução para o tema, deve-se primeiramente atentar para o


fato de que, ante o princípio da demanda, a prestação da tutela jurisdicional é, via de regra,
condicionada à provocação da parte ou do interessado (CPC, art. 2o). Portanto, é óbvio que
a declaração postulada, por ser estranha aos limites objetivos da demanda proposta por

29
Recorde-se a admoestação de Barbosa Moreira: “o legislador processual está retirando com a mão esquerda
aquilo que o legislador material deu ao credor com a direita, suprimindo, na prática, o benefício que a lei civil
lhe concede”. Estudos sobre o novo código de processo civil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1974. p. 89.
30
Trabalha-se aqui com a idéia de que a pretensão do demandante originário revelou-se fundada. Do
contrário, a sentença declaratória da improcedência do pedido favorecerá chamante e chamado(s), sendo-lhes,
assim, outorgada a tutela jurisdicional. Esse é o espírito do processo civil de resultados. Sobre o tema,
confira-se DINAMARCO, Cândido Rangel. Fundamentos do processo civil moderno, II vol. 3. ed. São Paulo:
Malheiros, 2000. especificamente, pp. 828-831.
31
Eis aí o princípio da economia, subjacente a qualquer modalidade de intervenção de terceiros.
32
NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado e legislação
processual civil extravagante em vigor. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p. 361. RODRIGUES,
Marcelo Abelha. Elementos de direito processual civil. 2 vol. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p.
303.
33
Por todos: CARNEIRO, Athos Gusmão. Intervenção de terceiros. 10 ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 115.
34
Cássio Scarpinella Bueno, apesar de asseverar inicialmente que tal intervenção, “embora não seja exercida
por ação, amplia o objeto litigioso deduzido em juízo”, logo em seguida afirma que aquele que pagar a dívida
por inteiro “pode voltar-se, em verdadeira ação de regresso, contra os coobrigados que não pagarem sua cota-
parte”. Cf. BUENO, Cássio Scarpinella. Partes e terceiros no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva,
2003. pp. 277 e 279.
aquele que se afirma credor, decorre de ato do réu. E esse ato, que tende a desaguar no
provimento jurisdicional declaratório, por certo, expressa o exercício da ação. É, pois,
demanda.35

Observe-se que, quando se fala da “ação declaratória”, não se contempla


relação processual que envolva o autor originário. Está-se, aqui, a vislumbrar relação que
abarca, tão-somente, chamante e chamado(s). Nada se pede em face do autor e este não tem
qualquer interesse no conteúdo ou no resultado da declaração, já que, uma vez acolhida a
pretensão por si deduzida, poderá exigir de qualquer um dos condenados a satisfação
integral da dívida, sendo-lhe indiferente a cota que cabe a cada qual36.

Com efeito, o art. 80 do CPC não exclui a execução forçada das hipóteses de
satisfação da pretensão do credor. Portanto, muito embora o pedido de condenação tenha
sido formulado, primitivamente, apenas em face do chamante, o provimento condenatório
poderá recair sobre o patrimônio deste ou do(s) chamado(s): assim, de um lado, abre-se
margem para a reconciliação, ainda que tardia, dos direitos material e processual; de outro,
amplia-se o potencial de efetividade do processo e, portanto, da própria tutela jurisdicional.

Forçoso, portanto, admitir-se que o chamamento ao processo também enseja


a formação de litisconsórcio passivo ulterior37, inserindo o co-responsável – até então
terceiro – na relação processual nascida da demanda proposta por quem se afirma credor38:

35
Ato por que “alguém pede ao Estado a prestação da atividade jurisdicional” e por meio do qual “começa a
exercer-se o direito de ação”. MOREIRA, José Carlos Barbosa. O novo processo civil brasileiro. 22. ed. Rio
de Janeiro: Forense, 2002. p. 9.
36
Tendo procedido ao chamamento, faculta-se ao fiador invocar o benefício de ordem (CC, art. 827). Cf.
CÂMARA, Alexandre Freitas. ob. cit. p. 218).
37
Para Alexandre Câmara (ob. cit. p. 197), o litisconsórcio é unitário. Estamos, contudo, com Flávio Cheim
Jorge, em que trata-se de litisconsórcio comum (por ele grafado “simples”), já que a situação jurídica dos co-
réus é passível de cisão e, portanto, de disciplina heterogênea (ob. cit. pp. 45-47). A respeito da submissão do
litisconsórcio formado entre supostos devedores solidários ao regime comum, confiram-se as magistrais obras
de José Carlos Barbosa Moreira (Litisconsórcio unitário. Rio de Janeiro: Forense, 1972. p. 225) e Cândido
Rangel Dinamarco (Litisconsórcio. 6 ed. SP: Malheiros, 2001). De mencionar, ainda, a controvérsia quanto à
necessidade ou facultatividade que qualifica o litisconsórcio: para Marcelo Abelha Rodrigues, a admitir-se
que o litisconsórcio enseja a ampliação do pólo passivo por ato do réu, o litisconsórcio, que seria facultativo
se formado em razão da demanda do credor, se converteria em necessário, pois o autor deveria se submeter
obrigatoriamente à vontade do demandado (ob. cit. p. 305); já Cândido Dinamarco assevera que o
litisconsórcio é facultativo, mas, por força do chamamento ao processo, o autor tem de “aceitar sem poder
repelir, embora na demanda tivesse pretendido dispensá-lo” (Litisconsórcio. 6. ed. São Paulo: Malheiros,
2001. p. 331).
38
Desta forma, homenageia-se o princípio da congruência ou da adstrição da sentença à demanda (art. 128 do
CPC).
é este quem pede a condenação; o demandado, suposto responsável, apenas requer que essa
mesma condenação, caso sobrevenha, se estenda ao terceiro.39

Note-se, pois, que, quando se fala de “ação condenatória”, a relação


processual a ser vislumbrada é aquela instaurada com a demanda originária, agora acrescida
do chamado, na qualidade de réu. O chamante não deduz pretensão regressiva antecipada
em face do chamado, pois também este último poderá habilitar-se como sucessor do credor
na execução, bastando que, para tanto, satisfaça a dívida e sub-rogue-se em seu direito.

Assim, o chamamento ao processo, a um só tempo, (1) expressa ação


exercida pelo réu40 em face dos co-devedores ou do devedor principal, visando à declaração
da situação interna do débito (“ação declaratória”), e (2) amplia os limites subjetivos
traçados pela demanda originária. E é justamente a conjugação desses dois fenômenos que
autoriza àquele que satisfizer a dívida sub-rogar-se na posição do credor, para “exigi-la, por
inteiro, do devedor principal, ou de cada um dos co-devedores a sua cota, na proporção
que lhes tocar” (art. 80 do CPC).

Procedimento

Conforme dispõe a parte final do art. 78 do CPC, o chamamento ao processo


deve ser proposto no prazo para a resposta do réu.

No controle de admissibilidade dessa intervenção, deve-se ter em mente que:

1 – por visar à declaração de responsabilidades (art. 78 do CPC) e à sub-


rogação na posição de credor daquele que vier a satisfazer a dívida (art. 80), não é cabível o
chamamento nos processos de execução e cautelar;

2 – considera-se parte legítima para propô-la o demandado originário


(situação legitimamente), que afirma a existência de uma das relações de direito material
contempladas pelo art. 77 do CPC;

39
Sobre a inexistência de pretensão condenatória deduzida pelo chamante em face do chamado, confira-se
CARNEIRO, Athos Gusmão. ob. cit. p. 115.
40
Essa afirmação não deve surpreender o leitor. Basta que ele se recorde da reconvenção, ou das judicia
duplicia, para que hipóteses corriqueiras da dedução de pretensões pelo réu em face do autor originário lhe
venham à mente.
3 – carece de interesse de agir o devedor principal que intenta o chamamento
em face do fiador: além de lógico, é o que se extrai da parte final do art. 80 e dos incisos do
art. 77 do Código de Processo Civil;

4 – também carece de interesse o devedor que propõe o chamamento em face


de quem – observada a relação interna do débito à luz da narrativa e/ou dos documentos
anexados à peça do chamamento – não tem qualquer cota de responsabilidade;

5 – por implicar restrição ao direito de o credor “exigir e receber de um ou


de alguns dos devedores, parcial ou totalmente, a dívida comum” (art. 275 do Código Civil
vigente), é juridicamente impossível o chamamento proposto fora das estritas hipóteses do
art. 77 do CPC.

A admissão do chamamento do terceiro implicará a suspensão do processo, a


fim de que se proceda à sua citação, observando-se, quanto a esta e aos prazos, as
disposições do art. 72 do Código de Processo Civil (CPC, art. 79)41.

Citado, o chamado poderá apresentar resposta, em que lhe é dado negar não
apenas a existência da dívida, mas também a qualidade de devedor principal ou co-devedor,
que lhe é imputada pelo chamante.

O procedimento, segue, então, o padrão ordinário42.

Quanto à sentença, leciona Manoel Antonio Teixeira Filho que, admitido o


chamamento, haverá, necessariamente, dois capítulos43:

no primeiro, conterá – se este for o caso – a condenação dos


devedores coobrigados ao pagamento de determinada
quantia ao autor; no segundo, declarará a responsabilidade
daqueles (CPC, art. 78), valendo como título executivo para
41
O artigo 79 remete, também, ao artigo 74. Tal remissão, porém, é inócua, como atentamente observa
Alexandre Câmara, uma vez que a denunciação da lide pelo autor não guarda nenhuma similitude com o
chamamento ao processo, cuja iniciativa cabe exclusivamente ao réu. Cf. CÂMARA, Alexandre Freitas. ob.
cit. p. 197.
42
Aliás, observe-se que, excetuados a assistência, o recurso de terceiro prejudicado e a intervenção fundada
em contrato de seguro, o procedimento sumário não comporta intervenção de terceiros (art. 280 do CPC).
43
Sobre capítulos de sentença, confira-se DINAMARCO, Cândido Rangel. Capítulos de sentença. São Paulo:
Malheiros, 2002. Também já tivemos a oportunidade de discorrer sobre o assunto em SANTOS, Marcelo
Alexandrino da Costa. “Parte” ou “capítulo” de sentença e anulação parcial do julgado. Revista do Tribunal
Regional do Trabalho da 1a Região, Rio de Janeiro, RJ, n. 36, p. 37-53, jan./abr. 2004.
o que satisfizer a dívida – que poderá ser exigida por inteiro
do devedor principal ou de cada um dos co-devedores, na
proporção que lhes tocar (CPC, art. 80).44

No mesmo sentido, leciona Dinamarco que “a sentença compor-se-á de


capítulos - um para decidir a pretensão do demandante, outro dispondo sobre a deduzida
pelo chamador”.45

Note-se que, sendo um ato facultativo do réu, poderá este, se lhe convier,
não dar causa à intervenção do terceiro, aguardando o resultado do julgamento para, se
sucumbente, deduzir pretensão regressiva em face do devedor principal, do co-fiador ou
dos co-devedor.

Feitas estas considerações, passemos à análise acerca do cabimento do


chamamento ao processo junto ao direito processual do trabalho.

Chamamento ao processo e direito processual do trabalho

Da simples leitura dos incisos I e II do artigo 77 do CPC, ressalta nítida a


incompatibilidade entre as hipóteses ali previstas e o processo trabalhista, uma vez que os
vínculos que unem credor, fiador e devedor “principal” são estranhos às relações
albergadas pelo direito do trabalho.

O inciso III, contudo, pareceu adequado àquele ramo do direito processual a


influentes doutrinadores, tais como Amauri Mascaro Nascimento46, Tostes Malta47 e
Wagner Giglio48.

Eduardo Gabriel Saad advoga o cabimento dessa modalidade de intervenção


de terceiros no direito processual do trabalho quando a demanda for ajuizada em face de

44
TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. Litisconsórcio, assistência e intervenção de terceiros no processo do
trabalho. 3. ed. São Paulo: Ltr, 1995. p. 254.
45
Cf. o texto eletrônico já citado, Coisa julgada e intervenção de terceiros.
46
Apud TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. Ob. cit. p. 264.
47
Idem, ibidem.
48
Idem, ibidem.
um dos integrantes de sociedade de fato49 ou, ainda, de um condômino de condomínio
irregular50.

Amador Paes de Almeida defende a admissibilidade do chamamento ao


processo quando invocada a hipótese prevista no art. 455, da CLT 51, que trata da
responsabilidade do empreiteiro principal pela satisfação dos créditos dos empregados do
subempreiteiro.

Manoel Antonio Teixeira Filho postula o cabimento dessa modalidade de


intervenção de terceiros no processo do trabalho, especialmente, quando configurada a
hipótese prevista no parágrafo 2o, do art. 2o, da CLT, que prevê a solidariedade das
empresas integrantes de grupo econômico52.

Radson Rangel Ferreira Duarte cita como exemplos de cabimento “o caso


[...] do grupo econômico, ou dos sócios quando a sociedade tiver sido extinta
irregularmente, ou o do chamamento que o subempreiteiro faz ao empreiteiro principal”.53

Detenhamo-nos aqui, por hora.

Inicialmente, voltemos nossa atenção para o fato de que a hipótese levantada


por Amador Paes de Almeida (subempreitada) está envolta em desentendimentos
doutrinários concernentes ao direito material, existindo quem veja, aí, caso típico de
solidariedade decorrente de lei, e outros que entendam tratar-se de responsabilidade
meramente subsidiária.54

Também não é pacífica a doutrina quanto ao grupo econômico. Francisco


Ferreira Jorge Neto ressalta que há, pelo menos, três correntes doutrinárias a esse respeito,
49
Atualmente, “sociedade em comum” (CC, art. 986).
50
SAAD, Eduardo Gabriel. Direito processual do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 1998. p. 188.
51
ALMEIDA, Amador Paes de. Curso prático de processo do trabalho. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p.
111.
52
TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. ob. cit. p. 268.
53
DUARTE, Radson Rangel Ferreira. Processo de conhecimento. Goiânia: AB, 2001. p. 80.
54
Sustentando tratar-se de responsabilidade solidária: MARANHÃO, Délio, CARVALHO, Luiz Inácio
Barbosa. Direito do trabalho. 17. ed. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1997. p. 186. Contra,
Mauricio Godinho Delgado, argumentado que “a partir da uniformização jurisprudencial sedimentada pelo
Enunciado 331, IV, do TST, engloba-se também a situação-tipo aventada pelo art. 455 da CLT, no cenário
jurídico da terceirização, passando-se a considerar como subsidiária a responsabilidade do empreiteiro
principal, em caso de subempreitada”. Cf. Curso de direito do trabalho. São Paulo: Ltr, 2002. p. 466.
apontando como respectivos expoentes Orlando Gomes, Amauri Mascaro Nascimento e
Otávio Bueno Magano55.

De acordo com os defensores da primeira corrente, a responsabilidade


patrimonial das empresas que compõem o grupo do empregador seria subsidiária.

Para os da segunda, adotar-se-iam as regras de solidariedade exatamente


como descritas no Código Civil. Portanto, o (ex-)empregado poderia, indistintamente,
ajuizar a demanda em face de qualquer uma das empresas integrantes do grupo, cobrando
daquela que escolhesse a satisfação da totalidade ou de parte da dívida.

Finalmente, pregariam os defensores da terceira corrente que a empresa com


quem o trabalhador celebra o contrato apenas aparenta ser a sua empregadora, qualidade
que, na verdade, seria inerente ao grupo (empregador único).

Observe-se que, a considerar-se subsidiária a responsabilidade, nessas ou


em quaisquer outras hipóteses, perderia completamente o sentido falar-se em chamamento
ao processo, uma vez que a única obrigação acessória contemplada pelo art. 77 do CPC – já
em caráter excepcional – é a fiança.

Não obstante, lancemos um olhar para o art. 114 da Constituição da


República, que fixa a competência material da Justiça do Trabalho56:

Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho conciliar e


julgar os dissídios individuais e coletivos entre
trabalhadores e empregadores, abrangidos os entes
de direito público externo e da administração pública
direta e indireta dos Municípios, do Distrito Federal,
dos Estados e da União, e, na forma da lei, outras
controvérsias decorrentes da relação de trabalho,
bem como os litígios que tenham origem no
cumprimento de suas próprias sentenças, inclusive
coletivas.

[...]
55
JORGE NETO, Francisco Ferreira. Direito do trabalho. Bauru: Edipro, 1998. p. 161/163.
56
Este texto foi escrito em meados de 2004; antes, portanto, da promulgação da EC 45/04.
§ 3o. Compete ainda à Justiça do Trabalho executar,
de ofício, as contribuições sociais previstas no art.
195, I, a, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes
das sentenças que proferir.

Trata-se de norma constitucional que delimita a competência da Justiça do


Trabalho e traça os limites em que é legítima a sua ampliação por regra infraconstitucional,
não deixando, porém, de recepcionar disposições legais excepcionais como as concernentes
aos conflitos oriundos das relações entre “trabalhadores avulsos e seus tomadores de
serviço” (CLT, art. 643) e dos “contratos de empreitada em que o empreiteiro seja operário
ou artífice” (inciso III do artigo 652).

Como facilmente se percebe, a competência típica da Justiça do Trabalho “é


a de compor as lides referentes à relação de emprego (o chamado trabalho subordinado ou
de integração na empresa), não eventual, entre os próprios interessados singulares (dissídios
individuais) ou entre uma categoria profissional e a categoria econômica ou a respectiva
empresa (dissídios coletivos)”57, muito embora admita-se - em caráter de exceção – que seu
raio de abrangência se estenda a outras relações.

Ainda que, com a iminente “Reforma do Judiciário”, a Constituição da


República venha a estender a competência material dos juízos trabalhistas a outras
relações58, o que se observa é que a norma constitucional tende sempre a excluir da
57
CARRION, Valentin. Comentários à consolidação das leis do trabalho. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2003.
p. 476.
58
De fato, tendo sobrevindo, após a primeira publicação deste texto, a promulgação da Emenda
Constitucional n. 45, de 30.12.2004, o texto do art. 114 da Constituição da República passou a ter o seguinte
teor:
Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:
I as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da
administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;
II as ações que envolvam exercício do direito de greve;
III as ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre
sindicatos e empregadores;
IV os mandados de segurança, habeas corpus e habeas data , quando o ato questionado envolver matéria
sujeita à sua jurisdição;
V os conflitos de competência entre órgãos com jurisdição trabalhista, ressalvado o disposto no art. 102,
I, o;
VI as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho;
VII as ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de
fiscalização das relações de trabalho;
VIII a execução, de ofício, das contribuições sociais previstas no art. 195, I, a , e II, e seus acréscimos
legais, decorrentes das sentenças que proferir;
apreciação, especialmente em sede de processo de conhecimento, de causas que envolvam
pretensões paralelas e estranhas às deduzidas pelos atores da relação de trabalho nessa
específica qualidade59, a fim de assegurar a efetividade da tutela jurisdicional àquele que
tem razão – o que, considerado o caráter alimentar das prestações sobre as quais paira a
controvérsia, pressupõe a celeridade própria de um procedimento sumário, onde vigoram a
simplicidade e a oralidade.

Ora, consoante a exposição anterior, o chamamento ao processo implica a


formação de relação processual, retratada nos mesmos autos do processo originário, da
qual o autor primitivo não participa60. Nessa relação paralela, tem-se o chamante por
demandante e o chamado por demandado, o que significa dizer que o chamamento, no
processo do trabalho, implicaria a dedução de uma pretensão cuja gênese não remonta à
relação de emprego ou – por ora ainda excepcionalmente – de trabalho.

Por conseguinte, a intervenção do terceiro esbarraria inevitavelmente na


incompetência da Justiça do Trabalho.

Mas o que dizer da regra do parágrafo único do artigo 942 do Código Civil,
segundo a qual “são solidariamente responsáveis com os autores os co-autores e as pessoas
designadas no art. 932”? Não poderia o empregador, demandado em processo que visa,

IX outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei.


§ 1º - Frustrada a negociação coletiva, as partes poderão eleger árbitros.
§ 2º Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado às mesmas, de
comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o
conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas
anteriormente.
§ 3º Em caso de greve em atividade essencial, com possibilidade de lesão do interesse público, o
Ministério Público do Trabalho poderá ajuizar dissídio coletivo, competindo à Justiça do Trabalho decidir o
conflito.
59
Quer-se dizer com isto que, versando a causa sobre um suposto conflito entre trabalhador e patrão, não há
lugar, no mesmo processo, para a dedução de pretensões titularizadas pelas entidades sindicais, ou por essas e
empregadores ou trabalhadores, bem como aqueles que digam respeito aos órgãos arrecadadores e aos
devedores das contribuições sociais, ou, ainda, ao ente público e àquele a quem imposta determinada multa
administrativa. Observe-se que a atribuição de competência à Justiça do Trabalho para solucionar conflitos de
interesse “que tenham origem no [des]cumprimento de convenções coletivas de trabalho ou acordos
coletivos de trabalho, mesmo quando ocorram entre sindicatos ou entre sindicatos de trabalhadores e
empregador” (Lei 8.984/95), ainda sem respaldo diante da atual redação do art. 114 da CRFB, somente se
legitima perante a ordem constitucional na medida em que não implica o julgamento de pedidos paralelos aos
formulados por determinado ator da relação de emprego.
60
Instaurada pela ação exercida pelo réu em face dos chamados, visando à declaração de que trata o art. 78 do
CPC.
digamos, à reparação por danos morais causados a determinado empregado por ato de um
colega seu (art. 932, III), chamar este último ao processo?

Poder-se-ia argumentar que a responsabilidade patronal objetiva tem feições


cíveis, já que, na verdade, o ato lesivo foi praticado pelo colega; portanto, a Justiça do
Trabalho careceria de competência para julgar a demanda ajuizada, nesses termos, pelo
trabalhador61.

Poder-se-ia, também, argumentar que a responsabilidade do patrão é


objetiva; a do empregado, subjetiva. Logo, estaria franqueada a discussão sobre o elemento
culpa, o que implicaria alteração objetiva da causa originária, quando o chamamento
somente autoriza ampliação subjetiva.62

Ponham-se tais ponderações de lado, contudo, e recorde-se que o


chamamento implica, também, a formação de vínculo processual entre o autor originário e
os chamados.63 Sem sombra de dúvida, a ampliação do pólo passivo traduziria conflito de
interesses entre dois trabalhadores, estando, portanto, excluída do limite de competência
dos juízos trabalhistas.

Em suma: a competência da Justiça do Trabalho, tal como delimitada desde


a Constituição da República, é óbice intransponível à admissibilidade do chamamento ao
processo no direito processual trabalhista.

A proposta de Manoel Antonio Teixeira Filho

Por fim, voltemos os olhos para a proposta de Manoel Antonio Teixeira


Filho, um dos juristas que mais têm contribuído para o enriquecimento da doutrina

61
Repare-se que a fundamentação, nesse caso, se prenderia ao próprio ato do segundo empregado, não na
imputação de responsabilidade ao empregador por descumprimento do dever de vigilância e segurança, ínsito
ao seu poder diretivo. Porém, no fim das contas, é esse o dever que, consoante a lição de Sérgio Cavalieri
Filho, fundamenta a responsabilidade objetiva do empregador (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de
responsabilidade civil. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 196).
62
A respeito da inadmissibilidade de alteração objetiva no chamamento ao processo, confira-se
FERNANDES, Sérgio Ricardo de Arruda. Questões importantes de processo civil. Rio de Janeiro: DP&A,
1999. p. 363.
63
O artigo 80 do CPC, dispõe claramente que a sentença que julga procedente o pedido formulado pelo credor
importa na condenação dos devedores, isto é, de chamante e chamado.
processual trabalhista, o qual sugere que mutile-se o chamamento ao transportá-lo para o
processo do trabalho64.

Segundo o mestre paranaense, para quem o chamamento ao processo tem


“caráter de ação incidental”65, poder-se-ia remover o obstáculo representado pela
incompetência da Justiça do Trabalho para apreciar as relações jurídicas materiais
existentes entre os co-réus “mediante o argumento de que a investigação desses vínculos
será feita de forma meramente incidental, não constituindo, assim, um fim em si mesma, e
sim um meio para que se possa definir a responsabilidade dos chamados, ante as pretensões
deduzidas pelo autor”. Admite, contudo, que “o devedor que satisfizer, plenamente, a
dívida, não poderá fazer uso da sentença como título executivo, para exigir, dos demais, o
reembolso, conforme a quota-parte de cada”66.

Quanto ao co-obrigado que satisfizer a dívida, sustenta que “o pressuposto


legal é de que a execução seja promovida perante o mesmo juízo que emitiu a sentença
condenatória passada em julgado; e à Justiça do Trabalho falta competência para isso”67,
razão pela qual a execução deveria ser processada perante a Justiça comum.

Relembre-se, no entanto, que, para atingir plenamente a sua finalidade, o


chamamento ao processo deve, em tese, (1) ensejar a definição da situação interna do
débito (art. 78 do CPC) e (2) possibilitar àquele que satisfizer a dívida “exigi-la, por inteiro,
do devedor principal, ou de cada um dos co-devedores a sua cota, na proporção que lhes
tocar” (art. 80 do CPC).

Por conseguinte, tomada a declaração como meramente incidental e/ou


desprezada a possibilidade de a execução ser promovida perante o mesmo juízo, pelo
devedor que satisfizer a dívida, sem a propositura de nova demanda, o chamamento ao
processo não seria apenas mutilado, mas sim desfigurado por completo diante do modelo
legal e ferido de morte pela flecha da inutilidade.

64
TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. Litisconsórcio, assistência e intervenção de terceiros no processo do
trabalho. 3. ed. São Paulo: Ltr, 1995. pp. 268 e 287.
65
Ob. cit. p. 254.
66
Idem, p. 287.
67
Ibidem, p. 268.
Aliás, o próprio jurista se mostra vacilante em suas convicções ao lançar as
seguintes objeções:

Em princípio, contudo, esse chamamento não deveria ser


admitido no processo do trabalho, pois, dentre outras coisas:
a) sendo ato exclusivo do réu, faz com que o autor se veja
obrigado a litigar diante de pessoas que não pretendeu (por
motivos, às vezes, ponderandos) introduzir no pólo passivo
da relação processual, ao ingressar em juízo; b) a formação
desse litisconsórcio poderá colocar o autor em desvantagem
processual, dado o grande número de pessoas que poderão
ser chamadas e que passarão a ser suas adversárias; c) essa
ampliação subjetiva passiva implica, ainda, aumentar as
conseqüências do eventual insucesso do autor na demanda
(condenação em honorários de advogado e de peritos etc); d)
a Justiça do Trabalho não possui competência para apreciar
a natureza dos vínculos de direito material existentes entre os
réus consorciados na lide.68

Repita-se: a mutilação proposta por Manoel Antonio Teixeira Filho é tão


inaceitável no chamamento ao processo quanto o é nos demais casos de intervenção de
terceiros69, pois o desfiguraria diante da hipótese legal e o atingiria no cor de sua
finalidade.70

Na verdade, a sugestão de Teixeira Filho reduz a utilidade do chamamento a


zero, uma vez que, se acolhida, redundaria na necessidade de o devedor que pagou a dívida
propor nova demanda, agora perante juízo comum, deduzindo sua pretensão regressiva em
face do(s) co-obrigado(s), o que exigiria nova apreciação da situação interna do débito71 e

68
TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. ob.cit. p. 286/287.
69
No mesmo sentido, MARTINS, Sérgio Pinto. Direito processual do trabalho. 5. ed. São Paulo: Atlas, 1997.
p. 190.
70
Consoante a lição de Athos Gusmão Carneiro, faltará interesse jurídico ao chamante quando não puder
reaver a quantia eventualmente paga ao credor mediante a “execução do chamado” nos mesmos autos.
CARNEIRO, Athos Gusmão. ob. cit. p. 115.
71
Fosse a declaração anterior meramente incidental, não gozaria da autoridade da coisa julgada.
nova condenação72, iniciativa que – como já destacado – pode ser tomada a despeito da
provocação da intervenção do terceiro.

Posto isto, e considerando-se que o credor, em e a princípio, não tem


interesse em litigar contra outro(s) co-obrigado(s), o que, então, legitimaria o chamamento
ao processo? Nada, certamente73, pois o incidente somente representaria vantagem ilícita
para o réu74, traduzida na delonga de um processo que visa, via de regra, a debelar uma ou
mais crises de adimplemento de prestações de natureza alimentar.

Cabem aqui, portanto, as mesmas palavras que o respeitado doutrinador


lançou ao dispor sobre a oposição: “O que não nos parece tolerável é transfigurar-se um
instituto específico do processo civil deturpando-lhe [...] o próprio sentido teleológico, para
colocá-lo, arrevesadamente, a serviço do processo do trabalho”.75

Chamamento ao processo?

Na verdade, o que se tem visto no cotidiano são preliminares suscitadas


pelos demandados, por meio das quais, a título de chamamento ao processo (ou
denunciação da lide), pretende-se apenas que se autorize a formação de litisconsórcio
passivo facultativo ulterior76, em princípio incabível após a estabilização da demanda (CPC,
art. 264)77.

72
Afinal, o título executivo anterior documentaria apenas o crédito do autor perante os co-réus.
73
Daí já ter decidido o TST que “o indeferimento de chamamento à lide não se constituiu em cerceamento de
defesa nem, tampouco, redundou em prejuízos materiais ao réu, à luz do artigo novecentos e treze do Código
Civil [de 1916]” (2a T., RR 16453/90, j. 16.12.91, rel. Vantuil Abdala).
74
DINAMARCO, Cândido Rangel. Litisconsórcio. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 333.
75
TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. Litisconsórcio, assistência e intervenção de terceiros no processo do
trabalho. p. 289.
76
Quanto ao litisconsórcio necessário, em que a ausência de citação do litisconsorte implica a ineficácia da
sentença (parte final do art. 47 do CPC), o Tribunal Superior do Trabalho, após proclamar que “o Direito
Romano permaneceu fiel, do primeiro ao último dia, ao princípio que faz do autor o dono absoluto da ação”,
se manifestou no sentido de que “na Justiça do Trabalho inexiste a figura do litisconsórcio necessário, exceto
na execução em que penhorado bem imóvel do casal (Christóvão Piragibe Tostes Malta, citado por Coqueijo
Costa, em Direito Judiciário do Trabalho)”. (Tribunal Pleno, ERR 3788/80, j. 09.08.84, rel. Marco Aurélio).
A conclusão da mais alta corte trabalhista não é absolutamente exata: basta que se pense que a perseguição de
“valores devidos pelos empregadores aos empregados [...] não recebidos em vida pelos respectivos titulares”
pode envolver litisconsórcio ativo necessário, desde que haja mais de um dependente habilitado “perante a
Previdência Social ou na forma da legislação específica” (art. 1o da Lei 6.858/80).
Em tais casos, quer-se geralmente trazer ao processo quem figurava na
relação de direito material como interposta pessoa, ou um terceiro a quem se atribui a
qualidade de verdadeiro empregador, ou, ainda, a quem se imputa a conduta lesiva da qual
teriam decorrido os prejuízos alegados pelo trabalhador: não se invoca solidariedade
passiva nem se pede a delimitação de responsabilidades, tampouco se cogita da
possibilidade de aquele que vier a satisfizer a dívida, sub-rogando-se nos direitos do credor,
direcionar a execução aos co-responsáveis.

Como facilmente se percebe, não se está diante de verdadeiro chamamento


ao processo, e o magistrado diligente não deve tratar tal requerimento como tal. Deve, sim,
corrigir desde logo a equivocada utilização do nomen juris, a fim de que, no futuro,
nenhuma dúvida paire sobre o que verdadeiramente se pretendeu e o que realmente foi
deferido ou indeferido.

E justamente porque de verdadeiro chamamento ao processo não se trata,


não tem o réu o poder de sujeitar o demandante à presença de novos sujeitos no pólo
passivo da relação processual78. É, pois, inválido o deferimento da providência requerida
pelo demandado sem a prévia anuência do autor79.

Com a anuência do demandante, a formação intempestiva do litisconsórcio


ulterior não importará em nulidade, porque as manifestações de vontade de ambas as partes
terão concorrido para o seu deferimento (CLT, art. 796, “b”), não lhes sendo dado,
portanto, alegar futuramente prejuízo de ordem processual (art. 794 da CLT).

De toda sorte, a concordância do autor não vincula o juiz ao deferimento da


ampliação subjetiva, na medida em que, nas hipóteses de litisconsórcio facultativo, o
requerimento do réu não encontra respaldo legal.

77
Para Dinamarco, que vê a formação de litisconsórcio passivo facultativo nas hipóteses do art. 77 do CPC,
“só pela via e formas do chamamento ao processo é que se admite do réu a ampliação subjetiva do processo”.
Litisconsórcio. p. 332.
78
Tampouco o tem o juiz, adstrito que é ao princípio da demanda (CPC, art. 2o).
79
O Supremo Tribunal Federal já se manifestou nesse sentido, acertando que “não é possível forçar o autor a
estender a ação a terceiros que não são obrigatoriamente partes na demanda, assim como coagir estes terceiros
à demanda, uma vez que não sejam litisconsortes necessários” (2 a. T., RE 44.657, j. 5.11.68, rel. Themístocles
Cavalcanti. v.u., RTJ 49/96) e “o juiz não pode impor a formação de litisconsórcio facultativo” (2 a. T., RE
80.582, j. 17.6.75, rel. Thompson Flores, v.u., RP 4/398, n. 143). Os exemplos estão em Litisconsórcio, ob.
cit., p. 329.
Caberá ao juiz, portanto, ponderar o interesse manifestado pelo demandado
em cotejo com os demais interesses e direitos em jogo, considerando a adequação da
anuência do autor diante do novo quadro que se instaurará, com todos os complicadores
que a ampliação subjetiva do pólo passivo poderá ensejar. A decisão, seja qual for, deverá
resguardar a paridade de armas e a efetividade do processo, e legitimar-se-á apenas se
evidenciar-se apta a proporcionar um resultado concreto e, sobretudo, justo.

Conclusão:

As linhas acima revelam os traços característicos do chamamento ao


processo e expõem a sua incompatibilidade com o processo trabalhista, à luz unicamente
dos limites da competência material da Justiça do Trabalho.

Revelam, também, que, fora do terreno do verdadeiro chamamento ao


processo, há ainda um curto espaço para a relativização da regra de estabilização da
demanda, sempre condicionada à manifestação concorrente da vontade das partes e a um
estrito controle judicial, que não pode desprezar o escopo e o caráter instrumental do
processo.

Além de tudo o que foi dito, insta, por fim, relembrar que a análise do
cabimento de qualquer figura peculiar ao direito comum – material e processual – junto aos
seus correlatos trabalhistas deve levar em conta, sempre, os fundamentos, princípios,
técnicas e métodos peculiares a estes últimos80.

Cabe aqui a lição de Paes de Almeida, apoiado em Antônio Lamarca, para


quem “ao transplantar as normas processuais civis para o direito processual do trabalho,
o intérprete deve guardar um princípio básico: a hipossuficiência do trabalhador”81.

Ora, induz-se das normas materiais de tutela das relações de trabalho o


princípio da proteção do hipossuficiente, o qual visa a corrigir as naturais e evidentes
desigualdades entre capital e labor. Por imposição do princípio constitucional da isonomia,
essa tendência corretiva também permeia o processo do trabalho, que foi idealizado para
80
Neste sentido, MALTA, Christóvão Piragibe Tostes, MACHADO, Francisco de Mello. Você conhece
processo trabalhista? Rio de Janeiro: Rio, 1978. p. 59.
81
DE ALMEIDA, Amador Paes. ob. cit. p. 79.
debelar com celeridade crises que, via de regra, dizem respeito ao (in)adimplemento de
prestações de cunho alimentar82. A tempestividade é, pois, essencial para que o processo do
trabalho se apresente como um processo de resultados83.

De fato, o processo trabalhista sempre teve por norte o princípio da


igualdade material, que implica o reconhecimento e a compensação das naturais
desigualdades existentes entre as partes84, pois “não existe desigualdade maior que aquela
de tratar a desigualdade de modo igual”85.

Além de colidir com as regras de fixação de competência material, o


chamamento ao processo, tal como as demais modalidades de intervenção de terceiros
assim nominadas pelo CPC, ofende o princípio isonômico, que faz parte da essência do
direito, quer processual, quer material, do trabalho. Mas essa é uma outra história.

82
Como bem frisou Jorge Luiz Souto Maior, “há de se reconhecer que a intervenção de terceiros no processo
do trabalho serve apenas para inserir complicadores no litígio, que impedem a efetivação do procedimento
oral e seus objetivos, sem trazer qualquer vantagem processual para partes, intervenientes e Justiça”. Cf.
Direito processual do trabalho: efetividade, acesso à justiça, procedimento oral. São Paulo: Ltr, 1998. p. 298.
83
A legislação posterior à CLT tende a vedar expressamente a intervenção de terceiros em procedimentos que
privilegiam a tempestividade como fator de efetividade do processo. Assim, o art. 280 do Código de Processo
Civil quanto ao procedimento sumário e o art. 10 da Lei 9.099/95, quanto aos Juizados Especiais. A Lei
8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor) veda a denunciação da lide, facultando a dedução de pretensão
regressiva em processo autônomo, ainda que aproveitando-se dos mesmos autos (art. 88). Observe-se, no
entanto, que o inciso II do art. 101 do CDC assegura o chamamento ao processo do segurador pelo réu que
houver contratado seguro de responsabilidade, dispondo que “a sentença que julgar procedente o pedido
condenará o réu nos termos do art. 80 do Código de Processo Civil”: a finalidade, aqui, é a de garantir a
solvabilidade do crédito pela imposição de condenação em obrigação de indenizar solidária ao devedor e ao
segurador; portanto, ao contrário do que ocorre no chamamento do CPC, o do CDC visa evidentemente à
proteção do consumidor, em homenagem ao princípio da igualdade material. Às diferenças teleológica e
axiológica, acresça-se o fato de que não há vínculo de direito material entre o segurador do fornecedor de
produtos ou serviços e o consumidor, para que definitivamente se constate que o chamamento ao processo do
Código de Defesa do Consumidor não é o mesmo chamamento ao processo do Código de Processo Civil, que,
como visto acima, pressupõe garantia simples, com vinculação direta entre o credor e o garantidor.
84
Essa característica do processo trabalhista é exaltada pelo professor Paulo Cezar Pinheiro Carneiro como
uma quebra de paradigma no direito processual nacional. Acesso à justiça: juizados especiais e ação civil
pública. pp. 40-41.
85
MENGER, Anton, apud CAPPELLETTI, Mauro. Giustiza e Societá. Milano:Edizioni di Comunita, 1977.
p. 330.
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