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ARTIGO ARTICLE
Por que o uso racional de medicamentos deve ser uma prioridade?

Why rational drug use must be a priority?

Daniela Silva de Aquino 1

Abstract According to the World Health Organi- Resumo A Organização Mundial de Saúde diz
zation, rational drug use means that patients re- que há uso racional de medicamentos quando pa-
ceive medicines appropriate to their clinical needs, cientes recebem medicamentos apropriados para
in doses that meet their individual requirements, suas condições clínicas, em doses adequadas às
for an adequate period of time, and at the lowest suas necessidades individuais, por um período ade-
cost to them and their community. However, as quado e ao menor custo para si e para a comuni-
far as one can see, the reality is very different. In dade. Porém, o que se observa, mostra uma reali-
Brazil, at least, 35% of medicines are purchased dade bastante diferente. Pelo menos 35% dos me-
for self-medication. Medicaments are responsible dicamentos adquiridos no Brasil são feitos atra-
for 27% of intoxications in Brazil and for 16% of vés de automedicação. Os medicamentos respon-
deaths due to poisoning are caused by medica- dem por 27% das intoxicações no Brasil e 16%
ments. Moreover, 50% of medicaments are pre- dos casos de morte por intoxicações são causados
scribed, dispensed or used inappropriately and por medicamentos. Além disso, 50% de todos os
hospitals spend about 15 to 20% of their budgets medicamentos são prescritos, dispensados ou usa-
to deal with the troubles caused by misuse of me- dos inadequadamente, e os hospitais gastam de 15
dicaments. The promise of immediate relief of a 20% de seus orçamentos para lidar com as com-
suffering is a very attractive appeal, but it has its plicações causadas pelo mau uso dos mesmos. A
price. Sometimes the price we pay is our health. proposta de alívio imediato do sofrimento, como
Rational drug use requires a very complex logical em um passe de mágica, é um apelo atraente, mas
chain involving a number of variables and par- tem seu preço. Este preço nem sempre se restringe
ticipation of different social actors including pa- ao desembolso financeiro e pode ser descontado
tients, health professionals, legislators, policy mak- na própria saúde. Os requisitos para o uso racio-
ers, industry, commerce and the government. nal de medicamentos são muito complexos e en-
Key words Drugs, Rational use, Poisoning volvem uma série de variáveis, em um encadea-
mento lógico. Para que sejam cumpridos, devem
1
Departamento de Farmácia,
contar com a participação de diversos atores so-
Faculdades Integradas da ciais: pacientes, profissionais de saúde, legislado-
Vitória de Santo Antão. res, formuladores de políticas públicas, indústria,
Rua Real da Torre 255A/
202, Madalena. 50610-000
comércio, governo.
Recife PE. Palavras-chave Medicamentos, Uso racional,
aquino.daniela@hotmail.com Intoxicação
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Aquino, D. S.

Introdução Soma-se a todos esses fatores, a propaganda


de medicamentos, que tem sido um estímulo fre-
A Organização Mundial de Saúde (OMS) propõe qüente para o uso inadequado dos mesmos, so-
que, para o uso racional de medicamentos, é pre- bretudo, porque tende a ressaltar os benefícios e
ciso, em primeiro lugar, estabelecer a necessidade omitir ou minimizar os riscos e os possíveis efei-
do uso do medicamento; a seguir, que se receite o tos adversos, dando a impressão, especialmente
medicamento apropriado, a melhor escolha, de ao público leigo, que são produtos inócuos, in-
acordo com os ditames de eficácia e segurança fluenciando-os a consumir como qualquer ou-
comprovados e aceitáveis. Além disso, é necessá- tra mercadoria.
rio que o medicamento seja prescrito adequada- Para agravar ainda mais esta situação, cons-
mente, na forma farmacêutica, doses e período tatamos a utilização crescente da Internet para
de duração do tratamento; que esteja disponível disseminar propaganda para os consumidores,
de modo oportuno, a um preço acessível, e que muitas delas assumindo uma forma menos ex-
responda sempre aos critérios de qualidade exigi- plícita já que tentam dar a impressão de que são
dos; que se dispense em condições adequadas, com instrumentos educativos ou de informação, ob-
a necessária orientação e responsabilidade, e, fi- jetivando promover a saúde6.
nalmente, que se cumpra o regime terapêutico já Segundo o Conselho Federal de Farmácia
prescrito, da melhor maneira possível1. Conceito (CFF), um relatório concluído recentemente pela
semelhante também é proposto pela Política Na- Organização das Nações Unidas (ONU) alerta as
cional de Medicamentos2. autoridades sanitárias do mundo inteiro para o
Todavia, o que tem sido observado no Brasil rápido tráfico de drogas lícitas (medicamentos
se contrapõe à proposta da OMS. Segundo Bar- controlados) pelas farmácias virtuais, que têm
ros3, pelo menos 35% dos medicamentos adqui- como principal forma de atuação os e-mails. O
ridos no Brasil são feitos através de automedica- CFF se pronunciou chamando a atenção de que a
ção. Entretanto, se o brasileiro tende a se auto- venda de medicamentos é muito mais grave do
medicar, é também porque não encontra dispo- que se imagina, pois além do tráfico, acumula
nibilidade dos serviços de saúde mais acessíveis, outros graves problemas à saúde da população.
precisa ficar horas em uma fila e, às vezes, espe- Os usuários de múltiplas drogas, os ex-pacientes
rar dias e até meses para ser atendido por um que se tornam dependentes e permanecem fazen-
médico. O baixo poder aquisitivo da população do uso de medicamentos, mesmo depois de terem
e a precariedade dos serviços de saúde contras- concluído o tratamento, e as pessoas que prefe-
tam com a facilidade de se obter medicamentos, rem a comodidade de receber produtos em casa e
sem pagamento de consulta e sem receita médica a preços baixos são os alvos do “cibertráfico”7.
em qualquer farmácia, onde, não raro, se encon- Ainda é importante lembrar que esse tipo de
tra o estímulo do balconista interessado em ga- comércio remoto, por fugir à fiscalização e a ou-
nhar uma comissão pela venda4. Embora o alto tros tipos de controle, pode ainda fazer com que
consumo e o consumo de medicamentos de for- produtos falsificados ou com prazo de validade
ma inadequada tenham sido observados tam- vencido vão parar nas mãos de usuários pouco
bém entre as camadas mais privilegiadas da soci- cautelosos.
edade, uma vez que essa prática se dá pela heran-
ça cultural, de forma instintiva sem qualquer base
racional, pela facilidade de acesso, dentre outros. O papel simbólico dos medicamentos
Além disso, os médicos, muitas vezes, não e a sociedade de consumo
têm acesso a informações completas a respeito
da segurança dos fármacos. Parte deles sequer Para um melhor entendimento sobre a proble-
conhece o conjunto dos possíveis efeitos nocivos mática do uso irracional de medicamentos, faz-
do que prescreve, ou não sabe identificar nem se necessário compreender as relações de consu-
prevenir corretamente combinações perigosas mo da sociedade e a interação das mesmas com
entre as substâncias farmacológicas. Por outro o medicamento.
lado, alguns pacientes ignoram os perigos de se “O consumo é algo inerente ao homem”, ha-
misturar medicamentos e não declaram se já es- vendo uma relação entre as transformações da
tão usando outros. Há também aqueles acom- sociedade e o fenômeno do consumo. Sendo as-
panhados por vários médicos, sem que haja in- sim, o medicamento não está desvinculado dessa
tercomunicações entre eles5. característica social. Diferentemente de outras
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Ciência & Saúde Coletiva, 13(Sup):733-736, 2008


épocas históricas, o capitalismo pós-moderno to que cura, pode matar ou deixar danos irrever-
incentiva o consumo através da publicidade e da síveis. Que reflita um pouco mais, antes de sair
idéia de substituição do “prazer vicário do ter consumindo medicamentos desenfreadamente,
sobre o ser”8. O uso de drogas pela humanidade, e perceba que a vida saudável não está no balcão
para os mais diversos fins, é antiqüíssimo e per- de uma farmácia, e sim, mudando os hábitos,
manece como um ato, ainda hoje, cheio de con- fazendo exercícios físicos, equilibrando a alimen-
teúdos simbólicos nas mais diversas culturas9. tação, procurando se estressar menos.
Cordeiro10 afirma que os medicamentos ocu-
pam o lugar de símbolos e representações que obs-
curecem os determinantes sociais das doenças, ilu- O que dizem as estatísticas
dem os indivíduos com a aparência de eficácia
científica e, como mercadoria, realizam o valor e Os dados acerca do uso irracional de medica-
garantem a acumulação de um dos segmentos mais mentos no Brasil são alarmantes. Aproximada-
lucrativos do capital industrial. Para Lefèvre11, esta mente um terço das internações ocorridas no país
afirmação é apenas parcial, pois os medicamen- tem como origem o uso incorreto de medica-
tos conseguem iludir e funcionam como paliati- mentos. Estatísticas do Sistema Nacional de In-
vos dos sofrimentos de milhares de indivíduos, formações Tóxico-Farmacológicas (Sinitox)14 da
não como aparência, mas com a realidade da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) revelam que
sua eficácia científica. os medicamentos respondem por 27% das into-
A hipervalorização no alcance da tecnologia xicações no Brasil, e 16% dos casos de morte por
médica passa a considerar como doença proble- intoxicações são causados por medicamentos.
mas os mais diversos (situações fisiológicas ou Contudo, o uso irracional de medicamentos
problemas cuja determinação são, em última não é uma prática exclusiva do Brasil, sendo,
análise, fundamentalmente, de natureza econô- portanto, prática mundial. Abaixo, seguem in-
mico-social), como tal demandando, para sua formações da OMS15, 16 sobre este hábito que
solução, procedimentos médicos6. ocorre em muitos países:
A crença excessiva e, até certo ponto, ingênua . 25 a 70% do gasto em saúde, nos países em
no poder dos medicamentos, ao lado da cres- desenvolvimento, correspondem a medicamen-
cente oferta e indicação desses produtos, com tos, em comparação a menos de 15% nos países
vigoroso suporte da mídia, tendem a aproximá- desenvolvidos.
los da condição de fetiche inanimado da atuali- . 50 a 70% das consultas médicas geram pres-
dade, encarnando o poder sacralizado da ciência crição medicamentosa.
e da tecnologia sobre a vida dos mortais. Consi- . 50% de todos os medicamentos são prescri-
dera-se o medicamento uma resposta imediata e tos, dispensados ou usados inadequadamente.
fácil para condições que requerem ações indivi- . 75% das prescrições com antibióticos são
duais e sociais de fundo para sua resolução12. errôneas.
Pierce13 afirma que a sociedade de consumo, ao . 2/3 dos antibióticos são usados sem prescri-
mesmo tempo em que promove, por todos os seus ção médica em muitos países.
canais de comunicação, a idéia de que qualquer . 50% dos consumidores compram medica-
sofrimento, qualquer dor, qualquer estado, enfim, mentos para um dia de tratamento.
que fuja daquilo que ela institui como padrão, in- . Cresce constantemente a resistência da maio-
clusive estético; por outro lado, oferece a solução ria dos microorganismos causadores de enfer-
mágica na ponta dos dedos: os comprimidos. midades infecciosas prevalentes.
A proposta de alívio imediato do sofrimento, . 53% de todas as prescrições de antibióticos
como em um passe de mágica, é um apelo atra- nos Estados Unidos são feitas para crianças de 0
ente, mas tem seu preço. Este preço nem sempre a 4 anos.
se restringe ao desembolso financeiro e pode ser . Os hospitais gastam de 15 a 20% de seus
descontado na própria saúde. A noção de que orçamentos para lidar com as complicações cau-
existe uma ecologia do corpo, que merece ser sadas pelo mau uso de medicamentos.
preservada e poupada da poluição e interven- Diante do exposto, a OMS estabeleceu como
ções farmacológicas desnecessárias, vem emer- seu grande desafio para a próxima década a me-
gindo, ainda que lentamente, em meio à névoa lhoria na racionalidade do uso de medicamen-
densa de promessas extraordinárias e dúbias5. tos, havendo uma necessidade de promover a
Portanto, faz-se necessário que a sociedade se avaliação desse uso e vigiar o seu consumo17.
conscientize e entenda que o mesmo medicamen-
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Aquino, D. S.

Medidas para promover cional de Medicamentos por meio da Portaria no


o uso racional de medicamentos 427/07, o que vem a atender uma recomendação
da OMS. O Comitê desenvolverá ações estratégi-
De acordo com a definição do uso racional de cas para ampliar o acesso da população à assis-
medicamentos proposta pela Política Nacional tência farmacêutica e para melhorar a qualidade e
de Medicamentos, os requisitos para a sua pro- segurança na utilização dos medicamentos.
moção são muito complexos e envolvem uma De uma maneira geral, as soluções propostas
série de variáveis, em um encadeamento lógico. para reverter ou minimizar este quadro devem
Para que sejam cumpridos, devem contar com a passar pela educação e informação da popula-
participação de diversos atores sociais: pacien- ção, maior controle na venda com e sem prescri-
tes, profissionais de saúde, legisladores, formu- ção médica, melhor acesso aos serviços de saúde,
ladores de políticas públicas, indústria, comér- adoção de critérios éticos para a promoção de
cio, governo18. medicamentos, retirada do mercado de nume-
Preocupado com este grave problema de saú- rosas especialidades farmacêuticas carentes de
de pública, o Ministério da Saúde do Brasil criou eficácia ou de segurança e incentivo à adoção de
o Comitê Nacional para a Promoção do Uso Ra- terapêuticas não medicamentosas5.

Referências

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