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Este documento discute a relação entre livros e computadores na era digital. Aponta que livros são invenções tecnológicas e que se adaptam lentamente a novas tecnologias, como a passagem do pergaminho para o papel. Também destaca que a leitura na internet recupera aspectos da oralidade e permite novas formas de interação, enquanto o livro mantém vantagens como a visualização do todo da obra. Conclui que períodos de transição revelam os elos da história e que a multiplicidade de recursos deve ser incent
Este documento discute a relação entre livros e computadores na era digital. Aponta que livros são invenções tecnológicas e que se adaptam lentamente a novas tecnologias, como a passagem do pergaminho para o papel. Também destaca que a leitura na internet recupera aspectos da oralidade e permite novas formas de interação, enquanto o livro mantém vantagens como a visualização do todo da obra. Conclui que períodos de transição revelam os elos da história e que a multiplicidade de recursos deve ser incent
Este documento discute a relação entre livros e computadores na era digital. Aponta que livros são invenções tecnológicas e que se adaptam lentamente a novas tecnologias, como a passagem do pergaminho para o papel. Também destaca que a leitura na internet recupera aspectos da oralidade e permite novas formas de interação, enquanto o livro mantém vantagens como a visualização do todo da obra. Conclui que períodos de transição revelam os elos da história e que a multiplicidade de recursos deve ser incent
CENTRO FEDERAL DE EDUCAO TECNOLGICA DE MINAS GERAIS
DEPARTAMENTO DE LINGUAGEM E TECNOLOGIA
COORDENAO DA REA DE LNGUA PORTUGUESA Oficina de Texto Acadmico e Comunicao Cientfica Professora Patrcia Tanuri Entre pergaminhos humanos e bits eletrnicos O livro na era do computador Raquel Wandelli E afinal, o livro tem lugar na cultura globalizada ou est prestes a virar pea de museu? A Internet seria o substituto definitivo para esse objeto de orelhas, corpo, rodap, colunas e folha de rosto que participou da prpria inveno do humano? !specula"es sobre o destino da cultura de papel na era da informtica pecam por desconsiderar que os incunbulos, como os livros eram chamados antes da inveno dos tipos mveis, no so objetos humanos que se op"em ao computador, artificial e frio, em uma dicotomia do tipo natureza versus cultura# $o imaginrio popular, a leitura e a escrita seriam aptid"es naturais, assim como comer, dormir, andar# Apaga%se o fato de que livros de papel so eles prprios inven"es tecnolgicas# Um esquecimento, alis, e&plicvel' se consideramos o pergaminho como prottipo do livro moderno, l se vo mais de () sculos *os primeiros cdices de pergaminho datam do sculo II a#+#, embora a tcnica s tenha alcanado difuso na !uropa a partir do sculo I,-# .e recuamos um pouco mais e tomamos como refer/ncia as tabuletas de argila e os velhos papiros dos mesopot0mios, a memria livresca se perde na antig1idade dos eg2pcios, gregos e romanos# tempo suficiente para naturalizarmos essa conviv/ncia e ignorarmos o livro como um elemento de cultura que se modifica e se adapta aos aparatos tecnolgicos de forma lenta, mas profunda# +ada corpo que lhe deu abrigo alterou a forma de leitura e nossa prpria relao com o conhecimento# .eja na passagem do papiros *papel obtido do preparo de hastes de juncos- para o pergaminho *feito de pele de animal- ou na passagem das pesadas encaderna"es do sculo 3,III para os livros de bolso e finalmente para o livro eletr4nico, muito mudou# Agora como nunca, a*s- histria*s- do livro e da leitura comea*m- a sair dos c2rculos dos biblifilos e eruditos para satisfazer a curiosidade p5blica geral# ! no parado&al que caia no interesse popular e&atamente quando as previs"es mais apocal2pticas anunciam o fim da cultura do papel se o medo do desconhecido que faz a modernidade debruar%se sobre o passado# $o momento em que hbitos de leitura se modificam de forma drstica, acorremos ao passado para compreender e suportar melhor a revoluo tecnolgica, sem a impresso de se dar um salto no abismo escuro# A 6istria nos d, seno a garantia, ao menos a impresso de que o futuro vizinho fruto e continuao de nossos prprios passos# um campo fascinante, que atrai ficcionistas e estudiosos como atraiu 7sman 8ins, de Avalovara, 9icardo :iglia, de Cidade Ausente, 6umberto !co, de O Nome da Rosa e o iugoslavo ;ilorad :vitch, de O Dicionrio Kazar, romances cujas tramas recriam a histria do livro e nos quais , quase um vivo objeto protagonista# $o campo ensa2stico, 9oger +hartier, de A Aventura do Livro; do leitor ao navegador e Alberto ;anguel, de Uma Histria da leitura, apresentam duas obras atual2ssimas e ricamente ilustradas# Um dos momentos mais fascinantes desses relatos fala da descoberta da leitura silenciosa, ainda no in2cio do primeiro mil/nio# !les retomam +onfiss"es, em que santo Agostinho *sculo III-, registra seu olhar de assombro ao entrar na <iblioteca do monastrio de ;ilo e surpreender o bispo Ambrsio lendo na cela individual# ,indo do $orte da =frica, o professor de retrica latina e elocuo viajara pelo mundo, mas jamais imaginara, em sua vasta cultura, que algum pudesse ler daquela forma, sem mover os lbios, com a l2ngua quieta, usando apenas os olhos e a mente e buscando o sentido no corao# !ra um revertrio para a leitura fonoc/ntrica, em voz alta, calcada no som e no ritmo# A epifania de .anto Agostinho nos provoca outra, nem to pequena, nem to bvia quanto parea' a leitura tambm uma tcnica# Uma viagem livresca no tempo permite perceber ainda que todos os aparatos tecnolgicos assumidos pelo livro coe&istem na era da informtica# :ensemos nos griots, os guerreiros cantadores que viajam a p de uma tribo a outra em algumas regi"es da =frica 7cidental, como <ambara e ;alin>e# 7 predom2nio quase total da oralidade e a aus/ncia de livros no impedem que as palavras caminhem no corpo dos guerreiros, dando perman/ncia ? cultura dessas gentes# @atuadas no aparato de escrita mais primitivo do mundo A a prpria pele A, as palavras caminham e contam histrias das tribos, genealogia, magia, ritos# !&ibem mapas geogrficos, can"es, ideogramas com avisos de guerra# !nquanto isso, no continente ao lado, a comunicao se d via satlite# A Beb , em si, muito mais uma quimera tecnolgica, onde coabitam formas passadas, presentes e futuras do que uma superao total do velho pelo novo# +omo bem anotou :ierre 8vC, em Tecnologias da inteligncia, o computador sobrep"e diversas m2dias *televiso, tele&, livro, rdio, telefone, fa&, v2deo, gravador, cinema- em um sincretismo de formas e linguagens *verbal, oral, ic4nica-, sem se reduzir a nenhuma delas# 7 novo no apaga o velho, como na imagem do palimpsesto, antigo pergaminho submetido a uma soluo qu2mica para receber nova inscrio, de forma que era poss2vel encontrar sob a superf2cie raspada, as camadas anteriores de escrita# 7 novo no apaga o velho, mas ao incidir sobre ele recria%o, transforma%o# A roda da histria circunscreve seu traado torto e a cada nova espiral, ao mesmo tempo retoma e modifica velhas prticas de leitura# 7s chats, grupos de discusso ou a correspond/ncia trocada pela Internet mostram que o meio eletr4nico recupera, por e&emplo, certa espontaneidade e fluidez da literatura oral# :ode tambm devolver a voz ao te&to, sem roubar a imagem da escrita, alm de retomar a iconografia# ;as a leitura vertical na tela, atravs da barra de rolamento, padece da limitao dos rolos de pergaminho, que obrigavam o leitor a seguir parte por parte, com as mos presas ao aparato# $esse aspecto, o livro moderno manteria a vantagem de permitir uma visualizao mais imediata do todo da obra ao ser manipulado horizontalmente# :or outro lado, o leitor no pode reescrev/%lo e modific%lo com a mesma facilidade que teria no computador# Disicamente liberado do suporte da leitura e encorajado pelas ferramentas tecnolgicas a se intrometer no te&to, o navegador e&perimenta uma produtiva confuso de papis entre autor e leitor# Entre as mudanas impactantes do computador est a inigualvel heterogeneidade do meio# +apaz de associar imagem, som e movimento ao verbal, provoca quase uma e&peri/ncia e&ttica, embora desvalorize o sentido do tato, a sensao afetiva de se acariciar um livro ou de se guardar uma lgrima nas pginas amarelas do papel, como bem anotou Eos .aramago# @alvez o maior impacto, alm da desmaterializao do corpo do livro, seja a privatizao cada vez maior do ato de leitura# +hartier aponta para uma separao da leitura de toda forma de espao comunitrio que ainda sobrevive ao per2odo industrial, a e&emplo dos saraus literrios, escolas, bibliotecas, cafs, 4nibus# :or outro lado, o aspecto coletivo da leitura pode ser recuperado, seno de corpo, ao menos virtualmente, nos grupos de discusso e na leitura a vrias mos que s uma rede interligada de computadores proporciona# H perdas e ganhos a cada grande mudana# ,antagens e desvantagens# ;as os per2odos de transio tecnolgica so 5nicos porque revelam para os que nele vivem os elos da 6istria# F um privilgio para leitores e historiadores participar dessa e&peri/ncia, por mais traumtica e desafiante que seja# A multiplicidade de recursos e oferta democrtica de aparatos de leitura deve ser incentivada# 7 m5ltiplo includente, enquanto o dom2nio de uma s tecnologia e&clui e marginaliza# !nto, que ao lado dos imputs magnticos do e%boo> haja lugar para as velhas superf2cies de inscrio# Gue os navegadores possam Hbai&arH o novo suspense de .tephen Iing na Internet, mas tambm os cantadores negros continuem a desfilar seus corpos%livros pela =frica, feito pergaminhos ambulantes# ! que haja sempre obras de papel para nos humanizar entre suas asas# Raquel Wandelli jornalista, mestre em teoria literria e professora universitria.