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O POPULAR NA OBRA DE
OSWALD DE ANDRADE
1- O POPULAR
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dominação (...) alienada e alienante, porque não é humanizante. (Ação popular, p. 20).
Já a segunda seria (...) a cultura que leva o homem a assumir sua posição de sujeito da
própria criação cultural e de operário consciente do processo histórico em que se
acha inserido. (Ação popular, p.23). Assim, um movimento de cultura popular deveria
ser fundamentalmente revolucionário e fazer arte com o povo, e não para o povo:
Neste sentido, Oswald dizia que “(...) como tantos outros de sua geração,
passara pela experiência vanguardista por efeito de uma inquietude mal compreendida,
que ignorava a origem social e o fundo político dos seus anseios.” (ANDRADE, citado
em NUNES, 1978, p.XV), mas ao mesmo tempo afirmava que a massa ainda comeria
do biscoito fino que ele fabricava.
Assim, o movimento modernista reformulou a arte brasileira não só estética,
como também tematicamente, servindo de ponto de partida para as posteriores gerações,
que farão o amadurecimento dessa primeira geração revolucionária e, como afirma
Haroldo de Campos, “radical”. O trabalho, no entanto, visa identificar como essa
mudança temática modificou a cultura brasileira, tanto erudita, como popular. Num
primeiro âmbito, propõe-se a identificar os pontos de representação do popular dentro
da obra de Oswald de Andrade. Paralelamente, no entanto, estuda se o autor realmente
conseguiu retratar uma cultura verdadeiramente brasileira, ou se, ao inserir o popular,
criou uma obra igualmente erudita, mas com uma temática diferente, popular. A análise
se faz por meio de dois manifestos, o Manifesto da Poesia Pau-Brasil e o Manifesto
Antropofágico, e de um livro de poesias do autor, Pau-Brasil. Vale ressaltar que as três
obras foram compostas em datas próximas. A análise, portanto, depreende-se de uma
vertente do pensamento oswaldiano, já que posteriormente ele viria a publicar várias
outras obras que se difeririam e se aproximariam em alguns pontos das obras aqui
analisadas.
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“O brilhantismo intuitivo de Oswald se faz acompanhar de uma
carência teórica. Ele busca um efeito a curto prazo o que faz
com que muitas de suas propostas apareçam como nebulosa
ideológica dos segmentos da burguesia não tradicionalista, mas
presa ao fascínio do folclórico e do lírico” (HELENA, 1985,
p.136)
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“Fatalidade do primeiro branco aportado e dominando politicamente as selvas
selvagens.” De acordo com Benedito Nunes:
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brasileiro. Ele diz que “Nunca fomos catequizados. Fizemos foi Carnaval. O índio
vestido de Senador do império. Fingindo e Pitt. Ou figurando nas óperas de Alencar
cheio de bons sentimentos portugueses.” Nota-se, portanto, que o elemento da cultura
popular aparece como aspecto que endossa a crítica à visão anterior da cultura nacional,
bem como à própria história de dominação brasileira. Há ainda a presença de palavras
em tupi, que compõem o quadro de miscigenação entre passado e presente existente no
texto. Oswald faz, também, a seguinte pergunta duas vezes: “Mas que temos nós com
isso?”, como uma forma de rejeitar o pensamento academicista e procurar um
pensamento que retratasse e analisasse a realidade nacional.
Há no texto, como no Manifesto da Poesia Pau-Brasil, a presença da
contextualização histórica. O texto diz: “A fixação do progresso por meio de catálogos
e aparelhos de televisão. Só a maquinaria. E os transfusores de sangue.”.
O texto faz alusões à influência da catequese para a des-construção da visão
nacional e para a reconstrução desta visão, agora apoiada na concepção e nos conceitos
externos. De acordo com Benedito Nunes, o Manifesto retratou
3- O POPULAR NA POESIA
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Oswald inicia o livro com o poema “Escapulário”, em que subverte a ordem
litúrgica para exaltar a poesia. Em seguida, há trechos do Manifesto da Poesia Pau-
brasil, sob o título de “Falação”. Ele, portanto justifica aquilo que irá aparecer em sua
obra. Os poemas que se seguem estão agrupados sob o nome de História do Brasil.
Estes poemas criticam e satirizam o processo de colonização brasileiro ao reescrever,
agora sob um novo contexto e uma nova forma de composição- a fragmentária-
documentos de europeus escritos durante o período de colonização. Desta forma, ele
chama atenção aos conceitos brasileiros apoiados nos europeus, inclusive o cultural.
Nestes poemas, Oswald mantém a linguagem arcaica e há alguns poemas em francês,
como uma sátira àquilo que era considerado culto, mas que já estava ultrapassado.
O próximo grupo de poemas receberá o nome de Poemas da Colonização. Neles
Oswald fará referência ao processo de colonização brasileiro para criticar o ato
exploratório a que os negros foram submetidos. Há nestes poemas uma grande presença
de elementos populares. Oswald incorpora neles mitos e lendas do Brasil colônia,
relacionados à cultura africana. A linguagem utilizada é simples e aproxima a poesia da
fala para criticar o já citado “mal da eloqüência”. Na poesia “Cena”, Oswald usa o
termo “côa” para representar a expressão “com a”. Isto demonstra o caráter coloquial
que aproxima poesia da realidade lingüística. Em “Medo da Senhora”, ele usa a
expressão “judiada” e em “A Roça “ ele incorpora vários elementos da culinária
brasileira, como “feijão, angu, abóbora, chicória e cambuquira”. No poema
“Azorrague”, Oswald transcreve a fala do negro por meio da expressão “peredoa”, e
em “Senhor Feudal”, há a expressão “boto”, ao invés de “coloco”. O Poema “O
Capoeira” compõe, de uma forma cubista, uma briga, mas as expressões são também de
cunho popular: “Qué apanhá sordado?”. O próprio título já remete à cultura julgada
popular, característica dos escravos. O poema “Relicário” expressa bem a incorporação
da cultura popular por meio da classe dominante. Nele, é o Conde d’Eu quem diz para
Dona Benvinda, note-se o nome popular, “Que farinha de Suruí/ Pinga de Parati/Fumo
de Baependi/ É comê, bebê, pitá e caí” . É importante ressaltar os elementos populares
na cultura, farinha, pinga e fumo, bem como os próprios lugares interioranos, Suruí,
Parati e Baependi, além da mudança e transcrição da realidade lingüística, comê, bebê,
pitá e caí. Estes elementos são defendidos pelo “Conde d’Eu”, o que cria a ironia e
demonstra a superficialidade das relações eruditas, uma vez que historicamente aquilo
que era considerado erudito já defendia o popular.
O próximo conjunto de poemas recebe o nome de “São Martinho”. Eles, assim
como os outros, têm características cubistas que Oswald utiliza para quebrar a
expectativa do leitor e fazer com que ele monte sua própria interpretação, sua
perspectiva do problema. Alguns destes poemas, como “Noturno”, “Lei” e
“Metalúrgica” atentam para as mudanças ocorridas pela modernização, chamando
atenção ao contexto histórico. Mas outras relatam elementos variados da cultura
brasileira, como “Escola Rural”, “Pai Negro”, “Assombração”, “Mate Chimarrão”, e
principalmente “O Violeiro”. Este poema subverte a ordem gramatical correta para criar
a rima e musicalidade do poema e, dessa forma, aproximá-lo das cantigas de viola.
Assim, “singular” torna-se “singulá” e voltas torna-se “vortas”. Esses recursos são
muito usados na composição desta classe musical, considerada na época inferior pelos
ditos “cultos”.
Os poemas seguintes são agrupados sob o nome de “rp 1”. Estes poemas tratam
basicamente da vida na cidade. A composição é fragmentária e o estilo renova a
linguagem, desestabilizando a estrutura até então usada nas composições. Ele chama
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atenção a produtos brasileiros, como “Creme Brasil/ Indústria Vassourense/ Doce de
Leite/ Água de Caxambu/ A natureza/ sobre a mesa”. O poema “Nova Iguaçu” retrata
bem esta transposição do ambiente brasileiro da cidade. Depois de enumerar alguns
nomes comuns de comércio, como “Café do Papagaio”, ele finaliza a poesia com a
seguinte afirmativa: “No país sem pecado”. Dessa forma atenta ao espírito sagaz do
brasileiro, espírito este que havia sido deixado de lado ou sido mistificado nas
manifestações literárias anteriores. A frase remete à figura do malandro, que já havia
sido retratada em “Memórias de um sargento de milícias” e que será posteriormente
tratada em outras manifestações artísticas.
Os dois poemas seguintes, “Nossa Senhora dos Cordões” e “Na Avenida” estão
reunidos sob o título de “Carnaval”. Os próprios nomes já remetem ao popular, uma vez
que o Carnaval era, e é, a manifestação popular que aproxima as camadas sociais num
mesmo intuito de fuga da realidade e de diversão. “Nossa Senhora dos Cordões”
começa com “Evoé” e termina com “Do Riso e da Loucura”. Dessa forma, Oswald de
Andrade compõe a atmosfera de um “país sem pecado”, como já foi citado. E neste
país sem pecado os moldes morais que afunilavam os temas poéticos e a própria forma
poética perdem lugar para a liberdade temática e de composição, que retrata justamente
o Brasil, próprio para “exportação”, como defende o Manifesto da Poesia Pau-Brasil.
Nesta poesia de exportação caberia tanto o histórico como o moderno, e o popular
nestes dois sentidos. Já no poema “Na Avenida”, Oswald coloca que o bloco é
composto de “20 damas”, “40 homens do coro”. Com isto ele demonstra que estas
manifestações, por mais que consideradas pela elite não qualitativas, são quantitativas.
Ele termina com o seguinte verso: “Entre luzes elétricas”, tanto para contextualizar o
texto como moderno, quanto para demonstrar que ambos, popular e moderno,
caminhavam juntos.
Os poemas seguintes, que estão enumerados, reúnem-se como “Secretário dos
Amantes”. Os poemas narram a saudade do homem que está no exterior. A composição
segue o mesmo estilo fragmentário e o passional é reforçado, e dessa forma ironizado.
Não há, no entanto, referências ao popular.
Posteriormente aparecem os poemas reunidos como “Postes da Light”. Como o
próprio nome sugere, a maioria deles trata da modernização da cidade. O poema
“Pronominais”, no entanto, resgata a fala popular ao dizer que “o bom negro e o bom
branco”, ou seja, todos, “Da Nação Brasileira/ Dizem todos os dias/ Deixa disso
camarada/ Me dá um cigarro”. Dessa forma, ele subverte a linguagem culta até então
retratada na literatura por uma linguagem mais real do povo brasileiro, sem distinção.
Ou seja, ele defende a linguagem popular, ao invés da culta. Uma outra referência
popular presente neste conjunto está no poema “A Europa curvou-se ante o Brasil”, que
alude ao futebol, capaz de fazer o Brasil superar a Europa e defendido como um
potencial brasileiro. Por fim, há o poema “Digestão”, que retrata elementos da cultura
brasileira, como couve mineira, café, pinga e palha.
Em seguida Oswald reúne os poemas sob o nome de “Roteiro de Minas”. Estes
poemas resgatam elementos do interior mineiro, tanto da paisagem, em “Longo da
Linha”, quanto da história, ao resgatar as cidades históricas. Retrata também o folclore,
no poema “Bumba meu boi”, bem como a expressão, em “Canção do Vira”. Este
resgate histórico e interiorano serve para demonstrar o período de transição a que o
Brasil estava submetido, pois colonial e moderno ainda se misturavam num mesmo
quadro. Desta forma, erudito e popular também se misturavam, mas Oswald assume sua
posição diante deste contexto, ao criticar e ironizar o erudito.
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O último conjunto de poemas intitula-se “Lóide Brasileiro”. Este contém o
famoso “Canto de regresso à Pátria”, sátira do poema de Gonçalves Dias. Os outros
poemas trazem o retrato das cidades e regiões do Brasil, como Rio de Janeiro, São
Paulo e Fernando de Noronha.
Os poemas de “Pau-Brasil”, assim, tanto incorporam elementos culturais, como
criticam a erudição e a eloqüência. Esta incorporação é tida como natural, pois Oswald
considera que ela se manifesta histórica, como vimos em “Relicário”, e modernamente,
como vimos em “Pronominais”, dentre tantos outros. Esta mescla de moderno e
histórico cria o retrato do Brasil, que Oswald pretendia passar em sua “poesia de
exportação”.
3- CONCLUSÃO
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“Não vemos em Oswald a confluência de ‘um bom e um mau
escritor’ (Cândido, 1970, p. 75), mas uma consciência artística
e intelectual viva e dilacerada, um pensamento ágil que trouxe
para o cenário nacional problemas ainda hoje carentes de
discussão e aprofundamento.” (HELENA, 1985, p. 135)
BIBLIOGRAFIA