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DIREITOS DA PERSONALIDADE
RIO DE JANEIRO
2003
1
UNIVERSIDADE GAMA FILHO
DIREITOS DA PERSONALIDADE
Rio de Janeiro
2003
2
“Los derechos de la personalidad no pueden ser
separados, escindidios, de la persona, de la que no
son sino una prolongación necesaria; más
exactamente, no son susceptibles de cambiar de
titular. Son, pues, intransmisibles”.
Mazeaud & Mazeaud
3
SUMÁRIO
Página
I- INTRODUÇÃO............................................................................................................01
II. EVOLUÇÃO
HISTÓRICA..........................................................................................03
III.-NATUREZA
JURÍDICA............................................................................................12
IV–
TITULARIDADE.......................................................................................................15
V – OBJETO....................................................................................................................22
VI- CARACTERÍSTICAS................................................................................................26
1-Direitos inatos................................................................................................................26
2 – Direitos
Vitalícios........................................................................................................28
3 – Direitos absolutos........................................................................................................29
4- Direitos relativamente
indisponíveis..............................................................................29
5- Direitos extrapatrimoniais.............................................................................................31
6 – Direitos intransmissíveis.............................................................................................32
7- Direitos irrenunciáveis.................................................................................................33
4
VII – CLASSIFICAÇÃO..................................................................................................35
1 – Integridade física.........................................................................................................38
2- Integridade intelectual.............................................................................................43
3- Integridade moral........................................................................................................43
X- CONCLUSÃO...........................................................................................................68
5
I - INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem por finalidade fazer uma abordagem acerca dos
Civil Brasileiro, o qual na verdade não apresenta novidade em relação ao tema, uma vez
estabelecendo regras para proteção aos direitos da personalidade. Já nos artigos 38 a 44, o
identidade, integrante da tutela à integridade moral, sendo que tais disposições foram
personalíssimos, porque visam proteger o ser humano, não obstante estendam sua proteção
1
Orlando Gomes, na exposição acerca da reforma do Código Civil, consigna: “Seria impossível a um
Código hodierno, imbuído dessa filosofia, não emprestasse relevo aos direitos da personalidade, que os
reconhecidos tradicionalmente, como o direito à vida, à liberdade e à honra, que os que surgiram como
expressão de novas exigências da vida social. O direito ao trabalho, o direito à intimidade, o direito à
própria imagem, o direito de constituir família constituem interesses que, dentre outros, reclamam tutela,
não apenas em disposições de direito público, mas também em preceitos de direito privado, porque
revelam aspectos inéditos na expansão da personalidade individual” GOMES, Orlando. A Reforma do
Código Civil. – Salvador: Universidade da Bahia, 1965, p.39.
6
integridade física, moral e intelectual. Como afirmava Pontes de Miranda2: “Direitos de
da existência humana, veremos que nos planos doutrinário e legislativo a matéria é de certa
forma recente, já que são do final do século XIX os textos que passaram a dispor mais
amiúde acerca dos direitos de proteção ao ser humano. Na doutrina, ver-se-á que o tema
entendimento de grande parte da doutrina, no sentido de que tais direitos não poderiam ser
considerados como direitos subjetivos, posto que o titular seria também objeto dos mesmos
de 1988, que em seu art. 1º, incisos II e III, estabeleceu como princípios fundamentais da
Título II, que trata dos Direitos e garantias Fundamentais, vários direitos alusivos à
personalidade humana, criando, como afirma Gustavo Tepedino5 “uma cláusula geral de
II – EVOLUÇÃO HISTÓRICA
antiga, embora não haja muitos textos legislativos sistematizados neste sentido, havendo,
atributos pessoais7.
ou de regularmos objetivamente situações que, embora admitidas, não estavam expressamente previstas,
como de assunção de dívida.”
5
Neste sentido: “Com efeito, a escolha da dignidade da pessoa humana como fundamento da República,
associada ao objetivo fundamental de erradicação da pobreza e da marginalização, e de redução das
desigualdades sociais, juntamente com a previsão do § 2º do art. 5º, no sentido da não exclusão de
quaisquer direitos e garantias, mesmo que não expressos, desde que decorrentes dos princípios adotados
pelo texto maior, configuram cláusula geral de tutela e promoção da pessoa humana, tomada como valor
máximo pelo ordenamento.” TEPEDINO, Gustavo. Temas de Direito Civil. – Rio de Janeiro : Renovar,
1999. p. 48
6
Neste sentido o antigo Código de Hamurabi, parágrafos 195/197 e 202.
7
Diogo Leite de Campos, afirmava que somente eram tidas como pessoas individualizadas em sua
subjetividade na sociedade antiga aquelas que ocupassem os primeiros papéis na sociedade, ou fossem os
grandes heróis das guerras ou os vencedores dos jogos. CAMPOS, Diogo Leite de. Lições de Direitos da
Personalidade. In Boletim da Faculdade de Direito, vol. LXVII. Universidade de Coimbra, 1991, p. 134.
Gustavo Tepedino afirma que os direitos da personalidade são de construção recente, fruto de elaborações
doutrinárias germânica e francesa da Segunda metade do século XIX. TEPEDINO, Gustavo. Temas de
Direito Civil. – Rio de Janeiro : Renovar, 1999. p. 24.
8
O conceito de personalidade não é visto como objeto de preocupação
acontecendo também desta forma nos tempos de democracia e vida na pólis. Contudo o
com a idéia de hybris, que significava excesso, injustiça, justificando a sanção punitiva8,
Romano, o qual não previa um termo específico para designar personalidade jurídica,
do direito em Roma não era o ser; ao contrário percebe-se a formação legislativa voltada
status libertatis, statuts civitatis e status familiae, necessitava de proteção dos direitos
Szaniaawski:10
humanidade, v.g. o Cristianismo, a evolução natural das sociedades, nos âmbitos social,
direito natural, sem necessidade de positivá-la, foi perdendo adeptos como conseqüência
lógica da evolução das sociedades, que criaram economias de escala, estados liberais no
formação do pensamento no sentido de que o homem precisava ser protegido das agressões
contra sua pessoa, com a conseqüente elaboração de uma sistema legal que disciplinasse o
doutrinando desde seus primeiros momentos o indivíduo como valor absoluto, ressaltando
10
direitos da personalidade, Francisco Amaral12 destaca o Renascimento e o Humanismo do
século XVI, e o Iluminismo nos séculos XVII e XVIII, que reconhecem o homem como
dos Direitos do Homem de 1.948; a Convenção Européia dos Direitos Humanos, de 1.950;
conseqüência das arbitrariedades promovidas pelo poder constituído dos Estados, tendo
sido as referidas declarações occasio legis para Constituições dos países democráticos, que
brasileira são exemplos de constituições que estabeleceram tal princípio como fundamento
na sistematização constitucional.
12
AMARAL, Francisco. Direito civil : introdução. – Rio de Janeiro : Renovar, 2003. p. 256.
11
Embora haja previsão nos textos constitucionais, é possível observar que
nos textos de direito privado a proteção aos direitos da personalidade é mais lenta, como
por exemplo o Código Civil francês de 1.804 que, sem defini-los, tutelou-os
superficialmente. Os Códigos Civis português, (de 1.866) e italiano (de 1865) não os
associação, à apropriação e à defesa, conforme artigos 359 a 367. O Código Civil alemão
pessoa. Atualmente, o Código Civil português regula os direitos da personalidade nos arts.
garantias individuais, iniciando com a Constituição do Império, que no art. 179 descreveu
nos 35 incisos acerca de “Direitos Civis e Políticos dos Cidadãos Brasileiros”, sendo que os
13
Cf. BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos da personalidade – Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999.
p 32. DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. vol. I. Teoria geral do direito civil. – São
Paulo: Saraiva, 2002, p.118. AMARAL, Francisco. Direito civil : introdução. – Rio de Janeiro : Renovar,
2003. pp. 256-257.
14
Cf. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. – São Paulo: Malheiros Editores,
1996. p.p 67- 80.
12
Na fase republicana, a Constituição de 1.891, no Título IV, Seção II,
“Declaração dos Direitos”, pela primeira vez estende os direitos e garantias individuais aos
novidades, tendo com a primeira delas a inclusão dos direitos de nacionalidade e políticos
as hipóteses em que se poderia aplicar a pena de morte, que não ficava restrita aos casos
previstos na legislação militar para épocas de guerra, mas em lei especial, sendo tal
art. 141 a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, etc. Vale ressaltar que o art. 145
13
assegurava a todos o trabalho, possibilitando uma existência digna, estabelecendo que o
dispôs acerca dos direitos e garantias individuais no art. 150, preservando entre outros os
que manteve a previsão aos direitos da personalidade em seu art. 153. Todavia, no artigo
seguinte limita o exercício desses direitos dispondo que: “O abuso de direito individual ou
a suspensão daqueles direitos de dois a dez anos, a qual será declarada pelo Supremo
prejuízo da ação cível ou penal que couber, assegurada ao paciente ampla defesa”.
como princípio fundamental a dignidade humana, elencando uma série de direitos como
estabeleceu, como afirma Gustavo Tepedino15 “uma cláusula geral de tutela e promoção
15
TEPEDINO, Gustavo. Temas de Direito Civil. – Rio de Janeiro : Renovar, 1999. p. 48.
14
da pessoa humana”. Consigna Gilberto Haddad Jabur:16
personalíssimos, como: o art. 666, X, que regulamentava o direito à imagem; o art. 671,
parágrafo único, que versava sobre o segredo de correspondência, e os arts. 649-651 e 658,
que dispunham sobre direitos do autor. A matéria foi também posteriormente tratada no
regras em leis extravagantes, como por exemplo: o Decreto nº 24.559/34, que protege a
pessoa e seus bens dos psicopatas; a Lei nº 7.649/88, que dispõe sobre a cessão de
16
JABUR, Gilberto Haddad. Limitações ao direito à própria imagem no novo código civil. In DELGADO,
Mário Luis e ALVES, Jones Figueirêdo. Questões convertidas no novo código civil. – São Paulo: Editora
Método, 2003, p. 31
15
produtos biológicos, como sangue; o Estatuto da Criança e do Adolescente; a Lei nº
8.069/90, que regulamenta direitos fundamentais nos arts. 7 a 69; a Lei nº 9.434/97, que
mais amiúde os fatos criminosos que atentam contra os direitos da personalidade, como se
vê no Código Penal de 1.940 e legislação esparsa, que pune agressões contra a vida, a
virtude dos ordenamentos jurídicos” dos quais o homem é titular. É possível distinguir
duas categorias: aqueles que são destacáveis da pessoa de seu titular (a propriedade, a
posse, o crédito, etc.) e aqueles que são inseparáveis por serem essenciais à pessoa
humana, por isso a ela vinculados vitaliciamente, não se podendo conceber nas
sociedades democráticas contemporâneas uma pessoa humana que não tenha direito à vida,
17
RUGGIERO, Roberto de. Instituições de direito civil – Campinas : Bookseller, 1999 p.263.
16
patrimoniais, nos bens destacáveis da pessoa humana, cujo objeto do direito são os bens
patrimoniais, tendo como titular desses direitos a pessoa física ou moral. A construção
decorrência da visão sedimentada de que o objeto do direito deveriam ser os bens e não o
próprio homem, que seria o titular e o objeto do direito concomitantemente. Este dissenso
doutrinário foi, como afirma José Carlos Moreira Alves18, responsável pela omissão da
personalidade deu azo à criação de duas correntes antagônicas. A corrente que rejeitava
tais direitos como subjetivos entendia que havia contradição evidente ao estabelecer na
mesma pessoa titularidade e objeto do direito, o que poderia levar o titular a dispor da
própria integridade física, suicidando-se ou mutilando o próprio corpo, sem que nada
pudesse ser feito para impedir tal conduta. Nesta corrente, aliam-se Roubier, Unger, Dabin,
Savigny, Thon, Von Thur, Ennecerus, Zitelmann, Crome, Iellinek, Ravà, Simoncelli,
Oerteman, Cabral de Moncada e Orgaz. Por outro lado, defendiam a concepção dos direitos
Ravanas, Perlingieri, Limongi França, Milton Fernandes, Orlando Gomes, Ferrara, Venzi
Mazzoni, Coviello, Planiol, Messineo, Guido Alpa, Capelo de Souza, entre inúmeros
outros.19
18
MOREIRA ALVES, José Carlos .“A parte geral do projeto do Código Civil” Revista nº 9 do Conselho
da Justiça Federal, disponível em http://www.cjf.gov.br. revista n9/artigo1.htm (22.07.2002)
19
Sobre as correntes doutrinária e seus defensores cf.: BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos da
personalidade – Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999. pp 4-5. FIUZA, César. Direito civil: curso
completo. – Belo Horizonte: Del Rey, 2003. pp. 134-136. GOMES, Orlando. Introdução ao direito civil. –
Rio de Janeiro: Forense: 1986. pp. 129-130. OLIVEIRA, J.M. Leoni Lopes de. Teoria Geral do Direito
17
A tese prevalecente, como afirma Carlos Alberto Bittar20, é a da corrente
positiva, ou seja, a que afirma serem os direitos da personalidade direitos subjetivos que
têm por objeto os bens e valores essenciais da pessoa, em seus aspectos físico, moral e
intelectual, que são a vida humana, o corpo humano na sua integridade e nas suas partes
contra as agressões do poder público, embora não haja muitos textos legislativos neste
sentido. Sob este prisma, os direitos da personalidade se situam no direito público, pois o
tais direitos no campo do direito privado, encarando-se as relações entre as pessoas físicas
imagem, a voz, um bem de produção intelectual de outrem, viole sua vida privada ou não
18
subjetivos que estão situados no âmbito do direito público quando há conflito de interesses
com o Estado, v.g., agressão ao estado civil político, e no âmbito do direito privado
IV- TITULARIDADE
ciclo vital de sua existência, isto é, desde a concepção, como decorrência da garantia
adquirir direitos e contrair obrigações23, uma vez que, de acordo com a legislação civil, a
personalidade irradiam efeitos ainda antes do nascimento. Neste sentido, observa-se que o
21
Neste sentido, Carlos Alberto Bittar afirma que no âmbito do direito privado são denominados liberdades
públicas e, no âmbito do direito privado, são denominados direitos da personalidade. BITTAR, Carlos
Alberto. Os direitos da personalidade – Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999. p 3, e ainda: FIUZA,
César. Direito civil: curso completo. – Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p 134. RODRIGUES, Silvio.
Direito Civil, vol. I, parte geral – São Paulo: Saraiva, 2002, p.62.
22
Cf. AMARAL, Francisco. Direito civil : introdução. – Rio de Janeiro : Renovar, 2003. p. 253.
OLIVEIRA, J.M. Leoni Lopes de. Teoria Geral do Direito Civil. vol. 2. – Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2000, p. 180. BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos da personalidade – Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 1999. p 13.
23
Neste sentido é a lição de San Tiago Dantas: “Quando penso nos direitos da personalidade, estou
pensando na vida, na honra, na liberdade, na integridade corpórea, coisas que não são todas elas
adaptáveis à simples capacidade de Ter direitos e obrigações. Quer dizer que a palavra personalidade
pode ser tomada em duas acepções: numa acepção puramente técnico-jurídica ela é a capacidade de Ter
direitos e obrigações e é, como muito bem diz Unger, o pressuposto de todos os direitos subjetivos; e numa
outra acepção, que podemos chamar acepção natural, ela é o conjunto dos atributos humanos. Aquele
pressuposto pode perfeitamente ser objeto de relações jurídicas.” DANTAS, San Tiago. Programa de
direito civil. – Rio de Janeiro: Forense. 2001, p. 152.
19
direitos do nascituro estão preservados desde a concepção24.
Desta forma, quando a lei penal pune a gestante ou o terceiro que pratica
Pontes de Miranda26:
arts. 6º e 7º do atual Código Civil Brasileiro, também pode ser extinta com a ausência ou
morte presumida. Pode-se afirmar, não obstante, que os direitos da personalidade irradiam
efeitos “post-mortem”, como ocorre nos casos do direito ao corpo, à imagem, ao direito
moral do autor e no direito à honra, cabendo aos herdeiros a sua defesa contra terceiros27.
24
Neste sentido cf. PERLINGIERI, Pietro. Perfis do Direito Civil. – Rio de Janeiro: Renovar. 2002. p.
111
25
Arnaldo Rizzardo anota: “ O direito à vida não permite o aborto, pois dando-se a concepção, há uma
nova vida, surge um indivíduo novo.” RIZZARDO, Arnaldo. Parte Geral do Código Civil. – Rio de
Janeiro: Forense, 2002. p. 145. No mesmo sentido escreve Roberto Rosas: “O Direito da Personalidade vai
surgir em decorrência de um princípio constitucional do respeito à vida, a partir da concepção,
protegendo, assim, o nascituro. Em conseqüência, derivam-se outros aspectos do Direito da Personalidade,
como o direito ao nome, à imagem e à intimidade, proteções que a Constituição explicitamente traz e
resguarda.” In “Direito Civil e Constituição. Relação do Projeto com a Constituição”. publicado na
revista nº 9 do Conselho da Justiça Federal, disponível em http://www.cjf.gov.br. revista n9/artigo1.htm
(22.07.2002). Esta é também a posição de GAGLIANO Stolze Pablo e FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo
curso de direito civil : parte geral. – São Paulo: Saraiva, 2002. p. 149.
26
MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado. Atualizado por Vilson Rodrigues Alves. Parte
especial, tomo VII – Campinas : Bookseller, 2000. p. 54. Que também defende a aplicação dos direitos da
personalidade ao nascituro no caso de crime contra a honra, pp. 72-73.
27
Neste sentido cf. PERLINGIERI, Pietro. Perfis do Direito Civil. – Rio de Janeiro: Renovar. 2002. p.
111.
20
O fato de os direitos da personalidade ultrapassarem o ciclo da vida
humana comporta discussão doutrinária, por entenderem alguns autores que, ocorrendo a
mortem” são consideradas contra os sucessores do morto, que agem em nome próprio,
como se as lesões fossem diretamente a seus direitos. Neste sentido é a posição de Pontes
plausível conceber a idéia de que os direitos da personalidade extinta podem irradiar efeitos
mesmo após a morte do titular. Assim, como o titular já faleceu, podem seus parentes
ajuizarem ações visando impedir a lesão, fazê-la cessar e ainda pleitear indenização que
seria devida ao ofendido. Tal hipótese foi prevista pelo legislador português, que no artigo
proteção depois da morte do respectivo titular”29. Em seguida, dispôs quais os parentes que
que os direitos da personalidade sobrevivem em alguns casos ao seu titular, entre os quais:
Orlando Gomes32, J.M. Leoni de Oliveira33, Arnaldo Rizzardo34, César Fiúza35, Francisco
Amaral36, Carlos Alberto Bittar37, Maria Helena Diniz38, Gustavo Tepedino39, Fábio Maria
Civil reconhece eficácia de alguns dos direitos da personalidade após a morte de seu
30
Cf. LOTUFO, Renan. Código civil comentado : parte geral. – São Paulo: Saraiva, 2003. pp. 12-13
31
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil, vol. 1. – São Paulo: Saraiva. 2003, p.217.
32
Cf. GOMES, Orlando. Introdução ao direito civil. – Rio de Janeiro: Forense: 1986. pp. 132-133.
33
Cf. OLIVEIRA, J.M. Leoni Lopes de. Teoria Geral do Direito Civil. vol. 2. – Rio de Janeiro: Lumen
Juris, 2000, pp. 180-181.
34
Cf. RIZZARDO, Arnaldo. Parte Geral do Código Civil. – Rio de Janeiro: Forense, 2002. pp. 148-149.
35
Cf. FIUZA, César. Direito civil: curso completo. – Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p 134.
36
Cf. AMARAL, Francisco. Direito civil : introdução. – Rio de Janeiro : Renovar, 2003. pp. 253-254.
37
O autor, na sua obra monográfica sobre o tema em algumas passagens, fls. 82, 88 e 95, demonstra que os
direitos da personalidade irradiam efeitos após a morte do titular, embora à fl. 95 afirme que os herdeiros
devem agir processualmente, defendendo direito próprio. BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos da
personalidade – Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999.
38
Cf. DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. vol. I. Teoria geral do direito civil. – São
Paulo: Saraiva, 2002, p.121.
39
O autor, além de manifestar sua opinião, colaciona nota de Diogo Leite Campos, com a mesma
orientação em análise ao Código Civil Português. TEPEDINO, Gustavo. Temas de Direito Civil. – Rio de
Janeiro : Renovar, 1999. p. 34.
40
Cf. MATTIA, Fábio Maria de. Direitos da personalidade: aspectos gerais. Revista de Direito Civil. vol. 3.
Ano 2, Janeiro/Março. – São Paulo: Revista dos Tribunais, 1978, pp. 34-51.
22
titular, legitimando seu cônjuge ou parentes sucessíveis para ajuizarem ação processual
fundamento, também se admite serem as pessoas morais titulares desses mesmos direitos,
personalidade à pessoa jurídica no que for compatível, concluindo-se, por conseguinte, que
atual código, já tinha sumulado sob o nº 227 que a pessoa jurídica pode sofrer dano moral,
entendem que os direitos da personalidade são exclusivos da pessoa física, e que a extensão
desses direitos à pessoa jurídica pode enfraquecer seu valor, posto que visam proteger a
41
Clóvis V. do Couto e Silva demonstra que o dano moral está intimamente ligado aos direitos da
personalidade. SILVA, Clóvis V. do Couto. O conceito de dano no direito brasileiro e comparado. São
Paulo. Revista do Tribunais, vol. 667, pp. 07-16.
42
Danilo Doneda afirma: “A extensão dos direitos da personalidade às pessoas jurídicas é assunto
controverso. Embora em um aceno à formação histórico-dogmática desta categoria seja virtualmente
impossível vislumbrar referências à pessoa, não é menos verdade que esta operação vem sendo feita, muitas
vezes ao arrepio de algumas considerações metodológicas necessárias. DONEDA, Danilo. Os direitos da
personalidade no novo Código Civil. In TEPEDINO, Gustavo, coordenador. A parte geral do novo Código
Civil – Estudos na perspectiva civil-constitucional. – Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 53.
23
dignidade da pessoa humana. Gustavo Tepedino43 afirma que quando as lesões não atingem
humanos, devendo os direitos da pessoa jurídica serem tutelados como direitos próprios e
não como direitos da personalidade, por serem inerentes ao homem. Assim, também
matéria conclui pela possibilidade de sua aplicação. Ainda no mesmo diapasão: Pontes de
Miranda48, Francisco Amaral49, Arnaldo Rizzardo50, J.M. Leoni Lopes de Oliveira51 (este
Coelho52 e outros.
43
Cf. TEPEDINO, Gustavo. Temas de Direito Civil. – Rio de Janeiro : Renovar, 1999. pp. 49-53.
44
Cf. LOTUFO, Renan. Código civil comentado : parte geral. – São Paulo: Saraiva, 2003. pp. 148-154.
45
O autor chega a consignar que somente pessoas físicas podem sofrer danos morais. Pessoas jurídicas
somente poderão sofrer danos com reflexos patrimoniais. LEÃO, Antônio Carlos Amaral. Considerações
em torno do dano moral e a pessoa jurídica. São Paulo. Revista do Tribunais, vol. 689 07-13, pp. 07-16.
46
Cf. FIUZA, César. Direito civil: curso completo. – Belo Horizonte: Del Rey, 2003. pp. 143-144.
47
Cf. ALVES, Alexandre Ferreira de Assumpção. A pessoa jurídica e os direitos da personalidade. – Rio de
Janeiro: Renovar, 1988.
48
Cf. MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado. Atualizado por Vilson Rodrigues Alves. Parte
especial tomo VII – Campinas : Bookseller, 2000. pp. 72, 111, 154-155.
49
Cf. AMARAL, Francisco. Direito civil : introdução. – Rio de Janeiro : Renovar, 2003. p. 254.
50
Cf. RIZZARDO, Arnaldo. Parte Geral do Código Civil. – Rio de Janeiro: Forense, 2002. pp. 164-165.
51
Cf. OLIVEIRA, J.M. Leoni Lopes de. Teoria Geral do Direito Civil. vol. 2. – Rio de Janeiro: Lumen
Juris, 2000, pp. pp. 253-254.
52
O autor afirma: “A proteção dos direitos da personalidade aplica-se, no que couber, à pessoa jurídica.
Tal como as pessoas naturais, ou associações, fundações, associações e sociedades têm direitos de impedir
agravos ao seu nome, privacidade, imagem e honra, bem como de serem indenizadas pelos prejuízos
materiais e morais.” COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil, vol. 1. – São Paulo: Saraiva. 2003,
24
Não obstante a controvérsia doutrinária existente, é possível reconhecer
que as pessoas jurídicas são suscetíveis de titularidade de direitos da personalidade que não
sejam inerentes à pessoa humana, tais como o direito à vida, à integridade física e ao seu
corpo, até porque a Constituição Federal de 1988, ao elevar a pessoa humana como valor
máximo do ordenamento jurídico brasileiro, não deixa dúvida acerca de sua preferência em
preservar a pessoa humana contra qualquer agressão externa. Esses direitos consagrados na
Carta da República precisam ser preservados, e respeitados por todos, impedindo que
proteger as pessoas jurídicas que são criadas para desempenhar função da pessoa humana,
V - OBJETO
intelectual da pessoa humana, aplicando-se no que for compatível à pessoa jurídica. Alguns
autores apresentam divisão diferente para classificar o objeto dos direitos personalíssimos,
p.261.
53
Vale ressaltar, como consignado alhures, que parte da doutrina rejeitava a concepção dos direitos da
personalidade na categoria dos direitos subjetivos, justamente porque confundem na mesma pessoa titular e
objeto do direito.
54
Carlos Alberto Bittar, compartilhando entendimento de Rubens Limongi França, entende que o objeto
dos direitos da personalidade classifica-se em direitos físicos, direitos psíquicos e direitos morais. BITTAR,
25
Portanto, o objeto dos direitos da personalidade protegidos pela lei ou
o próprio corpo (vivo ou morto), o corpo alheio (vivo ou morto), as partes separadas do
alguns autores destacarem o direito à vida como direito à tutela específica 55. Protege-se,
impedir ou punir qualquer agressão que acarrete à pessoa dano em qualquer função
biológica, como por exemplo a voz, tendo como valor supremo a própria vida, que é o
bem maior protegido pelo ordenamento jurídico, sendo certo que esta tutela também se
Carlos Alberto. Os direitos da personalidade – Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999, p. 64, também é
a posição de GAGLIANO Stolze Pablo e FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo curso de direito civil : parte
geral. – São Paulo: Saraiva, 2002. p. 157. Pontes de Miranda dividia na seguinte ordem de preferência:
direito à vida, direito à integridade psíquica e direito à integridade física . Cf. MIRANDA, Pontes de.
Tratado de direito privado. Atualizado por Vilson Rodrigues Alves. Parte especial tomo VII – Campinas :
Bookseller, 2000. p. 55.
55
Neste sentido, entre outros: GAGLIANO Stolze Pablo e FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo curso de
direito civil : parte geral. – São Paulo: Saraiva, 2002. pp. 157-172. MIRANDA, Pontes de. Tratado de
direito privado. Atualizado por Vilson Rodrigues Alves. Parte especial tomo VII – Campinas : Bookseller,
2000. p. 55.
26
Na tutela da integridade intelectual, que para alguns autores é considerada
de criação do autor, capaz de vinculá-lo à obra que produziu com sua habilidade pessoal.
humana, tal direito não pode ser alienado, pois não é possível alienar o pensamento nem o
poder de criatividade do autor. Por outro lado, produzida a obra, tem seu autor o direito de
usufruir amplamente e até alienar o resultado de sua atividade pessoal, sem ofensa ao
pessoa usufrui na comunidade em que reside a liberdade, que somente pode ser suspensa se
a pessoa demonstrar despreparo para viver em sociedade, ofendendo bens tutelados pela lei
penal e, raras exceções, em outros ramos do direito, v.g. prisão por dívida de alimentos;
características associadas que determinam a maneira da pessoa ser; nome, que não pode ser
utilizado por outrem em prejuízo ao titular e, ainda, recato, segredo, intimidade, vida
privada, que têm por objeto resguardar a pessoa em suas atividades pessoal e familiar.
direitos da personalidade. Também neste passo a doutrina não é unânime, havendo autores
27
como San Tiago Dantas56 e Orlando Gomes57, que defendem a existência de vários direitos
a proteger a personalidade.
sustentam Francisco Amaral59, Eroulths Cortiano Junior60 e Gustavo Tepedino61, sendo que
humana”. Tal conclusão, porém, se aproxima da teoria monista, com tipificação nos
O legislador brasileiro optou pela tese monista, optando por não especificar todos
que pode ter vários desdobramentos na medida em que a sociedade avance e se faça
VI - CARACTERÍSTICAS
positivação nos ordenamentos jurídicos. Contudo, ainda que não haja unanimidade, há
características que são consagradas em maioria doutrinária, como sendo direitos inatos,
Código Civil. Há outras características também citadas por alguns doutrinadores, tais
1 – Direitos Inatos
com a pessoa, pela sua essencialidade à existência humana, havendo alguns que irradiam
efeitos antes mesmo do nascimento, como, por exemplo, a vida do nascituro, protegida
A regra pode ser excepcionada64, visto que alguns direitos protegidos como
sendo direitos da personalidade podem ser adquiridos no decorrer da vida humana, sendo
este o caso dos direitos morais do autor, que somente podem se materializar com o
64
Caio Mário da Silva Pereira, neste aspecto caracteriza os direitos da personalidade em direitos inatos e
adquiridos, aqueles sobrepostos a qualquer condição legislativa, estes como decorrência do status
individual, existentes nos termos e na extensão previstos no ordenamento jurídico. PEREIRA, Caio Mário
da Silva. Instituições de direito civil. vol. I. – Rio de Janeiro. Forense. 2004. p. 242.
65
Neste sentido: SILVA, Edson Ferreira da. Os direitos da personalidade são inatos? Revista dos Tribunais.
Vol. 694, p.p. 21/34.
66
Cf. MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado. Atualizado por Vilson Rodrigues Alves. Parte
especial tomo VII – Campinas : Bookseller, 2000. p. 145.
30
2 – Direitos vitalícios
Os direitos da personalidade são gerais, uma vez que são titularizados por todas
as pessoas, sem nenhuma condição para reconhecimento, sendo protegidos durante toda a
existência da pessoa humana, irradiando efeitos para o nascituro e após a morte, como se
vê nos arts. 2º e 12 (parágrafo único) do Código Civil brasileiro que, neste aspecto, segue
qual deve ser analisada sob dois aspectos. No primeiro, a imprescritibilidade decorre da
vitaliciedade,ou seja, por acompanhar a pessoa no ciclo de sua existência. Neste caso, não
se perdem os direitos pelo não uso de alguns deles, nem se adquire a titularidade pelo uso
reiterado por algum tempo, já que os direitos da personalidade são inatos. Portanto, as
ações que o protegem são também vitalícias, de forma que em qualquer época pode a
pessoa propor uma ação para restaurar ou retificar seu nome. No segundo aspecto, há
determinado lapso de tempo previsto em lei, a fim de exigir que o Estado imponha sanção
ao ofensor. Como exemplo, temos a prescrição para receber indenização por danos morais
3 – Direitos absolutos
cria um dever geral de abstenção contra o uso do direito subjetivo absoluto, como, por
exemplo, também o direito à propriedade. Obviamente que, uma vez lesado qualquer
desses direitos, será instaurada uma relação jurídica própria dos direitos relativos, entre o
ofendido e o ofensor, o que não retira a característica de direito subjetivo absoluto desses
direitos indisponíveis, e de forma geral faz sentido tal caracterização, uma vez que não se
67
Cf. AMARAL, Francisco. Direito civil : introdução. – Rio de Janeiro : Renovar, 2003. p. 252.
32
relativização da indisponibilidade dos direitos da personalidade, permitindo a própria
do corpo humano para fins de proteção à saúde. Tal matéria é regulamentada por leis
esparsas e pelo próprio Código Civil, que permite a cessão de sangue, material humano
para fecundação artificial e órgãos para transplante, conforme dispõe o seu art. 13,
parágrafo único.
alguns casos, é a disposição onerosa de tais bens, ou que esta disposição atente contra o
padrão médio de tolerabilidade e moralidade aceitos pela sociedade68. Assim é que se tem
permitido, por exemplo, a prática de certas profissões em que a pessoa expõe sua
intimidade, põe em risco sua vida, aliena parte de seus cabelos, unhas etc., e, lado outro,
5 – Direitos extrapatrimoniais
Tal afirmação faz sentido, mas, contudo, no sistema capitalista há uma tendência de
68
A este respeito, anota Eduardo Espínola: “Isso, porém, não se deve admitir de modo absoluto, e é
impossível apresentar um critério geral, mas basta afirmar que a propriedade e comerciabilidade das
partes destacadas do corpo humano podem ir somente até o ponto em que não ofendam os bons costumes.”
Em nota de rodapé o autor destaca partes do corpo que poderiam ser negociadas como dentes e cabelos.
ESPINOLA, Eduardo. Sistema do direito civil brasileiro. – Rio de Janeiro: Editora Rio, 1977, p. 329.
69
Paulo Nader afirma que é “nulo , de pleno direito, o negócio jurídico que tenha por objeto a alienação
de uma peça anatômica” NADER, Paulo. Curso de direito civil, parte geral. – Rio de Janeiro: Forense,
2003. p. 212.
33
negociação de todos os bens que forem relevantes para o homem, a fim de satisfazerem
personalidade que não atentem contra o padrão médio de moralidade de uma determinada
pessoas nuas em revistas, filmes, peças teatrais, participação em reality shows, participação
Não se permite a alienação de bens que firam o padrão médio de moralidade e eticididade,
tais como venda de órgãos para transplante, venda do próprio corpo para prostituição, etc.
direta em perda material ( por exemplo, morte de uma pessoa, lesão estética em rosto de
atriz famosa), há patrimonialidade para reparação moral do dano, visto que não se paga
pelo direito lesionado, mas se procura mensurar um bem patrimonial que compense a dor,
34
Pode-se afirmar que a regra é que os direitos da personalidade são
podem ser alienados onerosamente, e que a violação a eles pode importar em entrega de
incompensáveis.
6 – Direitos intransmissíveis
com a pessoa ( regra geral) e são vitalícios, ou seja, são inerentes ao titular no ciclo de sua
existência, com irradiação antes e depois da vida. Também, como regra, são adquiridos por
direito próprio e não por transmissão de outro titular, visto que não é possível ao titular do
direito à honra, à privacidade e à vida transferi-los a seus herdeiros, que os adquirem por
direito próprio70. Até mesmo o nome que o rebento recebe ao nascer, que pode ser
reiteração do nome dos ascendentes com acréscimo de agnome, na verdade não importa
identificação através do nome, que por homenagem familiar foi reiterado com acréscimo
70
O Ministro Carlos Mário da Silva Velloso, defende a intransmissibilidade pelo fato de não poderem ser
transmitidos “causa mortis”, não abordando a transmissão entre pessoas vivas. Cf. VELLOSO, Carlos
Mário da Silva. Os direitos da personalidade no Código Civil português e no novo Código Civil Brasileiro.
ALVIM, Arruda, CÉSAR, Joaquim Portes de Cerqueira, ROSAS, Roberto, coordenadores. Aspectos
Controvertidos do novo Código Civil. – São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003. p.118.
35
núpcias, não se opera transmissão, e sim, direito derivado do próprio casamento71.
como regra geral não é possível transmitir bens personalíssimos como honra, vida,
intimidade. Porém, pode-se transmitir partes do corpo como órgãos para transplantes,
cabelos para embelezamento estético, material genético para reprodução humana, etc72.
7 – Direitos irrenunciáveis
renunciar à sua liberdade, honra, vida, parte de seu corpo, afora nas hipóteses de
disponibilidade previstas em lei ou aceitas pela sociedade. Por esta razão, não se permite no
Brasil a prática da eutanásia, ou seja, a morte pretendida pelo paciente para interromper o
ciclo de sua vida por motivo de doença, importando nesta hipótese em renúncia à própria
vida que, malgrado as discussões filosóficas e morais73 sobre o tema, não é a acolhida pelo
ordenamento jurídico brasileiro. Este consagrou o direito à vida como direito individual
que são inatos, vitalícios, absolutos, gerais, necessários, essenciais, intransmissíveis, não
renunciar à própria personalidade, que é protegida por esses direitos, não tendo qualquer
VII - CLASSIFICAÇÃO
personalidade, que compreenderia todos os tipos previstos em leis ou princípios legais, sem
direito à vida; direito à integridade física e direito sobre as partes separadas do próprio
corpo; II- Direito à liberdade; III- Direito à honra e ao resguardo pessoal: direito à honra;
37
integridade física: direito à vida e à saúde; direito ao cadáver e direito à liberdade física: II-
Direito à integridade moral: direito à própria imagem; direito à liberdade intelectual; direito
profissão, de sexo, de condição, condições especiais do indivíduo (ser nobre, por exemplo),
77
Cf. ESPINOLA, Eduardo. Sistema do direito civil brasileiro. – Rio de Janeiro: Editora Rio, 1977, p. 325
78
Cf. ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito civil teoria geral, vol. I, introdução as pessoas os bens. –
Coimbra: Coimbra Editora. 2000, p. 108-109
79
Cf. FERNANDES, Luís A. Carvalho. Teoria Geral do Direito Civil. vol. I, introdução pressupostos da
relação jurídica. – Lisboa, Universidade Católica Editora, 2001, pp. 229-231.
38
relativos à personalidade física, à personalidade moral e à personalidade jurídica e bens
equilibrado.
sob duas tutelas: integridade física e integridade moral. A primeira protege o direito à vida,
honra, à liberdade, ao recato, à imagem, ao nome e, também, o direito moral do autor, não
vida, direito à integridade psíquica e direito à integridade física, direito à liberdade, direito
à verdade, direito à honra, direito à própria imagem, direito de igualdade, direito ao nome,
direito à intimidade e direito autoral. Esta classificação é também adotada por Carlos
Alberto Bittar82.
unânime acerca dos direitos da personalidade. É também assim na sua classificação, por se
80
Cf. GOMES, Orlando. Introdução ao direito civil. – Rio de Janeiro: Forense: 1986. p. 133.
81
O autor estabelece uma escala de direitos em importância, destacando inicialmente o direito à vida,
direito à integridade psíquica e à integridade física. Cf. MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado.
Atualizado por Vilson Rodrigues Alves. Parte especial tomo VII – Campinas : Bookseller, 2000. pp. 40-190
82
BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos da personalidade – Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999, p.
64.
39
tratar de matéria recentemente inserida nas legislações. Desta forma, é preciso construir
pessoas jurídicas no que for compatível , cremos ser preciso classificar tais direitos em
proteção à integridade física (protegendo a vida, corpo vivo ou morto, partes separadas,
artística e literária) e a integridade moral (que são as imagens, retrato e atributo, a honra, a
1. Integridade física
eutanásia, pena de morte, etc. Neste sentido, anota Enrique Varsi Rospigliosi84: “Como
sabemos esta es de caráter universal. Es una proteción general a la persona y pone como
83
Esta classificação é adotada por Rubens Limongi França, como se vê em: DINIZ, Maria Helena. Curso
de direito civil brasileiro. vol. I. Teoria geral do direito civil. – São Paulo: Saraiva, 2002, p.p. 121-122, e
também AMARAL, Francisco. Direito civil : introdução. – Rio de Janeiro : Renovar, 2003. pp. 259-270.
84
ROSPIGLIOSI, Enrique Varsi. Apuntes juridicos acerca del genoma humano. Revista de direito civil,
imobiliário, agrário e empresarial. Vol. 76. Revista dos Tribunais, abril-junho 1996. pp. 5-9.
40
investigaciones, salvo consentimento prévio.” O ciclo de proteção à vida se estende mesmo
acompanhar a pessoa por toda a vida, até que a morte aconteça e ponha fim à sua condição
Pode-se afirmar que a vida é um direito da pessoa, mas também um dever, dela
casos, embora não se puna a tentativa, pune-se o terceiro que concorre para o fato e
também que participa da eutanásia, cabendo dizer que, de forma genérica, os sistemas
impedindo qualquer ofensa à sua saúde, obrigando o estado a prestar-lhe assistência, bem
subsistência humana, havendo também punição por lesões corporais e vedando ao sujeito a
entendimento de San Tiago Dantas85: “O homem não pode dispor de sua integridade
corpórea, não pode se submeter a mutilações, porque ele não dispõe do corpo; tem direito
85
DANTAS, San Tiago. Programa de direito civil. – Rio de Janeiro: Forense. 2001, p. 158. No mesmo
sentido, escreve Roberto de Ruggiero, afirmando que a disposição do corpo fica limitada à moral e à lei.
RUGGIERO, Roberto de. Instituições de direito civil – Campinas : Bookseller, 1999 p. 443.
41
morto, e também a voz, não havendo qualquer possibilidade de apropriação, a qualquer
título por terceiros, sem autorização da pessoa ou seu representante, nos casos possíveis.
Mesmo no caso de morte, enquanto o cadáver tiver forma, estará protegido contra ação de
para fins de transplantes de órgãos, cessão de sangue, material genético para fecundação,
unhas, cabelos, inseminação artificial (a qual, de acordo com o novo Código Civil, pode ser
homóloga ou heteróloga) e, por fim, a questão das cirurgias para mudança de sexo.
disposição de parte do corpo para fins de transplante, cuja matéria está especificada na Lei
nº 9.437/97. Para o caso de pessoas vivas, deverão ser observados: duplicidade do órgão ou
autorização judicial, ter no mínimo 25 anos ou pelo menos 02 filhos vivos, manifestação
por escrito, com anuência do cônjuge, se casada, com prazo mínimo de 60 dias entre a
com o advento do novo código, que no artigo 13 veda a disposição do corpo quando
pela sociedade. Prima facie, da leitura do aludido dispositivo legal, parece que será
externo que não se compatibiliza com sua mente, já que se sente como pessoa de sexo
oposto. Neste caso, comprovada por médicos a anomalia, poderá ser realizada a cirurgia
Por outro lado, no caso de homossexuais que pretendem apenas ser mais felizes
podendo algumas liberdades ser qualificadas como integrantes da tutela moral e até mesmo
86
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil, vol. 1. – São Paulo: Saraiva. 2003, p.204.
87
Esta posição não é unânime; em sentido contrário afirma Maria Celina Bodin de Moraes: “O princípio da
liberdade individual se consubstancia, cada vez mais, numa perspectiva de privacidade, de intimidade, de
exercício da vida privada. Liberdade significa, hoje, poder realizar , sem interferências de qualquer
gênero, as próprias escolhas individuais, exercendo-as como melhor convier.” MORAES, Maria Celina
Bodin de. Danos à pessoa humana: uma leitura civil-constitucional dos danos morais. – Rio de Janeiro:
Renovar, 2003. p. 107. No mesmo sentido BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos da personalidade – Rio
de Janeiro: Forense Universitária, 1999. p 101-105. MATTIA, Fábio Maria de. Direitos da personalidade:
aspectos gerais. Revista de Direito Civil. vol. 3. Ano 2, Janeiro/Março. – São Paulo: Revista dos Tribunais,
1978, pp. 34-51.
43
de locomover-se livremente, e esta sem dúvida é integrante da tutela física. O direito à
liberdade permite à pessoa humana exercer todas as liberdades individuais, tais como
participação em culto ou religião, associações não proibidas por lei, criação e locomoção
por todo o território brasileiro88, não podendo sofrer qualquer limitação, senão decorrente
decorrente de sanção legal. A restrição ou privação ilegal dão direito à imediata restauração
não faz muito tempo, o homem era submetido à condição de escravo, sem direito à
2 Integridade intelectual
humana em sua liberdade de raciocinar e de criar, de acordo com seus dons, podendo
88
Pontes de Miranda elencava nos direitos da personalidade várias liberdades, como liberdade de culto,
liberdade de arte, liberdade de reunião, etc. Cf. MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado.
Atualizado por Vilson Rodrigues Alves. Parte especial tomo VII – Campinas : Bookseller, 2000. p. 56. No
mesmo sentido é a doutrina de Luís A. Carvalho Fernandes, que afirma que direito à liberdade abarca as
várias modalidades de manifestação da liberdade individual, como liberdade de expressão, de culto e
religião, de emigração, etc. FERNANDES, Luis A. Carvalho, Teoria Geral do Direito Civil – Introdução
pressupostos da relação jurídica. – Lisboa: Universidade Católica Editora, 2001, vol. Ip. 219. Cf.
FERNANDES, Luis A. Carvalho, Teoria Geral do Direito Civil – Introdução pressupostos da relação
jurídica. – Lisboa: Universidade Católica Editora, 2001, vol. Ip. 220.
89
San Tiago Dantas entendia que a liberdade sexual da pessoa também estava preservada como direito da
personalidade, desde que não ofendesse direito de terceiros. DANTAS, San Tiago. Programa de direito
civil. – Rio de Janeiro: Forense. 2001, p. 157.
44
explorar comercialmente o produto de sua inteligência. Esta proteção está assegurada na
Constituição Federal em seu artigo 5º, incisos XXVII e XXVIII, e especialmente na Lei
através de terceiros, afirmando Caio Mário da Silva Pereira90: “ O indivíduo é senhor das
criações de seu espírito, e tem o direito de reprimir a divulgação, a não ser quando
autorizada.”
3. Integridade moral
honra, à vida privada, à intimidade, aos segredos pessoal e doméstico, à identidade, enfim,
aos direitos que integram a dignidade humana, que é princípio fundamental da República
efígie que espelha a pessoa fisicamente, não podendo ser exposta contra a vontade de seu
titular, com ou sem finalidade lucrativa, ainda que não lesione sua honra, respeitabilidade
ou fama, visto que a Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso X, declara inviolável a
90
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. vol. I. – Rio de Janeiro. Forense. 2004. p.
256.
45
imagem, não condicionando tal violação a nenhum efeito. Portanto, ninguém pode captar
ou publicar a imagem de outra pessoa sem seu consentimento, sob pena de estar ofendendo
para evitar violação por terceiros. A proteção contra a violação da imagem abrange pessoas
antes do advento do novo Código Civil, não era cuidado especificamente, e , para protegê-
lo, deveria o intérprete socorrer-se no art. 666, inciso X, do Código Civil de 1916, que
do qual a pessoa desfruta na sociedade em que está domiciliada, sendo a adequação de sua
conduta ao padrão médio de moralidade aceito numa determinada comunidade, que lhe
defere boa ou má reputação. Portanto, a pessoa tem o direito de defender sua reputação
a reunião dos conceitos que as demais pessoas estabelecem em face de suas condutas).
Quanto às pessoas jurídicas, a violação afeta a honra objetiva, que deverá ser analisada
Miranda91, e consagrado no artigo 5º, inciso V, primeira parte da Constituição Federal, que
assegura direito de resposta à pessoa que tenha sido ofendida em sua honra,
compreendendo também o direito de negar os fatos que maculem o objeto de tal direito. A
defesa pode ser manejada através de ação processual própria, e, no caso de violação através
riservatezza, ou seja, o direito de não ter sua imagem, retrato ou atributo, sua intimidade
ao ambiente familiar, que tem como sede o lar, o qual, por sua vez, é inviolável por
91
Cf. MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado. Atualizado por Vilson Rodrigues Alves. Parte
especial tomo VII – Campinas : Bookseller, 2000. pp. 63-70.
92
Carlos Alberto Bittar ressalta que este direito caracteriza-se pelo seu conteúdo negativo, que expressa a
não exposição a conhecimento de terceiros de elementos particulares da esfera reservada do titular,
impedindo o acesso dos mesmos à confidencialidade. BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos da
personalidade – Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999. p 108.
93
É muito tênue a diferença entre intimidade e vida privada. Arnaldo Rizzardo afirma que a intimidade
circunscreve ao circuito humano, à sua consciência, àquilo que se situa na esfera interior e que envolve
afeto, carinho, subjetividade. A privacidade diz mais com a vida pessoal, com os assuntos individuais e
particulares, com a gama de questões relativa à esfera pessoal. RIZZARDO, Arnaldo. Parte Geral do
Código Civil. – Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 155. Por seu turno, Caio Mário afirma que ambos foram
aproximados pela Constituição de 1988. PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. vol.
I. – Rio de Janeiro. Forense. 2004. p. 259.
47
disposição constitucional, como se vê no art. 5º, inciso XI, da Constituição Federal.
Todavia, tais direitos não são ilimitados, já que interesses coletivos poderão autorizar a
já que o que se pretende proteger dos olhares e curiosidades alheios são aspectos íntimos da
pessoa, que não devem ser conhecidos pelo público em geral, devendo ser ressaltado que
quanto maior for o prestígio da pessoa na comunidade, mais difícil será a preservação de
sua intimidade e vida privada em face do interesse público que sua vida pode despertar para
que somente podem ser restringidos com autorização judicial, para fins de construção de
muito recente, tendo em vista que somente com a promulgação da Constituição de 1.988
passou-se a prescrever tal tutela. Anteriormente a matéria era tratada pela jurisprudência
intimidade da pessoa.
por denominação própria que a identifique e a diferencie das demais pessoas. O nome
arts. 54 a 63 da Lei dos Registros Públicos e nos arts. 16 a 19 do Código Civil. O nome é
partículas da, do, das, dos, de, e o agnome, elemento aposto em último lugar filho,
pessoa, há: o vocatário, designação comum pela qual a pessoa é conhecida; o epíteto, a
pseudônimo, outro nome usado pela pessoa, normalmente em função de sua atividade
peculiar (como no caso dos artistas), que pode integrar o nome da pessoa, por força do art.
havendo por esse motivo quem defenda que o direito à identidade é inato96. Todavia, o
94
Cf. AMARAL, Francisco, ob. cit. p. 270.
95
“Les prénoms forment l’élement individuel du nom; ils servent à distinguer les différentes personnes de
la même famille.” PLANIOL, Marcel. Traité Élémentaire de Droit Civil. Tome Premier. – Paris: Librairie
Générale de Droit & de Jurisprudence, 1908. p. 154.
96
SILVA, Edson Ferreira da. Os direitos da personalidade são inatos? Revista dos Tribunais. Vol. 694, p.p.
21/34.
49
direito a ter nome certo é adquirido posteriormente ao nascimento97, tanto que atualmente
pode ser retificado, já que a redação atual do artigo 58 da Lei dos Registros Públicos não
veda a mutabilidade do prenome, embora a tradição seja pela imutabilidade do nome, visto
não ser normal que durante a vida a pessoa seja titular de diversos nomes, tal como
acontece com a pessoa jurídica, que por seu turno pode alterar várias vezes o nome,
Não se pode utilizar o nome alheio sem autorização do titular, sempre que
sobrevier exposição da pessoa, com ofensa à sua honra ou utilização para fins comerciais,
No artigo 5º, a Carta Magna estabelece vários direitos e garantias fundamentais, criando,
como afirma Gustavo Tepedino99, tutela geral de proteção e promoção da pessoa humana.
97
Cf. ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito civil teoria geral, vol. I, introdução as pessoas os bens. –
Coimbra: Coimbra Editora. 2000, p. 111
98
Neste sentido: É ela, a dignidade, o primeiro fundamento de todo o sistema constitucional posto e o
último arcabouço da guarida dos direitos individuais. NUNES, Luiz Antônio Rizzatto. O princípio
constitucional da dignidade da pessoa humana: doutrina e jurisprudência. – São Paulo: Saraiva. 2002, p. 45.
99
TEPEDINO, Gustavo. Temas de Direito Civil. – Rio de Janeiro : Renovar, 1999. p. 48.
50
A legislação infraconstitucional regulamenta as espécies dos direitos da
personalidade que estão protegidos pelo sistema jurídico, como por exemplo o Código
Civil nos artigos 11 a 21, a Lei 9.610/98, que estabelece regras de proteção ao direito do
autor, a Lei nº 8.069/90, arts. 7 a 69, que estabelece normas aos direitos fundamentais da
órgãos, etc. A eventual falta de legislação sobre um tipo específico dos direitos da
para a obtenção de uma tutela judicial que evite a transformação da ameaça em lesão a bens
meio pela qual atua a jurisdição, como se sabe, não é um fim em si mesmo. No dizer de
Federico Carpi100, deve servir de modo efetivo e concreto para a atuação do direito,
Marinoni101,
100
La provvisoria esecutorietà della sentenza, Milano, Giuffrè: 1979, p. 11, apud Novas Linhas de Processo
Civil, Luiz Guilherme Marinoni, passim.
101
MARINONI, Luiz Guilherme. Novas Linhas do Processo Civil. – São Paulo: Malheiros, 3 edição, p. 55.
51
“o processo de conhecimento clássico não foi estruturado para
atender a uma pretensão de tutela preventiva, o que se afigura
extremamente grave quando se percebe que os direitos não
patrimoniais, aí relacionados os direitos da personalidade e os
denominados “novos direitos”, não se compadecem de outra
forma de proteção. Embora os direitos não patrimoniais devam
ser tutelados de forma preventiva, para não sofrerem dano, a
ordem instrumental não lhes socorre.”
uma vez que são impotentes para impedir a violação de um direito, ou mesmo para impedir
direitos da personalidade, que carecem de proteção integral e urgente, em face dos danos
que a violação pode causar à pessoa humana. Neste sentido anota Danilo Doneda102:
102
DONEDA, Danilo. Os direitos da personalidade no novo Código Civil. In TEPEDINO, Gustavo,
coordenador. A parte geral do novo Código Civil – Estudos na perspectiva civil-constitucional. – Rio de
Janeiro: Renovar, 2002. p. 48.
103
“La tutela giurisdizionale dei diritti della personalità: strumenti e tecniche di tutela”, Foro italiano,
apud Novas Linhas de Processo Civil, Luiz Guilherme Marinoni, passim.
52
para permitir sua efetiva tutela, que evidentemente não é a tutela ressarcitória, é um sistema
incompleto ou falho.
A sociedade clama por justiça e lhe assiste inteira razão. A justiça materializa-se
adequado aos legítimos interesses dos postulantes. Deve-se partir da moderna concepção
processual da finalidade de seu contexto, para dar sentido e tornar eficaz a atuação da
criticar o excesso na aplicação de efetividade, como risco inerente a todo excesso. Todavia,
é preciso levar em conta a precisa lição de Barbosa Moreira, mencionado por Joel Dias
104
DINAMARCO, Cândido Rangel, A Instrumentalidade do Processo, São Paulo, Malheiros, 3 ed. P. 149.
105
JÚNIOR, Joel Dias Figueira. Comentários à novíssima reforma do CPC. Rio de Janeiro, Forense. 2002.
p. 8.
53
De acordo com Luiz Fux106, o problema da tutela jurisdicional é no momento
atual um tanto mais relevante, posto que o processo se encontra sob o crivo da
celeridade. Essa dissintonia entre o processo e as novas exigências revela uma crise,
possível de ser solucionada com novos instrumentos, diante do fenômeno dos “novos
direitos” ou “novos anseios”107. Assim, como nos primórdios da civilização, o anseio era de
justiça institucionalizada contra a justiça privada. Hoje, a grande aspiração social é a justiça
valor segurança jurídica. Essa prontidão da tutela jurisdicional ora preconizada se ajusta à
que “nenhuma lesão escapará à apreciação judicial” deve encaixar-se na tutela célere do
direito material. O decurso do tempo diante do direito evidente sem resposta já representa
uma “lesão”.
política, novas medidas são instrumentalizadas para tornar efetivo o “acesso à ordem
106
FUX. Luiz. Tutela de Segurança e Tutela de Evidência – Fundamentos da Tutela antecipada, Ed.
Saraiva, 1996, p.308.
107
A tutela do direito evidente, conforme anota Luiz Fux, pertence ao campo da “justiça” e não estritamente
ao campo do direito. A Escola da “norma fundamental” de Hans Kelsen, bem como os “neopositivistas, não
enxergam o valor “justiça” como fundamento do direito senão como uma “aspiração emocional”.
Entretanto, o processualista informa que está convencido pela doutrina de Miguel Reale, segundo a qual a
“teoria da justiça” como fundamento do direito nunca alcançou contornos tão vivos como no atual
momento, sobretudo na medida em que vieram adquirindo maior profundidade os estudos de axiologia ou
teoria dos valores.
54
jurídica”. O Prof. Kazuo Watanabe108 lembra que o acesso à justiça e seus correspondentes
instrumentos processuais deverão ser importantes mais pela potencialidade do uso e pela
mais eficazes e mais ajustados à natureza dos conflitos a serem solvidos, principalmente
quando envolve direitos da personalidade, deverá fazer com que, juntamente com o
conjunto de medidas adotadas, a nova mentalidade tão almejada seja efetivamente uma
realidade, fazendo com que, ao invés do paternalismo do Estado, tenhamos uma sociedade
civil mais bem estruturada, mais consciente e mais participativa, na qual os mecanismos
personalidade que exige, em muitos dos casos, ação para inibir o dano, e não compensação
impedir e fazer cessar ameaça ou lesão a direito da personalidade, tais como habeas
108
WATANABE, Kasuo. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor – comentários dos autores do
anteprojeto – Rio de Janeiro, Forense Universitária, 2 ed. p. 496.
109
Cf. JUNIOR, Eroulths Cortiano. Alguns apontamentnos sobre os chamados direitos da personalidade. IN
FACHIN, Luiz Edson(coordenação). Repensando fundamentos do direito civil brasileiro contemporâneo. –
Rio de Janeiro: Renovar, 1998. p.p. .34.
55
corpus, habeas data, mandado de segurança, medidas cautelares, antecipação das tutelas
genérica e específica, previstas nos arts. 273 e 461 do CPC. Entretanto, tais instrumentos
ainda são discretos para proteção aos direitos personalíssimos, já que em regra foram
antecipação dos efeitos da tutela, para evitar que seja publicado programa jornalístico que
de que não se pode censurar previamente as empresas jornalísticas. Nestes casos, todavia,
Caso houvesse uma tutela específica para proteção dos direitos da personalidade,
ressarcitória, que em muitos casos não compensa o dano sofrido aos direitos da
personalidade do autor.
a referida lesão aos direitos da personalidade dever ser compensada com o pagamento de
uma indenização, nos termos do artigo 186 do Código Civil, que serviria para compensar
tiver reflexo direto no patrimônio do ofendido. Como exemplo, exposição de imagem nua
por bens patrimoniais capazes de fazê-lo readquirir a vontade de viver e de ser feliz.
Portanto, de uma forma geral, pode-se afirmar que a proteção aos direitos da
pelo juiz de outras medidas de apoio, a fim de evitar a concretização da ameaça em lesão;
repressiva, através de imposição de sanção quando o dano foi concretizado, podendo esta
ser civil, com o pagamento de uma indenização ou multa, ou criminal, com pena
Em qualquer das hipóteses, a ação deverá ser proposta pelo próprio ofendido,
ofendido não pode ser representado contra sua vontade, com exceção dos incapazes.
Havendo vários ofendidos, qualquer um deles pode pleitear em nome próprio a reparação
exclusiva dos danos que sofreu, não podendo, contudo, incluir na lide, contra sua vontade,
57
Não obstante as críticas no sentido de que o atual código não inovou na
anteprojeto de Orlando Gomes, certo é que a inserção da matéria no novo texto representou
um avanço na proteção aos direitos personalíssimos, visto que o código revogado não
permissão legal, em face do disposto no artigo 13, parágrafo único, que autoriza a
disponibilidade para fins de transplante, ou que não atente contra os bons costumes e que a
pessoa não possa renunciar a tal direito, ainda que não queira desfrutar do mesmo, não se
deve ser estendida para compreender os direitos da personalidade também como: absolutos,
110
Neste sentido: REALE, Miguel O projeto do novo código civil. – São Paulo: Saraiva, 1999, p. 65.
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. vol. I. Teoria geral do direito civil. – São Paulo:
Saraiva, 2002, p.123. MOREIRA ALVES, José Carlos .“A parte geral do projeto do Código Civil” Revista
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Código Civil Brasileiro. ALVIM, Arruda, CÉSAR, Joaquim Portes de Cerqueira, ROSAS, Roberto,
coordenadores. Aspectos Controvertidos do novo Código Civil. – São Paulo: Revista dos Tribunais. 2003.
p.118.
58
já que não podem sofrer limitação voluntária; inatos, porque, como regra geral, nascem
desapropriação.
inibitório para cessar ameaça, embora não haja procedimento próprio e sedimentado no
sistema jurídico visando a inibição de futuro dano, devendo o ofendido se valer dos
instrumentos existentes no processo civil e em leis esparsas, ou outros que façam cessar os
danos em curso, autorizando o ofendido a pleitear indenização por dano material ou moral,
Estando a pessoa viva e capaz, não há dúvida de que somente ela está legitimada
a ingressar em juízo com ação própria. Se for incapaz, deverá ser assistida ou representada.
cônjuge supérstite, ou os parentes de qualquer grau da linha reta, e os parentes até o quarto
grau da linha colateral. Parece que o legislador esqueceu de inserir neste rol o companheiro
Observa-se que a legitimação dos demais parentes justifica-se por serem sucessores, nos
termos do art. 1.829 do Código Civil. Entretanto, por força do mesmo texto, arts. 1.790 e
parentes é a sucessão, igual direito terá o companheiro que, além de sucessor, também vivia
59
em união estável, reconhecida pela Constituição Federal como entidade familiar.
próprio corpo, visando proteger a vida humana, que é o bem supremo dentre os direitos da
Esta proteção irá implicar, entre outras, dificuldades para mudança de sexo e para cessão de
órgãos para transplantes, ressaltando que o parágrafo único do artigo 13 cria uma exceção à
regra, para permitir a disposição de órgãos para fins de transplante, na forma estabelecida
mudança de sexo, como já analisado, tratando-se de transexual que não aceita o corpo que
aparenta e, comprovado tal fato através de relatório médico, tem-se entendido ser possível
sexo para melhorar sua “performance”, não será possível acolher sua pretensão, em razão
60
da vedação prevista no caput do art. 13 do Código Civil.
visto que antes do advento do novo código havia uma única disposição no art. 53 do
como a não presunção fater is est quem justae nuptias demonstrant, ou seja, pai é aquele
que o prova através de casamento. Por outro lado, não permitindo a inseminação
parte, após a morte, para fins científicos ou altruístico, podendo tal disponibilidade ser
revogada até o momento da morte, não se aceitando a disposição onerosa, por completa
agressão aos bons costumes. Maria Helena Diniz111 afirma que tal preceito consagra o
princípio do consenso afirmativo, pelo qual a pessoa capaz deve manifestar sua vontade de
111
DINIZ, Maria Helena. Código Civil Anotado. – São Paulo: Saraiva, 2002, p. 30.
61
a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica com risco de vida, assumindo o médico
responsabilidade se praticar o ato sem autorização. Conclui-se que o paciente deve receber
do médico informações detalhadas acerca de seu estado de saúde, bem como do tratamento
a ser ministrado ou cirurgia a ser realizada, para que a autorização seja concedida
solução mais plausível para essas hipóteses é que no caso de inconsciência e sem parentes,
deve o médico envidar os esforços necessários para salvar o paciente, agindo de acordo
com seu código de ética e com sua habilidade técnica. No caso de cônjuge, companheiro ou
parentes sucessíveis estarem presentes, devem estes autorizarem, ou não, devendo o médico
que não andou bem, devendo ter estabelecido regra para esta hipótese, como fez o art. 33 e
seu parágrafo do Anteprojeto de Orlando Gomes. É verdade que no aludido dispositivo não
se fala em recusa com risco de vida. Todavia, em tese, quase todas as cirurgias podem
ocasionar algum risco de vida e, não comprovado o efetivo risco, o ofendido poderá obter
vantagem indevida oriunda de sua recusa. No caso de recusa à submissão a exame pericial,
a questão está resolvida com o disposto nos artigos 231 e 232 do Código Civil.
proteção à integridade moral, estabelecendo que toda pessoa tem direito ao nome, o que
para alguns autores não é direito inato, pois se adquire após o nascimento, com o registro
de família dos pais, identificando-se a pessoa pelo prenome e a família a que pertence pelo
nome de seus familiares. Nos casos de nascimento, casamento ou união estável, quando se
adquire o nome de outrem, esta aquisição é por direito próprio e não por transmissão.
mesmo que o usuário não tenha a intenção de difamá-lo, já que o nome, como direito da
relativamente indisponíveis, pode o titular ceder seu uso a terceiros, mediante algum tipo
permite o artigo 18 do mesmo diploma legal que o titular exerça o direito de cessar a
63
utilização indevida e, ainda, o direito de ser indenizado de todos os danos que sofreu.
feito o art. 58 da Lei dos Registros Públicos, que também protege o pseudônimo, ou seja,
falso nome utilizado por alguém de forma reiterada, que o leva a ser identificado pelo
mesmo. A aludida lei permite sua inserção no nome oficial, ou a substituição do nome pelo
pseudônimo conhecido.
normalmente criado pelo próprio titular com a finalidade de ocultar seu verdadeiro nome,
substituição pelo nome registrado. Desta forma, o pseudônimo não pode ser usado para
constranger seu titular, ainda que não haja intenção difamatória, tampouco pode ser
que, demonstrando lesão à honra, boa fama, respeitabilidade ou destinação para fins
comerciais, possa requerer ao Poder Judiciário que faça cessar a utilização ou exposição.
administração da Justiça, de forma que o criminoso não possa requerer que se encerre
exposição de sua imagem ou voz, quando a mesma é necessária para elucidar crime,
Federal, que proclama que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a
código, a pessoa pode expor um busto de outra pessoa no seu quintal, com acesso ao
público, sem que o retratado possa requerer a cessação da exposição, se de tal fato não
sobrevier agressão à sua honra, boa fama, respeitabilidade, ou tiver finalidade comercial.
condições do código , é ilícito, pois, de acordo com o Texto Maior, somente o autor da
114
“ 10 Abuso dell’immagine altrui. – Qualora l’immagine de una persona o dei genitori, del coniuge o dei
figli sta stata esposta o pubblicata fuori dei casi in cui l’esposizione o la pubblicazione è dalla legge
consentita, ovvero com pregiudizio al decoro o alla reputazione della persona stessa o dei detti congiuinti,
l’autoritá giudiziaria su rechiesta dell’isteressato, puó dispore che cessi lábuso, salvo il rissarcimento dei
danni.”
115
O art. 79 do Código Civil Português também é menos liberal que o dispositivo brasileiro, já que
estabelece como regra geral a prévia autorização do titular para exposição de sua imagem, com algumas
exceções, como notoriedade do cargo que a pessoa ocupa, exigências policiais ou da justiça, finalidades
científicas, didáticas, culturais, ou quando a imagem vier enquadrada em lugares públicos, ou fatos de
interesse público que tenham ocorrido publicamente.
65
imagem pode autorizar sua exposição, mesmo que esta não acarrete dano à sua pessoa.
seja, permite que os fatos ou os segredos da pessoa e de sua família fiquem restritos ao
titular ou aos seus familiares, afastando do conhecimento público tudo aquilo que não tem
relevância pública. Deve, contudo, ser considerada nesta proteção a vida pública da pessoa,
visto que, quanto mais famosa no campo da política, artes, esporte, etc., maior será a
jurídicas, no que for aplicável. Como se sabe, os direitos personalíssimos têm como origem
Consoante já visto, há autores que entendem que não se aplicam tais direitos às pessoas
116
JABUR, Gilberto Haddad. Limitações ao direito à própria imagem no novo código civil. In DELGADO,
Mário Luis e ALVES, Jones Figueirêdo. Questões convertidas no novo código civil. – São Paulo: Editora
Método, 2003, p. 40.
117
Fábio Ulhoa afirma: “Inviolabilidade da vida privada, assim, é o direito da personalidade que assegura
à pessoa a faculdade de selecionar quais dados (não públicos) sobre ela podem ou não ser divulgados, e
por que meios. Por ser um direito absoluto, todos indistintamente têm o dever de se abster de qualquer ato,
público ou privado, que importe na divulgação não desejada da informação.” COELHO, Fábio Ulhoa.
Curso de direito civil, vol. 1. – São Paulo: Saraiva. 2003, p.193.
66
jurídicas, pois toda agressão sempre terá reflexos patrimoniais, ou ainda, que estes direitos
são tão relevantes para a pessoa humana que não se pode banalizá-los, estendendo-os às
pessoas jurídicas. As aludidas posições estão superadas, uma vez que há muito tempo a
doutrina dominante e a jurisprudência têm entendido que cabe indenização por dano moral
contra a pessoa jurídica, como em casos de agressão a bens não patrimoniais, que podem
preciso ressaltar apenas que as pessoas morais fazem jus à proteção própria de sua natureza,
ou seja, proteção à integridade moral, e não à integridade física e intelectual, por serem
próprias e exclusivas dos seres humanos118. Assim, estará protegido o nome, segredo de
fusão, etc.
X – CONCLUSÃO
intelectual e moral, ou seja, corpo, mente e espírito, aplicando-se no que for compatível às
pessoas jurídicas.
sem esgotar o assunto, visto que a Constituição estabelece como um dos fundamentos da
desenvolvam o tema na medida em que os conflitos forem surgindo, sem perder de vista a
V- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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