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A UNIÃO DE FACTO:
EVOLUÇÃO.

PREÂMBULO

Pretende-se com o presente trabalho realizar uma análise da


evolução do instituto jurídico da união de facto em Portugal. Análise
forçosamente ligeira, porque o autor não possui talento, nem tem a
disponibilidade para realizar um trabalho que se pudesse pretender
exaustivo. São muitos os pormenores, os problemas, as questões que
os singelos onze artigos da Lei 7/2001, de 11 de Maio, nos levantam e
que pelos limites do trabalho não poderemos focar.

Por opção, não se abordará as questões relacionadas com o direito


internacional privado e o reconhecimento das uniões de facto
estrangeiras na nossa ordem jurídica. Sobre esta temática, existem
alguns trabalhos muito interessantes, dos quais salientamos um
artigo publicado na Revista da Ordem dos Advogados de Abril de
1999, da autoria de SOFIA OLIVEIRA PAIS e de ANTÓNIO FRADA DE SOUSA, bem
como um livro de GERALDO DA CRUZ ALMEIDA, intitulado "Da União de Facto,
Convivência More Uxorio em Direito Internacional Privado".

Pensámos que seria útil iniciar com uma noção de união de facto,
distinguindo-a de outros conceitos, antes de nos referirmos às
disposições legais que ao longo dos tempos se referiram à união de
facto.

Seguidamente, analisámos aspectos da Lei n.º 135/99, de 28 de


Agosto, entretanto revogada, mas que introduziu a primeira
sistematização da matéria em análise no direito português.
Simultaneamente, interpretamos a Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio,
actualmente em vigor, nalguns dos seus aspectos mais importantes.
Decidimos analisar estas leis em simultâneo, porque não existe uma
grande mudança nos seus artigos que justifique a análise em
capítulos diferentes.

Por fim, questionamos o futuro deste instituto, tentando perceber


qual será a sua evolução.

Tanto quanto fomos capazes, esforçámo-nos por ter sempre presente


um espírito crítico na interpretação das disposições legais que
possibilitasse realizar, neste trabalho, algo mais do que uma
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cronologia dos normativos, doutrina e jurisprudência atinentes às


uniões de facto.

NOÇÃO DE UNIÃO DE FACTO

Tanto a Lei n.º 135/99, de 28 de Agosto, como a Lei n.º 7/2001, de 11


de Maio, não nos apresentam uma noção de união de facto.
Certamente, porque o nosso legislador considerou desnecessária a
definição de um conceito jurídico para uma situação de facto
constatada pela sociedade e que se consubstancia numa convivência
de habitação conjugada com a existência de relações sexuais a que a
doutrina designa de comunhão de leito, mesa e habitação.

Estamos perante uma realidade semelhante ao casamento, mas que


não respeitou os requisitos de validade exigidos para este.

Pensamos ser útil apresentar uma pequena distinção entre


casamento, união de facto e economia comum.

Assim, podemos definir casamento como um contrato entre pessoas


de sexo diferente que pretendem constituir família tendo em vista
uma plena comunhão de vida no plano pessoal e, com excepção feita
ao casamento em regime de separação de bens, também patrimonial.

Diferentemente, a união de facto não implica a existência de


qualquer contrato escrito, podendo ser realizada com pessoas do
mesmo sexo, não sendo fonte de relações familiares entre os seus
membros e, consoante as perspectivas, podendo ou não estabelecer-
se uma plena comunhão de vidai[i] no plano pessoal, mas nunca no
plano patrimonial.

A união de facto, nos termos do artigo 1576º do Código Civil, não é


uma relação familiar, uma vez que estas nascem apenas do
casamento, parentesco, afinidade e da adopção. Contudo, esta não é
uma posição unânime na doutrina nacional. Os constitucionalistas
GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA partilham da opinião que a união de
facto é uma relação familiar. Baseiam este seu pensamento no artigo
36º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa por este
estabelecer que “Todos têm o direito de constituir família e de
contrair casamento em condições de plena igualdade”. PEREIRA COELHO e
GUILHERME DE OLIVEIRA classificam a união de facto como uma relação
parafamiliar.

A divergência entre os constitucionalistas referidos e a maioria da


doutrina e jurisprudência portuguesas reside no facto de aqueles
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atribuírem relevância ao facto de no texto do artigo 36º, n.º1 da CRP


se conceder o direito de constituir família antes do direito de contrair
casamento, pelo que concluem ser possível a constituição de família
fora do casamento, nomeadamente através das uniões de facto.

Na união de facto, as pessoas vivem em comunhão de habitação,


mesa e leito. Distingue-se do concubinato duradouro, por neste não
existir a comunhão de mesa e de habitação, mesmo na situação de os
concubinos possuírem uma casa onde se costumem encontrar.

A economia comum, por sua vez, e ao invés do que acontece com a


união de facto, vem definida no diploma legal que a reconhece e lhe
concede medidas de protecção. Assim, no artigo 2º da Lei n.º 6/2001,
de 11 de Maio, estabelece-se que a economia comum é a situação de
pessoas que vivam em comunhão de mesa e habitação há mais de
dois anos e tenham estabelecido uma vivência em comum de
entreajuda ou partilha de recursos.

Temos que na economia comum o número de pessoas não está


limitado a duas e que não se exige, embora possa existir, um
relacionamento sexual entre os seus membros. Os seus requisitos
fundamentais são o viverem na mesma casa, suportando em conjunto
as despesas atinentes à habitação e alimentação e, ainda, o facto de
um dos seus membros ser maior de idade (artigo 2º, n.º2, da Lei n.º
6/2001). Em nosso entender, o requisito da maioridade não se
compreende, podendo eventualmente ser inconstitucional por
violação do artigo 13º da Constituição da República Portuguesa.
Embora, possamos ser acusados de fugir ao tema proposto neste
trabalho, pensamos útil fundamentar “ao de leve” esta nossa
consideração.

Temos dificuldade em aceitar que o legislador permita que um


cidadão trabalhe, conquistando independência económica, a partir
dos 16 anos, mas não lhe reconheça a possibilidade de organizar,
partilhando, a sua vida numa situação de economia comum com
outros menores maiores de 16. A economia comum, como o próprio
nome o indica, mais não é do que uma micro-organização económica.
Aliás, para sermos rigorosos, a lei não proíbe as economias comuns
de menores, apenas não lhe atribui direitos. A exigência de
maioridade a um dos membros da economia comum, para que esta
possa usufruir dos direitos consagrados, não retira a menoridade aos
outros, e significa que um conjunto de menores, todos maiores de 16,
não podem usufruir de direitos legítimos que são atribuídos a
concidadãos de iguais características, mas que possuem na sua
economia comum um indivíduo maior de idade. Parece-nos uma clara
inconstitucionalidade por violação do princípio da igualdade. Recorde-
se que a doutrina e jurisprudência constitucionais concebem a
violação do princípio da igualdade como uma “discriminação
arbitrária, desprovida de fundamento ou justificação racional”.
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Acresce que, para cúmulo, o legislador reconhece uma união de facto


entre dois menores, desde que maiores de 16 anos, pelo que a ratio
legis não estará numa maturidade física ou psíquica dos seus
membros. Mas por mais que se reflicta, não somos capazes de a
encontrar!... Defeito nosso, provavelmente.

Veja-se que na união de facto temos todos os requisitos da economia


comum, dispensando-se a maioridade, e ainda exigindo-se um
requisito sexual. Pelo que o natural seria ser-se mais exigente nos
impedimentos de uma união de facto do que nos impedimentos de
uma situação de economia comum.

A UNIÃO DE FACTO ANTES DA LEI N.º135/99, DE 28 DE AGOSTO

Antes de se publicar a Lei n.º 135/99, de 28 de Agosto, não existia


qualquer sistematização jurídica relativa à união de facto no nosso
país. Existiam normas em diplomas avulsos que atribuíam um ou
outro direito/restrição a quem vivesse em condições análogas às dos
cônjuges. A quase totalidade destas ainda estão em vigor, até porque
a Lei n.º 135/99 e a Lei n.º 7/2001, nos seus n.º2 do artigo 1º
estabeleceu que nenhuma das suas normas prejudicaria a aplicação
de qualquer outra disposição legal ou regulamentar em vigor
tendente à protecção jurídica de uniões de facto.

Assim, antes de 28 de Agosto de 1999, encontrávamos normas


aplicáveis à união de facto como:

Constituição da República Portuguesa:

Artigo n.º 26º, n.º 1 (revisão de1997)

A todos são reconhecidos os direitos à identidade pessoal, ao


desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania,
ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da
intimidade da vida privada e familiar e à protecção legal contra
quaisquer formas de discriminação.

Artigo 36º, n.º 4 – Os filhos nascidos fora do casamento não podem,


por esse motivo, ser objecto de qualquer discriminação e a lei ou as
repartições oficiais não podem usar designações discriminatórias
relativas à filiação.
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Código Civil:

Artigo 495, n.º3 - Têm igualmente direito a indemnização os que


podiam exigir alimentos ao lesado ou aqueles a quem o lesado os
prestava no cumprimento de uma obrigação natural.

Artigo 953º

É aplicável às doações, devidamente adaptado, o disposto nos artigos


2192º a 2198º.

Artigo 1111º (versão da Lei n.º 46/85, de 20 de Setembro, revogada


pelo Decreto-lei n.º 321-B/90, de 15 de Outubro)

2 - No caso de o primitivo inquilino ser pessoa não casada ou


separada judicialmente de pessoas e bens, a sua posição também se
transmite, sem prejuízo do disposto no número anterior, àquele que
no momento da sua morte vivia com ele há mais de 5 anos em
condições análogas às dos cônjuges.

3 - A transmissão da posição de inquilino, estabelecido nos números


anteriores, defere-se pela ordem seguinte:

a) Ao cônjuge sobrevivo;

b) Aos parentes ou afins na linha recta, preferindo os


primeiros aos segundos, os descendentes aos ascendentes e
os de grau mais próximo aos de grau ulterior;

c) À pessoa mencionada no n.º 2.

Artigo 1691º (por analogia)

1. São da responsabilidade de ambos os cônjuges:

b) As dívidas contraídas por qualquer dos cônjuges, antes ou depois


da celebração do casamento, para ocorrer aos encargos normais da
vida familiar;
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Artigo 1871º, n.º1, alínea c) [na versão de 1966 era o art. 1860º, n,º1,
c)]

1. A paternidade presume-se:

c) Quando, durante o período legal da concepção, tenha existido


comunhão duradoura de vida em condições análogas às dos cônjuges
ou concubinato duradouro entre a mãe e o pretenso pai;

Artigo 1911º, n.º3 - Se os progenitores conviverem maritalmente, o


exercício do poder paternal pertence a ambos quando declarem,
perante o funcionário do registo civil, ser essa a sua vontade; é
aplicável, neste caso, com as necessárias adaptações, o disposto nos
artigos 1901º a 1904º.

Artigo 2020, n.º1 - Aquele que, no momento da morte de pessoa não


casada ou separada judicialmente de pessoas e bens, vivia com ela
há mais de dois anos em condições análogas às dos cônjuges tem
direito a exigir alimentos da herança do falecido, se os não puder
obter nos termos das alíneas a) a d) do artigo 2009º.

Artigo 2196º

1. É nula a disposição a favor da pessoa com quem o testador casado


cometeu adultério.

2. Não se aplica o preceito do número anterior:

a) Se o casamento já estava dissolvido, ou os cônjuges estavam


separados judicialmente de pessoas e bens ou separados de facto há
mais de seis anos, à data da abertura da sucessão;

b) Se a disposição se limitar a assegurar alimentos ao beneficiário.

Código de Processo Civil

Artigo 122º, n.º 1 - 1 – Nenhum juiz pode exercer as suas funções, em


jurisdição contenciosa ou voluntária:
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i) Quando esteja em situação prevista nas alíneas anteriores pessoa


que com o juiz viva em economia comum.

Artigo 618º

1 – Podem recusar-se a depor como testemunhas, salvo nas acções


que tenham como objecto verificar o nascimento ou o óbito dos
filhos:

d) Quem conviver, ou tiver convivido, em união de facto em


condições análogas às dos cônjuges com alguma das partes na
causa.

Código Penal:

Artigo 152º, n.º2 - A mesma pena é aplicável a quem infligir ao


cônjuge, ou a quem com ele conviver em condições análogas às dos
cônjuges, maus tratos físicos ou psíquicos.

Artigo 207º - No caso do artigo 203º e do n.º 1 do artigo 205º, o


procedimento criminal depende de acusação particular se:

a) O agente for cônjuge, ascendente, descendente, adoptante,


adoptado, parente ou afim até ao 2º grau da vítima, ou com ela viver
em condições análogas às dos cônjuges;

Código de Processo Penal:

Artigo 68º, n.º1 - Podem constituir-se assistentes no processo penal,


além das pessoas e entidades a quem leis especiais conferirem esse
direito:

c) No caso de o ofendido morrer sem ter renunciado à queixa, o


cônjuge sobrevivo não separado judicialmente de pessoas e bens, os
descendentes e adoptados, ascendentes e adoptantes, ou, na falta
deles, irmãos e seus descendentes e a pessoa que com o ofendido
vivesse em condições análogas às dos cônjuges, salvo se algumas
destas pessoas houver comparticipado no crime;
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Regime do Arrendamento Urbano

Artigo 85º (redacção anterior à Lei n.º 135/99, 28 de Agosto)

1 – O arrendamento para habitação não caduca por morte do


primitivo arrendatário ou daquele a quem tiver sido cedida a sua
posição contratual, se lhe sobreviver:

e) Pessoa que com ele viva há mais de cinco anos em condições


análogas às dos cônjuges, quando o arrendatário não seja casado ou
esteja separado judicialmente de pessoas e bens.

Decreto-lei n.º 420/76, de 28 de Maio

Artigo 1.º

1. Gozam do direito de preferência relativamente a novo


arrendamento para habitação, no caso de caducidade do anterior por
morte do respectivo titular, ainda que não fosse o primitivo
arrendatário, e sucessivamente:

a) O subarrendatário;

b) As pessoas a que se refere o artigo 1109.º do Código


Civil, desde que coabitem com o titular do
arrendamento caducado há mais de cinco anos.

2. Sendo várias as pessoas nas condições referidas na alínea b) do


número anterior, o direito de preferência caberá, em primeiro lugar,
às que viviam com o arrendatário em economia comum e, dentro de
cada categoria, às que com ele viviam ou coabitavam há mais tempo.

3. Em igualdade de condições, o direito de preferência, dentro de


cada uma das categorias referidas nas alíneas a) e b) do n.º 1 do
artigo 1109.º do Código Civil, deferir-se-á, sucessivamente, ao
parente mais próximo, ao afim mais próximo, à pessoa mais idosa de
entre os que, por força da lei ou de negócio jurídico que não respeite
directamente à habitação, convivam obrigatoriamente com o
arrendatário ou dele recebam alimentos e ao hóspede mais idoso.
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Regime do Arrendamento Rural

Artigo 23.º

1 - O arrendamento rural não caduca por morte do arrendatário,


transmitindo-se ao cônjuge sobrevivo, desde que não divorciado ou
separado judicialmente ou de facto, àquele que no momento da sua
morte vivia com ele há mais de cinco anos em condições análogas às
dos cônjuges e a parentes ou afins, na linha recta, que com o mesmo
viviam habitualmente em comunhão de mesa e habitação ou em
economia comum há mais de um ano consecutivo.

2 - A transmissão a que se refere o número anterior defere-se pela


ordem seguinte:

a) Ao cônjuge sobrevivo;

b) Aos parentes ou afins da linha recta, preferindo os


primeiros aos segundos, os descendentes aos ascendentes e
os de grau mais próximo aos de grau mais remoto;

c) À pessoa que vivia com o arrendatário há mais de cinco


anos em condições análogas às dos cônjuges.

4 - Pode haver duas transmissões mortis causa nos termos do


número anterior ou apenas uma quando a primeira transmissão se
operar a favor das pessoas referidas nas alíneas b) e c) do n.º 2.

Regime do Arrendamento Florestal

Artigo 19º

2 - O mesmo arrendamento não caduca por morte do arrendatário,


transmitindo-se ao cônjuge sobrevivo não separado de pessoas e
bens ou de facto, àquele que no momento da sua morte vivia com ele
há mais de cinco anos em condições análogas às dos cônjuges e a
parentes ou afins na linha recta que com ele vivessem em comunhão
de mesa e habitação ou em economia comum há pelo menos dois
anos.

3 - A transmissão a que se refere o número anterior defere-se pela


ordem seguinte:
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a) Ao cônjuge sobrevivo;

b) Aos parentes ou afins na linha recta, preferindo os


primeiros aos segundos, os descendentes aos ascendentes e
os de grau mais próximo aos de grau mais afastado;

c) À pessoa que vivia com o arrendatário há mais de cinco


anos em condições análogas às dos cônjuges.

Decreto-lei n.º 874/76, 28 de Dezembro (Lei das férias,


feriados e faltas)

Artigo 8º, n.º 5 – Salvo se houver prejuízo grave para a entidade


empregadora, devem gozar férias no mesmo período os cônjuges que
trabalhem na mesma empresa ou estabelecimento, bem como as
pessoas que vivam há mais de dois anos em condições análogas às
dos cônjuges.

Artigo 24º - 1 – Nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo anterior, o


trabalhador pode faltar justificadamente:

a) Até cinco dias consecutivos por falecimento de cônjuge não


separado de pessoas e bens ou de parente ou afim no 1º grau da
linha recta;

b) Até dois dias consecutivos por falecimento de outro parente ou


afim da linha recta ou 2º grau da linha colateral.

2 – Aplica-se o disposto na alínea b) do número anterior ao


falecimento de, pessoas que vivam em comunhão de vida e
habitação com os trabalhadores.

Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro (Reg. Jur. dos Acidentes de


Trabalho e Doenças Profissionais)

Artigo 17º, n.º 2 – As indemnizações são devidas enquanto o


sinistrado estiver em regime de tratamento ambulatório ou de
reabilitação profissional; mas serão reduzidas a 45% durante o
período de internamento hospitalar ou durante o tempo em que
correrem por conta da entidade empregadora ou seguradora as
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despesas com assistência clínica e alimentos do mesmo sinistrado, se


este for solteiro, não viver em união de facto ou não tiver filhos ou
outras pessoas a seu cargo.

Artigo 20º, n.º1 - Se do acidente resultar a morte, as pensões anuais


serão as seguintes:

a) Ao cônjuge ou a pessoa em união de facto: 30% da


retribuição do sinistrado até perfazer a idade de reforma por
velhice e 40% a partir daquela idade ou no caso de doença
física ou mental que afecte sensivelmente a sua capacidade de
trabalho;

3 – Qualquer das pessoas referidas nas alíneas a) e b) do n.º 1 que


contraia casamento ou união de facto receberá, por uma só vez, o
triplo do valor da pensão anual, excepto se já tiver ocorrido a remição
total da pensão.

Artigo 21º

1 – As pensões referidas no artigo anterior são acumuláveis, mas o


seu total não poderá exceder 80% da retribuição do sinistrado.

2 – Se as pensões referidas na alínea d) do n.º 1 do artigo anterior


adicionadas às previstas nas alíneas a), b) e c) excederem 80% da
retribuição do sinistrado, serão as prestações sujeitas a rateio,
enquanto esse montante se mostrar excedido.

Artigo 22º

1 – O subsídio por morte será igual a 12 vezes a remuneração mínima


mensal garantida mais elevada, sendo atribuído:

a) Metade ao cônjuge ou à pessoa em união de facto e metade aos


filhos que tiverem direito a pensão nos termos da alínea c) do n.º 1
do artigo 20º;

b) Por inteiro ao cônjuge ou pessoa em união de facto, ou aos filhos


previstos na alínea anterior, não sobrevivendo, em simultâneo,
cônjuge ou pessoa em união de facto ou filhos.
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Código Cooperativo, de 7 de Setembro de 1996

Artigo 42º, n.º 2 – Não podem ser eleitos para o mesmo órgão social
de cooperativas com mais de 20 membros ou ser simultaneamente
membros da direcção e do conselho fiscal os cônjuges e as pessoas
que vivam em união de facto.

Código de Procedimento Administrativo (DL n.º442/91, 15/11


alterado pelo DL n.º6/96, 31/1)

Artigo 44º, n.º1 – Nenhum titular de órgão ou agente da


Administração Pública pode intervir em procedimento administrativo
ou em acto ou contrato de direito público ou privado da
Administração Pública nos seguintes casos:

b) Quando, por si ou como representante de outra pessoa, nele tenha


interesse o seu cônjuge, algum parente ou afim em linha recta ou até
ao 2º grau da linha colateral, bem como qualquer pessoa com quem
viva em economia comum;

g) Quando se trate de recurso de decisão proferida por si, ou com a


sua intervenção, ou proferida por qualquer das pessoas referidas na
alínea b) ou com intervenção destas.

Decreto-lei n.º 413/93, de 23 de Outubro

Artigo 6º

1 - Considera-se equiparado ao interesse dos titulares de órgãos,


funcionários e agentes, nas situações previstas nos artigos 3.º e 4.º
do presente diploma, o interesse:

a) Do seu cônjuge, não separado de pessoas e bens, dos seus


ascendentes e descendentes em qualquer grau e dos colaterais até
ao 2.º grau, bem como daquele que com ele viva nas condições do
artigo 2020.º do Código Civil;
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Decreto-lei n.º 24/84, de 16 de Janeiro (Estatuto Disciplinar


dos Funcionários e Agentes da Administração Central,
Regional e Local)

Artigo 52.º, n.º 1 - O arguido e o participante poderão deduzir a


suspeição do instrutor do processo disciplinar com qualquer dos
fundamentos seguintes:

b) Se o instrutor for parente na linha recta ou até ao terceiro grau na


linha colateral do arguido, do participante, ou de qualquer
funcionário, agente ou particular ofendido, ou de alguém que com os
referidos indivíduos viva em economia comum;

Para além destas normas ainda existem outras destinadas a proteger


a união de facto que podemos encontrar nos seguintes diplomas:

- Decreto-lei n.º 142/73, de 31 de Março, alterado pelo


Decreto-lei n.º71/97, de 3 de Abril;

- Decreto-lei n.º 497/88, de 30 de Dezembro, alterado pelo


Decreto-lei n.º178/95, de 26 de Julho e pelo Decreto-lei n.º
101-A/96, de 26 de Julho;

- Decreto-lei n.º 498/88, de 30 de Dezembro, alterado pelo


Decreto-lei n.º215/95, de 3 de Agosto;

- Decreto-lei n.º 322/90, de 18 de Outubro;

- Decreto-lei n.º223/95, de 8 de Setembro;

- Lei n.º 19-A/96, de 29 de Junho;

- Decreto-lei n.º133/97, de 30 de Maio;

A jurisprudência abordou por diversas vezes a questão da união de


facto, reconhecendo, via de regra, alguns efeitos jurídicos mormente
de assistência social e garantia de habitação.

É disto exemplo o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 21 de


Novembro de 1985, publicado no Boletim do Ministério da Justiça n.º
351, pág. 429 e que se transcreve parcialmente:

“I – A Constituição da República Portuguesa – artigo 36º, n.º 1 –


apenas quis reconhecer aos cidadãos o direito de constituírem família
independentemente do casamento, atribuindo à "união de facto"
alguns efeitos jurídicos, sem equiparar as duas figuras jurídicas.
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II – A consagração pontual de determinados efeitos jurídicos da


"união de facto" não pode ser aceite como afloramento de um
princípio geral na nossa ordem jurídica, reconhecido por uma norma
hierárquica superior, de equiparação de "união de facto" ao
casamento.

III – O legislador, muito cautelosamente, tem vindo a estender à


"união de facto" alguns efeitos jurídicos que se situam, porém,
somente no âmbito da assistência social, direito a alimentos e
garantia de habitação.”

Outro exemplo é o Acórdão da Relação de Lisboa de 24 de


Outubro de 1985, publicado no Boletim do Ministério da Justiça,
n.º357, pág. 476:

“No caso de regulação do poder paternal entre pais não casados


entre si, é legalmente possível, olhando, nomeadamente, aos
interesses dos filhos de ambos, a transmissão do direito ao
arrendamento de um para outro, independentemente do
consentimento do senhorio.”

Ou relativo ao direito de alimentos, o Acórdão do STJ de 18 de Março


de 1986, publicado no BMJ n.º 355, pág. 392:

“I – A convivência análoga à dos cônjuges, referida no n.º 1 do artigo


2020º do Código Civil, não exige que o companheiro falecido não
fosse casado ou que estivesse separado judicialmente de pessoas a
bens.

II – O direito a alimentos conferido na mesma disposição só exige,


quanto à falta de vínculo conjugal ou à sua suspensão por separação
judicial de pessoas e bens por parte do companheiro falecido, que
qualquer destes estados se verificasse no momento da sua morte.”

Para um conhecimento mais profundo da nossa jurisprudência


relativa à união de facto, poder-se-á consultar o anexo I deste
trabalho.
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A doutrina, acima de tudo, abordava o tema da união de facto


lateralmente, via de regra algumas páginas ou apenas parágrafos em
livros de direito da família ou em artigos de revistas jurídicas. Poucos
os textos dedicados exclusivamente à união de facto. Estes poucos
quase sempre numa perspectiva de direito internacional privado. E é
natural que assim fosse, pois não havia uma sistematização jurídica
em Portugal sobre as uniões de facto, mas já existia noutros países,
nomeadamente nos países da Europa do Norte, Escandinavos e na
Holanda.

A UNIÃO DE FACTO APÓS A LEI N.º 135/99, DE 28 DE AGOSTO

Relevância jurídica da união de facto

Na Lei n.º 135/99, só as relações heterossexuais tinham relevância


jurídica. Nenhum dos efeitos jurídicos se aplicava às uniões
homossexuais. Hoje, na vigência da Lei n.º 7/2001, já não é assim. Os
efeitos jurídicos verificam-se quer as uniões sejam heterossexuais,
quer sejam homossexuais.

O nosso ordenamento jurídico atribui relevância jurídica às uniões de


facto que tenham alguma estabilidade, durabilidade. Definiu o
legislador na Lei n.º 135/99, o que manteve na Lei n.º 7/2001, que a
união de facto só teria relevância jurídica se subsistisse há mais de
dois anos.

Esta disposição legal veio, de alguma forma, uniformizar o critério


para o reconhecimento e atribuição de direitos. É que, anteriormente,
existiam disposições que exigiam durações diferentes da relação: 1
ano (rendimento mínimo garantido), 2 anos (benefício de faltas para o
tratamento ambulatório do companheiro(a)) ou 5 anos (transmissão
de arrendamento em caso de morte do primitivo arrendatário).

Pensamos, contudo, que as disposições legais que estabeleçam


prazos diferentes a “há mais de dois anos” mantêm-se inalteradas,
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por força do disposto no artigo 1º, n.º 2 da Lei n.º 135/99 e da Lei n.º
7/2001. Acreditamos é que para o futuro o legislador atenderá ao
critério estabelecido para legislar nesta matéria. Isto, para além de já
ter corrigido, nomeadamente, o artigo 85º do RAU, passando de “há
mais de 5 anos” para “há mais de dois anos”.

Questão importante é saber como é que se pode provar a existência


da relação em união de facto por um período superior a dois anos, se
não existe, como no casamento, um registo civil de onde se possa
extrair uma certidão.

Esta é uma questão interessante, porque revela um dos problemas


que se poderão levantar com as uniões de facto e a actual legislação.

Assim, tanto a Lei n.º 135/99 como a Lei n.º 7/2001 nada dizem
a este respeito e, apesar de o artigo 9º da Lei n.º 7/2001 conter uma
disposição em que a Assembleia da República atribui ao Governo a
função de publicar, no prazo de 90 dias, os diplomas regulamentares
das normas da presente lei que de tal careçam, estes diplomas nunca
foram publicados. E os 90 dias há muito que passaram... Disposição
semelhante também existia na Lei n.º 135/99 onde se constatou a
mesma inércia legislativa.

Pelo que, e por enquanto, a resposta a esta questão encontrar-


se-á nas normas gerais sobre provas.

Em nosso entender, a prova de que uma união de facto dura há mais


de dois anos far-se-á, conforme os casos, através de testemunhas ou
através de uma mera declaração, sob o compromisso de honra, dos
unidos de facto. Ora, esta solução parece-nos evidente, uma vez que
não existem registos de uniões de facto nas Conservatórias do
Registo Civil, como acontece com o casamento, nem as Câmaras
Municipais passam certificados comprovativos da existência da união
como se verifica em Espanha e França.

Nem nunca poderão existir registos obrigatórios à semelhança do


casamento!!! É nossa convicção que se se exigissem registos
obrigatórios das uniões de facto, estas transformar-se-iam em uniões
de direito e não de facto. Quem se une de facto, fá-lo por não querer
unir-se de direito. Se se exige um registo, estamos a obrigar um casal
a assumir juridicamente uma relação que não pretende juridicamente
assumida. Será um contra-senso.

Outra solução plausível seria o recurso a uma acção judicial para que
o Tribunal declarasse a existência da união de facto – acção de
simples apreciação positiva. Com a sentença, os unidos de facto
poderiam provar que a sua união teria uma duração superior a dois
anos ou que a sua relação se iniciara em determinado dia. Contudo,
esta solução poderá ser perigosa, porque permite aproveitamentos
de um dos unidos de facto, mesmo após uma separação do casal.
17

Nada impediria o ex-unido de facto de apresentar a sentença, sem


conhecimento do(a) ex-companheiro(a), para provar junto de
terceiros que vive em união de facto, enganando-os e causando-lhes
graves prejuízos. Não apreciamos esta solução e pensamos que
deveria existir um diploma regulamentar da Lei n.º 7/2001 que
proibisse tal procedimento e que estabelecesse a obrigatoriedade de
a prova da união de facto se concretizar em cada momento que seja
necessária, mediante declaração dos unidos de facto.

Também reconhecemos que provando-se a união através de


testemunhas ou de declaração dos unidos de facto, abre-se a
possibilidade de o casal, individual ou colectivamente, prestar falsas
declarações às Finanças, à Segurança Social, ao Estado, à entidade
patronal e ao senhorio para poder beneficiar dos direitos atribuídos
pela lei às uniões de facto em matéria de impostos sobre o
rendimento, pensões, férias, feriados, faltas, licenças e preferência na
colocação dos funcionários da Administração Pública, contrato de
arrendamento, e sucessões [no caso de morte do(a) companheiro(a)].

Todavia, o facto de se exigir uma declaração dos dois companheiros,


em cada momento em que se pretenda usufruir dos direitos
atribuídos às uniões de facto, implica a participação de ambos, ao
contrário de uma sentença que pode ser usada unilateralmente e à
revelia do outro.

Também existe doutrina que sugere, igualmente, a realização de


escrituras notariais ou declarações de Juntas de Freguesia para
comprovar a existência de uniões de facto.

Impedimentos para a atribuição de efeitos jurídicos às uniões


de facto

Os impedimentos no que concerne à atribuição de efeitos às uniões


de facto são os mesmos na Lei n.º 135/99, de 28 de Agosto e na Lei
n.º 7/2001, de 11 de Maio. A alteração existente resume-se a
questões linguísticas.

Assim, temos como impeditivos da produção de efeitos jurídicos


previstos nestas leis a idade inferior a 16 anos; a demência notória,
mesmo nos intervalos lúcidos, e interdição ou inabilitação por
18

anomalia psíquica; o casamento anterior não dissolvido, salvo se tiver


sido decretada separação judicial de pessoas e bens; o parentesco na
linha recta ou no 2º grau da linha colateral ou afinidade na linha
recta; e a condenação anterior de uma das pessoas como autor ou
cúmplice por homicídio doloso ainda que não consumado contra
cônjuge do outro.

As relações entre pessoas previstas no artigo 2º de ambas as leis são


uniões de facto. Não há lei nenhuma capaz de separar factualmente o
que as pessoas de facto, na realidade, unem. Contudo, estas uniões
de facto não usufruem de direitos estipulados nesta lei. Os seus
titulares, mesmo vivendo há mais de 2 anos em união, não têm
direito a ver produzidas nas suas esferas jurídicas os efeitos previstos
no artigo 3º, 7º e na lei geral por remissão do artigo 1º, n.º 2, todos
da Lei n.º7/2001.

É importante realçar que este artigo 2º deve ser sujeito a uma


interpretação restritiva. É compreensível que o legislador não atribua
os direitos previstos na lei, mas seria incompreensível, injusto e
irresponsável ilibar os unidos de facto das responsabilidades, dos
deveres, emergentes dessa união. Veja-se a título de exemplo na
injustiça que seria a não presunção de paternidade, se durante o
período de concepção a união de facto subsistisse.

Às uniões de facto excluídas pelo artigo 2º da Lei n.º 7/2001, aplicar-


se-á a Lei n.º 6/2001, de 11 de Maio, que versa sobre as relações de
pessoas que vivam em economia comum, desde que esta persista há
mais de 2 anos (art. 1º, n.º 1, da Lei n.º6/2001). Ideia esta reforçada
pelo teor do n.º 3 do artigo 1º da Lei n.º 6/2001.

Pensamos interessante abordar alguns pontos referentes a estes


impedimentos.

Assim, quanto à idade mínima de 16 anos para a atribuição de


efeitos à união de facto, é curioso notar que da conjugação dos
artigos 2º, alínea a) e n.º 1 do artigo 1º (...há mais de dois anos) da
Lei n.º 7/2001 se deduz que a nossa ordem jurídica atribui direitos a
uniões iniciadas em violação de normas imperativas da nossa
legislação, isto é, reconhece direitos a uniões de facto que se tenham
iniciado com membros de 14 ou 15 anos de idade. O que contrasta
com os artigos 172º, 173º e 174º do Código Penal que penalizam este
tipo de relações sexuais com pena de prisão. Parece-nos uma
incoerência do sistema.

No que concerne à demência notória , mesmo nos intervalos


lúcidos, há alguma doutrina que defende a desnecessidade da
referência na lei aos intervalos lúcidos, uma vez que a união de facto
é uma situação contínua e, por isso, não há, como no casamento, um
momento lúcido em que o unido de facto possa manifestar a sua
19

vontade de viver em união. Para a união de facto produzir efeitos a


manifestação da vontade terá de ser contínua por mais de dois anos.

Questão interessante é analisar o que acontece a uma união de facto


com mais de dois anos, pelo que atribuidora de efeitos jurídicos, se
um dos membros se tornar entretanto demente, interdito ou
inabilitado por anomalia psíquica. Deixa de produzir efeitos por força
do artigo 2º da Lei n.º 7/2001 ou o companheiro do demente,
interdito ou inabilitado por razões psíquicas goza de direitos
adquiridos?

Na linha de pensamento de FRANÇA PITÃO, entendemos que a demência


de um dos unidos de facto não impede que a união produza efeitos
jurídicos, assegurados que estejam os requisitos legais previstos no
artigo 1º, n.º 1, da Lei n.º 7/2001, isto é a convivência em união de
facto há mais de dois anos.

Outro impedimento é o casamento anterior não dissolvido, salvo


se tiver sido decretada a separação judicial de pessoas e
bens. O objectivo deste impedimento não é, como no casamento,
evitar a bigamia. Tão só a defesa da moralidade. Assim pensa FRANÇA
PITÃO com quem concordamos. A lei, ao não atribuir efeitos jurídicos a
uma união de facto sem que haja uma separação judicial de pessoas
e bens, pretende que o cônjuge separado de facto e que viva em
união de facto regularize a situação, se não através de um divórcio,
pelo menos através de uma separação judicial de pessoas e bens.
Desta forma evitar-se-ão conflitos de interesses e de direitos entre
cônjuge e unido de facto, por exemplo quanto ao direito a usufruir de
pensão de preço de sangue ou por morte resultante de acidente de
trabalho.

Temos, ainda, como impedimento o parentesco na linha recta ou


no segundo grau da linha colateral ou afinidade na linha
recta. As razões são evidentes. Umas de ordem eugénica, outras de
ordem moral e social. O parentesco é impedimento para evitar o
nascimento de crianças com malformações, e também porque a
sociedade condena este género de relação. Na afinidade não existe o
problema da malformação de crianças, mas subsiste a questão moral
e social.

Aqui, em ambas as leis, o legislador esqueceu-se de impedir os


efeitos jurídicos da união de facto entre adoptante e adoptados. O
que é, a nosso ver, grave. As razões de ordem moral e social acima
referidas para o parentesco e a afinidade, mantêm-se na adopção. As
razões de ordem eugénica mantêm-se para os parentes biológicos do
adoptado. Pensamos que numa futura alteração legislativa, esta
situação merece ser revista.

Por fim, o último dos impedimentos previstos é a condenação


anterior de uma das pessoas em união de facto como autor ou
20

cúmplice por homicídio doloso ainda que não consumado


contra o cônjuge do outro. A lei prevê o impedimento apenas se
existir uma condenação no momento em que as pessoas se unem de
facto. Se o membro da união de facto ainda for arguido, não existe
impedimento à produção de efeitos jurídicos da união de facto, como
não existirá enquanto a sentença condenatória não tiver transitado
em julgado. Só a união de facto iniciada depois do trânsito em julgado
da condenação é que cria o impedimento.

O unido de facto terá de ser condenado como autor ou cúmplice, não


se exigindo a consumação do crime, pelo que a tentativa é punível.

Depois, terá de haver dolo directo, necessário ou eventual, não se


bastando a negligência para se produzir o impedimento.

Efeitos da união de facto

Segundo PEREIRA COELHO e GUILHERME DE OLIVEIRA, o facto de a Lei n.º7/2001


se destinar a uniões de facto, independentemente do sexo, não quer
isto dizer que todos os seus efeitos se apliquem a todas as uniões de
facto, sejam heterossexuais ou homossexuais.

Para além do artigo 7º que se dedica à adopção, e que


expressamente afirma não se aplicar a uniões de facto homossexuais,
a heterossexualidade é condição de eficácia dos efeitos que exigem,
por natureza, a diversidade sexual, como por exemplo os dos artigos
1911º, n.º 3 e 1871º, n.º 1, al. c) do Código Civil.

Na óptica destes dois insignes professores, só se aplicam às uniões de


facto homossexuais os efeitos constantes dos artigos 3º e 5º da Lei
n.º 7/2001. A explicação para tal interpretação poder-se-á resumir,
cremos que sem deturpação, no facto de o legislador que criou ao
longo dos tempos normas protectoras das uniões de facto, nunca ter
previsto uniões homossexuais, pelo que não haverá legitimidade
para, hoje, atribuirmos os direitos previstos a uniões heterossexuais
às uniões de facto homossexuais.

Reconhecendo valor à posição dos professores de Coimbra, não


percebemos por que não se haverá de realizar uma interpretação
correctiva dessas normas que mantenha a unidade do sistema
21

jurídico tendo em conta as condições específicas do tempo em que


são aplicadas, de acordo com o artigo 9º do Código Civil.

Confessamos que a interpretação da expressão «condições análogas


às dos cônjuges» quando aplicada a uma realidade homossexual
levantou-nos algumas dúvidas.

Será que um casal homossexual unido de facto vive em situação


análoga, idêntica, semelhante à de um casal heterossexual casado?
Da resposta a esta questão depende a atribuição ou não, aos unidos
de facto homossexuais, das medidas de protecção previstas na Lei n.º
7/2001.

Para ANTUNES VARELA e PIRES DE LIMA, a expressão «condições análogas às


dos cônjuges» significa que os “companheiros não só mantêm
notoriamente relações de sexo, mas vivem também de casa e
pucarinho um com o outro, com comunhão de mesa, leito e
habitação, como se fossem de facto cônjuges um do outro” (itálico
dos autores). Estes autores ainda dizem que não é “necessário (...) a
convicção, por parte do público, de que os companheiros são
casados”.

Também, a jurisprudência já definiu o conceito de «condições


análogas às dos cônjuges», nomeadamente no acórdão do STJ de 5
de Junho de 1985, publicado no BMJ n.º 348, pág. 428 e seguintes,
“esquecendo-se” da necessidade de comunhão de habitação. Já
definiu correctamente o conceito em causa no acórdão do STJ de 21
de Novembro 1985, publicado no BMJ, n.º 351, pág. 429 e seguintes,
abarcando aquela expressão a comunhão de cama, mesa e
habitação.

É verdade que a expressão cônjuges significa estado de pessoa


casada em relação ao outro esposo. É, igualmente, verdadeiro que as
pessoas só se podem casar com outras de sexo diferente. Logo, não
existem cônjuges do mesmo sexo. Contudo, parece-nos que o critério
decisivo não estará em saber se o casal homossexual se “confunde”
com um heterossexual e se tem a possibilidade ou não de se casar,
mas sim em saber se vivem à semelhança de um casal heterossexual,
isto é, em comunhão de leito, mesa e habitação.

Parece-nos que a resposta terá de ser positiva, pois um casal


homossexual vive em comunhão de leito, mesa e habitação à
semelhança de um casal heterossexual.

Parece-nos, também, que a não atribuição dos mesmos direitos a


situações de facto iguais por razões de diferença meramente sexual,
seria uma discriminação por razão de sexo, logo uma eventual
violação do disposto no artigo 13º da CRP.
22

Assim, entendemos que todas as disposições no ordenamento jurídico


português atinentes à união de facto são aplicáveis às uniões
homossexuais, desde que estas não se encontrem expressamente
excluídas e desde que não sejam impossibilitadas pela própria
natureza, isto é, desde que não impliquem a heterossexualidade.

Concluída esta anotação prévia, debrucemo-nos sobre os efeitos


pessoais e patrimoniais a que a união de facto dá lugar.

a) Efeitos pessoais

A doutrina é unânime em concordar que os unidos de facto não


usufruem do direito de acrescentar ao seu nome o apelido do outro,
nem a sua relação lhes permite a aquisição da nacionalidade.
Também, não existe discordância quanto aos efeitos pessoais
expressamente previstos na legislação, tais como a permissão da
adopção, se a relação durar há mais de 4 anos e os seus membros
tiverem mais de 25 anos; o direito a recusar-se a depor como
testemunha; o direito de gozar férias no mesmo período, se
trabalharem na mesma empresa ou na Administração Pública; ou a
presunção de paternidade, se existir, no período legal da concepção,
comunhão duradoura.

Contudo, já existem diferenças de pontos de vista no que concerne


aos deveres de respeito, fidelidade, coabitação, cooperação e
assistência, previstos para o casamento no artigo 1672º do Código
Civil. PEREIRA COELHO e GUILHERME DE OLIVEIRA defendem que não existe
qualquer efeito pessoal, quanto a estes deveres, decorrente de uma
relação de união de facto. Já FRANÇA PITÃO considera que estes deveres,
poder-se-ão aplicar às uniões de facto, criando inclusive o direito a
indemnizar nos termos gerais, agravado pela relação existente entre
os companheiros. Na aplicação destes deveres às uniões de facto
verificar-se-ão âmbitos diferentes face ao regime do casamento.

Assim, para este último autor, a infidelidade na união de facto é


apenas reprovável no plano ético ou social, por não existir disposição
legal que crie o dever de fidelidade, mas susceptível de criar a
obrigação de indemnizar nos termos gerais. Tal como GUYON considera
que subsiste sempre um dever especial de sinceridade.

Na sua óptica, existe um dever de respeito em duas vertentes: dever


geral de respeito; e um especial dever de respeito. A primeira mais
não é do que o respeito que qualquer cidadão deve ter face aos
direitos de personalidade e liberdades individuais de outro
23

concidadão. A segunda consiste no facto de cada um dos membros


da união de facto, em consequência da própria relação, dever possuir
um maior empenho no respeito do outro do que o comum cidadão.

A violação deste dever para além da sanção social, poderá ser motivo
de sanção criminal (crime contra a honra ou pessoa) e civil nos
termos gerais.

Quanto ao dever de coabitação, podemos afirmar que ele está


previsto nas Leis n.º 135/99 e 7/2001, pois a união de facto para
existir implica comunhão de habitação. Sem esta não existe união de
facto. Ora, assim, a coabitação para além de dever, é condição de
existência da união.

Por fim, no que concerne ao dever de assistência e de cooperação,


aquele autor refere que, embora sem penalizações à sua violação,
existe o dever de contribuir para os encargos da vida familiar e que
sem este não existiria uma plena comunhão de vida entre os unidos
de facto. Considera, também, que a prestação de alimentos em caso
de morte do outro membro da união se inclui no âmbito deste dever,
apesar de aparecer desvirtuado tal o carácter de patrimonialidade
que assume na nossa legislação.

Nesta matéria, discordamos de FRANÇA PITÃO, PEREIRA COELHO e GUILHERME DE


OLIVEIRA. Do primeiro, porque afirma existirem todos os deveres
conjugais (se bem que com nuances) menos o da fidelidade, dos
outros por considerarem que não existe nenhum. Pensamos, pois, que
não existem deveres conjugais na união de facto, excepção feita ao
dever de coabitação. Os outros deveres conjugais poder-se-ão exigir
ao companheiro, não por ser companheiro, mas porque se exigem a
todos os cidadãos. E é nesta mesma medida que se lhe poderão ser
exigidos. Se dúvidas houver, facilmente são superadas pela análise
dos argumentos justificativos da eventual indemnização –
indemnização a conceder nos termos gerais. Se é nos termos gerais,
então o companheiro está no mesmo patamar de qualquer outro
cidadão. Quanto ao dever da coabitação, ele existe e a sanção à sua
não verificação é a própria extinção da união de facto.

Em nossa opinião, basta a não exigência de um dos deveres conjugais


ou a impossibilidade de adquirir um apelidos do outro membro da
união para, legitimamente, se poder afirmar que na união de facto
não existe plena comunhão de vida no plano pessoal. Discordamos,
assim, da perspectiva de FRANÇA PITÃO.
24

b) Efeitos patrimoniais

No casamento, o legislador definiu um conjunto de regimes de bens,


permitindo aos casais a opção por um deles. Nestes regimes prevê-se
toda a relação patrimonial entre os cônjuges e entre estes e terceiros.

Na união de facto não existe um regime legal de bens pré-definido


com o objectivo de regular o seu património comum, pelo que aos
unidos de facto aplica-se o regime geral das relações obrigacionais e
reais.

Assim, os unidos de facto podem realizar os contratos que lhes


apetecer, sendo únicos proprietários dos bens que compram, e
podendo vender, sem necessidade do consentimento do outro, os
seus bens próprios. Podem, igualmente, negociar entre si. Agem
como sendo solteiros, estranhos. Existe uma excepção a esta regra.
Trata-se do disposto no artigo 953º que remete para o artigo 2196º,
ambos do Código Civil. Isto é, é nula a doação de um bem a pessoa
com quem o doador casado cometeu adultério.

Se a regra é a propriedade exclusiva do bem que o unido adquire,


existem contudo excepções. Podem adquirir bens para ambos ficando
abrangidos pelo instituto jurídico da compropriedade e, ainda, bens
de propriedade comum, que será o caso de bens para fazer face às
necessidades da vida em comum (ex.: alimentos, produtos
farmacêuticos, etc.).

Como já dissemos a lei não definiu o regime aplicável aos bens


adquiridos durante a união de facto. Contudo, os nossos tribunais já
foram chamados a decidir sobre esta matéria. Vejam-se os acórdãos
do STJ, de 15 de Novembro de 1995 e do Tribunal da Relação de
Lisboa, de 21 de Janeiro de 1999, a título de exemplo.

Em ambas as decisões jurisprudenciais optou-se por aplicar o


princípio geral do enriquecimento sem causa nas situações em que
um dos membros da união de facto, por ter um bem em seu nome,
pretende ficar único proprietário desse bem. Se o bem foi adquirido
para fazer face às necessidades da vida em comum, com dinheiro de
ambos, é da mais elementar justiça, reconhecer-se que a propriedade
do bem pertence a ambos. Inclusive quando um dos membros da
união não aufere rendimentos por se dedicar ao trabalho doméstico.

Quanto às dívidas pessoais, elas não se transmitem ao outro membro,


com excepção das que são contraídas para fazer face aos encargos
normais da vida em comum. São as despesas com a casa, a
alimentação, divertimentos, etc..
25

Outro efeito patrimonial da união de facto é a aplicação aos membros


da união do regime do IRS nas mesmas condições dos sujeitos
passivos casados e não separados judicialmente de pessoas e bens.

PEREIRA COELHO e GUILHERME DE OLIVEIRA chamam a atenção para dois efeitos


patrimoniais interessantes.

Um é o facto de os membros da união não usufruírem de ADSE, uma


vez que não são considerados «beneficiários familiares ou
equiparados» no âmbito do Decreto-lei que define o funcionamento
da ADSE.

O outro consiste em a existência de uma união de facto,


diferentemente do que se passa com o casamento, não impedir que
um seu membro continue a receber pensão de sobrevivência por
morte do cônjuge, ou pensão de alimentos do ex-cônjuge por virtude
de divórcio, ou pensão de alimentos da herança do falecido. Ora, se
um titular de uma pensão casar, perde a pensão. Se se mantiver em
união de facto, continua a recebê-la. Teríamos aqui, se
concordássemos com os Ilustres Professores, uma situação de grande
injustiça para com quem tem o dever jurídico de prestar uma pensão.

Mas pensamos de forma diferente e consideramos que esta injustiça


não existe. O artigo 2020º do Código Civil atribui o direito a um unido
de facto de exigir alimentos da herança do falecido. E diz o seu n.º 3
que o artigo 2019º do mesmo código aplica-se, com as necessárias
adaptações, à união de facto. Ou seja, cessa o direito a alimentos se o
alimentado contrair nova união de facto, ou se se tornar indigno do
benefício pelo seu comportamento moral.

Não temos a menor dúvida que esta é a interpretação correcta. Pois,


o facto de o artigo 2019º ter a palavra «casamento» advém de os
artigos anteriores respeitarem todos ao casamento e porque o artigo
2020º é uma inserção do 1977, isto é, quando se criou o artigo 2019º
não se imaginava o conteúdo que o art.2020º viria a ter em 1977,
pelo que não se escreveu a expressão: casamento ou união de facto.
Assim, o legislador pensou, e bem, que ao criar um n.º 3 no artigo
2020º a questão em apreço nunca se colocaria.

Dissolução da união de facto

Ao contrário do que acontece na Lei n.º 135/99, a Lei n.º 7/2001


estabeleceu um conjunto de regras no que concerne à dissolução da
união de facto.
26

Assim, postula o artigo 8º desta última lei que a união de facto


dissolve-se com o falecimento, vontade ou casamento de um dos
seus membros.

Não se entende a razão pela qual o legislador terá precisado que a


união de facto «para efeitos da presente lei» se dissolve através dos
factos acima descritos. E não se entende, porque esses factos
dissolvem a união de facto de per si. Não é porque a lei o diz, mas é
porque se verifica na realidade que a união de facto deixa de existir.
Logo, trata-se de uma disposição desnecessária. Excepção feita à
alínea c) do n.º1 do artigo 8º em que concebemos como possível,
embora estranhíssimo, a continuidade de uma união de facto a par de
um casamento. Estaria o unido de facto casado a violar o dever
conjugal de fidelidade, mas talvez o outro cônjuge considerasse que
tal infidelidade não seria motivo para comprometer a possibilidade da
vida em comum... Será esta a lógica de tal disposição e do
legislador?! Não o sabemos, e dificilmente o saberemos. Sabemos,
contudo, é que consideramos este artigo no seu primeiro ponto
desnecessário. Pensamento comum ao legislador de 1999 que não
sentiu necessidade de criar um artigo dedicado à dissolução das
uniões de facto.

Mais, segundo PEREIRA COELHO e GUILHERME DE OLIVEIRA, “é pouco verosímil


que um dos membros desta (união de facto) celebre casamento com
outra pessoa sem que previamente tenha manifestado a vontade de
romper a relação”.

Para além disto, dispõe ainda o mesmo artigo, no seu n.º 2, que a
dissolução por vontade de um dos membros apenas terá de ser
judicialmente declarada quando se pretender fazer valer direitos
dependentes dessa declaração judicial. Essa declaração judicial
deverá ocorrer em acção que siga o regime processual das acções de
estado ou em acção onde os direitos reclamados são exercidos. No
fundo, esta é uma disposição com o objectivo de definir um regime
processual para a declaração judicial do terminus da união de facto.

Intrinsecamente ligada à dissolução da união de facto, está a


importante disposição relativa à “casa de morada de família” ou
“casa de morada do casal” (Lei n.º135/99) ou “casa de morada de
família e residência comum” ou “casa de morada comum” (Lei n.º
7/2001).

Poder-se-ia questionar, nomeadamente no âmbito da Lei n.º 135/99,


se, ao designarmos a casa dos unidos de facto como casa de morada
de família, estaríamos a reconhecer que a união de facto criaria uma
relação de família entre o casal.

Nem a doutrina, nem a jurisprudência colocaram esta questão e, hoje,


ela não faz qualquer sentido, pois o legislador já emendou a
designação para “casa de morada de família e residência comum”.
27

Casa de morada de família entre membro da união de facto e seus


filhos. Residência comum entre unidos de facto.

Nesta matéria, importa referir que a lei distingue entre casa própria e
casa arrendada. No primeiro caso, havendo uma separação e sendo o
bem pertencente a ambos, qualquer dos unidos pode requerer ao
tribunal que este lhe atribua a casa de arrendamento. Pertencendo
apenas a um deles, o outro poderá, na mesma, solicitar o
arrendamento.

Se a casa for arrendada, por acordo ou por decisão do tribunal (a


solicitação de um deles), qualquer dos unidos poderá ficar com o
arrendamento.

De referir ainda que a expressão «membro sobrevivo» no artigo 4º,


n.º 4 da Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio, trata-se de mais um lapso do
legislador, porque esta disposição dedica-se à separação dos
membros da união de facto como se inferirá da leitura dos artigos
1793º do Código Civil e 84º, n.º 2 do RAU.

Outra das formas de dissolução da união de facto reside no


falecimento de um dos seus membros. A lei atribui o direito a
alimentos e o direito à casa de morada de família ou residência
comum ao membro sobrevivo.

O direito a alimentos tem de ser requerido no prazo de dois anos a


contar da data da morte do companheiro, sob pena de caducidade.
Estes alimentos pretendem oferecer ao membro sobrevivo as
condições indispensáveis ao seu sustento, habitação e vestuário e,
havendo um menor, também abarca as despesas com a sua instrução
e educação. Só haverá direito a receber alimentos, se o membro
sobrevivo não tiver forma de prover à sua subsistência e aqueles
serão proporcionais à herança do de cujus e à necessidade do
sobrevivo. Pelo exposto, se compreende que não se pretende manter
o mesmo nível de vida que o casal detinha.

Pormenor bastante importante é que a lei não exige que à data do


falecimento a união de facto já tivesse dois anos sem ser adulterina.
Basta que exista há mais de dois anos, mesmo que apenas
recentemente perdesse o carácter de adúltera.

O direito à casa de morada de família ou residência comum aparece


como um direito real de habitação e direito de preferência na sua
venda, pelo prazo de cinco anos a contar da morte do membro da
união de facto. Contudo, este direito só existe se não sobreviverem
descendentes com menos de um ano ou que com ele vivessem há
mais de um ano e pretendam habitar a casa, ou se o de cujus não
dispuser da casa por testamento. Nas uniões de facto, ao contrário do
que se passa no casamento, não se concede o direito ao recheio.
28

O membro sobrevivo duma união de facto com relevância jurídica nos


termos das Leis em apreço tem, igualmente, direito à transmissão do
arrendamento da habitação, por morte do companheiro.

Existe uma grande diferença relativa a este direito nas Leis n.º
135/99 e na 7/2001 e que reside hierarquia do gozo deste direito. A
segunda lei coloca o membro sobrevivo a seguir aos descendentes,
enquanto a primeira colocava em último lugar, depois de
descendentes com menos de um ano ou que com ele convivesse há
mais de um ano, ascendentes que com ele convivesse há mais de um
ano e afins na linha recta nas condições referidas para os
descendentes e ascendentes. Esta alteração traduz-se num
fortalecimento do direito e da posição do membro sobrevivo.

Também aqui só se exige que união de facto não seja adulterina à


data do falecimento.

Não se poderá analisar este direito sem fazer referência à alteração


introduzida ao n.º 2 do artigo 85º do RAU. Qual o sentido que o
legislador pretende dar a esta disposição? Para PEREIRA COELHO esta
norma pretende criar, ao contrário da Lei n.º135/99, o direito a uma
transmissão do arrendamento “em dois graus”, permitindo-se, assim,
a transmissão a favor de parentes e afins do membro sobrevivo
aquando da sua morte. Isto é, equipara-se o unido de facto ao
cônjuge para efeitos do artigo 85º n.º 4 do RAU.

Na hipótese de o de cujus viver em união de facto sem relevância


jurídica para efeitos da lei, o membro sobrevivo tem direito a novo
arrendamento (art. 90º, n.º 1, al. a) do RAU).

Outros dos direitos do membro sobrevivo são o direito a uma


prestação por morte e à pensão de sobrevivência, previstos no artigo
3º e), f) e g) da Lei n.º 7/2001. Na Lei n.º 135/99, estavam previstos
no artigo 3º alíneas f), g) e h).

Para que o membro sobrevivo possa usufruir destes direitos, deverá


obter sentença que reconheça estarem verificadas as exigências do
artigo 2020º do Código Civil. Esta sentença poderá ter sido proposta
contra os herdeiros do falecido para a obtenção de alimentos ou
contra a instituição competente pela prestação ou pensão –
Caixa Geral de Aposentações ou Instituto de Solidariedade e
Segurança Social – em caso de inexistência ou insuficiência de bens
da herança, ou ainda nos «casos referidos no número anterior» (art.
6º, n.º 2 da Lei n.º 7/2001).

Este artigo, na sua versão da Lei n.º 135/99 era bem mais claro do
que na actual. Temos alguma dificuldade em compreender o actual
artigo 6º, n.º 2, nomeadamente o âmbito da expressão: «casos
referidos no número anterior». Quer esta expressão referir-se às
alíneas e), f) e g) do art. 3º, ou às uniões de facto previstas na
29

presente lei, ou às uniões que reunirem as condições constantes do


art. 2020º do Código Civil, ou, ainda, a todos estes requisitos? Parece-
nos ser a última hipótese, significando, assim, o n.º 2 do art. 6º em
caso de inexistência ou insuficiência de bens da herança, ou ainda
independentemente desta inexistência ou insuficiência. Mas se assim
é, a referência à existência, insuficiência ou inexistência de bens é
totalmente desnecessária.

Como última nota, focar que o artigo 24º, n.º 2 do Decreto-lei n.º
874/76, por nós já referido supra a propósito das normas aplicáveis à
união de facto antes da vigência da Lei n.º 135/99, concede ao unido
de facto o direito a faltar ao trabalho por dois dias, se tiver falecido o
seu companheiro. Estes dias aumentam para 5 na hipótese de a união
de facto durar há mais de dois anos.

Perspectivas para o futuro – algumas questões

Confessamos que não somos capazes de antever a próxima evolução


do instituto jurídico em análise, mas cremos que de futuro o
legislador irá laborar no sentido de atribuir efeitos jurídicos à união de
facto sempre que esta exista há mais de 2 anos, deixando de existir
avulsamente outros prazos, excepção feita ao caso da adopção.

Cremos, igualmente, que este instituto irá ser motivo de avultada


doutrina e jurisprudência, tais as questões em aberto, as indefinições
e incorrecções que o legislador nos legou. A parca doutrina existente
em Portugal, à semelhança de alguma estrangeira, defende posições
tão díspares que parece-nos importante uma intervenção do
legislador, esclarecendo o que realmente pretende. Veja-se as
dificuldades e injustiças que poderão surgir por não existir um eficaz
meio de prova quanto ao início e ao fim da relação, ao regime de
bens (o que é próprio da união de facto, mas cria gravíssimas
dificuldades aos credores, nomeadamente em fase de execução) e
aos seus efeitos pessoais.

As questões que podemos colocar são muitas: umas mais teóricas,


outras mais práticas, e muitas serão as possíveis reivindicações.

O casal constituído por dois menores cria emancipação? Parece-nos


evidente que não, por não ter sido previsto na lei, mas o não
30

reconhecimento de uma emancipação criará dificuldades ao casal


menor na administração de uma economia comum, especialmente se
não obtiver a “benção” dos titulares do poder paternal ou da tutela.

Não nos espantará ver futuras reivindicações de unidos de facto


homossexuais pela conquista do poder de adopção. Certamente que,
antes ou depois, esta mesma categoria social reivindicará o
casamento civil.

Imaginem-se as injustiças que serão possíveis fazer recorrendo ao


disposto nesta legislação.

Arrendatários de quartos que não recebem quitação, afirmarem e


provarem em conluio com outros, depois do(a) senhorio(a) falecer,
que viviam em união de facto com o de cujus, obtendo assim direito
real de habitação, direito de preferência na venda e direito a
alimentos proveniente da herança.

Funcionários públicos, com o objectivo de não se deslocarem para


longe no exercício das suas funções, combinam com amigos, pagando
se necessário, afirmar perante o Estado viver em união de facto, para,
desta forma, obter preferência na sua colocação.

Unidos de facto que compram bens, afirmando ser apenas para um


deles ou escondendo a sua relação, diminuindo as garantias
patrimoniais do credor.

E muitas outras certamente, pois a mente humana é fértil, e muitas


as brechas desta legislação.

Pensamos que esta legislação tem aspectos positivos, como sejam


acautelar justos interesses dos unidos de facto. Contudo,
consideramos um mau serviço ao país, nomeadamente à segurança
jurídica, legislar sobre matérias tão delicadas sem a devida
ponderação dos seus efeitos.

Para terminar, a nossa convicção é a de que a sistematização da


união de facto veio para ficar. Não nos parece credível que o
legislador venha a eliminar a Lei n.º7/2001, legislando avulsamente
sobre os direitos concedidos por esta lei.

ANEXO I

Jurisprudência Portuguesa sobre a União de Facto anterior à


Lei n.º 135/99
31

Publicada no Boletim do Ministério da Justiça:

- Ac. STJ, 30-05-1961, BMJ 107, pp. 557

- Ac. Relação de Évora, 26-01-1984, BMJ 335, pp. 355

- Ac. Relação de Évora, 31-01-1984, BMJ 335, pp. 354

- Ac. Relação de Lisboa, 16-02-1984, BMJ 341, pp. 463

- Ac. Relação de Lisboa, 12-07-1984, BMJ 346, pp. 305

- Ac. Relação de Lisboa, 24-10-1985, BMJ, 357, pp. 486

- Ac. Relação de Lisboa, 19-11-1985, BMJ, 358, pp. 602

- Ac. STJ, 21-11-1985, BMJ 351, pp. 429

- Ac. STJ, 09-01-1986, BMJ, 353, pp. 464

- Ac. STJ, 18-03-1986, BMJ, 355, pp. 392

- Assento STJ, 23-04-1987, BMJ, 366, pp. 177 e DR 28-05-


1987

- Ac. STJ, 15-05-1990, BMJ 397, pp. 478

- Ac. STJ, 11-07-1991, BMJ 409, pp. 411

- Ac. STJ, 07-11-1991, BMJ 411, pp. 565

- Ac. Relação de Lisboa, 22-09-1993, BMJ 429, pp. 860 e Col.


de Jur., 1993, 4, 179

- Ac. Relação de Lisboa, 07-10-1993, BMJ 430, pp. 503

- Ac. Relação de Lisboa, 07-12-1995, BMJ 452, pp. 482

- Ac. Relação do Porto, 06-03-1996, BMJ 455, pp. 575

- Ac. Relação do Porto, 26-03-1996, BMJ 455, pp. 575

- Ac. Relação de Coimbra, 28-05-1996, BMJ 457, pp. 457

- Ac. STJ, 04-06-1996, BMJ 458, pp. 211


32

- Ac. STJ, 25-06-1996, BMJ 458, pp. 335

- Ac. Trib. Const. n.º 1221/96, 04-12-1996, BMJ 462, pp. 121

- Ac. Relação de Coimbra, 14-01-1997, BMJ 463, pp. 646

- Ac. Relação do Porto, 01-04-1997, BMJ 466, pp. 583

- Ac. Relação de Évora, 12-03-1998, BMJ 475, pp. 792

Publicada na Colectânia de Jurisprudência:

- Ac. Relação de Coimbra, 11-12-1984, Col. de Jur., 1984, 5,


86

- Ac. Relação de Lisboa, 11-12-1984, Col. de Jur., 1984, 5,


165

- Ac. Relação do Porto, 18-12-1984, Col. de Jur., 1984, 5, 273

- Ac. Relação de Évora, 09-07-1985, Col. de Jur., 1985, 303

- Ac. Relação de Lisboa, 19-12-1985, Col. de Jur., 1985, 5,


117

- Ac. Relação de Lisboa, 16-01-1986, Col. de Jur., 1986, 1, 91

- Ac. Relação de Coimbra, 20-11-1986, Col. de Jur., 1986, 5,


122

- Ac. Relação de Lisboa, 14-07-1987, Col. de Jur., 1987, 4,


134

- Ac. Relação do Porto, 03-12-1987, Col. de Jur., 1987, 5, 206

- Ac. Relação de Coimbra, 12-04-1988, Col. de Jur., 1988, 2,


65

- Ac. Relação de Lisboa, 28-06-1990, Col. de Jur., 1990, 3,


152

- Ac. Relação de Lisboa, 06-03-1991, Col. de Jur., 1991, 2,


193

- Ac. Relação do Porto, 30-09-1991, Col. de Jur., 1991, 4, 259


33

- Ac. Relação de Lisboa, 17-03-1992, Col. de Jur., 1992, 2,


167

- Ac. STJ, 26-05-1993, Col. de Jur., 1993, 2, 133

- Ac. STJ, 20-01-1994, Col. de Jur., 1994, 3, 200

- Ac. Relação de Lisboa, 01-02-1994, Col. de Jur., 1994, 1,


125

- Ac. Relação do Porto, 07-02-1994, Col. de Jur., 1994, 1, 230

- Ac. Relação do Porto, 27-09-1994, Col. de Jur., 1994, 4, 198

- Ac. STJ, 01-06-1994, Col. de Jur., 1994, 2, 123

- Ac. STJ, 16-03-1995, Col. de Jur., 1995, 1, 124

- Ac. STJ, 22-03-1995, Col. de Jur., 1995, 1, 284

- Ac. STJ, 28-06-1995, Col. de Jur., 1995, 2, 242

- Ac. STJ, 29-06-1995, Col. de Jur., 1995, 2, 147

- Ac. Relação de Lisboa, 30-11-1995, Col. de Jur., 1995, 5,


126

- Ac. Relação de Lisboa, 18-04-1996, Col. de Jur., 1996, 2,


105

- Ac. Relação de Évora, 05-12-1996, Col. de Jur., 1996, 5, 271

- Ac. Relação do Porto, 09-01-1997, Col. de Jur., 1997, 1, 19

- Ac. Relação de Coimbra, 14-01-1997, Col. de Jur., 1997, 1,


11

- Ac. STJ, 04-02-1997, Col. de Jur., 1997, 1, 8

- Ac. Relação de Lisboa, 20-02-1997, Col. de Jur., 1997, 1,


132

- Ac. STJ, 08-05-1997, Col. de Jur., 1997, 2, 81

- Ac. Relação do Porto, 19-05-1997, Col. de Jur., 1997, 3, 187

- Ac. Relação de Lisboa, 09-10-1997, Col. de Jur., 1997, 4,


111

- Ac. STJ, 14-10-1997, Col. de Jur., 1997, 3, 61


34

- Ac. Relação de Coimbra, 20-01-1998, Col. de Jur., 1998, 1, 6

- Ac. Relação de Lisboa, 23-04-1998, Col. de Jur., 1998, 2,


126

- Ac. Relação d o Porto, 05-03-1998, Col. de Jur., 2, 190

- Ac. STJ, 09-02-1999, Col. de Jur., 1999, 1, 89

- Ac. Relação de Lisboa, 21-01-1999, Col. de Jur., 1999, 1, 83

- Ac. Relação de Lisboa, 02-03-1999, Col. de Jur., 1999, 2, 70

Outras publicações:

- Ac. STJ, 05-06-1985, Rev. Leg. e Jur., 119, 372

- Ac. Trib. Const. n.º 359/91, 09-07-1991, pub.15-10-1991, DR


n.º 237, I-A, p.5332 a 5346;

- Ac. Trib. Const. n.º286/99, 11-05-1999, pub. Diário da


República 21-10-1999
i[i] A nossa legislação não define o conceito de plena comunhão de vida. Segundo Pereira Coelho,
“trata-se de uma comunhão de vida em que os cônjuges estão reciprocamente vinculados pelos
deveres de respeito, fidelidade, coabitação, cooperação e assistência (art.1672º), comunhão de vida
exclusiva (al. c) do art. 1601º) e tendencial ou presuntivamente perpétua (art. 1773º).” A procriação
não será um fim essencial. Para concluir pela existência ou não de plena comunhão de vida, haverá
que analisar se na união de facto existem estes deveres. Somos da opinião que não existem todos os
deveres apontados como se verá infra. Para França Pitão, na união de facto existem deveres
conjugais, pelo que existe plena comunhão de vida. Para Pereira Coelho, não existe nenhum destes
deveres conjugais, pelo que não há plena comunhão de vida no plano pessoal.

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