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FICHA CATALOGRAFICA (Preparada pelo Centro de Catalogagdo-na-fonte, Camara Brasileira do Livro, SP) 0473 74-0615 Chociay, Rogério. Teoria do Verso. Sio Paulo, McGraw-Hill do Brasil, 1974. Pe 1. Postica 2. Portugués — Versificagdo 3. Versificagao L. Titulo. CDD-808.1 469.6 | Indice para catdlogo sistemtico: |. Poética ; Retorica : Literatura 808.1 2. Versificagao : Portugués : Lingiistica 469.6 3. Versificagao : Ret6rica : Literatura 808.1 4, Verso : Técnica: Literatura 808.1 Whrversioae FEDERAL oy )E UBER La Bibiiatess ma ‘SAO PAULO RIO DE JANEIRO BELO HORIZONTE| PORTO ALEGRE RECIFE TEORIA DO VERSO ae Rogério Chociay (Professor de Teoria do Verso Faculdade de Filosofia, Cigncias e Letras Universidade Catdlica do Parand) toe 02.0 case OIRBVUFU 04180, CTT 1000147223, NEWYORK «ST. LOUIS “SAN FRANCISCO ‘AUCKLAND « BOGOTA « DUSSELDORF « JOHANNESBURG KUALA LUMPUR + LONDON + MADRID + MEXICO MONTREAL «NEW OELHI + PANAMA + PARIS. SINGAPORE «SYDNEY = TOKYO «TORONTO Copyright © 1974 da Editora McGraw-Hill do Brasil, Ltda Nenhum’ parte desta publicagdo podsré ser teproduzid, guadada plo sistema “re treva” ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro meio, se) este cleton- to, mecinic, de folocopin, de gravayae, outos sem préva sutorzaio por eseilo da Esitors. 1979 Todos os direitos para lingua portuguesa reservados pela EDITORA McGRAW-HILL DO BRASIL, LTDA. Roa Tabaput, 947 Av. Paulo de Fro SAO. PAULO RIO _DE JANEIRO ESTADO DE SAO PAULO —- ESTADO DO RIO DE JANEIRO ‘Av. Bernardo Monteiro, 447. Rua General Lima e Silva, 87 BELO HORIZONTE — PORTO ALEGRE MINAS.GERAIS RIO GRANDE DO SUL ‘Av. Jodo de Barros, 1.750 s/11 RECIFE PERNAMBUCO EY Impresso no Bras Printed in Brazil on PREFACIO . vee . vit NOTAPREVIA 20.0. o eevee cea ee sees ee ees IK I Metroeritmo .. 6.6.06. cece | 2. Nogdes elementares 4 }. Os versos ¢ suas medidas aT |. Processos de acomodaglo . . SEeeeEEe 14 . Receitae realizagdo dos versos 0... ee eee eee eee ee 4 Andamento dos vers0S 0.0... ee eee ee eee eee eee 61 . Tipotogia dos versos.. . A unidade funcional do poema . Aestrofe e suas denominagies . . 10. As cadénciss silébica e acentual ..... eer anaw IL. Dinimica daestrofe .. . 12, O andamento fénico e seus processos . 13. A cadéncia fonica: rima . . 14. 0 indice de reiteragdo fonica na rima . . . 15. Posicionamento das rimas 2.6.0.0 e eee e cece e eee eee 14 NOTAFINAL .. 0.0.0... 0 cece cee ee eee : = 200 INDICE ANALITICO .. SEE eee eee = 202 PREFACIO A caracterfstica principal do Professor Rogério E. Chociay, nesta bela Teoria do Verso, parece-nos ser a dligente, minuciosa, firme consciéncia com que examina a matéria, de modo a expor a sua verdade, que pode coincidir ou nfo com 0 modo de ver de antecessores scus. Argumento de autoridade para ele ndo existe; existe apenas a convicgdo com que chega aos scus resultados, ou, se nfo pode atingi-los, com que reconhece estar diante de um problema a ser solucionado, Sendo pois fruto da reflexio, a Teoria do Verso se distingue da maior parte dos livros que circulam em nosso meio sobre versificagéo, ‘manuais fastidiasos ou festivos que se repetem uns aos outros, sem desconfiat de nada, nem inovar coisa alguma, Rogério Chociay ndo produziu um livro de Tepetigo, mas um livro rico de informagdes sobre 0 nosso verso medido, hébil € Gtil para todo o perfodo que vem dos drcades ¢ atinge os préprics poetas ‘modemos do Brasil, quando metrificam. Um livro, pois, que explica nflo $6 a técnica dos roménticos como a posterior, implantada aquém-mar com a obediéncia aos princfpios adotados por Casiilho ¢, acessoriamente, com o pagamento de razogvel tributo aos manuais franceses. © autor no cuida apenas dos versos canonicamente construtdos, mas também dos que se desviam do cédigo versificatério de seu tempo, sendo 0 seu trabalho, em conjunto, o mais completo que conhecemos nesse campo; ¢ também no campo, mals vasto, da restituigfo de versos ao sou cédigo original, que pode nfo ser 0 cédigo de nossos dias, como se dava com a versificago Toméntica. E leva tudo isso a cabo, e mais a andlise do andamento fonico dos vers0s, com 0 vocabuldrio técnico mais simples possivel, a0 contrdrio de tantos estudiosos atuais, que desvirtuam ou inovam o sentido mais ou menos consagrado dos termos de Poética, ou inventam outros para fenémenos jd denominados, construindo um verdadeiro cipoal onde o intrincamento longe estava de ser necessério, Em suas linhas gerais e nos particulares, o livro do Professor Chociay parece-nos solidamente construfdo ¢ inegavelmente merit6rio, pela amplitude € percucincia de sua andlise, Natural que, num ponto ou noutro, possamos ter opinido diversa da do jovem esticdlogo, cujo livro & de longe, nfo ‘obstante, o mais sugestivo de que temos not(cia sobre 0 assunto, em nossa lingua. Assim, deixando de lado observag6es de pequena monta, e atendendo 4 pedido do préprio autor, no sentido de que expresséssemos possiveis divergéncias remanescentes, queremos fixar-nos apenas num ponto, No nos parece que deva ser desprezada tio de plano a possibilidade de se evidenciar metricamente um acento semiforte na segunda sflaba metaténica dos Proparox{tonas. Em 2.6.2, aponta Chociay que a alterndncia quaterndria pode ser encontrada em seqiéncias que envolvam vocdbulos proparoxitonos, como em “pincaros azuis”, , “seqiéncias que, de resto, nfo se reduzem a dois bindrios, como querem alguns estudiosos”, Nisso mostra Chociay seu desacordo com esticélogos anteriores, entre (08 quais Cavalcanti Proenga, que observa: “Naturais, mesmo, sao as células de duas e trés sflabas, 0 que, alids, Said Ali deixou implicito quando, no seu Tratado de Versificagdo, $6 deu patente aos pés di e trissilébicos”, De nossa parte, perfithamos © parecer de Said Ali, Cavalcanti Proenga e outros, no nos parecendo dificil demonstrar a evidenclabilidade métrica de uma semifforte ‘em vocdbulos proparoxitonos. Certificou-o Manuel Bandei em “A Dama Branca”, quando fez “vulgivaga” e “sarcéstic “Ig” e “m4”. Na “Cango de Muitas Marias”, também de Bandeira, ressalta sem margem de diivida o acento metricamente semiforte em “Cndida” (3.9 verso): “E depois dessa Maria que foi Cindida no nome, / Candida no corago”. Da mesma forma, 0 andamento trocaico parece mostrarse com toda a nitidez em “Flores Murchas”, p. ex.: “Pélidas criangas / Mal desabrochadas / Na manh da vida! / Tristes asiladas / Quo pendois cansadas / Como flores murchas! // Pélidas criangas / Que me recordals / Minhas © andamento exige um acento metricamente semiforte em “pulidas”, bastante n/tido no in(clo da segunda estrofe, Bandeira, diga-se para clareza, 20 contar todas as sflabas em “vulgivaga” e “sarcdstica”, nos eneass(iabos “Era uma estranha vulgivaga” ¢ "Se the furtava sarcéstica”, estava seguindo, esse pormenor, 0 principio médio-atino das “sflabas contadas". Vejase como, na estrofe do “Stabat Mater”, nfo s6 se evidencia o acento secundério numa palavra proparox{tona interna, “animam”, como também as proparoxitonas em posigfo de rima (3.0 € 6.0 versos) ostentam esse acento secundério na dltima sflaba (a que rima): Stabat miter délorésa Tixta eriicem Ifcrimésa, Dim pendébat filiés, Cus énimam geméntem, Contristétam ét doléntem Pertransivit glidids. esquema, tal como apontado por Karl Strecker, ¢ trocaico, apoiado Jargamente em sflabas semifortes; e vé-se em “fiius” e “'gladius” o processo de contagem que Bandeira adotaria séculos mais tarde: apenas em latim “rftmico” era normal, a0 passo que em nossa lingua nfo passa de curiosidade. Dirse-4 que, sendo 0 cédigo métrico uma convengdo, tanto faz adotar tum eritétio como outro, mas afigurase.nos leremente ildgico reconhecer as sflabas semifortes pretdnicas ¢ nfo. as metatOnicas, umas como outras metricamente evidencidveis, Nem se fale em Fonética Experimental, pois em primeiro lugar o poeta, ao escrever, nfo lida diretamente com sons, mas com imagens auditivas, e em segundo lugar jd se metrificava quando nem existia a Fonética, ¢ muito menos a Fonética Experimental. A validade do cédigo versificat6rio repousa em sua propria coeréncia interna, e nfo em dados fouéticas exteriores, desde que nfo sejam bésicos para a formagifo desse mesmo e6digo. Esta a contribuicfo que trazemos, despretensicsamente, 20 exame do cestudloso sério e bem informado que produziu este livro nos vdos entre suas aulas na Universidade Catélica do Parand, a0 mesmo passo que louvamos a feliz tenacidade com que levou a termo um trabalho como este, que se 1€ com agrado € proveito € no qual mesmo os especialistas tém 0 que aprender. Honra-nos, particularmente, prefaciar volume de tio luminosa valia; ¢ comove-nos fazer isso, como se a nossa jé longa experiéncia, servindo de pedra de toque, atestasse com sua imparcialidade mineral, mas receptiva, que o livro 6 de ouro, ¢ ouro do mais puro quilate. ‘S80 Paulo Péricles Eugenio da Silva Ramos NOTA PREVIA Este trabalho, que ndo se pretende original, inovador ou erudito, comegou a surgir da necessidade de apresentarmos, a nossos alunos da Faculdade de Filosofia, Ciéncias e Letras da Universidade Cat6lica do Parand, as nogdes mais importantes da versificagio tradicional, de um modo tanto quanto possivel claro, seguro € didético. Embora o assunto nao nos fosse estranho, acostumados que estvamos ao estudo e ensino do verso, fomos verificando, nessa tarefa de maior folego e responsabilidade, toda uma série de problemas complexos que se escondem sob a aparéncia facil dos manuais sumiirios que até entdo nos tinham servido de base. Chegamos a um ponto critico ao verificarmos a insubsisténcia das ligdes que habitualmente forneciamos, quando as diividas nos obrigaram a pesquisar, mais intensa e profundamente, a obra dos principais pocias brasileiros’ e portugueses Terminada a tarefa, que sofreu a coagio de uma série de fatores, entre os uais 0 tempo de estudo bastante reduzido, nfo podemos dizer que chegamos ‘mesmo a metade do caminho, Temos ai uma série de ligdes e exemplos que, se alguma virtude apresentam, & a de buscar a verdade reta e dificil num caminho cheio de faccis saidas laterais. Evitamos incidir em dogmatisnio, ‘mesmo porque nosso estudo reflete somente o esforgo de pesquisa de um interessado licido, nunca de um especialista. Os especialistas, sim, surgem a ravés de citagSes, nos pontos em que mais necessitamos de fo segura, © a3 SUBS Obras remetemos os interessador no aprofundamento de aspectos cuja superficie mal pudemos percorrer. A estes mesmos especialistas pedimos, sem falsa humildade, as observagdes ¢ conselhos que julgarem oportunos. Em relagGo aos méritos que esta obra possa apresentar, destaquemos a influéncia de alguns colegas que muito nos auxiliaram: do Professor Vicente Ataide, com quem dividimos atualmente os trabalhos de pesquisa e ensino da Teoria da Literatura, sem cujo incentivo e aconselhamento constantes este livro simplesmente nao viria 4 luz. Do Professor Massaud Moisés, a quem devemos um seguro conceito de “ritmo”, que muito nos tem servido e muito nos serviré para ampliarmos as perspectivas de nosso estudo. Do Professor Péricles Eugénio da Silva Ramos, um dos maiores se nfo o maior especialista nna Teoria do Verso em nosso pais, pela paciéncia que teve ao ler e comentar as redagdes de nosso trabalho, que como bom mestre € com uma honestidade intelectual 4 toda a prova nos soube “puxar as orelhas” nos momentos oportunos, tirando-nos de muitos descaminhos e fornecendo-nos informes e material para que aperfeigodssemos nossa visdo dos problemas. Do Professor Geraldo Mattos, eminente tingoista brasileiro, que dispds de seu valioso tempo, colocando-se 4 nossa disposigéo para fomecer-nos seguras descrigdes sobre os aspectos melédicos da Lingua Portuguesa. Do Professor José Luis Mercer, a quem devemos valiosas sugestdes que eperfeigoaram nossos métodos de trabalho. Do Professor Jaime Ferreira Bueno, com quem pudemos discutir * xt comprovar uma série de fatos. Finalmente, do Professor Antonio Manuel dos Santos Silva, profundo conhecedor da versificagdo espanhola, pelos conselhos de amigo e reparos de mestre. Falemos da obra cm si, cuja montagem é bastante simples, formando um corpo de 15 capitulos. Nao € uma solugio ideal, ji que de inicio pensivamos dividir 0 trabalho em trés partes, em que se estudariam, Tespectivamente, 0 verso, a estrofe ¢ as formas poéticas. Mas, desde logo, pressentimos a impossibilidade de realizar perfeitamente tal objetivo num sO livro, preferindo estudar neste, com mais profundidade, o verso, fornecendo também uma boa dose de informagdes sobre a estrofe. Em trabalhos futuros pretendemos ampliar 0 estudo da estrofe e realizat 0 das formas posticas Como se observa, esta € uma primeira tentativa de equacionar a Teoria do Verso, visando colocéta em termos novos, sem contudo trair as boas ligoes antigas. Nao temos receio de pdr em julgamento alguns enfoques pessoais sobre 0 estudo do verso, bem como as modificagdes na terminologia versificatéria que tivemos de fazer, por necessidade de clareza e com a melhor das boas intengdes, Se falharmos, em mais ou menos pontos, nossa mentalidade € aberta a criticas, que estamos ndo somente dispostos a receber como também seguir, desde que as julguemos procedentes; para tanto, indicamos logo abaixo nosso enderego. Por enquanto, dar-nos-emos por satisfeitissimos 8 08 nowos alunos ou os loitores interessados assimilarem os pontos capiti de nosso trabalho, aceltando alguns e, mesmo, contestando ¢ discutindo ‘Outros (nfo somos tdo ingénuos que nos creiamos isentos de erro). Com apesar de suas imperfeigbes, a obra terd atingido suas finalidades. Rogério E. Chociay Faculdade de Filosofia, Ciéncias ¢ Letras Universidade Catélica do Parand Rua XV de Novembro, 1004 Curitiba — 80.000 198 Rogério E. Chociay (fraca) dos dois iltimos. José Jambo da Costa, citado por Mello Nébrega (1), apresenta a tentativa de situar a rima no inicio dos versos: ama_ Chama da vida a iluminar a sina, ina orte Norte do audaz, que, sem temer o incerto, —_erto ama Ama se arroja a gloria peregrina ina orle ~ Morte num mundo, sempre, aro e deserto, erto Esta & a primeira quadra de um soneto em que as demais estrofes obedecem a semelhantes processos, tornando-se, caso se aceite a legitimidade da analogia, polirrimicas. Mas este exemplar, como o anterior, insere-se no rol das ocorréncias esporddicas, ndo permitindo teorizar-se com maior seguranca a tespeito. Além disso, um estudo comparativo dessas rimas internas com a convencional, “externa”, apontard dissemelhancas insuperdveis para que se possa colocé:las a um mesmo nivel. Com efeito, a rima “externa” néo deve seus resultados (cadéncia fonica) apenas A mera teiteragZo total ou parcial de segmentos terminais dos versos, sendo a algumas peculiaridades que s6 nessa posi¢do existem: a intensidade forte, a entoagao caracteristica, a pausa de final de verso € que terminam por conferirlhe distingo e autonomia. J4 os exemplos vistos de rima interna comegam por apresentar-se com menor distingZo intensiva (0 primeiro, baseado na 6. silaba fundamental, é ainda relativamente destacado pela intensidade, mas o segundo, na 1.8 silaba dos versus, resulta enfraquecido © com pouco destaque) e sem serem seguidos, Nuvesintiginente pur uuu venacvel) s6te inplion mpobreaiinente dos afelton pretendidos com o seu emprego. Além do mais, a prépria rima “externa” apresentou sempre violentos detratores, que nela tém visto um fator de aprisionamento expressive “interna”, a esse titulo, acaba criando uma’ prisio ainda pior, 15.4.2 Melhor destino, posto que ainda irrelevante, conseguiram as rimas encadeadas, que consistem no enlace rimico-do segmento terminal de um verso /1/ a um segmento medial do seguinte /2/, como nas estrofes dos rons de Silva Alvarenga 3 7 Ja serena desde a tarde arde Jando arde 0 sol formoso; arde 080 ‘Vem saudoso o brando vento 080 ento Doce alento respirar. ento em que desaparece a rima “externa” no seu entendimento bisico, pelo fato de ‘8 segmentos terminais da sétima sflaba do primeito, segundo e terceiro versos rimarem, respectivamente, com os segmentos baseados na terceira silaba do (1) Op. cit, p. 300, Teonta do Verso 199 segundo, terceiro € quarto versos. A quadra, que externamente comportatia a dirrima, toma-se a custa desta combinat6ria tritrimica, 15.4.3 Outro processo € 0 da fixago de homofonias no interior de Yers0s; as homofonias so diferentes em cada verso, mas a posigio é fixa (vimas coroadas): 204 8 10 Donzela bela que me inspira a lira Um canto santo de fremente amor, ‘Ao bardo 0 cardo da tremenda senda Estanca, arranc Of, (Castro Alves) 18.4.4 Ambos os exemplares indlcados em 15.4.2 e 15.4.3, se a um Primeiro contato podem parecer agradaveis, acabam por revelar grande monotonia na seqiéncia de uma composiglo, o que bem diz de seu pouco emprego. 15.5 Sobre os exemplos vistos de rima interna e muitos outros semelhantes pode-se dizer que néo suportam o énus de um emprego intenso, que x6 faz encher a estrofe de homofonias forgadas ¢ desagradaveis. Com efeito, Aunooroniae intvenas, udeguadue, ¢, ‘edpordicumente, eopulliedas nume composigio, podem sor fator de’ enriquecimento ritmico-expressivo (como bem perceberam no apenas simbolistas como muitos modernios), mas o uso insistente tende a esgotar suas possibilidades expressivas e trazer um fardo de ‘monotonia que a estrofe habitualmente no pode suportar. z 1. Metro e ritmo 1.1 Se quisermos tragar uma distingdo formal (e mesmo assim de cardter apenas relativo) entre a prosa e a poesia, tal como ambas se tém apresentado ttadicionalmente, no poderemos evitar, pelo menos conto solugio didatica, 0 confronto entre a estrofe, genericamente, considerada como unidade do Prema versificade, © © periode, unidade da expressio prostica. Esta aproximagto, se faz reamaltar a sensivel analogia guatdads pela primeira em relago 20 segundo, faz-nos melhormente observar os aspectos em que a estrofe, a custa de uma organizagao peculiar, afasta-se perceptivelmente de algumas linhas de conduta trilhadas pelo perfodo. No todo, uma estrofe nada mais ¢ do que um perfodo a que se imp3e feigdo diversa da habitual: locugdes ¢ sentengas tém de fluir através de um esquema global prévio, do qual os versos — linhas com numero fixo de silabas e medido posicionamento ‘scentual — representam unidades relativamente arbitrérias. 1.2 34 0s antigos preceptistas atinavam com esta diferenciago, ao afirmarem que a estrofe, desprezando a relativa liberdade na sucessio de sflabas, acentos © pausas, ou 0 avango solto, livre, das linhas no perfodo (oratio prosa, soluta), baseiase na imposigao de certas pausas fixas que, travando em pontot {dénticos as linhas do discurso poético, anulam a possbilidade de seu avanco livre. Os versos (1) tomam-se, assim, linhas simétricas limitadas por pausas (1) 0 nome verso tem origem no latim versus (de vertere, = retornar), que (inha 0 significado de volta, retomo. A custa de diversas conotagies que veio a assumir na Mngua latina, tais como sulco (do arado), linka, flleira, renque, ete., a palavia Drestou-se # designar a linha do poema: qual o sulco do arado, ela volta sempre sobre i mesma, 2 Rogério E. Chociay {oratio vincta), obrigadas a um movimento de retorno sobre si mesmas. Essa volta constante precipita, quando menos, 0 surgimento de uma cadéncia sildbica, percebida da repetigfo de um mesmo esquema numérico de sflabas verso a verso. A esta se pode acrescer uma cadéncia acentual, quando, a pat da simetria sildbica, ocorrer em menor ou maior indice a do andamento acentual dos versos na estrofe. 1.3 O andamento, nos versos, ¢ a cadéncia, nas estrofes, constituem a parcela mais rigorosamente mensurdvel da versificagio, podendo ser indicados por meio de esquemas ou metros. Sendo apenas um aspecto dentro da teoria geral do poema, o aprendizado da Métrica nao implica o da poesia, mas tio somente a assimilagdo de um sistema segundo o qual a poesia tem-se realizado tradicionalmente, Assim entendido, o metro nfo surge como finalidade, seno como apoio, base em fungdo da qual a poesia pode ou pode corporificar-se. A organizacdo métrica funciona, portanto, como convengo, como um primeiro (no 0 mais importante, nem o mais necessério) indicio de que o que se tem sob os olhos, na leitura, ow nos penetra os ouvidos, na declamagao, deva ser poesia ¢ ndo outra coisa 1.4 Os metros tém sido chamados muitas vezes de “prisio da poesia”. Se atenuarmos um pouco o significado desta conhecida metéfora, poderemos concordar com ela. © verso metrificado ¢ um corpo sildbico que se organiza em fungao de um conjunto maior — a estrofe — imposto & poesia de fora para dentro. O poeta tem de acomodar o discurso a um esquema pré-estabelecido. Essa acomodagio, nem sempre facil, solicita o desenvolvimento e dominio de uma técnica anterior ao processo de cria¢o. Mas um poema rigorosamente metrificado nunca é, em sua concretizaggo verbal, apenas um poema Figorosamente metrificado. Nele atuam também e principalmente o jogo dos valores vocilicos € consonnticos, as reiteragées fonicas de toda ordem, a durago maior ou menor de certas sflabas, a entonacdo, ete. ete., e nada disso € desvinculado da expressio global veiculada pelo poema. Na seqiiéncia destas idéias, o que entendemos por ritmo ¢ justamente a resultante pergebida da solidariedade desses niveis da linguagem que encorpam 0. poema; profundamente arraigado & expressio, nao surge devido a um aprendizado de preceitos, mas a0 proprio dinamismo criador ¢ verbalizador do artista. E, antes de tudo, percebido, sentido, ¢ nfo como efeitos parciais ou colaterais, ‘mas como uma resultante global, Podem-se indicar pistas, elucidar detalhes, apontar aspectos para melhor aprecis-lo, mas, a0 fim, dele restard sempre um quantum to imensurivel como a propria expresso poética a que se irmana. O metro representa apenas a abstrago de um dos apoios ritmicos do poema, ow, como afirma Pfeiffer, Teptia do Verso 3 0 metro é 0 exterior € 0 ritmo o interior; o metro € a regra abstrata, 0 ritmo a vibragio que confere vida; o metro é o Sempre, 0 ritmo 0 Aqui ¢ o Hoje; 0 metro é a medida transferivel, o ritmo é a imagdo intransferivel e incomensurdvel.”(1) palavras que no devem ser entendidas como mero jogo ret6rico, mas como a simples ¢ fiel constatagio de um fato, e com a humildade de quem se reconhece maravilhado ante sua complexidade. 1.5 Acrescente-se que 0 ritmo, elemento vital de uma linguagem, no é Privilégio do poema versificado, sendo do poemia em versos livres ¢ também da rosa, pois ele sempre resulta de uma tensdo entre um sistema expressivo € a criatividade verbal de um individuo. Cada prosador, cada poeta atingem-no e podem, gragas a seu talento verbalizador, impregné-lo dos mais diversos e sutis, matizes e requintes. Estudé-lo segundo esse equacionamento amplo, cremos que seja tarefa para muitos mais anos de ciéncia lingifstica e literdtia, (1) PFEIFFER, Johannes - Introdugéo 4 Poesia (trad, Manuel Villverde -Cabral), Publicagdes Europa-América Lisbou, 1966, p. 18. " 2. Noc6es elementares 2.1 Elementarmente, todo verso pode ser considerado como um alinhamento harménico de silabas e pausas (1). Nas sflabas ¢ nas pausas estéo as Potencialidades que, atualizadas, d80 a cada verso andamento caracteristico ¢ fazem surgit na estrofe as cadéncias sildbica, acentual e fonica (2). 2.2 0 primeiro verso de um poema reside entre duas balizas; o siléncio, que Ihe ¢ anterior, e a pausa apés suaditima sflaba. O verso final do poema € delimitado pela pausa do verso precedente e pelo siléncio que se the segue. Excetuados, portanto, estes dois, os demals tesidem entra duas Pausas: a do verso imediatamente anterior ¢ a sua propria, Sio as pausas que, travando o final de um verso, permitem o retorno sildbico e acentual do esquema através do verso seguinte, segundo diversos graus de simetria estrOfica. A duracdo destas pausas est4 relacionada diretamente com a maior ou menor extensio dos versos, havendo casos em que, pelo processo do encadeamento, ela deixa praticamente de existit, embora outros fatores Gontinuem sustentando a distingfo ene o final de um eo inicio de outro verso (3). 2.3 Além das pausas delimitadoras, de posicionamento “externo”, os versos comportam outras, internas, que 36 se tornam relevantes em dois casos: 1.0) (DAs silts do no vero harmonitadasseundo seus valores ntnsvo, silos do Imalor grav de forga cm sua emisio.A puta ¢ umn iencio ene veror ou metebon deverss. (2) Sobre ete eadfacis¥, 0 estado da este, 13) ste moto de entender cadeamento tw njembement ao & pacifico ene ox ‘o estudo do probl ‘nats adlante. " " no dies Teoriado Verso S representam um dado prévio da receita do verso; 2.9) mesmo nao previstas, implicam uma alteragdo substancial no andamento do verso em que surgem. As que se enquadram no primeiro caso slo necessérias ¢ fixas, devendo ocorrer no mesmo ponto em todos os versos da estrofe, dividindo-os em membros distintos; dada sua natureza e concepcio, este primeiro tipo pausal, a que melhor cabe 0 nome de cesura (1), interdita sempre a sinalefa (2) entre os membros do verso: As que pertencem ao segundo caso, apesar dle nio previstas necessariamente e de ndo apresentarem posicio fixa de aparecimento, alteram substancialmente o andamento dos versos sobre que incidem: por isso, muitos versos, idénticos pelo nimero de silabas ¢ disposigio dos acentos, tornam-se distintos gracas ao surgimento de uma ou mais pausas sensiveis. O valor e a’ importincia destas pausas pode ser facilmente comprovado pelo fato de elas permitirem ~ como também ocorre a certos esquemas de versos com cesura — a contigiidade de silabas fortes, 0 que normalmente no se verifica na auséncia de pausa entre tais silabas. 24 As sflabas vém marcadas ou ndo por um acento de intensidadle, cuja importancia para a versificagio deve ser focalizada segundo dois aspectos: a) forga relativa; b) distribuigdo funcional no verso e na estrofe. 2.5 Quanto aos valores intensivos das sflabas, ¢ preciso de inicio esclarecer que as usualmente chamadas “t6nicas™ possuem trés valores fundamentais, conforme se trafe (em ordem crescente de forga) da dltima silaba intensa de vocibulo, de locugao e de sentenca (1), No proprio vocabulo, as chamadas ““étonas” apresentam pelo menos dois sgraus intensivos diversos, sendo necessério observar que, em rclagao a forte, () Sio virios ¢ divergentes os conceitos tradicionais de cesura (latim cacdere, = cortar), ue 6 muitas veres entendida come acento principal de intetior de VorKs, ow como Corte tedrico no scu alinhamento. Achamos que o termo tem melhor serventia entendido apenas e sempre como corte pausal necessarioc fixo. (2) Sobre a sinalefa,v. 0 estudo dos “Processos de Avomodaci0", logo adiante. () 05 termos vocdbulo, locugéo ¢ sentenca sio aqui ulilizados na acepga0 de Eurico Back & Geraldo Mattos ~ Gramética Construtural da Lingua Portuguesa, 2 vol, Fuitora F-T.D., Sio Paulo, 1.4 ed., 1972, Num dos indimeros exemplos em que, nd cituda obra, se torna patente esta diferenga de intensidad (p. 298 do vol. 1), cmos a sentenca: “Tenho “dado a ‘muitas “mogas ‘lindas re'vstas nacio™ nais onde (*) representa a intensidade de vocabulo, (") a de locugio e (") ade sentenga ‘Temos ai trés locugées (termos de oragio): tenho dado / a muitas mogas / lindas revistas nacionais ~— as duas primeiras com intensidade (") om sua iltima silaba forte; a terccira, por coincidir com final de sentenca, revebe carga intensiva ("), Observerse que a intensidade (°) nos aponta a silaba forte de vocibulos pertencentes a Tocugics: tenho / muitas / lindas, revistas. Ainda acompanhando as explicagies dus citados mestres, observe-e que se 0 vocibulo lindas, pertencente & terecita, lizesse parte da segunda locugio ~ ¢ assim teriamos muitas mocas lindas ~ sua slab for teceberia carga intensiva ("), ji que passaria a ser conseqiléncia, a silaba mo- (de mogas), deixando de se ter apenas intensidade (') de voeabulo: “Tenho "dado a ‘muitas ‘mogas “lindas revistas nacio" nabs al de locugdo, passaria a 6 Ragéto F. Chocuay “todas as silabas conseqiientes sio fraquissinus” (1), isto &, possuem o menor valor relativo de intensidade. © mesmo nio acontece as antecedentes, que “ocorrem em duas variantes: uma, fraca e a outra, fraqu issima.” (2). Convém ni esquecer, igualmente, que nos vocébulos compostos os. elementos formadores conservam usualmente autonomia fonoldgica; assim, em Porta-retratos, p.e., temos de considerar a silaba forte em por- e em -tra-. Fato similar ocorre em vocabulos como: melancolicamente, Mariazinha, etc. 2.6 A seqiiéncia de silabas com intensidade relevante (e aqui incluimos fracas ¢ fortes) espagadas pelas de intensidade irrelevante (as fraquissimas, por natureza ou posigio) € que traca 0 contomno intensivo do verso (3), Tal contorno — como, de resto, todos os elementos e expedientes versificatorios — nao trai, por principio, a indole do idioma, mas aproveita e canaliza seus recursos e potencialidades, 2.6.1 Quanto 4 sucesso das silabas na cadeia fonica, a Lingua Portuguesa apresenta predom(nio da alterndncia bindria: as sflabas televantesse sucedem sparadss por uma itelevante, com base na contnuidade dos esquemas de alternancia -2 — ou — —Z, esquemas que, por este motivo, sfo denominados bindrios. Néo é demais lembrar que o idioma apresenta predominio macigo de vocdbulos paroxttonos (‘.. .~2 — = bindrio); entre os oxvtonos, hd que destacar v bom ndmero de dissitabos ( — —L= bindrio), Acresea-se que as silabas antecedentes a forte (raquissimas ¢ fracas) ‘manifestam tendéncla dominante para a sucessfo altemnada, de ordem bingria, da direita para a esquerda (cfe.Gramftica Construtural, v.1, pg. 352), 0 que & facilmente verificdvel em séries de palavras como 20 02 canto cantar 020 10 2 encanto encantar 1020 0102 mobilizo mobilizar 01020 10 102 imobilizo imobilizar (1) Gramatica Constratural, val. 1, p. 382. (2) Idem, p. 352, (3) Estamos ¢ esturemos usando 0s termos relevante ¢ irrelevante, em relagfo a0 valor funcional da intensidade sili escapar da ambiglidade que os termos enéricos — e de duvidosa aplicagao ~ “étona™ e “t6nica” sempre trazcm, quando 36 trata de descrever © andamento intensivo do verso. Note-se também que fempregaremos ox termos fraca © fraquissima exatumente nos sentidos scima ‘9pontados, Teoria do Verso 7 em que atribuimos, arbitrariamente,o valor 0 a silaba fraquissima, ! a fraca e 2 4 forte. Observe-se que os compostos, cujos elementos formadores mantém 0 esquema de disposigdo da intensidade, ndo se enquadram, em tese, a0 prinetpio de alterndncia bindria; ai ode surgi ‘© espaco de dugs silabas inrglevantes: contrabuzina, ~ Porta-retratos, -2 — — — € mesmo de trés: médicoegal, 4 — —~ — -L. Mas a propria natured dos voctbulos ou elementos formadores fez com qu o espago dp uma saba irrelevante ainda seja substancial: portaduvas, contrabaxo, + lancha-torpedeira, L -— . Considerando-se estas e outras mintcias de alternincia intensiva que nao nos cabe justificar € anolar, notase que nas combinagdes de vocdbulos (em locugdes), de locugdes (em sentengas) hd predominio do intervalo de uma sflaba irrelevante entre silabas de intensidade relevante; o espaco de duas irrelevantes ainda apresenta bom {ndice, mas o de trés, que 86 se torna formalmente possfvel através dos proparoxitonos, tem incidéncia bem mais rara. 2.6.2 A alternancia quaterndria pode ser encontrada em seqiiéncias que envolvam vocdbulos proparoxitonos, — pincaros azuis: tele — lind{ssimas estrelas: > —-—-—t~ — pélida sondmbul SSeS ~ médico-legal: LoL lk — estrépito do mar: —-te_ ek — ficévamos na praia: —~be—~Le — ligrima-de-moga: a anpenene oe seqiiéncias que, de resto, ndo se reduzem a dois bindrios, como querem alguns estudiosos. Estas possibilidades sio, aliés, magnificamente exploradas por alguns poetas. O verso decassilabo, p.c., pode comportar duat seqiiéncias {quaternérias, como no verso abaixo, de Cesdrio Verde: “A miisica duleissima do vento” —-ti ee bee 2.6.3 As unidades de disposiggo acentual nos versos, surgidas das alterndncias binéria, ternéria e quaterndria, sfo as vezes chamadas células métricas ov células ritmicas (1). Designam-s, também, por analogia a versificagfo greco-latina, como “pés”, termo que deve ser entendido com muito cuidado, dada a mudanga da nogao de quantidade, em que se baseava 0 sistema versificat6rio greco-latino, pela de intensidade, base do nosso. () PROENGA, M. Cavalcanti ~ Ritmo e Poesia, Simdes, Rio, 1985. 8 Rogério E. Chociay 2.6.4 A pura distribuigfo intensiva no alinhamento silébico do verso representa o primeito dado para a aferigfo de seu andamento. O segundo dado, mais importante, consiste no maior ou menor grau de forga das proprias Wlabas rolevantes, cuja variagfo define o contomo intentivo de cada verso. ‘Aqui, as fracas subordinam-se as fortes, cujo nimero e posigfo é que tomam distintos versos idénticos pela extenso e esquema genérico de alternincia. £ © maior grau de forga da 2.8 e 6.2, em relagdo as demais sflabas internas com intensidade relevante (4.2 ¢ 8.8), do verso “Ac solvas sinwosns da snudade” (Vinicius de Moraes) 12345678910 ee eee ae que the toma peculiar © contorno intensivo, distinguindo-o, por exemplo, do verso “O sentimento da candura eterna” (Tobias Barreto) 12345678910 ele ee em quo o msior grau reside justamente na 4.2 6 8.8, sondo menor o da 2 6.8 sflabas. Ambos os verso$, no entanto, inscrevemse em idéntico fundo de alternincia bintria de fracas e fortes entre fraqu(ssimas: 2-4-6.8-10, ° 2.7 Um verso pode nao trazer qualquer surpresa quanto A sucessio de vogais € consoantes no alinhamento —.e quanto a este aspecto nada o diferencia de uma seqiéncia prosaica similar. Ou, 20 contrdrio, pode apresentar mais ov menos efeitos de teiteragHo e contraste de fonemas em seu transcurso. Versos como “‘Babujadas por baixos beigos brutos” (Augusto dos Anjos) Ny OANA tém a0 seu andamento acentual acrescido um andamento fonico, que se realiza com maior ou menor simetria por meio de processos de reiteragao (do 5, do s, ov de tragos comuns) e contraste (do j e do x, homorganicos contrastando pelo trago da sonoridade; das vogais que principiam alternando-se entre abertas e fechadas ~ a/u — e depois se encaminham para as trés finais fechadas; do p, que apesar do contraste de sonoridade Teoria do Vers 9 acomodase perfeitamente na seqiéncia reiterativa; note-se a propésito as duas seqiiéncias: bbj/pbj) de fonemas, cujo resultado, quando menos (1) implica 0 surgimento de uma tessitura de sons realmente enriquecedora do verto em que se realizam, 28 Inferemse, conseqllentemente, duas preocupagdes iniciais a motivar 0 estudo do verso: a) o andamento intensivo, resultante da disposigdo e valores de forga das silabas; b) 0 andamento fénico, surgido dos processos de reiteragdo e contraste dos elementos da matéria fonica no verso. Pelos exemplos apontados e comentérios feitos, vé-se desde logo que ambos podem atingir suma complexidade. 2.9 Vé-se por esta generalizago que estamos a deixar de lado dois fatores — entoagio ¢ duragio — ¢ isto 0 fazemos nfo por consideré-los desprez{veis 20 estudo do verso e da estrofe, mas pela falta de obras especializadas sobre ambos os fatores no portugués, em nossa reduzida bibliografia (*). E por demais evidente que todos os fatores supracitados contribuem de modo decisivo, na realizagio do poema, e isto a ponto de podermos afirmar sem medo que 0 verso possui um andamento também de ordem entoativa: 0 fato de 0 sistema versificatorio basear-se na intensidade nfo implica a desimportancia da entoago, j4 que ambos se imbricam e interpenetram de muitos modos na consecugdo da cadeia fonica. O proprio enfoque em termos de duragdo das silabas ¢ das pausas necessério, dada a importancia que exercem na teallzago coneteta de, cada verto! ao compararmos vertos absolutamente impausados em seu transcurso a versos internamente seccionados por duas ou mais pausas sensiveis, verificamos que a duragio dos primeiros € bem menor que a dos segundos, embora pertengam ambos a esquemas silébicos ¢ intensivos idénticos. Isto estaria a denunciar, em termos de duragdo, uma espécie de pauta temporal, bastante flexivel, dentro da qual muitas possibilidades de realizago existem para um mesmo tipo de verso, Os exemplares abaixo, de Antero de Quental, “Os combates eternos da Justiga!” “Respondeu: Cruz, eu sou a Natureza!” “Aide mim! aide mim! e quem sou eu? ! elaborados segundo um mesmo nimero de silabas ¢ esquema bésico 6-10, apresentam contudo diversa configuragdo, e uma leitura atenta apontard diferengas na duragio dos trés, resultantes da propria diferenga de duracao de algumas sflabas e do surgimento de pausas sensiveis. (1) Evidentemente, no estamos preocupados, no momento, com o enfoque mais importante desses efeitos (ordens de motivacdo o sugestio), mas tentamos destacar seus resultados primrios na mecanica do verso. (*) Gostariamos muito, ais, de receber subsidios a respeito, ja sob forma de indicagao bibliogrifica, ou de remessa de estudos especializados, para aumentarmos ‘nosso campo de visfo. 10 Rogétio E. Chociay 2.10 Estas sio, em suma, as nogdes fundamentais sobre a teoria do verso tradicional, que nos capitulos posteriores procuraremos desenvolver, dentro das nossas possibilidades e conhecimentos, 3. Os versos e suas medidas 3.1 Existem dois modos distintos de computar as silabas dos versos ¢ aferir © primeiro, tomando por base 0 padrdo agudo para finais de versos, nflo leva em consideracfo na contagem a8 sflabas posteriores & ditima forte de cada verso; o segundo basela-se no padrdo grave, computando sempre uma silaba além da iltima forte. O primeiro sistema é conhecido, usualmente; como contagem francesa; 0 outro, como contagem espanhola, embora ambo' ‘fo sejam empregados unicamente por esses dois povos de lingua romantica: “De um modo ou de outro, o fato ¢ que as linguas romanicas se acham divididas no modo de contar as silabas dos versos, alinhando-se de um lado o provengal, francés e portugués, de outro o italiano e o espanol.” a). 3.2 Exemplifiquemos: 2-5-7 Que temas modula o vento 12345 6f7js 2-5-7 Vagando por sobre o mar? 12345 6/7 1-5-7 Vento é simplesmente vento, 12345 6)7/8 1-5-7 Mar é simplesmente mar . .. 12345 6[7! (Tasso da Silveira) s versos da quadra acima possuem a sétima como sua iiltima silaba forte. A contagem francesa vai até ai, desprezando as silabas consequentes: (1) RAMOS, Péricles Eugénio da Silva - Sistemas de Contagem dot Versos, in “O Verso Romintico ¢ Outros Ensios”, Conselho Estadual de Cultura, $0 Paulo, 1959, 5. 12 Rogttio E. Chociay cada verso € computado em sete silabas. A contagem espanhola, servindo-se do padrdo grave, conta sempre uma silaba a mais se o final de verso for agudo ¢ despreza uma sflaba se 0 final for esdrixulo, Os mesmos versos, assim, com as mesmas potsibilidades de realizagS0 sildbice, 123456789 (agudo) (grave) (esdrdxulo) receberio, conforme o padrio de contagem, diferentes denominagée: heptassilabos (contagem francesa), octossilabos (contagem espanhola).. 3.3 Até hd pouco menos de dois séculos, a contagem dos versos nas literaturas portuguesa ¢ brasileira era feita pelo padrdo grave, tendo em seguida surgido a instituigdo da contagem francesa. Um erro de perspectiva e Informagdo histérica fez com que se atribuisse o estabelecimento deste aiitério a Antonio Feliciano de Castilho, que em 1851 publicara o seu Tratado de Metrificacdo Portuguesa, torriando-se comum entre os tratadistas & tle posteriores a expresso “Reforma de Castilho” para caracterizar 0 autor € 4 époee da implantngdd da fistema, Nada obsiante, Mello Nobrega, em fundamentado ensaio (1) provou cabalmente que, apesar da ressondncia do Tratado e do mérito divulgador de Castilho, o privilégio de tal instituigo cabe a Miguel Couto Guerreiro; este, jé em 1784 (77 anos antes de Castilho), publicara 0 Tratado de Versificacdo Portuguesa, no qual adota a contagem bica até a dltima tOnica, Mello Nobrega cita, inclusive, parte da regra IX do ‘manual de Couto Guerreiro: “Contando até o acento dominante (Que basta para o verso ser constante) Dez sflabas 0 herdico inteiro tem...” © que deixa fora de davidas a precedéncia hist6rica. O livro de Couto Guerreiro tomou-se bastante conhecido em Portugal e é de causar espécie a ‘omissdo que dele faz Castilho em sua obra; este, por esta e outras raz6es, veio a ser considerado 0 verdadeiro inovador. Mas a verdade fica: a despeito dos méritos indiscutiveis € do alcance divulgador de sua obra, o terreno estava preparado. 3.4 Outro livrinho bastante divulgado foi o Tratado de Versificagdo, de Olavo Bilac & Guimaraes Passos, que seguiram a risca os ensinamentos de (1) NORREGA, Mello ~ Couto Guerreiro ¢ a “Reforma de Castitho”, in “Arredores da Poesia, Consctho Estadual de Cultura, Sio Paulo, 1970, pp. 120-127. Teotiado Verso 13 Castitho. A custa da divulgagio dessas e de outras obras nelas calcadas, a ccontagem francesa generalizou-se para as versificagdes portuguesa e brasileira, tendo sido bem poucos os que tentaram retornar & contagem de padrio grave. Entre estes, podemos citar apenas of que conhecemos: Manuel da Costa Honorato (1) ¢, mals recentemente, Sald Ali (2). Este dltimo defende e segue convicto 0 padrio grave, estribado no fato de ser esta a terminagio predominante das palavras ¢, conseqiientemente, dos versos de lingua portuguesa. As ligdes de Said Ali foram retomadas, ultimamente, pelo professor Leodegério A. de Azevedo Filho (3). Aliés, pode-se pereeber entre 0s estudiosos de hoje alguma vacilagdo quanto ao emprego dos dois sistemas, ‘embora esteja mais pesado o lado da balanga que pende para a manutengdo da contagem francesa. 3.5 Em vez de tomarmos partido por um sistema ou outro, devemos ter em mente que eles nfo passam disto: sfo apenas sistemas de contagem; posteriores ¢ no diretamente pertinentes & criac3o poética. Uma polémica sobre ambos nfo chegaria a solugdo nenhuma, jé que se podem compulsar argumentos.vélidos para a defesa de um ou de outro sistema. Nossa preocupagao deve sair desse metricismo exagerado ¢ visar a explicagio do desenvolvimento da linha melédica do verso e da estrofe, na qual em certos casos podem-se considerar despreziveis as silabas excrescentes a iltima forte; outros, porém, tais silabas se tornam atuantes (por exempla; nas oposigves entre segmentos terminals esdrdxutos « ayudos, atdranulos ¢ Bravos, graves 6 agudos, rimantes ou nfo: assim também nos versos menotes de cinco silabas, em que as sflabas conseqentes sio muilas vezes imprescind{veis 20 andamento; acrescente-se que 0s efeitos da rima vo além da altima forte). Por tudo isso, vemo-nos forgados a ficar numa média distancia confortével: mantendo embora a contagem de padrdo agudo, por usualissima que 6, no deixaremos de fazer as aproximagdes necessérias & de padrdo grave. Em verdade, certos fatos de nossa versificago ~ o do verso composto é um deles ~ sf ficam satisfatoriamente entendidos ¢ explicados através desse sistema, que informou a técnica versificatéria de alguns de nossos poetas arcadicos rominticos. (1) HONORATO, Manuel da Costa ~ Synopses de Eloquencia ¢ Poetica Nacional, Rio 1870. (2) ALI, Said ~ Versificagdo Portuguesa, LN.L., Rio, 1948. (3) AZEVEDO FILHO, Leodcgitio Amarante de ~ Estruturalismo e Critica de Poesia Ed, Gernasa, Rio, 1970. 4. Processos de acomodacio 4.1 A feitura do verso pressupde 0 conhecimento e dominio téenico de uma série de processos de acomodagio silébica e acentual, para que se atinja 0 esquema desejado, A jungo ou « sepuragiio do vogals om contato, o ucrdscimo ou a supressto de sflabas, o recuo ou o avango do acento forte vocabular sto algumas destas solugdes que, atuantes ou latentes na fala, ganham no versejar valor operatério (1). 4.2 0 poeta assimila 0 acervo mel6dico da lingua para construir 0 verso, 0 que se toma possivel mediante a reutilizagdo do material e dos recursos que aquela the faculta, Estabelecem-se, deste modo, em termos de técnica versificatéria, os meios com que alcangar um fim — a harmonia mel6dica do poema. Nao se adultera; reelabora-se. Nessa passagem de nivel, o natural e espontineo da fala requinta-se ¢ formaliza-se através da técnica versificatoria, Ha em todo processo de acomodagio um quantum de naturalidade, relativo 40 primeiro nivel, e um quantum de funcionalidade, ditado pelo segundo. 4.3 Aqui, as palavras vale como grupos de silabas que se atticulam num Conjunto medido. Nao se trata de mera justaposiggo: a contextura silébico-acentual de cada palavra nem sempre é estivel, o mesmo acontecendo © cin mwlor ewcula - quando amogtadas as paluvras nis saquéncla do verso. Tudo se reduz. a um jogo de silabas, acentuadas ou ndo, estaveis ou nio, que se devem harmonizar segundo uma medida para ganharem a condigio de verso. O conhecimento dessa dinimica é em grande parte, 0 proprio (Segundo o enfoque com que tim sido estudado, exes expe cites expotintes resteram tole eas figures e posse ou de de, Tiga de aoe oe -metaplasmos, licencas ou liberdades poéticas, etc. 40, Few le Teouia do Verso 15 conhecimento das fronteiras sildbicas, que jé na palavra podem apresentar boa margem de oscilagdo nos casos de relagbes de contato a) vogal x vogal; ) consoante x consoante; intensificando-se tal indice no estabelecimento _das_fronteiras intervocabulares, que apenas so estiveis quando a relagio € consoante x vogal € em quase todos os casos de consoante x consoante, porém extremamente instaveis nos casos de vogais em contato. 4.4. Antes de comegarmos o estudo dos processos, falemos sobre um fato do idioma que apresenta bastante importincia para a correta escansio dos versos. Referimo-nos a ligaedo (1), associagio natural da consoante de fim de palavra (L.RSZ) A vogal inicial da palavra seguinte, formando-se deste modo uma silaba interverbal, Assim em: “O teu pé, sutil e breve” (Antero de Quental) Jo}teu/pé/su/tifle/bre/vel ““Empresta-me a voz ingénua” (Antero de Quental) Jem/pres/ta/mea/vo/zin/gé/nua/ “Para trazer a extrola namorada De homens e deuses a cabeca louca” (B. Lopes) [palra/tra/ze/racs/tre/la/na/mo/ra/da/ Idcho/men/seeu/se/sa/ca/be/;a/lou/ca/ 4.4.1 Ocorre também a ligagdo, mas com o desenvolvimento de um “fonema de transigo” (2), sempre que a palavra anterior termine por & ou “Quem as cordas estalou? ” (Antero de Quental) Ique/nhas/cor/da/ses/ta/lou? / “Bem m’importa a mim o mundo” (Antero de Quental) Jbem/m'im/por/taa/mi/nho/mun/do/ “Assim € que vamos ambos” (Antero de Quental) Jalssi/nhé/que/va/mo{sam/bos/ 4.4.2 H4 também 0 caso da relago do -b de sob com vogal seguinte, embora ndo se trate propriamente de ligagio: idioma ¢ avesso a finais de palavra oslusives, mative por que mu situs pulayee, # om voodbulas advindos de outras linguas que apresentem tais terminacdes, desenvolve sempre uma vogal (por paragage: clube, lorde, bonde, etc.), de modo que na relagdo com o fonema seguinte a solugio ocorre-por sinalefa, quando tal fonema é vocdlico; () CAMARA JR., Joaquim Mattoso ~ Estrutura de Lingua Portugues, 3% ed. Voaes, Rio, 1972, pp. $0-51. (2) SILVEIRA, Souza da ~ Fonética Sintética, Simdes, Rio, 1952, pp.30-31. 16 Rogério E. Chociay quando 0 fonema seguinte € consonantico, a oclusiva mais a vogal paragégica se isolam numa sflaba: “Sob as vagas altaneiras!" (Fagundes Varela) ‘sofbins/va/ ga/sal/ta/nei/ras/ “Sob indspito solo e estéril estremece” (Raimundo Correia) /s0fbil/n6s/ pi /to/so/loees/té/ri/les/tre/me/ce] ““A paz sob teu véu!” (Fagundes Varela) Jalpaa/so/bi/teu/véu/ ""Sob nuver lutulenta” (Fagundes Varela) (So/bi/nu/vem/lu/tu/len/ta/ “Sob leivas, onde ninguém poe roseiras” (Guerra Junqueiro) {sofbiftei/va/son/de/nin/guém/poe/ro/sei/ras/ “D'azul réseo crisol sob céus d’oiro” (Alvares de Azevedo) Halzul/r6/se0/ cri/sol/so/bi/oéus/doi/r0/ “Jesus de Nazareth! — logo exclamam" (Fagundes Varela) ‘Ne{sus/de/Na/za/te/ti/1o/goex/cla/mam/ “Um bric-a-brac de estima” (B. Lopes) Jumnfbrifca/bra/qui/dees)ti/ma/ 4.5 Feitas estas ressalvas, podemos observar os processos de acomodapéo (1), que constituem um aproveitamento do potencial de oscilago das fronteiras sldbleas © dos acentos, insttuindo-se como meios de transformar um corpo silébico (instével) num corpo métrico (estdvel). Podemos classficd-los evn, 1) processos de acomodagio silébica: implicam na contragio ou na expansio do corpo sildbico do verso; b) procestos de acomodagdo acentual: visam tegulatizar 0 curso Intensivo do verso em fungdo da cadéncia extr Entre 0s primeiros destacam-se a elisdo, a sinalefa a sinérese (contrasdo); a ampliagdo, a dialefa ea diérese (expansio). Enire os segundos, a sistole ¢ a didstole. 4.6 A listo, a sinalefa © a sinérese efetuam a contrago do corpo silébico. Pode-se ter uma boa idéia do grau de funcionalidade dessa contragdo, 20 examinarmos o verso de Guilherme de Almeida: (1) Os s6tulos ticenpas ou tiberdades potticas, conforme foram conhecidos durante ‘muito tempo, levaram a entender tas processos como exclusivos do labor postice Portanto, artificiosos, 0 que representow grosseiro emo de perspective, Postergamo-los para evitar essa conotagio pejorativa. Teoria do Verso 17 “E 0 fogo em que se abrasa uma alma a outra alma uni em que, separadas as sflabas dos vocdbulos isolados, /4{o]fo/go/ern/que/se/a/bra/sa/u/ma/al/ma/a/ou/tra/al/ma/u/ni/da/ Contamos vinte e duas a0 todo, Com a.contragio causada pelos processos de acomodagio, 123 45678 9 w ui [60] f0/goem| que/sea/bra/sau/maal/maaou/traal/mau/ni/da/ esse corpo de silabas estéticas se recompde num conjunto de freze silabas dinimicas (doze, segundo a contagem francesa: verso alexandrino de esquema intensivo 2-6-8-10-12). 4.7 Consiste a elisfo (latim: elisione) na supressdo de fonema ou fonemas em qualquer ponto do corpo sildbico, visando reduzit 0 nimero de sflabas 20 esquema desejado (1). Assim considerada, distinguimos trés casos de elisdo- 4.7.1 Eliséo da primeira fraca de duas vogais em contato pertencentes a palavras distintas (2), como em: “A restinga d’areia onde rebenta” (Alvares de Azevedo) e “Ap6s um’hora de gozar maldito” (Fagundes Varela) r . “Estrela d’oir0, no purptireo leito” (Alvares de Azevedo) é “Na rufna alheia ergueste o teu futuro” (Fagundes Varela) r “Nao basta ainda esta igndbil farsa” (Fagundes Varela) t “So anéis da cadeia, qu’arrojou-me” (Laurindo Rabelo) t (1) No aff de estabelecermos terminologia mfnima indispensivel, sem fugirmos da exatidlo ¢ sem recairmos na confusfo de termos atuais, achamos que a palavra ellsfo Pode perfeitamente designar, no extudo do verso, qualquer tipo de supressdo em Gualquer parte do corpo silébico. Com isso, evitamos 0 baralho de termos come aferese, sincope, apdcope, haplologa, eclipse, ttels noutra dsciplina, dispenssveis ‘aqui, onde podemos rotular de uma 36 vex um s6 processo generico. fsto porque a Preocupagio do poeta nfo 0 corte na palavra em sl, mas em qualquer ponte do {210 ssilébico. E claro que a supressio ocomerd na palavra e no ponto. desta facuitado por uma tendéncia do idioma. (2) Este caso ¢ freqlentemente considerado como de sinalefa, IX Rogério E. Choviay “Vem um’onda bonzngosa” (Gongalves Dias) 4 7.2 Blisio da ressonaincia nasal da primeira de duas vogais em contato ntes a palavras distintas (1). E importante que nao se confunda este caso de elixio com a sinalefa que se verifica logo apés: a supressio da ressondneia nasal toma possivel a unio das duas vogais numa sé sflaba; caso contrério, manter-se-iam ambas separadas. Em alguns casos ocorre a elisio da ressoniincia e também da vogal. Sirvam de exemplo: 4, perten “Tu cum sorriso as ftias the assossegas” (Garrett) “"Co'a face na mao eu te vejo ao luar” (Alvares de Azevedo) “C’o movimento das cang®es governa” (Laurindo Rabelo) “Rogando co’as franjas o trono de Deus” (Goncalves Dias) “Com perfumes na aurora ¢ & noite co'harmonia” (Raimundo Correia) “Mos que com a chuva de meus prantos roro” (Alberto de Oliveira) ah “Com a incleméncia do céu e a dureza da sorte? ” (Olavo Bilac) h Como se observa, este tipo de eliséo em nosso idioma at reposigao com, sendo menos encontradigo em outros casos: ge comumente a “Que amostra da corage’ a cor e a seiba” (Tobias Barreto) “A virge’ a nao quer deixar” (Gongalves Dias) “Estd finda a romagem: um velho chefe”” (Fagundes Varela) hh “Ail a ndo serem as vividas lembrangas” (Fagundes Varela) A “Langando um olhar obliquo. . . rua esté deserta.” (G, Junqueiro) h “Nem nuve’ alguma tolda essa solene cena” (Raimundo Correia) (1) Eeatipse Teofta do Verso 19 “Que a nuvem azulada que a aurora matizs fh (Aureliano Lessa) Inexistindo a necessidade de contragZo, sera funcional a manutengio da ressonincia e, conseqiientemente, da separagdo das duas vogais em silabas distintas “Uma cruz comos bracos bem abertos” (Laurindo Rabelo) ““Comyo gallio verde duma giesta em flor” (Guerra Junqueiro) “"Comyalaridos de ingénuo riso” (B. Lopes) “*Conduzi comyamor a Suprema Conquista (Félix Pacheco) “Comjos olhos febris furando a escuriddo” (Olavo Bilac) 4.7.3 Elisio de fonema ou sflaba articulatoriamente débil, em qualquer parte do corpo sildbico do verso (1). A despeito de a causa deste tipo de ellsdo ser no verso uma s6 — a redugdo do corpo sildbico ao esquema — as solugdes encontradas pelos poetas no se prendem exclusivamente a um ato mecinico € discriciondrio de elidir fonemas ou silabas de qualquer palavra e em qualquer ponto da palavra. Eles se servem, em primeiro lugar, da tradicfo ¢ convengdo da linguagem poética, que Ihes permitem langar mo de variances = também de arcaismos — com fonemas ou silabas clididos; segundo, essas varlantes podem ser emprestadas do coloquial de sou tempo ¢ lugar; tereeiro, tratz-se de solugdo pessoal do poeta que, aproveitando-se da debilidade articulatéria de certos fonemas ou sflabas (por exemplo, nos proparoxitonos, da vogal imediatamente posterior a forte), despreza-os, se necessdrio, no cOmputo sildbico de determinado verso (2). A rigor, apenas este ultimo caso poderia ser considerado como elisdo realmente praticada pelo poeta, j4 que ‘nos anteriores ocorre de fato uma simples op¢do entre duas formas de extensdo diversa de um mesmo vocdbulo. Dois problemas surgem quanto a estas solugdes de eli ©, a que fonte das trés supra-indicadas se prende determinado exemplo? 2.0, a palavra com fonema ou sflaba em elisio estd no verso por necessidade de redueio do corpo silébico? Quanto 20 primeiro caso, ndo sabemos de um estudo de folego nas literaturas portuguesa € brasileira, a ndo ser informagdes dispersas. Aqui nos interessa particularmente © segundo, em que a funcionalidade do processo pode ser verificada: a) pela escansio do verso, e b) pela constataco do emprego do mesmo vocdbulo, em outros versos do mesmo poeta, sem silaba elidida. Esta verificagdo separaré os casos realmente funcionais de elisio daqueles que representam apenas a submissdo do poeta a um hdbito prosédico, como freqientemente se observa em alguns de nossos poetas romanticos. Passemos ao rol de exemplos: (1) Metaplasmos por supressio: aférese, stncope, apdcope, haplologia, (2) Neste time caso, haveria uma questio a resolver: o fonema ou a silabe seriam realmente elididos, ou teriam a possibilidade de uma emissio com debilidade articulatra tal, que no perturbariam o andamento do verso? 0 Rogério F. Chociay * “Longo tempo assim esteve, mergulhado” (Fagundes Varela) f “Mais trémulo que os juncos ao sopro do norte” (Fagundes Varela) a “Dos discipulos os doze que elegera™ (Fagundes Varela) a “Vou contar tim por tintim” (Fagundes Varela) ‘ tf “Té que por fim caiu na eternidade” (Laurindo Rabelo) Z “Beijada pelos 26firos — c'roada" (Laurindo Rabelo) B “Quando, livre, 0 esp'rito aos céus remonta” (Laurindo Rabelo) T “Com as ondas cérulas, com as auroras palidas” (Tobias Barreto) a “No célice das flores puras” (Tobias Barreto) E No chao dos timulos expresses penosas” (Tobias Barreto) a “De raiva e desespera Tr “Do val de Josal plas gargantas” (Alvares de Azevedo) t “Fora 1é i um sonho — e um s6 desejo” (Alvares de Azevedo) i “Que um poeta nao val meia princesa” (Alvares de Azevedo) E Em consolos da esperanga, em céus abertos” (Alvares de Azevedo) é “Desconhecendo o temor, 0 espago, 0 tempo” (Gongalves Dias) ah io” (Tobias Barreto) Teoria do Verso 2 “Quem sofre ou tem prazer, ou ama, ou ‘spera" (Congalves Dias) f “Faz que cu viva, Senor! di-me de novo” (Casimiro de Abreu) E “Diz“lhe que mais que a ti, mais me queimara” (Almeida Garrett) é “Sec'los de ferro de enrugadas frontes" (Almeida Garrett) h “Nessa imensa soiddo que me circunda” (*) (Almeida Garrett) “Que inda se ignora e, p'ra sor A “Ter nascido em aspérrima soiddo, (*) (Antero de Quental) se esconde” (Antero de Quental) ‘Stepes infindaveis que ninguém descreve" (Guerra Junqueiro) f ‘N'aldeia a Plicidad junqueiro) z “E marmor da Lacénia. O teto caprichoso” (Olavo Bilac) E “Nessa pedra ajoelhou rezando, dés que entrara O sol té que o nascente enchera com a luz clara” (Alberto de Oliveira) r “Seja dos olhos teus a soiddo que interrogas” (*) (Alberto de Oliveira) “Id na tela, em cada ingulo, o esbogo inteligente” (Luis Delfino) i “Oh! terra em convulsdes ep'léticas devias” (Raimundo Correia) T “Nem te desc’roam mais da neve dessas cis!” (Raimundo Correia) & (*) Nos trés versos assinalados, 0 arcaismo soidao (dissflabo) entrou em lugar Ue soliddo (trissilabo), cuja silaba excedente extravazaria 0 esquema. Rogério E. Chociay Para comprovar-se a funcionalidade do emprego de vocdbulos com elisio, Comparemtse os exemplos seguintes com alguns anteriores, dos mesmos poetas: “Levantaram-se trémulos, medrosos” (Fagundes Varela) “Afastam-se os discipulos de Cristo” (Fagundes Varela) ““As horas da existéncia coroadas” (Laurindo Rabelo) “Dai vem que o espirito, voando” (Laurindo Rabelo) “Uma estrela no ailice de um lirio” (Tobias Barreto) “TE o vale da morte” (Alvares de Azevedo) ' esperangas que sonhei contigo” (Alvares de Azevedo) i na tarde, misteriosa ¢ bela” (Alvares de Azevedo) “Vale todo um harém a minha bela” (Alvares de Azevedo) “Que os sécwlos vindouros nos aguardam” (Garrett) "este ar da solido vou recobrando” (Garrett) ara 0 céu a minh'alma sobe e canta” (Antero de Quental) nesta solidddo que me consumo” (Antero de Quental) “Mas se secreto mal a solidéo te arrasta” (Alberto de Oliveira) “Talhar no mérmore divino” (Olavo Bilac) em que, desaparecendo a necessilade de contragdo, as palavras aparecem na sua forma atual e integral. 4.8 Ampliagio, como se depreende pelo proprio nome (1), & processo de aumento do corpo sildbico para satisfazer ao esquema. Ili duas faces distintas do processo de ampliagao: 4.8.1 A simples opgao pela mais extensa de duas formas de um mesmo vocdbulo (levantar x alevantar, limpada x alimpada, baixar x abaixar, bastar x abastar, feliz x felice, ¢ outras que tais), valendo aqui as observagdes, mutatis mutandis, que se fizeram em 4.7.3 sobre a elisio. Eis um bom exemplo de Bocage (soneto “O Colo de Marilia”), em que, no primeiro verso, © poeta faz. uso da forma Mavorte, “Mavorte, porque em péefida cilada” cujas trés silabas sio necessérias para o esquema decassilabico do verso. Porém ‘no décimo-segundo verso do soneto, o poeta emprega a forma Marte, “14 Marte arroja as armas, e aplacado” ‘cujas duas silabas sdo suficientes ao esquema, (1) Conforme nossa arientacén até aqui, achamor de bom alvitre postergar 03 tcemos Protese, epéntese, paragoRe Ou, epltese. Teoriqdo Verso 23 4.8.2 Outro tipo de ampliaedo, bastante caracteristico, é eventualmente ‘empregado por poctas brasileiros, embora seu indice de ocorréncia tenha sido bem maior na fase romintica: 0 desdobramento (1). Tratase do desenvolvimento de uma vogal no meio de certos grupos de consoantes: “.. oclusiva ou constritiva labial surda, seguida de uma oclusiva, uma constritiva ou uma nasal, havendo ento uma discontinuidade fonética, de uma consoante a outra, por uma emissio vocélica minima, como transicio articulatéria, que, na lingua popular do Brasil, se desenvolve numa vogal ¢ dissocia 0 grupo consonéntico; ex.:icto, afti ritmo, absoluto, advogado, fixo (com o grupo /ks/ indicado pela letra x), ou, em posicdo inicial no vocébulo: Ptose, psicologia, tmese, cténio.” (2). O aproveitamento funcional dessa possibilidade €, no verso, evidente, requerendo menos explicagdes que exemplos: “A quem foge da luz obstinado ¢ cego" (Fagundes Varela) Jolbislii/naldo! “Aos dentes vis de perros abjetos” (Fagundes Varela) /albiljeTtos! “Que a multidzo admira” (Fagundes Varela) JaldiTmilral “Submissos se curvam” /sulbilmilssos! “Reflexos de Deus” (Fagundes Varela) Ire/feTkilssos! “Como a lagoa estagnads, impura” (Fagundes Varela) Jes/ta/guilnaldal “Reptis saltam condores” (Castro Alves) IreTpiltis! “Eentio diris: “objeto” " (Gongalves Dias) Jofbifjeltol “Se a dor do pai nio absorve inteiro” (Gongalves Dias) Jalbilssorlvel “Contudo os olhos d'ignobil pranto™ (Gongalves Dias) Filguilnaloit! jgundes Varela) (1) Julganos methor, por mais claro, que suarabéct! ou anaptixe, termos usuais para a ‘esigragio do fendmeno. 5 (2) CAMARA JR., Joaquim Mattoso - Dicionério de Filologia e Gramética, p. 174. 24 Rogftio E. Chociay "“Ninguém mais observa o tratado” (Gongalves Dias) Jolbisserlval “Na mio de Ptolomeu” (Tobias Barreto) {piltolfolmeu! “Como um canto de morte ao ritmo de um sonho” (Fontoura Xavier) ilo! “Que a papalvos perplexos empulha” (Emilio de Meneses) . IpetT pléTkilssos! “Faz os objetos” (Mauro Mota) lofbifjeltos! 4.8.3 Os poetas romanticos serviram-se bastante do desdobramento de Brupos consonantais nessas condigdes, mas depois esse indice dectesceu bastante, embora os exemplos possam ser ainda encontrados em poetas Posterloscs, Multox dester, no entanto, evitaram-no ostensivamente, como Augusto dos Anjos: “Benigna agua, magndnima e magnifica” “Assim também, observa a ciéncia crua” “Cai de incégnites cripras mistoriosas”” “Como as estalactites duma gruta? !" Nestes versos, a divisdo das palavras grifadas €: be/nigina, mag/ni/ni/ma, i/ca, ob/ser/va, in/obg/niftas, crip/tas, es/ta/lac/ti/tes, nao ocorrendo. nento. 4.9 A sinalefa (grego: synaloiphé, = mistura, fusfo; pelo latim synaloepha) ea sinérese (grego: synairesis, = contragdo; pelo lati synaerese) operam a contrag3o de vogais em contato numa s6 silaba dinamica. O indice de Oscilagdo das fronteiras silébicas de vogais em contato é bem maior intervocabularmente, © que faz da sinalefa © processo mais comum na versificagzo, 4.9.1 A sinalefa consiste na acomodagio, numa sb silaba métrica, de duas ou trés vogais em contato de palavras diferentes. Pode implicar na absorgio, por crase, ou na semivocalizagdo de todas menos uma que passa a ser a base de um encontro (ditongagao, tritongago), sendo também comum a simultaneidade (crase-ditongaglo, por exemplo): “E mais se afrouxa.a agreste sinfonia” (Gongalves Crespo) “Huma nuvem no céu queé minha, Desce” (Alberto de Oliveira) “"Sacode-a e diz: acorda, eu vim matar-te!” (Tobias Barreto) Teoria do Verso 25 “Afronta 9 sol, provoca-o frente. frente” (L.G. Junior) “Salve, 6 sublime filha do Senhor!” (L.G. Junior) “Cresce a invernosa noite, um frio intenso” (LG. Junior) “Triste-a escutar, pancada por pancada” (Augusto dos Anjos) 4.9.2 A sinalefa € a ocorréncia normal quando as vogais em contato sio fracas. Sendo nasal a primeira vogal do encontro, a ocorréncia comum é a separagao de ambas em silabas distintas, embora em alguns casos possa ocorrer a sinalefa apés a elisio da ressonincia nasal. O problema torna-se mais complexo se apenas uma das vogais do encontro ¢ forte: aqui, dependendo da natureza da vogal desacentuada, pode haver a sinalefa ou manter-se 0 hiato. Nio nos € possivel, no momento, explorar 0 assunto, que aliés esti satisfatoriamente equacionado por Oiticica (1) na “Teoria dos Encontros Vocilicos”. Tratase de uma tese, se no perfeita, pelo menos bastante honesta ¢ que pode servir de ponto de reféncia para um melhor entendimento do problema. Também se recomenda a leitura de um trabalho de Hamilton Elia (2) feito Justamente a propésito da tese citada. 4.9.3 Sinérese: crase ou ditongagdo de duas vogais em contato no interior de um vocébulo. Na proniincia cuidada essas vogais constituem embora no coloquial apresentem certa margem de oscilagdo. A possibi de reversio ¢ aproveitada funcionalmente no verso: ““Rebentou ~ pelo Séara — de minh“alma” (Fagundes Varela) “Tremeu em ansias — se estorceu, recuou” (Fagundes Varela) “*No leito véem-na estremecida, ansiosa!” (Tobias Barreto) ““Escuma de esséncia ruim. ..” (Tobias Barreto) ““Sobre a estante do piano reluzente” (Gongalves Crespo) ““Feita de louco heraismo ¢ de aventura louca" (Olavo Bilac) “Como 0 lego da Biblia, morto no vergel” (Guerra Junqueiro) “E as vezes, quando o eterno Ideal me abrasa” (Alphonsus de Guimaraens) 'O caso nada tem de extraordindrio” (Alphonsus de Guimaraens) 'Na fronte real de rei dos reis vetustos” (Cruz e Sousa) “Era a elégia pantejsta do Universo” (Augusto dos Anjos) ““Aquele rujdo obscuro de gagueira” (Augusto dos Anjos) 4.9.4 Elisdo ou ditongagdo? Muitos lingiiistas nacionais consideram a ditongagdo como a maior tendéncia na lingua portuguesa do Brasil, a0 (1) ONICICA, José — Roteiros em Fonética FisioWgica, Téenica do Verso ¢ Dicdo, 15es, Rio. 1985, pp. 49-58, LIA, Hamilton ~ Fendmenos Fonéticot Ocorrentes no Verso, in “(Atas do) 2.9 Congresso de Lingua e Literatura”, Gernasa, Rio, 1971, p. 114. a 26 Rogério E. Chociay contrario do que ocorre em Portugal, que tende para a elisdo, Desta, entre 16s, haveria uns poucos casos. O fato de os poetas brasileiros, principalmente foménticos, praticarem muitas elisdes (1), marcando-as inclusive com o apéstrofo, seria uma trai¢do a esse status da lingua? uma espécie de lusismo versificatorio? A verdade é que o parecer supramencionado néo ganhou ainda uunanimidade; alids, sempre houve argumentos em contririo, lembrando que ‘ndo se conhecem, sendo superficialmente, os falares regionais do Brasil, nio sendo possivel, por enquanto, discemnir de modo inequivoco as tendéncias dominantes. 4.9.5 Elisio & sinalefa. H& casos comuns de simultaneidade lisdo-sinalefa, quando © encontro interverbal 6 de trés ou quatro vogais: a Primeira se elide, sobrevindo a sinalefa entre as restantes, O indice de ‘ocorréncia deste fato ¢ relativamente grande: “O teto é de mosaico, ¢ ornado de figuras” (Gongalves Crespo) 6 “O tempo, ¢ 0 sol, que vai passando, olhé:la”* (Luts Delfino) — “A cena o autor! a cer autor! a cena o autor!” (Artur Azevedo) rr r_ ~_ eva s6 velho eunuco, ¢ a escrava adolescente” (Luis Delfino) t— “Revelasthe a presenga 0 ar que estremece” (Alberto de Oliveira) t “Nao canta a cotovia: é a voz do rouxinol! (Olavo Bilac) i “Desvairas-me a razdo, tirasme a calma e o sono” (Olavo Bilac) i ““Acorda,¢ os olhos tem cheios de brilho” (Eugénio de Castro) _ ““E a noiva e ambos d’amores s'embriagavam” (Augusto dos Anjos) - 4.9.6 Verificamos algumas vezes casos de contracfo (sinalefa e/ou elisio) que podemos considerar extremos, ndo somente pela dificuldade de leitura como também de explicagao: (1) Estamos fazendo referéncia ao primeiro caso de elisfo, estudado em 4.7.1. Teoriado Verso 27 “Ao ideal aspira! a estrela aspir faci] ““E chegards ao ideal ea vida, o pomo” (Joao Ribeiro) facil “Qual vence na brancura: 0 corpo ou a nivea espuma? ” (Afonso Celso) fooual “Ao altar o sacerdote mesto e grave” (Afonso Celso) facal “Com a e6lica firia do harmata inquieto” (Augusto dos Anjos) feomaes a vida" (Jodo Ribeiro) E muitos outros poderfamos alinhar. Este problema ser comentado logo adiante. 4.9.7 Em sua funcionalidade, 0 processo da sinalefa vai além de muitas barteiras. Na dinamica do verso, 0 balizamento pausal entre certas construgdes pode desaparecer por virtude de sinalefa, sempre que a natureza das vogais limitrofes 0 permita. Dito de outro modo: a sinalefa, como também a elisio, no respsitam necessariamente a pontusglio, 0 que se pode observar em muitos dos exemplos trés-citados e mais nos seguintes: “Ble foge, ela grita... — Apito! — Ato segundo” (Artur Azevedo) “No leito me ergo. ¢ escuto o desolado Uivo do Invern, atroz, convulso, imenso. ..” (L.G. Junior) “Dormita:a luz do Sol the beija a loura tranca” (Goncalves Crespo) “Aproximei-me. O cho que piso estala” (Alberto de Oliveira) “Diz a palmeica: “Invejo.a! ao vir a luz radiante” (Olavo Bilac) “Hé de ter... Mas onde?_¢ quando? ” (Vicente de Carvalho) “Fumo ¢ cismo. Os castelos do horizonte” (Antero de Quental) “Nao queres que eu te beije! E 0 beijo é a propria vida!” (Guilherme de Almeida) 4.9.8 Os casos extremos arrolados em 4.9.6, bem como muitos casos em que a sinalefa (ou a elisfo) rompe o balizamento pausal de duas construgdes sintéticas, devem ser estudados com minicia e cautela, para que se chegue a resultados conclusivos, Nao se trata de condenar 0 uso antiga, pois o que foi feito ndo se pode mudar, Se a versificagio tradicional std fadida a um total desaparecimento, também nfo seria procedente este comentério. Nada obstante, se se pensa em termos de uma continuidade da versificagdo, 0 que no esté no campo do impossivel, uma observagio se faz necessiria. Na declamagio, pee., de composigbes tas modernos ou antigos, notamos que a sinalefa, embora surja como uma realidade métrica, é 28 Rogério E. Chociay em alguns casos freqiientemente evitada. Tivemos recentemente em mios @ gravasdo de “Carta”, de Carlos Drummond de Andrade, declamada pelo préprio autor; este deixa de fazer boa parte das sinalefas, embora sejam elas fnecensdrias metsicamente para perfuzer 0 ainhamento decassildbico dos versos (vg, “Eu mesmo / envelheci; olha, / em relevo,”). Joio Villaret, ao declamar © “Soneto ditado na agonia™, de Bocage, tem idéntica atitude, p. “Eu me artependo; / a lingua quase fria”), Sdo fatos isolados, que no entanto levam a pensar se nio estatia a teoria do verso necessitada de um contato maiot com a realidade da fala, limitando alguns de seus processos e solugdes, Por extravazarem de muito as possibilidades de uma declamagio aceitavel, 4.10 Pelo processo de dialefa ¢ pelo de diérese so separadas em silabas distintas, por necessidade de expansio do corpo sildbico do verso, as vogais de lum grupo que, se as circunstincias fossem inversas, também poderiam estar unidas numa 36 sflaba, por sinalefa ou sinérese, respectivamente. A dialefa (1) opera uma separacdo intervocabular. A diérese (grego: diairesis, = divisio; pelo latim diaerese), uma separacio intravocabular, 4.10.1. Bis dois exemplos tipicos de diérese: “Que pode dar saudade a saiidade”* (Camoes) “Nos elisios de amor endetisada” (Bocage) O primeiro ¢ excelente para demonstrar.ncs 0 dom{nio téenico do processo: a ‘mesma palavra — saudade ~ aparece duas vezes, na primeira com 0 encontro ‘au em ditongo, na segunda em hiato. A diérese & solicitada pelo esquema ¢ corre no segundo voctbulo scudade necessariamente; se ocorresse no primeiro, o verso perderia a acentuagdo fundamental da 6.8 silaba, deixando de se enquadrar no esquema herdico. 4.10.2 O conhecimento da proniincia do tempo ¢ lugar do poeta seria interessante para a cabal elucidagio de todos os casos de sinérese e diérese. A falta deste, 0 melhor ¢ estudarmos, comparativamente, na propria obra do Poeta, as ocorréncias dos mesmos vocdbulos com seus grupos vocélicos ora Unidos, ora separados. Com isso atingiremos, se nfo todos, pelo menos os exemplos cabalmente demonstrativos da técnica de sinérese ¢ diérese do poeta. Se um vocébulo € empregado por este com um grupo vocdlico sempre (1) Pensamos, a principio, empregar apenas sinérese © ditrese, para designar todos os tipos de contragio ou separacio de vogais, interou-intravocabularmente, Mas 0 termo sinalefa apresenta um uso bastante arraigado, e tememos causa apenas ‘gonfusto, Por isso, mantivemos sinale/e, para as junges intervocabulares, opondo-a A dialefa, para as separsgdes, do mesmo modo como sindrese e diérese se opbem no {mbito intzevocabular. 0 termo dialefa pode ser também encontrado, neste mesmo sentido, em MACRI, Oreste - Ensayo de Métrica Sintagmdtica, Editorial Gredos, Madrid, 1968, p46, Teoria do Verso 29 em hiato — ou, a0 contrério, sempre em ditongo — néo hi manejo Propriamente funcional, e nem se pode falar ai em processo: no jargéo do poeta, pelo menos, tal encontro € estatico e irreversivel. Pelo contritio, se ora corre a junclo, ora a separagdo, af sim poderemos falar de manejo consciente € técnico de sinérese ou de ditrese. Isto porque o hiato ou o ditongo funcionam por necessidade métrica, e 9 posta, por obedecer aos ditames do verso, ndo se atém nesses casos a um ¢ proniincia. Escolhemos para exemplificaggo, pelos motives apontfifos, um. tnico poeta (dos menos estudados): Tobias Barreto. Nele pudenfos rastrear a jun¢ao ou a separacdo de certas vogais nas mesmas palavras, confdime a necessidade do verso: (S) “Vem correndo anelante, ansigsa e ts¢mula”” (decassilabo) alia! (D) “Tao vivo! Batia-lhe o peito ansioso” ‘ (hendecassflabo) (aaToTe (Ss) “Legides que passam, candidas, purpures (decassilabo) el gies ae (D) “Sao legides que sacodem” (heptassilabo) NeTgiTSes! (Ss) “Eleva-me, que amar-te é voar. contigo” (decassilabo) Tar! (D) “Mas o martirio fez voar mink‘alma" (decassflabo) (wala (Ss) (heptassflabo) (D) _“Desgo ao inferno, Beatriz, por ti..." (decassitabo) Talal (S)__“Banhadas no esplendor que sai do piano” (decassilabo) /pilnal (D) “Nao; ndo recebas do piano os bafos” (decassilabo) Ipifalnol (S) “Cadaver santo e glorioso” {heptassilabo) Inlioal (D) “‘Aos combates, as lutas gloriosas” (decassilabo) (aloes! 4.10.3 Eis alguns. exemplos de dialefa, do mesmo poeta: “E atrds... ‘0/anjo palido da morte” (decassflabo) “E pensas que o/6dio finda? ” (heptassilabo) 30 Rogénto E. Choctay “Pela entrada feliz do novo/ano” (decassilabo) “Da luz que guardas como/um tesoiro” (decassitabo) “Da vida na ” (heptassitabo) (heptassilabo) possivel (heptassilabo) 4.10.4 Anotemos que os roménticos nunca hesitavam em manter ou forgar separagdes de vogais entre vocabulos ou no interior de vocdbulos, mas ndo faziam do recurso uma fatalidade, efetuando a jungdo das mesmas Sequiéncias caso o verso disso tivesse necessidade, Essa atitude, alids, estava em perfeito acordo com a tradigéo versificatéria em nosso idioma. Dizse de ‘nossos patnasianos que repugnavam ostensivamente o hiato, manifestando na teoria € na pratica verdadeira obsessao pela sinalefa e sinérese. Em termos de técnica predominante, isso pode ser considerado verdadeiro, mas possivel encontrar, mesmo em Raimundo Correia, Olavo Bilac e Alberto de Oliveira, exemplos como estes: “Da religio cristd, a verdadeira, a tnica, IcTiilgifo! Estupidos fazeis muitas religides!” IeelilgT@es! “Quando os muros Josué, pela terceira vez” WNolsué! “Josué respirando a oblera no olhar”™ [ojsu/é/ “E em tudo a mesma voz misteriosa passa” InnistteTosal “Como ela, num livor de névoas misteriosas” (Olavo Bilac) ImislteTrio/:as! “Posso agora morrer, porque vives!” Eo Poeta” IpoeTtal “Poeta! Deus creou as mulheres ¢ as rosas” (Olavo Bilac) IpoTeltal “De outra ¢ ignota regido, ventos do sul agrestes” Irelgiaol ““E irromperam na paz das regides supernas” (Alberto de Oliveira) IrelgiTes! ‘Num exame apenas parcial verificamos que em Bilac ¢ Raimundo a elisio da ressonancia nasal em com o, com a, etc., nem sempre se realiza, valendo tais (Raimundo Correia) (Raimundo Correia) ‘Tebriado Verso 31 seqiiéncias como duas silabas. Por outro lado, em Alberto de Oliveira, vocabulos como suave, misterioso, oceano, viagem, ideal, luar etc., tem seus encontros vocdlicos ora unidos ora separados por necessidade métrica. Acreditamos, por isso, que um exame de todos os versos destes e de outros poetas paranasianos poder-nos-é esclarcoer definitivamente suas reais atitudes ante a sinalefa ¢ a dialefa, a sinérese e a diérese. Isto pode por fim a opinides buseauas em exames de superficie, que usualmente levam a muitos enganos, 4.11 Os dois processos de acomodagéo acentual que estudaremos agora tepresentam faces distintas de um mesmo expediente — a translagdo da intensidade forte vocabular para a sflaba imediatamente anterior ow para a imediatamente posterior & posigio normal (1), como nestes versos de Augusto dos Anjos, ~Bra a elégia panteista do Universo” “Chupar os ossos das alimarias!” ‘em que: a) a palavra elegia teve 0 acento recuado por imposigio «io vers, pois com sua proniincia normal deixaria o verso de ser decassflabc:; b) a palavra alimdrias teve seu acento deslocado para a silaba -ri-, pelo mesmo motivo e, mais, para fazer rima com dias, como se pode ver pela quadra donde foi extraido o verso: “E por trezentos e sessenta dias Trabalhar e comer! Martirios juntos! Alimentar-se dos irmios defuntos, Chupar os ossos das alimarias!” Como se observa, o recuo ou o avango do acento so motivados pelo esquema do verso e/ou pela necessidade de rima. Quando nfo se trate de inovagto do poeta, que efetua a translaglo do acento em palavras que normalmente nko o permitem, muitas sfo as fontes a que se pode dirigir para obter ejustificar o deslocamento acentual: a) linguagem poética do tempo ou de épocas anteriores; ») oscilagao na pronincia do vocdbul ©) aproveitamento de formas arcaicas com o acento noutra posigo. 4.11.1 0 conhecimento da prontincia padrio de cada época & importante para verificarmos se houve realmente deslocamento intencional e (1) Como metaplasmos, © recuo e 0 avango do acento forte recebem o4 nomes respestivos de sisiole e didstole, espécies de hiperbibarmo, Tals teimos s80 dispenséveis na terminologia versificatria, 32 Rogério E. Chociay funcional do acento pelo poeta (1), ¢ igualmente importante é observar 0 vocdbulo noutros versos do mesmo poeta. Nada impede, por exemplo, que ‘um poeta traia a proniincia de seu tempo e lugar, empregando uma palavra em que & posigio do acento diferente da normal: o problema é verificar na sua obra se ele 0 faz sempre ou algumas vezes apenas; e, em qualquer caso, se a translagdo do acento surge por necessidade do esquema do verso ou & devid: outros fatores. Continua sendo aqui a funcionalidade o melhor critétio Wdentificador: se 0 acento é deslocado porque a conjuntura do verso o exigiv, hd processo de acomodagio; se ela ocorre, mas 0 verso no a necessarigmente, as implicagdes e explicagdes deverdo ser tratadas noutro campo, jé que fatores, outros que nao os estritamente versificatérios, levaram & mudanga da sflaba forte (2) 4.11.2 Exemplificamos nosso critério com a Palavra orgia, que apresenta em alguns romanticos oscitago para drgia. Nem sempre é possivel, or isso, resolver se 0 poeta decidiu por esta ou por aquela proniincia, jé que a palavra apresenta no texto as duas possibilidades de leitura sem altcrar, Substancialmente, © andamento do verso. Mas hé casos em que se percebe, apesar disso, o manejo intencional e funcional de uma ou outta. Tal é 6 emprego de drgia, em Castro Alves (Pedro Ivo), “Dorme, filha da Geérgia, Prostituta em negra érgia S€ hoje Lucrécia Borgia Da desonra no Balcio! . ue surge por necessidade de rima com Geérgia ¢ Bérgia. Sendo outras as ircunstancias,é utilizada a prontincia orgia: “Cantavam!. . . Reinava Festa! Festa! E ninguém (O Fantasma e a Cangao) “Tens 0 seio de fogo e a alma fria, 0 cetro empunhas hibrico da orgia” alia) (1) 0 Prof. Pétices Hugénio da Silva Ramos alertov-nos, recentemente, para 0 perigo que representa o desconhecimento da proniincia do tempo ¢ higar do poeta. mos julgat que este pratica a translagio do acento, quando na realidade ce 36 az seguir a proniincia normal de seu tempo (rem sempre igual ade hoje), Tal, Por exemplo, 0 caso de hipodromo (paroxitono) em B. Lopes (“Eamejando nas taias do hipodromo"). prondincia normal na época lugar do poeta. (2) Fatores de ordem estilstica, por exemplo. Teoria do Verso 33 Em Alberto de Oliveira, nota-se 0 aproveitamento funcional da translagdo do acento de murmuirio para murmurio, em “Desce a corrente do rio O barco sem remadores. Que secreto murmurio Da ritanceira entre as flores!” (Serenata do Rio) neste caso exigida pelo alinhamento heptasslibico do verso e para perfazer ima com rio, Noutro texto, quando a rima é com purplireo, 0 poeta serve-se da forma murmuirio “E juntando a essa voz 0 glorioso murmiirio De minha fronte e abrindo ao largo espago 0s véus, Ir com ela através do horizonte purpiireo E penetrar nos céus; Aspiragao) 5. Receita e realizacdo dos versos 5.1 Antes de tentarmos esclarecer aspectos e colocar problemas que envolvem 0 conhecimento da receita métrica e da realizagao concreta dos versos, necessirio se torna rever algumas nogdes e situar outras: 5.1.1 Jd sabemos que o sistema de contagem atualmente wando entre nds basela-se no padnio agudo, que despreza na contagem e denominacio numérica dos versos todas as silabas posteriores A tltima forte. Assim, as trés terminag®es comuns dos versos 1 (aguda) aS (grave) m- (esdrixula) feduzem-se, em termos de conjagem, 20 padrdo agudo (I). Deste sistema difere 0 usado, por exemplo, na versificaggo espanhola, que toma por base 0 adrao grave (II), considerando uma silaba além da iltima forte; neste caso, ‘conta-se sempre uma a mais para as terminagdes agudas (I), depreza-se uma no caso de terminagdes esdrixulas (III). Nesta exposicd0, como em todo 0 nosso Livro, estaremos seguindo, na denominacte dos vertos, o padrdo agudo di contagem, embora no estudo da estrutura e do andamento tenhamos de aproximar constantemente ambos os padrdes, com o intuito de melhor esclarecer certos fatos. 5.1.2 Indicamos, a seguir, um quadro comparativo das denominagdes dos principais versos segundo os dois sistemas: Teor do Verso 35 ULTIMA — PADRAO AGUDO. PADRAO GRAVE FORTE eco 5 eee oda monossflabo dissilabo 2a. dissilabo trissflabo 3a, trissflabo tetrassflabo 4a. tetrassflabo pentassilabo Sa. pentassflabo hexassilabo 6a. hexassflabo heptassilabo Ta. heptassflabo octossitabo 8a. octossilabo eneassilabo 9a. eneassilabo decassilabo 10a. aecassflabo hendecassflabo Ma, hendecassflabo dodecassilabo 12a, dodecassilabo tridecassflabo 13a, tridecassflabo tetradecassflabo. 5.1.3 Os versos tém obedecido tradicionalmente a um sistema baseado no jogo combinatério das sflabas com ¢ sem intensidade relevante. Devem-se aqui considerar dois nfveis: 1.0) o da pura distribuigdo de silabas marcadas por intensidade relevante (fracas e fortes) entre os intervalos representados pelas sflabas intensivamente lrrelevantes (fraqu(ssimas); 2.0) o da distribulgto das silabas que se destacam pelo maior valor relativo de intensidade (fortes). 0 esquema do primeiro nivel, sendo de ordem puramente distributiva, nos ‘mostra a ocorréncia, em cada verso, de seqincias de ordem binéria, terndria ¢ quateméria (1). O esquema do segundo nivel dé-nos o retrato peculiar do andamento de cada verso. 5.1.4 Outro dado importante a entrar em consideragdo ¢ o da receita métrica. Pode-se afirmar sem receio que todo verso é realizado tendo-se em mente, com maior ou menor clareza, uma receita tebrica, que lhe fixa 0 nndimero de silabas € alguns apoios bésicos. A verdade € que essa receita, usualmente chegada ao poeta através do tom normativista dos manuais de versificago, nunca consegue ser demasiado proibitiva, deixando maior ou menor niimero de fatores implicitos, cuja exploragdo ¢ desenvolvimento fleam « cargo do dinamismo ertador @ verbalizador de cady posta. Para a mals rigida das receitas sempre houve desvios espontneos ou intencionals de parte dos poetas, ¢ o falar-se em erro, ai, nem sempre serd procedente, j4 que a versificagio, como alids qualquer atividade cultural humana, é dindmica ¢ (1) Para entender melhor estas nopGes aqui apenas sumariadas, é ler o Capitulo Segundo #0 Capitulo Sexto. 36 Rogério E. Chocity aberta, ndo se podendo enclausurar em normas excessivamente rigidas e ‘vercitivas (1). 5.1.5 Encerremos estas nodes dizendo que, embora a versificago se fundamente no nimero de silabas e nos fatores de intensidade e pausas, muitas vezes estes dados no serio suficientes Para explicar certos fatos, raz3o Por que temos de recorrer também & entoagdo e & propria duragdo, pois nada que 6 do idioma se perde no verso, 5.2 Tomemos para exemplo o verso decassilabo (padréo agudo), cuja receita Senérica indicada tradicionalmente pelos manuais de versificacZo pode ser assim resumida: a) um alinhamento de dez sflabas, contadas até a tltima forte; b) localizagio obrigatéria de silabas fortes fundamentais (além da Altima): da 6.4, no tipo comumente designado por herdico; da 4, no tipo sifico; ¢) repidio pela acentuagio da 5.2 e 7.8 silabas; d) pausa previsivel, mas no fatal, apds s 6.8 sflaba (no herdico) ¢ apés a 4.2 (no séfico). Estudando essa recelta, que 0 uso dos poetas consagrou, podemos verificar que ela realmente se define, em termos intens ivos, pela neutralidade de trés silabas {mpares, impedidas de receber carga intensiva relevante, ou, pelo menos, de eoeber carga intensiva que desequilibre a acentuagio fundamental de cada tipo (6-10 ¢ 4.10): 123456678 9 10 Eseas trés silabas slo, portanto, a 5.2, 2 7.4, evidentemente, a 9.8, pela posicfo imediatamente anterior a ultim: forte do verso. O comportantento do decassilabo assim elaborado, num primeiro nivel de alternancia intensiva, Insereve-se num esquema fundamentalmente bindrio '@2@5O©7O9@ Cujas realizagdes concretas apresentam o destaque intensivo de duas ou mais silabas fortes no interior do verso, em esquemas como por exemplo, 2610 46-10 4810 2.6810 468-10 246-10 ete, realizagdes que ndo traem o esquema de alternincia fundamental, Este $6, apresenta possiblidade de quebra relevante do binarismo com a imposigdo da intensidade forte na 1.8, 3.2 ou em ambas essas silabas: 13610 1-610 3610 ete, (1) Exemplo disso & a prétiea, entre nbs, do verso slexandrino elfsico, que estudaremos om detalhes mais adiante. Em certos casos, hi uma distancia enorme entre a receite feérica de tal verso, que se queria rigid ea realizes concretas, qu descobeen Possblidades nfo prevstas pela receita. ‘Teoria do Verso 37 5.2.2 Isto entendido, estudemos a relagio de versos seguinte, escolhidos por apresentarem caracteristicas comuns: “0 espago da estreitissima clausura,” (Tasso da Silveira) “Repetiremos passos ancestrais.” (Tasso da Silveira) “Na memoria arqui-hicida de Deus.” (Tasso da Silveira “Refletiste um semblante adolescente” (Tasso da Silv “As imensas auroras do Futuro!” (Antero de Quental) “Para cobrir as trevas da miséria!” (Antero de Quental) “E 0 esquecimento brotard também.” (Tobias Barreto) “Extase do siléncio vertical.” (Dante Milano) ra) A escansdo destes versos apontard que eles se enquadram na receita métrica, ‘nfo apresentando carga intensiva na 5.2, 7.4 ¢ 9.8 silabas. Suas construgdes sintéticas no prevéem o surgimento de qualquer pausa interna, desenvolvendo-se todos numa seqiléncia melédica continua da primeira & ‘altima sflaba, Em seu andamento, estes versos seguem perfeitamente os Principios de alternancia intensiva enunciados no Capitulo Segundo, pois ‘mantém invariavelmente os espagos de uma, duas ou trés sflabas fraquissimas entre fracas ou fortes, Ganham maior dostaque as s¢labas fortes, sendo estas ue, segundo a posigdo que ocupem, criam espécimes distintos: 26:10 46-10 3610 36-10 36-10 46-10 26:10 48-10 1-610 respectivamente. Como vemos, 0 contorno intensivo destes versos apresenta trés dpices intensivos, que noutros exemplares poderdo aumentar de numero (1). As silabas anteriores e as imediatamente posteriores a cada forte a ela se subordinam intensivamente, fato que nos possibilida recortar teoricamente o alinhamento de cada verso em tantos segmenios quantas forem tais sflabas fortes. No caso destes exemplares, podemos constatar a variabilidade de ‘nimero de silabas ¢ relagbes dos segmentos entre si 2 6 10 “O espaco / da estreitissima / clausura,” 4 6 10 “Repetiremos / passos / ancestrais.” 3 6 10 “Na meméria/arqui-licida/de Deus.” 3 6 10 “Refletiste / um semblante / adolescente”” 3 6 10 “As imensas / auroras / do futuro!” () Isto serd desenvotvido no estudo do Andamento Acentual, 38 Rogério E. Chociay 4 6 10 “Para cobrit / as trevas / da miséria !” 2 6 10 “Eu falo / das ruinas / do passado,” 4 8 10 “E 0 esquecimento / brotard / também. 1 6 10 “Extase/do silencio / vertical.” E de se notar que estes segmentos apresentam as trés possibilidades de terminagdo que caracterizam os vocabulos do idioma:... 1... __, ... Ll _.. Entre um segmento outro poderio ocorrer a sinalefa ou a ligaedo (1), desde que haja condicdes para tal. Nos exemplares em foco, a sinalefa transforma numa s6 as sflabas final e inicial dos segmentos 3 6 “Na meméria/arqulicida ...” 3 6 10 “Refletiste / um semblante / adolescente ” € aligagdo firma uma sflaba interyerbal em 6 10 “ passos/ancestas.” 3 6 “As imensas / auroras, , .” “Para cobris/ as trevas, . .” Um estudo mais profundo nos revelaré que estes segmentos impausados podem ter menos ¢ mais sflabas do que os dos exemplares apresentados, mas caracterizamse sempre pela presenga de uma s6 sflaba realmente forte. 5.2.2 Um novo rol de exemplos, também escolhidos pelas caracteristicas comuns que apresentam, aumentard as informag6es anteriores: “Que alegre, que suave, que sonora,” (Cléudio Manuel da Costa) “Do claro, do suavissimo Mondego,” (Cléudio Manuel da Costa) “Com mais énsia, mais dor, mais agonia.” (Cléudio Manuel da Costa) “Comovidos estais, uma inimiga” (Claudio Manuel da Costa) “Lembra-te, caminhante, da ternura” (Céudio Manuel da Costa) “E 0s que se inclinam, mudos e impassiveis,” (Antero de Quental) “Cortado de rekimpagos. . . anseia” (Antero de Quental) (1) V. ligopdo e sinalefa, no Capitulo Quarto ~ Frocessos de Acomodaséo. Teotindo Verto 39 “Consolagdo. ... saudade. .. e inda esperancas. ..” (Antero de Quental) “Os vagalhdes, as érvores, os ventos,” (Dante Milano) “Metamorfoses, conexdes monstruosas” (Dante Milano) Os exemplares agrupados acima trazem acréscimo de caracteristicas 20s anteriores, pois articulam-se em’ membros que resultam distintos melodicamente (isto néo acontecia aos segmentos em que dividimos os versos do primeiro rol, inscritos todos num mesmo esquema global de entoasao). Tais membros sio comumente separados por pausas ou, dito de outro modo, apresentam a possibilidade de serem balizados por pausas solicitadas pelas construgées sintéticas que encorpam os versos. Apesar disso, uma comparago entre 08 segmentos impausados ¢ os membros articulados Patenteia a identidade de ambos quanto & posiglo da silaba forte e, em muitos casos, quanto ao nimero de silabas: 2 6 10 “Bu falo / das nuinas / do passado,” 2 6 10 -""Que alegre,// que suave,// que sonora,” 3 6 10 ““As iinensas / auroras / do Futuro!” 3 6 10 “Com mais ansia,// mais dor,// mais agonia.” 4 6 10 “Repetiremos / passos / ancestrais.” 4 6 10 “Consolagio. . // saudade. ../¢ inda esperangas, ..” 4 6 10 “Os vagalhdes,// as érvores,// of ventos,”” 1 6 10 “Extase / do siléncio / vertical.” 1 6 10 “Lembra-te,// caminhante,// da temura” Por outro lado, membros de maior nimero de silabas apresentam mais de uma sflaba forte, valendo dizer que se subdividem em segmentos, a semelhanga dos versos estudados em 5.2.2 e s.: 2 6 10 “No espaco/da estreit ssima/clausura” 2 6 10 “Do claro,// do suavissimo / Mondego: 2 6 10 “Cortado / de relimpagos. ..// anseia” 40 Rogério E. Chociay 3 6 10 $ imensas / auroras/do futuro!” 3 6 10 “Comovidos/estais, // uma inimiga” 4 6 10 “Repetiremos / passos / ancestrais.”” 4 6 10 “E 0s que se inclinam, // mudos / ¢ impassiveis,” ro 4 6 10 “Metamorfoses, // conexdes / monstruosas” Nada impede que entre os membros ocorra a sinalefa, como em 6 10 “,.. saudade...// e inda esperangas. .." fato esse to comum af como entre segmentos, dado o fato de que a pausa, que s¢ permite entre eles, ndo representa um fator imprescindjvel, podendo desaparecer sem prejuizo para 8 compreensio, 5.2.3 Pelo que se viu, as possibilidades de estruturagiio de tal verso, a partir das normas gerais da receita, sfo numerosissimas (e repare-se que estamos trabalhando com exemplos que apresentam apenas duaé fortes internas). O decassilabo 3-6-10, por exemplo, pode realizar-se através de variadas combinagdes de segmentos ou de membros, como por exemplo: Teotia do Verso 41 inte e sete combinagdes diversas que se tornardo muitas mais se os segmentos forem maiores que of acima, mas a eles equivalentes pela unido por sinalefa; que se tornardo muitas mais se os esquemas acima corresponderem a membros articulados; que se tornarfo muitas mais se houver um membro maior, com duas fortes, ¢ um menor. E isto para um s6 dos muitissimos esquemas possives. .. 5.2.4 Novos exemplares, dos muitos que poderiamos continuar alinhando, mostram-nos que a coisa ndo para necessariamente “Dinheiro, luxo, gléria, amor, poesia,” (Dante Milano) ““Flutuante, fina, aligera, fugace,” (Mauro Mota) ““Deixo-me estar, sombra desacordada,” (Dante Milano) “Meus olhos, igrimas petrificadas” (Dante Milano) “Que o canto glorificard somente” (Mauro Mota) “De descobertas e de profecias” (Joaquim Cardozo) “Flores, murchai. Aguas, apodrecei.” (Dante Milano) “Respondeu: Cruz, eu sou a Natureza!™ (Antero de Quental) “Paz! Paz! Brincai, adormecei, criangas! (Joaquim Cardozo) Neles vislumbramos as, praticamente inesgotaveis, possibilidades de realizagio ritmico-expressiva do alinhamento decassilabico, em articulagbes bimembres, trimembres € multimembres, com maior ou menor dose de submissio 3 receita genética, que podem apresentar maxima proximidade de sflabas fortes ou, a0 contrdrio, méxima distancia: 42 Rogério E. Chociay 2 4 6 8 10 “Dinheiro, // luxo, // gloria, / amor, /] poesia,” 2 4 6 10 “Flutuante, // fina, // aligera, // fugace,” 1 4S 10 Flores, // murchai. // Aguas, // apodrecei.” 12 4 8 10 “Paz! // Paa! // Brincai, // adormecei, // criangas!” 30 4 6 10 “Respondeu: // Cruz, // eu sou / a Natureza !” 1 45 10 “Deixo-me / estar, // sombra / desacordada,” 2 4 10 “Meus olhos, // Iigrimas/petrificadas”” 2 810 “Que o canto / glorificard / somente” 4 10 “De descobertas / e de profecias” 5.2.5 E paremos por aqui, dizendo que todos os versos, de quatro a doze silabas, podem upresentar, na proporgdo direta do ndmero de silabas de seu alinhamento, menos ou mais realizagdes baseadas nos dois tipos de estruturagdo que acabamos de verificar para 0 decassilabo: a) através de segmentos impausados, cada qual caracterizado pela presenga de uma silaba forte, num alinhamento melédico continuo; b)através de membros articulados, relativamente independentes, de niamero varidvel de silabas € que podem comportar mais de uma silaba forte. Estes dois modos de elaborago na realidade nfo se opdem, mas representam duas faces distintas baseadas numa mesma receita teérica, que fixa apenas namero de sflabas num alinhamento Gnico e uma ou duas silabas fortes fundamentais no seu interior. Verdade que um ou outro exemplar que explicamos parcce afastar~: demais de tal receita, mas julgé-los errados seré norar a distincia que vai do Metro ao Ritmo; o artista aceita padrbes, mas ndo se prende necessariamente a eles, quebrando-os sempre que a irregularidade for mais expressiva que a regularidade. Por todos esses motivos, 4 pura indicagao dos esquemas de intensidade deve ser entendida apenas como um primeiro passo para compreendermos a sua realizado integral, devendo seguir-selhe necessariamente a descrigéo dos segmentos e membros, a verificagao dos fatores de entoagdo ¢ duragao, bem como a relagdo dos versos no todo estrofico. Nesse sentido, um estudo minucioso e sem preconceitos & tarefa promissora, principalmente pelo fato de irmos descobrindo que, quanto Tedtiado Verso 43 mais nos afastamos do Metro, mais nos tomamos capazes de aprender 0 Ritmo que fui em cada pocma, indissoluvelmente aliado a expressio. 5.3 Problema também complexo oferecem a receita e as realizagdes dus 80s compostos, claborados segundo uma receita que prevé dois, alinhamentos métricos, formados Por membros de mesma extenso silébica (em termos de contagem). Neste caso, € melhor partirmos de exemplos coneretos, formando estrofes, e irmos aos poucos elucidando os moldes de sua elaboragao, bem como os resultados obtidos: “Tio dolorosa e triste que espera as horas mortas, Para afogar seu brilho no palio tenebroso, ‘Tio surda que ao rolar nas faces desbotadas Talvez nem a pressinta o misero inditoso, Hé um pesar ainda mais bérbaro e cruento! E esse que enregela as lagrimas nos olhi E queima a gota fiilgida que a madre natureza Verteu como um consolo, da vida entre os abrothos!" (Fagundes Varela) 5.3.1 Se fizéssemos a escansio destes versos como alé agora fizemos a dos anteriores, inclusive observando as sinalefas que uma leitura normal pediria, terfamos resultados esquisitos, j4 que alguns deles apresentariam doze, outros teze, outros quatorze sflabas. Contudo, estes versos s80 todos simétricos, 0 que perceberemos claramente se levarmos em conta a receita segundo a qual foram eles elaborados. Os oito versos acima se estruturam: a) como a soma de dois membros simétricos ou melosversos ou hemistiquios, cada qual com a sexta silaha sempre forte; b) podendo ambos os hemistiquios terminar, indistintamente, em palavras oxitonas (Lerminago aguda). 6 6 a a paroxitonas (terminagao grave), 6 6 ee Loy (ou proparoxitonas (terminagdo esdnixula), 4 Rogério E. Chociay ©) tornando-se obrigat6ria uma cesura (1), que separa nitidamente os hemistiquios entre si; 4) ocorrendo a cesura perpendicularmente em todos os versos da estrofe e do poema, situando-se entre palavras e coincidindo geralmente com pausa sintitics €) devendo-se considerar interdita a sinalefa entre os hemistiquios, ‘mesmo que esta seja possibilitada pela auséncia de pausa sintética. Deste modo, a leitura deverd levar em consideragio a concepgao métrica destes versos, Tio dolorose tite I] que espera as horas, mst Para afogar seu batho 1 n0 patio tenebrxo, Tao surda que ao rola / ns faces desbotads Talveznema oe Ifo misero aioe (1) Como vimos no Capitulo Segundo, a cesura & uma pausa obrigatéria entre hhemistiquios. Teoria do Verso 45 Ha um pesar an ida // mais bérbaroe ervetol Besse que eaves Has tgrimas nos ohost E queima a gota figida J] que a madre natureza 6 Verteu como um con, 1] da vida entre os abrolhos! As variagBes de terminagZo do primeiro hemistiquio destes versos so explicadas pelo sistema de contagem a que obedece sua elaboracio: 0 padrao considerado é o grave, pressupondo o edmputo de uma sflaba além da iltima forte (6.8), conforme o esquema bésico 1234567 12345 67 oe Loy he a que se reduzem as outras terminagdes posstveis, contando-se, pois, uma a ‘mais, sea terminaglo for aguda, como no verso n.° 3; ou desprezando-se uma, se a terminaggo for esdrdxula, como no verso 1.0 7. O niimero de silabas total considerado seré sempre o do esquema bésico, ou seja, quatorze. Somente a ignorancia destes principios poderia levar alguém a considerar necesséria a sinalefa entre os hemistfquios, no caso dos versos n.°8 4 ¢ 6, reduzindo ambos a treze silabas (padrio grave). A verdade € que, parega ou nto artificial ¢ forgado em relago a nossos habitos versificatérios, @ estrutura destes versos torna indispensivel a cesura, e esta impede a sinalefa do mesmo modo como a impede a pausa interversal. Esta divida no existe na versificagdo espanhola; donde Fagundes Varela tomou 0 modelo, mas somente na nossa, em que tal receita teve poucas realizagGes (1). Informados ¢€ habituados que estamos pela teoria e leitura do verso alexandrino cléssico ou francés, cuja condigio vital ¢ a sinalefa apés primeiro hemistiquio grave, somos tentados a cret, por pura inexperiéncia, que a mesma deva ser feita para os versos trés-estudados. Mas um pouco de informagao faz-nos ver que ‘nossos poetas arcédicos € roménticos praticaram tal verso com regras proprias ‘a que devemos obedecer na escansio. () Quem primeiro elucidou estes problemas em nossa versificagao, dirimindo as dvidas surgidas pela desinformasio tedrica ¢ histérica de muilos, foi o Prof. Péticles Eugénio da Silva Ramos, principalmente em obras como “O Verso Roméntico ¢ Outros Ensaios" ¢ “Do Barroco a0 Modernismo”, que citamos em mais de um ponto ‘em nosso livro, te Reyne b Chctay 5.4.2 Se entendidas as explicagdes, coneluiusse que 0 verso alexandring antigo ow arcaico ow espanhol (1), que estamos estudando a partir de exemplos de Fagundes Varela, & um verso composto, estruturado,com base ‘unin esquema fundamental de dois hemistiquios graves separados por cesura, teduzindo-se todas as suas realizagdes possiveis a0 cOmputo de quatorze silabas, sempre acentuado obrigatoriamente na 6.4 e 13.4 silabas. Sobre seus problemas particulares, falaremos no estudo da Tipologia dos Versos. Sua receita tetradecassilibica deixou de ser considerada, quase totalmente, apos o Romantismo, substituida que foi pela do alexandrino clissico ou francés, dodecassilibica, cujo grande uso se deve principalmente a doutrina de Castilho, embora jé tivesse sido praticada anteriormente por outros poctas, inclusive por Bocage. 54 0 verso alexandrino. clissico ou fran principios de composigio, porque és apresenta diferentes a) todas as sflabas internas so contadas, sem se permitir a sobra apés 0 primeiro hemistiquio; b) formarido-se cada Verso de dois hemistiquios hexassilabos, segundo o esquena fundamental 12345 67 8 90 22 - Ln ¢)com a cesura fixada imediatamente aps a sexta silaba forte do Primeiro hemistiquio; 4) podendo essa sexta silaba pertencer a palavra aguda, como em 6 12 “Molemente emergir // & flor da face trémula” (Olavo Bilac) ou a palavra grave, “Doirava o sol de outubro // a aeia dos caminhos” (Olavo Bilac) caso em que o primero membro do verso deve terminar em vogal e 0 segundo iniciar por vogal, processando-se, obrigatoriamente, a sinalefa entre (Q) © termo “areaico™ nao ¢ dos metiores para rotular este verso, ji que boa parte dos vversos, ainda hoje usados, também o foram em priscas ctas. Conforme observa o Prof Péricles Lugénio da Silva Ramos, a designagio de “espanhol” também ndo é muito pprocedente, ji que os “alexandrinos arcaicos figuram em nossos cancionciros Imedievais © antes de serem espanhis ji eran franceses” ("Do_Barroco 30 Modernism", Comissio Estadual de Literatura, $0 Paulo, 1968, p. 147). Tebriado Verso 47 ambos: com isso, a tiltima silaba de um e a primeira de outro tornam-se uma 86, resguardando-se a integridade tedrica do esquema fundamental, “Doirava 0 sol de outu // bro_a_areia dos caminhos” 6 12 aby ek €)sendo portanto © verso computado sempre em doze silabus, conforme © padrio agudo de contagem (0 padrio grave, contando além da 12.9 silaba, considerard treze_ silabas). 5.4.1 Continua-se a falar ai em hemistiquio e em cesura, mas em ambos os casos trata-se de conceito diverso do verificado no alexandrino antigo, Com efeito, se & pacifica uma pausa ou pelo menos uma fronteira intervocabular no caso de 0 primeiro hemistiquio ser encerrado pela sflaba forte de palavra aguda (1), como em “De luto e de esplendor, // de crepes ¢ auriflamas” (Bilac) “Para a respiragdo // suavissima Ihe ouvir” (Bilac) (© mesmo nao acontece quando o primeiro membro do verbo apresenta-se terminado por palavra grave, “Cruzam-se numa prece // as suas mos pequenas” pois 0 espaco entre os dois membros do verso & preenchido pela sinalefa. A divisio ““Cruzam-se numa pre //c@ as suas mos pequenas” € meramente te6rica, surgindo pela necessidade de justificar a existéncia de - hemistiquios, numa estrutura simétrica 6+6 de ordem puramente acentual, j4 que a iltima sflaba do verso ndo é contada, e a que sobra apés a 6.8'se ‘embebe na primeira silaba do segundo hemistiquio. O termo cesura, nesig caso, $6 pode ser usado para designar este corte fedrico, nunca uma pausa 2, pois esta, se chega a existir entre a iltima silaba de um membro ¢ a primeira de outro, anula-se no todo vérsico em fungdo da sinalefa. Temos para nés que 2 passagem de um membro do verso a outro é suficientemente destacada pela intensidade forte da sexta silaa. A pritica do alexandrino cléssico entre nés apresenta freqiientemente discrepancias entre a receita tebrica e as realizagdes (2) Observe-se que essa realizagio fi era uma das possiblidades do alexandtino antigo, tambora os prineipios fossem outros. 48 Rogério E. Chociay Conéretss. Sobre isso, deixamos para falar no estudo especial do verso (Capitulo Sétimo), 5.4.2 Se compararmos entre si as receitas dos versos alexandrinos antigo © cléssico, veremos que eles sio estruturados segundo diferentes Principios, mes se encaixam perfeitamente num mesmo fundo comum, formado pelas relugdes possivels de dois membros hexatsilabos num dnice ‘alinhamento: SILABAS 12345678 1234567 8 REAIS 1 12 " 13 ml 14 Vv 13 v 14 VI Is vil 4 VIL 1S 1x 16 O alexandrino antigo toma por base o esqueman.© V, 123456712345 67 To bat A o gve 6 rave Com ambos os hemistiquios graves, cada qual com 7 silabas. Impse a cesura (Como pausa que interdita sinalefa) entre os hemistiquios ¢ aceita todas at nove possibilidades de realizacto sildbica.dos hemistiquios, embora em termos de contagem reduza-as sempre ao padrio tetradecassilibico, com acentee Principals na 6.8 ¢ 13. silabas. O alexandrino cldssico toma como base o esquema I, 12345678 90n 2 eee ee L 6 agudo+6 com ambos os hemistiquics agudos, cada qual com seis slabas. Com essa Primeira atitude te6rica, incorpora apenas as trés primeiras posstilinles at tude enfrente um uso atraig Gur eso uso, por vezes indiscriminado, foi que trouxe a ambighidade de sentido Que © termo penosamente carrega, Teoria do Verso 49 fealizagdo, reduzindo-as sempre em termos de contagem as doze silabas do padrio. Numa segunda atitude, aceita os esquemas IV, V e VI. de Primeiro membro grave, com a condigao de que a ultima silaba do primeiro realize sempre sinalefa com a primeira sflaba do segundo membro: 2 cesura (como corte tebrico) € imposta sempre imediatamente apés a 6.2 sflaba, resguardando-se a simetria 6+6. As realizagdes de VII, VIII € IX ‘nfo poderiam entrar na recelta, pois mesmo com sinalefa ‘o verso viria a ter mais de doze silabas; contudo, um primeiro membro hexassilabo esdrixulo poderia combinar com um segundo pentassilabo (c/sinalefa entre ambos), ou com um segundo membro tetrassilabo (s/sinalefa) 1234567 § swun ~o ete a 12345678 own Estas formulas também nao entraram na receita, a nosso ver por dois motivos: a) deixariam de existir dois’ hemistiquios hexassitabos, sendo o verso formado or dois membros assimétricos; b) a sistematizag#o do alexandrino elassico partiu da Franga, ¢ o idioma francés nfo possui vocdbulos proparoxitonos, Fazio por que os esquemas acima nem poderiam ser cogitados. Mas eses Preocupagio poderia ser nossa: daria certo o verso com tal formag0? Sim, daria, tanto quanto o esquema 6 grave + 5, explorado, intencionalmente, por alguns poetas. 6 n “E 08 velhos, quando passo,// vendo-me tio pélido,” (José Duro) nao cabendo aqui acusagdes como “quebra do ritmo”, “indecisio acentual” tc. jf que 0 verso possui andamento idéntico a muitos outros que seguem a receita, 54.3 Vem muito a propésito anotar que em nossos tempos o alexandrino recebeu de Jamil Almansur Haddad, na tradugio de Verlaine (1), um tratamento livre de preceitos rigidos, conciliando, de certo modo, as receitas antiga € cléssica (aproveitando ambas as possibilidades do mesino fundo em que se inscrevem as duas receitas). Em “Prologo”, sfo empregados intencional ¢ conscientemente (como 0 provam as notas do préprio tradutor). (1 Rerlane = Poemat, Seleio, tradugéo, preficio e notas de Jamil Almansur Haddad, Difusio Européia do Livro, Sio Paulo, 1962, pp. 33-38. 50 Koger F. Chociay a) alexandrinos de primeito hemist iquio agudo: 6 12 “Sera que muito apés// nas batalhas mais loucas” ) alexandrinos de primeiro hemistiquio grave com sinalefa: 6 R ““A Forga que 0 Poeta // outrora segurava” c) alexandrino de primeiro hemistiquio grave sem sinalefa com o segundo (também hexassilabo): 6 13 “O pacto primitivo // que o tempo consumiu” 4d) alexandrino “irregular” ou, se se prefere, dodecassilabo de estrutura 6 grave + 5: 6 12 “Elevaram-se augustos // ao Nada dos Sonhos” ) alexandrino ou dodecassilabo “trimétrico”: 4 8 12 “Posteridade, vossos ecos no cansados”” Os efeitos obtidos, que se nos afiguram excelentes, demonstram de modo inequivoco a legitimidade de um caminho infelizmente nunca trilhado pelos ‘nossos poetas: a busca de relagdes ndo ortodoxas, embora sem descambar para a ametria total 5.5 Entendida a receita destes dois versos, nfo podemos deixar de cait na tentagdo de teorizar no vazio, isto é, sem considerar exemplos concretos, inferindo a possibilidade de o mesmo arranjo poder tornar-se exequivel com hemistiquios de menor nimero de silabas: a)5+5; bara. 5.5.1 As probabilidades 5 grave + 5 grave, ou 5 agudo + 5 agudo, enquadram-se também num fundo comum: Tegtia do Verso $1 SILABAS REAIS 10 ~ " —--~ Dv " 12 —-- 2B n - 13 -- «4 1234567 891011 KARKAKAKA | dar-nosd um verso composto to molde do alexandrino antigo. Possul cada hemistiquio seis silabas, com acento principal na 5.8. A adogio desta base, ¢ da cesura que separa seus hemistiquios, implica a aceitagio de todas as nove possibilidades de realizagdo, embora o verso venha a ser computado sempre, conforme o esquema bdsico, em 12 silabas, cujos acentos principais recairio na 5.4 11.8 silabas de seu alinhamento global. A adogio da base I, 5 agudo + Sagudo, 12345 6789 10 permite-nos estabelecer um verso andlogo a0 alexandrino clissico; cada hemistiquio somando cinco sflabas, com acentos principais na 5.8, Adotada esta base decassilébica, os esquemas IIe Ill a ela se adaptam perfeitamente em termos de contagem; os esquemas IV, Ve VI poderio entrar fazendo sinalefa entre os hemistiquios. J4 os esquemas VII, VIII e IX nao teriam possibilidade, pois mesmo com sinalefa (como no caso do alexandrino clissico) extravazariam © niimero méximo de dez silabas do alinhamento, Se se deixasse de lado a necessidade de resguardar a simetria 5+5 dos hemist{quios (ainda como a simetria 6+6 do alexandrino cléssico), pensando-se apenas no alinhamento decassilébico, a coisa poderia dar certo do seguinte mod8: 52 Rogétlo E. Chociay 123456 #789 10 =a aba + = HL (sem sinatetay Hee bh yi Ls (semsinalefa) Le — L. comsinatetay Voltando a realidade, ¢ 0 caso de perguntar se existe este ultimo verso. Nos poetas simbolistas e nalguns modernos em que encontramos exemplares que tajs, usualmente misturados a decassflabos de base 6+4 ou 4+6, embora sejam telativamente poucos os exemplos, dé para ver que a receita ¢ exequivel. Sobre 0 uso de tal esquema na poesia trovadoresca, falem os especialistas no ‘assunto. Mas 0 esquema baseado em hemistiquios pentassilabos graves (5 grave + 5 grave) serve-nos e muito, pois foi ele que, segundo nos informa 0 Prof. Péricles Eugénio da Silva Ramos, os roménticos tiveram em mente na elaboragto do verso de arte maior (hendecassilabo, na contagem de padrio ‘agudo, dodecassilabo na de padrio grave): “O primeiro hemistiquio, no verso de arte maior romantico, podia oscilar na terminagdo, que era grave ou aguda, segundo 0 ensinamento de Filipe Nunes, repetido por Bluteau, ¢ até esdrixula, Alguns exemplos, na contagem atual: “Gigante de pedra de fero semblante” (5 grave + 5), Gongalves Dias, “No albor da manhd qudo forte que os vi" (5 agudo + 5), Gongalves Dias; “Somente uma légrima da face a descor” (5 esdrixulo + 5), Alvares de Azevedo. Ent conseqiéncia, no tipo $ grave +S, se o primeiro hemistiquio terminava por vogal € 0 segundo comegava por vogal, havia hiato forgado entre as duas vogais: “Ah! ndo lhe bastava a guerra continua” (Porto-Alegre), “Se via revolto 0 seio do mar” (Cardoso de Meneses), “No fogo sagrado, isento de crime” (Francisco Otaviano). Esses encontros vocdlicos entre os hemist(quios eram freqientes no verso de arte maior romintico.” (1) Prof. Péricles segue considerando que tal esquema “foi incidentalmente desobedecido pelo menos por dois grandes poetas, Goncalves Dias e Fagundes Varela”, apresentando os exemplos “A corca ligeira, o trombudo qual (Gongalves Dias) em que “ao pentassilabo inicial se acrescenta um hexassilabo, com sinalefa obrigada na 6.8 silaba”, (1) RAMOS, Péricles Eugénio da Silva ~ Do Berroco ao Modernitmo, Comissio Estadual de Literatura, Sio Paulo, 1967, p. 148. Teoria do Verso 53 s 6 ~ eee te -ak “Conteve-se o birbaro. Misero cio.” (Fagundes Varela) em que se somam um membro pentassflabo esdrixulo ¢ um tetrassilabo agudo, sem sinalefa, perfazendo 0 mimero de silabas necessirio ¢ com as outras duas sflabas fortes mantendo a mesma posigio do esquema bésico (2:5-8-11). A estes podemos acrescentar os exemplares “Do espago — por cipula ~ as conchas azuis!,.." (Castro Alves) “Por ele uma lgrima inunda. . . que faces!” (Tobias Barreto) ““— Bem cedo meu animo ardente vereis” (Junqueira Freire) “86 elas no curvam-se go mando dos homens” (Junqueira Freire) “Sua alma revolve-se em ondas de luz.” (Castro Alves) que obedecem a uma relagio idéntica entre hemistiquios, s s —a-- ete ek com um primeiro esdrixulo fazendo sinalefa com o segundo. A raziio dessas ‘ocorréncias parece-nos estar no andamento 2-5-8-11 envolvente na estrofe, que nfo ¢ perturbado apesar das variagbes de composigio, conforme procuraremos explicar no estudo especifico do verso, no Capitulo Sétimo. De qualquer maneira, um estudo que se quelra honesto do verso de arte-mator, do Romantismo aos nostos dias, nfo poderd isolarse apenas num ponto de vista, mas admitir que todos estes aspectos, de estrutura e de andamento, influ(ram em maior ou menor grau sobre os poetas na realizagdo de tal verso. 5.6 Eis o fundo comum em que se encaixam as probabilidades 4 grave + 4 rave, e 4 agudo + agudo: SILABAS 123456 123 4 5 6 REAIS Poi LZ +o 8 Holle ane 9 mol LZ +oOL lL zl Woll ze toll 9 54 Rogério F. Chociay VoL Lg a 10 Mo Le ee vil ee 10 VND et Le u LS ee 12 A adlogao da base V, 4 grave + 4 grave, 123 45 123 4 5 ~ ae bi ye be ue permite 0 aproveitamento de todas as nove possibilidades de realizagio (sempre computadas segundo a base), dénos um verso composto. semelhanga do alexandrino antigo, nomeado decassilabo pela contagem de adrdo grave, com acentos principais na 4.2 e 9.8 silabas. Foi exatamente essa @ receita que seguiu Junqueira Freire, no poema “A Freira”, de que damos duas estrofes: “O mundo, o mundo. ‘Achar a parte // a quem faltei. Eu devo, eu devo // pagar a0 homem Esse pedago // que lhe arranquei.” “Seu coragdo // — nobre fragmento — Sente um vazio, // que ha de doer, Mesmo sua alma // geme incompleta. Quase roubet-lhe // todo o seu ser.” Sao a0 todo quarenta quadras, onde se patenteiam duas terminagées para amibos os hemistiquios, que podem ser expressas nas quatro {érmulas abaixo: 4 4 —-—-—-+t— +t “A estrela Vésper // ter certos raios” ee ee ee “Seu coragio // — nobre fragmento” ‘Teormdo Verso 55 “Que vos dizeis // cheias de Deus,” nem se cogitando da sinalefa quando o primeiro hemistiquio grave termine em vogal € em vogal inicie 0 segundo, jé que a concepcio do verso, que fica bem delineada nos outros exemplares, elimina a possibilidade da unio dos hhemistiquios por sinalefa, “Boia de prata // em mar de anil,” “Tenta um alivio, // acha uma angisti: “O mundo, o miindo. . .// eu freira aflita,” chaificando-se perfeitamente a receita de verso composto nos padrdes do alexandrino antigo, a base receitual de 5 grave + 5 grave, a que se reduzem em termos de contagem as outras trés realizagdes. Poderemos, ¢ claro, chamé de eneassilabo, se pelo padrtio agudo desprezarmos as sflabas excrescentes & 9.8, mas as relagdes entre o primeiro e 0 segundo hemistiquio obedecem claramente ao padrdo grave. 5.6.2 Bem mais perto de nbs, Jorge de Lima, no poema n.0 X do Canto Il de “Invengdo de Orfeu”, serve-se de idéntica receita. Nesse poema, cujas estrofes sio sempre encerradas por um quebrado de acento na 4. silaba (com uma $6 excesio no ultimo verso do pocma), a terminagio do primeito hemistiquio ora € grave ora aguda; o segundo hemistiquio, bem como o verso quebrado, apresentam terminagBes aguda, grave e esdrixula. Claro fica que a base considerada é a de hemistiquios graves, 4 4 ee ooo es dando-nos também o verso composto, como se poderd notar nos exemplos: “Monte vazio, // través e em torno; serd meu ser? // J4 nao me lembro o onde 0 encontrei” 56 Rogério E. Chociay “Tentei suprir // vagando em brisas, contando os passos. // O jeito é rir com a boca ausente. “Agora e sempre, // continuaremos, pelos de febre, // mortes perfeitas, medos e¢ coetera.” So a0 todo 117 versos, dos quais 40 quebrados, cujas realizagdes podem ser expressas pelas formulas abaixo: 4 a) quebrados: — — —L — “Esquina aguda.” ele “onde o encontrei.” eee “medos et coetera, 4 4 b) compostos: — — — L—+— --_ L _ “Carinho alheio, // mole tangente” eo ees “Desde 0 comego, // n6 sobre nd,” —~-t—+t_i_ tiie 'No mais ¢ em tudo, // sho choros intimos” ere “Conversa vai, // conversa vern, ee ae “Tempo de apés, // danga do inicio,” Dos 40 quebrados apenas um, que ¢ o ultimo versy du poema, apresenta apenas duas sflabas:_/ __, “Seime”. Todos os outros enquadram-se numa das formulas dadas. Como jé acontecia no poema de Junqueira Freire, ocorre no de Jorge de Lima a proximidade de vogais entre um hemist{quio e outro, ‘como nos exemplos Teoria do Verso $7 “goela de lama, // aranhe mole,” “no mar me lango,// engulo em seco,” “Na sua esteira // hd um sem fé,” “Conclusio fra: // um cego canta.” © que nao significa que devam ser feitas as sinalefas. A estrutura da maior parte dos versos € por demais clara: trata-se de um verso composto de dois hemistiquios tetrassflabos, pelo padrdo grave, permitindo-se que o primeiro apresente sem problemas a terminago aguda, sendo interdita a sinalefa entre 0 hemist{quios. 5.6.3 Mas a receita que realmente vingou em nossa versificago, embora baseada na soma de hemistiquios tetrassilabos, levou em considera¢go a contagem de todas as silabas do interior do verso. Ela pode ser resumida pelas palavras do pamasiano Mério de Alencar; diz este que hd versos de nove silabas “formados de dois quadrissilabos, que se devem conservar inteiramente distintos, ¢ de modo que ndo caia entre um e outro a elisio (a nio ser quando © primeiro hemistiquio é esdrixulo)”. Temos, portanto, duas formulas: (sinalefa interdita) (Raimundo Correia) 'do!” (Raimundo Correia) —— — Lb 4 — — L Gsinateta obrigada) ““Vaga, noctambula // aparigéo!” (Raimundo Correia) “Quantos, bebendo-te // a refulgéncia,” (Raimundo Correia) A proibigfo da sinalefa, num caso, ¢ a sua obrigatoriedade, noutro, mostram-nos presente a intergo de manter a simetria tetrassilabica dos hemistiquios, embora vinculada a um miimero fixo de silabas, sem ossibilidade de falta ou sobra na passagem de um hemistiquio a outro, Princ{pio este que diversifica esta receita da estudada em 5.6.2. Pata muitos Poctas simbolistas e modemos, no entanto, o que passa a importar é apenas 0 alinhamento eneassilébico € os acentos principais na 4.2 ¢ 9. sflabas. Com ‘sso, surgem outras estruturagées através de membros assimétricos. Mas a obediéncia receita de hemistiquios simétricos também continua existindo, podendo ser verificada inclusive em modernos. 5.64 Tomando pot base 08 nove esquemas indicados em 5.6, podemos chegar ainds ao verso octosslabo acentuado na 4.2 e 8.4 sflabas. Sua formula fundamental é: 58 Rogério E. Chociay 12345678 ———+t+-— — L aagutor4 “Que vai morrer // ou que estd morta!” (Alphonsus de Guimaraens) “Tudo ilusdo, // tudo quimera;” (Emiliano Perneta) As possibilidades VII, VIII ¢ 1X, € claro, ndo podem ser aproveitadas, pois ‘mesmo com sinalefa iriam além do esquema octossildbico. As de n.0s,1V, Ve VI, a0 contrétio, sio aproveitadas, fazendo-se sinalefa entre os hemistiquios: 1234 5 678 a he te HL gre t 4 cfsinatets ““O tédio amargo, |/ 0 atroz pesar. ..” (Emiliano Perneta) “Era uma deusa // e ndo sabiamos” (Jorge de Lima) Na prética do octossilabo 4-8, contudo, ndo se respeitou, necessariamente, a simetria de hemistiquios, sendo comuns estruturagdes como: 12345 678 a tat be a graves “Caido em gotas / de luar.” (Guerra Junqueiro) “Era uma deusa, // pela duvida” (Jorge de Lima) “Da formosura / triunfal” (Vicente de Carvalho) 6 7 8 —~t— — 1 Aesdrixulo + 3 of sinalefa “Ao teu esquilido / esqueleto” (Cruz e Sousa) “Em doce frémito__amoroso" (Guerra Junquelro) “E acorda placido / a sorrir. ..” (Raimundo: Correia) 123456 78 ——4L— — +— L fesarixuto+2 “Claro ¢ difano, // cercado” (Goulart de Andrade) “Enxame olimpico / de abelhas” (Guerra Junqueiro) “A vor tristissima / do mar... .” (Vicente de Carvalho) 5.6.5 Destaque-se, @ propésito, que simbolistas como Alphonmus de Guimaraens ¢ Eugénio de Castro, percebendo o parentesco entre octossilabos 4-8 e eneassilabos 4-9, empregam-nos as vezes misturados na mesma estrofe, indo se podendo negar, nesse caso, a consecugao de bons efeitos: Teoria do Verso 59 “Sino de incento, grito de alume, Nuvem de eae num eéu bao" (Eugenio de Castro) “Sao salmos tastes, mortises, Profundas pan de penlténcia.” (Alphonsus de Guimaraens) 5.7 Chegados ao fim deste capitulo que, melhor desenvolvido, poderia dar todo um livro, apresentamos um pequeno esbo¢o classificatdrio dos versos, segundo suas possibilidades de estruturagio: 1.9) Versos elementares: colocamos entre eles os monossilabos, dissilabos ¢ trissitabos (contagem de padrio agudo), 1 2 3 4 are ele = =i —— a 2S eto a or considerarmotos apenas segmentos ou membros de verso eventualmente guindados a tal condigao (neste caso, devendo ser estudados como tal), embora usualmente atuem como quebrados. 2.) Versos simples: 0s versos cuja receita métrica prevé apenas um alinhamento global ¢ uma ou mais possibilidades de estruturagio baseadas em silabas fixas fundamentais pela intensidade. Poderdo realizar-se como simples, nna medida de suas possibilidades, os versos de quatro a doze silabas (padrio 3.9) Versos compostos: aqueles cuja receita métrica prevé dois alinhamentos simétricos (poderiam ser mais de dois), considerando-te dois ipios de composig#o, baseados em hemistiquios graves ou em istiquios agudi 44 e 4 grave + 4 grave 5H e S grave +S grave 66 e 6 grave + 6 grave Os que pertencem ao segundo grupo acima, apresentam a possibilidade de variagfo livre do final do primeiro hemistiquio, ¢ tém como ocorréncis tipica a cesura a limitar distintamente ambos 0s hemistiquios de cada verso. Nos segundos, a variagio é limitada a certos casos, ocorrendo néutros a 60 Rogério E. Chociay compehsagto da desigualdade entre os hemistiquios através de sinalefa. A cesura neste caso, ou se torna meramente tedrica ou é 0 nome com que se designa 0 ponto de intersecgo dos hemistiquios. No uso prético deste segundo tipo, verifica-se a tendéncia de incorporar formagées através de ‘membros assimétricos, normalmente sem prejufzo para o andamento e para a cadéncia acentual. 4.) Versos quebrados: 08 versos de extensio menor, correspondentes a segmentos ou membros de versos maiores, a eles combinados em estrofes heterométricas. No estudo da estrofe esclareceremos sobre sua natureza e ‘emprego. ” 6. Andamento dos versos 6.1 Para nfo nos perdermos no estudo do andamento, convém agora repetirmos sucintamente as nogdes indicadas no Capitulo Segundo: 6.1.1 Vimos que o idioma apresenta como ocorréncia mais comum, no alinhamento de vocdbulos, locugdes e sentencas, o esquema de alterndncia bindria; a alterndncia terndria representa uma substancial variagio a bindria. J4 a alternancia quaterndria, de menor ocorréncia, nfo deve deixar de ser considerada, j4 que ndo trai, fundamentalmente a {ndole do idioma (seqiiéncias bindrias © quaternérias casam perfeitamente) e apresenta virtualidade (¢ bem explorada) para efeitos expressivos. 6.1.2 Nao esquegamos igualmente da diversidade de grau de forga das silabas que apresentam carga intensiva: a) silaba fraquissima (funciona como “intervalo” b) sflaba fraca; ©) sflaba forte (de vocabulo, de locugdo, de sentenga). 6.1.3 Como a versificago nfo trai nem tem necessidade de trair 0 ‘idioma, estes principios de alternéncia nfo sto nela rompidos, embora sejam realmente as sflabas fortes (em suas trés ordens de valor) as responsdvcis pelas peculiaridades do andamento intensivo de cada verso. 6.2 Comecemos estudando 0s versos elementares, aqui denominados segundo © padrdo agudo de contagem: 62 Rogério E. Chociay 6.2.1 Os versos monossilabo e dissilabo, cujas_realizagdes, esquematizamos abaixo, 1 2 L at Le a en —-Lo_ apresentam uma 9 silaba acentuada, reduzindo-se a simples segmentos ou ‘membros, no podendo apresentar, como versos, andamento algum. Seu escasso emprego isolado no deixa de ter, por isso, suas razdes, acrescido 0 fato de se tornarem as possibilidades expressivas bastante diminutas em tio reduzido campo. Com efeito, composigdes neles baseados, exclusivamente, ou pedem uma leitura assaz forgada, se obedecermos a pausas ainda que minimas em seus finais; ou sio lidos em seqiéncia, através de sucessivos encadeamentos que 08 equiparam, no conjunto, a versos maiores articulados simetricamente. De qualquer modo, servem eles para constatarmos esquemas intensivos verficdveis em vocébulos ou seqiiéncias no idioma: 1 2 + 6 — -L amor, a voz aL — casa, faze — LL — encanto, eu canto, a vida L — ~ ‘wore, deixa-me — -L — — espirito, a pérola, deixava- -me 6.2.2 O verso trissilabo tem um esbogo de andamento intensivo, de alternincia bindria, podendo realizar-se como abaixo indicamos: 123 Lok 13 tobe 13 LiLo 143 como se poder observar nos exemplos forjados: c — -L cantador, canta a dor, leva-e-traz, este amor, buscapé — 4 — amarelo, porta-luvas, falas muito, corta as folhas; LL —fidelissimo, melancélico, estas pérolas, leva as méquinas; ‘ou nos versos: “Para espanto das mutheres, tu me queres, eeu te canto” (Cecilia Meireles) Teagia do Verso 63 ‘A primeira silaba, nos exemplos ou nos versos, sempre apresenta carga intensiva, embora variivel (fraca ou forte). Na seqléncia dos versos 0 andamento se toma envolvente, percebido como 1-3, segundo uma ordem trocaica de alternincia. 6.3 Passemos agora aos versos simples: 6.3.1 Os dois esquemas bésicos dos tetrassilabos so: Lot x14 —— 14 © primeiro traduz um andamento bindrio (2-4) ¢ 0 segundo quebra a alterndncia bindria pela acentuagao da silaba inicial. Uma pequena nuance pode ser obtida no primeiro esquema com o surgimento da 2.8 sflaba em condig&o de fraca, sendo neste caso melhor indicar o andamento do verso através do nimero 4, apesar de sabermos que o espaco da primeira a quarta silaba nunce é totalmente irrelevante. Esta variagdo forte-fraca da 2.8 silaba teré maior destaque, prestando-se melhormente a efeitos expressivos, no octossilabo 4-8 ou no eneassilabo 4-9, formados a partir de um padrio, a) de tetrassilabos agudos: —~— t+ ee b) de tetrassflabos graves: eapanney /Epuey pune ae ene / bees respectivamente. Eis todas as possibilidades do tetrassilabo aproveitadas por Jorge de Lima, “anjo acolhido 14 em réseo céu 24 abrigo instante, 24 pranto lavado, 14 chorar em ti 24 de arrependido 4 subir teus vales, 24 amar teu pélen, 24 nunca escapar-me 14 de tuas pétalas, 24 . cair com elas.” 24 64 Rogério E. Chociay . _ 8.3.2 O verso pentassilabo apresenta dois esquemas bésicos, um de aiterndncia bindria a partir de uma primeira silaba acentuada, 12345 LoeLeL 35 cujo andamento trocaico implica a funcionalidade da 6.9 sflaba, embora a contagem de padrio agudo nfo a considere; outro combinando uma sequéncia bbindris (acento na 2.8 sflaba) com uma ternéria (acento na 5.8 silaba): —~Loek 25 Oprimeiro esquema se inscreve, perfeitamente,na ordem de alterndncia binéria que 0 idioma apresenta, habitualmente, entre as silabas fraquissimas e fracas antecedentes a forte dos voedbulos, como em 10102 10102 0 101020 0 mobllizagio ou —mobillzaremos ou mobilizarfamos © preenchimento do esquema / __/ {por vocdbulos compostos, locugdes ou sentengas altera o graui de forga das sflabas impares internas, mas essa diferenca, dada a durago reduzida do verso e a sucesso do ‘mesmo esquema na estrofe, s6 se torna sensivel com o aproveitamento de ‘uma primeira silaba forte pertencente a vocdbulo proparoxitono; nos demais 2808, 0 normal € o andamento se tornar envolvente na estrofe, apesar de um que outro matiz: “Ha no olhar etéreo 13-5 Do boizinho bento 135 Sonhos de mistério 135 Num encantamento..." 1.3.5 (Guerra Junqueiro) Duplicado 0 alinhamento ¢ mantendo-se o mesmo esquema de altemancia, teremos o hendecassilabo trocaico, tao ao gosto de Guerra Junqueiro, “Reza pelos mortos..reza a visgem pura 5 tokLiobLiyhotii_ © esquema 2-5 implica um andamento bem distinto, justamente porque Tompe essa altemancia, impondo um acento na 2.8 sflaba, que deve ser, Te indo Verso 65 necessariamente, forte; 0 préximo acento, assim, s6 poderd marcar a quinta silaba, e 0 espacamento resultante entre ambas as silabas fortes dé-thes realce a0 andamento do verso, como se pode apreciar no exemplo de Bocage: “Aqui os sentidos 25 Nas asas de um ai 25 Lhe escapam, the fogem 2-5 Bo misero cai.’ 25 Ocorre também 0 uso dos dois esquemas na mesma estrofe, o que Ihe d4 ‘maior flexibilidade, evitando a monotonia a que, fatalmente, atinge o emprego de um esquema, “Na casa fechada, 25 A vida parece 25 Morta como a estrada.” 135 (Ribeiro Couto) variedade que aumenta pela articulagio do verso em pequenos membros, que podem resultar bastante expressivos: “Lé fora é domingo. 25 Triste? Alegre? Médio? 1.3.5 Chove. Cada pingo inga pena e tédio.” (Ribeiro Couto) Um outro exemplar, de Cecilia Meireles, nos mostra os efeitos expressivos que se podem tirar da variante 1-5: “Respiro teu nome. 25 Que brisa to pura 28 Sabito circula 15 no meu corago!” 28 em que 0 1.0, 0 2.0 ¢ 0 4.0 versos s inscrevem em 2-5, mas o terceiro, aproveitando uma primeira sflaba forte, realiza-se em 1-5, com 0 intervalo de trés fraqufssimas sustentado também expressivamente. Duplicada o alinhamento pentassilabico 2-5, teremos 0 tipico hendecassilabo de arte maior: 2 5 2 5 “Rebramam os ventos. . . // Da negra tormenta 66 Rogétio E. Chociay 2 5 2 5 Nos montes de nuvens // galopa o corcel. (Castro Alves) 63.3 O verso hexassilabo aumenta de muito as possibilidades do tetrassilabo, e nele tornam-se j4 perceptiveis diferentes contornos intensivos, 4 partir de um esquema fundamental de alternancia bind 12345 6 ae teat 24.6 que pode realizar-se integralmente e bem marcado, como em 24 6 “A vaga lambe a areia” (Jorge de Lima) 2 4 6 “Um denso musgo frouxo” (Cecilia Meireles) ‘ou com 0 predominio da 2.8 sobre a 4.8, ou vice-versa, ctcrct 3% 2 o “Também naufragarés” (Cléudio Manuel da Costa) aroma salamendea” (Jorge de Lima) ot um ene (Dante Milano) “Nem divegso nem ee Gorge de Lima) “Dos fitowtis do aoe (Cecilia Meireles) Ocorre a quebra parcial da altemancia bindria com a imposigdo de uma primeira silaba forte, em vez da segunda, 12345 6 L——1L—l 146 Teoyiado Verso 67 1 4 6 “Doce instrumento brando” (Cliudio Manuel da Costa) 1 4° 6 “Tu o meu bem serés” (Claudio Manuel da Costa) 1 4 6 “Agua 0 meu proprio corpo” (Cecilia Meireles) andamento que pode ser matizado com a 4.8 surgindo como fraca, em vez de forte, 1 6 “Lavram 0s pensamentos” (Cecilia Meireles) 1 6 “Vagas felicidades” (Cecilia Meireles) 1 6 “Ramos amarelecem” (Ribeiro Couto) A quebra da alternancia bindria € total com 0 acento forte incidindo na 3.8 silaba, 3 6 “0s canteiros molhados”” (Ribeiro Couto) 3 6 “Num teclado cafdo 3 6 Pelo fundo horizonte” (Cecilia Meireles) que se destaca bastante, a ponto de tornar irrelevante a silaba fraca inicial, 12345 6 —-—-t——L 36 razio por que esta ndo precisa ser indicada no esquema numérico, ou, s6 deve ser indicada quando for realmente forte: 1 3 6 13.6 “Brinca e pde-se a sorrir.” (Fagundes Varela) A duplicagio do alinhamento hexassildbico, conforme as regras de composi¢io estudadas no capitulo anterior, pode nos dar o alexandrino antigo ou 0 clissico, 68 Rogério E. Chociay “6.3.4 O verso heptassilabo incorpora todas as vantagens, mas no as desvantagens dos até aqui estudados, tornando-se extremamente maledvel por comportar variad(ssimas disposigdes acentuais e solugdes de andamento. Sobre ele deixamos para falar com detalhes no estudo da Tipologia dos Versos. 6.4 Esta répida passagem pelo andamento dos versos menores nos mostrou que cles ndo oferecem grandes problemas em seu contorno intensive, Nos vers0s pentassflabo © hexassilabo, contudo, j4 se podem notar algumas peculiaridades, principalmente © destaque intensivo de uma sobre as demais sflabas internas (1-5, 2-5, 1-6, 2-6, 3-6, 4-6) ou a envolvéncia do andamento (1-35), As possibilidades de apresentarem-se formados por membros Aarticulados no sio grandes. mas existe, devendo ser consideradas, rincipalmente, pelos efeitos expressivos que disso podem resultar. O espago de tues silabas fraquissimas, apesar de raro, ocorre e, como vimos, pode apresentar outras justificativas que ndo as puramente formais, 6.5 Para a compreensio do andamento dos versos maiores, em vez de Seguirmos uma scala, partiremos do principal deles, o decassilabo, cujo uso consagrado em nossa literatura baseia-e na alternancia bind 6.5.1 Consideremos os exemplos tipicos: “Seu longo ra de cidades brancas” (Cassiano Ricardo) “A sombra deleitosa dos teus seios. ..” (Raimundo Correia) “E amarratia os bragos ao sertio” (Cassiano Ricardo) “O tempo em febre e sede extingue a fonte” (Joaquim Cardozo) Verificando a disposicéo dos acentos de intensidade (fracas e fortes) nas silabas de todos estes versos, segundo os mesmos principios que vinhamos até aqui adotando, chegaremos a esquemas de alternancia totalmente idénticos: 24-6-8-10 24-68-10 246-810 2-4-6-8-10 6.5.2 A pura representagdo numérica veiculada pelo esquema de alternincia nfo nos dé ainda uma boa idéia do contomo intensivo de cada verso, mas apenas nos aponta um primeiro nivel de distribuicdo intensiva. Na verdade, a simples leitura acusard diferengas sensiveis entre eles: “Seu longo rastro de cidades brancas” (Cassiano Ricardo) 204 8 10 ee eee eee Teoria do Verso 69 “A sombra deleitosa dos teus seios. ..” (Raimundo Correia) 2 6 10 TE “E amarraria os bragos ao serto" (Cassiano Ricardo) 4 6 10 ee ee “O tempo em febre ¢ sede extingue a fonte" (Joaquim Cardozo) 204 6 8 10 -L-L-LeLik em que notamos algumas das silabas destacando-se do conjunto pelo maior srau de forga de que sfo possuidoras (trés primeitos versos) ou, realmente, todas as sflabas pares inscritas em idéntico nivel e grau (ciltimo verso). Este fato énos jé suficlentemente revelador de que 0 andamento intensivo destes versos se processa numa espécie de movimento ondulatrio, que pode atingit méxima regularidade, como no quarto exemplar, semelhante a este outro: “Andando andando andando andando andando” (Dante Milano) 2 4 6 8 10 -L-L-LoL_b cujas sflabas fortes internas vo surgindo sempre com o mesmo valor até a Sltima; ow com menor regularidade, caso em que a disparidade de forga faz com que as mais intensas se destaquem, situando-se nas curvas superiores, ficando as outras em sucessivos planos inferiores. Cada um dos trés primiciros versos escandidos tem, portanto, diversificado seu andamento gracas is Posi¢des em que surgem 0s pontos de maior intensidade: 2-48-10, 2-6-10, 46:10. Por este mesmo motivo, tals versos, que se nao confundem entre si, menos se confundirfo aos abaixo: 3 6 8 10 “Dos espasmos golfados ruivamente” (Mario de S4-Cameiro) 1 6 10 “Fonte de repulsdes e de prazeres”” (Augusto dos Anjos) dada também a quebra parcial da alterndncia bindria que ai se verifica. Se isto ‘nfo basta para provar arelevincia das silabas fortes ¢ o scu papel identificador do andamento intensivo, comparem-se 0s versos: 10 Rogério E. Chociay 2 6 10 “A sombra deleitosa dos teus seios . . .” (Raimundo Correia) 2 6 10 “0 cuspo aftodisiaco das fémeas” (Augusto dos Anjos) ambos com 0 andamento identificado por duas sflabas fortes intemnas (2.2 ¢ 6.4), embora a tltima parte do segundo seja representada por uma seqiéncia quaterndria. A redugdo do quatemnério a bindrio, af, nem precisa ser cogitada, 4J4 que duas seqiiéncias bindrias casam perfeitamente com uma quaternéria na realizagio do esquema do verso, embora o poeta possa tirat proveito expressivo de uma ou de outra (1), como se pode notar comparando os exemplos anteriores a este: 2 6 10 “A musica duleissima do vento” (Cesério Verde) 3 Para fazer nitido esse destaque assumido pelas silabas fortes no curso intensivo dos versos, torna-se necessério omitir os niimeros das fracas no esquema, jé que estas se inferem facilmente a partir dos_pressupostos indicados no Capftulo Segundo e infelo deste, Os versos analisados, portanto, aptesentam como esquemas peculiares: “Seu longo rastro de cidades brancas” 2-48-10 “A sombra deleitosa dos teus seios. . .” 26-10 ““E amarraria os bragos ao sertao’ 46-10 “O tempo em febre e sede extingue a fonte” (*) 246-810 “Andando andando andando andando andando” (*) 246-810 “Dos espasmos golfados ruivamente” 36-8:10 “Fonte de repulsoes e de prazeres” 16-10 ““O cuspo afrodisiaco das fémeas” 26:10 “A misica dulefssima do vento” 26-10 6.6 Estas primeiras observagdes, baseadas no estudo do verso decassilabo, dio-nos uma idéia melhor sobre o andamento intensivo deste e de alguns ‘outros versos maiores: ele nao trai os princfpios de altemancia intensiva habituais no idioma, mas peculiariza diferentes esquemas de realizagio pelo Jogo combinatorio de sflabas que, pela maior forga, se destacam e destacam 0 ‘curso intensivo de cada verso, podendo, porventura ocorrer que todas as silabas acentuadas se coloquem em idéntico nivel de forca. Pelos exemplos (1) Estilstcamente, duas seqUéncias binérias,do tipo 0102, tanto podem funciona como bindrias perfeitas como resolver-se numa quaternéria do tipo 0002. ( Apenas estes dois versos, dada sua construgso, presentamt o esquema ditibutivo ¢ 0 de forga pleramente Mentificados. Teotiado Verso 71 analisados ¢ mais os de alguns versos maiores que acrescentaremos, vé-e que 0 intervalo entre sflabas fortes (representado agora por fracas ¢ fraquissimas) tomas bastante varidvel, podendo ser de uma silaba, “0 Ifrio.e o vale ¢ 0 serro.¢ o mar ¢ eu” (Emiliano Perneta) 204 6 8 10 —-L-L-LedeL 2468.10 “Setembro, outubro, maio, abril, janeiro ou margo" (Alphonsus) 24 6 8@ 0 2 -t-L-L-L-LL paesioar de duas silabas, “Pelo trilho que as 4guas abriraim” (Tobias Barreto) “Aprendi os queixumes da brisa”” (Tobias Barreto) 3 6 9 ee eee 3-69 “Neste canto sem luz da gaveta da mesa” (Ribeiro Couto) “Ilumina o degredo e perguma o deserto” (Olavo Bilac) 3 6 9 2 --t--L--L-_L 369 de trés silabas, “Sentimental como um poeta enamorado” (Ribeiro Couto) “Triunfalmente por seu beijo coroado” (Ribeiro Couto) 4 8 2 —--4---L---L 4sn que poderto aparecer em combinagdes simétricas como as acima, ou mesclados num mesmo verso: “Os cabelos borrifados de estrelas” (Cassiano Ricardo) 7 10 an eel 37-10 72°—_—Rogério E. Chociay “Qs ios pendidos nos olhos to belos” (Casimiro de Abreu) 2 s 8 iT -te-Lo_ Lat 25841 Nio slo raros os exemplares que apresentam maior espagamento entre sflabas fortes: ““As luzes do amanhecimento” (Cecilia Meireles) “Olhavam-se desintegrados” (Cecilia Meireles) 2 8g -Lo---_- L 2. “Meus olhos, Idgrimas petrificadas” (Joaquim Cardozo) 24 10 -Litew L 2410 “Que o canto glorificard somente” (Mauro Mota) 2 8 10 -Lo-- LLL LoL 2810 6.7 Todos os exemplares escandidos em 6.6, que serviram como complementagio de nossas observagSes sobre o papel das sflabas fortes no andamento acentual dos versos, sugerem-nos duas importantes questdes, bastante relacionadas entre si: a) qual o espagamento minimo e 0 méximo entre sflabas fortes? b) no segundo caso, quais as caracteristicas intensivas do grande intervalo? 6.7.1 O problema da maior ou menor distancia entre silabas fortes nos versos estd relacionado diretamente a natureza do alinhamento em que estas surgem. No alinhamento impausado de versos ou de membros de versos, 0 espagamento minimo é de uma sflaba entre fortes. Em versos como, “Que rf mores, on que esd morta!” (Alphonsus de Guimaraens) “O sofrimento produz canto..." (Tasso da Silveira) “6 visto, vito we ¢ piedosa!” (Antero de Quental) “Niommo vale beth d beer" (Antero de Quental) “E 0 corcel negro diz: “Eu sou a Morte.” (Antero de Quental) Teoria do Verso 73, surgem seqiiéncias impausadas que apresentam duas silabas fortes contiguas. Na realidade, estas ocorréncias, longe de serem fatos especificos dos versos, Pré-xistem no idioma, que as resolve pelo enfraquecimento da silaba que Scupa posigfo mais débil; assim, na fala ou no verso, tais problemas si0 apenas aparentes. Nos exemplos dados, hé apenas uma leitura possivel, 8 “.. est morta!” 8 roduz canto. ..” 6 «visio triste, 6 *, << vulgar brilho.. 4 + Corcel negro. ..” resultando fortes apenas a 8.8 silaba, nos dois primeiros exemplos;a 6.2, nos dois segundos; a 4.2 no iltimo. 6.7.2 Se se trata, contudo, da dltima forte de um membro de verso e da Primeira forte do membro seguinte, como se observa nos exemplares absixo, 45 “Blasfema a dor, mora o rugido” (Vicente de Carvalho) 6 7 “E das roupas, enfim, livres 0s corpos saltam" (Olavo Bilac) 6 7 “Quanto pode pungir, mostra-se tudo" (Antero de Quental) 4 5 “Flores murchai. Aguas, apodrecei!” (Dante Milano) 2.3 “Secai, prantos do mar, e reste, vacuo” (Dante Milano) fem que uma sflaba forte termina um membro de verso © uma silaba forte ‘nicia © seguinte, 2 pausa que as separa legitima a ocorréncia, permitindo que ambas mantenham as respectivas cargas intensivas. Na maior parte dos casos, a primeira delas, por apresentar-se como final de membro melédico, apresenta maior destaque. Construgdes especiais, porém, podem dar-lhes idéntica condigic 1 45 10 “Flores, // murchai. // Aguas, // apodrecei!” 14 Rogério. Chociay 6.7.3 Silabas fracas, em condigées especiais, podem transformar-se em. fortes: “Espelham-se os esplendores Do céu, em reflexos, nas Aguas, fingindo cristais Das mais deslumbrantes cores.” (Augusto dos Anjos) Observe-se que do final do segundo verso para 0 inicio do terceiro verifica-se © encadeamento: © monossilabo mas, incidindo na sétima posiggo forte do verso heptassilabo, recebe carga intensiva que habitualmente nio ostenta, encerrando 0 verso e inclusive vindo a perfazer rima com -ais, final do vocdbulo que encerra o terceiro verso (cristais). 6.7.4 Pensando em termos de maior espagamento, partimos observando ue as ocorréncias mais comuns podem ser situadas em uma, duas ou trés silabas entre fortes; a incidéncia do intervalo de quatro sflabas & ainda relevante (no decassflabo 1-6-10, s6 para citar um exemplo). Mas em todas as épocas se podem compulsar exemplares que extrapolam 0 espago de quatro silubas entre fortes. A dificuldade do tebrico do verso, no caso, tem como ‘uma das causas principais 0 fato de ndo haver sido elucidada ainda, de modo inequivoco, a exata pauta intensiva do idioma: a malor parte das graméticas de hoje continuam falando em uma silaba “tonica” para cada voedbulo, que no méximo se pode tornar possuidor de uma “subtonica”, isso em casos especiais de formagdo (8s vezes, essa “subtonica” s6 tem existéncia tebrica, como em felizmente, cuja silaba -liz- nao é portadora de intensidade forte de mancira nenhuma); vocdbulos com seis, sete, oito sflabas nfo tém, deste modo, esclarecido’ 0 seu cxato contorno intensivo, assim como muitas construgdes de que se diz resultarem “indecisas” quanto aos acentos de intensidade... E evidente que o estudioso da versificago, no podendo contar com tal auxilio, facilmente cairé no erro de querer solucionar qualquer caso estranho com a célebre chave do “desenvolvimento de acentos ritmicos secundétios que operam milagre de regularizar 0 andamento dos versos dificeis.” Nossa atitude, no entanto, é ainda de expectativa quanto a0 aparecimento de informagées precisas, fundamentadas em experiéncias de laboratério, sobre 0 fator da intensidade nos vocéculos e construgbes do idioma. Enquanto tal no ocorre, colocamo-nos no campo da mera opiniio pessoal, que nés mesmos consideramos discutivel. 6.7.5 Se versos como 3 6 10 “Profundissimamente hipocondrfaco”” 3 6 8 10 “Fisiologicamente muito calmo” Teotia do Verso 78 de Augusto dos Anjos, no oferecem qualquer problema quanto a alterniancia intensiva € & presenga de silabas fortes (3-6-10, 3-6-8-10), como jé foi explicado no Capitulo Segundo, jé os seguintes “A sucessividade dos segundos” ““A mottificadora coalescéncia” “Misericordiosissimo carneiro” ““Antagonismos irreconcilidveis” “Os esqueletos desarticulados” tém-nos levado a refletir bastante ¢ duvidar de _explicagdes superficiais. Cremos que neles as “‘irregularidades” sio apenas aparentes. As construgGes que os encorpam tanto poderiam figurar em versos, como em prosa, sendo © mais importante no caso verificat qual a soluglo que Ihes dé 0 idioma na emissio normal, para depois estudar 0 problema na versificagao. Baseados nos pressupostos indicados no Capitulo Segundo, podemos inferir, inicialmente, que os grandes vocébulos existentes em tais versos apresentam alternancia bindria de fraquissimas e fracas, da dircita para a esquerda, a partir da silaba forte, 10 1020 sucessividade 1010 20 mottificadora 0101 0200 misericordiosissimo 101 020 inreconcilidveis 101020 desarticulados € © alinhamento global dos versos em que se situam também se inscreve perfeitamente num esquema de alternancia bindria, 1@:OsO'@@ © primeiro, 0 segundo e © terceiro versos apresentam como fortes a 6.8 ¢ a 10.8 sflabas; 0 quarto © 0 quinto, a 4.2 e a 10.8, Todos, como se vé, perfeitamente regulares quante alterancia, O problema, agora, esté em descobrit_se, na dinamica de cada verso, existe algo mais que a pura distribuigéo entre fraquissimas e fracas até a 6.2 silaba, num caso, ¢ da 44 4 10.2, noutro. A envolvéncia da cadéncia acentual da estrofe em versos decassilabos € argumento de que aqui ndo podemos langar mao, Pois 0s decassilabos de Augusto dos Anjos, embura conformados as duas 76 Rogério E. Chociny receitas de distribuigéo predominantemente binéria, apresentam-se em variadas contexturas na estrofe e de estrofe a estrofe. Poder-se-ia dizer, em funglo da receita ¢ de suas realizagSes habituais, que hé uma expectativa para a tetceira sflaba forte surgir na 1.8, 2.8, 3.8 ou 4.4 posicfo, no caso de 6-10; na 8.8, em 4-10, Mas seria preciso explicar também a razio concreta do surgimento “‘necessério” numa destas s{labas. M. Cavalcanti Proenca, a propésito, diz-nos que “é inevitdvel a acentuagfo suplementar, embora possa variar de posigdo” (1), em versos como “A sucessividade dos segundos” dizendo-nos que tanto podem ser lidos deste modo “A si-ce-ssi-vicdé-de dos se-gin-dos” —2-6-10 ou destes “A suct-ssi-vi-dé-de dos se-gindos" 3.6.10 “A sice-ssi-vi-dé-de dos se-gin-dos" 24.610 Que tais leituras sfo possiveis, nfo resta a menor duivida, embora das trés nflo aceitemos, por motivos dbvios, a que inscreve o verso em 3-6-10 (quebra forgada ¢ desnecesséria da alternncis bindria). O que nfo nos parece certo é considerar num mesmo grau de forga os acentos de versos como “A sucessividade dos segundos” “O espago da estreitissima clausura” “‘Antagonismos irreconcilidveis” “E o esquecimento brotar4 também” Se aceitarmos, no primeiro caso, a leitura 2-6-10, que & pactfica para 0 segundo verso, também para o primeiro, nfo poderemos deixar de observar que neste a 2. silaba apresenta grau inferior & do outro, de modo que a leitura forcada 2 6 10 “A su/ cessividade / dos segundos” resultaria bastante artificial, como artificial resultaria (D Op. cit. pp. 20-21 Teoria do Verso 77 4 8 10 “Antagonismos / irrecon / cilidveis”” De qualquer maneira, enquanto informagées mais seguras nfo surgem, preferimos considerar 0 esquema destes e de versos de distribuigto aniloga aponss nos pontos em que surgem sflabas fortes indiscutivels, nfo esquecendo, é claro, do primeiro nfvel de alternincia intensiva, que mesmo neles é perfeitamente regular pela distribuicfo de fracas ¢ fraquissimas, Se, na dindmica do verso, uma sflaba fraca pode ser reforgada e atingit o mesmo grau Aas demais fortes do verso, isto € problema sinda nfo definitivamente Ivido. 6.7.6 As consideragdes acima justificam 0 porqué da escanso de alguns Yersos apresentados em 6.6, que, embora com grande espagamento entre sflabas fortes, néo apresentam problema algum de alterndncia intensiva. Eilos novamente, ¢ mais alguns, com a indicagfo _) para as sflabas fracas altemadas entre fraquissimas: ““As luzes do amanhecimento” 2 8 ee reetel cese eee 28 “Olhavarnse desintegrados” (Cecilia Meieles) 2 8 aL dik 28 “Meus olhos, ldgrimas petrificadas” (Joaquim Cardozo) 2 4 10 -t-1--_1_4 24-10 “Que o canto glorificaré somente” (Mauro Mota) -L-1_-1_L_L 28:10 “Fonte de repulsdes ¢ de prazeres” (Augusto dos Anjos) “Extase do siléncio vertical” (Dante Milano) 1 6 10 Le-LeL-A_L 619 18 Rogério E. Chociay, “Viveremos a cultivar na estufa” (Alphonsus de Guimaraens) 3 8 10 DeLee) eee eee 3-810 ““Muitos outros se aproximaram destes” (Alphonsus de Guimaraens) 1-41-44 138-10 “De descobertas ¢ de profecias” (Joaquim Cardozo) —2-4-1-1-4 4-10 “Entre relampagos ¢ lividezes" (Dante Milano) J eee 410 © problema aqui continua sendo o mesmo hd pouco apontado: descobrir se em todos os pontos indicados com _) a carga intensiva, em cada verso, apresenta_ um mesmo valor relative ou hi diferencas. Embora sem informagoes apoiadas em exame de laboratério, continuamos achando que nenhuma dessas silabas pode receber carga intensiva equivalente & de sflaba forte. Alids, 0s poetas de cujas obras se extrafram os exemplares acima sempre foram ustiros ¢ vezeiras nessas desarticulagdes do andamento dos versos e da cadéncia estrdfica, obtendo, aliés, excelentes efeitos expressivos em fungo is0, como atestam muitos dos versos supracitados. 6.8 Temse, portanto, que duas atitudes. tedricas sfo possiveis ante as ocorréncias estudadas em 6.7.4. s.: a) deve desenvolver-se uma silaba forte para “normalizar” o curso intensivo do verso; b) o curso intensivo do verso deve ser considerado tal qual se apresenta, ‘sem redugGes a qualquer cadéncia. 69 De tudo que se disse, deve-se ter concluido que 0 problema, seja qual for @ atitude que se tome, nfo pode ser resolvido sem fundamentagio, Em primeiro lugar, porque a interpretagio de cada caso particular dependerd das doutrinas métricas da época, das solugdes praticadas pelo poeta, como do proprio poema em que se localiza o verso “irregular” (a imregularkdade pode ser mais expressiva que a regularidade, e 0 poeta sabe disso). Trazido o Teowla do Verso 79 problema para os tempos atuais, seré preciso, em segundo lugar, carrear informagdes lingiifsticas especializadas sobre a pauta intensiva do idioma; esta, segundo nos parece, esconde ainda alguns segredos. Tudo isso faz 0 problema pendente de solugao nos atuais estudos da teoria do verso. 6.10 Encerremos este capitulo observando que o papel fundamental no andamento do verso ¢ representado pela intensidade, num primeiro nivel de ura distribuigo ¢ num segundo de sflabas fortes. Mas quando o alinhamento do verso se conforma através da articulagio de membros distintos, a entonago € as pausas passim a trazer contributo indiscutivel para a caracterizagao desse andamento, e somente o estudo desses fatores poderd explicar muitos fatos usualmente nao esclarecidos nos manuais. A esse titulo, so patentes as diferengas de andamento (entoagdo e duragao) em pares de versos idénticos pelo esquema intensivo: 2 6 10 “A miisica duleissima do vento” (Cesério Verde) 2 6 10 ““Sondmbulo. ..Sonimbulo.... Sonimbulo. ..” (Augusto dos Anjos) 2 6 10 “Eu falo das ruinas do pasado,” (Antero de Quental) 2 6 10 “Que alegre, que suave, que sonora,” (Cléudio Manuel da Costa) 3 6 10 “As imensas auroras do Futura!” (Antero de Quental) 3 6 10 “Com mais énsta, mais dor, mais agonia.” (Cliudio Manuel da Costa) 2 6 10 “Na muda solidio deste arvoredo,” (Claudio Manuel da Costa) 2 6 10 “Prometem-vos (quem sabe? ) entre os ciprestes,” (Augusto dos Anjos) * exemplos que poderiam ser aumentados a saciedade, mostrando-nos articulagdes bimembres, trimembres, multimembres, com maior ou menor proximidade de sflabas fortes, maior ou menor numero de pausase efeitos de ‘entoagdo, embora todos eles identificados pela obediéncia a um mesmo cOmputo de sflabas no alinhamento e & incidincia de sflabas fortes fundamentals. Por estes © por multos outros que apresentamos neste livro, comera-se a verificar a infinidade de matizes a que pode atingir a melodia verbal, apesar de inscrita em certas “medidas”, Por af se vé, também, 0 erro 80 Rogério E. Chociay ‘em Que incidiram ¢ incidem muitos detratores da versificagdo (1), que a viram ¢ véem através das informagdes estereotipadas (e mesmo assim mal digeridas) de um que outro manual, sem nunca terem ido conferi-las com a realidade viva e miltipla dos textos. (1) Maitas “propos dia forma poética sio bem mais complicadas “fechadas” que a propria versificagéo tradicional. 7. Tipologia dos versos 7.1 Neste capitulo estudaremos, com farta exemplificagdo, os varios tipos de versos praticados em muitas épocas pelos nossos poetas, indicando as detignagdes de ordem numérica e as especiais, os esquemas gendricos ¢ as realizagBee concretas. Eslaremos adotando 0 padrio agudo de contagem, mas nao deixaremos de langar mfo do padrdo grave, sempre que este for necessério para a elucidacdo de certos fatos. 17.2. VERSO DE UMA SILABA 7.2.1 Bis 0s seus dados: 8) denominagdo: monossilabo (p. grave: dssilabo), b)esquema intensivo: 1; 1 ©) realizagio silébica: = -L. 1 a 1 2 Lt——|i} 2 3 O cixo mostra a tinica sflaba (forte) que é considerada na contagem. 7.2.2 Pouquissimo empregado isoladamente, neste cato recebendo a pecha de mera demonstragio de virtuosismo, como no exemplo B, 0 verso ‘monossilabo aparece com alguma frequéncia em estrofes heterométricas, as vezes em rima cont{gua com o verso maior anterior, motivo por que alguns tratadistas afirmam néo se tratar, af, de verso, mas de um fragmento ecdico 2 Rogério E, Choctay do vel 9 maior, como no exemplo A. Nada obstante, alguns poetas souberam utilizar-se muito bem de suas possibilidades /C), sem apelo necessério a0 eco. 7.23 Exemplos: (A) Sob nuvem lutulenta, ' — Lenta, — Se esconde a pélida lua; Na sombra os génios combatem; — Batem — Os ventos.a rocha nua (Fagundes Varela) (B) Vo bar Re tar (©) Natarde, morta, 0 que sino a chora? 4 it Nio chora, canta, na repica, flor tine. . hé (Eduardo Guimaraens) por A mor. (Martins Fontes) 1.3 VERSO DE DUAS SILABAS 7.3.1 Eis 0s seus dados: a) denominagdo: dissflabo (p. grave: trissilabo); ) esquema intensivo: ©) realizacao silébica: | — 1 [2] —-4t— 1 [2] 3 —~L—— 1 ja3aa6 7.3.2 Menos raro que o precedente, apresenta também melhor indice de ‘ocorréncia combinado a versos de maior extensdo, Observe-se especialmente quanto ao exemplo-A a funcionalidade da terceira sflaba, que nio pode ser desconsiderada para a caracterizagdo do andamento. ‘Teagin do Verso 83, 73.3 Exemplos: (A) Calado, (B) Nunca, jamais Sozinho, para sempre Mesquinho perdido Em zelos Ardendo 0 eco do corpo Eu vite ‘no préprio vento Correndo pregado. Tio falsa (Cecilia Meireles) Na valsa Veloz! (Casimiro de Abreu) (©) Numleito (D) Ele despiv-se Feito de qué? De cheirosas De tudo Rosas que amara. Risonhos Surdo-mudo Sonhos cegara. Sonharemos n Agora vé. (Castro Alves) (lorge de Lima) 14 VERSO DE TRES SILABAS 74.1 Eis 08 seus dados: a) denominagio: trissilabo (p. grave: tetrassilabo) b) esquema intensivo: 6) realizagio silébica 3 3] 4 3] 4 7.4.2 Seu emprego isolado ¢ jé bem maior que o dos anteriores, embora © {ndice de ocorréncia aumente se combinado a versos de medida maior, principalmente como quebrado de redondilho. Observe-se no exemplo B que a harmonia do conjunto surge do fato de os tetrassflabos serem agudos € graves 0s trissflabos. 714.3 Exemplos (A) Densa bruma (B) Mégoas de além Pelo espaco De olhos de quem Jase esfuma... Pede esmoli Ea garoa Gemidos ais 84 Rogério E. Chociay Se povoa ‘Das autunais De mil génios Barcarolas: ‘Vagarosos, (Alphonsus de Guimaraens) Pelo vento (©) Dos campos do relativo Reunidos escapei. E impelidos Se perguntem como vivo Centoe cento. que direi?’ (Castro Alves) (Cecflia Meireles) ©) Eisarose (©) Noite triste: silentiosa zimbra o vento Suas péta- que de riste Jas vermethas sangra ¢ lasca tém consciéncia velha casca da secreta e avelhentado tronco confidéncia rudo, das abethas (Guilherme de Almeida). (Atflio Milano) 1.8 VERSO DE QUATRO SILABAS 7.5.1 Bis os seus dados: 4) denominaeto: terrassilabo (p. grave: pentassilabo) ») esquemas intensivos: 24 eee arene L——~L 4 75.2 Sua freqiéncia nas literaturas portuguese © brasileira & sensivelmente maior que a dos anteriores, quer isoladamente, quer combinado 4 outros, maiores ou menores, especialmente como quebrado de séfico, de octossilabo, de eneass{labo e, mesmo, de heptassflabo. Pode-se encontré-lo regularmente entre 08 arcédicos e, também, entre muitos poetas modernos, alguns dos quais souberam utilizar-se magnificament: da potencialidade expressiva de suas quatro silabas, 73.3 Exemplos: (A) Alvejam cémoros (8B) Quero trabalho Dos nevoeiros! Firme nas ancas Como os coqueiros Sede na boca slo espetrais! Forga no brago Fantasma ldgubre Brinca esperanca Uivava triste No peito cheio Teoria do Verso 85 Quando safste Quero 0 trabatho. Dos coqueirais! (Mario de Andrade) (Raimundo Correia) (C) Que quer o vento? (D) No fim do mundo A cada instante Hi uma gruta, Este lamento Casa de pedra, Passa na porta Cama no chao Dizendo: abre De terra fresca, (Ribeiro Couto) Dormir na terra, (Dante Milano) (E)Desordem na alma (F) Do peito as ondas que se atropela Sao tempestades Sobvsta care Onde as vontades que transparece. Vio naufragar. (J. Cabral de Melo Neto) (Alvarenga Peixoto) 6 VERSO DE CINCO SILABAS 7.6.1 Eis os seus dados: a) denominagdes: pentassilabo (p.grave: hexassilaho); redonditho menor; de redonditha menor (1); redondilho pentassilabico, 'b) Esquemas intensivos: 12345 — trocaico: L—L—L— 135 1 2345 — idmbico-anapésticoe: — L ——L 25 — variantes: 1-5 ¢ 3-5 G) Notese “a propisito que redondilha &, propriamente, uma quadra de versos Pentassilabos (ou heptassilabos), com esquema rimico ABBA, emprcgada por exemplo na cantiga (a cancién trovadoresca dos espanhéis), poema em que a quadra final faz. um retomo rimico ¢ temético a primeira (mote), razio por que esta forma fol entendida como redonda, donde a palavra redonditha. Aplica-se 0 vocibulo feminino ao tipo estrdfico, ¢ o masculino aos versos usuais nas redondilhas. Diz, portanto, verso redondilho ou vervo de redondilhe. 486 Rogério E. Chociay . Teotiedo Verso 87 7.6.2 Nativo na poesia galego-portuguesa ¢, alids, 0 metro de menor sobre a outra, fato que se tomard mais relevante nos versos maiores. Com base extensdo empregado como tal pelos trovadores, seu uso tem-se prolongado até destaque ba int maiores. Com ‘05 nossos dias. Aparece frequentemente combinado a versos de maior e menor nese destaque de silaba interna, podemos inert as Seguntesrealzagbes: extensio, principalmente como quebrado de hendecassilabo, Tipoa: 24.6 (a2.8¢84 se equivalem): 24 6 7.6.3 Exemplos: . “A vaga lambe a areia” (Jorge de Lima) 2 6 (A) Caland’ ¢ sofrendo (B) Cordeirinha santa, 26 -* a i ee epee: Também naufiagars” (Clio Manuel da Cort) sil mortes na vida vvossa santa vinda 46 — “Dos iltoal . ‘ sinto, nam vos vendo. o diabo espanta Dos litrais do mundo" (Ceefia Metees) (Conde do Vimioso) (José de Anchieta) Tipob: 1-46 1aeada : (©) Burives, Euives, (D) Blaera nascida " Tl porque choras tanto, na Figrida. A vida “Tuo meu bem serés” — (Claidio Manuel da Costa) porque que é que assim vives Na Florida, olé 1 6 com as faces em pranto? como é que serd? 16 — “R ren (Martins Fontes) (Onestaldo de Pennafort) moramarclecem” (Ribeiro Couto) (E) Cavalos ligeiros (F) Tio tarde seria Tipoe: 1-3-6 a i 7 De erigadas crinas se apenas chegasses oe @ 1 . 8 * aera Ppr que sobre as ondas vestida de verbos “Brin - Passais sem parar? gue as lendas conjugam. ea Prose a sori” (Fagundes Varela) (oaquim Cardozo) (Paulo Bonfim) 3-6 — “Os canteiros molhados” (Ribeiro Couto) Na estrofe este alt i izand 4.7 VERSO DE SEIS SILABAS Na esto estes equematusalmente x misturm, earctezandose apenas a 7.7.1 Denominagées: “Um raio de luar Entrando de improviso, a) hexassilabo (p. grave: heptassilabo); No meu quarto sombrio b) herdico quebrado; ‘Onde medito, a s6s, c) herdico menor. Deixa a tremer no at Um pilido sorriso, 7.7.2 Este verso teve emprego bastante intenso nas estrofes ‘Um murmiirio de luz heterométricas do tipo 10/6 (odes e cangdes classicas, p.c.). Desse uso junto Que lembra a tua vo.” (Teixeira de Pascoaes) ao herdico adveiothe o nome de herdico quebrado, como também herdico menor. Os poetas logo perceberam suas possibilidades expressivas, vindo a mas nfo € dificil encontrarmos hexassilabos empregados com cadéncia empregé-lo também como verso auténomo, o que acontece inclusive entre acentual na estrofe, como em modemnos. oo “Beijar-te a fronte linda: 7.1.3 Podemos consideré-lo em trés tipos distintos, conforme a Beijar-te 0 aspecto altivo: distribuigdo intensiva: a) 2-4-6, b) 1-4-6, ) 1-3-6. Nas realizagSes de cada tipo Beijr-te a tes morena " jd se torna perceptivel © predominio intensivo de uma das silabas internas Beijar-te o rir lascivo:” (Junqueira Freire) 88 Rogério E. Chociay Teotiado Verso 89 Como jf dissemos, seu uso como quebrado de decassilabo ¢ relevante: Tipoa: 1-35-7— “Lutae gira sonhae volta” JL) , | “Movel terra, céu incerto” (JL) “Esprema a vil caltinia muito embora “Noites de alma, céus a tona” (CM) Entre mos denegridas,¢ insolentes, “Rosa clara em rubro espelho” (CM) Os venenos das plantas “Mar e cet morreram juntos” (CM) E das bravas serpentes.’ (Toms Antonio Gonzaga) 1-27 “Cumpre apenas o seu fado” IL) “Dia e noite a navegar” JL.) “Enquanto alerta, circulando os ares, “Quieto reino mineral” (JL) * O fatal cabo montas, “Dorme em dguas de mistério” (PESR) tu, que os raios, os tufbes, os mares, “Tua misica univalve” (CM) ‘Audaz ¢ insano afrontas!” (Bocage) 15-7 “Ela o pensard também? "(CM “Chamas de um secreto inferno” (CM) “Mudam-se em dogura rara.”” (CM) “Eco de invisiveis festas” (CM) “Niimeros de grande urgéncia” (CM) “Crespo vagalhiio do oceano” (DM) 7.8 VERSO DE SETE SILABAS 7.8.1 Denominagoes: “Mar que na maré vazante” (RC) a) heptassilabo (p. grave: octossilabo); ») septissilabo; ¢) setissilabo; 3-5-7 — “De manhd estrelas verdes" (IL) @) -edonditho maior; “A paises de outros vinhos” JT.) ©) verso de redondilha maior (1); “Em redor dos bancos frios” (CM) f) redondilho heptassilébico. “Desenhiados par a par” (CM) 7.8.2 Com presenga considerdvel na poesia galego-portuguesa, como 3-7 ~ — “Aleprias descobertas” (JL) uum de seus versos nativos, 0 heptassilabo atravessou todas a8 épocas com uso “Disciplina de chorar (CM) regular que se mantém até hoje. Veros no alinhamento heptasslébico quatro “Da letdrgica bacia (CDA) esquemas fundamentais de alternancia intensiva: a) 1-3-5-7, b) 2-4-7, ¢) 2-5-7, ““O mais puro dos mortais” (PESR) 4) 14-7. As diversas realizagbes que pode apresentar cada tipo surgirdo do destaque de uma ou mais sflabas internas no seu curso intensivo, Et-las, com nae exemplos de $7 ~ ito" (CM) “Na definitiva pressa” (CM) “Possibilidades clara: Jorge de Lima (JL) Cectfia Meireles (CM) Péricles Eugénio da Silva Ramos (PESR) Dante Milano (DM) Le Ribeiro Couto (RC) ‘Rapido o levantaria” (CM) Carlos Drummond de Andrade (CDA) “Ecos de misericdrdia” (CM) “Juntas na separaco” (RC) “Itha de metancotia” (RC) () Sobre este nome, v. nota referente 20 pentasefabo em 7.6.1. “Vai-se metamorfoseando” (DM) 0 Rogério E, Chociay Tipo b: 2-4-7-- “Que bico r6i o teu mal? ” (JL) “0 amor se banha na morte” (CDA) “0 fino dardo da chuva” (CDA) ““Aragem presa em si mesma” (PESR) “Orfeu deitado nas trevas” (PESR) “Mirei soldados deitados” (CM) 47 - espiragdo ventaniada” (JL) “Equilibrado na lama” (CM) “Desconhecido de mim” (PESR) “Definitivas eternas” (CDA) “Histérias que so porfias” (JL) “Cabegas de estranhas musas” (JL) ‘ampélica voz perdida” (CDA) “A carne que exige as cinzas” (PESR) \dicios de canibais” (JL) 'stévamos esquivados” (JL) “No plano do aceltamento" (JL) “E a misica dos meus dedos” (CM) “Lembrava-se do passado” (CM) “E espalha-se murmurando” (DM) "O olhar experimentado” (CDA) “Perdido no nevoeiro” (RC) Tipod: 1-4-7— “Mastros que apontam caminhos” (JL) "Asas das hastes pendidas” (JL) jizio do sonho secreto” (CM) ‘Poupa ‘a amargura insolivel” (CM) “Bi-las sumindo-se no ar” (CDA) “Itha de um s6 habitante” (RC) 7.8.3 Os esquemas ¢ realizagdes apontadas no chegam, contudo, a demonstrar toda a riqueza de andamento que possui o verso heptassilabo, pois pode apresentar-se também articulado por dois ou mais membros, comportando, inclusive, a contighidade de sflabas fortes (separadas por pausa) em seu alinhamento. Tradicionalmente, seu uso na estrofe basela-se apenas na cadéncia sildbica, com —muitfssimas possibilidades de variagZo ritmico-expressiva verso a verso. Nada obstante, alguns poetas usaram-no Tedriado Verso 91 também com cadéncia acentual na estrote, como por exemplo Silva Alvarenga, nos seus rondas, que damos um exemplo: “Para frutos nao concorte Este vale ingrato e seco; Um se enruga murcho e peco, Outro morte ainda em flor. cujos versos se inscrevem como realizagdes do tipoa (1-3-5-7), 0 heptassilabo surge ainda em composigdes heterométricas, com os seus quebrados, o trissilabo © 0 tetrassilabo. 7.9 VERSO DE OITO SILABAS 79.1 De jominagdo: octossilabo (p. grave: encassilabo), 7.9.2 verso de oito silabas, introduzide por influéneia francesa na poesia trovadoresca, foi, praticamente, abandonado durante o Classivismo Ganhou impulso novo em Portugal, apis Casilho, que dele afin “O metro de oito syllabas pode-se dizer que ainda ndo & usado em portuguez. Nada, talvez, escrito n’elle, afora uma ou duas tentativas de José Anastacio da Cunha, que Porventura 0 estreou, ¢ uma ou duas minhas, sem continuago nem imitador; razdo porque, a sua harmonia se ndo acha ainda devidamente fixada, nem ouvido nacional Por ora se Ihe ageita. | Todavia, quando mais e melhor cultivado este metro (a julgarmo-o pelos seus elementos, ¢ pelo que os Franceses delle teem chegado a fazer), pode vit 4 ser muito apreciado.” (1) Mais adiante, o mestre faz, a seu modo, a relagio das possibilidades do verso, enunciando os esquemas 48, 246-8, 2-8, 3.68 © 2.5.8, Conclui, porém, fazendo uma selegao: “Diestas cinco variedades as mais apraziveis sio: a de dois, tres, € tres; a de dois, dois, dois e dois; ¢ a de quatro ¢ quatro. O rythmo das outras ¢ apenas perceptivel." (2) GY CASTILHO, Anionio Feliciano de ~ Tratado de Metrificaséo Portugueza, Empreza 4a Historia de Portugal, Lisboa, 1908, 58 ed., pp. 57-38. (2) Idem, p. 59. 92 Rogério E. Chociay Entre nés, Olavo Bitac demonstra, na teoria e na pratica, preferéncia pelos ‘esquemas fundados em 4-8. Diz-nos que 0 verso “octissyllabo” possui duas varledades: “No horrendo pantano medonho, assim se decompée: 12 No horren 12 Do pan 1234 Tano medonho O octissyllabo também se pode dividir em um verso de quatro syllabas, e dois de duas; em que vivertos és o cysne: 1 2 34 Em que vive 12 Mos és 12 Ocysne Ou ainda em quatro versos de duas syllabas: Que o cruza sem que a alyura tisne: I 2 Que o cru 12 Zasem 1 2 Que aalvu 12 Ratisne.” (1) Pelo visto, foram os rominticos que, timidamente, comesaram a tomar consciéncia das possibilidades deste verso, ¢ a previsfo de Castilho veio a se realizar, pois 0S poetas portugueses ¢ brasilciros, mais tarde, acabaram explorando o verso em todas as suas possibilidades combinatérias, J4 em Garrett (O Emprazado) encontramos: “Da guerra d'el-tei Almangor 25.8 Vira co’essas armas sangrand 258 Ou foi que na estrada algum bando 258 O quis, por mé-traga, matar!” 288 (1) BILAC, Obvo & PAS ‘Alves, 1905, pp. 61-62. OS, Guimaries, ~ Tratado de Versificagdo, Rio, Francisco Teoriado Vero 93 E Gongalves Dias, embora circunstancialmente (A Tempestade), serve-se de idéntico esquema: ‘Bem como serpentes que o frio 258 Em nés emaranha, — salgadas 258 As ondas s'estanham, pesadas 258 Batendo no frouxo areal.” 25.8 Em Machado de Assis é de se notar 0 predominio dos esquemas baseados em 13-68 € 4-8, de mistura a todos os outros tipos, como se pode ver pelos exemplares abaixo: “Tem do céu a serena cor” 13468 “Soliddes em que se ouve o grito” 368 ‘“Meditando, conjeturandc” 38 “Via limpos 0s coragdes” 138 “De batalhas ¢ descobertas” 38 “De folha e flor, de sol e neve”” 24.68 “Os hipopétamos tranqiiilos 48 Riso de eterno mogo amigo” 1-468 ‘Gosta do estrépito infinito” “Era no glacial dezembro” “Das cortinas ia acordando” 35-8 ““Regressa ao temporal, regressa 268 “Ea gloria coroava a gloria.” 268 Foi Guerra Junqueiro, famoso pelos hendecassilabos trocaicas, um dos que notabilizaram o uso do octossilabo com cadéncia acentual 4-8 na estrofe: “Todo esse vomito de honores 1.4.8 E de catéstrofes sombrias, 48 Profundo atlantico de dores, 248 ‘Negro Himalaia de agonias,” 14.8 E Bilac, coerentemente a0 que afirmara no Tratado, scrve-se de idéntico esquema acentual (Baladas Roménticas, p.e.): “Revivo a mégoa jd vivida 246-8 Eas velhas Ligrimas. . a fim 248 De que chorando, arrependida, 24.8 Possas lembrar-te inda de mim!” 148 Boa parte dos pamnasianos manteve-se fiel a esse uso, que cresceu de intensidade entre 0s simbolistas, Cumpre destacar 0 relevo que 0 actos 94 Ropstio k. Chociay: apresenta na obra de Alphonsus de Guimaraens, que consegue excelentes efeitos de contraste entre 0 esquema 4-8, em maior indice, e todas as ou tras possibilidades: “Se nds olhamos para tris, 248 Quantos mortos vamos revendo! 13.5.8 Este € 0 sepulero em que ela jaz. 1468 Foi ontem que év a vi morrendo.”" 26-8 A inifluéncia da literatura francesa durante o Parnasianisino ¢ 0 Simbolismo é uma das razdes aventadas para a explicagdo do subito gosto pelo octossilabo entre nds, Nao esquegamos, aliés, de que as fontes de Castillo foram os ‘manuais franceses. De um modo ou de outro, se 0 uso na poesia trovadoresca nao fora suficiente para impo-lo, a verdade é que 0 verso de oito sitabas realmente se consagrou apés as lig@es do mestre, vindo a ter uso intenso entre os simbolistas ¢, inclusive, entre alguns modernos, como Ribeiro Couto, Cecilia Meireles, Jorge de Lima, Cecilia Meircles, por exemplo, serviu-se dele mais que 0 proprio Alphonsus, com a peculiaridade de nao dar primazia a ‘qualquer esquema particular, variando intensamente as suas realizages: “No desequilibrio dos mares, as proas giraram sozinhas. ‘Numa das naves que afundaram € que tu certamente vinhas.” “Sombras. A cémara apagada, . Sombras. . . Meu vulto é longe. . . ausente Silencio. .. Calma. . . Sonho. . . Nada Vago, leve, indecisamente, 7.9.3 Podemos melhormente explicar a réceita do octossilaho com hase na sua realizagéo estréfica, em que vetificamos duas possibilidades de emprego: 1.8) com cadéncia silébico-acentu: também 2-5-8 ¢ 3-6-8): 2.2) com cadéncia silébica na estrofe: contam todas as suas possibilidades de realizagdo, a partir dos tipos bdsicos de alternincia: a) 1-3-5-8, b) 1-3-6-8, ¢) 1-4-6-8, d) 2-468, e) 2.58, 1) 2.6.8, : esquema 4-8 (esporadicamente, 7.9.4 O uso do verso com cadéncia sildbico-acentual na estrofe toma or base a simetria obtida pela fixagdo de uma 4.8 silaba forte, variando as demais silabas de cada membro quanto a intensidade, podendo também ser fortes: a 1.4 ou a 2.8, a 5.8 ou a 6.4, O esquema fundamental €, portanto: Teoflado Vero 95 1203 4 S$ 67 8 » - hae tans aie Cobo 4 que se adaptam quanto a andamento ¢ cadéncia: 123 4 5 67 8 ym Li La grave +4 sinaleta wel web 1203 4 5 67 8 g batt age Le a 123 4 5 6 78 Q —~—~~L— us, — 1 desdrixuto+ 3 L ¢/sinalefa wt 1203 4 5 6 7 8 2) ——~—~La— +L gesdrixuto+2 Note-se que nos esquemas a) e b) fica resgvardada a integridade dos hemistiquios tetrassilabos, o que nfo acontece nos restantes. Mas a verdade & que, na pritica, isto nfo veio a ter grande importincia, pois os esquemas c), d) € e) desde logo surgiram misturados aos outros. O que passa a caracterizar tal verso, assim, € tio somente a fixagdo de uma 4.2 silaba forte, que Ihe traz andamento peculiar, ¢ nJo a diviso em membros sildbicos simétricos. Apesar disto, Duque-Estrada ainda dizia do octossilabo 4-8: “Pode ser decomposto em um verso de quatro syllabase- dous de duas, ou vice-versa; ou ainda em quatro de duas; 96 — Rogério E. Chociay “nas a divisio mais curial é a que se faz muito naturalmente ‘em dous versos de quatro syllabas, por serem esses os seus verdadeiros elementos estructuraes: 123 4 567 8 Hoje -nem-sek- / de-tan-tos -s0-/nhos, Te-nhode -sér- / t'o-co-ra-¢50” (1) ‘Ou, ainda, 20 comentar a cesura, “No octossyllabo ¢ no alexandrino a collocacao da cesura é exatamente no meio;” (2) Mas tanto a cesura como a fixacdo de hemistiquios para 0 octossitabo tormaram-se apenas dados tedricos, jé que este veio a assumir todas as Possibilidades de articulagzo de membros que a fixagdo do acento forte na quarts sflaba Ihe permitiu, sem que isto trouxesse qualquer prejufzo a0 seu andamento ¢ A cadéncia acentual estréfica. Nada obstante, grande nimero destes versos guarda exatamente essas proporgdes simétricas (444 ou 4 grave + 4 com sinalefa), apresentando inclusive a contigiidade de silabas fortes entre (08 membros tetrass{labos. Eis os nimeros de todas essas realizagBes: 24-68, 4-6-8, 24-8, 48, 1-4-6-8, 1-4-8, 2.4/5.8, 1-4/5.8, 4/5-8, E alguns exemplos: ““Aos borbotées/o sangue cai. ..” (Olavo Bilac) “O amor € uma drvore ampla e rica”” (Olavo Bilac) “Terriveis pdginas/da vida" (Olavo Bilac) “Ail coragio!/peno e definho” (Olavo Bilac) “Na escuridio/vaga perdida” (Olavo Bilac) “A vor piedosa/do gigante” (Vicente de Carvalho) “Atrés de cOmoros/de areia” (Vicente de Carvalho) “Da formosura/triunfal” (Vicente de Carvalho) ““Sonha a nudez:/brutal e impuro” (Vicente de Carvalho) “Passa, ¢ ndo vés:/branca, marmérea” (Vicente de Carvalho) “Branco de espuma, ébrio de amor” (Vicente de Carvalho) “A telva fresca a iluminar” (Guerra Junqueiro) “Em doce frémito amoroso” (Guerra Junqueito) (1) DUQUEESTRADA, Ossrio ~ A Arte de Fazer Versos, Francisco Alves, Rio, 1914, 28ed,, p.91 Teotiado Verso 97 “Monstruosidade apocalfptical” (Guerra Junqueiro) “Vala comum — / tasca nojenta” (Guerra Junqueiro) “Nao, marinheiro! / Olha-o assim” (Guerra Junqueiro) “O astro palido / que ascendes” (Alberto de Oliveira) “Ouves dos orbes / 0 profundo” (Alberto de Oliveir “Rola, talvez, / sem lei nem rumo” (Alberto de Oliveira) 7.9.5 O emprego do octossilabo com cadéncia apenas silébica na estrofe (de indice também relevante) aproveita todas as possibilidades surgidas de 4-8 mais as que surgem dos tipos 1-3-5-8, 1-3-8, 2-58 e 2-6-8. Assim 0 encontramos, por exemplo, na obra de Alphonsus de Guimaraens, Ribeiro Couto, Cecflia Mcireles, Jorge de Lima, e outros. Eis alguns exemplos destes Ultimos esquemas ¢ poetas: 4) 1-3.5-8: — “Cisnes brancos! Sede felizes ““Tomam formas de aves noturnas” (CM) 35-8 — “Em lagadas feitas de flores" (AG) “Ficaria também perdida” (CM) 1-5-8 — “Perde a intensidade sonora” (RC) “Livre de qualquer sepultura” (CM) b) 1-3-6-8: “Sete damas por mim passaram”” (AG) “Duros, fortes, blindados como” (JL) “Foste feita de chamas de oiro” (CM) “Cai na varzea que a névoa encobre” (RC) 3-6-8 — “Agitaram as verdes vestes” (AG) “Oferecem barcos estranhos” (RC) 13-8 ~ “Vozes quentes de lavadeiras” (RC) “Cantos vagos de passarinhos” (RC) 38 — “Com figuras alucinadas por desejos e covardias? ” (CM) ©) 2-4.6-8 (4 exemplificado). 4) 1-4-68 (4 exemplificado). #) 25-8: “BE aquele que os mortos reine” (AG) ““Colore as areias desertas.” (CM) “Em misica, em mérmore, em versos? ” (CM) “O dura legenda incendiada” (JL) 98 Rogério E. Checiay f) 2.64 “Vencendo sucessivos planos” (CM) “E nada ficard impune” (AG) “E fiz uma figura triste” (RC) “Decide-se a fazer os cactos” (JL) 28 “De novo se debrugardo” (CM) ““Nasceram das encruzilhadas” (CM) “As luzes de amanhecimento” (CM) “Olhavam-se desintegrados” (CM) 7.10 VERSO DE NOVE SILABAS 7.10.1 Denominagao: eneassilabo (padrio grave: decassilabo) 7.10.2. Encontramo-lo j4 em Bocage, que em uma de suas odes (1) ‘© emprega com a soma de dois tetrassilabos (0 primeiro grave ¢ o segundo esdrixulo), “Canora musa // do culto Pindaro, 24/179 Que remontavas // sou estro férvido” 4/179 “Eis aparecem // no mundo, ¢ sibito 14//79 Murcham-se as flores, // secam-se as drvores;”” 1-4//69 “Desce a meus gritos, // inspira, inspira-me 14//79 Queixosas nénias, // fiinebres canticos;” 2-4//6-9 Entre 08 roménticos predomina 0 esquema 3.6.9, com cadéncia sildbico-acentual na estrofe. Ao lado deste'ndo deixa de ser empregado, pe. por Junqueira Freire ¢ Fagundes Varela, o eneassilabo 4-9, com primeiro hemistfquio invariavelmente grave. Junqueira Freire, como 4 explicamos no Capitulo Quarto, chega 2 utilizé-1o como verso composto segundo os mesmos padrdes do alexandrino antigo (possibilidade de variar a terminago do primeiro hemistiquio). Os parnasianos empregaram, predominantemente, 0 verso de nove sflabas como a soma de dois tetrassilabos, dos quais 0 primeiro Brave, © nesse caso interdita a sinalefa, que se toma porém obrigat6ria quando © primeiro hemistiquio é esdréxulo. Esta receita passou aos simbolistas, () Ode A tmprovisa morte do Exma, Principal Mescarenhas (D. Domingos de Assi). Esta compodgio consta de vinte © sete quadras, das quais o primeiro e o segundo versos ‘so eneassflabos 4.9 ¢ os dois restantes hexassilabos. Os eneassilabos posmem terminagio esdrixula; o primeiro hexassflabo sempre grave, assim como o segundo hhexassflabo sempre exdrtixulo, Teoria do Verso 99 muitos dos quais, mantendo embora a acentuagio fundamental 4.9, ampliaram a combinatoria de membros do verso, usando ndo somente 4 grave + 4e 4 esdninulo + 4 com sinalefa, como também 4 agudo + 5, 4 grave + 5. com sinalefa e4 esdrixulo + 3. Cumpre destacar o fato de alguns simbolistas (pe. Alphonsus de Guimaraens e Eugénio de Castro) terem usado o encassilabo de mistura a octossilabos ou vice-versa (4-8 € 4.9), 0 que é verificével modernamente também em Cecilia Meireles. Indo mais além, Alphonsus chega a langar mio de possibilidades nfo ortodoxas, misturando 369, 49, 25:9, 2-6-9, 1-3-5-7-9, num emprego do verso com cadéncia apenas sildbica na estrofe. Reencontramos 0 eneassilabo na obra de alguns poetas modernos como Cecilia Meireles, Manuel Bandeira, Ribeiro Couto, Murillo Araijo, Guilherme de Almeida, Paulo Bonfim e outros, sendo importante destacar que Jorge de Lima chega a uséo nos mesmos moldes em que o fez Junqueira Freire (1). 7.10.3 Conforme a época e 0 poeta, como vimos, poderemos encontrar © eneassilabo empregado de diferentes modos: 1.0) Esquema 3-6-9, com cadéncia sildbico-acentual na estrofe: ““interpelo as estrelas que choram, E asestrelas nfo querem dizer, Falo aos ventos ¢ 0s ventos respondem: Também nés procuramos saber. . .” (Tobias Barreto) Este tipo eneasildbico, de andamento temnério, as vezes chamado de “verso de Gregorio de Matos", foi muito do gosto dos roménticos, Enquadrs realmente em 1-36.9 pela altemincia, com a sflaba inicial podendo surgit ‘como fraca, “Cavalguemos dois lindos corcéis” (Tobias Barreto) ou como forte, “Diga 0 anjo que sempre comigo” (Tobias Barreto) De outro modo, 0 andamento monétono e envolvente, gerado pelo uso sistemttico da acentuagdo na 3.8, 6.4 ¢ 9.8 sflabas, pode ser atenuado pela articulagfo do verso em dois ou mais membros, surgindo daf diferentes matizes de tom, pausas e, mesmo, a contighidade de sflabas fortes (da 3.8 com 248, da68coma7): (G) Fato jd explicado © exemplificado no Capitulo Quarto, 100 Roplrio E. Chociay “"Mas tu foges de mim!. ..ouve, espera” “Pobte, louco, misérrimo e triste! “Proibir-me que sof “E de mais, bem 0 sei, a loucura” “O que tenho? que posso eu ter dar? “Guardo ldgrimas; queres? nfo queiras; “Vem, a hora é bel{ssima; os péssaros”” “Que perfume!. . . Tew hilito faz" (Tobias Barreto) 2.9) Esquema fundamental 4-9, de verso composto segundo os mesmos principios do alexandrino antigo (possibilidade de vatiagfo terminal do primeiro hemistiquio, embora o padrfo considerado sejam os hemist{quios Graves); trataze do exato modelo do decassilabo composto dos espanhois: eee 2nero ners eee 1203 4 5 yo LL to lds a y-- pean Ut agl Lb aL Zot 0 a = L Loe “E quando o sino // tocou mati 244/24 Ela tremeu // de seu fragor. 1.4//2-4 Ea pobre moga // — da vez primeira — 24/124 Das rezas quase // sentia horror.” (1) 241/24 Gunqueira Freie) 3.0) Esquema fundamental 4-9, embora de principios de composigdo modificados em relaglo ao anterior, pois todas as silabas do alinhamento do verso so contadas até a iiltima forte, nfo se permitindo excesso ou falta: (1) Um primeizo hemistfquio esdrixulo nfo & enconiravel nos poemas de Junqueira Freire ¢ de Jorge de Lima feitos segundo tal receita. Mas bastam para sustenté-la: a) a variacfo grave-aguds dos hemistiquios iniias; b) a separagio entre os hemistfquios ‘raves, mesmo quando hé possbilidade de sinalefe, Teoria do Verso 101 12345 6789 y———L— +———L Ginaleta interditay by — — — L— 4 — — L Ginalefa obrigada) “Ou ser como érvore: // aos lavradores 249 dé lenhae fruto, // da sombrae 24.7.9 44 ninho as aves; // 20 inseto, flores. 24.19 ‘Mas nada sabe // do bem que faz.” 247-9 (Guilherme de Almeida) © andamento intensivo do verso assim equacionado apresenta quatro possibilidades com o intervalo de fraqufssimas entre fortes: “Olhos pisados, fundas olheiras,” (Raimundo Correia) “Banhos de lua que fazem mal!” (Raimundo Correia) “Do céu remonte-se a ave mais forte” (Alberto de Oliveira) ““Abrindo um voo de asas gigantes” (Guilherme de Almeida) 24-79; “Dos sete ventos da noite imensa.” (Paulo Bonfim) Outros esquemas de realizagdo, tais como 4-69, 4-79, 249, 14.9, 4.9, apresentam, apenas aparentemente, intervalo superior a duas_ silabas Fraquissimas. Nos esquemas apontados, a 2.2, ou 2 6.4, ou ambas, surgem ‘sempre como fracas, 0 que 6 suficiente para sustentar o tndamento intensivo dos versos onde surgem, trazendo-Ihes embora diverso matiz: ““Evaporavam letal perfume. ..” (Raimundo Correia) “Desponta ratila, a madrugada” (Carvalho Aranha) “‘Vaga, noctimbula apari¢ao!” (Raimundo Correia) “Se amortalhavam na lividea. . .” (Raimundo Corre “De desalento. .. de desencanto. . .” (Manuel Bandeira) “Ingenuidades encantadoras!” (Antonio Nobre) “Felicidade! Felicidade!” (Antonio Nobre) 4.9) Esquema fundamental 4-9, que incorpora as duas possibilidades anteriores, articuladas em membros. simétricos, as és seguintes, que articulam membros assimétricos: 1234 $6789 g——— b+ Lagi 1234 $ 6789 a) — — — Las — — — L agave +5 ojsinateta 123456 789 y———L—— + © L Aesirixuto +3 102 Rogério E. Chociay “Depois da chuva // desabalada Que tarde limpida // de verdo! A verde sombra // de uma latada Venho beber // esta exalacao De folha fresca // e terra molhada.” (Ribeiro Couto) “De ti s6 resta// 0 que se consome. Vais para a morte? // Vais para a vida? Tua presenga // nalguma parte ¢ j sinal // da tua partida.” (Cecilia Meireles) As possibilidades de realizagfo acentual sio aqui as, mesmas da receita anterior, valendo destacar: a) os efeitos peculiares obtidos com o esquema 4 esdrixulo + 3: “Cheios de ldgrimas emotivas” (Ribeiro Couto) “Oh! mar das placidas perspectivas” (Ribeiro Couto) “Dos olhos languidos da menina” (Ribeiro Couto) “Por estas liricas redondezas” (Ribeiro Couto) ) a possibilidade de silabas fortes contiguas, quando 0 verso se realiza em 4 agude + 5; “Vé praia e mar,// ondas a bater” (Ribeiro Couto) “Passam pelo ar // sombras de esqueletos” (Alphonsus de Guimaraens) ““Virgens de luz, // fadas erradias!” (Alphonsus de Guimaraens) 7.10.4 Como jé afirmamos em 7.10.2, podemos ver em muitos poemas de Alphonsus de Guimaraens ¢ alguns de Ribeiro Couto o emprego do verso eneassilabo com cadéncia apenas na estrofe. Em Alphonsus encontramos variadissimas possibilidades de realizagdo acentual desse verso (1): 14-69, 14-79, 2-469, 24-79, 369, 1-3-5-79, 25-9, 2-69. Eis uma relagdo de exemplos: : 1:3-5-7.9: “Horas € horas, cose, cose, cose, Prega, prega, triste sapateiro!”” “Rosas brancas, rosas cor-de-rosa.” “Pobre lua-nova, quem te pos” a {ato apresenta precedentes em muitos simbolistas que, apesar de empregarem busicamente 4-9, uma que outra vez quebravam a cadéncia acentual da esttofe com versos sem acentuagio na 4.9 sflaba, Mas em Alphonsus 0 niimero dessas quebras & ‘bem maior. Teorla do Vero 103, : “Nas remotas soliddes agreste: “Dolorosas, pelo cho da igreja’ “Eurritmia celestial das cores” 3-5-9: “Sapateiro, faze os sapatinhos”” “Em trend, entao, pelos caminhos” : “Serds a senhora lua-cheia.” “Mais leve que brancos véus de espuma” 25-9: “Espectros de miimias imortais.” 2-6-9: “E logo te ajoelhaste a rezar. “Ungidos pela cor da alvor 136.9: “Rosa mistica, imécula rosa” “Passa, acaso, por mim rogagante” ~> 3469: “Os vestidos de luar que perdeste. ..” 7.10.5 Podemos encerrar esta visio do eneassilabo lembtando 0 seu ‘emprego junto @ octossfiabos (4-8 & 4-9) verificdvel em Alphonsus de Guimaraens ¢ Eugénio de Castro e, mais proximo de nés, em Cecilia Meiteles, Os esquemas 4-8 ¢ 4-9 facilmente se confundem, pois “o ouvido quase no pereebe a diferenga de uma silaba”, enganado pelo acento da 4.8 (1); “Olhos sublimes, sombras chinesas, 1469 Sob a arcaria das sobrancelhas. . . 146-9 Solar magnéfico, onde princesas 2469 Passam de tiinicas vermelhas. ..” 148 (Alphonsus de Guimaraens) 7.11 VERSO DE DEZ SILABAS 7.11.1 Denominagdes: decass{labo (p. grave: hendecassilabo). Existem ‘multes outras denomingebes surgidas conforme o esquema fundamental, § época ¢ os tratados de versificagio, Ax que julgarmos importantes’ ¢ necessérias serfo Indicadas através deste estudo, (D “Ritmo e Poesia”, p. $2. 106 Rogério E. Chociay 7.11.2 0 verso decassflabo, cujo emprego na poesia trovadoresca, em variados esquemas, é matéria controversa, teve, desde o Classicismo, seu uso caracterizado pelo predoménio de realizagdes fundadas em 6+4, esquema fundamental 6-10, tipo denominado, genericamente, de herdico; © 4+6, esquema fundamental 48-10, tipo denominado de sifico. Mas afirmar-se que apenas estes tipos foram realizados ¢ arriscar-se um pouco. Manuel Bandeira, Pe., aponta em Camdes “muitos exemplos harmoniosos de outros ritmos (G#7, 44343, 248, 446)" (1); € 0 Prof. Péricles Eugenio da Silva Ramos embra, a propésito, que nao devemos considerar a introdug0 dos modelos italianos do decassflabo na versificagio portuguesa apenas com “o duplo rosto que atualmente the concedem os manuals”, ou seja, 6-10 ¢ 4-8-10, mas também esquemas com acento na 7. sflaba,verificaveis, p.., em Dante (“Se wol campar desto loco selvaggio”) (2), Castilho, em seu Tratado, embora defends os esquemas de alternincia bindria predominante ou total, nfo deixa de citar como realizdveis os decassflabos 2-7-10 (“A férrea e precipitada bigorna”) © 47-10 (“A triunfante vermelha bandelra"), aconselhando, inclusive, que tais solugdes sejam tentadas pelos poetas (3). Na verdade, of ‘versot bratieiros e portugueses de todas as épocas ndo esto ainda esmlugados em tus totalidede, ¢ quando lato for feito mults cofsa nova poderd vir A tone, De nossa parte, acompanhando a trilha aberta por Manuel Bandeira e Péricles Eugtnio da Silva Ramos, encontramos em poetas por eles citados e noutros que nés mesmos, por acaso de pesquisa, folheamos, muitas realizagdes nfo Ortodoxas do decass{labo, que incluiremos em nossa exposicdo seguinte sobre overso. 7.11.3 M. Cavalcanti Proenga,’ tomando por base a tistribuigfo de silabas fortes no alinhamento decassilébico (intervalos de uma, duas e trés sflabas), fala-nos de vinte € oito possibilidades de realizagfo para 0 verso (4). Cinco delas apresentam 5 sflabas fortes; dezessete, 4 sflabas fortes; seis, 3 sflabas fortes: 2-610 3-610 3-710 46-10 GD BANDEIRA, Manet - Pocsia do Fare Pamesiena, Edighes de Ouro, 1967, pp. 285-289, (2) “0 Verve Romintico. 3) Op. ch. pp. 62-63. 4) Op. cit. pp. 54-64. pp. S158, Teoria do Verso 105 246-8-10 47-10 48:10 Embora vinte ¢ oito powsibilidades jf parecam bastantes, essas combinat6rias fepresentam apenas um pélido exemplo da riqueza a que pode atingit a linha melodica do decassdabo. Se considerarmos também as pausas internas, a3 folugden de entougfo. w hierarqula entre as afabas forte ettabalectde poles construgdes sintéticas que conformam seu alinkamento, veremos pura indlcagdo das sflabas intensas nem sempre nos retrata a real tesitura deo cxemplares analisados. Acresca-se que alguns tipos de decass{labo realizamse fom intervalo superior a trés sflabas entre fortes. Destes, parecem nos bastante caracteristicos e exequiveis, 1-6-10, 2-7-10, 3-8:10¢ 4.16, 7.11.4 Na verdade, no existe ainda uma classificagio Perfeta do verso decstlabo em lingua portuguesa, Bueande nos on nei de um bom ntimero de exemplares encontrados em varios. ‘poetas de diferentes épocas, parece-nos que possivel, de inicio, situar duas possibilidadee Peculiares de emprego: a primeira, numa relacSo pentassildbica simétrica 5+5, oe ceo Se somporefo pode Ser stabelecila a partir de hemistiquios s inda englobamos toc il is Mbdhiencs Seyi gees touts a outs potbilidades, qu depois 7.11.5 © emprego do decassflebo em hemistiquios pentassldbicos ter mua receita de compotigfo elaborade a pastit de vee 1234@678 9@ (1) Nio estamon 106 Rogério E. Chociay ou seja, 123 4 5 67 8 9 10 aa tt HH HL Saguao ts —----—-4+tiy ~LLk 5 grave + 5 cfsi- nalefa ou em outras realizagdes em que desaparece a articulagZo de hemist{quios, embora possa ser mantida a mesma linha intensiva de base 5-10: 12345 6 789 10 cone ht PK OL Spravess —-———t st ak Sendes ci nalefa —~———-L-——+ ~~ L Sesdrixuto+3 Em “Cangio da Partida”, Camilo Pessanha usou-o mais ou menos assim (1), ‘como se pode ver pelos exemplos: 5 10 “Ao meu coragdo // um peso de ferro” 5 10 “E hei-de mercar // um fecho de prata.” 5 10 “A iiltima, de antes // do teu noivado.” 5 10 “E um lengo bordado. .. // Esse hei-de o levat”” $ 10 “No dia em que enfim // deixar de chorar.” A combinatéria dos acentos internos aos fundamentais nos dé os seguintes esquemas possiveis: 1:3-5-7-1 1-3-5-8-10: 25-710 258-10 GVO poems € formado por quatro quadsas; ax duas primeiras terminam por um auebrado; is dust segunda possirs ox quatro veo" ntepes. Dos deca tnbon, dos quatorze, escampam i relaglo 5+5: 0 11.9 (“A sete chaves; tem dentro uma carta...")e 0 13,9 ("A sete chaves, ‘ambos de esquema Toots do Verso 107 devendo-se também considerar que a divisio em hemistiquios permite 4 6.2 silaba surgir como forte, embora com menos realce que a 5.2, e sem perturbar ‘aestrutura do verso: 1.3-5//6-8-10 1-5//6-8-10 3-5//6-8-10 25//6-8-10 ete. Nao nos foi preciso muito esforgo para extrair exemplares 5-10 da obra dos oetas abaixo: Joaquim Cardozo: “Com redes de vento pesquei satinas “De luz se alimenta. Fala cristal” “Se de mim pretendes, se a mim preferes, Nao hé mais razdes, nem hd mais confronto. . .” fo seu ar sereno que inda hoje absorvo” “86, de terra 86, soja @ minha casa” “Antes de morrer jé sou lama ¢ vasa” “Dos que aqui viveram vida esquecida” Cassiano Ricardo: “Nao obstante ao pio preferir a ros “No século XX. Ainda africano” “Surpreendeme ver-te agora transviado” Tasso da Silveira: “Auséncia, presenga multiplicada” Geir Campos: “Guindando a aten¢a dos homens da estiva” “Quase um desperdicio de estrelas claras”” Carlos Drummond de Andrade: “Eu quero compor um soneto duro” “Eu quero pintar um soneto escuro”” “Como poeta algum ousar4 fazer” Manuel Bandeira: ‘“Magoada a cabeca exposta a umidade.”* “O seu desencanto no tem um fim : "Que sio teus amores’ Ingenuidade” 108 Rogério E. Chociay 7.116 Exclu(das as realizagdes de 5+5, restam-nos ainda 20 outras (das, arroladas por M. Cavalcanti Proenga) em que a 5.8 silaba tornase neutra (mesmo que esta quinta sflaba aqui aparega como forte, a estruturagio dos ‘vernos fundamenta-se em outra(s), 0 que ndo permite identificagfo a $45): 13-6810 2-4.6-8-10 3-6-8-10 13610 2-46-10 — 3-6-10 13-710 2-47-10 3-7-10 146810 2-4.8.10 14610 — 2-6-8-10 147-10 26-10 14810 Se estudarmos com atengao essas realizagdes, veremos que é possivel reunilas em dois grandes grupos, identificados entre si pela neutralidade da 5.8 sflaba ¢ pela igual possibilidade de acentuar qualquer das primeiras quatro silabas: 1XDOOO ©1@» OOOO s «Os ° @ com os efrculos marcando as provaveis localizagdes de silahas fortes. A distingZo entre versos que pertengam a um e a outro grupo se faz, evidentemente, da metade em diante do esquema realizado: no 1.9 grupo a alternncia é bindria da 6.4 sflaba em diant 10 2.° grupo, com a acentuagiio da 7.8 (em vez da 6.8 e da 8,2), a alterndncia torna-se terndria. Em ambos os casos, da 1.94 4.8 silaba pode-se realizar a alterna bindria ou a terndria, combinando ou contrastando com a restante seqiiéncia do alinhamento sildbico. 7.11.7 Estudando 0s versos que se enquadram no primeiro modelo, O@BOsO7Os que se diferenciam entre si conforme o nmero, a combinat6ria € as vatiagdes de grau de forga das silabas marcadas, podemos encontrar as 15 seguintes, que indicamos e exemplificamos: ““E eu que busco a moderna e fina arte” (Cesario Verde) ““Fundem circulos méximos de espanto” (Geir Campos) “Pode habitar talvez um Deus distante” (Antero de Quental) “Vi um jardim com érvores escuras” (Cesério Verde) :_ “*Vivas fafscas me mostrou um dia” (Cam@es) : “O amor florindo em nés abril e outubro” (Geir Campos) Heona de Vero 100 ““Sulgava ouvir monétonas corujas” (Augusto dos Anjos) “Do bruto embate férreo das tenazes (Augusto dos Anjos) “Num tempo diplice de abril e outubro” (Geir Campos) “Do bébado feliz que fala 86!” (Cesirio Verde) “A migoa de moneer expatriado.” (Bocage) “E o sublime Cambes de fome expira” (Guerra Junquciro) “Com o amarrilho vermelho das estradas” (Cassiano Ricardo) “A religiosa luz de um claustro exprime” (Alphonsus) “A realidade esquilida estrangula” (Dante Milano) “Desaparece sem deixar saudade” (Dante Milano) “Sonoridade potencial dos seres” (Augusto dos Anjos) A receita tradicional dos decassilabos heréico e sdfico se inscreve nesse undo genérico, e ambas se distinguem estruturalmente pelo fato de set fundamental 2.62 silaba, no primeiro, a 4.3, no segundo, ou, em linguagem de manual, “um verso de seis mais um verso de quatro, ou um verso de quatro mais um verso de seis”: 12 3 4 5 @f 7 8 9 (1OyI// _herdico 1203 @ 5 6 7 8 9% (OVI séfico ambas consideradas a base da estruturagdo de cada tipo, conforme as relagdes 644 © 446, respectivamente. Se observarmos, alids, atentamente os esquemas fundamentais dos dois tipos, veremos que um é exatamente o inverso do ‘outro: 6 10: 4. 10 esquemas que continuardo exatamente inversos com o complemento acentual na 8.8 silaba, para 446, e na 2.8, para 6+4. As realizagdes que resultem em 4-6-10 poderdo se inscrever estruturalmente em 6+4 ou 446, dependendo de ser a 6. ow a 4.2 a silaba fundamental, 0 que se descobre pela escansio e anilise de cada exemplar: 4 10 “Quebra-se 0 torso, a pema se descola” (Dante Milano) 6 10 “A realidade esqudlida estrangula” (Dante Milano) Em termos de estruturagio, alids, 0 decassilabo vai muito além, podendo apresentar-se bimembre, trimembre e multimembre, inclusive com a contigtiidade de sflabas fortes facultada pela articulaggo em membros pausados entre si (casos, p.e.,em que a 5.4, em 4-10, € a 7.8, em 6-10, podem aparecer também fortes, sem que se traia A receita do verso). Ei 110 Rogétio E. Chociay incompleta destasestruturagdes, em que indicamos, numericamente, apenas os acentos finais de cada membro: Dante Milano (DM) Mauro Mota (MM) Joaquim Cardozo (JC) ‘Augusto dos Anjos (AA) Emiliano Perneta (EP) Bocage (B) Camées (C) I 10 “O ar, // cheio de fantasticas agdes !” (DM) 1 10 “LongzL/auele monslogo malhado” (HM) “Meus aos, I] Migrirmas peuiten " (DM) “Ser cachort! 11 Ganie incompreendton” (AA) “Expres, [I que parece soridente” (pM) “Som de ony HI gemer de atures” (DM) “Clardes da tarde, I luzes de agonia, Noite soln, JLestrelas lancinntes” (DM) “Nas maduras manhis de sol. // Carinho” (JC) 8 10 “Desesperada solidio. // Sozinho” (MM) “Navens, I omg vos, // falsas gloria doar" (DM) “Steg. J tropego, // sestcalando” (DM) “Pe, I coisa do sl, I face parade” (DM) 7 Astros, IL por ue enna? J aque: otha? ”(DM) “No ci, II n0 a 1] nas tépidas arcs” (Mm) Teotia do Vero 111 2 10 “Eu wi II de olhos sexperts, JI fabulosas” (DM) 6 10 “Seu os 11 seu perfume, // sua voz” (EP) 2 6 10 “Sonambulo . .. // Sonimbulo ... // Sonibuto 2 (AA) 3 6 “Me roubou, // terna mae, a teu doce. agi” @) 3 10 "Soft os aio... mas ‘i! 1 Que sem Pledade” (8) “Has de cri 11 igual a um pre” (AA) “Pego de um on 11 Esforgos fig, I chego" (Aa) “Todo despid, 11 1, 1) da use” (EP) 1 4 6 10 ° 7 II sob $ vento, tls a duna, // onde a luxdria” (DM) re, i sérue, I infin! raguitca" (AA) 4 8 10 “Sombra, I perfume, // ressonincia, // imagem” (MM) 2 46 10 “Cruzadas, // frias, | ¥anguidas, // desertas” (MM) 2 4 6 10 “Flutuante, // fina, / aligera, // fugace” (MM) 2 6 8 10 “Sem sombra,// sem luat, / sem sonhos, // vem. ..” (JC) 2 6 8 10 "Secl [!prantos do mar, frst, vcuo” (DM) 6 8 10 “De mim en i bem perto, // junto, // unida” (MM) 2 4 6 8 10 “Florestas, vale / seas, faba, thos” (AA) 8 10 “Daas, H wis, ti aust, Ute dineo, I seis /] © sete” (AA) 7 10 o4eo)P “De ou, // so, (abs) neve //¢ luz pura.” (C) 7.11.8 Os decassflabos que se enquadram no fundo OOOO: «O19 @ 112 Rogério E. Chociay cancterizamse pelo predominio que apresentam do andamento terndrio, total, p-., em 14-7-10 (“Dia de sol, inundado de soll. ..", Camilo Pessanha} @ parcial nos outros casos, Podemos colocéos em dois tipos basicos, conforme sejam também a 3.2 ou a 4.2 sflabas intensas: At 37-10: 1-3-7-10 B: 4.710: 1-4-7-10, 2-47-10 Os exemplos ndo sfo diffceis de obter. Sem grande esforso, conseguimos ‘encontrar muitos mais do que estes, dos seguintes poetas: Camilo Pessanha (CP) Cassiano Ricardo (CR) Alphonsus de Guimaraens (AG) Tasso da Silveira (TS) Manuel Bandeira (MB) Carlos Drummond de Andrade (CDA) Dante Milano (DM) Guilherme de Almeida (GA) Geir Campos (GC) Machado de Assis (MA) “Primavera que durou um momento, ..” (CP) ““As eatrelas, dolorosas lanternas” (CR) “Elefante, que nasceste na origem"* (CR) “Os cabelos borrifados de estrelas” (CR) ““E de cada coraglo penitente” (AG) “Pede, pede quem odeia a quem ama” (AG) “Suplicando a compaixfo do Deus forte.” (AG) “E espreitamos por detrés da cortina” (TS) “Depois da lutae depois da conquista” (CP) “Por cujo amor escalei a muralha” (CP) “Dia de sol, inundado de soll, ..” (CP) - “Ao relembrar como outrora gemia” (MA) “Soltou a voz solitéria e plangente” (MA) “Querem que faca reforma no império” (MA) “O mundo inteiro que sofre levanta” (AG) ‘“Misericérdia, meu Deus de cleméncia” (AG) ““Sobe terrfvel clamor de agonia” (AG) “De Colombina o infantil borzeguim” (MB) “Pobre Pierrot! Ndo Ihe queiras assim.” (MB) ‘Que nfo conseguem dormir nem morrer” (CR) “Ounno festio de sonetos de mérmore” (CR) Teoria do Verso 113 “Rosa de um céu que devia ser teu” (CR) ‘Seco, abafado, dificil de ler” (CDA) “Completamente esquecida de si” (DM) ““Indiferente & carfcia da mio” (DM) ‘"Um grande sonho que nunca sonhei" (GA) Um sofrimento que sempre sofri" (GA) “Ser o perigo de eternos enganos” (GC) “Um edificio, uma ponte, um navio” (GC) “Desgo cantando aos subsolos e as minas” (GC) 7.11.9 Em todo este trabalho sobre o decasslabo, tomamos por base o interalo mifximo de aés siabas entre fortes. Todavia, como jf lndicanios no ¢studo do andamento, muitos sfo os exemplares que extrapolam tais limites Na elagdo 446, por exemplo, constitui ocorténcia comum o. nig aparecimento de sflaba realmente forte apés a quarta sflaba, configurando.se © #squema 4-10 que, em muitos versos resulta bastante expressivo, como em 4 10 “Entre relimpagos e lividezes” (Dante Milano) Além de outros esquemas com grande espagamento, que estamos coletando ¢ Pretendemos estudar futuramente, trés outros merecem atengfo por serem de fieil laboragao: 146-10 (1-6-8-10), 27.10 © 38-10 (1:38.10), todos Apresentando 0 intervalo de cinco silabas (fracas efraquissims) entre fortes, num ponto de seu alinhamento. O decassflabo de esquema 1-6-10 pode ser considerado ocoréncia normal, mesmo entre os cldssicos, enquadrando- fem quaisquer problemas no mesmo grupo de 6-10. Sua peculiaridade res ‘Leda sereridade deleitosa”” (Camées) “Possa diminuir 0 amor perfeito” (Cam@es) © 5@®7 8 9 @ un4 5© Em A, quatro grupos de sflabas, em cada um computadas até a iltima forte, se sucedem regularmente, produzindo-se uma cadéncia silébica peculiar, Em B nd duas séries alternadas, de dez e de seis silabas, numa espécie de contraponto de cadéncias silébicas. 8.1.2 O acordo entre os versos na estrofe pode ser, além de sildbico, também de ordem acentual: (©) Ditoso seja aquele que somente Se quelxa de amorosas esquivancas; Pois por elas nfo perde as esperangas, De poder n'algum tempo ser contente. (Cam@es) '@3@s5 ®7 8 9 nN 1@345@78 9 nN 12@4s5@7 8 9 " 12@45@7 9 nN Teoria do Verso 147 (D)_E tao doce esta vaga saudade, ‘Na soiddo das montanhas colhida, Para quem entre mil tempestades Transitou pelos campos da vida! (Alexandre Herculano) 12@45@7 2 © 12@45@©78@ w 12@4s5@78@ 12@45@67 8 © w (©) Fermosa fera humana, Em cujo coragdo soberbo e rudo A forga soberana Do vingativo amor, que vence tudo, ‘ ‘As pontas amoladas. De-quantas setastinha, tem quebradas. _ (Cam@es) 1@3@5@1 1@3 4 7@9 @Mu 4 1 ® ® > @u ®» @u 23 1@3 4 1@®@?2:@ AA persisténcia de uma 6.8 sflabs fundamental (além da 10.8) em todos ot vertos do exemplo C, estende ao conjunto o esquema intensivo fundamental de cada membro, que se acresce & cadéncia silébica dando malor equilfbrio & estrofe. Em D chegase a perfeita simetria da extensio aldbica da disposlgto intensiva em todos os versos do conjunto, que se resolve numa cadéncla 20. mesmo tempo silibiea © acentual. Apesar da heteromettia verificavel em Ea altemincia de versos de extensto desigual produz 0 efeito harménico de contraponto de cadénclas sifbices (6-6-6 x 10-—10-10), ¢ 0 parentesco acentual dos decasslabos ¢ hexassflabos através da 6.8 slabs forte ¢ fundamental traz-lhe maior equilibrio, que neste caso particular ¢ ainda aumentado pela distribuigio sempre par das sflabas fortes, Note-se, & propésito, que nem tudo isso ocorre em B. QOOCO 148 Rogério F. Chociay 8.1.3 Em todos os exemplares examinados pode-se comprovar, além da teiteragéo de esquemas sildbicos e acentuais, a repetigso de fonemas em segmentos terminais, verso a verso: (B) -undos (C) -ente (D) -ade (EB) -ana -ou angas vida sudo -undos -ente ~ades sana sou ~angas vida sudo -adas sadas Essa relteragdo de fonemas verso a verso, continua ou alternada,que constitui 8 espécie mais usual de rima em nossa versificagao, pode apresentar iniimeros matizes e postibilidades combinatérias, e resulta sempre na percepgSo de uma cadéncia fonica, acrescentada acessoriamente a0 conjunto, 8.1.4 Note-se que o ponto capital para a elaboragao e percepeio das trés cadéncias descritas reside justamente nas pausas que, travando o final de cada alinhamento, fazem com que a seqiéncia seja retomada para, em posiggo idéntica, travar novamente a segunda linha, e assim por diante. Como se depreende, as cadéncias constituem a regularidade percebida nesses retornos simétricos de mimero de sflabas, acentos e segmentos fOnicos, o que torna o Perfodo assim elaborado radicalmente diverso do perfodo prosaico, onde, huma relagio membro_a membro, so usuais as anticadéncias silébica, acentual ¢ de segmentos fonicos termin: 8.2 Grosso modo, estes perfodos simétricos se comportam de duas maneiras distintas nos textos potticos tradicionais, Alguns apresentam-nos justapostos, harmgnieos pelas cadéncias obtidas, mas irregulares ainda pelo namero ‘aridvel de linhas ou versos que comporta cada periodo. Esta irregularidade ¢ ‘outros textos superada, obtendo-se uma sequéncia de conjuntos de idéntico tmimero de versos ao longo do poema. A separagdo gréfica surge para destacar Visualmente esta regularidade fonica. A rigor, apenas neste segundo caso Podemos falar em estrofe (1), que nao é somente um grupo ou seqUiéncia de versos, mas também um grupo limitado de versos solidérios. A limitagdo numérica confere maior harmonia aos conjuntos, que se sucedem segundo um exquema comum, percebido como cadéncia esiréfica. Deste modo, como 0 (I)A palavea estrofe (gego stroph2, = volta, conversio; pelo latim strophe) foi aplicada no ‘canto lirica giego vom sentido corcogrifico, designando 0 primeito de trés movimenios que 0 coro efetuava cantando: estofe, movimento da dicita para Ceduerda: anifsrofe, movimento. de retorno, da esquerda para a diteita; epodo, evolugéo final do retorno. As trés palavras acabaram for designar também co treo onjuntos de versos entoados em cada um desses movimentos coreogréficos, Teoria da Verso 149 verso (versus, = volta), também a estrofe tem como caracteristica o retorno (strophé, = volta). 8.3 A analogia da estrofe ao perfodo, vista tradicionalmente pelos tedricos, € Obvia: o final de verso € o final de estrofe correspondem, de modo ger: final de sentenga ¢ final de periodo, quer pela intensidade, quer pelas pausas que balizam estes finais: (F) Pouco importa, formosa Daliana, Que fugindo de ouvir-me, 0 fuso tomes! Se quanto mais me afliges, e consomes, Tanto te adoro mais, bela serrana. (Cliudio Manuel da Costa) Este exemplar tipico apresenta os finais de verses caracterizados por entoagdo, intensidade e, principalmente, pausas idénticas is de ui periodo prikaico de estrutura sintitica equivalente. Nascida do periodo, a esirofe deve apresentar, € claro, forte tendéncia para um balizamento andlogo, a despeito do jogo de simetrias que the ¢ peculiar. Mas os poetas, menos numas, mais noutras épocas, no vacilaram em colocar em cheque estes liames: (G) Esse negro corcel, cujas passadas Escuto em sonhos, quando a sombra desce, E, passando a galope, me aparece Danoite nas fantisticas estradas, Donde vem ele? Que regides sagradas, E terriveis cruzou, que assim parece Tenebroso e sublime, ¢ the estremece ‘Nao sei que horror nas crinas agitadas? (Antero de Quental) Se a simples constatagGo de que os finais de alguns versos estas estrofes sompem o liame sintético intervocabular (separam o que sintaticamente & insepardvel; colocam em posigao de intensidade forte no verso 0 que no perfodo prosaico teria intensidade mais fraca) e que 0 periodo iriciado na primeira estrofe fui para a segunda, forem suficientes para a sua leitura segundo os ditames da prosa, terfamos uma declamagao mais ou menos como esl “Esse negro corcel, cujas passadas escuto em sonhos, quando a sombra desce, e, passando a galope, me aparece da noite nas fantésticas estradas, donde vem ele? Que regides sagradas ¢ terriveis cruzou, que assim parece tencbroso ¢ sublime, ¢ the estremece ndo sei que horror nas crinas agitadas? ” 150 Ropétio F. Chociay Ji ndo dizemos apenas a declamagio, mas a simples leitura que aceitasse tal subservigncia trariainremedidveis prejuizos para os apoios sildbicos, acentuais ¢ fonicos que moldaram ambas as estrofes: suas cadéncias se diluiriam nas correspondentes anticadéncias prosaicas, poral a) desapareceria 0 isossilabismo dos versos, e com ele a cadéncia silibica: b) esvaziar-se-ia_ 0 efeito harménico resultante de uma hdbil contraposigdo de decassilabos 6-10 ¢ 4-8-10; ¢).a cadéncia fonica sofreria um desmanchamento total, jé que grande parte de seus efeitos nio se baseia na mera repetigao de segmentos fonicos (como simples homofonias de interior de verso), mas principalmente pelo fato de essa reiteragdo situar-se com base na silaba forte final de verses, sendo destacada, pois, pela maior intensidade relativa que af se localiza e pelas pausas delimitadoras; 4) ndo haveria, a rigor, duas estrofes, sendo uma sb seqUéncia, nfo de versos, mas de locugdes que formam sentgncas que se articulam num dnico prosaico perfodo, 8.4 Quer-nos parecer que a partir deste ponto o paralelo entre a estrofe ¢ 0 periodo prosaico deverd ser mantido com algumas restrigdes, e nfo para subordinar a primeira as normas que regem o segundo, mas, ao contrério, para destacar a autonomia de organizagao e efeitos que ela, a estrofe, passa a assumir: a) fixagdo de fronteiras mel6dicas verso a verso; b) possibilidade real de essas fronteiras ndo apresentarem coincidéncia com fronteiras sintéticas equivalentes; ¢) busca, a partir de tais pressupostos, do estabelecimento de seus proprios efeitos melodicd-expressivos, @ custa de rupturas intencionais dos liames inter-e-intravocabulares, verso a verso. Os matizes ritmicos e expressivos que soem obter-se através de tais rupturas apresentam uma riqueza praticamente inesgotivel, eimplicam diversas feigdes a estrofes aparentemente as mesmas. Sobre isso, a julgar pelos estudos a que pudems ter acess, pouco ou quase nada foi pesquisado na versificagao portuguesa, 9. A estrofe e suas denominacées 9.1 A rotulagdo convencional das estrofes toma por base 0 nero de versos {que as integram: DENOMINAGOES, N.° DE VERSOS Distico ou parelha Terceto Quadra ou quarteto Quinteto e quintitha Sexteto e sextilha ‘Sétima ou setilha ou setena ou hepteto Oitava Nona ou novena Décima 1 Secoronsun 9.1.1 Segundo o quadro acima, dois versos destacados graficamente dos demais constituem disticos, trés formam tercetos, ¢ assim por diante. Mas deverse levar em considerago que a disposiglo gréfica nem sempre condiz estrutura estréfica; esta € que deve ser analisada para verificarse se um agrupamento de versos constitui um todo orgiinico. Esta observacto é importante, principalmente no caso de disticos que $6 0 sfo na aparércia, jé que na realidade constituem quadras a que 0 poeta deu disposig&o diversa, O oposto também ¢ verdadeiro, podendo aparecer numa s6 arrumacto gréfica mais de uma estrofe. 152 Rogério E. Chociay 9.1.2 Quanto a0 mondstico, este designa nfo propriamente uma estrofe, mas um verso destacado visualmente de uma estrofe, posto que a ela pertenga organicamente. 9.1.3 Quanto a diferenga entre quintilha e quinteto, sextilha e sexteto, € preciso ter em mente que a versificagdo tradicional chegou a distinguir versos de arte maior € de arte menor. Eram considerados de arte menor, pot no terem esquema acentual definido (apenas a dominancia da dltima sflaba), os versos de sete ou menos silabas (contagem de padrfo agudo); por oposigio, de arte maior eram os versos de oito sflabas em diante, que podem apresentar duas ou mais domindncias internas, Com base nisto, surgiu a distinggo entre quintitha-sextilha, estrofes. em versos de arte menor; e quinteto sexteto, estrofes em versos de arte maior. Hoje em dia esta distingfo nfo é tigorosamente observada. 9.1.4 Estrofes de nimero de versos igual ou superior a onze, posto que ‘no sejam raras, no tém merecido grande destaque, e a razio principal parece residir no fato de que, além do nimero de dez versos, a unidade do conjunto tende a se diluir, tornando-se menos perceptivel a cadéncia estrofica ao longo do poema. 9.1.5 Os exemplos de cada tipo estréfico esto sendo dados durante 0 transcorter deste livro e, no estudo da rima, ainda voltaremos a falar sobre eles. 9.2 Outros dois rétulos devem ser levados em consideragio, segundo ocorra ‘ou nfo a identidade do nimero de silabas nos versos que integram a estrofe: a) estrofes isométricas: todos 0s versos componentes possuem o mesmo nGimero de silabas, por exemplo: Quadra isométrica b) estrofes heterométricas: baseiam-se na combinagdo de versos de diferente nameto de silabas: 10 Quadra heterométrica (10/6) —10 Teoria do Verso 153 Sobre elas falaremos ainda no estudo das cadéncias. 9.3 Também quanto 20 nimero de rimas que a estrofe comporta, al r6tulos tomam-se ate pons: Signs a) estrofe monorrimica: uma s6 rima; ©) estrofe mririmica:trés rimas: 4) estrofe polirrimica: quatro ou mais rimas. 9.4 Boa parte dos textos potticos tradicionais tem apresentacio a-estréfica, ou sefa, baselam-se na pura seqiéncia dos versus constituindo periodos Poéticos de tamanho varidvel; assim certas odes, cartas, éclogas, etc. Aqui também se enquadram os poemas em versos livres, no os versos livres modemos, mas os tradicionais, que buscavam na combinagio de metros diversos manter respeito aos principios vigentes da versificagio. 10. As cadéncias silabica e acentual 10.1 A disposigo grafica dos versos na estrofe, acumulados verticalmente, no visa outra coisa que destacar sua sucessio regular no tempo. Quando a jentidade do nimero de sflabas ¢ total (estrofe isométrica), os efeitos percebidos so de uma cadéncia sildbica peculiar: Quem disser que suspirais Por dar a dor desafogo, Dizei-Ihe: que tanto fogo ‘Ao vento se acende mais. (Gregorio de Matos) ou, visualizando, — 7 7 7 servindo como ponto de referéncia a dltima sflaba acentuada e sendo o valor Pritico das silabas a ela excrescentes considerado sempre o mesmo. 10.2 Esse esquema pode ser modificado pela introdugdo de um verso de menor nimero de silabas (geralmente o Ultimo), provocando na estrofe, uma anticadéncia; a simettia é restaurada pela repetiggo do mesmo esquema em todas as estrofes: ‘Que nau cheia de gloria e d’esperangas, Floreada ao vento a ribida bandeira Na luz do incéndio rebentou bramindo Na vaga sobranceira? (Alvares de Azevedo) Teoria do Verso 155 Por que ao sol da manhd,e ao ar da noite Essa triste cangao, eterna, escura ‘Como um treno de sombra e de agonia Nos teus ldbios murm ‘cujo esquema, visualizado: 10 ——_— 10 _____- 10 —__6 10 10—___6 10.3 Os poetas praticaram também largamente as estrofes em que se combinam dois versos_ com desigual nimero de silabas (estrofes heterométricas), cujos efeitos percebidos sio de um contia ponto harménico de cadéncias sitébicas: a) seja alternando os versos desiguais (*): Nessas convulsas, dedithadas cordas Um eco inda ressoa; Das teus amplexos o calor, a vida ‘Ainda nelas coa, (Gongalves de Magalhies) ou: 10, 6. 10. 6 b) seja aos pares (*): Exprema a vil calinia muito embora Entre as mos denegridas, e insolentes, Os venenos das plantas, E das bravas serpentes. (Tomés Antonio Gonzaga) ou: 10. 10. 6. 6 ©) ou em seqiléncia inversa: tempo voa, as horas despedidas ‘Tao ligeiras decorrem Murcham tao breve e morrem Rosas que do prazer nfo sfo cothida + (Almeida Garrett) ou: 10, 6. 6, 10 (*) A ordem de inicio é indiferente, podendo comegar pelo maior ou pelo ‘menor. 156 Rogério E, Chociay 4) ou em variadas disposigdes, especialmente em quintetos, sextetos ¢ sttimas: 6/10/6/6/10, 10/6/10/6/10, 10/6/6/10/6, 6/10/6/10/10/10, {6/10/6/10/6/6, 6/10/6/10/6/10, 10/6/10/6/10/10, 6 /6/10/10/6/10, 10/10/6/6/10/10, 10/6/10/6/6/6/ 10, 10/6/61 10/ 10/6/10, 6/6/10) 10/10/6/10, ete, Todos esses esquemas e muitos outros, com versos maiores € menores, ‘so facilmente encontraveis, dispensando @ necessidade de continuarmos ‘exemplificando. 10.4 Vem acrescer-se a sildbica a cadéncia acentual, resultante da disposigao regular, verso a verso, de algumas ou todas as silabas fortes: a) podendo ser apenas parcial, como no esquema abaixo, extraido do exemplo (C) de 1.1.2: 10) 11 to} 1 io} 1 10} 11 eevee Bees Rane ou: 6 106 10 6 10 6 10 fem que se nota a obediéncia da estrofe nio apenas a um esquema de cadéncias sildbicas, mas também a um mesmo esquema de cadéncia dos accntos fundamentais; b) como pode configurar-se plena, por atingir a tot {conforme 0 exemplo (D), em 1.1.2): 12 B]4 sf6]7 8 [9] 10 1 2)3/4 s}6l7 8/9 10 1 2/3/4 s}6l7 8)9| 10 1 2|3}4 s{6}7 8{9} 10 6 69 em que a simetria silébico-acentual alcanga 0 mdximo de envolvéncia na estrofe. 10.5 Na estrofe heterométrica pode ser obtida uma harmonia acentual do contraponto silibico, bascada no acordo de silabas fortes de um e de outro verso, ou pelo menos, de sflabas fortes fundamentais (a tiltima do verso menor ¢ uma interna do maior). Parte do entendimento de verso quebrado dos antigos resulta justamente deste fato. Os manuais recomendavam que as estrofes heterométricas fossem feitas somente com 0 verso maior € seu * Teotiado Verso 157 respectivo quebrado, entendido este como um segmento incompleto do outro, ou mellior, como uma das partes te6ricas de que se formava 0 verso maior (0 sentido de quebrado nunca foi, portanto, pejorativo). Assim, para 0 decassilabo herdico (dominancia 6-10) a melhor alianga seria a0 hexassilabo (6), por isso entendido como herdico quebrado. Segundo tal entendimento, lum bom quebrado para 0 sdflco (4-8-10) 6 0 terrassflabo (4). A estrofe das chamadas odes sificas (calcadas visualmente no modelo grego), como se nota ‘no exemplo abaixo, Obrando sono dos meus lares foi-se Vigilia eterna meus sentidos cansam; Negras imagens, pensamentos tristes D’Alma se apossam. (Gongalres Magalhiies) baseia-se justamente na combinagdo de trés decassilabos séficos a um tetrassilabo. 10.6 Seguindo este principio de harmonizacdo acentual, facilmente se podem depreender quais seriam as combinages mais recomendiveis: Dodecassilabo (6-12) Dodecassilabo (4-8-12) Hendecassitabo (2-5-8-11) Hendecassflabo (1-3-5-7-9-11) Decassilabo heroico (6-10) Decassilabo safico (4-8-10) Eneassilabo (3-6-9) Eneassilabo (4.9) Octossilabo (4-8) Heptassflabo (7) x hexassilabo (6) x tetrassilabo (4), octossilabo (4-8) x pontassflabo (2-5) x pentassflabo (1-3-5) x hexassilabo (6) x tetrassilabo (4) x trissflabo (3), hexassfabo (3-6) x tetrassflabo (4) x tetrassflabo (4) x trissflabo (3) isto para falar de apenas algumas combinagdes, de cuja maioria seria excessive alinhar exemplos, tao faceis sto eles de encontrar. 10.7 Mas os poetas nem sempre se preocuparam demais com esse critério de harmoniza¢io acentual, cuidando as vezes de apenas manter a arrumagio sildbica ua esuiofe heterométrica: 158 Teoria do Verso ) como neste exemplar de uma das odes de Bocage: Sacrificaihe as firias, 46 As flrias que defesa ndo consentem; 26-10 Nunca, nunca as injirias 136 Do Tempo, ou Morte profané-la intentem. 24810 ) ou neste de Fagundes Varela: Quando & noitinha me falando a medo 4-810 Elevas-me do céu luz suprema, 268-10 Esquego-me do mundo e de mim mesmo, 26-10 Gero um poema, 14 em que se percebem as livres combinagdes de sificos ¢ herdicos quer com hexassilabos, quer com tetrassflabos. Em quintetos, sextetos e.sétimas heterométricas mais se patenteia este uso, o que nao se deve estranhar, pois os niimeros 4 ¢ 6 pertencem ao esquema fundamental de ambos os decassilabos (Sifico: 446, herdico: 6+4). 10.8 Os simbolistas, 4 cata de todos os matizes da musicalidade verbal, ¢ ja sem padecer da coagio dos preceitos, desrespeitaram intencionalmente estas idéias de parentesco por quebrados, conseguindo efeitos invulgares para a linha mel6dica da estrofe por promoverem as mais variadas combinagdes hheterométricas. Foi o que fez Alphonsus de Guimaraens, por exemplo, a) alternando octoss labos e heptassilabos: Dona Guiomar tombou de giolhos, 46-8 — Dobravam tédolos sinos — 24-7 E no horizonte dos seus olhos 48 Dois Anjos eantaram hinos, 257 b) ou nesta arrumagdo de eneassMlabos e decassilabos: Volvo 0 rosto para o teu afago, 379 Vendo 0 consolo dos teus olhates. .. 1479 Sé propicia para mim que trago s oles mortos de. chorar pesares. ‘A minha Alma, pobre ave que se assusta, 346-10 Veio encontrar 0 derradeiro asilo 48:10 No teu othar de Imperatriz augusta, 48:10 Cheio de mar ¢ de céu trangiiilo, 479 Rogério E.Chociay 159 ‘que se sucedem em variadas disposicdes pelas cinco estrofes restantes, numa linha melédica surpreendentemente harmonica. 10.9 E de dois o ntimero de versos usual nas estrofes heterométricas. Mas na evolugdo da estrofe na versificagéo em lingua portuguesa pode-se notar a tendéncia crescente de incorporar maior niimero a0 conjunto, especialmente durante ¢ apés 0 Romantismo, 4) como neste exemplar de Fagundes Varela: Tu és a aragem perdida, a) Na espessura do pomar, a Eu sou a folha caida M Que levas sobre as asas ao passar, (10) Ah! oa, voa, a sina cumprirei (10) Te seguirei. a) repetido por nove vezes a0 longo do poema; o paralelismo que ceracteriza no Poema 93 dois iltimos versos de todos os conjuntos toma-os a rigor uma espicie de refrdo, mas o importante ¢ notar o nimero e a variedade dos versos (sete, dez ¢ quatro silabas) que esto a denunciar uma tentativa de dar maior complexidade a estrofe; b) ou neste, bem mais complexo, tentado por Bilac, conjunto ou estrofe (2) cujo esquema se repete por dez vezes ao longo da composigio. Aqui se combinam seis versos de medida diferente: Quero um beijo sem fim, (6) Que dute a vida inteira e aplaque o meu desejo! (2) Ferve-me o Singue.-Acalma-o com teu beijo! (10) Beija-me assim! @) 0 owvido fecha a0 rumor 7) Do mundo, ¢ beijame, querida! @) Vive s6 para mim, s6 para a minha vida, (12) $6 para o meu amor! © ‘Note-se que os versos sio “livres” na estrofe, mas sujeitos a uma seqiiéncia que se repete sempre a mesma em todas as estrofes. 10.10 A estes poderiam ser somados muitos outros exemplos em que se observa a tentativa de incorporar maior nimero de versos & estrofe, buscando tomar mais complexa a sua linha melédica, para nfo falar nos versos livres tradicionais, arrumag@es a-estrficas que procuravam diversficar 0 niimero de versos em sua seqiléncia, mas obedientes ainda aos ditames da versificagio. De 160 Rogtrio E. Chociay qualquer modo, ou porque a estrofe, como tal, no admite variagio superior a dois ou tés versos, ou porque combinagdes desta ordem tornam-se extremamente complicadas, quando nfo virtuosisticas, tais intentos frustraramse, sendo praticamente obnubilados pela superveniéncia avassaladora do verso livre moderno, que nfo obedece aos padrées ionais de medidas e cadéncias e, as vezes, renuncia deliberadamente & propria musicalidade, 11. Dinamica da estrofe I1.1 Pelo que afirmamos no primeiro capitulo desta parte, pode-se depreender a armadura bésica da estrofe, cujos pontos de apoio essenciais setiam: 4) intensidade mais forte-localizada na iltima silaba tonica de cada verso; ) pausas delimitadoras: entre versos na estrofe; entre o dltimo verso de uma estrofe e o primeiro da seguinte. Estes dois apotos, aliados a0 isonsilablamo dos versos, quando menoe, implicam o surgimento de uma cadéncia silébica perfeitamente perceptivel a ‘uma simples leitura. Se a isso for acrescida uma ordenagdo parcial ou global das sflabas acentuadas em cada um dos versos, 0 organismo estrdfico é beneficiado pelo surgimento de uma cadéncia acentual, Essa roupagem pode ser ainda enriquecida pela reiteracio dos segmentos terminais dos versos, Percebida como cadéncia fonica. A triplice sustentago cadencial da estrofe opie-se radicalmente, como perfodo versificado, ao perfodo prosaico, em que Para os mesmos aspectos se verificam usualmente anticadéncias. Todavia, 0 Perfodo versificado guarda ainda freqiente obediéncia aos balizamentos sintéticos do perfodo prosaico, fazendo coincidir fi com finais de oragio ¢ perfodo. Mas essa vinculagio.é percebida apenas 4 custa de reflexdes tebricas, porque na pratica a estrofe & sentida como uma Seqléncia autOnoma de linhas mel6dicas — os versos — que caminham sempre para uma intensidade mais forte ¢ para pausas espectficas. A percepeio deste arranjo melédico no ¢, necessariamente, acompanhada do sentimento da estrutura sintdtica equivalente, vale dizer, sentem-se os finais de versus ¢ de 162 Rogério , Chowiay estrofes como finais de versos e de estrofes, € no como finais de oragdes e perioxlos. E a prova da veracidade destas, aparentemente simpl6rias tefloxdes surge nos efeitos de enjambement ou encadeamento interversais ou interestroficos, largamente praticados pelos poetas, como no exemplo tréscitado (G). 11.2 Em que consiste o enjambement ou encaleamento ou encavalgamento ©u cavalgamento ou debordamento ou embebimento ou transportagio ou enlace? Essa seqiiéncia sinonimica irritante parece denunciar a vacilagio dos teéricos quanto a0 entendimento do fato. Um dos maiores erros de Perspectiva, alids, tem sido o de estudé-lo no campo especifico do verso, quando, na verdade, seus efeitos o situam.no Ambito da estrofe, Rafael de Balbin (1) a0 falar do encavalgamento, parte do principio segundo o qual a estrofe habitualmente representa um todo “ritmico” intimamente entrosado um todo “semiantico”, de modo que, 20 completar-se “ritmicamente”, ela o faz também semanticamente. Conforme esse enfoque, o final da estrofe, representando o limite de uma unidade “ritmico-seméntica”, caracterizar se-4 Uusualmente pela presenga de uma pausa longa, que corresponde a final de periodo acabado e completo. J4 0 finais de versos possuem pausa semilonga, Correspondente a final de sentenca. Assim, ax pausas estrdficas ¢ vérsicas manteriam perfeita coincidéncia com as previstas pela sintaxe. Segundo o tmesmo autor e, além dele, Jean Cohen (2), durante o Classicismo houve um safoiye razotvel no sentido de se nfo romper x colncidéncia das pauses ritmica e sintética em finais de versos e de estrofes, 0 que ndo impediu que vez por outra o fato se verificasse. Daf para a frente, todavia, passou a registrar-se cada vez em maior indice a ruptura intencional a essa convergéncia, com 0s versos — e mesmo as estrofes — terminando por palavras «aps as quais a sintaxe nao previa pausa alguma. Eis um exemplo moderno: (A) Quanta gente que zomba do desgosto mudo, da angistia que nfo molha o rosto. de Guilherme de Almeida, em que no final ¢o primeiro verso aparece 0 substantivo desgosto; no inicio do segundo o adjetivo correspondente mudo; ora, a sintaxe nfo abona pausa entre o substantive e 0 seu adjetivo; separando-se os dois, verso a verso, isso implica em verdadeiro desequilibrio: 08 vorsos separam o que deveria estar unido. Tal desequilfbrio tem sido levado As vezes as Ultimas conseqiléncias, quando o final de verso, em vez de ferir a tunidade intervocabular, rompe o proprio liame natural entre as sflabas de uma 7 (1) BALBIN, Rafael de ~ Sistema de Ritmica Cestelane, Gredos, Madrid, 1968, seg. ed, pp. 202-218, (2) COHEN, Jean ~ Esmveture del Lenguae Posto, Versién Expafola de Mastin Blanco Alvarez, Gredos, Madrid, 1970, pp.5 1-103. TeoriadoVeno 163 Palavra (e, no caso do exemplo : baixo, coincidentemente, separando os seus morfemas), (B) ‘Sao nuvens de oxigénio Teus vestidos? Sao de vidro? Ou sio vapores de hidro- Génio?” (Martins Fontes) , mais, 0 liame entre 1s fonemas de uma sflaba: (©) Que reporteres sto esses entrevistando um siléncio? O Corio, Globo, Estado, Manchete, France-Presse, tele cotografando o invisivel? (Carlos Drummond de Andrade) 11.3 Mas o problema capital do encadeamento esti no seu resultado em termos de leitura ou declamagdo. Podemos equacionélo a partir das bases ‘expostes em 2.1: que acontece & inte a8? Quanto & intensldade, o parscer dos tebrleos # mals ou menos words. © verto exige intensidade forte na sua ultima silaba acentuada ¢ 0 encadeamento raticamente no a altera. A opiniao de J. Mattoso Camara Jr., a esse respeito, ¢ importante: “Em poesia, esse feito ressalta _imperativamente, impondo-se leitura, quando o grupo fonético é cindido pela terminagdo do verso; assim, 0 enjambement (ou encadeamento, se preferirmos a traduco, adotada por exemplo por A. Soares Amora) ¢ um proceiso de que dispde 0 poeta para fazer sentir, mesmo na pigina escrita, o propésito de uma intensidade de cardter estlistico../ Raimundo Correia ilustra bem 0 enjambement a servigo doma finalidade expressive em dois versos que aqui colhem a esmo. / Num deles ressalta emotivamente reposigfo para, cuja primeira silaba se faz tOnica, recebendo 0 icto métrico de silaba final de verso, e com um Ja] ‘nico e aberto passa até a rimar com 0 qualificativo clara enunciado antes: “Para / dos deuses estudar a lingua. 164 Rogério E. Chociay No outro © quilificativo infinda no intetior de um sintagma, onde normalmente ficaria subtdnico, concentra a emogio em virtude da intensidade plena, também nitidamente imposta pela posigSo final no verso: {te em toda a curva infinda / » O problema que origina maior nimero de discussdes, entretanto, € 0 da manutengdo ou ndo da pausa vétsica. A esse t‘tulo, Jean Cohen, falando da versificagio francesa, embora nfo ignore as opinides opostas, afirma a manutengio da pausa (2). Maurice Grammont, igualmente, ¢ a tal respeito taxstive: “Ce mest pas que l'enjambement, comme certains l'ont dit, supprime la pause de la fin du vers, ni qu'il supprime ou méme affaiblisse le dernier accent rythmique du vers; loin de 13 ta pause finale du vers qui enjambe est aussi nette et aussi longue que celle des autres, et son dernier accent tythmique est aussi fort.” (3) Rafael de Balbin (4), estudando o encadeamento na versificagio espanhola, mantém o entendimento acima apontado, aceitando a manutenga0 da pausa apesar do rompimento do liame sintético: “La pausa ritmica castellana se conserva idéntica en su duracién y amplitud — como lo ‘comprueba la ausencia de sinalefa (§ $1) — al producirse el encabalgamiento”. Mas, observa que, na declamagdo, os seus efeitos nao se igualam absolutamente aos dos versos de pausas coincidentes: © encadeamento produz “efecto acistico desusado y estrafio, que tiene immediato influjo impsesivo en la atencién del oyente”. Em exemplares que analisa com minticia, observa a ocorréncia, em maior ou menor grau, de variagdes intensivas e de entoagio nos dois voedbulos “encavalgantes", cujo efeito é, afinal, o realce expressivo de ambos. Ademais, um outro matiz, de ordem pausal, surge freqiientemente no verso “encavalgado", em exemplos como “Tudo passou! Mas dessas arcarias Negras, e desses torredes medonhios,” (Raimundo Correia) em que 2 pausa sintética, que deveria estar localizada no final do verso anterior, ocorre com atraso de dois tempos (silabas) no seguinte, dividindo-o () CAMARA JR. J. Mattoso - Contribuicio 4 Estlietca Portuguesa, SimBes, Rio, 1953, p. 50, (2) Op.cit,,p. 59, (3) Op.cit:p, 109, (4) Op.cit., pp. 202-218 Teoria do Verso 165 em dois membros melédicos (2+8) e, com o realce intensive € tonal do Primeiro membro (vocdbulo “encavalgado”), atribuindo ao verso um andamento peculiar, diferente do de outros versos de esquema intensivo idéntico (1-4-8-10). 11.4 Parece-nos que as informacdes sumariadas, ¢ muitas outras que Poderfamos continuar alinhando, so suficientes para demoustiar a autonomia da organizagio estrOfica em relaglo A sintaxe. O encadeamento, longe de destruir a relagdo sintética entre as palavras e mesmo o seu significado, ¢ um recurso que acaba ob tendo maior riqueza e complexidade de apoios ritmicos aos versos ¢ as estrofes, além de ser fator de realce expressivo. Fioames, todavia, algo intrigados quanto ao aspooto da duraglo @ realizagho oneretas da pausa nos versos encadeados. E a duvida no é apenas nossa: “A pausa_métrica coincide comumente com uma pausa espiratéria, inconclusa ou conclusa, intrinseca a frase enunciada. Quando no hd essa coincidéncia, tem-se um efeito ritmico especial, o encadeamento ou debordamento, mais conhecido pelo nome francés de enjambement: a pausa métrica se reduz a uma répida tomada de impulso para a passagem ao verso seguinte.” (1) Em que consistiria essa “répida tomada de impulso? " Seria uma pausa radicalmente diminuida em sua duracdo? Ou, mantendo-se a pausa integral, ocorteria apenas a impressio psicolégica da quebra de um lime sintético? J4 que temos de optar, embora consideremos tal fato ainda em discussio nos estudos de teoria do verso, nfo receamos rejeitar a pura supressdo da pausa intervetsal no encadeamento; primeiro, porque a pausa é, reconhecidamente, um dos apoios essenciais da organizagio estrdfica; segundo, porque os encadeamentos, em sua maioria, retiram efeitos expressivos justamente da quebra de liames sintaticos: se na leitura ou declamagao é a sintaxe obedecida, tais efeitos simplesmente néo se realizam. Nessa perspectiva, seja mantida integralmente, seja diminufda em sua duragdo usual (variagdes que devem realmente ocorrer conforme a natureza dos liames rompidos), parece-nos que 4 pausa de um modo ou de outro se mantém. Os exemplares de encadeamento que temos analisado ¢, também, a sua regular utilizacio por muitos poetas, autorizam-nos a afirmar que tal expediente no é, em nossa versificacio, um fato excepcional, desprezivel, nem tampouco desobediéncia dos poctas a tegra técnica, mas um dos possiveis ingredientes da receita da estrofe, que a pode valorizar sobremancira. Aqui podemos retomar os exemplos apontados anteriormente, nfo mais vistos; como perturbadores de uma ordem rigida ¢ (1) CAMARA JR., J. Mattoso — Dicionério de Filoloria e Gramédtica, 2 edigdo, J. Ozon-Editor, Rio, 1964, p. 349, Tos Rogério F. Chociay pré-estabelecida, mas altamente expressivos, por isso que legitimos. A par da quebra da monotonia, pela reordenagio de alguns apoios da estrofe e dos versos, verificdvel facilmente, notem-se: em A o realce expressive que a separagdo em fim de verso confere a0 vocdbulo desespero e, mais, que 0 insulamento entre dus pausas dé ao vocdbulo mudo, Em B, que parte uma palavra verso a verso, 0 destaque intensivo do elemento hidro- permitethe ima perfeita com vidro, e 0 elemento -génio, & custa da fragmentagdo, funciona ambiguo, participando do significado de hidrogénio e, simultaneamente, suscitando as conotagdes da palavra génio, Em C, de diverso entendimento, a ruptura do liame fonético de uma silaba libera um f da vogal que deveria estar vinculado e, de certo modo, alonge-o, permitindodhe trazer a0 vocébulo telefotografando a dose de sugestio visual e fonica de que normalmente néo seria capaz. 11.5 0 estudo do encadeamento, infelizmente apenas sumariado, que parece ternos desviado do assunto, foi ai colocado de propésito, como sustentagao de nosso atual modo de ver a estrutura estr6fica. Se fomos bem entendidos, a estrofe, tal como a descrevemos em 8.1 ¢ s., ndo é destruida sendo enriquecida pelos efeitos de encadeamento. Mantémse praticamente inalterada a intensidade plena, caracteristica de final de verso; quanto & pausa, mesmo que reduzida em sua duragio, tal fato serd ainda suficiente para continuar sustentando a armadura da estrofe. Também a entoagdo pode padecer variagGes minimas, sem que se fira 0 conteddo. Longe disso, todas estas oscilages so fatores de tealce ritmico-expressivo dos versos ¢ das estrofes, através dos vocdbulos ou elementos separados verso a verso. Nao se destrdi a armadura cadencial da estrofe, embora ela, & custa de mais ou menos efeitos de encadeamento, possa atingir variadissimas contexturas, caracterizadas pela quebra da monotonia que a obedigncia a padres rigidos acarrets, Estas observagées apontam um campo de pesquisa nem sempre trilhado: cem quadras, por exemplo, totalmente idénticas pelo esquema intensivo dos versos, poderdo representar, por virtude do jogo de pausas e outros efeitos trazidos pelo encadeamento, cem realizagdes diversamente ricas_¢ diversamente legitimas sobre uma base comum. De tudo que se disse nfo custa reiterar a esséncia: a estrofe repousa sobre um sistema de cadéncias, Sixas mus nde régldas, quo the permite aproveltar ox recureas tftimicos © expressivos do perfodo ¢, além, desenvolver as potencialidades nele latentes, mas de modo préprio, acabando por instituir-se como unidade auténoma de expresso poética, e como tal dependente de seus proprios principios ¢ leis. 12.0 andamento fonico e seus processos 12.1 Antes de iniciarmos o estudo da rima interversal (1), responsével pela cadéncia fonica na estrofe, convém ressaltar que ela é apenas uma realizagao sistemdtica aproveitada de um campo muito vasto em possibilidades: o dos rocessos de harmonizagdo féniea. Nos vertos, excluido o arranjo numérico de sflabas, acentos ¢ pausss, resta ainda enorme potencialidade quanto a0 aproveltamento da matéria fOnica constituliva das sflabas, que se pole conformar através de toda ordem de reiteragbes e contrastes, cujos efeitos, quando menos constituem um fundo orquestral com grande dose de responsabilidade na configuraglo global do ritmo do poema: tal o que, nesta obra, convencionamos chamar de andamento fénico, que no surge em nosso verso de _modo sistemitico, como 0 andamento intensivo, embora posse atingir arranjos bastante harménicos e de singular forga sugestiva. Inserida no ‘mesmo contexto, embora a0 nivel da estrofe, a cadéncia fonica obtida pela rima interversal representa apenas uma parcela, cujo destaque maior surge em fungio de seu realizar-so sistemstico, quantitative, ¢ ndo por yirtudes necessarlamente qualitativas. Ao contrdrlo, ax qualidades malormente enriquecedoras residem nos aproveitamentos livres da combinatéria da ‘matéria fonica no corpo dos versos. (1) © termo rima temi sido utilzado para designar néo somente a reiteragio de Segmentos f6nicos terminais, verso a verso, como também variada gama de procesios ¢ reiterago fonica ou homofonias no interoe dos versos, Nao estamos inteewsadon, neste momento ¢ nesta obra, em deslinda tals atos histéricos, como também nfo Bretendemos ir contra a trdigio Por iso servmo-nos do 6tulogenstico "procesot de harmonizagio fOnica™ e, no caso da espécic de rima empregada sistematlcamente ‘em nossa versificagdo, empregamos 0 adjetivo interversal, 168 Rogério E. Chociay 12.2 Comecemos pelo mais simples processo, a reiteragdo vocilica no inhamento de palavras préximas. Ela pode-e limitar as vogais fortes, como atingir simultaneamente fortes e fracas: carada” (Alphonsus de Guimaraens) a aaa “O vento ulula, trémulo de susto" (Alphonsus de Guimaraens) uowu uuouu “Fazia frio € 0 frio que fazia"* (Augusto dos Anjos) ii i i 12.3 Seguesse a reiteragdo diplice ou multipla de consoantes no alinhamento de palavras préximas: “O.mar todo com fogo e ferro ferve” (Camées, Lus.) fof f “E 20,nufo ruidoso de rouco tambor” (Fagundes Varela) rr r r “Caia na cova que est cavando” (Alphonsus de Guimaraens) kok kk “*Seguem suaves, silentes, vio sonhando” (Alphonsus de Guimaraens) Sees Tene aaa! “Um eéu turvado, cheio de chuvas” (Alphonsus de Guimaraens) ch ch ““Brancas bacantes bébedas o beijam!” (Augusto dos Anjos) bb bb Ob 12.4 Os efeitos combinados de reiteragdo vocdlica e consonintica, surgindo livremente nos versos, geram as mais variadas homofonias: “Pisando espinhos no letal letargo” (Alphonsus de Guimaraens) pi pi leté Leta Teoria do Verso 169 “Os teus olhares crepusculares” (Alphonsus de Guimaraens) ares ares “Passam dentro do templo érias imagin: 3" (Alphonsus de Guimaraens) “E que flocos de neve mais leve"" (Alphonsus de Guimaraens) “A durea estrela que, licida, lucila” (Alphonsus de Guimaraens) canta apés dentre a pupila” (Cruz ¢ Sousa) “Na Linguida, na morna morbideza” (Cruz e Sousa) na nna mor na mor 12.5 Mas a harmonia que pode surgir do aproveitamento da matéria fénica no se deve apenas a0 que aparece com maior evidéncia a um primeito e desavisado contato com o texto. Muitos versos nos apresentam toda uma rede de harmonizagdes fonicas subjacentes, ’s vezes fundada no parentesco de um 86 taco articulatério. As reiteragdes so, portanto, parciais, mas os efeitos se tornam bastante peculiares pelo contraste entre os tragos nfo reiterados: 12.5.1. Reiteragdo de todos menos o trago da sonoridade: “Num cortejo de canticos alados” (Cruz e Sousa) td t d ile” (Alphonsus de Guimaraens) t ite de nés, em frente, td t 12.5.2 Reiteragdo de apenas um trago necessfrio numa série de onsoantes: “Vendo-me beira de um abismo: “Espera” (Alphonsus de Guimaraens) vom} bmp 12.5.3 O parentesco pode ser ainda mais ténue: e otk pkd p “Cintila e canta apés dentre a pupila” (Cruz e Sousa) t ktpdt pp 170—_Rogério E. Chociay “Rolos de incensos alvadios, finos” (Cruz ¢ Sousa) rls’ sss v sf s em que, sob uma rede de consonancias iguais ou homorgénicas, se esconde um vinculo mais sutil — oclusivo ou constritivo ~ que lhes serve de base comum., 12.5.4 Nao devemos olvidar, & claro, que os versos comportam a simultaneidade dos processos trés estudados, que surgem 2s vezes combinados ‘com surpreendente regularidade ¢ grande forga sugestiva: “E fria, fluente, frouxa claridade” (Cruz e Sousa) cma f rod rods “Lembra os trovdes, que tétricos estrugem” (Cruz e Sousa) b vk Kk t tt t ror r 1 “‘Batem pausadamente as patas compassadas” (Olavo Bilac) bop om P P t dot ot 4 aoaaa aaa aaa “Benigna égua, magnnima e magnifica” (Augusto dos Anjos) b m nm 8B 8 ek nn an A iaaa oa dia aiia “Babujada por baixos beigos brutos” (Augusto dos Anjos) bb pb b b auaau au éu uu Teorin do Verso 171 12.6 Os efeitos das consonancias repousam, ainda, noutros matizes articulatérios. E 0 que nos informa Oswaldino Marques, num pequeno mas excelente ensaio (1), em que estabelece dois grupos de consoantes ligadas por ‘um parentesco quando menos serial pela articulagzo: p-—-f 2) grupo domé: m b---v do sé: ane b) grupo dosé: reo Com essas fSrmulas, por ele explicadas e bem justificadas, podemos ainda mais perceber a rica tessitura consonantica de certos versos, estabelecida desde uma linha de tragos minimos, quase imperceptiveis, avangando para camadas superiores de articulagdes cada vez mais evidentes pela reiteragdo Progressiva de maior nimero de tragos, até & reiteragio total: é febris de agua, fervendo” (Augusto dos Anjos) fb fv “Perfurava-me o peito aspera pua” (Augusto dos Anjos) pf vm pp p “Junto aos nobres, seguindo os olhos das condessas” (Alphonsus de Guimaraens) j soos zihs s oss Mas essa orquestrago nfo se baseia unicamente em trago de parentesco entre consoantes seqilentes no alinhamento, Séries reiterativas diversas podem submeter-se a ordenagdo simétrica. Oswaldino Marques delineia, com base em Kenneth Burke, algumas marrizes esinuturais surgidas da’ ordenagio ¢ reordenagio de consonincias no alinhamento de vocdbulos proximgs, a seu ver responséveis em grande parte pela harmonia do verso moderno. Citaremos apenas algumas, com exemplos que nés mesmos coligimos em Alphonsus de Guimaraens, remetendo os interessados em maior proveito 4 leitura do trabalho original: 12.6.1 Amplificagdo: verifica-se quando “ocorrem, em_justaposiggo, duas consondncias e se repetem elas depois, porém jd distanciadas entre si por um intervalo vocilico ou mesmo silabico, como o br em “braseiro” € na palavra “buril”: (1) MARQUES, Oswaldino ~ Alatrizes Estruturais do Verto Moderna. in ““Ensaios Escolhidos", Civilizagdo, 1968, pp. 29-36. 172 Rogério F, Chociay “Debrugados a beira das estradas” br bar ““Semeias preces para as Pecadoras” Poop pee 12.6.2 Diminuicdo: exatamente o inverso da amplificagao: “Sigo formosa ¢ fria entre outros lit fr fr “Olha-me, pois, Amor! A sepultura é estreita” trot 12.6.3 Quiasma: Arranjo “em que os fonemas extremos e 0s medianos . do iguais entre si, par a par, ou seja, do tipo a-b-b-a"": “Nao sei que vento mau turvou de todo o lago” : “consonincias dispostas de uma certa forma se teproduzem no mesmo verso, reordenadas, porém, de um modo diferente. Niz-se, ento, que o novo grupo é um acréstico do primeiro, ou que se verificou uma ordenagdo em acréstico”: "0 beijo etéreo e trigico de Hamleto™ try tern” “Escuto em trevas uma vor 1 teva mvamtr 12.6.5 Feo ow ressondncia: “reagrupamento de consonancias com tepetigao da Ultima ou das diltimas” “A noite, como a capa de um pedinte”” tkm kpd pd 12.7 Para encerrar, observemos que todos esses arranjos do andamento fSnico dos versos niv surgem av acaso, nem siv produto de tecnticismo esteril, Teoria do Verso 173 Haverd sempre uma motivagio intrinseca na sua génese; e, mesmo aqueles que, como a rima, a0 arvorarem-se em receita sistemdtica parecem carreat para si pobreza expressiva extrema, poderio apresentar intertelagdes com 0 “ritmo” e expressio do poema e do poeta. A esse titulo, 0 “fundo orquestral” a que nos vimos referindo durante esta parte, jamais estar desvinculado, como apéndice initil ou mero adoro, mas firmemente integrado como parte indissolivel a expressio poética. Um pensamento feliz de Mikel Duftenne (1) parece-nos vir bastante a propdsito, por representar a maxima norma a que deve obedecer o analista do poema: “A harmonia nao esté unicamente na linguagem; ela estd entre a palavra ¢ a idéia.” (2) (Q) DUFRENNE, Mikel ~ 0 Poético, wad. de Luiz Arthur Nunes © Reasylvia Kroctf de Souza, Ed. Globo, P. Algre, 1969, p.76. Q) O grifo é nosso. 13, A cadéncia fénica: rima. 13.1 Depois da visio genérica do campo de harmonizagao fonica dos versos, iniciemos 0 estudo da rima interversal (1), responsdvel pela cadéncia fonica na estrofe. Pensando apenas em scus aspectos permanentes e deixando de lado as diversas roupagens de que se tenha revestido nesta ou naquela época, procuremos esbogar suas caracteristicas: 4) a rima é um processo de reiteragao fonica que ocorre geralmente, a partir da dtima vogal forte de cada verso; ») reiteragio total (abrangendo todos os fonemas do segmento) ou parcial (abrangendo alguns fonemas); ) realizase na estrofe entre 0 final de um verso e o final do seguinte; ou entre versos alternados; ou entre versos mais afastados; )sendo proceso reiterativo, supde pelo menos dois segmentos (portanto, dois versos), mas uma nica ordem rimica pode atingir trés ou mais versos seguidos ou no: ©) pode completar-se também por enlace entre um verso € outro de estrofes seguidas. Somados estes pontos, sintetizemos: a rima_€ um proceso intra-e-interestrOfico de teiteragio total ou parcial, que se realiza, sistematicamente, a partir da ultima vogal forte de dols ou mais versos, >. Esta regularidade € percebida como cadéncia fonica, que vem completar a triplice sustentagdo dos tipos mais usuais de estrofes, predominantes em muitas épocas de nossa versificago. (D) Sempre, portanto, que falarmos em rima, estareinos remetendo 3 que se realiza cote versos produz eadénela fGnica na estrofe, Teoria do Verso 175 13.2 As classificagdes que apresentaremos, acusadas por nds antecipadamente de pobres, buscam, pelo menos, facultar ao iniciante rétujos que descrevem com rigor ¢ economia terminoldgica os aspectos, a nosso ver, mais relevantes do proceso rimico. A riqueza de realizagées partivulares da rima ocasionou Sempre as fraquezas, quando ndo exageros abusivos, da maior parte das tentativas classiicatorias. Para o interessado em comprovar esta assertiva, recomendamos a leitura do melhor trabalho que até hoje lemos sobre o assunto, em lingua portuguesa, feito pelo professor Mello Nobrega (1), em que se tomard conhecimento da complexidade a que atingiram os poetas de todas as épocas no emprego da rima. Somente lendo obra de tal quilate é que se compreende 0 quanto falta para a elaboragéo de uma teoria definitiva acerca do problema. 13.3 Interessa-nos, por ora, equacionar 0 processo nimico conforme: a) sua ocorréncia numérica na estrofe e no poems; ) oesquema acentual dos segmentos rimantes; ©) o.indice de reiteracdo dos fonemas nos segmentos; 4) 0 esquema posicional da rima ¢ das rimas na estrofe ou entre estrofes. 13.4 Podemos estimar o nimero de rimas que ocorre na estrofe ou no poema, sem esquecer, claro, que enquanto houver reiteragZo de um mesmo segmento haverd uma s6 rima. Tomando por base a estrofe, verificamos: a) auséncia de rima, que caracteriza os chamados versos brancos ou soltos; b)monorrima: reiteraggo dupla ou miltipla de um mesmo segmento fonico; ©) dirrima: reiteragfo de dois segmentos diferentes; 4) trirrima: ceiteragio de trés segmentos; ©) polirrima: reiteragdo de quatro ou mais segmentos. ‘Tudo depende das possibilidades da estrofe segundo o niimero de vers0s. que a integra. Um distico, por exemplo, comporta no maximo a monorrima (AA, BB, CC, etc.) ou nem isto, nos casos em que a rima se completa por enlace interestréfico (AB, AB; ou AB, AB, BC, BC, CD, CD, etc.). Um terceto 6 pode set igualmente monorrimico (AAA, ou AAB, ou ABA, ou ABB); um de seus versos pode completar rima com a estrofe seguinte (ABA/BCB/CDC, etc.) ou todas as rimas completarem-se interestroficamente (ABC/ABC, ou ABC/CBA, ou ABC/BCA, etc,). A quadra comporta a monorrima (AMAA, ou ABAC, ou ABCB) e'a dirrima (ABAB, ou ABBA, ou ABB). E assim por diante, aumentando as possibilidades posicionais ¢ numéricas na proporedo do aumento dos versos. 1) NOBREGA, Mello ~ Rima e Poesia, LN.L., Rio, 1965, 176 Rogtrio E. Chociay 13.5 E tradicional a classificagdo das rimas segundo 0 esquema acentual dos segmentos rimantes: 8) aguda (ou masculina): entre segmentos ox{tonos; b) grave (ou feminina): entre segmentos paroxiton ©) esdnizxula: entre segmentos proparoxitonos. Duas estrofes dirrimicas de Raimundo Correia servem de exemplo: Um mavioso harpejo De eftara ideal, onde: A_A= rima grave; De luz solar um beijo Em prisma de cristal,_ Geram-te — rosa splice! Que amor e que inogénci Formam-te 0 ser! & diiplice BB ima aguda; onde: CC = rima esdrixula; D.D> ima grave. voce e> & > Diiplice a tua esséncia! 13.5.1 Ressaltemos um aspecto interessante quanto 20 esquema acentual dos segmentos terminais de versos brancos. Na lingua portuguesa ecorre um predominio macigo de palavras graves; em menor {ndice de ocorréncia seguem-se as agudas; as esdnixilas constituem escassa minoria, donde as dificuldades de obter neste dltimo caso rimas totais. Apesar disto, os Poetas nfo evitaram seu uso, empregando finais esdraxulos sem se preocupar com a reitera¢do total dos fonemas dos segmentos. Os efeitos obtidos com tepetigao de finais desse esquema acentual nem sempre se devem, pois, a uma que outra reiteragdo esporddica, mas ao proprio esquema esdriixulo que, rar0 no idioma, contrasta razoavelmente com versos regularmente rimados, graves ou agudos, como nesta estrofe de Raimundo Correia, Sou orgulhoso! mas se passas, férvido aL—— Meu Iibio o rastro dos teus pésnio beija? = sw L. E ndo me prostro como a planta siplice aL—— Prostra-se a0 vento que a passar pragueja? §—B -/- —— Teoriado Vero 177 ‘ou nesta estrofe de uma ode de Bocage: Canora Musa do culto Pindaro, aL Que remontavas seu estro férvido A ¢ -—— Sobre as purpireas asas B ae De almos, fogosos éxtases: AL—— ou nesta, de F.F. Barreto: Oh prole misera Do triste Addo! LA surge a tétrica Serpente audaz: 13.5.2 Outro fato a notar, ainda em relagdo ao esquema acentual, é 0 ‘que diz respeito a0 constituir-se a rima: a) de segmentos inteirigos (palavra ou final de palavra); b) de segmentos justapostos (de palavras, particulas ou segmentos de palavras e particulas). © emprego comum da rima incide macigamente no primeiro caso. Um dos acabados exemplos em que se combinam os dois casos ocorre na “Berceuse“ das Rimas Riquissimas, de Guilherme de Almeida: Durma! A noite suave e grande anda com passos de Ia de war, de penugem de nuver. . Durma! Em seu corpo alvo e nu vem rogar as asas um ar de Jardins distantes. .. tarde. Durma a sombra dos meus olhos como de uma drvore, e mothe os seus sonhos nas minhas légrimas, no esperando um milagre, mas sentindo que o mal ¢ 0 bem so uma tinica e mesma béngd Durma! E que a minha voz seja ‘uma voz que 86 vocé jé ouviu em sonhos: a voz que a Adormecida no Bosque nunca escutou no seu sono. . este siléncio que vence 0 meu corpo e brotou do seu corpo e que 0 envolve todo. 178 Rogério L. Chociay ‘A manutengio do esquema heptassilébico, bem como a realizagio integral da maior parte destas rimas s6 se poderdo concretizar a custa de deslocamentos intensivos ¢ enlaces violentos verso a verso. Se, de um lado, se pode acusar 0 texto de ruptura da sintaxe e prosédia, no se Ihe poderd negar, por outro, a consecugdo de requintados matizes. Certo ou errado, exagero ou preciosismo, © fato ¢ que exemplos que tais existem muitos em parnasianos ¢ pés:pamasianos, requerendo, mais do que opinides circunstanciais, estudos de {olego e base para uma conclusdo definitiva. 14.0, indice de reiteracao fonica na rima 14.1 Considerando © indice de reiteragdo dos fonemas, partimos das indagagdes: a rima atinge todos os fonemas? a partit donde? ou apenas alguns? de que qualidade? s critérios de que nos valemos para respondé-las tomario, portanto, & seguinte base: 4) a qualidade dos fonemas reiterados: s6 vogais; sé consoantes; vogais € consoantes; b) a quantidade de fonemas reiterados: reiteram-se todos, da mesma ‘qualidade ou de qualidades diversas; reiteram-se apenas alguns, ©) intencion: do emprego: quer fazendo parte da organizagfo estr6fica como um de seus apoios, ou mesmo ocorrendo com maior liberdade, a rima é proceso consciente: reiteragdes esporddicas, a ela semelhantes, sfo quase sempre obra do acaso. 14.1.1 Um outro alerta devemos fazer quanto 20 nosso equacionamento: falamos de rima e rimas, isto é, da rima considerada na sua individualidade — reiterago diplice ou miltipla de um mesmo segmento — ou das rimas consideradas nas relages entre si. Numa quadra, por exemplo, as duas ordens de rima podem ser alofonicas entre si; mas sabemos pela pritica ue freqilentes vezes 0 fendmeno rimico sai da individualidade para obter efeitos mais complexos através da combinagdo ou identidade de fonemas rima a rima, Estudaremos ambos os casos. 14.1.2 Uma palavra ainda sobre os versos brancos ou soltos, assim designados pela auséncia de rima. As reiteragbes esporidicas que possam surgit ~ € realmente aparecem, pois é mais facil rimar absolutamente do que absolutamente nao rimar — devem ser consideradas produto aleatdrio, 180 Rogério E, Chociay “14.1.3 Esbocemos um esquema pritico para o estudo da rima (interversal) considerada na sua individualidade: 1) Toante Rima interversal Badri J completa incompleta 2) Soante dampliada {diminuta imetatética Este quadro ¢, evidentemente, incompleto e se prende aos tipos que julgamos importantes para ser estudados em seguida. 14.2 A tima foante consite na reiteragio das vogais a partir da iltima forte dos versos. Na maior parte dos casos, todas as vogais dos segmentos so reiteradas. Quando se diz todas, pense no esquema predominante — agudo, grave, esdrixulo — e 0 odas af se transforma, relativamente, em uma, duas ou tres vogas. ‘Umas que se asfixiam por debaixo do pé. 6 ‘outras despercebidas ‘em meio a grandes n6s; (Jodo Cabral de Melo Neto) Que dissera eu, se vos vira A beleza dessa cara, aa Dot coragdes doce enlelo, Suave encanto das almas. aa (Gregorio de Matos) Foi assim que Teresa de Jesus amou. . . Molha em teu pranto de aurora as minhas mos pélidas. Oespasmo é como um éxtase religioso. a Eo teu amor tem o sabor das tuas igrimas. .. (Manuel Bandeira) 14.2.1 A raridade do material esdrixulo pode limitar a reiteragio a apenas duas vogais, preferentemente a forte e a ultima: Dou cambalhota, fago gesto obsceno ede cartola e fraque como um mégica = &_o imobilizo 0 olhiar vesgo das gentes. Teoria do Verso 181 Engulo fogo que ninguém discute e segurando as pontas de um vocdbulg 4_o. domo panteras numa jaula inatil. (Gilberto Mendonga Teles) € essa mesma ratidade dos esdrixulos € que permite a rima toante entre segmento grave + segmento esdrixulo, geralmente sendo reiteradas a forte e a vogal final: As Décimas ¢ seus conceitos, aqui vinham dando ao dizimo, {io ‘mas amor quando se paga nfo se paga de juizos fo (Antonio Cardoso da Fonseca) 14.2.2 Note-se que vimos falando em vogais, jé que a constincia no reiterar nao atinge, necessariamente, as semivogais. Assim, pode haver ‘exemplos de semivogais reiteradas, Movido do mal de Amor, Que as liberdades sujeita, eia Fénix foram meus cuidados, Bergo uma amante fogu cia (Gregbrio de Matos) embora 0 usual seja a sua nfo reiteragio: , alia Mostram ao tirar das sedas Mil mataduras de albardas. aa (Gregério de Matos) 14.2.3 A prética da rima toante mostra-nos que a identidade total entre as vogais reiteradas nfo se considera necesséria: nada impede que uma vogal possa ser oral e nasal a outra: Vos ambos sois pescadores; Mas com diferenga tanta, ia Vos ao peixe armais com redes, Ela co’os ohos vos arma! aa (Cludio Manuel da Costa) 182 Rogétio E, Chociay ‘como também aberta uma e fechada a outra: Mata-me o meu pensamento; Que a meu pesar, se tem édio_ 60 Os sentidos, e as poténcias, Dentro em meu mesmo compost. 0.9 (Gregorio de Matos) 14.2.4 A rima toante pode, ainda, ser apenas parcial, atingindo s6 a vogal forte: Permite que feche meus glhos, 6. pois é muito longe ¢ tdo tarde! . Pensei que era apenas demora, o ¢ cantando pus-me a esperar-te. (Cecilia Meireles) Pousou na escuriddo, e repousou, pois erao dia sete de seus sticubos tu) (0) Foi quando se exelamou: Faca-se aluz. i__ E a luz dentro das trevas se formou. (Jorge de Lima) 14.2.5 Quanto ao uso da reiterago parcial apenas da ultima vogal fraca, além de mais raro, é tanto mais dificil de, no caso de nos depararmos com exemplos particulares, podermos comprovar se houve intencionalidade ‘ou acaso. Nos segmentos esdrixulos, quando se patenteia a intengéo de nfo rimar perfeitamente, € comum encontrarmos reiterages apenas das conseqiientes (pélido/ritilo, mdquina/livida, quérula/época, etc.). Nos poetas modernos notamos maior incidéncia de rima entre vogais inacentuadas: Joaquim Cardoso, Cecflia Meireles, Joo Cabral de Melo Neto, Jorge de Lima, Gilberto M. Teles, ete. Bis uma quadra de Joaquim Cardoso, de um poema ‘com seis quadras, em que o primeiro e 0 terceiro versos apresentam em cinco delas reiteragdo apenas da vogal conseqdente; numa estrofe ocorre reiteragdo também da forte; o segundo 0 quarto versos de todas as quadras fazem sempre rima soante: A virzea tem cajazeiras. . = Cada cajazeira um ninho ‘Que entre o verde e 0 azul oscila; Mocambo de passarinho. (A varzea tem cajazeiras) Teotiado Verso 483, 14.3 Como se observa pela variedade dos exemplos, a tentativa d rotular as subespécies encontriveis da rima toante & il, $6 i impossivel. Parece-nos melhor manter apenas a designagio genérica unirmola descritivamente a classificagdo segundo o esquema acentual. Assim, pelo menos, conseguimos abranger as suas possibilidades combinat6rias. a) de esquema agudo: amanhecer/bem, vé/ vaifabrasar, banhar/cristal, vai/cabedai azul/luz, sol/atrgz, ete.; b) de esquema grave: = total: praia/vasta, engana/fama, avena/penhas, aves/fale, et ~ parcial forte: saudade/cava, frondes/sombra, olhos/demora, emudeca/siléncio, longe/tona, tristes/imagino, vida/grito, perguntas/tudo, etc; ta/arma, _ribgita/ovelha, aquela/pena, vizinha/fica, cristaling/silvas, indyltg/murg, = parcial fraca: — enterro/corpo, sombra/estrelas, | Funda/ama, planicie/conforme, desvelados/sonho, verdes/ posse, etc.; ©) de esquema esdrixxulo: — total: brasflico/liquido, bonjssimo/vivide, cr légrima/pélida, pérola/déspota, pintano/imago, época/pérola, librico/Gm angmona/t ula, etc.; ~ parcial de duas fracas: ‘inicoypalido, ultima/ti . imago/sbang, imido/frenético, pléstico/sdlide, etc. parcial de uma fraca: —_vido/il méquina/pérola, éviday vibora, ete. 1a, ébano/bérbara, A realidade dos textos, todavia, nfo consagrou algumas des especialmente as duas dltimes de esquema esdrixulo ea segunda de esquema grave. Entre os poetas mais antigos € preponderante o uso simétrico do esquema agudo, do primeiro grave e, pouco mais raro, do primeiro esdraxulo. Um pouco nos antigos e mais nos modemos, a rima toante aparece nas combinagdes assimétricas (de segmentos terminais diferentes): agudotgrave: pé/talo, vez/tergo, sol/rglo; agudotesdraxulo: faz/ldgrima, tal/pdlido, timido/fiz; — pravetesdrixulo: . 12) de duas vogais: teto/época, era/Hélade, nfuftagolescada: 184 Rogério F. Chociay * b)de duas vogais: fato/pélido, bussola/duplas, incorpora/sdlida, técnica/opera, clara/fabula, hermética/regra, sonimbulo/canto, oposicionista/politica, bairros/passaro; ¢) 80 da forte: fato/palida, palavras/arvore, tudo/rm d)sé6 da fraca: halo/limpido, funda/pérola, amago/tinta, limpido/praxis. 14.4 Passemos agora ao estudo da rima soante, que se realiza como uma homofonia (1) fixa jal de dois ou versos. Sendo a mais utilizada em nossa literatura, ¢ a mais rica em possibilidades e efeitos colaterais, seu estudo demandaré maior espaco ¢ tempo. 14.4.1 Para caracterizé-la, partimos da verificagfo de seu uso mais constante ~ reiterago total a partir da altima vogal forte de dois ou mais versos seguidos ou nfo. E este o molde sobre o qual se firmou o conceito de rima entre nés — em que muitos tratadistas quiseram ver uma espécie de adréo imutivel e necessariamente perfeito, tanto mais perfeito quanto mais diversos forem os pares rimicos entre si: Como a crisilida emergindo do ovo, A = ovo Para que o campo flérido a concenire, —-B -entre Assim, oh! Mie, sujo de sangue, um nc A = ovo Ser, entre dores, te emergiu do ven! B - entre (Augusto dos Anjos) Aqui se percebem, verso a verso, reiteragdes completas a partir da tltima ‘vogal forte. Note-se que os pares rimicos AA e BB sio alofénicos entre si. 14.4.2 Em todas as épocas houve maior ou menor niimero de rupturas do padrao rigido. A que nos interessa neste momento se refere a uma real ov aparente auséncia de reiteragéo de um fonema num dos segmentos rimantes: Onde, como num ofsis calmoe verde, er) de @caravana branca mata a sede; e_de (Guilherme de Almeida) Nas horas tardias que a noite desmaia, ‘Que rolam na praia mil vagas azuis, wis Ea lua cercada de palida chama Nos mares derrama seu prantode luz, u_s (Fagundes Varela) (©) Esquemas mais usados, (2) Conforme entendémos a homofonia no Capitulo Doze. Teoria do Verso 188 Dos linhos claros da areia_ cia Fez o vento retorcidas, Rotas, miserdveis teias. eia(s) (Cecilia Meiteles) Exemplos similares podem ser encontrados numerosos em nossa versificaao, 4) soja pela falta de uma consoante: negros/morcegos, quictos/abertos, Tedes/verdes, sombra/tomba, espaco/esparso, ouroloutro, gaivota/resposta, etes b) seja pela falta de uma _semivogal: _silencig/extenso, espadas/esmeraldas, finou-se/doce, embalde/cidade, ouro/coro, beijo/desejo, tes € sua explicag#o nfo pode recair sempre numa desajeitada troca de rétulos: ourvfoutro = rima toante, ou contemplo/tempo = ima imperfeita. O Professor Mattoso Camara Jr., no valioso estudo “A Rima na Poesia Brasileira” (1), estuda minuciosamente todos estes casos tradicionalmente acoimados de imperfeigio, estabelecendo, de inicio, uma sensata divisio entre imas aparentemente imperfeitas © rimas realmente imperfeitas. Diz ele que as primeiras s6 sfo tidas em tal conta dada a detasagem escrita x fala comrente; na realidade, so perfeitas, j4 que o campo dos efeitos rimicos é para 0 poeta essencialmente fénico. Assim sendo, ndo se pode considerar fator de imperfeigo © que, diferenciado pela grafla, resulta indistinto na fala cortente. Portanto, devem ser consideradas apenas aparentemente imperfeitas rimas dos tipos: Argus/largos ‘onde Uo toe Cilix/vales " she Visse/superficie " e,-ie Ricos/obliquos " 0, -uo Reponho-os/risonhos " 00,0 Espécie/tece € " “ie, ee Sélido/6le0 " “io, -c0 Area/sria " -eay-ia Mégoa/ gua " Moléstia/veste-a " Cérulas/pérolas " Impele-te/satélite " Fouce/doce " -0U,-0- Vowave " ou, 0 Vejo/beiio " eH) () fare 0 Estudo da Fonémlca Portuguese, Simdes, Rio, 1953, Capitulo 1, pp. 186 Rogério F. Chociay Achofbaixo " -ach-,-aich- = -aych- Luzlazuis " az, -uis = -uys Trés{leis " “es, cis = -eys por nio representarem lapsos, senfo acuidade dos poetas, que percebem ientidades fonicas através de grafias discordantes, As timas, realmente imperfeitas, ficam, assim, bastante reduzidas, justamente nos casos em que a fala apresenta distingdo, sobrando um foneina no reiterado: a) orquestsa/festa, virgem/vertigem, consomem/dormem (sobra 0 1); ') esmaga/vagas, almas/palma (sobra o 3); ©) Julieta/espreita, deita/preta (0 y de ditongo diante de ¢ nfo se esvazia ‘na pronincia; na rima deste tipo, realmente sobra); 4) lenta/preta, minto/infinito (a nasalidade deve ser considerada como elemento consonantico, ficando excrescente na reiterago); ¢) pele/dtle, por/melhor (apenas 0 grau de abertura é diverso nas vogais fortes: é/¢, 6/6). A este segundo tipo de rima imperfeita, que pretendemos chamar incompleta (em telagio 20 padrdo), pata evitar a conotagio pejorativa do ‘outro termo, os tratadistas de muitas épocas pretenderam banit da pratica dos poetas, considerando que mesmo um trago néo reiterado € elemento perturbador do ideal de simetria, visto como regra mdxima da ima, Ao contrério, s¢ deixarmos de nos escravizer por esse ideal de simetria ¢ pensarmos que o fundo orquestral buscado pelo poeta nfo o obriga a prender-se a esquemas rigidos que s6 podem levar A exaustdo, 20 fastio, facilmente constatamos a riqueza de efeitos que podem trazer & linha melédica do poema essas * ibertando-o da monotonia que 0 Padrdo soante puro pode acatretar. A conclusio de Mattoso Camara nfo deixa margem a quaisquer dividas: “A tima, como efeito acistico da repeticfo de um motivo, {raz em ai @ gorme da monotonis, A time imperfaite justifica-se, portanto, esteticamente como um meio de quebrar essa monotonia sem abandono da correspondéncia dos sons." (1) 14.4.3 O padrio da rima soante pode ser ampliado, reiterando-se também a(3) consoante(s) da sflaba forte; e, mais ainda, reiterando-se as vezes ‘uma ou duas silabas anteriores a forte final (2): ) Op. p. 168 : toy 2 A'tndigdo Charan de opulent, po pose & millet ie pad) ina que (© {pein tambem a) Consante) a sabe forte tte po também ferbeu emo ‘rina com contone de apo Teoriado Veo 187 4) ampliagdo de uma consoante ou grupo consonantal da silaba forte: idades/saudades, estradas/choradas, _missa/submissa, _brando/orando, miserando/chorando, encerra/serra, _patrono/trono, —curiosu/misterioso, ansioso/silencioso. gravo/agravo; b) ampliagdo de uma silaba imediatamente anterior a forte (aterra/a derma, frivolidade/tranquilidade) ou apenas de uma vogal dessa. silaba (Cidade/claridade). 14.4.4 O uso darima ampliada existiu sempre em nossa poesia, embora de modo assistemético. Dursnte 0 Parnasianismo, Goulart de Andrade tentou dar consisténcia ao emprego da ampliagao de consoante ou grupo da silaba forte (rima com consoante de apoio), como no exemplo destacado de lum seu poemia “sujeito a consoante de apoi Venha aqui dentro 0 Sol eesta terra fecunde! _- cunde Venha o musgo crescendoe a muralha circunde! - cunde ‘Venha gemer 0 mar, que espumarento, esbarra «barra No rochedo em que dorme o vigia da barra barra ‘mas no teve imitadores tenazes, continuando a ampliagio a ser usada sem formas coercitivas. ‘Como nos demais efeitos de relterac%o fonica, a ampliago pode ser menos evidente, arrancando matizes através do contraste de consoantes da sflaba forte (1). O fato pode ser acusado em mi mas adquiriu especial indice entre 0s simbolistas: exilio/augitio, olhares/crepusculares, aberto/perto, ingertos/desertos, albente/bruscamente, Porte/morte, chéo/cangio, brisio/orago, cabelos/escrevé-los, abandono] ‘ittono, inteiras/derradeiras, porta/morta, pressagas/chagas, brlhardes/alardes , remaremos/remos, 14.4.5 Contrariamente, 0 padrio pode apresentarse diminu/do, nfo pela auséncia total de reiteragfo que se observa na rime incompleta, mas por minimas diferengas de tragos em fonemas da mesma posigio nos segmentos rimantes, obtendo-se assim, além da quebra da monotonia, efeitos acisticos invulgares através do contraste surda-sonora: ‘No olhar do meu Senhor, como num pogo, —_- ogo (3) procurei o reflexo misterioso. : (Guilherme de Almeida) (0) O conceito de cotiteraréo contirua, ai, © mesma de 5.6, 188 Rogério E. Chociay “Por que fazer 0 menor gesto, se nada sei, se nada sofro, sofro () se estou perdida em mim, tdo perdida ‘como o som da voz no seu sopro? sopro (p) (Cecilia Meireles) Esta pritica, que muitos confundem coma ima toante, dado o fato de no uso tradicional da rima toante haver exemplos espatsos coincidentes, apresenta em muitos poetas modernos indice de ocorréncia assaz elevado, impedindonos de consideré-la produto aleatério. Em Cecilia Meireles ¢ Guilherme de Almeida, principalmente, percede -se a intencionalidade do processo, 0 que torna muitos desses exemplares de rimas, na pior das hipéteses, rimas toantes enriquecidas substancialmente. Preferimos, de nossa Parte, escudados em exemplos como Avidas/r4j idas, tardes/artes, ‘marco/amatgo, considerar a existéncia de rima soante diminuta, que se afasta do padrio por minimos tragos, quebrando-lhe a monotonia, A cata de exemplos nfo ¢ dificil em poetas modernos: steniense/enche, mudo/fruto, branca/miganga, oco/fogo, morta/borda, beleza/cabesa, misteriosa/gross tarde/esperarte, andas/tantas, almas/albas, orvalhada/prata, muralhas/f estrelas/vermethas, —barga/langa, feghados/inesafos, — comparando/prai parte/arde (1), 14.4.6 A rima diminuta pode surgir por via vocdlica: a vatiagio metafonica evidente nos pares é/é, 6/6, (aberta/fechada). Deste modo, 0 padrdo se reduz, mas enriquecem-se os efeitos. Este tipo de rima, que tem sido empregado desde 0 Classicismo, ¢ chamado por Joaquim Ribeiro de rima metafontca (1). Els um bom exemplo de Alphonsus de Guimarsens, no poema Aria do Luar, Como lengéis claros de neve, - ve Que o sol filtrando em luz esteve, -éve E transparente, é branco, éleve. -éve Eurritmia celestial das cores, ores Parece feito dos menores + Ores E mais transcendentes odores + Ores em que cada um dos dez tercetos tem uma s6 rima: a vogal forte do segundo ‘sempre variagio metafonica, tornando-se aberta se as outras cm exemplos come morta/bor aumentado pelo mesma process. (1) RIBEIRO, Joaquim Ftérice da LAngua Portuguese 3. Ozond 277.296, echades/inexatos, © padréo diminuido ditor, Rio, 1964, pp. Teoria do Verso 189 duas forem fechadas e fechada se as outras forem abertas. Esse contraste é/é, 6/6, traz delicado matiz aos trés segmentos de mesma rima. Eis alguns exemplos: querer-e/inerte, descrevera/era, belafestrela, cruéis/talver, cadela/européia, veia/idéia, morreu/cruel, amorosalesposa, mariposa/rosa lengdis/depois, cores/chores, etc 14.4.7 Um iiltimo tipo de alterago do padrio ¢ representado pela rima metatética: os fonemas dos segmentos sio todos reiterados, mas com um ou dois em posigao inversa: ‘Se amanha perder o meu corpo, -0rpo serd possivel que ainda venha, que a0 pé de ti me detenha como um levissimo sopro? + opro (Cecilia Meireles) _ Neste exemplo, baseado no padrio, os fonemas ¢ p (corpo) aparccem reiterados em ordem inversa (Sopto). 0 efeito sonoro € invulgar, ¢ nao se confunde com 2 pura rima toante. Nos seguintes pares verifica-se 0 mesmo fato: “mageo/letargo, cetro/perto, espetro/ceito, em que, segmento 2 segmento, dois fonemas esto em ordem inversa, simetricamente. A troca dos fonemas pode aparecer assimétrica: tortas/mostra, Semivogais e vogais Participam também desse jogo em muitos pares: algas/dguas, altos/fituos, Pardg/corda, perto/sorte. A ampliagdo de rimas desse tipo reforca a idéia de Sua intencionalldade; magro/amargo, espetto/perto, eetto/certo, falto/fatuo, cardojcorda, perto/porte, mortas/mostra, O processo as vezes abrange uma consoante da silaba forte, baseando-se portanto no padrio ampliado: Eaminha Alma (oh! a sublime e dorida grinalda De saudades!) no mais volveu os olhos tristes -rigtes Para o azul donde viera a pobre flor fanada. . . De joethos, ante o Céu que se estrela de cruzes Eisme aqui como quem escapo as negras sites Do mar, se veja numa ampla floresta de urzes! (Alphonsus de Guimaraens) Nestes dois exemplares, vemos inversio semelhante ozorrer entre 0 1.¢ 08. (tristes/sistes) © 0 re 0 u (cruzes/urzes). Eis alguns pares em que o efeito seré andlogo: pardo/prado, tarda/estrada, —graca/garga, _virgem/origem, ttiste/partiste, torno/trono, arde/grade, durma/bruma. 190 Rogétio E, Chociay 14.5 Consideramos até aqui apenas as relagdes reiterativas dos segmentos de 1a. Mas essas relagdes podem existir igualmente entre segmentos de ‘mesma rimas diversas: 14.5.1 A reiteragio vocdlica pode servir de liame aos segmentos de rimas diferent a) seja da vogal forte: Eu, que sou feio, slido, leal, A ti que és bela, frégil, assustada, Quero estimar-te, sempre, recatad Numa existéncia honesta, de cristal. (Cesério Verde) ) da fraca: Como pude pensar eu que, partida, ida, A serva de servir se libertava, -ava Se a cadeia, seguindo-a, se alongava, -ava E mais pesava, pois que mais comprida? (Guilherme de Almeida) ) ou de ambas: Era assim luminosa e delicada, Tao nobre sempre de beleza e graca Que recordava pompas de alvorada, Sonoridades de cristais de taga. (Cruz e Sousa) 14.5.2 A variaglio metafonica das vogais ¢/é, 6/6 (abertas ¢ fechadas fortes) é também recurso de harmonizagao entre segmentos de timas diversas: E como na minh’alma aluz.era uma aurora, - 6ra A aragem ao passar parece que me trouxe -Ouxe O som da tua voz, metalica, sonora, -6ra Eo teu perfume forte, o teu perfume doce. - 6ce (Cesério Verde) 14.5.3 De outro modo, a harmonia entre rimas pode surgir de efeitos de reiteragao consonintica: Teoriado Verso 191 4) seja de uma 36 consoante: A flor vaga, o seu cabelo verde, -erde Que 0 torvelinho enredz e desenreda. .. -eda O cheiro a came que nos embebeda! -eda Em que desvios a razio se perde! -erde (Camilo Pessanha) Porque, se no orbe oval que meus pés tocam — - ocam Eu nfo deixasse 0 meu cuspo carrasco, Jamais exprimiria 0 acérrimo asco Que os canathas do mundo me provocam! (Augusto dos Anjos) ) seja de duas: Héstia negra e feral da comunhfio dos mortos, - ortos Noite criadora, mfe dos gnomos, dos vampiros, -iros. Passageira senil dos encantados portos, cego sem bordio da torre dos suspiros. (Cruze Sousa) ©) ou, mesmo, de todas, com exclusio das vogais: ‘Trémulos astros. . . Soiddes lacustres... — Lemes e mastros. .. E os alabastros Dos balaistres! (Camilo Pessanha) d)e, as vezes, com assonincia também da vogal forte (ou da fraca): Tardes de ouro para harpas dedilhadas por sacras solenidades De catedrais em pomps, iuminadas com rituais majestades. (Cruze Sousa) Eceu desejava ter, numa insia rara ‘Ao pensar nas pessoas que perdera, A inconsciéncia das mascaras de cera, Que a gente prega, com um cord, na cara! (Augusto dos Anjos) sera vem ara 192 Rogério E. Chociay €) processo que pode atingir maior sutileza com a reiteragio de ambas ‘as vogais € quase todas as consoantes: Infinitos esp{ritos dispersos, Inefaveis, edénicos, aéreos, Fecundai o mistério destes versos ‘Com a chama ideal de todos os mistérios. (Cruz e Sousa) 14.5.4 O contraste de consoantes surdas e sonoras entre rimas é outro fato nem sempre observado pelos estudiosos: 2) seja com grande destaque, dada a reiterago de todas as vogais dos segmentos: Entre vidracas, como numa estufa, - fa No inverno glacial de vento e chuva IVs Que sobre as tethas tamborila e rufa uta ‘Vejo-a, talhada em nitidez de luva. .. sya (Cruz e Sousa) +b) seja com menor desiaque, quando a reiteragio nfo atinge 2s vogais: Lembrome bem. A ponte era comprida, ida Eaminha sombra enorme enchia a ponte, - onte ‘Como uma pele de rinoceronte sonte Estendida por toda a minha vidal ida (Augusto dos Anjos) 14.5.5 © fino senso auditivo de alguns poetas oferece-nos por vezes exemplos mais complexos de harmonia, 8) sja fazendo 0 jogo reiterativo das consoantes da sflaba forte, em ‘segmentos de rimas diferentes, como em, passado sfo flores mortas mortas Atiradas pelos caminhos. minhos Visdes que batem as nossas portas Portas E que nos vém coroar de espinhos. piinhos (Alphonsus de Guimaraens) b) seja com rimas a primeira vista julgadas incompletas ou somente baseadas em reiteragdo de vogais. Tal a quadra abaixo, de Alphonsus de Guimaraens (‘A Escada de Jaco, XXXII"), Teotia do Verso 193 Os olhos meigos da Esperanca que ndo volta, ota I Ai! com que dor cerrados dentro da minha Alma! ama 1 Pois ela esté com as duas méos no peito, morta, ota r Ehouve quem aspirasse a violeta de Parma. amar em que, rima a rima, reiteram-se 0 Le 0 1 ndo reiterados nos segmentos de mesma ima (o_ta/o_ta; a_ma/a_ma). Aliés, em Cecilia Meireles ("Itinerério”), deparamo-nos com exemplar andlogo: Primeiro, foram os verdes eres d E dguas ¢ pedras da tarde, we d ‘Eoamees soninns be peraos te ne E meus sonhos de encontrar-te. .. are t com o contraste d/t nos segmentos de mesma rima (erdes/erte; arde/arte) ¢ a relagdo reiterativa d/d t/t na seqiéncia dos finais de segmentos contiguos (erdes/arde; erte/arte), devendo-se notar também neste caso a reiteracio do t € do ¢ em todos os segmentos. Que tais arranjos sao incomuns, e seus efeitos excelentes, cremos ndo restar sobre isso a menor divida. Abre-se aqui uma promissora perspectiva de enriquecimento dos efeitos da rima interversal. 14.6 Pelos exemplares que apontamos e comentérios feitos, nota-se que mio estivemos muito interessados em apresentar classicagio rigida — em que, de festo, ndo acreditamos ~ mas fazer tio somente uma amostragem da riqueza de possibilidades combinatérias que apresentam as rimas quanto 4 reiteragio ou 20 contraste dos fonemas que as encorpam. Todo um estudo, que accite estes pontos de vista, poderd ser feito sobre os “velhos™ textos ¢, tenios certeza, trard & tona muitos fatos “novos”, que escaparam da argicia dos studiosos ou foram soterrados pelo normativismo dos manuais 15. Posicionamento das rimas 15.1. A importincia maior do estudo do posicionamento das rimas surge em fungto das formas poéticas ou formas fixas, tais como 0 soneto, o rondé, a balada, etc., onde a disposi¢do assume o cardter de norma. Ao nivel da estrofe, o problema é relativamente simples, e por ele passaremos répidos. 15.2 Convém insistit, de infcio, no mesmo ponto fundamental: a rima é uma reiteragio diplice ou miltipla do mesmo segmento fonico em finais de versos. Sendo assim, ela pode surgit da repeticao de segmentos finais em versos contiguos, ou de segmentos alternados por um ou mais versos (brancos ou portadores de segmentos de outras rimas). Tal afastamento io é normalmente superior a quatro versos, donde a designago de rima afastada para a que se completa com intervalo maior. Isto pensado, podemos clasificar a disposigio das rimas: a) emparethadas: numa estrofe ou seqiéncia em que cada rima se realiza or contigitidade: —a A ——aA ——a A —aA ——B A —B ——B ——B ——B ——B —ec ——B —c —DpD D Teoria do Verso 195 )altermadas: numa estrofe ou seqiiéncia em que cada rima se realiza por altemndncia simétrica aos segmentos de outras: ——aA —a ——a ——B —B —B —a ——A —c ——B ——B ——a —a —B ——B —c 6) entrelagadas: numa estrofe em que uma das rimas se realiza entre os segmentos contiguos de outra: ——A ——aA —B —B —B ——B ——aA ——B qualsquer outras disposigdes em que nfo se verifica a simétria dos pares rimicos entre si: ABAABA, AABCBC, ABBCAB, ete. Acreditamos nfo ser preciso ir além, jf que estes termos suprem, tazoavelmente, todas as necessidades descritivas. 15.3 Estudemos agora as possibilidades de disposigdo das rimas nas diversas estrofes: 15.3.1 Os disticos, evidentemente, 9 podem spresentar uma rima (segmentos cont{guos: AA, BB, CC), ou nem isso, quando os segmentos terminais de cada um dos dois versos se completam rimicamente na estrofe Seguinte (por altemincia: AB, AB, AB). Na seqléncia de dfsticos com rima cont gua as rimas sio emparelhadas. 15.3.2 Os tercetos comportam também s6 a monorrima, com trés Segmentos contiguos (AAA) ou apenas dois, contiguos (AB ou ABB) ou altemados por um verso branco (ABA) ou portador de segmento que 10 completa rimicamente na estrofe seguinte (ABA, BAB; ABA, AB; AAB, BAA); podendo ainda nfo possuir rima, mas apenas segmentos que %¢ completam na estrofe posterior (ABC, ABC). A composigfo mais usual em tercetos — a terpa rima — baseia-se numa série variivel dessas estrofes, cujas rimas st completam uma na estrofe outra entre estrofes: ABA, BCB, CDC... até 0 terceto final, eujo segundo verso completa rima com um ‘monéstico. Um exemplo concreto de terga rima com dez estrofes apresentaria 196 Rogério E. Chociay 4 seguinte disposiggo: ABA, BCB, CDC, DED, EFE, FGF, GHG, HIH, UI, ILL-L. Os dois tercetos que encerram o modelo clissico do soneto apresentam as mais variadas disposigdes rimicas: CDC, DCD; CDE, CDE; CDC, CDC; CDE, DCE; CDE, CED; CCD, EED, etc.. 15.3.3 As quadras podem comportar a monorrima (segmentos contiguos: AAA; ou alternados: ABCB) e a dirrima (rimas alternadas: ABAB; ou emparelhadas: AABB; ou entrelacadas: ABBA), mas, de todos esses esquemas a preferéncia recai de modo geral sobre trés: ABCB (a rima voedlica dos romances; ou a rima padrdo das quadrinhas); ABBA (esquema d radondilhas) © ABAB. Os dois ultimos sfo caracteristicos das quadras dos sonetos ¢ bastante utilizados nas composicdes de estrofagao livre. O emprego das quadras, aliés, predomina sobre o dos outros tipos estréficos. 15.3.4 As quintithas (quintetos, se em versos de oito ou mais silabas) comportam a dirrima, sendo os seus esquemas mais comuns: ABABA, ABBAB, ABAAB. Pode aparecer solto o segmento do primeiro verso: sABAB ‘ou sABBA. Um tipo especial de quinteto ¢ a lira, que combina versos de dez ¢ de seis silabas; sua apresentagio mais comum obedece ao esquema ABABB, sendo 0 primeito, o terceiro ¢ 0 quarto versos hexassilabos, ¢ 0s dois outros decassilabos. 15.3.5 As sextilhas (sextetos, se em versos de oito ou mais silabas) comportam a trirrima, ou menos, em variadas disposicdes. Um modelo mais antigo de sextilha exige uma 36 rima, que sc realiza alternada (80 nos versos pares) ~ sAsAsA — encontrével, por exemplo, nas “Sextillias de Frei Antio” (Gongalves Dias) e em “O menestrel do Sertio” de Junqueira Freire. Modelos dirrimicos tritrimicos apresentam os esquemas: AABCCB, ABABCC, ABAABA. Um tipo especial do esquema AABCCB exige rima aguda no 3.0 ¢ 6.9 versos, 15.3.6 As sétimas isométricas nunca apresentaram regularidade, quer de emprego, quer de disposigéo rimica. Em Fagundes Varela (“Viiva e Moga”), 0 esquema € AABCCCB (sendo B_B em segmentos agudos e os demals graves). Em “Pedro Ivo" de Alvares de Azevedo, o esquema é AABCBBC. Como estrofes heterométricas, especialmente da telacio 10/6 (decassilabo + hersico quebrado), as sétimas apresentam bom indice de ocorréncia nas odes cléssicas ou em outras composigdes. 15.3.7 Da oitava dois esquemas merecem atengio: a) oitava rima ou citava real ou oltara herdica, a estrofe dOs Lusiadas, na disposicao ABABABCC; 6) a oitava italiana, em que 0.1.0 ¢ 0 5.0 vers0s slo soltos, 0 4.0 © 0 8° conformam rima aguda, 0 2.0 e 0 3.0 rimam entre si, 0 mesmo Teoria do Verso 197 acontecendo 20 6.° ¢ 7.0 (sAABSCCB). Especialmente apés © Romantismo muitas outras disposigées foram realizadas. 15.3.8 Bem pouco considerada por tratadistas e poctas, a estrofe de ove versos tem sido usada apenas esporadicamente. 15.3.9 J a décima, de uso mais generalizado, pode apresentar variados esquemas de disposigZo rimica. Num de seus tipos, os tratadistas tém visto a fusio de uma quadra e um sexteto, ou de dois quintetos: trata-se da décima cléssica ou espinela (sistematizada pelo poeta espanhol Vicente Martinez Espinel), cujo uso consagrado ¢ em versos heptassilabos: apresenta quatro rimas na seguinte disposicdo: ABBAACCDDC. 15.4 Em todas as épocas verificaram-se fugas @ rigidez posicional da rima entre versos, procurandose estender seus efeitos para o interior dos versos da estrofe. Nao confundamos esse fato com o que vimos designando por homofonia; esta & aleat6ria; a rima, geradora da cadéncia fonica, mesmo que a aceitemos “intema”, tem cardter sistemdtico. A rima “interna” constitui, portanto, uma sistematizagdo, a0 nivel da estrofe, de homofonias internas, segundo um esquema prévio. No quadro abaixo, 2 —— P| —— ll} BI —— 2} —— Ii} 13f —— 2] ——1 2f —— 2] —— Il tomando por modelo a quadra, as linhas representam os versos, 0 niimero /1/ a posigio convencional da rima; os niimeros /2/ e /3/ acenam a possibilidade de um posicionamento simétrico dos segmentos rimicos. A relagio pode ser estabelecida também entre segmentos “externos” ¢ “internos”, como porexemplo, entre /1/ e /3/ ou entre /1/ e /2/. 15.4.1 Jorge de Lima tentou a rima “interna"’ /2/: thos, olhos de boi pendidos vertem Prantos por quem se foi. Ouvidos ouvem, Calam. Crepes enlutam as janelas. Fundas ougas escutam seus gemidos. Os segmentos intemos oi/oi fazem rima por contigtidade na 6.8 silaba (forte) dos dois primeiros versos; ¢ os segmentos utam/utam na 6.8 (forte) e 78 198 Rogério E. Chociay (fraca) dos dois iltimos. José Jambo da Costa, citado por Mello Nébrega (1), apresenta a tentativa de situar a rima no inicio dos versos: ama_ Chama da vida a iluminar a sina, ina orte Norte do audaz, que, sem temer o incerto, —_erto ama Ama se arroja a gloria peregrina ina orle ~ Morte num mundo, sempre, aro e deserto, erto Esta & a primeira quadra de um soneto em que as demais estrofes obedecem a semelhantes processos, tornando-se, caso se aceite a legitimidade da analogia, polirrimicas. Mas este exemplar, como o anterior, insere-se no rol das ocorréncias esporddicas, ndo permitindo teorizar-se com maior seguranca a tespeito. Além disso, um estudo comparativo dessas rimas internas com a convencional, “externa”, apontard dissemelhancas insuperdveis para que se possa colocé:las a um mesmo nivel. Com efeito, a rima “externa” néo deve seus resultados (cadéncia fonica) apenas A mera teiteragZo total ou parcial de segmentos terminais dos versos, sendo a algumas peculiaridades que s6 nessa posi¢do existem: a intensidade forte, a entoagao caracteristica, a pausa de final de verso € que terminam por conferirlhe distingo e autonomia. J4 os exemplos vistos de rima interna comegam por apresentar-se com menor distingZo intensiva (0 primeiro, baseado na 6. silaba fundamental, é ainda relativamente destacado pela intensidade, mas o segundo, na 1.8 silaba dos versus, resulta enfraquecido © com pouco destaque) e sem serem seguidos, Nuvesintiginente pur uuu venacvel) s6te inplion mpobreaiinente dos afelton pretendidos com o seu emprego. Além do mais, a prépria rima “externa” apresentou sempre violentos detratores, que nela tém visto um fator de aprisionamento expressive “interna”, a esse titulo, acaba criando uma’ prisio ainda pior, 15.4.2 Melhor destino, posto que ainda irrelevante, conseguiram as rimas encadeadas, que consistem no enlace rimico-do segmento terminal de um verso /1/ a um segmento medial do seguinte /2/, como nas estrofes dos rons de Silva Alvarenga 3 7 Ja serena desde a tarde arde Jando arde 0 sol formoso; arde 080 ‘Vem saudoso o brando vento 080 ento Doce alento respirar. ento em que desaparece a rima “externa” no seu entendimento bisico, pelo fato de ‘8 segmentos terminais da sétima sflaba do primeito, segundo e terceiro versos rimarem, respectivamente, com os segmentos baseados na terceira silaba do (1) Op. cit, p. 300, Teonta do Verso 199 segundo, terceiro € quarto versos. A quadra, que externamente comportatia a dirrima, toma-se a custa desta combinat6ria tritrimica, 15.4.3 Outro processo € 0 da fixago de homofonias no interior de Yers0s; as homofonias so diferentes em cada verso, mas a posigio é fixa (vimas coroadas): 204 8 10 Donzela bela que me inspira a lira Um canto santo de fremente amor, ‘Ao bardo 0 cardo da tremenda senda Estanca, arranc Of, (Castro Alves) 18.4.4 Ambos os exemplares indlcados em 15.4.2 e 15.4.3, se a um Primeiro contato podem parecer agradaveis, acabam por revelar grande monotonia na seqiéncia de uma composiglo, o que bem diz de seu pouco emprego. 15.5 Sobre os exemplos vistos de rima interna e muitos outros semelhantes pode-se dizer que néo suportam o énus de um emprego intenso, que x6 faz encher a estrofe de homofonias forgadas ¢ desagradaveis. Com efeito, Aunooroniae intvenas, udeguadue, ¢, ‘edpordicumente, eopulliedas nume composigio, podem sor fator de’ enriquecimento ritmico-expressivo (como bem perceberam no apenas simbolistas como muitos modernios), mas o uso insistente tende a esgotar suas possibilidades expressivas e trazer um fardo de ‘monotonia que a estrofe habitualmente no pode suportar. z 200 Rogétio E. Chociay NOTA FINAL Se 0 leitor conseguiu chegar até aqui, teré verificado que em nenhum instante tivemos a ingenuidade de pretender esgotar qualquer dos assuntos tratados. Ao contrério, buscamos a cada pasto enfatizar a grande riqueza de solug6es apresentadas pelo sistema versificatdrio tradicional, riqueza esta obnubilada por certas informacées usuais, tendenciosas e pretensamente desmerecedoras do veiculo de expressio secular de nossa poesia. Se conseguimos convencer, ter-se-4 concluido: que 0 verso tradicional, em suas miltiplas possibilidades de esquematizacdo e solugdes de andamento; que a estrofe, com seu complexo e variado jogo de cadéncias; que os processos de relteragdo e contraste obtidos da matéria fonica, muitos dos quais surpreendentemente harménicos e expressivos; enfim, que os principais aspectos da versificagio tradicional, sio ainda ilustremente desconhecidos da maior parte de nossos estudantes universitérios, de professores, de nossos jovens poetas, para ndo por em cena alguns estudiosos que, por omissio ou descaso, simplesmente abrem mao desse estrato em seus estudos. Fala-se muito, hoje em dia, no “encerramento do ciclo do verso”, expressio entendida muito além do que 0 devera. Do verso tradicional a0 verso livre modemo a distancia nfo é assim tio grande que este possa ser considerado como nova forma de expresso postica, a comegar pela matéria fonica trabalhada, que & ainda a mesma. Nos poemas literalmente “modemos” desaparece a armagdo rigida das cadéncias ¢ a submissio dos versos & métrica, instaura-se a pesquisa e valorizagao dos efeitos de grafia e de espago (0 que vez por outra surgia na tradicional). Mas subsistem muitos processos, tais como as reiteragdes vocilicas, consoniinticas, os jogos de contraste fOnico, quando nio a propria tima interversal, e tudo isso as vezes com maior requinte. Alguns poetas abrem mfo da “medida” no andamento dos versos, buscando obter uma linha melédica personalissima, livre de padroes rigidos; outros negam a propria musicalidade (mas isso implica conhecer a musicalidade, para negé-a). Diante de tudo, a evidéncia nos fala em evolugdo, nunca revoluedo, Observe-se que, a0 lado de poemas assim concebidos, os grandes poetas ndo deixam de praticar, em bom indice, a “medida velha” de versos que se agrupam em estrofes, de estrofes que geram cadéncias se articulam em poemas. Estamos numa auténtica fase de transigdo, em que se percebe a perplexidade ante um futuro desconhecido. Sabe-se que 0 passado ndo volta, especula-se sobre 0 que tomaré seu lugar; mas, sobretudo, tem-se a certeza de que 0 caos ndo serve como substituto. Uma parte substancial dos poemas modernos, em versos livres, nfo perde, mas elabora um “ritmo” que ndo € o mesmo dos poemas tradicionais, em tampouco se confundirs a0 da prosa. Se estamos certos em nossas observacdes. todo um estudo sobre a técnica do verso moderno esté pedindo para ser feito, ¢ 0 seu ponto de partida deverd ser, necessariamente, 0 conhecimento profundo da versificagio tradicional. Nao hé ruptura no Teoria do Verso 201 processo de desenvolvimento de qualquer atividade humana, mas sempre a continuidade surgida da lei natural que manda assimilar 0 antigo para produzir 0 novo, Assim também a atividade literdria: qualquer pocta que se queira realmente moderno tera de conhecer, e bem, todos os estratos da poesia que a tradigfo nos legou; partindo do zero, rompendo com essa {radigfo, corre o risco de criar o eriado, vale dizer: nada eriar, INDICE ANALITICO INDICE DE ASSUNTOS E INDICE DE NOMES Indice de assuntos Acrbstico (ordenagio em), 172. ‘Afastada (rima), 193 ‘Aférese, 17,19. ‘Aguda (rima), 176-177 ‘Aguda (terminacio), 34,43, 176, ‘Agudo (padrio de contagern), 11-13, Ataapdrno (weno), = = antigo, arcaico ou espanhol, 43-46-, 48-49, 123-125. ~ effssico ou francés, 46-49, 125-137, 142, ~ integular, 49, 50, 129-137, = timétrico (romintico, moderno), 50, 138-141. Aliteraglo, v. Reiteragio (nica, Alternadas (rimas) ‘lternfincia intenst ‘Ampliagdo, 23-24 ‘Ampliada (rima), 186-187. ‘Amplificacio, 171-172, ‘Andamento, = silébico e acentual, 2, -8, 61-80. ~ fonico, 8-9, 167-173, ‘Arte mator (verso de), v. Hendecassilabo. ‘Arte maior (versos de}, 152. ‘Arte menor (versos de), 152. Assonincia, 168, 170, 191. Alona (aba), 36. labo (verso), 142. Bindria (alterndncia), 6-8, 61. Bioctossflabo (verso}, 142, Branco (verso), 179, Codénclas, = nag, 2, = sidbica, 145-146, 148, 154-156, Al. Coliteragio, v. Contraste fonico. Sr cms Contigua (rima), 193. Contraste fonico, 169-170. Décima, io a Diistole, 31. is Didsere, 3829, 30, 3 Bea Dirrimica (estsofe), 3, ei 195-196, bee Dodecassilabo (verso), 35, 46-49, 125-142. eee Elementare (vero), $9. Eliséo, 17-22, 25, 26, iirc ce st Encassilabo (verso), 35, 54-57, 98-103. eee Entoagéo, 9, 36, 164, 165, 166. iced ac coed ce Se studs 3, 145-150, ee ta, tease Forte ), ¥. Intensidade, ute ere an 34535,45. Sa nei, Gave, {terminacio), 34,43, 176, {poe labo (verso), 35, 50-53, 114- Heptassilabo (verso), 35, $9, 68, 87-90. ioe Heterométrica (estrofe), 152, 155, 156, 159, 196. 68-169, 184, 197. (ria), 184-186, = acento de, 4-10, = silaba forie, 5,61. = sflaba froca, 6, 61; = sflaba fraquissima, 6, 61, = alteméncia ¢ distribuido intenst 6-8, 35,61, 72-80. Interversal (rina), 167, 174-199. Interna (rima), 197-199, Isométrica (estrofe), 152, 154, 196. Ligagio, 15-16. Lira, 196, Locucio (intensidade da), $. Masculina (rima), 176-177. Membro (de verso), 38-42, Metafonica (rima), 188. Metatética (ima), 189. Métrica, 23 Métrica (célula), 7, ee an, 198, Monorrima, 175, 195, 196. Monorr{mica (estrofe), 1$3, 175, 195. Monossilabo (verso), 35, $9, 62, 80-81. Nero core) 3 See A so Srosibe sz) Ser Se, Oitava rima (real, herdi asin eal Ri pe men pana pee Distico, us 4, 3648, 73, 79, 161-166 Pentasslabo (verso), 35, 59, 64-66, 85486, Perfodo, 1, 145, 149, Postico (discurso), 1. Polirrima, 175, 196-197. Polirrimica (estrofe), 153, Processos de acomodaeio, 14-33, = scomodagdo sildbica, 14, 16-30, = scomodagio scentual, 14, 31-33, Quaterdcia Gltemdnci), 7. Suetrado (eo) 60,3113 Quinteto (quiaina, 151-152, 196. Receita metric, 35, Redondilho maior, v. Heptassabo. Redondilho menor, v.Penassabo, Reitergdo fone, ~studo da > freed 192, ~ r.consonintica, 168, 170, 190-192. mates fonts, TH-17 Ressonincia, v. Eco, Rima, 174.199, ‘somo cadéneia nica, 148, 174-178. indice de reiteragdo {Baten 1735193. sicionamento Fimico, 193195. Séfca(estroe)s 131. Sarco (decassAabo), 36, 105. Seamento (de vero), 37-49, Seen nteniade do. Septsabo (vero), v.HepassMabo, Setiha, v, Sétima, Sétima, 151, 196. Setsflabo (verso), v, Heptassabo. Sexteto Gextitha), 151-182, 196. Shab, ie Simples (verso), 59-60, ‘Sinalefa, 24, 26-28. Soante (rima), 180, 184-193. Solto (verso). 179 Soneto, 194, 196, Terga-tima, 195,196. ‘Tereeto, 151, 175, 195-196. ‘Temata (alternancia), 7-8, 61, Tettadecassilabo (verso), 38, 43-46, 48 49, 123-125, Tetrassfabo (verso), 35, 59, 63, 84-85, Toante (rima), 180-184 ‘Tonica(silaba), 5-6, 74. 207 Transportacao, v. Encadeamento. Tridecassilabo (verso), 35. ‘Triexassilabo (verso), 143. Tripentassilabo (verso), 143, Trietima, 175, 195, 196. Trisimica (estrofe}, 153, 175, 196, Trissilabo (verso), 35, $9, 62-63, 83-86. atetraslabo verso}, 143. ~ apalavra, | be = andamento dos, 61+ = tipologia dos, 81-184, ‘Vocdbulo (intensidade do), 5, Indice de nomes A Abreu, Casimito de: 21, 72, 83. Albuquerque, Medeiros ¢, 134, Alencar, Mario de, 57 ‘Ali, M. Said, 13, Almeida, Guilherme de, 16, 17, 27, 84, 99, 101, 112, 113, 162, 177, 184, 187, 188, 190. Atvarenga, Silva, 91, 124, 198. ‘Atves, Castro, 23, 32, 53, 65, 66, 83, 84, 134,198, Amora, A. Soares, 163. Anchicta, José de, 86. ‘Andrade, Carlos Drummond de, 28, 89, 90, 107, 112, 113, 163. ‘nid, Goulart de, $8,118, 119, 120, ‘Andrade, Mésio de, 85, ‘Anjos, Augusto dos, 8.24, 25, 26, 27, 30, 69, 70,73, 77, 79, 109, 110, 14, 113, 168, 170, 171, 184, 191, 192, ‘Aranha, Carvalho: 101 Araujo, Murillo, $9, 135, ‘Araujo, Paulo, 135. ‘Assis, Machado de, 93, 112. ‘Azevedo. Alvares de, 16, 17, 18, 20, 22, 52, 116, 154, 196. ‘Azevedo Filho, Leodegirio Amarante, 13. B Back, Eurico, 5,6, Balbin, Rfacl de "162, 164 Bandeira, Manuel, 99, 101, 104, 107, 112, 113,130, 137, 180. Barctoy Tobi, 8 18, 20,22, 24, 25,29, 30, 37, $3, 71, 99, 100,117, Buse, Olavo, 12, 13, 18, 19, 21, 22, 25, . 93, 96, 126, 127, 128, 129. 130, 131, 132, 133, 134, 138, 139, 143, 159, 170. Bluteau, $2 Bocage. 22. 28, 46, 65, 88, 98, 109, 110, TT, 113, 125, 158, 177 Bonfim, Pauio, 86,99, 101, 118, 119. Burke, Kenneth, 171 c Camara Jr. J. Mattoso, 15, 23, 163, 164, 165, 185, 186, eS, 28, 104, 108, 110, 111, 113, 146, 147, 168, Campos, Gti 107, 108, 109, 112,113. Cardozo, Joaquim, 41, 68, 69, 72, 77, 78, 86, 107, 110, 111, 183, Carvano, Amorim dey 143) 143, Carvalho; Vicente de, 27.88, 13, 96,118, 119, 132, 133, 134, 136.139 91, 94, 104, 114, 125, Castro, Eugénio de, 26, 58, $9, 99, 126, 154, 136, 137, 14i, 142, Celso, Afonso, 27 Cohen, Jean, 162, 164 Correia, Raimundo, 16, 18, 21, 30, $7, 58, 68, 69, 70, 85, 101, 117, 127, 128, 133, 133, 134, 136, 138,139, 163, 164, 176. Costa, Claudio Manuel da, 38, 66, 67, 79, 87, 113, 149, 181 Costa, José Jamibo ds, 198, Couto Guerreiro, Miguel, 12, Couto, Ribeiro, 65, 67.71, 85, 87, 89, 94, 97, 98, 99, 102, 137, 181 respo, Congas, 24. 25.26.27 a, José Anasticio da, 91, 9 Tristio da, 135, a a et aan. anaa scan Duque-Estrada, Osorio, 95, 96. : nn : roc nn rte Fontes, Hermes, 118, 119, 121, 122. Fontes, ‘Martins, 82, 86, 118, 143, 163. : a, Aristides, 135, Freire, Jungucira, 53, 54, 88, 98, 99, 100, 198 G Gama, Basflio da, 124, Garrett, 18, 21, 22, 93, 155. Goes, Femando, 144 Gonzaga, Tomés Antonio, 88, 155, Grammont, Maurice, 138, 164, Guimaraens, Alphonius de, 25, 58, 59. 71, 72, 78, 84, 94, 97, 98, 99, 102, 103, 109, 112, 115, 134, 141; 158, 188, 169, 171, 172, 188, 189,192 Guimaraens, Eduardo, 82, 143. Guimaries, Bemardo,'113, Guimaraes Ir, Luis, 25, 27, H Haddad, Jamil Alsnansur, 49, 50. Herculano, Alexandre, 147, Honorato, Manvel da Costa 13. Hugo, Victor, 138. 1 Jungueiro, Guerra, 16, 18, 19, 21, 25, "3 93,96, 97,105,148, 19, 120, L Lessa, Aureliano, 19, Lima, Jorge de, $5, $8, 63, 66, 83, 87, 89, 90, 94, 97, 98, 100, 182, 197 Lopes, B., 15, 16, 19. M Macrf, Oreste, 28, Magalhiies, Gongaives de, 155, 157. Mariano, Gtegario, 118, 119, Marques, Oswaldino, 11, 172. Matos, Gregério de, 99, 154, 180, 181, 18 Mattos, Geraldo, 5,6. Meizeles, Cecilia, 62, 65, 66, 67, 72, 77, 83, 84, 87, 89, 90, 94, 97 98, 99, 102, 403,121,422, 128,143,144, 182, Melo, Francisco Manuel de, 113. Melo Neto, Jodo Cabral de, 85, 180, 18: Meneses, Cardoso de, $2. Meneses, Emilio de, 24. Milano, Atilio, 84 Milano, Dante, 37, 39, 41, 66, 69, 73.77, 78, 85, 89, 90, 105, 10, 111, 113, 113,114, Moraes, Vinicios de, 8, Morais, Durval de, 144, Mota, Mauro, 24,'41, 72, 77, 110, 111. N Nobre, Antonio, 101, 120, 121, 122. Nobrepa, Melo, 12, 175, 198. itipe, $2, ° Oiticica, Joss, 25. Oliveira, Alberto de, 18, 21,22, 24, 26, 24,30, 31, 33, 97, 101,"118, 1 120, 139, 131, 132, 133, 134, 138, 139, 140, 143: Otaviano, Francisco, $2. 19, 134 6, P Pacheco, Félix, 19 aes, Teixeira de, 88, Passos, Guimaries, 12, 13, 126, 127, 123, 130, 131. Peixoto, Alvarenga, 85. Pennafort, Onestaldo de, 86, 168. Femeta, Emiliano, $8, 71,140, 111, Pessanha, Camilo, 106, 112, 191. Pfeiffer, Johannes, 2,3. Pimenta, Alfredo, 142. Porto Alegre, Manuel José de Aradjo, $2. Froenga, M. Cavalcanti, 7,76, 103,106, wate 104, 116, 118, rain Ribeiro, Joéo, 27. Ribeiro, Joaquim, 188. Ricard, utano, 68,69, 71,107, 108, 112, 143, 114, 123. s ‘S4Carneiro, Maro de, 69. Siva, Julio Cesar da, 135. Siveira, Sousa da, 13. Siveeg Taso da, 37,72, 107,112, Souss, Joo de Cruz e, 25, 28, 114, 169, 170, 190, 191, 193, Subervile, Jean, 123, 138. T Teles, Gilberto Mendonga, 181, 182, v Varela, Fagundes, 16,17, 20, 22, 23,25, “4345046, 53,59, 67, 82, 87, 98, 2 11S, 117,124, 146, 158,159,168, Verde, Cesirio, 7, 70, 79, 108, 109, 114, 190. Verlaine, 49. Victor Hugo, 138, Vielé-Griffin, Francis, 136. Villaret, Jofo, 28128, Vimioso, Conde do, 86. x Xavier, Fontoura, 24, x Wamozy, Alceu, 135,

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