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Inter-relações entre Estratégia

de Operações e Gestão da Cadeia de


Suprimentos: Estudos de Caso no Segmento
de Motores para Automóveis

Jonas Lucio Maia


Aline Lamon Cerra
Alceu Gomes Alves Filho
Grupo de Estudos sobre a Indústria Automobilística,
Departamento de Engenharia de Produção, Universidade Federal de São Carlos,
Rod. Washington Luiz, Km 235, CEP 13565-905, São Carlos, SP, Brasil,
e-mail: jonasmaia@dep.ufscar.br, alinelc@terra.com.br, alceu@power.ufscar.br

Recebido em 01/7/2005
Aceito em 27/10/2005
v.12, n.3, p.377-391, set.-dez. 2005

Resumo

A Indústria Automobilística no Brasil e no mundo tem passado por um processo de importantes transformações.
Especificamente no Brasil, a instalação de novas montadoras, a consolidação e desnacionalização das autopeças e
fenômenos como a introdução de motores de baixa cilindrada têm trazido implicações estratégicas importantes para
as empresas, assim como para suas cadeias de suprimentos. Considerando estas implicações, este trabalho tem por
objetivo compreender os inter-relacionamentos entre a Estratégia de Operações (EO) e a Gestão da Cadeia de Supri-
mentos (GCS), analisando estudos de caso em duas montadoras de motores instaladas no Brasil e dois de seus forne-
cedores. Os resultados indicam forte inter-relacionamento entre as prioridades competitivas e decisões nas áreas es-
truturais e infra-estruturais das empresas, bem como entre os aspectos estruturais e relacionais das cadeias nas quais
estas estão inseridas. As montadoras estudadas apresentam EOs semelhantes, mas suas prioridades e ações ocorrem
no contexto de diferentes estruturas de cadeias de suprimentos e, conseqüentemente, por meio de diferentes formas de
relacionamento. Dada a influência mútua entre os fatores de EO e GCS, bem como a dependência de escolhas anterio-
res, são conferidas complexidade e relevância estratégica ainda maiores às decisões realizadas em ambas as áreas.
Palavras-chave: estratégia de operações, gestão da cadeia de suprimentos, indústria automobilística brasileira.

1. Introdução
Embora a implementação das práticas e filosofia da Segundo Humphrey e Salerno (2000), novos investi-
“produção enxuta” constitua um marco na indústria auto- mentos em mercados emergentes tornaram-se estratégi-
mobilística mundial, esta tem passado por transformações cos não apenas para montadoras, mas também para os
contundentes que, segundo Salerno et al. (2003), não se fornecedores de primeiro nível e subsidiárias de compa-
restringem ao lean manufacturing. De maneira sucinta, nhias transnacionais. Conseqüentemente, as indústrias
estas mudanças ocorrem em três grandes áreas: reestru- automobilísticas destes países têm sido estruturalmente
turação interna da produção, pela adoção das práticas en- transformadas, tanto no que tange ao número e tamanho
xutas; configuração de novas relações de fornecimento, das empresas quanto ao padrão de relacionamento entre
devido à formação dos blocos de comércio regionais e à elas.
introdução de novos arranjos organizacionais (modular, No Brasil, com a abertura da economia, a indústria au-
condomínio industrial, etc.); e mudanças nas atividades tomobilística passou por uma reestruturação importante
de projeto de produto, por meio das tecnologias CAD/ a partir de 1995, quando diversas montadoras instalaram
CAM/CAE e da introdução do conceito de carro mun- unidades produtivas em regiões sem tradição no setor au-
dial. tomobilístico. Nesse período, as montadoras de automó-
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veis experimentaram um processo de crescimento e in- tua entre os aspectos estruturais e relacionais das cadeias
vestimento, enquanto que as autopeças atravessavam um e as prioridades e decisões da EO?
período de consolidação/desnacionalização (Posthuma, Diante destas questões, o presente trabalho tem por
1997). objetivo compreender os inter-relacionamentos entre a
No contexto da segunda frente de mudanças citada (no- Estratégia de Operações e a Gestão da Cadeia de Supri-
vas relações de fornecimento), Alves Filho et al. (2002) mentos, analisando estudos de caso no setor automobi-
ressaltam o impacto que os investimentos realizados pe- lístico brasileiro, mais especificamente no segmento de
las montadoras têm trazido nos arranjos das cadeias de produção de motores para automóveis. O motor foi aqui
suprimentos e na alteração do padrão de relacionamento escolhido como componente a ser analisado pois: 1) re-
montadora-fornecedor. presenta porção significativa dos custos de produção dos
No período em questão, as montadoras de automó- veículos; 2) tem passado ultimamente por importantes
veis ganharam poder em relação aos fornecedores de au- inovações tecnológicas, por exemplo, motores de 1000 cc
topeças. Com esse poder acumulado e comandando os mais potentes, operação com dois combustíveis, etc.; e 3)
investimentos feitos, as montadoras puderam definir, em é composto por grande número de peças, fornecidas por
grande parte, as configurações das cadeias industriais no várias empresas que compõem a cadeia de suprimentos.
setor. Segundo Alves Filho et al. (2000), as configura- Com base nos estudos de caso, podem-se identificar
ções das cadeias produtivas foram sendo definidas nas eventuais convergências e divergências entre as EOs e
negociações das montadoras com seus fornecedores prin- práticas de GCS adotadas pelas cadeias, bem como bus-
cipais, especialmente nas ocasiões em que novas plantas car ilustrar a dinâmica de interação existente entre ambas
estavam sendo instaladas. as áreas nas empresas estudadas.
Frente a esta transformação, puderam-se observar tam- O artigo encontra-se assim estruturado: inicialmente
bém impactos significativos nas unidades montadoras de é realizada uma revisão bibliográfica acerca dos temas
motores das empresas montadoras de automóveis. Fenô- concernentes ao trabalho, ou seja, Estratégias de Opera-
menos como os motores de 1000 cc e as joint-ventures ções e Gestão da Cadeia de Suprimentos. Posteriormente,
para produção conjunta de motores permitem a constata- descrevem-se o método e a pesquisa de campo realizada
ção de que as montadoras de automóveis no Brasil adota- junto às montadoras de motores e seus fornecedores. Fi-
ram, durante o período, estratégias competitivas distintas nalizando o trabalho, algumas conclusões são indicadas,
e estabeleceram novos tipos de relações com fornecedores assim como são apresentadas possibilidades para futuras
de autopeças, em novas cadeias industriais (Maia e Cerra, pesquisas.
2004a), tendo, por conseguinte, que adotar Estratégias de
Operações (EOs) e práticas de Gestão da Cadeia de Su-
2. Estratégia de operações
primentos (GCS) apropriadas a esses novos contextos.
Contudo, a teoria sobre Gestão da Cadeia de Supri- Diferentes denominações vêm sendo utilizadas, em
mentos está embasada, segundo Alves Filho et al. (2004), momentos diferentes, na literatura sobre Estratégia de
em alguns pressupostos que contemplam, dentre outras Operações (EO): inicialmente, “estratégia de manufa-
questões, a necessidade de que as empresas da cadeia pos- tura”, evoluindo para “estratégia de produção” e, atual-
suam suas estratégias devidamente alinhadas, de modo a mente, para “estratégia de operações”. Estas expressões
enfrentar a competitividade e gerar ganhos para todos os diferentes não decorrem, entretanto, de mudanças nos
seus elos. A Estratégia de Operações, por sua vez, abran- conceitos e fundamentos teóricos, tendo as duas últimas
ge em suas áreas de decisão uma série de aspectos que sido propostas de modo a abarcar as aplicações também
são intimamente ligados à Gestão da Cadeia de Supri- na gestão de serviços, além de na gestão da manufatura.
mentos. Questões como o nível de integração vertical, o É atribuída a William Skinner a elaboração do con-
planejamento e controle da produção, o desenvolvimento ceito inicial sobre este assunto, por meio de seu artigo
de produtos, entre outras, são fortemente influenciadas “Manufacturing – Missing Link in Corporate Strategy”
(ao mesmo tempo que influenciam) por aspectos estrutu- (Skinner, 1969). Para o autor, a relação entre a estratégia
rais, relacionais e estratégicos da GCS. da empresa e a manufatura não era facilmente compre-
Desta forma, considerando a importância econômica endida, embora a política de produção necessitasse ser
do setor automotivo do Brasil, bem como a relevância especificamente projetada para atender às necessidades
das alterações que este setor tem sofrido, ao menos duas definidas como estratégicas.
questões podem ser formuladas: 1) As estratégias de ope- Diversas definições para o conceito de Estratégia de
rações, por meio de suas prioridades competitivas e áreas Operações podem ser encontradas na literatura, cada uma
de decisão, encontram-se consistentemente alinhadas en- enfocando um aspecto particular da gestão de operações,
tre as empresas pertencentes a cada cadeia de suprimen- ou uma escola de pensamento a respeito de estratégia.
tos do setor?; e 2) Até que ponto ocorre a influência mú- Será aqui adotada a definição de Hayes et al. (2004), para
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os quais “a estratégia de operações é um conjunto de ob- As prioridades competitivas variam conforme as di-
jetivos, políticas e restrições auto-impostas que conjunta- ferentes circunstâncias competitivas e a estratégia da
mente descrevem como a organização se propõe a dirigir empresa. Além disso, não há um consenso sobre quais
e desenvolver todos os recursos investidos nas operações, devam ser os conjuntos delas que orientam a implemen-
de forma a melhor executar (e possivelmente redefinir) tação da estratégia de operações.
sua missão”. Segundo Nogueira (2002), um aspecto importante a ser
Na definição acima apresentada, podem ser identi- considerado quando se projeta ou opera um sistema de
ficadas duas orientações estratégicas distintas, porém produção é a necessidade da realização de trade-offs. Va-
complementares. Quando os autores comentam sobre riáveis como custo, qualidade, flexibilidade, entrega e ser-
objetivos e políticas, direcionamento de investimentos e viço ao cliente colocam a administração constantemente
execução da missão, estes se pautam na escola de pla- diante de situações de decisão em que escolhas (por uma
nejamento estratégico – um processo formal e top-down ou por algumas poucas prioridades) são inevitáveis.
que abrange o plano estratégico, tático e operacional A realização de trade-offs está associada às áreas
(Oliveira, 2001). No entanto, quando tratam de restrições de decisão estrutural e infra-estrutural. De acordo com
auto-impostas e redefinição de missão, estes se referem Skinner (1969), o fundamental na tomada de decisão é
às competências estudadas pela visão baseada em recur- garantir que a alternativa selecionada seja apropriada às
sos (RBV - Resource Based View). A RBV advoga que as tarefas da manufatura determinada pela estratégia com-
competências e recursos intangíveis das empresas são as petitiva da empresa.
origens da vantagem competitiva, sendo que tais recursos A proposição da necessidade de realização de trade-offs
e competências desenvolvidos no presente e no passado tem sido responsável por umas das principais controvér-
condicionarão o direcionamento estratégico do futuro sias existentes na literatura relativa ao conceito de estra-
(Collis e Montgomery, 1995). tégia de operações. Como exemplo desta discordância,
Sob a ótica do planejamento estratégico, a Estratégia diversos autores desenvolvem e advogam suas idéias em
de Operações é uma estratégia funcional e, portanto, deve pelo menos três diferentes correntes de pensamento: a
promover sustentação à estratégia competitiva. Dado o visão tradicional, a cumulativa e a integrativa (Boyer e
fato de os elementos que compõem o sistema produtivo Lewis, 2002).
terem de ser concebidos para atingir determinados fins A visão tradicional de trade-offs segue a linha de pen-
e realizar determinadas tarefas, estratégias competitivas samento de Skinner (1969), para quem as escolhas entre
diferentes poderão exigir configurações distintas do sis- enfatizar uma ou outra prioridade competitiva serão ine-
tema de produção. Neste sentido, cada tipo de estratégia vitáveis, nas mais diversas circunstâncias.
demanda certas tarefas da produção e especifica deter- Na visão cumulativa, Ferdows e De Meyer (1990) cri-
minados objetivos, os quais são conhecidos por “priori- ticam a visão tradicional a respeito de incompatibilidades
dades competitivas” e foram inicialmente identificados entre as prioridades competitivas. Esses autores, a partir
por Skinner (1969) como sendo produtividade, serviço, de uma pesquisa que desenvolveram na década de oitenta
qualidade e retorno sobre investimento. em empresas européias, japonesas e norte-americanas,
Em trabalhos subseqüentes, outros autores apresen- verificaram que várias empresas estavam obtendo bons
taram diferentes combinações de prioridades como, desempenhos em algumas das prioridades competitivas
por exemplo, custo, qualidade, confiabilidade e flexi- ao mesmo tempo. Baseados nesta pesquisa, eles puderam
bilidade (Hayes e Wheelwright, 1984; Ward e Duray, propor o “modelo do cone de areia”, em que as capacida-
2000; Kathuria, 2000; Demeter, 2003). A este conjunto, des poderiam ser acumuladas e “construídas” umas sobre
Hill (2000); Slack, Chambers e Johnston (2002) adicio- as outras.
naram uma dimensão relativa à velocidade, e Dangayach Buscando uma combinação das duas visões anteriores,
e Deshmukh (2003) contemplaram ainda o aspecto inova- a visão integrativa prega que os elementos de ambos os
ção. Embora o aspecto velocidade seja aqui considerado, pontos de vista são aplicáveis. O “modelo pivô” de Da
a inovação será tratada como agente facilitador das outras Silveira e Slack (2001), apresentado na Figura 1, é um
prioridades competitivas, possibilitando, por exemplo, exemplo de abordagem integrativa. Para estes autores,
ampliar a flexibilidade de introdução de novos produtos, existem certas escolhas a serem realizadas entre as prio-
reduzir custos por meio do reprojeto de processos, etc. ridades (como os dois extremos de uma gangorra), mas o
Diante destas considerações, o modelo de priorida- acúmulo de competências faz com que todas as priorida-
des aqui adotado é o de Garvin (1993), que apresenta as des competitivas tenham seus níveis absolutos aumenta-
prioridades como sendo custo, qualidade, entrega, flexi- dos (elevando a altura do pivô da gangorra).
bilidade e serviço. Este modelo, com ampla aceitação na Também adotando a visão integrativa, Hayes
literatura, ainda desdobra as prioridades competitivas em et al. (2004) comentam a existência de trade-offs de
várias subprioridades, conforme mostra a Tabela 1. primeiro (impacto no presente) e segundo (impacto no
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Tabela 1. Subprioridades competitivas da produção. Fonte: Garvin (1993).


Prioridades Subprioridades
Custo •  Custo inicial - o preço ou o custo para se adquirir um produto;
•  Custo operacional - o custo para operar ou usar um produto ao longo de sua vida útil; e
•  Custo de manutenção - o custo para manutenção de um produto ao longo de sua vida útil. Inclui pequenos reparos e
reposição de peças.
Qualidade •  Desempenho - as características primárias para operação de um produto ou serviço;
•  Características - as características secundárias de um produto ou serviço;
•  Confiabilidade - a probabilidade de um produto ou serviço falhar durante certo período de tempo;
•  Conformidade - o grau em que um produto ou serviço reúne os padrões preestabelecidos;
•  Durabilidade - o número de vezes que um produto pode ser usado antes de deteriorar-se fisicamente ou não ser viável
economicamente repará-lo;
•  Nível de serviço - depende da velocidade, da cortesia e da competência dos reparos;
•  Estética - a aparência, o sentimento, o gosto, o cheiro e o som de um produto ou serviço; e
•  Qualidade percebida - o impacto da marca, a imagem da empresa e a propaganda.
Entrega •  Precisão - se os itens corretos foram entregues nas quantidades certas;
•  Completude - se os carregamentos (entregas) foram completos na primeira vez ou se houve necessidade de emitirno-
vos pedidos para determinados itens;
•  Confiabilidade - se os produtos foram entregues na data estipulada;
•  Disponibilidade - a probabilidade de ter em estoque certo item no momento da emissão do pedido;
•  Velocidade - o tempo decorrido entre a emissão do pedido e a entrega do produto ao consumidor;
•  Disponibilidade de informação - o grau em que as informações a respeito do transporte estão disponíveis em tempo
real;
•  Facilidade de emissão de pedidos - a maneira como a empresa recebe os pedidos (eletronicamente ou não) e informa
os itens que estão em estoque;
•  Qualidade - a condição do produto após o transporte;
•  Flexibilidade de emissão de pedidos - se há limites estabelecendo o número mínimo de itens por pedido e selecio-
nando os itens de um pedido isolado;
•  Flexibilidade de transporte - a habilidade de modificar o roteiro de entrega para atender a circunstâncias espe-
ciais; e
•  Facilidade de retorno - a disposição de absorver os custos de retorno de um produto e a velocidade com que os re-
tornos são processados.
Flexibilidade •  Flexibilidade de produto
-  Novos produtos - a velocidade com que os produtos são criados, projetados, manufaturados e introduzidos;
-  Customização - habilidade de projetar um produto para atender às especificações de um cliente particular; e
-  Modificação - a habilidade de modificar os produtos existentes para atender a necessidades especiais;
•  Flexibilidade de volume
-  Previsões incertas - a habilidade de responder a súbitas mudanças no volume de um produto requerido pelo mer-
cado; e
-  Aumento de escala de novos processos - a velocidade com que novos processos de manufatura podem variar a
produção de pequenos volumes em grandes escalas;
•  Flexibilidade de processo
-  Flexibilidade de mix - a habilidade de produzir uma variedade de produtos, em um curto espaço de tempo, sem
modificar as instalações existentes;
-  Flexibilidade de substituição - a habilidade de ajustar as mudanças no mix de produtos a longo prazo;
-  Flexibilidade de roteiro - o grau em que a seqüência de fabricação ou de montagem pode ser modificada se uma
máquina ou um equipamento estiver com problemas;
-  Flexibilidade de materiais - a habilidade de acomodar variações e substituições das matérias-primas; e
-  Flexibilidade nos seqüenciamentos - a habilidade de modificar a ordem de alimentação dos pedidos no processo
produtivo, em razão de incertezas no fornecimento de componentes e materiais.
Serviço •  Apoio ao cliente - a habilidade de atender o cliente rapidamente pela substituição de peças defeituosas ou de reabas-
tecimento de estoques para evitar paradas para manutenção ou perdas de vendas;
•  Apoio às vendas - a habilidade de melhorar as vendas por meio de informações em tempo real sobre a tecnologia, o
equipamento, o produto ou o sistema que a empresa está vendendo;
•  Resolução de problemas - a habilidade em assistir grupos internos e clientes na solução de problemas, especialmente
em áreas como desenvolvimento de novos produtos, projetos, considerando a manufaturabilidade e a melhoria da
qualidade; e
•  Informação - a habilidade de fornecimento de dados críticos a respeito de desempenho de produto, parâmetros de
processo e custos para grupos internos, tais como P&D, e para clientes que então utilizam os dados para melhorar
suas próprias operações ou produtos.
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futuro) graus. Desta forma, as escolhas estratégicas reali- áreas de decisão: planta e equipamento, planejamento e
zadas no presente não somente direcionarão as operações controle da produção, mão-de-obra e estrutura adminis-
hoje, mas condicionarão as possibilidades de estratégias trativa, projeto do produto/engenharia, e organização e
no futuro, em um fenômeno conhecido como “dependên- administração.
cia de trajetória” (do inglês, path dependence). A partir da proposição de Skinner, Hayes et al. (1988)
Assim, pode-se considerar que os trade-offs continu- propuseram uma nova classificação (representada na Ta-
am sendo um elemento importante na teoria a respeito bela 2), com dez áreas de decisão, agrupadas sob duas
da estratégia de operações, embora tenham ocorrido, nos categorias: estruturais e infra-estruturais. As decisões
últimos trinta anos, significativas mudanças tecnológicas, estruturais possuem impactos a longo prazo, sendo di-
surgido novas demandas da sociedade, mudado os perfis fíceis de serem revertidas ou modificadas e exigem vul-
dos consumidores e ocorrido ainda outras mudanças no tosos investimentos de capital. As decisões de natureza
ambiente que afetaram o projeto e a operação dos siste- infra-estruturais estão relacionadas a aspectos mais ope-
mas produtivos e, assim, a natureza e os tipos de objeti- racionais do negócio, possuindo resultados tanto a curto,
vos da produção. como a médio e a longo prazo.
As prioridades competitivas refletem necessidades O corpo teórico de estratégia de operações até aqui
da estratégia competitiva e apontam para determinados apresentado é fortemente pautado pela teoria de plane-
objetivos a serem atingidos pelo sistema produtivo. Para jamento estratégico. No entanto, segundo Schroeder
esses objetivos serem alcançados, é necessário o desen- et al. (2002), a visão baseada em recursos pode abordar
volvimento de um padrão de ações relacionadas a um várias das deficiências desta abordagem tradicional de
conjunto de áreas de decisões. Em seu trabalho inicial, estratégia de operações.
Skinner (1969) exemplificou escolhas possíveis em cinco Sob a ótica da RBV, a estratégia de operações com-
preende “decisões sobre, e o gerenciamento estratégico
de: competências, capacidades e processos; tecnologia;
Prioridade recursos; e atividades táticas chave necessárias em qual-
Competitiva A Prioridade quer rede de suprimentos, de forma a criar e entregar
Prioridade Competitiva B
Competitiva A produtos ou serviços exigidos pelo consumidor. O papel
estratégico envolve combinar estes ‘blocos básicos’ em
Prioridade
Competitiva B uma ou mais arquiteturas estratégias únicas e específicas
Competências
Adicionais
à organização” (Lowson, 2003: 538).
Neste contexto, três grandes frentes de pesqui-
sa dentro da literatura de operações têm se amparado
Figura 1. Modelo de pivô dos trade-offs. Fonte: (adapta- na RBV para buscar desenvolvimento de novas teorias
do de Da Silveira e Slack, 2001). (Gagnon, 1999):

Tabela 2. Áreas de decisão em estratégia de produção. Fonte: adaptada de Hayes et al. (1988).
Áreas de decisão Decisões a serem tomadas
Decisões Estruturais
Capacidade A capacidade de produção total a ser provida.
Instalações O número de plantas, a localização e a especialização de cada planta necessária para se atingir o volu-
me de produção desejado.
Tecnologia Os tipos de equipamentos e sistemas a serem utilizados em cada unidade, o grau de automação do
processo e a forma de ligação entre as plantas.
Integração vertical Os materiais, sistemas e os serviços a serem providos internamente e aqueles que devem ser fornecidos
por terceiros (e também o tipo de relacionamento a ser desenvolvido com os fornecedores).
Decisões Infra-estruturais
Recursos humanos As políticas e as práticas de recursos humanos, incluindo administração, seleção e treinamento.
Qualidade Os sistemas de controle e garantia da qualidade (prevenção de defeitos, monitoramento, intervenção).
Planejamento e controle da Sistemas de planejamento da produção e controle de estoque, políticas de fornecimento, regras de
produção/materiais decisão.
Novos produtos O processo de desenvolvimento de novos produtos.
Medidas de desempenho Indicadores de desempenho e sistemas de recompensa incluindo sistema de alocação de capital.
Organização A estrutura organizacional, sistemas de controle e remuneração, papel dos grupos de staff.
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•  O papel ativo da produção na estratégia - a abordagem no ocidente, com a difusão do novo padrão de relacio-
baseada em recursos tem sido vista como uma forma namento entre montadoras e fornecedores da indústria
de conferir aspecto pró-ativo à produção, em lugar de automobilística japonesa (Alves Filho et al., 2004).
meramente suportar a estratégia competitiva definida Antes de buscar uma definição para a Gestão da Ca-
pela empresa. Para Hayes e Pisano (1996), as compa- deia de Suprimentos (GCS), é necessário compreender
nhias que obtêm sucesso a longo prazo o fazem sendo qual o objeto que será gerido por estas práticas. Segun-
capazes de desempenhar certas coisas melhor que seus do Chopra e Meindl (2003), uma cadeia de suprimentos
competidores. Desta forma, como a maioria das compe- engloba todos os estágios (clientes, varejistas, distribui-
tências críticas de uma companhia reside na produção, dores, fabricantes e fornecedores) envolvidos, direta ou
tem-se um aumento de sua importância no desenvolvi- indiretamente, no atendimento de um pedido ao cliente.
mento da estratégia competitiva; Pode ser vista, de acordo com Lumus et al. (1998), como
•  A questão dos trade-offs - a maior parte das pesquisas
uma rede de entidades que abrange todo o fluxo de mate-
se concentra no caráter dinâmico das prioridades com-
riais e informações.
petitivas, tanto buscando explicar como capacidades e
Esta cadeia de empresas, enxergada como um conjun-
to, traz uma série de desafios para as práticas gerenciais
competências parecem alterar as relações de trade-off
tradicionais. O forte controle hierárquico, anteriormen-
quanto tentando retratar o reflexo que as escolhas dos
te exercido pela Integração Vertical, não é mais factível
trade-offs terão no futuro da estratégia de operações da
na situação em que empresas distintas detêm a operação
empresa; e
de diferentes etapas do processo produtivo, acumulando
•  A implementação das práticas de classe mundial - Hayes competências inerentes a tais etapas e necessitando traçar
e Pisano (1994) destacam que a estratégia de operações estratégias para servir seus vários clientes.
não deve ceder lugar à simples implementação destas Neste novo contexto de relações, surge a Gestão da Ca-
práticas, como se estas constituíssem panacéia para to- deia de Suprimentos. Segundo Pedroso (2002:21), a GCS
dos os problemas das empresas. Ao contrário, os auto- pode ser definida como “a integração dos principais pro-
res defendem que tais programas e práticas devem ser cessos que gerenciam os fluxos bidirecionais de materiais
implementados como passos consecutivos no caminho e informações no âmbito intra-empresa e entre empresas
de uma direção estratégica desejada. Desta forma, a participantes da cadeia de suprimentos, até atingir os con-
estratégia de operações deve buscar construir compe- sumidores finais, cujo objetivo principal é agregar valor aos
tências que serão necessárias para a empresa no futuro. acionistas e aos clientes ao longo destes processos”. Este
Programas como TQM (Total Quality Management), conceito atual tem trazido interessantes contribuições para
JIT (Just In Time) e outros não devem ser vistos como as indústrias, sobretudo a automobilística (Pires, 1998).
fins, mas como programas de melhoria da produção que Segundo Cooper et al. (1997) e Tan (2002), a GCS en-
desenvolverão habilidades e capacidades para a empre- volve a integração dos processos de negócios por meio da
sa distinguir-se competitivamente a longo prazo. cadeia de suprimentos, abrangendo a coordenação de ati-
É também importante considerar que a função ope- vidades e processos não apenas dentro de uma organiza-
rações e, conseqüentemente, a estratégia que pauta suas ção isolada, mas entre todas as que compõem a cadeia de
decisões provêem significativa contribuição aos diversos suprimentos. A GCS baseia-se na idéia de que empresas
processos de negócios que existem dentro das empresas. devem estar estratégica e holisticamente integradas com
Embora esta perspectiva de processos seja relevante tam- os seus fornecedores e clientes (Pires, 2001).
bém em EO, preferiu-se apresentar este aspecto na pró- Embora cada empresa da cadeia tenha seus clientes
xima seção (sobre GCS), considerando-se as limitações diretos, a cadeia como um todo, cumulativamente, agre-
de espaço para este artigo e a importância ainda maior ga valor ao produto/serviço que será entregue ao cliente
destes processos no funcionamento das cadeias de supri- final. Desta forma, o objetivo da Gestão da Cadeia de Su-
mentos. primentos é maximizar a sinergia entre todas as partes da
cadeia, a fim de atender o cliente final da maneira mais
eficiente possível. Para Alves Filho et al. (2001), o objeti-
3. Gestão da Cadeia de Suprimentos vo é tornar os processos de negócio mais eficientes e efi-
(Supply Chain Management)
cazes, reduzindo custos, níveis de estoque, melhorando a
Os esforços para o desenvolvimento de abordagens qualidade e criando vantagem competitiva e valor para a
para o estudo de cadeias de suprimentos são relativamente cadeia de suprimentos.
recentes. Apenas no início da década de 90, lastreado pelo O foco na satisfação do cliente final impõe desafios
amplo desenvolvimento da logística, o assunto começa de integração, visibilidade e coordenação entre todas as
a ser sistematicamente tratado em periódicos científicos empresas. Flutuações na demanda final, associadas a um
nas áreas de Administração e Engenharia de Produção fluxo deficiente de informações entre as empresas, pos-
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suem seus impactos amplificados conforme se caminha a Para Ballou (1999), o aumento do interesse pelas rela-
montante na cadeia (fato conhecido como efeito “chico- ções de parceria deve-se ao fato de não existir mais a pos-
te”) (Slack et al., 2002). Embora o efeito “chicote” seja sibilidade de uma única empresa ter todo o controle do
relevante e um bom exemplo didático, uma série de ou- fluxo dos produtos ou serviços, da fonte da matéria-prima
tros problemas pode ser originada pelas dificuldades de ao consumo final. As relações de parceria buscam inte-
integração e relacionamento entre empresas. grar empresas distintas, responsáveis por diferentes eta-
Desta forma, um dos princípios norteadores da GCS pas do processo produtivo, em um modelo de integração
é “assegurar maior visibilidade dos eventos relacionados alternativo à hierarquia da Integração Vertical.
à satisfação da demanda, com o objetivo de minimizar Buscando uma definição para o conceito de parceria,
os custos das operações produtivas e logísticas entre Lamming apud Slack et al. (2002:433) apresenta parceria
empresas, constituintes do fluxo de materiais, compo- como um padrão de relacionamento pautado “no com-
nentes e produtos acabados” (Christopher, 1998; Han- partilhamento de riscos e recompensas de tecnologia e
dfield e Nichols, 1999; Chopra e Meindel, 2003 apud inovação, levando à redução de custos, ao aprimoramen-
Assumpção, 2003:346). to na entrega e na qualidade e à ampliação de vantagem
Alves Filho et al. (2004) sintetiza os principais pressu- competitiva”.
postos da GCS, agrupados em quatro subconjuntos rela- Os relacionamentos de parceria, segundo Mchug
cionados, respectivamente, 1) ao ambiente competitivo; et al. (2003), guardam alguns aspectos comuns como,
2) ao alinhamento estratégico das organizações e à repar- por exemplo: relacionamento de longo prazo baseado
tição dos ganhos; 3) à estrutura da cadeia; e 4) às relações em confiança mútua e em cooperação mais do que em
entre as empresas da cadeia. competição; forte interesse do fornecedor pela qualidade
O primeiro subconjunto de pressupostos se refere à ma- dos produtos que são entregues; e cooperação visando o
neira pela qual as companhias e os pesquisadores percebem aumento de desempenho dos fornecedores.
o ambiente competitivo. Segundo (Christopher, 1998), tal A confiança mútua, um dos requisitos para o estabele-
ambiente passou por um processo de reestruturação, de cimento de parcerias, é fortemente condicionada por ou-
forma que a competição agora ocorre entre cadeias intei- tro pressuposto da Gestão da Cadeia de Suprimentos: as
ras, e não mais entre empresas isoladas. relações de longo prazo. Relações de longo prazo podem
O segundo grupo de pressupostos deriva do primei- implicar ligações de confiança entre as empresas, na me-
ro. Se agora a competição ocorre entre cadeias inteiras, dida em que as transações ocorrem reiteradamente entre
as companhias devem ter suas estratégias alinhadas, de os diversos elos da cadeia (Maia e Cerra, 2004a).
forma que ações individuais gerem ganhos para toda a Considerando o que foi exposto nessa seção, pode-se
cadeia. A contrapartida do alinhamento estratégico seria concluir que a Gestão da Cadeia de Suprimentos é um
uma distribuição de ganhos equânime entre as empresas, conceito com caráter fortemente estratégico e, conseqüen-
de acordo com os esforços e investimentos feitos por temente, as empresas necessitam acompanhar o desem-
cada uma. penho de seus processos de GCS. Contudo, a medição de
O primeiro e o segundo conjunto de pressupostos pos- desempenho na cadeia é ainda um campo em desenvol-
suem relação imediata com os objetivos deste trabalho. A vimento, no qual diversos autores realizam proposições
alteração no padrão de competição e a necessidade de ali- enfocando aspectos específicos. Como exemplos, têm-se:
nhamento estratégico possuem impacto direto nas estra- enfoque em custos (Damme e Zon, 1999), eficiência na
tégias competitivas e, conseqüentemente, na estratégia de utilização de recursos, saídas/serviços aos clientes e fle-
operações implementada por cada companhia da cadeia. xibilidade às mudanças do ambiente (Beamon, 1999),
O terceiro subconjunto contempla aspectos relativos níveis de estoque, tempo, atendimento aos pedidos, qua-
à estrutura, isto é, o papel que cada companhia e cada lidade, foco no cliente, satisfação dos clientes (Ramdas e
unidade produtiva deve desempenhar dentro das cadeias. Sperkman, 2000).
Ele inclui a existência de um número agora relativamente As duas seções anteriores buscaram realizar uma sín-
pequeno de fornecedores hierarquizados, a integração de tese teórica a respeito dos temas envolvidos nesse tra-
processos e atividades por meio da cadeia, a ocorrência balho, ou seja, Estratégia de Operações e Gestão da Ca-
de um fluxo bidirecional eficiente de materiais e informa- deia de Suprimentos. Seus elementos constituintes - as
ção e a realização de esforços por parte de cada empresa prioridades competitivas e as áreas de decisão da EO, e
para reduzir sua própria complexidade (reduzindo assim as questões estruturais, relacionais e de alinhamento da
a complexidade da cadeia como um todo). GCS - possuem relações (entre si) que ainda precisam
O quarto grupo se refere às relações entre as compa- ser identificadas e discutidas para o desenvolvimento de
nhias que fazem parte da cadeia de suprimentos. Ele lida uma gestão estratégica das operações em cadeias de su-
com o estabelecimento de relações cooperativas e de lon- primentos. Algumas destas relações serão empiricamente
go prazo, assim como parcerias entre as empresas. analisadas na pesquisa descrita em seguida.
384 Maia et al. − Inter-relações entre Estratégia de Operações e Gestão da Cadeia de Suprimentos: Estudos de Caso...

4. Método de pesquisa 5. Estudos de caso


A estratégia de pesquisa adotada foi o estudo de caso,
dado em que se ambicionava verificar, empiricamente, 5.1 Apresentação das empresas
convergências e divergências entre EOs e práticas de Os estudos de caso foram realizados em duas mon-
GCS, bem como ilustrar a dinâmica de interação existen- tadoras de motores para automóveis e em dois de seus
te entre ambas as áreas em empresas do segmento de mo- fornecedores. De forma a não identificá-las, elas serão
tores para automóveis. A escolha desta abordagem está aqui chamadas de montadoras “A” e “B” e fornecedores
em concordância com as proposições de Yin (1994:23), “C” e “D”.
pois se desejava “investigar um fenômeno atual dentro do A montadora “A” produz motores para automóveis
seu contexto real, quando as fronteiras entre o fenômeno (motores 1.0 a 1.6), envolvendo uma grande diversidade
e o contexto não são claramente definidas e utilizando-se de produtos. Trabalha em 3 turnos de produção, sendo
várias fontes de evidência”. que o terceiro turno produz metade da produção dos de-
A pesquisa de campo, tendo sido realizada por meio mais. Cada turno tem a capacidade de produzir 600 mo-
de estudos de caso, utilizou-se de um método qualita- tores, mas produz 550 devido ao mix de produção. Desta
tivo, de pesquisa descritiva (ou exploratória). Segun- forma, a planta possui capacidade de produção aproxi-
do Lazzarini (1997), os métodos denominados qualitati- mada de 38 mil motores por mês, sendo que exporta por
vos caracterizam-se por um foco maior na compreensão volta de 3000 motores/mês.
dos fatos que propriamente na sua mensuração. Eles são A montadora “B” lida com motores de baixa e mé-
empregados, de acordo com Richardson (1985), em ca- dia cilindradas (motores 1.0 a 1.8). Na subsidiária bra-
sos em que a riqueza dos detalhes é mais relevante do sileira, a fabricação de motores divide-se em três áreas:
que as informações quantitativas. a) usinagem do bloco motor, virabrequim e cabeçote;
A técnica de obtenção de dados empreendida foi a b) montagem final; e c) manutenção e trocas de ferramen-
entrevista, que, segundo Selltiz et al. (1967:273) apud tas. Existe um Sistema Integrado da Qualidade, pelo qual
Gil (1999), “é bastante adequada para a obtenção de in- monitora-se a montagem de um motor desde a usinagem
formações acerca do que as pessoas sabem, crêem, es- da primeira peça até o encarroçamento do motopropulsor
peram, sentem ou desejam, pretendem fazer, fazem ou no veículo. Possui capacidade instalada para a produção
fizeram, bem como acerca das suas explicações ou razões de aproximadamente 55 mil motores por mês, em três tur-
a respeito das coisas precedentes”. Com este intuito, fo- nos, e 50 mil transmissões/mês, também em três turnos.
ram conduzidas entrevistas semi-estruturadas, de cerca O fornecedor “C” produz embreagens para veículos
de uma hora cada, em duas montadoras de motores para de passeio, veículos pesados e agrícolas. As duas plantas
automóveis e em dois de seus fornecedores, seguindo-se instaladas no Brasil, trabalhando em três turnos, possuem
um roteiro previamente formulado a partir da revisão da capacidade para produzir 14.000 embreagens por mês,
literatura. englobando tanto a produção para a montadora quanto
Nas empresas, as pessoas entrevistadas foram aque- para o mercado de reposição.
las ligadas à gestão da produção, qualidade, produtos e O fornecedor “D” produz peças fundidas, como carca-
de processos, além de diretores industriais e gerentes de ças de transmissão, carters de óleo e agregados para mo-
compras. tores (suporte para compressor do ar condicionado, tam-
Para analisar as Estratégias de Operações (EOs) fo- pa de cabeçote, etc.). O processo produtivo é basicamente
ram consideradas as informações obtidas a respeito das composto por três etapas: fundição, usinagem e monta-
prioridades competitivas e das características das áreas gem. Tem capacidade para produção de até 1300 tonela-
estruturais e infra-estruturais dessas empresas. A análise das em peças/mês, trabalhando em três turnos.
da Gestão da Cadeia de Suprimentos (GCS), por sua vez, Para a compreensão da organização das cadeias, é ne-
se baseou em informações acerca da estrutura das cadeias cessário ressaltar que o fornecedor “C” produz compo-
e das relações entre as empresas que as compõem. nentes para a montadora “A”, mas somente atua em peças
A partir da análise das EOs das montadoras e de seus de reposição para “B”. O fornecedor “D” fornece para a
fornecedores, pôde ser investigado o alinhamento es- montadora “B”, mas não para “A”.
tratégico da cadeia, comparando aspectos competitivos
enfatizados pelas empresas e compatibilidade de suas 5.2 Estratégia de operações
decisões estruturais e infra-estruturais. Em um passo se- De forma a caracterizar o conteúdo das Estratégias de
guinte, o exame dos aspectos estruturais e relacionais das Operações empreendidas pelas companhias analisadas,
cadeias permitiu identificar se estes influenciam (e são foram levantadas as principais variáveis referentes às
influenciados por) as questões do âmbito da Estratégia prioridades competitivas e às áreas de decisão estrutu-
de Operações. rais e infra-estruturais. Alguns destes aspectos (principal-
GESTÃO & PRODUÇÃO, v.12, n.3, p.377-391, set.-dez. 2005 385

mente os estruturais) constam das apresentações acima 5.3 Gestão da Cadeia de Suprimentos
realizadas, enquanto que os outros são sintetizados na Com o intuito de caracterizar a Gestão das Cadeias de
Tabela 3. Suprimento analisadas, foram levantadas as principais

Tabela 3. Características relevantes da Estratégia de Produção nas montadoras e fornecedores.


Montadora de Motores Montadora de Motores Fornecedor “C” Fornecedor “D”
“A” “B”
Prioridades Flexibilidade, Custo e Flexibilidade, Custo e Flexibilidade, Custo, Qua- Entrega e Custo.
competitivas Entrega. Qualidade. lidade e Entrega.
Gestão da Certificada em ISO 9002, Certificada em ISO 9002, Certificados em ISO 9001, São certificados em
qualidade QS 9000, ISO 14001, QS 9000, ISO TS 16949, e ISO TS 16949 e ISO ISO 9001 e ISO TS 16949.
além de normas do país de ISO 14001. 14001.
origem da empresa. Está
em vias de se certificar em
TS 16949.
FMEA, PFMEA, CEP, Utilizam MASP, Engenha- Possui inspeção ao longo
Utilizam ferramentas como
pontos de verificação den- ria Estatística, TPM, CEP, do processo, e utiliza técni-
FMEA, CEP, PDCA
tro do processo e programa Auditoria de Processo, cas como MASP, poka- 8D e reuniões para resolu-
de sugestões. FMEA, e Programa de yoke e kaizen. Iniciam ção de problemas.
Sugestões. projeto para implementar
Iniciam projeto para imple-
6-sigma. mentar 6-sigma.
Gestão da Possui autonomia frente Possui autonomia frente Detém a tecnologia de O projeto inicial do produ-
tecnologia e à matriz no exterior para à matriz no exterior para produto e de processo de
to é fornecido pelas monta-
desenvolvimento desen-volvimentos incre- desenvolvimentos incre- produção de embreagens.doras. A empresa contribui
de produtos mentais nos motores. mentais nos motores. no sentido de adequá-lo à
produção.
Os motores bi-combustível Os motores bi-combustível Inovações incrementais em Possuem grande autono-
e para exportação são os são o mais recente desen- produtos surgem de especi- mia de desenvolvimento
mais recentes desenvolvi- volvimento. ficações de clientes. frente à matriz interna-
mentos. cional.
180 pessoas em DP de 163 pessoas
motores. em DP de motores.
Organização Existem 7 grupos de traba- Existem 7 células, cada Existem 11 células, e a Células com 1 ou 2 opera-
do trabalho lho, tendo cada um de 8 a uma com 12 operários. empresa possui condições dores. Não existe rodízio
12 pessoas (um monitor e Cada uma possui líder de montar novas, caso programado, mas isto
um líder). definido. necessário. ocorre devido ao mix de
Ocorre rodízio, por fatores produção.
ergonômicos e psíquicos.
Recursos Aproximadamente Aproximadamente 230 Aproximadamente Aproximadamente
humanos 450 funcionários. mensalistas e 1500 horis- 300 funcionários, mais 420 funcionários.
tas. 50 terceiros.
Identificaram necessidade O número tem se reduzido Pretende ampliar o treina- Tem ocorrido incentivo a
de treinamento comporta- nos últimos 10 anos. mento interno. cursos de formação.
mental.
Planejamento Recebe pedidos mensais, Recebe pedidos semanais Fornecedor recebe infor- O PCP se baseia nos
e controle da revistos diariamente. Re- (fixo para a semana e pre- mações semanais, com pedidos (fixo para mês
produção cebe também estimativas visão para 6 meses) previsão para 6 meses. corrente e previsão para de
para próximos 3 meses. 3 a 6 meses).
Estoque mínimo de 2 dias. Estoque mínimo é de 1,5 Empresa trabalha com Estoque mínimo de 4 dias
dia para produtos nacionais 2 dias de estoque.
e 30 para importados
Logística dos Opera em milk run com a Existem fornecedores Opera em Kanban, com Opera com Kanban, à ex-
materiais maioria dos fornecedores, dentro da fábrica. todo o transporte é realiza- ceção de uma montadora,
e uma empresa terceiri- Todas as atividades logísti- do por empresa terceira, à com quem opera JIS (Just
zada é responsável por cas são terceirizadas. exceção de uma montado- In Sequence).
realizá-lo. Existe centro de consolida- ra, com quem realiza milk Fornecedores entregam
ção perto de fornecedores run. na empresa, e a empresa
distantes. entrega às montadoras.
386 Maia et al. − Inter-relações entre Estratégia de Operações e Gestão da Cadeia de Suprimentos: Estudos de Caso...

variáveis referentes à estrutura das cadeias (clientes, nú- 6. Análise dos casos
mero e porte de fornecedores, componentes terceiriza- Com base na análise das prioridades competitivas
dos, critérios de seleção/avaliação e exclusividade de for- adotadas pelas empresas, têm-se os primeiros pontos
necimento,) e às relações entre empresas (existência de de discussão. Primeiro, as prioridades das montadoras
contratos, desenvolvimento conjunto e relacionamento de motores parecem ser extremamente próximas, sendo
com fornecedores não-diretos). Estas informações estão flexibilidade e custo as dimensões competitivas mais
sintetizadas na Tabela 4, de forma a permitir a compara- valorizadas por ambas. Entrega, prioridade citada por
ção entre elas nas diversas áreas estudadas. “A”, mas não por “B”, também é fortemente condiciona-

Tabela 4. Características relevantes da Gestão da Cadeia de Suprimentos nas empresas.


Montadora de Montadora de Fornecedor “C” Fornecedor “D”
Motores “A” Motores “B”
Principais clientes A montadora de automó- As unidades montadoras As montadoras de motores No Brasil, grandes monta-
veis. de automóveis. e mercado de reposição doras.
60% p/ exportação.
Número de for- 130. Diversidade de pro- 80. O número diminuiu 80 para as duas plantas do 2 atuais, e um desenvolvido
necedores diretos dutos gerou aumento no nos últimos anos. Brasil. em stand-by.
(aprox.) número.
Porte dos princi- 70% dos Quase todos os forne- Grande para aço e fundi- Grande
pais fornecedores fornecedores são cedores são de grande dos. Menor para minute-
de grande porte. porte. rias.
Fornecedores Não há. Não há. Um fornece, mas há 3 de- Não há.
exclusivos senvolvidos.
Componentes Terceiriza componentes Terceiriza compo-nentes Terceirizam a produção de Terceirizam a produção de
terceirizados que não são considerados que não tecnologica- molas. moldes e ferramentaria.
tecnologicamente estraté- mente estratégicos.
gicos. Faz internamente a usi-
Faz a usinagem inter- nagem do bloco motor,
namente e terceiriza a virabrequim e cabeçote.
fundição.
Seleção e Avalia- Custo, capacitação tecno- Qualidade, custo, Custo. Qualidade, Custo,
ção de Fornece- lógica e qualidade. capacitação Capacidade e Condição
dores tecnológica e relação Financeira.
comercial. Exigem sistema de qualida-
de, independente da norma
usada.
Contratos com Contratos Informais. Contratos formais de um Contratos formais.
ano. (renováveis) -
fornecedores
Desenvolvimento Realiza para alguns com- Realiza para alguns Detém a tecnologia de Trabalham em “Enge-
em conjunto de ponentes: componentes: produto e de processo de nharia Simultânea” com
produtos •  Sistema Blowby (desen- •  sistemas de injeção produção de embreagens. os clientes, pois o design
(co-design) volvido com um forne- (desenvolvidos com for- Assim atua em co-desing inicial é fornecido por eles,
cedor); necedores); e com a montadora quando e refinado em conjunto.
•  motor a gás (desenvol- •  motor bi-combustível ocorre necessidade de
vido com empresa espe- (desenvolvido com for- desenvolvimentos para
cializada); e necedores). novos motores.
•  motor bi-combustível
(com fornecedores).
Relações com A montadora se relaciona A montadora se relacio- Relaciona-se somente com Relaciona-se somente com
outros elos da com clientes e fornecedo- na apenas com clientes e os fornecedores imediatos. os fornecedores imediatos,
cadeia de supri- res diretos. fornecedores diretos. pois os de segunda camada
mentos são muito maiores que a
Pode comprar material e empresa.
consigná-lo aos fornece-
dores.
GESTÃO & PRODUÇÃO, v.12, n.3, p.377-391, set.-dez. 2005 387

da pelo aspecto da flexibilidade, uma vez que ambas as custos, mas devem se acautelar do esvaziamento de suas
empresas estão inseridas em um mercado extremamente competências.
dinâmico. Vale ressaltar que, na indústria automobilística, a deci-
Algumas diferenças podem ser notadas na relação en- são de comprar um determinado componente não necessa-
tre prioridades competitivas das montadoras e dos for- riamente implica não projetá-lo, já que em determinados
necedores. Na relação montadora “A” - fornecedor “C”, casos as montadoras cedem o design dos componentes
parece haver relação direta entre as prioridades das duas para que os fornecedores os produzam, assim como ocor-
empresas, mas tal fato parece não ser verificado na rela- re na relação montadora “B” - fornecedor “D”.
ção montadora “B” - fornecedor “D”. Esta diferença en- A organização do trabalho e a gestão de recursos hu-
tre prioridades competitivas pode ser explicada, em parte, manos também possuem papel estratégico relevante nas
pela característica de estabilidade do produto fornecido empresas analisadas. Todas as empresas analisadas ado-
(não sujeito a drásticas alterações, e de conteúdo tec- tam arranjo celular na produção, devendo-se destacar
nológico reduzido) e do seu processo de obtenção, com que a montadora “A” possui rodízio programado, fato
complexidade relativamente baixa. Além disso, deve-se que ocorre (embora não intencionalmente) no fornece-
considerar que os volumes de peças transacionadas entre dor “D” também. Tal rodízio permite que os funcionários
“A” e “C” são significativamente mais elevados que os dominem mais etapas do processo produtivo, podendo
volumes envolvidos nas trocas entre “B” e “D”. substituir outros operadores no caso de faltas e, dessa
Ainda relativo às prioridades dos fornecedores, deve- forma, garantir o aspecto de entregas.
se ressaltar que ambos mencionam o aspecto da “entre- Durante a pesquisa, pôde-se verificar que as empresas
ga” como uma das dimensões valorizadas. Tal fato, se- analisadas possuem estruturas organizacionais enxutas, fato
gundo os entrevistados, é decorrente das pesadas multas que, além de gerar reduções nos custos fixos, possibilita de-
impostas pelas montadoras para casos de parada de linha cisões mais velozes, ampliando flexibilidade e entrega.
por motivos de falta de componentes. A seleção/avaliação dos fornecedores também é for-
A qualidade ou não foi citada como prioridade, ou não temente influenciada pelos aspectos competitivos valo-
foi considerada como prioridade máxima, possivelmente rizados pela montadora de motores, dado que as com-
devido à percepção de que as empresas constituintes das petências dos fornecedores têm grande impacto no
cadeias automotivas já apresentam “nível satisfatório” de desempenho desta última. Assim, custo e qualidade estão
qualidade. Este “nível”, compartilhado pela maioria das presentes praticamente nas respostas de todas as empre-
empresas, é refletido na gestão da qualidade das empre- sas, enquanto capacitação tecnológica – fator que forte-
sas analisadas, pois estas empresas são certificadas prati- mente reflete na flexibilidade de produto e processo, além
camente pelas mesmas normas e adotam ferramentas da de permitir reduções de custo (Maia e Cerra, 2004b) – é
qualidade muito próximas umas das outras. valorizada principalmente pelas montadoras.
A flexibilidade, aspecto mais valorizado por ambas O planejamento e controle da produção e a logística
as montadoras, possui impactos na estrutura e padrão também apresentam características que oferecem suporte
de relacionamento entre as empresas da cadeia de supri- às prioridades competitivas das empresas. Nas montado-
mentos. Dada esta necessidade, a escolha estratégica das ras, previsões revistas semanalmente lhes conferem (que
montadoras foi desenvolver relacionamentos mais estrei- solicitam dos fornecedores) flexibilidade de mix e volu-
tos com um menor número de grandes empresas e repas- me, ao passo que os estoques também garantem certa fle-
sar a busca pela flexibilidade a estes fornecedores. xibilidade (proteção contra flutuações de demanda), não
Além disso, a priorização de custo também possui onerando muito os custos, por serem reduzidos. Tal fato
impacto na escolha realizada pelas empresas quanto ao também se verifica no fornecedor “C”, enquanto que no
relacionamento dentro da cadeia. A montadora “A”, de- fornecedor “D” os pedidos são fixos para um mês.
vido à dimensão competitiva custo, opta também por se O projeto de sistemas logísticos, além de influenciado
relacionar com alguns fornecedores “não imediatos” a pelas prioridades, também é influenciado por questões de
fim de utilizar seu maior poder de barganha na compra localização das empresas. A terceirização, verificada em
de materiais que, depois, são repassados a empresas por todas as empresas, conferiu reduções de custo. A monta-
meio do regime de consignação. dora “A” opta pelo sistema de milk run, ao passo que a
A questão do custo também motivou as montadoras montadora “B”, instalada em região de pouca tradição no
de motores, e até certo ponto os fornecedores, a ado- setor automotivo brasileiro, optou por instalar fornecedo-
tarem práticas de terceirização dos componentes não res dentro da fábrica e criar um centro de consolidação
considerados estratégicos para as empresas. O conte- próximo de vários fornecedores distantes da planta. Nos
údo tecnológico é, segundo os entrevistados, um dos fornecedores, é interessante destacar a empresa “D”, que
critérios-chave para a decisão do que pode ou não ser opera em “Just In Sequence” com uma das montadoras a
terceirizado, uma vez que as empresas desejam reduzir que atende.
388 Maia et al. − Inter-relações entre Estratégia de Operações e Gestão da Cadeia de Suprimentos: Estudos de Caso...

7. Conclusões e considerações finais com empresas de maior porte (preferencialmente em-


presas multinacionais e certificadas em normas de qua-
Retomando a primeira questão de pesquisa apre-
lidade), procura desenvolver um conjunto maior de em-
sentada, do alinhamento da EO entre as empresas da
presas pequenas, a fim de torná-las capazes de fornecer
cadeia, pode-se dizer que existem semelhanças im-
os componentes dentro de suas exigências. Em relação
portantes entre as prioridades competitivas dos casos es-
a essas empresas menores, a montadora, em um primei-
tudados, bem como em suas áreas de decisão estruturais
ro momento, realiza investimentos consideráveis, mas,
e infra-estruturais. posteriormente, passa a ter grande poder para estabele-
Especificamente, no tocante às políticas e sistemas cer preços e volumes de entregas dos componentes. Já
infra-estruturais, a semelhança entre as ferramentas de a escolha estratégica da montadora “B” foi desenvolver
qualidade, formas de organização do trabalho, e abor- relacionamentos mais estreitos com um número relati-
dagens de planejamento da produção/logística, entre vamente maior de grandes empresas e repassar-lhes esta
outros, pode ser atribuída à grande difusão das técnicas busca pela flexibilidade.
japonesas de administração (“toyotismo”), as quais foram Apesar de diferenças quanto ao porte, de forma seme-
implantadas, sobretudo na indústria automobilística, para lhante, as montadoras atribuem a seus fornecedores de
impulsionar a competitividade. primeira camada a responsabilidade de aumentar a flexi-
As prioridades competitivas das montadoras também bilidade e coordenar tal aumento nas camadas inferiores
apresentam grau significativo de similaridade, indicando dos fornecedores, eximindo-se desta coordenação.
que estas necessitam refletir as necessidades do setor in- Esta escolha corrobora proposição de Alves Filho et al.
dustrial no qual tais empresas atuam. Considerando que o (2000) que indica que há situações em que nem todos os
maior volume de vendas é dos automóveis considerados elos da cadeia precisam ser coordenados, sendo assim
“populares”, as montadoras enfrentam forte pressão por necessário determinar quais partes da cadeia merecem
redução de custos, enquanto que a exigência de ampla maior atenção, de acordo com uma série de fatores como
diversidade de modelos enfatiza o aspecto “flexibilidade” as competências da empresa e o nível de importância de
das operações destas empresas. cada subconjunto de peças (e seus correspondentes for-
No caso das prioridades entre montadoras e fornece- necedores) no contexto de negócio.
dores, também é possível verificar similaridade, fato que A cadeia de suprimentos também influi nas decisões
corrobora o alinhamento estratégico preconizado pela de Estratégia de Operações. No caso da montadora “B”,
Gestão da Cadeia de Suprimentos. No entanto, essa simi- o fato de haver se estabelecido em uma região não tra-
laridade é mais fortemente verificada no conjunto monta- dicional do setor automotivo brasileiro, distante de seus
dora “A” - fornecedor “C” do que no par montadora “B” principais fornecedores, obrigou-a a adotar um sistema
- fornecedor “D”. Este fato sugere que o alinhamento é logístico com lojas dentro das fábricas e com centros de
mediado por fatores como: 1) os próprios aspectos estru- consolidação para o suprimento de autopeças.
turais e relacionais da cadeia, dado que “C” só fornece O desenvolvimento de produtos também representa
para o mercado de reposição de “B”, e “D” não fornece ponto de confluência entre a EO e a GCS. No caso das
para “A”; 2) características dos produtos fornecidos, con- montadoras, estas possuem autonomia diante de suas
siderando que “D” não enfatiza flexibilidade, pois produz matrizes internacionais para realizar desenvolvimentos
componentes mais estáveis e de conteúdo tecnológico incrementais nos motores e, como resultado de tais de-
menor; e 3) o volume de transações que ocorre entre as senvolvimentos, buscam parcerias com os fornecedores
empresas, menor entre “B” e “D”. de suas cadeias para realizar o desenvolvimento conjun-
Retomando a questão das montadoras, embora haja si- to dos componentes necessários. Um exemplo disto é o
militude entre suas prioridades, elas optaram por propos- desenvolvimento de motores bicombustíveis, realizado a
tas diferentes de Gestão da Cadeia de Suprimentos para partir de motores pré-existentes, mas com o envolvimen-
viabilizarem tais prioridades. to dos fornecedores de eletrônicos, com maior expertise
Especificamente, no que tange ao custo, a montadora nesta área.
“A” opta por se relacionar com alguns fornecedores “não Assim, os casos indicam que há influência mútua en-
imediatos”, a fim de utilizar seu maior poder de barganha tre os aspectos estruturais e relacionais das cadeias e as
na compra de materiais que, depois, são repassados a em- prioridades e decisões da estratégia de operações – re-
presas de 1º nível por meio de consignação. Com isso, a metendo à segunda questão de pesquisa apresentada. Os
empresa consegue reduções de custo agindo diretamente aspectos concernentes à EO (principalmente as priorida-
no que seria o fornecedor de segunda camada, caso a ca- des) parecem afetar o projeto da rede de suprimentos, ao
deia fosse analisada considerando o fluxo de materiais. passo que o status quo da estrutura e relações da cadeia
Dada a necessidade de flexibilidade, a montadora “A”, condicionam algumas das questões das áreas de decisão
embora na maior parte dos casos procure manter relações da Estratégia de Operações.
GESTÃO & PRODUÇÃO, v.12, n.3, p.377-391, set.-dez. 2005 389

Além disso, este trabalho indica que as montadoras por competências resultantes de escolhas estratégicas re-
devem exercer influência sobre suas cadeias no que se alizadas no passado.
refere a preço, qualidade, diversidade de produtos e ao Dada a forte influência mútua entre os fatores de EO e
conteúdo tecnológico das peças. GCS, bem como a dependência de escolhas passadas, são
Uma das limitações do trabalho aqui apresentado é a conferidas complexidade e relevância estratégica ainda
base empírica restrita para que se possa fazer recomen- maior às decisões realizadas em ambas as áreas.
dações sobre EOs e GCS. Todavia, é importante enfati- Finalizando, tem-se que os fornecedores principais
zar que os estudos de caso realizados nas montadoras de normalmente atendem a várias montadoras e implemen-
tam estratégias que têm de ser compatíveis com a de seus
automóveis incluíram questões que envolviam tanto os
clientes. Dadas as diferentes orientações estratégicas das
clientes quanto os fornecedores, de forma a cobrir as ca-
montadoras, depreende-se a idéia de que devem ser dis-
deias de suprimentos.
tintas as influências que cada montadora exerce sobre os
Além disso, é necessário ressaltar que o presente tra- fornecedores. Neste sentido, fica a proposta de um futuro
balho foi pautado em uma visão estratégica de planeja- trabalho para comparar os padrões de relacionamento no
mento top-down. Um outro ponto de vista de análise, o caso de determinados fornecedores que simultaneamente
de recursos e competências, poderia em trabalho futuro servem montadoras distintas, de forma a elucidar em que
trazer importantes contribuições, analisando como as de- aspectos particulares a relação é afetada pelas diferentes
cisões estratégicas atuais de EO e GCS são influenciadas estratégias adotadas por tais montadoras.

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Interrelationship between Operations Strategy and


Supply Chain Management: Case Studies
in the Automotive Engine Sector

Abstract

The worldwide automotive industry has undergone major changes in recent years. In Brazil, the establishment of
new automakers, the consolidation and denationalization of autoparts, and the introduction of low displacement en-
gines and bi-fuelled engines have important strategic implications for these companies and for their supply chains.
Based on these implications, this paper attempts to shed light on the interrelationship between Operations Strategy
(OSs) and Supply Chain Management (SCM), analyzing case studies conducted at two engine manufacturers in Brazil
and at two of their suppliers. The findings of these case studies indicate strong interrelationships between competi-
tive priorities and decisions involving structural and infrastructural issues, and between the structural and relational
aspects of the productive chains to which these companies belong. The automakers studied here have similar OSs, but
their priorities and actions take place within the contexts of different supply chain structures and, hence, are governed
by distinct forms of relationships. Given the mutual influence of OS and SCM factors and the dependence on previous
strategic choices, the decisions made in these two areas are even more complex and strategically relevant.
Keywords: operations strategy, supply chain management, Brazilian automotive industry.

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