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ECOLOGIA INTERIOR

Forças de Cura da Natureza


nas Medicinas Tradicionais

“Um dia claro, vivo: ar seco e de brisa, cheio de oxigênio. Entre esses

silenciosos milagres que me cercam – árvores, água, ervas, sol, geada – o que mais

olho hoje é o céu. Tem este azul delicado, transparente, peculiar ao outono, e as

nuvens brancas dão o seu movimento calmo à grande abóbada. Durante a manhã, o

céu guarda um azul puro, mais vívido. Mas ao aproximar-se o meio-dia, torna-se mais

leve a cor, gris, quase durante duas ou três horas, logo mais pálido por um momento,

até o por do sol. Que vejo ofuscante pelos interstícios de um grupo de altas árvores:

dardos de fogo e uma suntuosa exposição de amarelo, súlfur e vermelho, com o vasto

resplendor prateado sobre as águas: flamejam as sombras transparentes e há vívidas

tonalidades, além de todas as pinturas jamais feitas. Não sei como nem porque, mas

parece-me que devido a estes céus tenho tido neste outono algumas horas de

maravilhoso enlevo, não poderia dizer de perfeita felicidade ? Esse invisível bálsamo

tu o derramas pelo ar, sobre mim, sutilmente, misticamente, céu azul”...

Walt Whitman

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ECOLOGIA INTERIOR - Forças de Cura da Natureza nas Medicinas
Tradicionais

Há tanto tempo que a medicina se confundiu com o uso de remédios que,


mesmo quando se imagina um retorno às forças curativas da natureza, se pensa
apenas em remédios naturais. Usar as plantas para curar é uma prática muito antiga
e muito boa, mas não é a única forma pela qual a natureza cura.

Na medicina tradicional chinesa, o uso de remédios – mesmo feitos de ervas,


como eram então todos os remédios – era apenas o sexto método em importância
entre as artes de cura. A acupuntura vinha em seguida, em quinto, e a massagem em
quarto. Em terceiro lugar estava a dietética energética. Os métodos mais importantes,
em segundo e primeiro lugar, eram os exercícios terapêuticos e a meditação,
praticados na natureza.

Na concepção tradicional chinesa, saúde é conseqüência do estado de unidade


com a natureza. As doenças são múltiplas, inumeráveis, mas a saúde é uma só.
Nenhum ser adoece se está unificado e em união com o Todo, o Tao. A primeira
divisão é entre o ser e o Universo. Quando um ser começa a se perceber como
separado do Todo ele abre a primeira fissura na unidade. Mais tarde, novas distinções
vão alargando essa fissura, até que ela se torna um abismo.

A doença começa na mente, com a divisão. A primeira das ilusões da mente é


a da existência separada. Os seres humanos são filhos da natureza, não existem
separados. Quando um ser se divide internamente, ele passa a se ver separado, sua
mente fica confusa e ele passa a enxergar propósitos próprios. Tenta realizá-los e não
consegue, pois os propósitos dos seres separados são irrealizáveis, então ele sofre. E
acaba doente. Na contemplação da natureza os médicos Taoístas viam a cura radical
para essa doença: a recuperação da unidade com nosso ser verdadeiro, que é a
unidade com todos os seres. Isso começa pela harmonização do homem com as leis
do ambiente terrestre, com os movimentos sutis da natureza e do cosmos.

Podemos sentir os ecos longínquos dessa sabedoria não só na medicina


chinesa, mas também nas medicinas tradicionais da Índia, o Ayurveda, e do Tibete, o
Vajraiana. Esses foram grandes sistemas de medicina, que conservaram e
desenvolveram por milênios suas observações. Não podemos descartar essas
observações como primitivas, pois elas mantiveram por milhares de anos a saúde de

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suas populações.

A força curativa da natureza é a mais profunda das medicinas. As doenças são


distorções da forma de se relacionar com o ambiente. O poder terapêutico de um
relacionamento sadio com o meio é imenso. Os espaços naturais possuem qualidades
diversas em sua ação sobre o corpo energético do homem. As montanhas estabilizam
as energias no alto, as planícies no centro, a floresta e beira-mar na base. O lago é
sedativo dos nervos, os rios fortes e cachoeiras estimulam as energias.

A contemplação do Céu e da Terra é a fonte de toda sabedoria tradicional. No I


Ching, que fundamenta todo o conhecimento Taoísta, todas as imagens são
estruturadas a partir das relações entre os elementos naturais. O homem tem
liberdade, “mas a experiência demonstra que desde o despertar de nossa consciência
já nos encontramos inseridos em sistemas já estabelecidos de relacionamentos tão
poderosos que tendem a prevalecer” diz o Ta Chuan, o “Grande Comentário” do I
Ching.

Esses sistemas de relacionamentos tão poderosos, sãs as relações entre a


forças do Céu da Terra, da Água, do Fogo, do Trovão, da Montanha, do Lago e do
Vento, representadas pelos oito trigramas. No I Ching, a história da civilização vem
assim descrita: “Quando na mais remota antiguidade Pao Hi governava o mundo, ele
levantou os olhos e contemplou os fenômenos da terra. Observou os sinais dos
pássaros dos animais, e sua adaptação às regiões. Ele procedia diretamente de si
mesmo e indiretamente a partir das coisas. Inventou assim os oito trigramas, para
entrar em contato com os deuses luminosos e para organizar as condições de todos
os seres”.

O trabalho terapêutico na natureza, que a tradição médica chinesa reputa como


o mais profundo dos métodos terapêuticos, é esse proceder diretamente de si mesmo.
Não se trata apenas de estar na natureza e de passear em sua paisagem “lá fora”.
Trata-se de atravessar a barreira mental que nos separa dela curando a divisão
interior do Ser. De acordo com a psicologia budista tibetana, o fundamento da doença
é a tendência a solidificar a energia em uma barreira que separa o espaço em duas
entidades: Eu e o Outro, o espaço aqui e o espaço lá fora. Esse processo é
tecnicamente denominado “fixação dualística”. Primeiro existe a criação inicial de uma
barreira, o sentimento do “outro”, e então a inferência de um interior, ou “Eu”. Esse é o
nascimento do Ego. Nós nos identificamos com o está “aqui dentro” e lutamos para

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nos relacionar com o que está lá fora.

A barreira causa um desequilíbrio entre dentro e fora. A luta para desfazer o


desequilíbrio solidifica ainda mais a barreira. Nós esquecemos o fato de que criamos
a barreira e na verdade agimos como se ela sempre tivesse estado lá. O objetivo da
terapêutica na natureza é dar à pessoa um senso de maior espaço interior. A clareza
e calma possíveis nesse espaço interior é o primeiro passo em direção à cura. O
relacionamento entre o espaço interior e o espaço exterior é estabilizado
suficientemente para que a luta com o mundo externo seja relaxada.

Essa relação “interior” com o espaço é característica das culturas tradicionais


do oriente. O espaço na pintura chinesa e japonesa, por exemplo, não é um espaço
vazio, neutro, onde estão as coisas. Nessa pintura, os corpos criam seu próprio
espaço, a matéria é a própria curvatura do espaço. Não se olha de fora para uma
pintura assim, porque o tema e cada detalhe dele são vistos tão intensamente a partir
de dentro que aquele que vê deve também estar na pintura, deve viver nela para
compreendê-la. Não apenas a perspectiva deixa de ter um ponto de vista único como
a própria relação de observador para observado é abolida. O observador está em
todas as partes, sendo um com a pulsação das coisas.

É essa mesma sensibilidade que existe no Feng-Shui, a arte do paisagismo


sagrado, que não parte de conceitos estéticos ou filosóficos para lidar com ambientes,
mas sim da observação sensível, “interior”, das correntes energéticas presentes em
cada lugar para que o homem possa nele encontrar a harmonia. O relevo, o grau de
umidade da terra, a direção dos cursos d’água, o clima, tudo é importante e se
constitui na base dessa antiga ciência que inclui a arquitetura e o paisagismo. Porque
para habitar na natureza era preciso antes estudar as energias e suas atuações em
cada local. Pois o espaço não é um vazio onde o homem pode colocar o que quiser,
tudo está vivo, tudo contém e faz parte da mesma energia, que pulsa em cada ser, em
cada árvore, em cada pedra.

A medicina tradicional tem por base a observação das correspondências entre


essas mudanças na natureza e as maneiras de sentir do ser humano. Nos exercícios
terapêuticos, como na meditação na natureza, o corpo se torna sensível, num nível
instintivo, a todas as condições do ambiente, pressão atmosférica, umidade,
temperatura, direção dos ventos, presença de nuvens, etc. Não apenas condições
meteorológicas mas determinantes geográficos afetam a sensibilidade do corpo

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energético, como altitude, proximidade de grandes massas de água, como um lago ou
o oceano. E também os ciclos naturais, como as estações, o período do dia ou da
noite.

A vinculação da circulação energética humana ao ambiente conduziu os


Taoístas a um estudo profundo das maneiras que o homem tem de se harmonizar com
as variações naturais e conservar o equilíbrio. As ginásticas terapêuticas são parte
desse estudo. Nelas, há uma escuta atenta dos ritmos interiores. Exercitar-se é
também estar profundamente consciente de suas próprias sensações. Escutar
profundamente o próprio corpo, mais do que movimentá-lo. Todo gesto, nessas
práticas, se desenvolve sobre uma base de escuta interior. O que exige que os
exercícios se façam na natureza. Nosso grande corpo é o corpo do mundo. Não
somos seres limitados pelas fronteiras de nossa pele.

Esse é um trabalho sobre o corpo energético através da postura e do


movimento. Os canais de energia – meridianos – são os desenhos da relação entre o
corpo e o cosmos. São os meridianos que portam as sensações, mas também a
motricidade. Mas eles são também respiração. Pela respiração, movimentos e
sensações, afetamos instantaneamente os fluxos energéticos. Essa é a base dos
exercícios; neles o que se procura modificar não é o organismo, é a relação como o
espaço. Nas técnicas como o Tai-Chi Chuan, o Tao Yin e o Chi Kung, o objetivo é
corrigirmos nossa relação com o espaço. Dessa forma, os meridianos se tornam o
local de comunicação onde o corpo fala de seu acordo com o cosmos. Não estão
limitados à saúde, mas passam também por ela. Mais do que isso, eles tem uma
dimensão espiritual.

Pode-se talvez pensar que essa é uma forma extrema de sensibilidade, um


exotismo oriental. Nada mais errôneo. A cultura grega, fonte principal da dimensão
humanística da civilização ocidental, é um exemplo notável de uma sensibilidade
semelhante. Os gregos se sentiam bem na natureza e no corpo. Procuravam
desenvolver harmoniosamente o corpo humano fazendo circular os fluidos energéticos
– humores – de acordo com as leis do cosmos. A correspondência do corpo humano,
como microcosmo, com o corpo do Universo, o macrocosmo, era expressa de maneira
semelhante à das tradições orientais. Os fluidos vitais do corpo eram vistos como
manifestações dos mesmos elementos que compunham o macrocosmo, terra, fogo,
água, ar e éter. A ginástica, a dança e a massagem eram consideradas as melhores
técnicas de harmonização do corpo, sendo amplamente utilizadas nos templos e

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ginásios com objetivos pedagógicos, terapêuticos e espirituais. Os movimentos do
corpo deviam refletir as leis dos astros, circulando os humores e exercitando os
membros de acordo com os impulsos artísticos de Vênus, a coragem de Marte, a força
plástica de Júpiter, a serenidade de Saturno. Seu contato com os deuses acontecia
nos templos na natureza. Sua alma se abria à influência climática, levando em conta a
iluminação solar, as sombras e as condições atmosféricas. Nessa época, a função da
medicina era a de descobrir as leis da natureza e ensinar os homens a respeitá-las.
Plantão, na República, dizia que a necessidade de médicos e hospitais numa região
era mau sinal, pois os médicos só deveriam existir para tratar dos feridos de guerra.

O médico mais importante da antiguidade ocidental foi Hipócrates. Para ele, a


saúde significa a harmonia do homem com as leis naturais, a relação equilibrada entre
os diversos componentes do organismo, entre si e com o meio ambiente. O estado de
saúde depende da harmonia entre o corpo e a mente, entre o homem e o meio. Para
Hipócrates, existiam relações entre a saúde e temperamento das pessoas com o tipo
de lugar e clima em que viviam. A doença é o resultado da desarmonia com essas
condições naturais. Seus métodos eram holísticos, para curar uma parte do corpo, ele
acreditava que era necessário curar o corpo inteiro. O equilíbrio humano dependia do
equilíbrio humano dependia do equilíbrio dos fluidos vitais no corpo, assim como de
fatores naturais, como clima, qualidade da água, do ar e da terra e hábitos de vida.
Em seu livro “Dos Ares, das Águas e dos Lugares”, indicava aos médicos que a
primeira coisa a observa ao visitar uma comunidade e era inspecionar a qualidade de
água, do ar e as condições físicas do local.

Se examinarmos as culturas da antiguidade, encontraremos por toda parte


exemplos de métodos de cura pela natureza que não se limitam ao uso de remédios
naturais. Um retorno da pessoa ou da comunidade enferma à harmonia com as leis
naturais sempre foi o núcleo das terapêuticas tradicionais. Em certas danças
cosmológicas se pode observar essa vinculação homem-natureza, inclusive
funcionando no sentido inverso, o equilíbrio do homem gerando uma reequilíbrio do
ambiente. Os Hopis, na América do Norte, através de seus rituais, são capazes de
fazer chover quando precisam de chuva. Rituais de plantio são sucedidos por chuvas
abundantes que observadores de formação racionalista não podem explicar. A
ligação dos xamãs Hopis com o tempo passa por purificações, preparações, jejuns,
culminando em danças tribais em que a comunidade mergulha na identidade com a
Terra, colabora com seu pulso profundo e obtém as condições climáticas que
necessita para seus cultivos.

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Muitos povos – que a ciência racionalista chama de primitivos – tinham esse
poder de harmonizar o espaço interno com o espaço externo, a ecologia exterior com
a ecologia interior. Manter a saúde, colaborar com os reinos vegetais, influenciar o
tempo, eram antigas ciências de povos que tinham a paciência e humildade para ouvir
os ventos. Esses povos tinham muito respeito pelas leis naturais. Acreditavam que se
não tivessem, estariam sujeitos a todos os tipos de catástrofes: vendavais, ciclones,
tempestades. Talvez ainda seja cedo para dizer que eles estavam errados. A
civilização técnico-científica é muito recente na história humana para que possamos
dizer que ela ainda vai ficar muito tempo sobre esta terra.

Hoje, existe um vasto movimento de retorno à natureza. Esse movimento está


gradualmente convergindo para unificações importantes. Começamos a nos dar conta
de que tudo está ligado neste Universo. É um tempo de quedas de barreiras, abolição
de fronteiras, união de diferenças. Ainda que a memória do passado continue a gerar
divisões, a força do futuro unifica. Cada especialidade da ciência racionalista se
acostumou a falar em uma linguagem especializada diferente. Isso nos leva às vezes
a pensar que os diversos níveis do universo são diferentes, mas é mais um problema
com as linguagens do que com a realidade.

Teremos que resolver todos os problemas de uma só vez. E isso vai nos levar
a ver que eles são o mesmo problema fundamental que os budistas chamam de
fixação dualística. As linguagens multiplicam a mesma coisa de dez mil formas. “A
Grande Sabedoria vê tudo num só”, dizia Chuang Tzu, enquanto a pequena sabedoria
se embaralha nas distinções. O que hoje chamamos de ecologia, o que chamamos de
medicina e o que chamamos de busca espiritual, para os antigos chineses era a
mesma coisa. As grandes verdades são sempre simples, e ao mesmo tempo
imensos paradoxos. Por isso elas passam despercebidas, e por isso se diz que o
segredo se guarda a si mesmo. O homem está enredado em dez mil problemas, a
situação é séria, e ainda assim poderíamos dizer com toda segurança: meditar ajuda,
caminhar nas florestas ajuda. Olhar as montanhas, ouvir os pássaros, nadar nos
riachos, observar as nuvens do céu, ver passar o tempo. Para os Taoístas, a verdade
não é complicada. A verdade é um equilíbrio. É um movimento e um repouso, é uma
posição. Olhemos para o tempo, vamos meditando, que nós alcançamos esta
posição.

Lumiar, Primavera, 1991

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Laerte Willmann Pereira

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