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Entrevista 3

Edição: Rodolfo Espínola Florianópolis, julho de 2009


Fotos:Rodolfo Espínola

Segurança continua presa a mitos


Desde o início do ano, o Ministério da Justiça está promovendo conferências em diversos
locais do país para estimular o debate sobre a segurança. Em agosto, Brasília vai sediar
a primeira Conferência Nacional de Segurança Pública, onde serão apresentados os
resultados dos eventos anteriores. Vera Regina de Andrade, uma das integrantes da
comissão organizadora em Santa Catarina, conversou com o ZERO sobre os problemas
do sistema penitenciário brasileiro e a falta de foco nas discussões sobre o tema.

Z
ERO - Hoje podemos verificar que o sis- cumprem pena junto com eles. Elas sofrem persegui- Julgamento feito à distância, vender pulseira,
tema penitenciário enfrenta diversos ções, são violentadas, os amigos se afastam, perdem chip, monitorar presídios. Isso é o modelo nortea-
problemas. A conferência se preocupa em emprego e têm dificuldade para encontrar outro. mericano e faz parte da política criminal como es-
melhorar esta situação? Na periferia, a polícia entra e mata. Funciona na petáculo. A utilização da pulseira tem várias incons-
A conferência é um conjunto de promessas e eu base do extermínio. Começamos matando os índios, titucionalidades. Ela é um artefato estigmatizante e
acompanho bem criticamente esse processo. Participei depois os escravos, continuamos a matar na ditadura a constituição diz que não teremos pena difamante.
desde o início, fiz parte da comissão de especialistas e hoje, na sociedade republicana, seguimos matando Eu considero a prisão difamante e cruel. A pulseira
que discutiu a concepção da conferência e fiz muitas os presos e os potenciais presos. A prisão mata no Brasil é uma pena e não adianta dizer que não é, que é
críticas ao encaminhamento à prisão. e vemos isso com naturalidade, falando de ressociali- apenas uma maneira de executá-la. Ela é uma pena
A concepção do sistema penitenciário é ultrapassa- zação. Os debates nem discutem as causas das mortes. duplicada e inconstitucional. A pessoa estará cum-
da, ainda se baseia na ideia de que é possível ressocia- prindo a pena da prisão e a pena de andar livre.
lizar os presos. A ressocialização é um mito. Ela não é Quais penas alternativas seriam eficazes para A segurança é um dos temas que mais vende no
e nunca foi a função real da prisão, que é o controle de reduzir estes problemas? mundo. Por trás disso, há um mercado gigantesco
classes. Um lugar de produção dos criminosos, não de Prestação de serviços à comunidade, um trabalho de empresas privadas em que muita gente está ga-
salvação. Nenhuma instituição fechada jamais vai ter real, dar assistência a instituições de caridade, a velhos, nhando dinheiro.
o poder de ressocializar ninguém, até porque, se tem a asilos, a crianças. Oferecer uma
que haver uma ressocialização é da própria sociedade formação. No Brasil, há poucos casos

“violarMaisosdodireitos
que produz os seus criminosos. O que precisamos fazer A prisão é seletiva e estrutural- de privatizações no sistema
é garantir condições mínimas de aprisionamento. mente desigual. É preciso dimi-
nuir a prisão para crimes contra
que penitenciário. Há uma jus-
tificativa?
Quais seriam estas condições? o patrimônio e descriminalizar A nossa tradição é diferente
Condições que respeitem os direitos humanos. Na
verdade, a prisão não é apenas a privação da liberdade,
qualquer produção e consumo
de drogas definidas como ilegais.
humanos, a dos EUA. A prisão aqui é um
elefante branco que assusta
mas de todos os outros direitos e necessidades reais, até Deslocar isso para um controle prisão é uma até o mercado. É um modelo
a vida. Ela deveria assegurar garantias como saúde,
educação e trabalho digno. Isso não é ressocialização.
sanitário, como é com o cigarro,
álcool e fármacos.
forma de pena de que não vingou, os empresários
veem mercados mais atraentes
São direitos mínimos para uma pessoa que está priva- morte indireta” no país e acho isso muito bom
da apenas de liberdade. Como uma prisão vai prepa- Como a descriminalização que isso não tenha acontecido.
rar alguém para um mercado, onde há desemprego das drogas poderia ajudar? O privado pode maquiar a violência do sistema pe-
estrutural, o ensinando a tecer bolinhas? Isso não é Ocorrem mais mortes com a criminalização. O nal. O poder punitivo é do Estado.
formação, é laborterapia. Uma atividade para a pessoa tráfico produz um genocídio em massa. É uma forma A tese da privatização tem amplo respaldo popu-
conseguir suportar o tempo, o ócio, a dor da prisão. genial dos Estados Unidos continuarem exercendo seu lar, pois é vista como eficiente na execução da pena
poder imperial, dar um uso para a indústria bélica e como um antídoto do medo. Estes são dois apelos
Vera Regina Pereira de Andrade, pós- E qual política seria ideal? ociosa após o fim da Guerra Fria. Uma indústria que fortes para a legitimação do privado. Daqui a pouco o
Doutora em Direito Penal e Criminologia Definitivamente seria investir em menos prisões. não produz mais armamento para lutar contra o co- privado não estará apenas fornecendo marmita para
pela Universidade de Buenos Aires, é Criar penas alternativas. Quem é que lota as prisões munismo, mas produz o sistema penitenciário que é os presos, vendendo pulseira e videoconferência. Eles
professora do Curso de Pós-Graduação hoje? Mais de 70% são condenados por crimes patri- vendido para encarcerar os criminalizados pelo uso das começarão a aplicar pena. Nosso senso comum está
em Direito da UFSC. Atua nas linhas moniais – furto, roubo e tráfico. O que temos hoje é drogas. Estes são os andinos, os latinos, os imigrantes. refém das ilusões que nos são vendidas com facilida-
de pesquisa de controle social, sistema uma criminalização da pobreza, pessoas de baixo Ou seja, a criminalização tem uma funcionalização de e amplo apelo midiático.
penal, cidadania e direitos humanos. estrato social que são vulneráveis a serem crimina- fantástica para o poder econômico global e sobretudo
Também presta assessoria para o lizadas. A prisão é uma exclusão social. Demarca as norteamericano. Além de fomentar o fantástico mer- Na sua opinião, quais medidas imediatas devem
Ministério da Justiça em trabalhos pessoas desconstruindo a biografia de um sujeito para cado informal que movimenta milhões de dólares. ser tomadas para melhorar o sistema no país?
relacionados à questão criminal. poder construir uma de criminoso. O sujeito assimila Então tem toda uma engenharia construída, um Sempre trabalho com três eixos: a radical legali-
a etiqueta e assume o estigma. Isso é um tipo de violên- grande império em torno da criminalização das dro- zação e descriminalização da produção, comerciali-
cia intersubjetiva muito clara que todas as instituições gas. Isso está narrado em pesquisas muito boas que zação e uso de drogas; penas alternativas para crimes
fechadas produzem. A função do hospício é produzir demonstram como a construção bélica do novo ini- patrimoniais como furto e roubo; e controle rigoroso
o louco, a do hospital, o doente, e das prisões, o cri- migo permite aos Estados Unidos satanizar a América do aprisionamento provisório.
minoso. Latina e manter um discurso de defesa das suas classes O grande motivo da superpopulação dos presídios
Nós temos que enfrentar decisivamente isso. Va- médias e altas, vitimizadas pelo tráfico cuja origem latino-americanos é o fenômeno do aprisionamento
mos continuar usando prisão e genocídio? Porque a é nossa. A criminalização do tráfico é um problema provisório. Santa Catarina segue esse padrão. O es-
prisão mata e isso tem que ser dito. Mais do que violar político sério. Além disso, tem o terrorismo, que é o se- tado não tem defesa pública, a advocacia dativa não
os direitos humanos, a prisão é uma forma de pena de gundo grande inimigo externo. funciona e ninguém consegue fazer nada porque os
morte indireta. Funcionam como extermínio puro. burocratas não permitem. Se não mexermos nisso
Falando em Estados Unidos, há debates no Brasil urgentemente, não teremos discussão nenhuma
Como se dá esse extermínio? sobre a implantação de julgamentos através de para fazer dentro do sistema penitenciário.
Entre presos, entre policiais e encarcerados, ex- videoconferência e utilização de pulseiras eletrô-
ternos com presos e familiares de presos. As famílias nicas. Como você encara essas iniciativas? Thaís Goes

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