Ver-se-á que os termos “grotesco” e “arabesco” indicam com bastante precisão o
teor dominante dos contos aqui publicados. Mas, se durante dois ou três anos escrevi 25 histórias curtas cujo caráter geral pode ser definido com tanta brevidade, não é justo – ou, em todo caso, não é verdadeiro – inferir daí que alimento um especial ou enorme gosto ou propensão por esse tipo de texto. Posso ter escrito pensando em reeditá-los em forma de livro e, portanto, posso ter tido a intenção de preservar, pelo menos até certo ponto, uma certa unidade de concepção. Na verdade, é este o caso; e pode até acontecer que eu nunca mais componha nada dessa maneira. Menciono aqui essas coisas porque sou levado a pensar que foi este predomínio do “arabesco” em meus contos sérios que levou um ou dois críticos a me censurar, muito amigavelmente, por algo que lhes aprouve chamar de “germanismo” e soturnez. É uma acusação de mau gosto, e suas razões não estão bem fundamentadas. Admitamos por um momento que as “peças de fantasia” aqui apresentadas sejam mesmo germânicas, ou o que for. Neste caso, o germanismo é “o estado de espírito” de agora. Amanhã posso ser tudo menos germânico, tal como ontem fui qualquer outra coisa. Estes vários contos continuam a ser um livro só. Meus amigos teriam igual razão em censurar um astrônomo por excesso de astronomia ou um autor ético por tratar demais da moral. Mas a verdade é que, salvo uma única exceção, em nenhuma destas histórias o estudioso reconhecerá as características próprias daquela espécie de pseudohorror que aprendemos a chamar de germânico, sem outra razão melhor a não ser porque alguns dos nomes menores da literatura alemã passaram a ser identificados com sua tolice. Se o terror é a tese em muitas criações minhas, digo que o terror não é da Alemanha, e sim da alma – que eu deduzi este terror apenas de suas fontes legítimas e o conduzi apenas a seus legítimos resultados.
Aqui há um ou dois escritos (concebidos e executados no mais puro espírito de
extravaganza) para os quais não espero uma atenção séria, e dos quais não falarei mais. Para os outros, porém, não seria consciencioso de minha parte pedir indulgência alegando que foram feitos às pressas. Creio que o melhor, portanto, é dizer que, se pequei, foi deliberadamente. Estas pequenas composições são, no principal, os resultados de um propósito maduro e de uma elaboração muito cuidadosa.
fonte: edgar allan poe society of baltimore, preface, http://www.eapoe.org/works/misc/tgap.htm
tradução informal minha (denise bottmann).
ver também http://naogostodeplagio.blogspot.com/2009/06/tales-of-grotesque-and- arabesque.html