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SOBREDEVIR, OU O REINO DA DIFERENÇA EXCEDENTE

Carlos Henrique Machado

ÍNDICE

Prefácio,
Introdução
Unidade 1. Geografia do lugar nenhum
Unidade 2. O discursos dos fluxos
Unidade 3. O poder, a ordem e o sentido do Ser
Unidade 4. Ver os toques antes que eles se estendam às peles
Unidade 5. Solilóquio da diferença
Unidade 6. Dromologia , a fratura morfológica do virtual
Unidade 7. Tempo, Duração, Mudança, Singularidade e Intensidade
Unidade 8. A emergência de uma nova ordem
Unidade 9. Caminhos para uma nova significação
PREFÁCIO
INTRODUÇÃO

Nos últimos anos me acostumei a ir quase todos os dias, a um mesmo bar. Em uma de
suas paredes está um grande quadro que exibe uma fotografia com a figura de quatro
homens, todos a olhar pela janela, fitando um prédio do outro lado da rua e tendo
entre eles uma luneta. Todos estão vestidos com ternos de cor escura, pois a foto é em
branco e preto. Toda as vezes faço a mesma pergunta. O que será que estão olhando?
Não tenho certeza de onde ou quando a fotografia foi tirada. Poderia ter sido em Nova
Iorque, ou não, em um tempo qualquer entre as décadas de 1930 e 1950. O mais
curioso é a ideia de que aquele encontro espaço-temporal ocorreu em algum ponto do
tempo que se contrai até mim. Supondo que a foto refletisse um período em que a
técnicas de captura e impressão estavam vinculadas aos princípios básicos da ótica
clássica, onde as imagens se formavam e eram impressas no anteparo da "chapa"
fotográfica, tal curiosidade se manteria, mas de uma forma mais simples. A partir do
momento que ousamos imaginar que o quadro pudesse ter sido produzido a partir das
técnicas digitais de organização dos pixels, , o assunto ganharia um curiosidade maior
e quase insólita. Então, pergunto se seria menos ou mais curioso se o tal quadro
tivesse saído do pincel de algum artista da figuração que tentasse reproduzir os limites
de um olhar acostumado a recortar as formas no clássico esquema: intensidades,
percepção sensível, memoria e significado. A essa altura, uma multidão de linhas de
fugas vem se embaralhar à questão inicial. Intensidades invadindo os prismas,
obturadores ou os órgãos da percepção sensível, se amalgamam aos suportes da tela,
da chapa, ou da retina, junto com a interface do programa que destrói todos suportes
e organiza os pixels em pontos luminosos. Assim, eliminando-se os anteparos sobram
apenas, em todos os casos, a intensidade da luz sintetizada nas formas apreendidas
pelo olhar.

A eliminação dos anteparos onde se reproduzem as imagens das sínteses operadas


pela reflexão dificulta a tarefa de se tentar descrever o que permanece diante dos
olhos a cada novo instante. A possibilidade de que em cada aparição, as partes ou as
qualidades constitutivas do que se abre a percepção sensível sejam reorganizadas
através dos programas que criam novas e ilimitadas imagens, compromete a eficácia
do ato de determinar o “Ser” daquilo que aparece. Como ficaria então uma ontologia
que pretendesse dar conta dessa disrrupção.?

Uma ontologia é a “ciência do ser”: um estudo filosófico sobre as categorias básicas da


existência ou da realidade – a exemplo da identidade e da diferença, do sujeito e do
objeto, essência e aparência, necessidade e acidente, substância, qualidade e
quantidade, espaço e tempo e todas as relações dessas categorias entre si. Ao longo
de sua história as ontologias assumiram a prioridade de descrever e identificar “aquilo
que permanece” diante do sujeito do conhecimento em meio a avalanche da
transitoriedade das coisas que surgem e desaparecem. Todo o seu esforço para
expugnar a transitoriedade e em última instância o “devir” dos estados de coisas,
visava resguardar o Ser dessa ameaça de dissolução. Sem poder reter os dias que
escorrem como gotas de luz e apontam, ininterruptamente um céu de novas cores, ou
a força das trevas que se lançam impiedosamente quando o dia vai dando lugar a
escuridão da noite, o pensamento assume a estratégia de buscar reter tudo aquilo
que pode retornar como o mesmo e seja reconhecido pelas propriedades que
permanecem semelhantes em cada aparição, constituindo, assim, sua identidade.
Desse modo a ciência do “Ser” tornou-se a ciência da identidade. Fundada nos
elementos que permitem reconhecer aquilo que aparce, vai e que volta como o
mesmo diante do sujeito que ve, abstrai e diz, a identidade garante o reconhecimento
daquilo que se repete, permitindo esse reconhecimento pelo sujeito que fita, organiza
e denomina a realidade ao seu redor.

Isto é; aquilo é; eles são; nós somos. A combinação das imagens em uma cadeia de
associações pelo sujeito que indica o que permanece em cada aparição, tornou
possível reconhecer e dizer o “Ser” das coisas, fundamento de todas as aparições nos
limites do espaço e do tempo. Conforme se vai estabelecendo essa cadeia de
correlações entre as ideias que se desprendem das coisas que aparecem ao sujeito,
estabelece-se os limites entre as aparições e os significados, criando-se um espaço
onde é possível se designar um estado de coisas pela repetição periódica do que se
pode reter em cada aparição da realidade apreendida pelos sentidos, prolongada pela
abstração e descrita pela linguagem. O conhecimento da realidade do mundo
apresenta-se, insistentemente, como um desafio que tem figurado nas diversas etapas
da organização histórica da existência humana, bem como da história do pensamento.
Como se poderia ter acesso a esso mundo e mitigar o sentimento provocado pela
instabilidade do fluxo de um devir que atravessa essa realidade? Até que o homem
pudesse dizer o “Ser” das coisas ele seguia contemplando o curso no mundo no qual
fora lançado e que prosseguia independente de sua existência, obrigando-o a buscar,
sob o risco de sua sucumbência, uma integração a este movimento. Como, porém,
buscar a estabilidade numa realidade marcada por um ritmo de frequentes e múltiplas
transformações, das quais a sua própria vida participa?

Se correspondermos a existência ao salto no mundo da vida orgânica e da quebra da


quietude do estado inorgânico, diríamos que a excitação e o movimento das primeiras
moléculas nas células dos seres ditos vivos representaram a expressão da vida. A vida
se expressa a partir da preservação de unidades cada vez maiores (zigoto, embrião,
feto, etc.) e dessa forma, desde a  primeira divisão mitótica do zigoto e da fusão dos
corpos celulares, o caminho da substância viva aponta para o inevitável destino de se
expressar através de unidades cada vez maiores de vida até o limite que faz a vida
retornar à quietude, ao silêncio, à dissolução das unidades e à morte. O caminho da
substância viva é o caminho da morte e a capacidade de enxergar esse caminho foi
uma das coisas que passou a diferenciar o ser que começou a se dizer humano, dos
outros seres que faziam parte desse irresistível movimento de vida e de morte. Esse
aparente paradoxo levou os seres ditos, por si mesmo, humanos, a enxergar na
realidade do devir a ameaça da dissolução de sua vida e a fugir dela a partir do
esforço para construir uma realidade estaticamente imóvel e una, que fosse capaz de
expugnar toda e qualquer mobilidade, devir ou multiplicidade, uma vez que esses
elementos estariam na base da dissolução de sua vida. Contudo, esta realidade
somente poderia ser elaborada a partir  de uma representação colocada também
paradoxalmente às originais impressões provenientes de um primeiro confronto, na
tentativa de deter essa transitoriedade, aparentemente inerente a todos os seres
vivos.

Quer partamos das primitivas práticas mágicas, das diversas concepções religiosas,
das formações hierarquizadas de Estado, das inúmeras correntes do pensamento
filosófico ou dos construtos teórico-científicos, esbarramos no esforço desse ente, que
insite em dizer a si e todos os outros, fazendo disso aquilo que o diferencia dos demais
entes, de se tentar minimizar as incertezas e insignificações da avalanche de uma
imprevisível novidade que insiste em escapar dos espaços de significação que ele
construiu como refúgio. Todo esse esforço se concentrou na busca por uma unidade
essencial, seja na esperança de extrair um arcabouço para o mundo, seja na tentativa
de obter segurança a partir da sua organização e controle. Da necessidade de garantir
sua sobrevivência, o homem, diferente dos outros animais, se estabelece como uma
ultrapassagem da natureza, fazendo dessa dissociação a pré-condição de sua
autopreservação e de seu autodesenvolvimento. O jogo dessa ultrapassagem controle
se processa através de diversos mecanismos que se sucedem no fluxo das civilizações,
sob a égide da imaginação, inscritos nos códigos que passaram a sustentar todas as
formas de vida.

Fugidas do caos da insignificação, brotam as construções, representações e


significados que vão preenchendo um escopo para a realidade. Contudo, a ameaça da
dissolução e do aturdimento do caos se apresenta de uma forma insistente, exigindo
representações que se afirmem como esferas estabilizantes fora da temível avalanche
da descontinuidade do mundo apreendido pelos sentidos. A a tendência inevitável é o
seu transporte para um “mundo” além da percepção sensível onde o “Ser” ficasse
resguardado de toda multiplicidade aparente e a civilização da ameaça do devir.
Porém, a marcha do mundo da transitoriedade sugere sua superioridade sobre as
construções estabilizadoras, que precisam ser constantemente reelaboradas através
de novos dispositivos e instituições e inscritas em novos espaços de significação.
Sociedades primitivas segmentárias são apropriadas e incorporadas pela soberania dos
Estados. Cai a verdade absolutizada, resguardada no universo do mito e surge a razão
como elemento capaz de harmonizar a verdade ameaçada pelas contradições
estabelecidas. Frente ao paradoxo da dúvida, o pensamento desenvolve critérios
absolutos para o resgate da unívoca verdade do Ser, que se desloca desde a ascensão
ao mundo das ideias eternas, passando pelas realidades essenciais, portadoras da
ordem em si mesmas, pela eficácia do conhecimento de um espírito absoluto e pelo
desenvolvimento de uma racionalidade científico-tecnológica. Todas essas tentativas
visam a apreensão da verdade do “Ser” como ponto de equilíbrio de uma realidade
desorganizada, e se reproduzem, historicamente, através de específicas organizações
no âmbito das civilizações, estabelecendo simultâneas ou sucessivas configurações. As
configurações históricas se expressam através de organizações na esfera da ordem
social, nas quais são harmonizadas as forças que agem no seu interior, como pré-
condição à subsistência da ordem em si mesma. Cada organização se estabelece à
medida que consegue realizar o equilíbrio dos poderes individuais e sociais, e entra em
declínio justamente quando perde esta capacidade de coesão.

A composição destes poderes é marcada pela interrelação de movimentos individuais


e coletivos e pelo processo de interação da realidade indivíduo-mundo, tanto no que
se refere à sua natureza biológica quanto social, determinando um equilíbrio
temporário e viabilizando a específica configuração constitutiva de uma ordem ou o
seu sentido. Como todo tempo traz o seu espaço de significação específico, dede que
se passou a catalogar as intensidades apreendidas pela percepção através de registros
fonéticos traduzidos por palavras, as significações assumiram formas diversas e
puseram os sentidos a dançar ao som da música composta pelo espírito de cada era.
Espíritos das matas, dos mares, das cavernas, dos ares e do mais íntimo recôndito apto
a guardar sensações e a partir delas representar a avalanche do mundo que nunca
parou de cair com o peso de quem cobrava sempre um novo abrigo para o sentido que
sendo dissolvido a cada volta do mundo.

Na era das velozes imagens que trafegam na grande rede como ícones de um tempo
que se tornou “real”, e a falta de mediações entre os sujeitos e objetos comprimiram o
passado o presente e o futuro, ao ponto de desorientarem os postulados clássicos
responsáveis em delimitar a diferença entre o “Ser” e sua representação,
embaralhando-os em uma geografia que não carece mais do espaço como suporte de
qualquer aparição. As imagens aparecem e se dissolvem como um fractal, na dança de
um ritornelo que gira com um spin em orbitais que se diluem em vários mundos
dispostos em única dimensão. Lançadas em um abismo sem fundo, superfície ou
margem as imagens do mundo dançam acompanhadas por um ruído de fundo
comprimido no menor espaço e tempo pensável, revelando a música dos novos
tempos a vibrar nas cordas do universo como uma sinfonia sempre nova e tocada “ao
vivo”.

Toda vez que se tenta reproduzir esse ruído silencioso, as representações vão
amplificando as frequências que vibram das cordas do universo, reduzindo a diferença
e a indeterminação de cada nova vibração a trajetórias definidas e dispostas no tempo
e no espaço a partir das relações ressonantes passam a organizar a realidade que
aparece para quem a representa. Compreender de que forma cada representação
encerra em um conjunto de regularidades e reduz a indeterminação das aparições
através do ato de projetar o conteúdo apreendido pelos sentidos nos anteparos
produzidos pelo pensamento, tornou-se o desafio para o conjunto de descrições de
diversas disciplinas e saberes desde o final do século XIX, liberando paradoxos que
eram contornados pelos modelos fundados na identidade e no determinismo de leis
extraídas da natureza, e postas como a essência da realidade objetiva dos entes. O
resultado desse novo clamor estendeu-se por todo o século XX , quando se seguiu
questionando os pressupostos dos modelos clássicos do conhecimento da realidade
em torno do sujeito da razão que tinha se estabelecido como o centro de medida de
todas as coisas, lançando-o para fora das dimensões estruturadas do espaço onde
tinha se habituado a trafegar em sua objetividade como agente da observação,
explodindo este espaço em N dimensões, onde a falta de um suporte onde se pudesse
imprimir as imagens do mundo, liberou um potencial que lançou o “Ser” para além de
suas representações, liberando toda a potência de um “Devir” que tinha sido mantido
aprisionado nos subterrâneos da identidade.

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