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[Na SEMANA DA ESCOLA o Grupo de Filosofia fará uma apresentação

sobre a trilogia MATRIX dos irmãos Wachowski. O que se pretende é uma


abordagem de temas filosóficos que possam estar presentes no filme a partir
de várias dimensões: ética, religiosa (cristã, budista e gnóstica)
metafísica/epistemológica, política e mitológica.]

A GRANDE ENCENAÇÃO OU A GRANDE REVELAÇÃO?

José Caselas

A trilogia Matrix representa um interesse filosófico relevante capaz de


estabelecer uma ponte entre professores e alunos no que respeita ao tratamento de
temas filosóficos. A bibliografia disponível na Net são os vários ensaios
filosóficos em
http://whatisthematrix.warnerbros.com/rl_cmp/phi.html e que se intitulam
genericamente Philosophy & The Matrix.
Aqui encontram-se análises bem curiosas e rigorosas sobre as abordagens
ao filme. Como bibliografia de apoio podemos ainda sugerir: Yeffeth, Glenn
(org), Taking the Red Pill: Science, Philosophy and the Religion in the Matrix,
Benbella Books, 2003; Matrix, machine philosophique, Ellipses, 2007; William,
Irwin, The Matrix and Philosophy: Welcome to the Desert of the Real, Open
Court, 2002; Lawrence, Mait, Like a Splinter in Your Mind: The Philosophy
Behind the Matrix Trilogy, Blackwell Publishing, 2004. Sobre o filme foi
organizado na Alemanha um Simpósio que contou com a presença de filósofos,
realizadores, dramaturgos e outros disponível em
http://on1.zkm.de/netcondition/navigation/symposia/default
onde se pode destacar o texto de Salvoj Zizek, «The matrix or The two Sides of
Perversion».
Como diz Colin McGinn (The Matrix of Dreams), em Philosophy & The
Matrix (P&M), as máquinas são um modelo de administração carinhosa de gado
(models of caring livestock husbandry), uma vez que criaram um mundo de
sonho e sem muita dor para os humanos poderem fornecer-lhes energia. Esta
alucinação consciente ou sonho acordado mantém os humanos no seu útero pré-
natal onde vivem um mundo simulado.
O personagem Cypher, o traidor do grupo, qual Judas, prefere o mundo de
sonho, o prazer artificial da ignorância abençoada; para ele a verdade pouco vale
se não vier acompanhada da felicidade. Aqui podemos perguntar o que é melhor:
o conhecimento ou a felicidade.
O mundo da Matrix não é cartesiano, uma vez que Descartes se lança na
dúvida com a certeza engatilhada – o seu abalo é apenas aparente. A sombra
tutelar de Deus permanece como pano de fundo oculto das suas hesitações, daí
que ele salte rapidamente da dúvida para a certeza com a alegria de um neófito
empossado no clube das intuições seguras. Apesar de tudo, a hipótese cartesiana
do animal-máquina deu origem a um
animado debate no séc. XVIII entre
materialistas, empiristas, cépticos, etc
que oscilavam entre a materialidade
do corpo e a espiritualidade da alma,
com nomes como La Mettrie com a
obra L’homme-Machine (1748),
Boullier, Essai philosophique sur
l’âme des bêtes (1728) e Condillac
com o seu Traité des animaux (1755).
A Matrix é um espectro do mundo
totalitário, um mundo vigiado; nesse caso o filme realiza o sonho de abafar
continuamente os insolentes, os que pretendem uma liberdade absoluta, como
advoga Michael McKenna em «Neo’s Freedom… Whoa!» Se a matrix é um
sistema de controle, como diz Morpheus logo no início, Neo é o insubmisso, o
que não aceita a servidão, o rebelde que assume as suas escolhas, a sua vontade
livre. O que é uma vontade livre? No interior da matrix os seres humanos estão
sujeitos a uma vigilância constante por parte de programas (Agent Smith) que
escrutinam a irreverência e repõem as falhas (ver «Recorde mundial» e «Além»
do Animatrix), e no exterior – no mundo devastado – são as sentinelas que se
encarregam disso, máquinas que se movem rapidamente com múltiplos olhos. A
matrix não existe sem um sistema de vigilância e sem um modo de constituição
de subjectividade, visto que não é permitido nem sequer uma rebeldia simulada.
Por que motivo não conceder a ilusão de uma liberdade absoluta no interior do
software, na fábrica de ilusões? Se a cidade das máquinas programa uma
simulação, esta ainda assim se aproxima da coerção clássica onde reina o medo, a
incitação à obediência e à docilidade. O corpo real confinado nesse ventre, nessa
matrix, no útero que serve de meta-realidade para produzir energia divaga no
mundo dos sonhos quase da mesma forma que na sua clausura, isto é, preso da
norma e do limite. Apenas Neo quebra essa norma, Morpheus também é um
rebelde à sua maneira no sistema de Zion. Neo o rebelde chega mesmo ao ponto
de controlar o seu sonho, a realidade induzida pelas máquinas. Trata-se do que
Colin McGinn designa como os sonhadores lúcidos e, neste caso, Neo é um
deles, capaz de dirigir a sua imaginação e assumir as suas escolhas, apesar das
máquinas soberanas. Se cada um está no seu casulo como é que existe a
interacção? Como lidamos com as outras pessoas? Somos nós que participamos
no seu sonho ou eles que entram no nosso? A questão da intersubjectividade ou
sonho colectivo articula-se com o nosso conhecimento do mundo. Se
pressupomos que o nosso mundo é real para nós, como sabemos que as outras
consciências o vêem da mesma forma? Como diz Iakdvos Vasilou (Reality, what
matters, and the Matrix), as pessoas encontram-se entre a escravidão e o engano
– Deus é um programa de computador.
Neo não acredita no destino; ele prefere a liberdade de escolha lutando
contra os programas sencientes. Mas terá uma liberdade absoluta? Aparentemente
ele vence a própria causalidade do mundo programado, conseguindo deter as
balas e voando, proezas que não estão acessíveis aos demais sonhadores.
Há quem prefira antecipar o mundo pós-apocalíptico. Kevin Warwick
(The Matrix – Our Future?) em P&M, implantou uma espécie de bio-portas no
seu sistema nervoso ligando-se ao computador de modo a alterar a sua
individualidade. Ele conseguia abrir portas e acender as luzes num quarto, tendo
todos os movimentos do corpo monitorizados. Afirma que se sentia feliz com
esse Big Brother vigiando o seu comportamento. Muitos autores afirmam que a
inteligência artificial e o aparecimento de robots sencientes é inevitável e que é
grande a probabilidade de estarmos num universo simulado (Ver o argumento da
simulação de Nick Bostrom em www.simulation-argument.com). Será que a sua
moralidade é a mesma do que a dos humanos ou será drasticamente diferente?
Escreve T. Bénatouil: «Todavia, de um ponto de vista estritamente político (e não
moral ou teológico), pouco importa que as máquinas exercem ou não o seu poder
de modificar ou de destruir a história humana na Matriz. A injustiça reside apenas
no facto de a humanidade estar sob o controle de uma outra potência que ela
própria.» [“Sommes-nous dans la Matrice?” in Matrix, machine philosophique, p.
118]
A liberdade pura de Neo contrasta com a razão
providencialista de Morpheus, crente no futuro do
mundo devastado, o deserto do real, encurralado pela
ilusão. A liberdade pode coexistir com a técnica? O
encontro de Neo com o Conselheiro Hamann tem como
objectivo pensar a relação de co-dependência entre as
máquinas e o homem. Como se iniciou a guerra homem-
máquina? Talvez a incapacidade de o homem perceber
que as máquinas não são apenas instrumentos.
Portanto, em Matrix, a grande revelação coincide
com a grande simulação: o que é revelado é que nos
encontramos num universo encenado (de cartão colorido
por bits) e que estamos sujeitos a um controle total, uma
dominação absoluta, por parte de uma instância maquínica, seja ela a velha
metáfora orwelliana do Big Brother ou a imagem distorcida do capitalismo
impiedoso. O que importa é então a rebeldia como modo de ser ético e não a
figura de um Messias salvador.
No fim da trilogia percebe-se
perfeitamente que Zion
continuará sendo um reduto
desvanecido de um mundo
destroçado. Neo não liberta os
milhões de seres humanos da
sua condição de existentes
quiméricos. A desertificação
do real tem que coexistir com a
tecno-cultura e, pior ainda, está
submetida a esta entidade não
humana, um sistema de controle irreversível. A única bênção de que dispomos é a
ignorância voluntária de Cypher, uma espécie de felicidade artificial (paraísos
artificiais?) forjada no engano. Assim sendo, Matrix não difere dos universos
paralelos que o consumo de drogas duras produz num autêntico castelo de cartas
que estilhaça o corpo e a mente.
O interessante ensaio de T. J. Mawson (Morpheus and Berkeley on
Reality) em P&M, coloca a grande questão de toda a filosofia do conhecimento:
Como é que sabemos se as nossas ideias se assemelham às coisas que pensamos?
Estando ou não na matrix tudo parece uma «incontornável ilusão»; imaginar a
realidade sem saber se é verdadeira ou não. Podemos comparar as nossas ideias
com as das outras pessoas? É possível sair por momentos do ponto de vista
humano? E se o mundo de Zion e da Nebuchadnezzar é uma matrix de outro
nível como nos jogos de computador? Provavelmente estaríamos dentro de uma
realidade virtual dentro de uma realidade virtual dentro de… e assim por diante.
E em que realidade está o Arquitecto? Se optarmos pela solução platónica,
apenas as ideias são reais. Mas a ideia que Morpheus faz do cockpit da sua nave
não será a mesma do que das ruas da matrix?
Para Rousseau, aqueles que pretenderem separar a política da moralidade
nunca entenderão nenhuma das duas. Serão as máquinas com inteligência
artificial um dia capazes de assumir atitudes políticas? E o que significa isto? Ser
político, como já dizia Aristóteles, implica utilizar o discurso para exprimir o útil
e o prejudicial, o justo e o injusto. Para ele, é necessário possuir o sentimento do
bem e do mal e sobretudo viver em cidade. Mas essa questão já matrix parece ter
resolvido ao erigir uma cidade das máquinas falantes e conscientes. Julia Driver
no seu ensaio «Artificial Ethics» (P&M) considera que a moralidade das ciber-
pessoas no filme é equivalente à humana visto que o programa possui
consciência. Eles não são como os loucos porque agem com uma intenção e com
uma escolha voluntária. Mas se assim fosse quem puniria os danos virtuais do
Agente Smith? Não estaria(m) ele(s) acima da justiça? O Arquitecto no segundo
episódio da trilogia “obriga” Neo a escolher entre duas portas, mas quem
constrange as máquinas? A impunidade das máquinas representaria o absoluto
constrangimento dos humanos, visto que estes se encontram sob o seu jugo.
Nesse caso, o universo de Matrix, esse mundo de sonho/pesadelo aproxima-se do
universo totalitário, onde vigora de forma permanente o estado de excepção e
onde a morte do Outro fica sempre impune. Nesse caso, todos os humanos se
transformam em vida nua à mercê dos danos que as máquinas entendessem
infligir, sem qualquer propósito racional – um mundo de pura instrumentalidade,
visto que o homem está reduzido à utilidade de produtor de energia. O seu bios, o
seu corpo, é apenas um mero instrumento ao serviço da cidade das máquinas.
Universo biopolítico portanto esta visão que resulta de Matrix onde não existe
realmente vontade livre e tudo se encontra determinado. Quem se rebela é
perseguido e «morto» virtualmente. Ora essa morte virtual implica a morte real
do corpo inserido no casulo. Não há, assim, imortalidade em Matrix, logo toda a
religião é impossível – não passa de mais uma simulação. O universo fechado de
Matrix não tem saída. É o nosso futuro? É isto que autoriza Zizek a fazer a
comparação com o nosso mundo actual. Se é que já não estamos no interior de
uma Matrix… «Esta atitude paranóica adquire um reforço posterior com a actual
digitalização das nossas vidas quotidianas. Quando a nossa inteira existência
(social) é progressivamente externalizada-materializada no grande Outro da rede
de computador, é fácil imaginar um programa maligno apagando a nossa
identidade digital e privando-nos da nossa existência social, tornando-nos não-
pessoas.» (The Matrix or The Two Sides of Perversion)
De facto, que vida social pode existir nesse limbo uterino?

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