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Vitória Heelena Cunhaa Espósito6
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anseio de propor um projeto de pesquisa para a realização do pós‐doutoramento
na Universidade Federal de São Paulo, para tanto foi questionado à mim da
publicação da Tese de Doutorado concluído em 2003 e, quais atividades foram
desenvolvidas durante esse período. Foi também inquirido sobre qual a qual
temática que estava refletindo para desenvolver a nova proposta e ainda, quais as
expectativas tinha com relação ao pós‐doutorado. Assim, iniciou a presente
proposta na qual tive como interlocutores nesse diálogo os Professores Doutores
Nildo Alves Batista e Sylvia Helena de Souza Silva Batista, docentes do
CEDESS/UNIFESP.
Nesse caminho iniciei uma re‐olhar para as minhas atividades laborativas na
Instituição de Ensino Superior onde desenvolvo papéis de docente, pesquisador e
gestor. Nessa re‐visita percebi‐me enredado em uma trama que envolvia o papel
de professor de disciplinas da área de educação e saúde, tanto na graduação como
no programa de pós‐graduação; desenvolvia e participava de grupos de pesquisa
institucionais e inter‐institucionais onde discutíamos temas atinentes a pesquisa
como ação educativa e na gestão desenvolvo, o referido papel, em um Programa de
Residência Multiprofissional em Saúde da Família.
Após 3 anos de conclusão do doutorado, sob orientação da Profa. Dra. Vitória
Helena Cunha Espósito, vi‐me desenvolvendo ações que se tornavam
indissociáveis da tríade ensino, pesquisa e extensão.
Assim, com um percurso trilhado nesse sentido e, sempre buscando a integração
de múltiplas propostas institucionais e interinstitucionais opto por compreender a
trama e os sentidos da formação multiprofissional em uma Residência em Saúde da
Família, onde participam dez categorias profissionais à saber: assistente social,
dentista, enfermeiro, farmacêutico, fisioterapeuta, fonoaudiólogo, médico,
nutricionista, psicólogo e terapeuta ocupacional. O desenvolvimento da proposta
supra citada dá‐se entendendo‐na como uma ação educativa na
interdisciplinaridade.
A continuidade desse fazer se justifica por vivenciar vários aspectos desse
processo de formação. Ao propor este projeto pretendo utilizá‐lo como âncora em
um pós‐doutoramento, na Universidade de Évora, especificamente no Centro de
Investigação em Educação e Psicologia sob a direção do Prof. Dr. Vítor Manuel de
Sousa Trindade. E, assim, integrá‐lo, para que ao me envolver com pesquisadores
de outras instituições, nacionais e internacionais, com certa experiência, de uma
forma ou de outra, a pesquisa se desenvolva e possibilite encontros e sentidos de
nosso fazer.
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SILVA, G. et al. (2007) A formação na residência multiprofissional em saúde da família como
ação educativa. Uma questão interprofissional? In, V. Trindade, N. Trindade & A.A. Candeias
(Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade de Évora
Com a implantação do Programa de Saúde da Família, na última década, como
estratégia de implementação da atenção básica, ampliou‐se não só a oferta de
postos de trabalho na esfera municipal (TEIXEIRA7), mas evidenciou‐se a
necessidade de adequação do perfil do profissional às características da
organização da atenção à saúde na modalidade PSF.
Nesse momento histórico ao dizer do perfil profissional é importante direcionar
o olhar para as Políticas Públicas de formação para que compreendendo o “modus
operandi” dinamizado pelas instituições de ensino superior tenhamos um olhar
para seus currículos.
A partir do acima exposto resgatamos parte do percurso histórico para a
contextualizar nossos estudos para tanto iniciamos tendo como ponto de partida a
década de 70 havia sido aberta uma brecha no paradigma que orienta a atenção à
saúde, com valorização das ações de promoção da saúde, prevenção da doença e
atenção integral às pessoas, em contraposição à hipertrofia da medicina curativa,
especializada e hospitalar, com excesso de procedimentos tecnológicos materiais e
medicamentosos, e baseado na fragmentação dos cuidados. O tema do “modo de
fazer saúde” e do respectivo perfil do profissional mostrou ser recorrente nos
debates sobre a reforma sanitária, aparecendo nos relatórios das Conferências
Nacionais de Recursos Humanos de 1986 e 1993, bem como na Norma Operacional
Básica de Recursos Humanos para o SUS (2002).
Em 1994 com a implantação do PSF, a necessidade de adequar o perfil dos
profissionais para uma atuação voltada para uma atenção mais integral e
integrada.
Como trata Gil‐Monte8 (2005), para apoio à expansão do PSF, criou‐se em 1998,
por meio do Departamento de Atenção Básica (DAB), do Ministério da Saúde, um
projeto dinamizador para a implementação da modalidade saúde da família: os
Pólos de Capacitação, Formação e Educação Permanente em Saúde da Família, com
a responsabilidade de fortalecer a relação educação‐serviço em torno, basicamente
das necessidades de capacitação dos profissionais de saúde constituintes das
7 Teixeira, C. F., Paim, J. S., & Vilasbôas, A. L. (1998). SUS: modelos assistenciais e vigilância da saúde / Unified
Health System, assistance models and health surveillance. Inf. epidemiol. SUS, 2, 7‐28.
8 “Formação de recursos humanos em saúde da família: paradoxos e perspectivas”. Gil‐Monte, P. R. (2005).
Validação fatorial de Maslach Burnout Inventory (MBI‐HSS) para profissionais espanhóis. Revista de Saúde
Publica, 1, 1‐8.
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SILVA, G. et al. (2007) A formação na residência multiprofissional em saúde da família como
ação educativa. Uma questão interprofissional? In, V. Trindade, N. Trindade & A.A. Candeias
(Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade de Évora
Assim sendo, com base nas temáticas emergidas das pesquisas, nos
propusemos, na continuidade, a explicitar os sentidos da formação vista como ação
educativa explorando‐a na sua dimensão interprofissional e interdisciplinar.
Sentidos, aqui, tomados na acepção gadameriana de consciência de, para, então,
nos debruçarmos sobre os saberes que se fazem necessários à qualidade do
trabalho docente.
Sobre saberes, muito se tem dito. Nossa ênfase se difere por assumirmos uma
fundamentação ontológica e, a partir dela, nos debruçarmos sobre proposições de
situações educativas de natureza prático‐poíetica, como aponta Martins (1992) em
seu último livro: Um enfoque fenomenológico de Currículo. Currículo como poíesis,
organizado pela Profa. Dra. Vitória Helena Cunha Espósito.
Para nos inserirmos no trabalho, e a partir dos resultados já apresentados à
comunidade científica, estabelecemos, sob o título A formação como ação
educativa: uma questão interdisciplinar? um ponto de intersecção entre o trabalho
proposto para continuidade e o já posto em minha Tese de doutorado: Preceptoria
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SILVA, G. et al. (2007) A formação na residência multiprofissional em saúde da família como
ação educativa. Uma questão interprofissional? In, V. Trindade, N. Trindade & A.A. Candeias
(Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade de Évora
A formação na Residência Multiprofissional em Saúde da Família como ação
educativa. Uma questão interdisciplinar e interprofissional? Buscando sentidos.
A origem da ação, sua causa eficiente, não final – é a escolha, o desejo e o
raciocínio com um fim em vista... A boa ação e o seu contrário não podem
existir sem uma combinação de intelecto e caráter. O intelecto em si
mesmo, porém, não move coisa alguma; só pode fazêlo o intelecto
prático, que visa a um fim qualquer.
(cfe. Aristóteles [30]. Ética a Nicômaco 1973, p.342)
Ao iniciar a apresentação do projeto integrado que insere‐se e interliga‐se a um
projeto integrado mais amplo e complexo por sua natureza interinstitucional têm
como coordenadora a Profa Dra. Vitória Helena Cunha Espósito e desenvolve
estudos e pesquisas na área de educação. A inserção do pesquisador deu‐se a
partir do projeto de doutoramento referenciado. A importância de apontar que o
presente projeto é desdobramento de nossas pesquisas têm o objetivo de apontar
a relevância da construção e consolidação de grupo de pesquisas e estudos inter‐
institucionais, como também, resgatar que projetos como este são uma construção
coletiva de vários pesquisadores e instituições e, assim, apontar outros caminhos
como o que faremos em seguida. a partir do grupo de estudos, já apontado e de
instituições de ensino superior brasileiras, buscamos com os contatos do grupo de
estudos estabelecer parcerias e convênios, para difundir nossos estudos e,
aproximar distâncias entre instituições internacionais. Nesse contexto, nos foi
indicado o Centro de Investigação em Educação e Psicologia da Universidade de
Évora, dirigido pelo Prof. Dr. Vítor Manuel de Sousa Trindade, catedrático dessa
universidade portuguesa com o qual passamos a desenvolver contatos para o
estreitamento de vínculos objetivando um aprendizado conjunto, coletivo, inter‐
institucional e internacional. Esta fase objetiva e descreve o início do projeto e
relata a trajetória do pesquisador. Dessa maneira o percurso, a partir dos
resultados já apresentados à comunidade científica, vislumbra um possível ponto
de intersecção, para buscar a continuidade de estudos acadêmicos, procurando
investigar as potencialidades e os desafios da interdisciplinaridade na pós‐
graduação em saúde a partir da perspectiva da interprofissionalidade.
9 Silva, G. T. R., & Espósito, V. H. C. (2001). Preceptoria com ação educativa como possibilidade para a formação
de residentes enfermeiros e médicos no municipio de São Paulo. Revista da Faculdade Santa Marcelina,
n.especial, 131‐134.
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SILVA, G. et al. (2007) A formação na residência multiprofissional em saúde da família como
ação educativa. Uma questão interprofissional? In, V. Trindade, N. Trindade & A.A. Candeias
(Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade de Évora
A formação10, ao ser vista como ação educativa, traz, no termo ‘ação’, alguns
sentidos: diz de relação, de idealizações, de valores. Fala de diversidade. Diz de
situações. Acha‐se, ainda, ao ser assim qualificada, perpassada por uma
intencionalidade que exige vê‐la dando‐se no movimento e inserida no mundo.
Situado no lócus do acontecimento vivo, no espaço e no tempo, esse fazer
confronta‐se diuturna e cotidianamente com o exercício de um pensar fundado na
lógica do improvável, que solicita escolhas e a constante tomada de decisões em
contextos de incerteza.
Assim, o presente projeto corrobora com as Políticas Públicas de formação de
profissionais na área de Saúde quando pretende permitir o diálogo entre os
residentes e preceptores/tutores para o modelo de formação desenvolvido no
Programa de Residência Multiprofissional e a Interdisciplinaridade (BRASIL,
2006).
É preciso enfatizar nas abordagens que os saberes disciplinares são abordados
parcialmente, de maneira segmentada e estanque, que estes incorporam a
complexidade dos conhecimentos científicos com saberes tradicionais e não
10 Espósito, V. H. C., & Pedra, J. (2001). A. A formação de professores como uma questão curricular: sentidos e
relações. Revista da Faculdade Santa Marcelina, n.especial, 103‐107.
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SILVA, G. et al. (2007) A formação na residência multiprofissional em saúde da família como
ação educativa. Uma questão interprofissional? In, V. Trindade, N. Trindade & A.A. Candeias
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científicos e ainda que há uma primazia das indagações de natureza ética, estética e
sócio‐ambiental, do tipo “para quê, para quem?” e a integração nos
procedimentos interdisciplinares de pesquisa, ensino e extensão dos saberes e
práticas dos atores sociais com aqueles dos pesquisadores e estudiosos.
Assim, a interdisciplinaridade não significa o somatório e a combinação de
diferentes paradigmas que constituem os departamentos e disciplinas das
universidades. A complexidade do mundo que nos rodeia, nas áreas social,
econômica, de saúde e do meio ambiente exige a participação de
pesquisadores especialistas que trazem pontos de vista complementares
sobre determinado problema ou realidade. Não representa um simples
somatório, mas a recriação e reconstrução do saber, além de departamentos
11 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Departamento de
Gestão da Educação na Saúde. (2006). Residência Multiprofissional em Saúde: experiências, avanço e desafios.
Brasília: MS
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SILVA, G. et al. (2007) A formação na residência multiprofissional em saúde da família como
ação educativa. Uma questão interprofissional? In, V. Trindade, N. Trindade & A.A. Candeias
(Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade de Évora
estanques da estrutura universitária, envolvendo pesquisadores de diversas
áreas de conhecimento.
Considerando as potencialidades desse modelo de formação em saúde, pretendo
investigar os significados, possibilidades e desafios da interdisciplinaridade neste
processo da Residência Multiprofissional em Saúde da Família.
Para tanto, nesse processo supra citado situa‐se o objeto de estudo dessa
pesquisa que possibilitará a interface da interdisciplinaridade e da
interprofissionalidade no debate do ensino superior em saúde, dialogando com as
políticas públicas de saúde e de educação.
O saber interdisciplinar se forja no encontro, na ação educativa que se
decodifica em uma situação educativa e no enfrentamento de saberes
diferenciados, na busca de sentido dos seres humanos, para apreender e
compreender os processos através dos quais encontram sua identidade e superam
as angústias frente ao esvaziamento dos sentidos existenciais.
Em uma ação educativa, nem sempre se quer apenas transmitir determinados
conhecimentos ou produzir modificações naquilo que ali está; o que se pode
pretender alcançar são transformações. Enquanto as modificações são de natureza
qualitativa, não produzindo alterações substanciais, as transformações visam
atingir estruturas, buscam constituir um outro diferente do anterior, algo
substancialmente diferente. (GADAMER 1988, p.188).
E mais: este ver considera o enraizamento do homem na mundaneidade do
mundo pela mediação da corporeidade de um corpo próprio, o corpo vivido, uma
existência encarnada. A existência constitui, decididamente, não apenas uma
matéria de significação e de linguagem, porque a verdade é aquilo que fala pelo
espelho e pela representação significativa – o próprio ato da existência.12
Uma reflexão desse porte, ao trazer à luz o caráter de intervenção da ação
educativa, é o que a expõe em sua natureza prático‐poíetica desvelando seu caráter
inter/transdisciplinar, como também, interprofissional. Mostra, ainda, o caráter
ético que reveste essa opção, pois a intervenção é fruto de uma ação – social e
individual ‐ suas decisões se apresentam em decorrência de determinada
12 Lik juen Tong. “Acto, signo e consciência: pensando em conjunto com Ricoeur”. In: Hahn, L. E. (org.) (1995).
A filosofia de paul ricoeur. Lisboa: Instituto Piaget. p. 18.
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SILVA, G. et al. (2007) A formação na residência multiprofissional em saúde da família como
ação educativa. Uma questão interprofissional? In, V. Trindade, N. Trindade & A.A. Candeias
(Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade de Évora
concepção de mundo e com uma conotação de valor que ocorre como construção
no bojo de uma determinada cultura.
Visando a distinguir as decorrências de tal posição, necessário se faz retirar da
ambigüidade aquilo que se propõe no fazer educativo como uma ação dirigida à
intervenção: uma trans – forma – ção.
Essa escolha solicita uma análise conceptual do termo para melhor
compreensão dos seus sentidos. Intervenção, do latim intervire13: ato ou efeito de
intervir. Mediação, em que ‘intervir’ significa ‘pôr‐se de permeio’, ‘ingerir‐se’, essa
palavra traz a idéia de uma ação que se dá no ‘entre’, dirigindo‐se à interioridade
de algo, interpondo‐se‐lhe ao meio. Intervenção diz de gestos, movimentos,
ocupação, combate, projetos.
Uma ação educativa que se proponha dirigida à transformação, deixa ver a
natureza plural e ontológica do homem como um ser que é, na visão arendiana, um
ser mundano que possui o poder de se retirar do mundo, sem nunca poder
emancipar‐se completamente deste mundo.
O pensamento está preso no mundo espáciotemporal e sonha libertarse
deste destino. Sonha desprenderse do seu invólucro carnal, sair da órbita
fenomenal, um pensamento que desse modo se vira contra si próprio,
destruindo sua própria condição de possibilidade.
(Rovielo, 1983, p.103)
13 Corrêa, R. A.(org.). (1991). Dicionário escolar francês‐português‐francês. s.l.: MEC/DNE.
Como intèrvenir, no francês (v.i.), essa palavra forma‐se da conjugação do verbo venir empregado sempre com
o auxiliar être. Seus sentidos: intervir, tornar‐se mediador, interpor‐se. Como verbo transitivo direto,
aproxima‐se de: ‘produzir‐se incidentalmente’.
O verbo venir, parte significativa dessa composição, traz os sentidos de: vir, ter lugar, crescer, mediar,
desenvolver‐se. O verbo être nos traz (v.i.): ser, estar, pertencer, ir. Na forma impessoal, como na expressão
n’être plus, significa ‘não mais existir’, ou, ainda, em Y être pour quelque chose – ser responsável por alguma
coisa. Consideramos interessante a acepção inglesa intervention, operation (v.t.), to intervene: to participate,
tomar parte.
14 Espósito, V. H. C. (1993). A escola: Um enfoque fenomenológico. São Paulo: Escrita. p.109. Veja‐se ainda em
Maria Anita Viviani Martins.Em direção ´construção do discurso pedagógico como prático –poíetico, in Martins
e Espósito Pedagogo – Artesão. Construindo a trama no cotidiano da escola. SP. EDUC, 1995, (reimpressão:
1997).
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SILVA, G. et al. (2007) A formação na residência multiprofissional em saúde da família como
ação educativa. Uma questão interprofissional? In, V. Trindade, N. Trindade & A.A. Candeias
(Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade de Évora
Da concepção de homem, mundo, sociedade e educação que já anunciamos,
decorre a metodologia privilegiada: a hermenêutica fenomenológica de Paul
Ricoeur15. A esse movimento – que subentende a ambigüidade humana do ‘poder
estar ao mundo vivendo na inerência’, e que caracteriza um ‘ceder à credulidade
acrítica próprio de uma consciência ingênua’ – opõe‐se outra possibilidade: a de
estar perplexo, de dar distanciamento, ad‐mirar‐se e, então, poder interrogar.
Como lembra o hermeneuta, a realidade é fugidia, a verdade se esconde e a fala
humana é escorregadia. A interpretação é um dos recursos contra o enredamento
das falsas aparências. Se tudo estivesse patente, a interpretação seria supérflua.
Contudo, mesmo esse falso estado de consciência fascinada – como diria
Heidegger, estado de alienação, forma ôntica de pôr‐se frente ao mundo – não é
uma situação desesperadora. À desconfiança, opõe‐se a fé e, se há engano, há
também a possibilidade do acerto, pois há sempre um sentido profundo que pode
ser encontrado nessa forma de compreender‐se na existência, sendo essa busca
característica de uma intenção ética que permeia a construção de uma prática
teórica. (Hahn, 1995, p.205).
Mas que ética é esta, que se coloca permeando a construção de uma prática
teórica? Qual o papel da filosofia nessa configuração? Mais: quais os saberes que se
fazem necessários para que, no cotidiano do fazer da residência multiprofissional,
a vinculação/desvinculação teoria/prática possa ser trabalhada ou enfrentada sem
as constantes acusações de nossos residentes de que, na formação universitária a
teoria foi mais valorizada em detrimento da prática, ou ainda que dizemos muito
de fazer a prática multiprofissional e interdisciplinar e que, na realidade, não
tratamos dos “que fazer?” com os quais eles realmente se defrontam em seu
mundo vida profissional. Mais ainda: como dar forma às situações vividas na
universidade e vivenciadas na concretude da prática profissional, convergem, de
tal maneira que se configuram como de natureza prático‐poíetica?
Nesse momento de objetivação é preciso dizer que em nossa prática, na
residência multiprofissional em saúde da família, há a indissociabilidade da tríade
ensino, pesquisa e extensão e o acima exposto, já indicam as possibilidades desse
fazer. Contudo, muitas vezes não a percebemos dessa maneira, assim, indicamos
essa possibilidade para desvelar o fenômeno da interdisciplinaridade e
interprofissionalidade no lócus da residência multiprofissional em saúde da
família, a partir de nossas vivências que passaremos, agora, a apontar caminhos
para sua consecução.
15Franco, S. G. (1995). Hermenêutica e Psicanálise na obra de Paul Ricoeur. São Paulo: Loyola.
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SILVA, G. et al. (2007) A formação na residência multiprofissional em saúde da família como
ação educativa. Uma questão interprofissional? In, V. Trindade, N. Trindade & A.A. Candeias
(Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade de Évora
Organização do Trabalho e o Projeto de Pós‐doutoramento
O presente trabalho, se configura formado por partes que se ligam subsidiando
umas às outras, a teórica que vai se colocando e outra a configurar‐se como
pesquisa‐intervenção e que se constitui no processo. Destacamos que o nosso
referencial de apoio é a fenomenologia hermenêutica na perspectiva de Paul
Ricoeur.
Esclareço que tenho orientado trabalhos de: iniciação científica, conclusão de
curso de graduação e de pós‐graduação lato‐sensu e co‐orientado pesquisas de
mestrado acadêmico junto ao departamento de enfermagem dessa universidade.
Os referidos estudos confluem e focam a formação e educação em saúde da qual
sou líder do núcleo e grupo de pesquisas institucionalizado. O núcleo supra citado
busca desenvolver ensino, pesquisa e extensão sobre Políticas Públicas de
Formação Profissional e Diretrizes Curriculares em Saúde; Currículo, Processo
Ensino‐aprendizagem, Avaliação e Educação em Saúde; Tecnologia Educacional,
Interdisciplinaridade, Formação Docente e Multiprofissionalidade na Área de
Saúde. Deste emanam 5 objetos de pesquisa que são:
Ao propor‐me a adentrar as questões que se colocavam para mim neste projeto,
a formulação da questão norteadora constitui‐se em momento que exigiu profunda
reflexão. Nos livros de Joel Martins aprendi e apreendi a não interrogar apenas o
mundo vivido pelos sujeitos da pesquisa, mas interrogar também, as minhas
próprias perplexidades ao ver o mundo, perplexidades que emergiram das minhas
inquietações diante do fenômeno a ser desvelado: A formação na Residência
Multiprofissional em Saúde da Família como ação educativa. Uma questão
interdisciplinar e interprofissional? Buscando sentidos como um desafio a ser
compreendido. Mas, compreendido por quem? E, no silêncio de minhas angústias e
devaneios, volto a questionar‐me. Recorro às lembranças experienciadas e
desprendo‐me de meus valores e pré‐conceitos e, por um momento, vejo‐me como
ser docente, pesquisador e gestor preocupado com o atendimento das
necessidades de residentes e preceptores/tutores. Assim, ao buscar uma forma de
interrogar a interdisciplinaridade e interprofissionalidade, tal como foi
experienciada pelos sujeitos deste estudo, pude apreender que o sentido da
palavra interrogação em uma pesquisa significa:
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SILVA, G. et al. (2007) A formação na residência multiprofissional em saúde da família como
ação educativa. Uma questão interprofissional? In, V. Trindade, N. Trindade & A.A. Candeias
(Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade de Évora
“Andar em torno dela, em todos os sentidos, sempre buscando todas as
suas dimensões e, andar outra vez e outra ainda, buscando mais sentido,
mais dimensões, e outra vez.”16
Nesse contexto, compreendi que para formular uma questão é necessário que eu
a verbalize em forma de uma pergunta clara, que me possibilite, não apenas uma
resposta simples ou definições, mas sim, que os sujeitos possam dizer de uma
forma natural e espontânea as situações vivenciadas por eles e presentes no seu
mundo‐vida, isto é, que a descrição de suas experiências envolvam pensamentos e
sentimentos sobre a realidade vivida, bem como a sua percepção da residência
multiprofissional e a interdisciplinaridade e interprofissionalidade.
16 Fini, M. I. (1994). Sobre a pesquisa qualitativa em educação, que tem a fenomenologia como suporte.In:
Bicudo, M. A. V., & Espoito, V. H. C. (org.). Pesquisa qualitativa em educação. Piracicaba: Editora UNIMEP.
(pp.24).
17 Região do Inquérito: é a região de perplexidades, é o local transparente das minhas preocupações. Não é
portanto, um espaço mas um contexto conceitual onde pessoas agem. (Nota do Pesquisador a partir de diálogo
com Espósito, V.H.C.)
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SILVA, G. et al. (2007) A formação na residência multiprofissional em saúde da família como
ação educativa. Uma questão interprofissional? In, V. Trindade, N. Trindade & A.A. Candeias
(Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade de Évora
Assim, ao decidir‐me que os sujeitos da pesquisa se constituíram de residentes e
preceptores/tutores, elegi como região de inquérito o Programa de Residência
Multiprofissional em Saúde da Família desenvolvido na Instituição de Ensino
Superior na qual desenvolvo minhas atividades laborativas. A escolha do local
surgiu como forma de situar‐me, de “voltar as coisas mesmas”, ou seja, emergiu de
um universo inserido em minha história de vida, como docente, pesquisador e
gestor administrativo.
Nesse sentido, Dartigues considera que:
“Voltar as coisas mesmas significa voltar ao mundo de experiência
considerando que, antes da realidade objetiva há um mundo prédado, e
antes de todo conhecimento, há uma vida que a fundamentou. Significa
que todo conhecimento está na origem da experiência que é o pré
reflexivo”.19
A escolha da região de inquérito, deve‐se ao fato de que a Instituição de
Educação Superior onde desenvolve‐se a residência multiprofissional encontra‐se
enredada como trama‐e‐reverso em meu mundo‐vida, quer seja por meio dos
aspectos acadêmicos vinculados a tríade ensino, pesquisa e extensão ou pelos de
gestão administrativa, os quais, são compatíveis com o meu pensar e que os
vivencio cotidianamente.
18 Diz respeito ao mundo pré‐reflexivo, ou pré‐objetivo, ou seja, à experiência vivenciada pelo pesquisador que
lhe permite interrogar o mundo dos fenômenos. (Martins, J. Op.cit. 1992).
19 Dartigues, A. Op. Cit. 1992. p.20.
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SILVA, G. et al. (2007) A formação na residência multiprofissional em saúde da família como
ação educativa. Uma questão interprofissional? In, V. Trindade, N. Trindade & A.A. Candeias
(Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade de Évora
“O tempo não é uma dimensão cronológica medido em dias, meses e anos, mas
sim horizonte de possibilidades do ser”.
“Perceber o fenômeno quer dizer que há um correlato e que a percepção
não ocorre no vazio, mas em um estarcomo percebido”.21
20 Esposito, V. H. C. referindo‐se ao texto de Joel Martins Não somos cronos somos kairós em palestra proferida
no Módulo: Pesquisa em Educação: uma Abordagem Fenomenológica. (Notas do Pesquisador).
21 Bicudo, M. A. V. (1994). Sobre a Fenomenologia: pesquisa Qualitativa em Educação. Piracicaba: UNIMEP.
p.18.
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SILVA, G. et al. (2007) A formação na residência multiprofissional em saúde da família como
ação educativa. Uma questão interprofissional? In, V. Trindade, N. Trindade & A.A. Candeias
(Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade de Évora
Dialoguei com cada residente, preceptor ou tutor de meu contato muitas vezes,
e nesse ir e vir, fui aos poucos percebendo uma disposição mútua de abertura,
embasada na empatia e confiança. Neste momento, aproximei‐me novamente do
indivíduo e expliquei os objetivos de meu estudo solicitando sua participação.
Assim, iniciei cada contato pedindo a permissão para gravação do encontro. Foi
permitido, aos sujeitos falarem livremente sobre a residência multiprofissional em
saúde da família e suas nuances com a interdisciplinaridade, não sendo
estabelecido tempo de duração de nossos diálogos ou encontros de orientação.
OS DISCURSOS
A linguagem é uma das maneiras do ser‐no‐mundo e vê‐se absorvido por ele22.
Pela articulação das palavras, o ser expressa a mundaneidade de seu mundo e se
abre ao mundo dos entes envolventes. Assim, a linguagem é vista como o domínio
em cujo interior qualquer forma de pensamento reside e se move.
Heidegger analisa a existência humana como um discurso que se alimenta de
um contato prévio com um tempo de verdade e sentido. É um movimento no qual a
originariedade é gerada na inteligibilidade23, compreensão e zelo do ser.
O discurso é a articulação do compreensível para o ser, e é através da linguagem
que o ser opera um desvelamento dos significados concretos do mundo. O discurso
do mundo é uma palavra do ser e a sua existência reflete esta linguagem
fundamental, ou seja, através do discurso torna‐se possível compreender a
situação do homem no mundo.24
O ser‐aí é, portanto, para Heidegger um ser situado no mundo, realizando‐se
como ser de linguagem. O homem se mostra como ente que é, no discurso
compreensível na ausência ou na presença de qualquer realização. Assim, o ouvir e
o silenciar constituem‐se em momentos do discurso de possibilitam ao homem
uma compreensão do que o ser lhe diz.
22 Estar absorvido no mundo: quer dizer estar vivencialmente ligado ao mundo, interpenetrado nas coisas, nos
entes‐envolventes. Heidegger, M. Op. Cit. 2002, p. 25.
23 Relativo à inteligência, no seu movimento peculiar de articular sentidos e significados.
24 Resweber, J.P. Op. Cit. 1982.p. 145.
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SILVA, G. et al. (2007) A formação na residência multiprofissional em saúde da família como
ação educativa. Uma questão interprofissional? In, V. Trindade, N. Trindade & A.A. Candeias
(Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade de Évora
Nesse sentido, é necessário que o homem assuma seu verdadeiro habitar, ou
seja, a responsabilidade de ouvindo o ser, torná‐lo palavra, pois é o próprio homem
que se manifesta através da linguagem que entendida como uma dimensão
essencial, não é apenas uma atividade do homem, mas sim um desvelar do Ser‐
Homem. E, neste desvelamento, o Ser expressa seu sentido do mundo.
“O discurso é a vivencia expressa. Lidase com ela para se obter o
significado. Este não está nas coisas, está no sujeito, que é o atribuidor dos
significados”.25
AS UNIDADES DE SIGNIFICADO
Para encontrar as unidades de significado, tomarei os discursos, lendo‐os
atentamente, tanta vezes quantas se fizeram necessárias, até que os significados
começaram a surgir aos meus olhos. Nesse momento, destacarei trechos para mim
significativos e os transformarei em unidades de significado, mantendo‐os como
foram expressos pelos sujeitos. Neste processo de redução fenomenológica não
haverá preocupação em enumerar fatos, mas sim, em buscar o significado que os
eventos têm, enquanto fenômenos, para os sujeitos que os descreveram. Para o
tratamento dos dados desta pesquisa, utilizarei além de análise fenomenológica do
discurso dos sujeitos, a análise compreensiva e interpretativa das proposições
emergidas das unidades de significado.
25 NUNES, D.M. Op. Cit. 1995. p.68.
26 Redução fenomenológica ou epoqué: “é a operação pela qual a existência efetiva do mundo exterior é “posta
entre parênteses”, para que a investigação se ocupe apenas com as operações realizadas pela consciência, sem
que se pergunte se as coisas visadas por ela existem ou não realmente.”
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(Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade de Évora
Deste modo, buscarei aproximar‐me do “logos” do sujeito para apreender o
sentido pelo qual eles manifestam sua compreensão da interdisciplinaridade e
interprofissionalidade para residentes, preceptores/tutores da residência
multiprofissional em saúde da família. A totalidade significativa ali articulada e por
mim, apreendida será desmembrada em unidade de significados que permitirão
aproximar‐me da concepção que os seres residente e preceptor/tutor expressam
ao vivenciarem situações de interdisciplinaridade no cotidiano do programa saúde
da família.
Heidegger manifesta que é o logos hermenêutico que se mostra através da
compreensão do ser, enquanto somos um modo de compreender e interpretar o
conhecimento. Conhecimento do mundo é um modo de ser do estar‐aí, e um modo
de ser que está onticamente fundado em sua constituição fundamental, o ser‐no‐
mundo.
O método fenomenológico trata daquilo que se esconde sob o “logos”, que é a
singularidade que tenta se expressas no “logos”, mas que o “logos” sempre oculta.28
27 Damasceno, M. M. C. (1997). O existir diabético da fenomenologia à enfermagem. Ceará: Fundação Cearense
de Pesquisa. p. 65.
28 Stein, E. (1988). Seis estudos sobre “Ser e Tempo”. Petrópolis, s.n. p.205.
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ação educativa. Uma questão interprofissional? In, V. Trindade, N. Trindade & A.A. Candeias
(Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade de Évora
Unidades de significados. Análise e explicitação do texto.
Símbolos29 presentes no discurso do sujeito;
Síntese.
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29 O problema da compreensão para a fenomenologia, é relativo ao símbolo como característica essencial do
mundo humano. A fenomenologia reconhece, no símbolo, a correspondência entre o homem e o sentido, aí, em
termos mais técnicos, entre o significante e os significados; portanto, há sentido no símbolo, porque se trata do
homem; há significantes, porque há significados existencialmente vividos. REZENDE, A. M. (1990). Concepção
fenomenológica da educação. s.l: s.n. p.27.
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