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TOMO XV
(Arts. 1.046-1.102)
CAPÍTULO X
Art. 1.052
1)Suspensão do proceSso
2)Bens não embargados
3)Efeito de suspensão da execução
4)Suspensão parcial e não-suspensão
5)Nulidades do processo principal
6)Partes na ação e embargante
7)Alienação de bem em fraude
8)Prazo e oposição a qualquer tempo
9)Suspensão do procedimento e decisão do juiz
10)Recurso, pendente, de terceiro e oposição de embargos de terceiro
11)Sentença trânsita em julgado
CAPITULO XI
Da habilitação
1)Conceito e processo de habilitação acidental
2)Ações de herança e habilitação acidental
3)Habilitação autoral e habilitação defensiva
Art. 1.055
Art. 1.056
1)Legitimação ativa
2)Angularização
3)Legitimação da parte
4)Legitimação dos sucessores
Art. 1.057 e parágrafo úniCO
1)Petição
2)Citação
3)Herdeiros incertos
4)Fazenda Pública
5)Parte com procurador constituído na causa
Art. 1.058
Art. 1.059
1)Habilitação em tribunal
2)Pedido ao juiz relator
3)Falecimento da parte antes da remessa do recurso
Art. 1.060
Art. 1.061
1)Adquirente e cessionário
2)Sub-rogado
3)Interesse no prosseguimento e interesse na inserção na relação jurídica processual
4)Alusão pelo juiz
Ãrt. 1.062
1)Natureza da sentença de habilitação
2)Retomada do curso
3)Suspensão do procedimento e não-suspensão
CAPÍTULO XII
Da restauração de autos
1)Autos e restaurabilidade
2)Autos extraviados ou destruídos
3)Ação de restauração de autos
CAPÍTULO XIII
CAPITULO XII
Do juízo arbitral
Arbitragem e compromisso para a arbitragem
Eficácia do compromisso
Conceito de compromisso
Direito grego
Direito romano
Direito moderno
Exceção de compromisso e eficácia do compromisso
Fatos supervenientes ao compromisso
Incidência e aplicação da lei, arbitragem e cognição
Compromisso e direito material
Referência a árbitros e pluralidade de árbitros
Dois negócios jurídicos distintos: o compromisso e o contrato arbitral
Necessariedade e voluntariedade do compromisso
Judicialidade e extrajudicialidade
Compromissos exteriores e compromissos interiores
Cláusula compromissória
Dívidas fiscais
Incomprometibilidade e ineficácia
Cláusula penal
pressupostos do compromisso
Pressupostos especiais do negócio jurídico
Cláusulas não essenciais
Determinação do que se há de decidir
Âmbito da questão
Nomeação dos árbitros no compromisso
Nomeação protraida
Forma do compromisso, direito material e direito processual
Negócio jurídico do compromisso
Extinção do compromisso
Decretação de nulidade do compromisso
Limites do julgamento
Nomeação dos árbitros
Recurso em arbitragem, distinções preliminares
Homologação
Compromisso e vontade dos cornpromitentes
Nulidade e anulabilidade
Perda de objeto
Atos processados no juízo arbitral
Pacto “de compromittendo”
Seção 1
Do compromisso
Art. 1.072
Art. 1.073
1)Espécies de compromisso
2)Escrito público ou particular
Art. 1.074
1)Pressupostos contenutisticos do compromisso
2)Profissão e domicilio do figurante
3)Profissão e domicílio dos árbitros
4)Objeto do litígio
5)Valor da causa
6)Honorários dos peritos e despesas processuais
Art. 1.075
1)Prazo para o laudo arbitral
2)Recorribilidade e irrecorribiidade
3)Recurso interposto contra a cláusula “sem recurso”
4)Julgamento por eqúidade
Art. 1.076
1)Nomeação de árbitros
2)Autorização aos árbitros
Art. 1.077
1)Extinção do compromisso
2)Escusa de árbitro, sem haver substituto
3)Falecimento e impossibilidade da função do árbitro
4)Expiração do prazo para o laudo arbitral
5)Falecimento da parte e herdeiro incapaz
6)Divergência dos árbitros quanto a nomeação do terceiro
SEÇÃO II
Dos árbitros
Art. 1.078
1)Função do árbitro
2)Cláusula de recurso
Art. 1.080
Art. 1.081
1)Prazo para o laudo arbitral
2)Prorrogação do prazo
3)Convenção das partes e força maior
Art. 1.082
1)Responsabilidade dos árbitros
2)Motivo justificado
Art. 1.083
1)Lacunas da legislação processual sobre juízo arbitral ....
2)Espécies mais relevantes
3)Confissão perante o juízo arbitral
4)“Declaração” da decisão arbitral
Art. 1.084
1)Despesas
2)Honorários dos árbitros
Seção III
Do procedimento
Art. 1.088
Art. 1.089
1)Pleito perante o juízo arbitral
2)Compromisso na pendência da lide, autos do processo
3)Decisão judicial e compromisso ou juízo arbitral
4)Lide pendente e celebração de compromisso
Art. 1.090
1)Restituição dos autos
2)Extinção do compromisso
Art. 1.095
Art. 1.096
1)Julgamento e publicação
2)Competência do juizo a que se tem de remeter ou autos
Art. 1.097
Seção IV
Da homologação do laudo
Art. 1.100
1)Apelabilidade
2)Novo julgamento da causa pelo juízo
3)Recorribilidade quanto ao ato homologatório ou denegatório
4)Provimento e apelação quanto à sentença dahomo1ogação ou denegatória
5)Laudo arbitral e eficácia
IX.Ação de demarcação
X.Ação de embargos de terceiros
XI.Ação de habilitação.
XII.Ação de restauração de autores
XIII.Ações relativas à reserva de domínio
XIV. Juízo arbitral
XV.Ações relativas à herança
A)Ações de nomeação e de investidura
B)Ação de Impugnação e de remoção de Inventariante
C) Ação de sonegados
D)Ações quanto às dividas passivas
CAPITULO X
CAPÍTULO X
A diferença material entre os embargos de terceiro, que são a espécie (c), e a oposição, que pertence à
espécie (a), está em que, na oposição, há ação em ângulo contra ato das duas partes (feitas réus), ou de uma,
a respeito da coisa ou do direito; nos embargos de terceiro, a ação é contra o ato do Estado, e não contra o
ato da parte, a favor de quem se concedeu o mandado de penhora, depósito, arresto, seqüestro, venda
judicial, arrecadação, partilha, ou outro ato de constrição judicial. Em quase todos os casos, os embargos de
terceiros, senhores e possuidores, ou só possuidores, dos bens constritos, levam consigo a discussão do título
do autor na medida preventiva, ou satisfativa, e a sentença, por seu alto valor declarativo, tem força de coisa
julgada. A incidentalidade dos embargos de terceiro não é só formal; a pretensão do terceiro embargante
exerce-se naquele momento, por que foi levado a defender o seu bem. O ato do Estado é que faz esizontar a
ação. Por isso mesmo, a ação de embargos de terceiro pertence àquela classe de ações que, ferindo-se o
direito material, nascem no direito processual: foi ato processual que feriu a pretensão do terceiro. Esse ato
é judicial, relativo a constrição estatal. Não seria admissível contra o simples suprimento judicial de
consentimento de alguém i~ara a venda de bens, se essa venda não é regida pelos arts. 1 . 113-1.119. Outra
conseqüência da natureza da ação de embargos de terceiro é que, sendo dirigida contra o ato do Estado, a
competência é do juiz que praticou o ato.
(a)Os embargos de terceiro são a ação do terceiro que pretende ter direito ao domínio ou outro direito,
inclusive a posse, sobre os bens penhorados ou por outro modo constritos. O usufrutuário, por exemplo, é
senhor; o locatário é possuidor. Se a penhora não lhes respeita o direito, um ou outro pode embargar como
terceiro. Daí ser tão freqúente, “questio quae tota die versatur de facto” (CINO DA PISTOlA no começo do
século XIV, sobre a L. 2, O., ne uxor pra manto vei maritus pra uxore veZ mater pra filio conveniatur,
4, 12), “matéria, quae quotidie versatur ín practica” (JASÃO DE MAINO, sobre a L. 15, § 4, D., de re
judicata ei de ei fecsu sententiarum et de interlocutionibus, 42, 1).
O dano, que sofre o terceiro, há de ser ex executione; não basta o ser ex cognitione. Mas, ai, executio está
em sentido amplo. Os embargos de terceiro são remédio jurídico processual, “ação”, pelo qual os terceiros
“executionem possunt impedire”. No processo de cognição, pode haver a intervenção principal ou a
oposição de terceiro, que corresponde aos embargos de terceiro, não os embargos de terceiro que supõem
constrição, ato, execução, em senso fatíssímo; mas, com a sentença, pode começar a eficácia constritiva.
A execução forçada não é só a que começa pela penhora. Há execução forçada das obrigações de fazer ou de
não fazer. Onde quer que a ação possa atingir, sem ser em ação declarativa ou de condenação o direito do
terceiro, como acontece em todas as ações executivas, em algumas constitutivas e algumas mandamentais,
os embargos de terceiro são permitidos. Qualquer que seja a constrição judicial em mandado, ou em alvará,
ou em~ ordem.
Na mesma pessoa tísica ou jurídica podem estar as figuras das partes e do terceiro. Por exemplo: o cônjuge
sobrevivente, cujos bens partilhados foram penhorados por algum credor de dívidas comuns (e. g., Supr~mo
Tribunal Federal, 29 de dezembro de 1949, O D., 68, 215, E. dos T., 209. 477, e R. F., 139, 147); o
comuneiro do edifício de apartamentos, se a penhora, por dívidas comux1s, apanhou apartamento que, por
sua construção e posição, não foi alcancado pelas obras cujo custo se cobra, cf. Câmara Cível do Tribunal de
Justiça do Ceará, 8 de outubro de 1951 (J. e D., IV, 125), 1.a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do
Paraná, 17 de agosto de 1951 (Paraná J., 56, 19), e 1.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 15
de abril de 1952 (E. dos T., 201, 318).
(b)Os embargos de terceiro sendo, como são, contra ato do juiz, distinguem-Se da ação possessória, e de
certo modo se justificam por ser turbado ou esbulhado o terceiro sem poder desforçar-Se, isto é,
possessionem recuperare auctoritate propria, como tão percuciente foi MANUEL GONÇALVES DA
SILVA (Commentaria, III, 293) em vê-lo, o que, por certo, se lhe permitiria se adversus alios extraneos.
A concepção dos embargos de terceiro como remédio jurídico possessório seria errada, porque a posse pode
ser o direito invocado, entre tantíssimos outros (sem razão, a 1~a Câmara Civil do Tribunal de Apelação de
São Paulo, a 10 de janeiro de 1944, R. dos T., 152, 541). O art. 505, 2•a parte, do Código Civil só é
invocável se a ação contida na ação mandamental é sobre a posse do terceiro.
A constrição judicial pode provir de execução voluntária, como se alguém pede ao juiz que ordene o registro
de algum bem em nome do adquirente, se o bem é de outrem., ou se foi arrecadado, a pedido, algum bem,
ou se vai ser partilhado, ou se vai ser vendido para divisão do preço. Não se pode pré-excluir a oposição de
embargos de terceiro nos processos de medidas preventivas~ de arrecadação, de inventário e partilha, nas
ações do pré-contraente comprador ou do pre-contraente vendedor (e. g., tratando-Se de imóveis, uma vez
que a impugnação somente concerne ao registro, antes de ser feito, e a medida de constrição pode apanhar
mais outro bem que o registrado); sem razão, a Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, a 20
de abril de 1950 (R. dos T., 203, 566). No sentido do que dissemos na 1.a edição dos Comentários ao
Código de PrOceSSO anterior, a 1.a Turma do Supremo Tribunal Federal, a 25 de maio de 1950 (D. da J. de
22 de março de 1952). O direito ofendido pode ser domínio , ou direito real limitado, ou direito pessoal ou
posse. Qualquer direito ~6.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de são Paulo, 27 de abril de 1951, R. dos
T., 192, 782). A constrição judicial pode ferir direito não-patrimonial de terceiro,
como se estão a discutir direito de guarda de filho A e B, e C, terceiro, se diz pai, ou tutor, e o juiz deposita
o menor, ou de qualquer modo o retira de B. O direito pode ser pessoal, como se o juiz penhora crédito,
pretensão ou ação, ou se, devendo somente penhorar o bem, deducta a dívida, a pretensão, ou a ação, o
penhora sem qualquer restrição , ou se, devendo somente penhorar o crédito, a pretensão ou a ação, penhora
o bem, cujo domínio ou direito real ainda não foi transferido ao credor, ou titular da pretensão ou ação.
Assim é que se há de entender o acórdão da 5~a Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a
24 de outubro de 1950 (R. de D. 1., 12, 79), que permitiu embargos de terceiro por parte de contraente
comprador de imóvel, antes da transcrição (sem razão, a Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Santa
Catarina, a 20 de abril de 1950, R. dos T., 203, 566).
Nas ações de divisão e demarcação (5.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 16 de junho de
1950, e 6.~ Câmara Civil, 4 de abril de 1952, R. dos T., 188, 212, e 201, 148; Câmaras Civis Reunidas, 22
de agosto de 1952, 205, 153), nas ações de inventário e partilha ou de arrolamento (3.a Câmara Civil do
Tribunal de Justiça de são Paulo, 22 de fevereiro de 1951, R. dos T., 192, 195) e em quaisquer ações
arrecadativas. Sem razão, a 2.~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, a 7 de agosto de 1950
(R. F., 145, 320), repeliu embargos de terceiro em ação de divisão, na qual a linha perimétrica invadiu terras
de terceiro.
(e) Os embargos de terceiro, já vimos, são ação; e ação mandamental negativa. Se a lei a põe entre as ações
acessórias, tal acessoriedade lhe vem de ser mandamental negativa. Porém, historicamente, nem sempre foi
assim. No direito lusitano, nos séculos XII e XIII, provavelmente antes, pois a “autorização judicial” para a
penhora e o arresto já aparece no ano 1095 (Decreto do Governador da Galícia) e no Foro de Miranda da
Beira (Port. Mon Hist., Leges et Consuetudines,373), começou o monopólio estatal da execução e da
segurança. Antes, porém, existiu (e através de séculos, depois, ainda perdurou) a prenda extrajudicial. Pode
dizer-se que a penhora judicial dos bens do devedor, presente o “merinus”, é obra do século XII. A
princípio, a ação do executado e a do terceiro eram de condenação, ainda quanto aos efeitos da violação da
resolução judicial de relaxamento (Foro de Teruel, art. 159).
Quando a prenda privada desapareceu e se exigiu, através da terrível resistência que encontrou a
estatalização das constrições (o Rei teve de ceder, em 1095, ao povo de Castelo Bom), a judicialização das
constrições, a situação jurídica mudou: em vez de vir contra o ato do credor, o terceiro ia contra o ato do
Estado. Tendo o Estado substituído o particular, já a ação de condenação não se justificaria, máxime
naqueles tempos. Afonso II e Afonso III edictaram leis daríssimas sobre só o Estado poder decretar as
constrições: “nom ouse a penhora outros senom”, dizia Afonso II, “aquel que poder provar que he seu
devidor ou fiador”, e Afonso III adniitia: “non seja algum tão ousado que sem Mandado d’El Rey, ou per
seu consentimento, filhe alguá cousa movel, ou raiz, de que outrem tenha a posse, salvo sendo
primeiramente chamado a Juízo esse, que assi estever em posse della”. Cf. Ordenações Afonsinas, Livro IV,
Título 65, ~ 1, Título 9, § 3; Leges et Consuetudines, 1, 255. Houve certa vacilação quanto à pena, o que
preocupou a HENRIQUE DA GAIVIA B.Am~os (História da Administração Pública em Portugal, III, 339 e
340) e a nós (História e Prática do Arresto, 42-47); mas isso foi devido à transmutação da ação de
condenação em ação manda-mental, quando se assentou a estatalização da constrição que teve por fito
proteger os “forçados” (as classes devedoras e possuidoras sem direito de domínio) contra os “forçadores”
(as classes dos que “som sempre mais poderosos que os forçados”, conforme explica lei de 1). João 1, que
aparece nas. Ordenações Afonsinas, Livro V, Título 27, §§ 10 e 13). Havia “mester Official poderoso pera
alçar essas forças e fazer entregar essas cousas forçadas”.
Temos, hoje, embargos de terceiro, por ofensa à posse e ao direito, se o ato do juiz provocou constrição
judicial. A alusão à posse, de per si, atende à tradição do nosso direito, que a recebeu, provavelmente, no
século XIV (MANUEL MENDEs DE CASTRO, Practica Lusitana, 1, 104, citou pós-glosadores). Quanto
aos “direitos” que não eram o de domínio nem posse,. ainda decisão do Senado português, em 1614, repeliu
embargos de terceiro; mas isso porque ainda não se revelara o principio da coextensividade da constrição e
da embargabilidade por terceiro: se o juiz arrestou, seqüestrou, penhorou, ou por outro modo prendeu bens
(no mais vasto sentido) de outrem, o terceiro ofendido pode embargar o ato. Admitiu-se mesmo ao
embargante, e com razão, alegar a prescrição da pretensão do executado quanto ao bem objeto da prenda
judicial (MANUEL MENDEs DE CASTRO, Practica Lusitana, 109).
(d) A ação de embargos de terceiro ou acaba pela sentença de repulsa, ou pela sentença de acolhimento, que
é, preponderantemente, mandamental. Essa classificacão científica é recente, pois a opinião prevalecente
considerava-a declarativa. Depois se pensou que fosse constitutiva. ANTONIO SEGNI (L’Intervento
volontario in appello, 35) e GIU5EFPE CHIOVENDA (Principii, 1014) viram que havia mais do que
declaração, porém entenderam que seriam ação e sentença constitutivas. A sentença negaria,
constritivamente, a respeito do terceiro, a sentença embargada e a sua exeqtii’oilidade. Mais ou menos
assim, FRANCESCO CARNELUTTI (Le~Joni, IV, 201 s.).
Na Itália, F. G. Líivuu (Caratteri e presupposti deli’opposizione di terzo, Rivista, III, Parte 1, 29) ainda
sustentou ser sentença de declaração. Ncm aqueles nem esse tinham razão:
esse reconhece de menos; a4queles, de mais. A sentença não declara só, tanto que o ato judicial impugnado
cede, o que seria eficácia demasiado forte para a sentença declarativa. Por outro lado, nada se altera à
existência, à validade ou a eficácia da sentença, ou do ato embargado, no que foi justo entre as partes (e. g.,
o direito de ação de reivindicação contra
o terceiro possuidor continua penhorável). O elemento constitutivo só acidentalmente vem à primeira plana
se o ato, além de embargável, era nulo ipso iure, mas há, aí, outra questão (a de cumulação de ações).
Considerai a sentença, nos embargos de terceiro, constitutiva, é generalizar esse acidente, fazê-lo natureza
da ação. A força constitutiva é demasiado forte para a sentença do art. 1.053 (cf. art. 803). Os direitoS do
embargado perante a outra parte ou dos embargados entre si não sofrem qualquer alteração com a sentença
nos embargos de terceiro. Nota-se que os proceSsualistas italianos, como os alemães , andavam à procura da
verdadeira natureza de tal sentença. Já Mxaco TULLIo ZANzUccm (Nuove domcznde, 274 5.) e ENRICO
REDENTI (Ii Giudi74o civile con pluralità di parti, 118 e 120) se esforçavam por manter a afirmação de ser
declarativa a sentença e apontar algo de específico, que seria a negatividade (sentença declarativa negativa:
declaração da lesão a ser repelida). Sentiam todos que a realidade 11-les escapava. A declaratividade, a
condenatoriedade, ou, até mesmo, a constitutividade está à base da mandamentalidade, mas apenas como
requisito de fundo da força de mandamento.
o autor dos embargos de terceiro tem a ação mandamental, que é a dos embargos, preciosa para evitar
consequências publicíSticas dos atos processuais (e. g., venda judicial do bem de terceiro), e a ação própria
ou as ações próprias do direito que ele invoca. É nesse sentido que se diz ser remédio “voluntário”. Nada lhe
obsta propor, prescindindo da força mandamental da sentença proferida nos embargoS de terceiro, a ação de
reivindicação, ou a anulatória (pauliana), ou outra, que corresponda à sua preten5ão~ salvo, está claro,
alguma preclusão~ o que melhor se estuda no fim da obra, a propósito dos embargos de terceiro na execução
(ve3a art. 1.048).
Ainda em 1946, MAnco TULLIO ZANzUCCRI (DirittO Processuaie Civile, ~ 4.a ed., III, 343) classificou
a “oppoSizione di terzi”, que são os embargos de terceiro do direito brasileiro, posto que mais característicos
esses embargos de terceiro, como ação de declaração negativa, isto é, ação tendente à declaração da
ilegitimidade material da execução em relação ao objeto, quanto ao terceiro. Tal declaratividade negativa
implicaria a declaraçao positiva do direito do opoente (terceiro embargante). ~,Se ele alegasse a
propriedade? Seria ação de declaração do direito de propriedade, concepção que o próprio MARCO TuLLIo
ZANzUOCHI combateu. Também AxTONINO CONIGLIO (11 Processo esecutivO, 463), para manter a
classificação da “opposizione di terzo” como ação declarativa, afirmou que “o efeito mediato da ação em
oposição édado pela restituição daquele bem a respeito do qual se declarou pertencer ao opoente”. Mediato,
não; imediato. Foi esse o pedido, essa é que é a eficácia específica dos embargos de terceiro e, por igual, da
“opposizione di terzi” dos textoS italianos.
5)PENDÊNCIA DE Ação EXECUTIvA. Os embargos de terceiro podem ser opostos na execução, porém
o direito brasileiro não tem os embargos de terceiro revocatórios ou anulatórios do direito sardo, a
opposizione revocatoria. É certo que nasceram tais embargos de se ter sentido necessidade de dar ao credor
prejudicado meio expedito para evitar que se levasse a cabo a execução. Verdade é, porém, que o direito
brasileiro tem algo próprio.
O credor prejudicado, no direito brasileiro, continua com a sua ação de anulação por fraude contra credores,
ainda que sobrevenha sentença condenatória contra os figurantes do negócio jurídico fraudulento, ou, até,
execução. Tem ele de propor a sua ação, à parte, que nada tem com a eficácia da sentença de condenação (ex
hypothesi, não foi julgada a matéria da fraude), nem, sequer, com a cognição adiantada em ação executiva
dos títulos extrajudiciais, nem com a eficácia do despacho na ação iudicati. Para evitar que a execução se
ultime, tem o credor de embargar ou suscitar o concurso de credores, onde se pode discutir a fraude contra
credores.
Aberto o concurso de credores, pode ser alegada, discutida e julgada a matéria da fraude contra credores.
Quando se empresta a tal impugnação o caráter de embargos de terceiro, ou de oposição de terceiro,
confundem-se institutos diversíssimos. A ação é de anulação; é a mesma ação de que cogita o direito civil,
subordinada a exigências processuais do concurso de credores, ganhando celeridade e perdendo em prazo de
propositura. Quanto aos credores retardatários, não pode haver essa abreviação processual; a ação contra os
seus créditos é a ordinária. Se há falência, e não se julgou antes, a despeito de ação de condenação, a
matéria da traude contra credores, nem se renunciou à ação de anulação ou de revogação, nada obsta a que
se exerça, satisfeitos, para isso, os respectivos pressupostos.
Art. 1 . 046. Quem, não sendo parte do processo 1) ~), sofrer turbação ou esbulho na posse 7) 10) 11) de
seus bens por ato de apreensão judicial, em casos como o de penhora, depósito, arresto, seqüestro 16),
alienação judicial, arrecadação, arrolamento, inventário, partilha 3), poderá requerer 2) 12) 15) lhes sejam
mariutenidos ou restituidos por meio de embargos4).
§ 1.0 Os embargos podem ser de terceiro senhor e possuidor, ou apenas possuidor6) 13) 14)
§ 29 Equipara-se a terceiro5) a parte que, posto figure no processo, defende bens que, pelo título de sua
aquisição ou pela qualidade em que os possuir, não podem ser atingidos pela apreensão judicial.
§ 3~O Considera-se também terceiro o cônjuge quando defende a posse de bens dotais, próprios, reservados
ou de sua meação 17).
Art. 1 . 047. Admitem-se ainda embargos de terceiro:
1 para a defesa da posse, quando nas ações de divisão ou de demarcação, for imóvel sujeito a atos 12 2atcri
ais, preparatórios ou definitivos, da partilha ou da fixação de rumos 18);
Ii para credor com garantia real 19) obstar alienação judicial do objeto da hipoteca, penhor ou anticrese 8)~
2)LEGITIMAÇÃO ATIVA DO TERCEIRO. (1) A primeira regra jurídica sobre a legitimação ativa do
terceiro é a de que somente pode embargar como terceiro quem não tomou parte no feito (art. 1.046: “não
sendo parte no processo”). Mais precisa e cientificamente se há de dizer que não rode usar de embargos de
terceiro quem quer que esteja sujeito à eficácia do ato judicial que pretende embargar. No fundo, há, ai, um
tanto disfarçada, mera tautologia (Tribunal Regional do Trabalho, 8 de agosto de 1963, D. da J., de 16 de
agosto: “Mais precisa e cientificamente se há de dizer, ensina PONTES DE MIRANDA, que não pode usar
de embargos de terceiro quem quer que esteja sujeito à eficácia do ato judicial que pretende embargar. É
justamente, o caso discutido”).
A base da legitimação ativa dos embargos de terceiro está toda a teoria dos limites subjetivos da eficácia dos
atos jurisdicionais, e não só da coisa julgada material. Quem não for parte está, no art. 1.046, por “aquele
que não participa da eficácia do ato judicial”. a) Ali, ainda se supõe a determinação (e discussão) de quem é
que se equipara à parte. b) Aqui, já se supõe ter-se determinado quem é (e, pois, encerrada a discussão). a’)
Ali, alude-se à res iudicata (material), porque é o que mais acontece. b’) Aqui, a qualquer eficácia do ato
judicial; e não há dúvida que o terceiro também se pode opor a que a sua esfera jurídica seja invadida pela
eficácia de ato~ jurisdicional que não seja a de coisa julgada material. Se, na constrição, se ofende interesse
de quem é parte, mas está fora do objeto da demanda, o ofendido, aí, é terceiro, e não parte (1.~ Câmara
Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 4 de dezembro de 1944, R. dos T., 156, 153), desde que se
precise a distinção (3.a Câmara Civil, 15 de março de 1944, 151, 599), extremados os interesses.
Quando a lei, em a), fala de “quem, não sendo parte”, não exclui a praxe, em b), que explicitou as
expressões semelhantes e superou as interpretações restritivas (ADOLF WACH, Zur Lehre vou der
Rechtskraft, 52). A doutrina por longo tempo se emaranhou em discutir se podia o terceiro, isto e, o que não
é parte, nem equiparado a parte, ser excepcionalmente sujeito à eficácia de atos jurisdicionais. A
ambigúidade, se não equivocidade, da expressão “res iudicata” levou os juristas a porem o problema como
de limites subjetivos da coisa julgada material; vale dizer como se a coisa julgada material pudesse atingir
terceiros e como se ela fosse exaustiva de toda a eficácia dos atos jurisdicionais. Feitas essas~
considerações, passemos à segunda regra jurídica.
(2)A segunda regra jurídica sobre a legitimação ativa do terceiro é a de que pode usar dos embargos de
terceiro o que só seria parte se houvesse identificação entre ele, terceira executado, e a pessoa que “figura”
como parte. Por exemplo: a sentença é contra A. Antunes e a execução contra A. A. Antunes, outra pessoa.
Se, porém, a sentença foi contra A. A. Antunes, em vez de ter sido contra A. Antunes, e a execução é contra
A. A. Antunes, os embargos de terceiro não cabem; caberiam embargos do devedor, do sujeito à execução,
para fazer valer a nulidade ipso iure da falta de citação ou da citação nula (art. 741,1), porque então aquele
contra quem correu à revelia o feito se exime à execução, reduzindo a não-
-existente a sentença nula ipso iure: decretada a nulidade. deixa de existir a sentença e, pois, eficácia da
sentença. Note-se a diferença, de que tantas vezes tratamos, entre nulidade e rescindibiidade. A sentença,
nos casos do art. 741, 1, é sentença existente e nula, porque a nulidade da falta de citação ou a citação nula,
que se sanaria com o comparecimento da parte, não se sanou, nem se teve tal força de sanação ao ocorrer a
preclusão dos prazos para se recorrer da. sentença.
Se a sentença foi contra A. A. Antunes e a execução é contra A. A. Antunes, não tendo sido citado, na ação,
A. A. Antunes, mas outrem contra quem ocorreu o processo, sob falso nome, então é o caso de processo sob
falso nome, de que já tratamos noutro lugar. O verdadeiro A. A. Antunes é terceiro, nesse processo; o
processo correu contra outra pessoa, que usou de falso nome.
(3)Terceira regra: se a pessoa figura na sentença como parte, e não no foi, embora o pudesse ter sido, se
tivesse sido citada, então os embargos são do devedor, e não de terceiro. É interessante observar-se que esse
caso, que não é de embargos de terceiro, foi tido por CARRÉ ET CHAUVEAU (Lois de Procédure civile,
IV, 270) como o caso típico, e único, de embargos de terceiro (contra, J. AMIGUES, De la Tierce
OppositiOn, 102), ao passo que A. TISsIER (Théorie et Pratique de la Tierce Opposition, 5, 25 e 108) lhe
negou o remédio dos embargos de terceiro. Um dos argumentos contra os embargos (de nulidade) do
executado consistia em se sanarem, com a sentença, as nulidades da própria relação jurídica processual,
sendo excepcional a sobrevivência da nulidade (nulidade pleno iure); mas a falta de citação e a nulidade,
aquela, porque a relação angular não se constituiu como devera, e essa, porque se constituiu por citação feita
nulamente, são exceções ao enunciado mesmo da não-sobrevivência (art. 741, 1). Sem a meditação desses
pontos, não se podem, sem risco, aplicar as regras do Código. Pressupõem elas certos conceitos e certos
enunciados que a ciência do direito processual conseguiu esclarecer e fixar.
Se o “terceiro” foi citado na execução e, constando da sentença exiquenda o seu nome, dela tendo sido
intimado, não alegou, no prazo legal, a falta de citação, ou a nulidade dela na ação em que se proferiu a
sentença, a nulidade da sentença, como defeito oponível em embargos, não aparece:
a relação jurídica processual, nula embora, existia; a sentença não a sanara e ela mesma ficara nula; mas,
agora, só a sentença em ação rescisória pode rescindi-la. Esse “terceiro”, que figurou como parte, parte era,
com a pretensão à decretação, da nulidade; e, tendo tido ensejo de interpor os seus recursos, não no fez. A
via dos embargos de terceiro nunca lhe fora aberta; nem se lhe abre depois.
(4)Muito se discutiu se o que não figura na sentença e, tendo de ser citado, não no foi, de modo que deixou
de ocorrer o litisconsórcio necessário, é a) terceiro com legitimação para embargar, ou b) se deve, apenas,
como executado, opor a “nulidade” da sentença quanto a ele, ou a nulidade ipso iure de todo o processo e,
pois, da sentença. Não se pense no caso de figurar na sentença (3): então seria nula a sentença, pois que
faltou, ou foi nula, a citação do réu revel, caso de embargos do devedor. A espécie (4) é a do que não figura
na sentença como réu, litisconsorte, nem como interveniente litisconsorte necessário, e não foi citado. Tal
terceiro entra na classe dos que são excluidos da eficácia pela própria sentença. MANUEL ALVAXES
P~GA5 (Resolutiones Forenses, 1, 395) já havia chamado atenção para essa delimitação à adio iudicati que
resulta dos termos da condenação. MANUEL DE ALMEiDA E SousA (Tratado sobre as Execuções, 163),
muito mais tarde, meteu a espécie no rol dos embargos do devedor. Rigorosamente, excepciona-se por
ilegitimidade de parte na execução, e a execução concerne ao juízo da execução, que foi além da sentença a
cuja eficácia se tinha de adstringir. E foi à exceptio. que MANUEL ALvARES PÉGAS aludiu, e não aos
embargos do devedor. Seja como for, a exceptio pode ser tratada nos embargos do devedor, se o terceiro foi
citado como tal, com fundamento na nulidade da execução até à penhora (art. 741, V), e nos embargos de
terceiro, porque, em verdade, o executado não foi parte. Resta saber-se se, citado na eçao de execução de
sentença e não alegando ser terceiro em relação à sentença exqúenda, renuncia aos embargos de terceiro.
Sim, se se defendeu como executado; aliter, se não compareceu. Isso e o que se disse sob (2) e (3) mostram
que devem ter cuidado com as preclusões de prazo todos aqueles que são citados como legitimados
executivos, ou, em geral, como legitimados à eficácia das sentenças (e. g., o terceiro tido como atingido pela
eficácia da sentença constitutiva ou da sentença mandamental, o terceiro tido como atingido pela eficácia da
sentença condenatória ou declarativa). Figurar na execução é figurar em relação jurídica processual, com
todas as conseqüências .
É preciso, para alguém embargar como terceiro, que não tenha ele participado do juízo, nem a respeito dele
tenha força ou efeito o julgado. A regra juridica domina o problema da legitimação subjetiva do terceiro.
Não há, portanto,ataque ao julgado, mas ao mandamento do juiz: seria con•tradictio in adiecto que o
embargante impugnasse a coisa julgada (cf. A. MENDELS5OHN-BARTHOLDY, Grenzeu der Rechtskraft,
371); o que ele impugna é, quando muito, a interpretação da coisa julgada material. Se, conforme os
princípios, a res iudicata apanhou, ou deve apanhar, o terceiro, esse, em preliminar, deve ser posto de lado
como terceiro embargante; está sujeito à coisa julgada. No fundo, os embargos de terceiro são ação para que
o juiz respeite os princípios concernentes à eficácia das sentenças, notadamente aos seus limites.
Certo é, porém, que a res iudicata tem limites subjetivos e limites objetivos, que não coincidem em toda a
extensão . Às vezes, a força ou os efeitos da coisa julgada ou da condenação atingem zonas objetivas onde o
terceiro, a que os limites subjetivos não chegavam, é envolvido pela eficácia do julgado. De modo que o
terceiro que segundo os princípios relativos aos limites subjetivos da res iudicata, ou, em geral, da eficácia
da sentença, estaria em situação de ser legitimado como embargante, pode ter de ser afastado, na preliminar,
por agarrá-lo, segundo os princípios relativos aos limites objetivos da res judicata, a força ou o efeito da
sentença. Nem toda pessoa, que não foi parte, pode embargar como terceiro, nem toda parte está excluída de
embargar, pois, no ponto do mandamento, é possível que a eficácia da sentença não na apanhe. Por onde se
vê a insuficiência do conceito de res iudicata (inter partes) e do conceito de extraneidade. (Quando falamos,
a respeito de embargos de terceiro, de mandamento, entenda-se o mandado, força ou efeito, o alvará e a
ordem constritivOS. Mas, sobretudo. precatemo-nos de reduzir à execução , senso estrito, a constrição. Tais
“restrições” são perigosas. Não só a executividade, no sentido técnico, constringe.)
Nem todo terceiro, a respeito do qual nenhuma eficácia tem a sentença, pode embargar. É preciso que a
despeito da sua incolumidade à eficácia da sentença, o que faz impugnável o mandamento do juiz, o
terceiro tenha interesse em embargar. Se o terceiro, que o direito livra de toda a eficácia do julgado, não tem
qualquer interesse no julgado (em seus limites subjetivos e objetivos), então esse terceiro é poenitus
extranei, e faltar-lhe-ia o interesse do art. 4~O~ Não se diga que, ai, a eficácia da sentença o atinge. De
modo nenhum. 1’Jx hypothesi, está ileso; e falta-lhe o interesse, o que é coisa diferente. Certo, ADOLE
WACH (Zur Lehre von der Rechtskraft, 9 e 10). O interesse há de concernir à ação de embargos de terceiro.
Ainda nos casos de eficácia erga omnes da sentença (alguns falam de erga omnes da coisa julgada material,
no que se equivocam, pois confundem força ou efeito de coisa julgada material com outra força ou efeito
das sentenças), sem o interesse, o terceiro não pode embargar.
Resta sabe-se se o que é titular da relação de direito material que se discute ou se discutiu na ação, porém
não foi parte no processo, pode embargar. Cumpre levar em conta três circunstâncias: (a) o legitimado de
direito material não foi citado, nem compareceu, e foi incluído na sentença, que é nula pleno iure, uma de
cujas conseqüências é a oponibilidade dos embargos do devedor (art. 741, 1); (b) o legitimado de direito
material foi citado, mas é nula a citação (não comparecendo o citado) e está incluído na sentença; (c) nem
foi citado, nem compareceu, nem foi incluído na sentença. Nos casos (a) e (b), a sentença é nula de pleno
direito, e não só rescindível. O que está nela incluído não é terceiro, é interessado no pedido de decretação
da nulidade, aliás, ai, de mandamento negativo da sentença. No caso (c), a sentença não contém referência
ao terceiro (processual), titular da relação de direito material: processualmente, seria terceiro, e o seu
prejuízo ressaltaria (portanto, estariam fora de dúvida a sua legitimação e o seu interesse), mas, em verdade,
não foi citado, a) devendo ter sido, ou não foi citado, b)podando ser excluido, com as conseqUências
respectivas de ser nula ipso iure a sentença, ou de não poder ter eficácia contra ele a sentença. No sistema
jurídico, a alegabilidade de a) é a todo tempo, inclusive em embargos do devedor; a alegabilidade de b),
somente em embargos de terceiro, porque se trata de discussão de limites da eficácia, ou em embargos do
devedor, com a exceptio de que falamos no começo.
Os embargos de terceiro podem ser usados mais de uma vez se a ofensa ocasionada pelo mandado é
diferente. Caso digno de nota é aquele em que o embargante foi parte na primeira instância, não apelou, nem
agravou, e a mudança da sentença lhe causou prejuízo. O mesmo pode ocorrer se a sentença de superior
instância foi modificada em embargos infringentes, ou em recurso extraordinário (cp. GIU5EPPE
CHioVENDA, Principio, 1093), salvo, numa e noutra hipótese, se se trata de litisconsórcio unitário. Ainda
em recurso extraordinário, se a decisão defere a constrição, estando caracterizada a ameaça especifica,
cabem embargos de terceiro. O que importa é saber-se se a constrição já se determina com o julgamento.
O que, começando por ser parte, ou sendo chamado ou nomeado à autoria, foi afastado da relação jurídica
processual, é terceiro; porém não o que foi chamado ou nomeado e não compareceu, ou compareceu e
desistiu, salvo se há diferente interesse nos embargos de terceiro.
(5) Dentre os casos que concernem à angularidade da relação jurídica processual, cumpre fazer-se distinção:
a) aqueles em que a relação jurídica processual só existe se a angularidade mesma se perfez; b) aqueles em
que a angularidade apenas a completa, apenas a estenderia. Os primeiros casos correspondem, noutro plano,
àqueles em que a lei não admite a formação (existência) da relação jurídica processual sem a integração do
litisconsórcio (o que não no3 ocorre exista no direito brasileiro). A regra é que, fora dos casos que a lei
positiva crie, a relação jurídica processual existe, mas a
sentença não tem eficácia contra o que devera ter sido citado e não foi. A sentença existe; é nula de pleno
direito, quanto à extensão subjetiva, além de ser rescindível (art. 485, V), se insere o nome do terceiro.
Antes de ser levada ?i execução, pode o terceiro propor a ação rescisória; levada à execução, cabem ao
executado os embargos do devedor (art. 741, 1). Se a lei cria casos em que a relação jurídica processual não
se constitui, a exclusão da parte necessária obsta a qualquer eficácia da sentença que também não poderia
ser executada; mas a atitude do terceiro, que foi citado na execução, há de ser com a mesma prudência~ que
teria, se o outro processo tivesse firmado a relação jurídica processual, porque a “sentença”, aí, é título
executivo, e o citado na execução tem de defender-se antes de precluir o prazo.
(6)É de enorme importáncia teórica e prática, porque evita graves confusões a que não se forram grandes
processualistas, a distinção entre sucessores universais e singulares, no plano do direito material, e
sucessores, sejam universais ou singulares, no piano do direito processual. Quem, C, comprou a A a casa,
que B, agora, reivindica de A, é sucessor de A, no plano do direito material, sem que o seja, talvez, no plano
do direito processual. Por isso mesmo existe o art. 70 do Código de Processo Civil, para que C se defenda,
se B vai contra ele antes de ir contra A; e existem os arts. 1.107-1.117 do Código Civil para a ação de
evicção, de B contra A (cf. art. 76 do Código de Processo Civil). Se C entra na relação jurídica processual,
em vez de A, então lhe sucede no plano processual (entrada sucessiva na relação). Os arts. 1.055-1 .062 do
Código do Processo Civil dizem respeito aos sucessores processuais, podendo dar-se que já haja ocorrido o
que é a regra a sucessão no plano do direito material, sem, todavia, se ter consumado a sucessão no plano de
direito processual.
A distinção assume significação de extrema delicadeza quando se pergunta se a coisa julgada material, que
somente opera inter partes, a) apanha os sucessores com a eficácia própria da sentença, ou b) se tal eficácia é
apenas reflexa. Se a), parte e sucessores e sucessores das partes são, irrestritamente, partes, pois que se disse
que a coisa julgada material só opera entre partes (Res iudicata jus facit inter partes); porém o enunciado a)
somente é sempre verdadeiro, se os sucessores, que sofrem a eficácia, ou dela se aproveitam, são os
sucessores depois da litispendência (e. g., o herdeiro ou legatário do autor ou réu morto pendente a lide). Aí,
o direito material deduzido em juízo está ligado ao exercício da ação ou da defesa em juízo, devido à
litigiosidaae (art. 219). Quanto aos sucessores antes da lide, o enunciado a) somente às veres é verdadeiro;
logo, em lógica de só dois valores, esse enunciado a) não é verdadeiro.
Quando, por exemplo, se discute qual o terceiro que pode usar dos embargos de terceiro, e se responde
sancta simplicitas! que estão excluídos os sucessores, enuncia-se proposição que pode ser verdadeira, ou ser
falsa, conforme o que se entende por “sucessores”. No plano processual, os que sucedem às partes e entram
na relação jurídica processual são partes, os que sucedem às partes, sem entrar na relação, estão sujeitos à
eventualidade da perda, como estão aquelas, pois sucederam na res litigiosa. Esses sucessores são
sucessores no plano processual, ou porque sucedem na relação jurídica processual ou porque sucedem no
evento processual. Contra eles e a favor deles opera a coisa julgada material, porque a eficácia, ai, e só inter
partes.
Se a parte alienara antes do pleito a coisa, o sucessor dela é imune à coisa julgada material inter partes. É o
tipo mesmo do terceiro legitimado à ação de embargos de terceiro, à reivindicação contra o vencedor da
ação contra o alienante, etc. Não fora parte, nem sucedera a alguma das partes. É lamentável ver-se como
juristas de renome baralham esses dois conceitos. Dir-se-á que a sentença entre o alienante e o vencedor da
ação prejudica, de certo modo, o :sucessor que adquiriu antes da litispendência; e que, portanto, há eficácia
da sentença contra esse sucessor. Essa eficácia é rei lexa, ao passo que a eficácia de coisa julgada material
quanto aos sucessores após a litispendência é eficácia direta, isto é, própria da sentença.
Quem quer que tenha sucedido, a titulo universal ou singular, pendente a lide (tenha ou não havido
habilitação, que é simples inserção processual, para integrar formalmente a relação jurídica processual), está
excluído dos embargos de terceiro; pois que não é terceiro: sucedeu à parte; adquiriu com o vicio litigiosi,
ainda que o ignorasse; e é indiferente que a aquisição tenha sido antes ou depois da sentença condenatória.
Não importa se a parte, A, alienou a coisa a C, e C a D; D não é terceiro, nem o seria E, que a recebesse de
D. Já no seu tempo, entre nós, DOMINGOS ANTUNES PORTUGAL pusera isso bem claro. Mas, se a lide
é entre A e B e foi X que alienou a Y a coisa, Y não é sucessor, nem adquiriu com o vício litigiosi, porque
litigiosidade é entre partes e eI eito da litispendência. Esse ponto foi excelentemente tratado em ANTÔNIO
DE SousA MACEDO (Decisiones, 188), que enunciou: “... si tertius possessor non habeus causam ab illo,
contra quem lata fuit sententia, proculdubio exequutio non procedit adversus eum, cum nullam
convenientiam inter se habeant”. Escapo à confusão em que tantos processualistas contemporâneos
incorreram, o embaixador de Portugal na Holanda em 1651 e, depois, Secretário de Estado, escreveu: “Si
vero tertius habet causam a condemnato, distingue; si incepit possidere ante litem motam, adhuc res ab omni
litis contagio erat libera, ideo etiam non procedit exequutio contra eum, sed opus est denuo agi via
ordinaria”.
A afirmação de que, nas execuções em ação de reivindicação , não se admitem embargos de terceiro (R. dos
T., 166, ~06) é sem base jurídica. Quem foi parte, é óbvio, não pode embargar como terceiro, mas isso
acontece em qualquer execução. Se houver erro quanto aos legitimados passivos, como se o possuidor não
foi parte na ação de reivindicação, ou não é possuidor nem foi parte, ou se houve transferência da posse
depois de se intentar a ação e não se prosseguiu contra o adquirente a demanda, terceiro ele o é, mas há a
regra jurídica sobre a eficácia da sentença exequenda contra o sucessor singular, nas ações reais. Não é
preciso que seja introduzido na relação jurídica processual. Há eficácia contra esse sucessor.
É interessante observar-se que A. TISSIER (Théorie et Pratique de la Tierce Opposition, 170-172) e
ENR7CO GALLUPPI (Teoria deila Opposizione del terso, 240 s.) ainda excluiam a extensão da coisa
julgada material, e GIUSEPPF CHIOvENDA (Principii, 598 s., 874 s., 923) recorria à noção da substituição
processual (terminologia que condenamos). A explicação científica é a da compreensão do sucessor pela
irradiação da eficácia: se a entrada no processo não se operou (e não se opera sempre), o alienante continua
sendo parte, enquanto o adquirente do bem é apenas titular da relação de direito material (cf. KONRAD
HELLWIG, Wesen und sub jektive Begrenzung der Rechtskraft, 156 s., 467).
Foi a concepção privatistica do processo que sustentou o falso dogma da coexistência necessária da
legitimação processual e da legitimação à causa, de modo que o autor teria de ser, necessariamente, o titular
da relação de direito material, da res in judicium deducta. Ora, isso era, e é, apenas, o que mais acontece;
casos há em que essa coincidência não se verifica. Quando JOSEF KOHLER, em 1886 (Der
Dispositionsniessbrauch, Jherings Jahrbiicher, 24, 319 5.) e depois (tYber die Sukzession in das
Prozessverhãltnis, Zeitschrift, 12, 97 s.), pensou em substituição processual (sem usar do termo), estava bem
entre duas épocas, a da concepção privatistica, que tudo punha no plano do direito material, e a da
concepção publicística; daí a ambigUidade do termo. Há substituição processual no chamado que assume; ~,
há, também, no alienante que continua no processo e nenhuma notícia deu,em juízo, da alienação? No caso
do adquirente da coisa litigiosa, há três estados diferentes: a) o do adquirente de que não há notícia no
processo; b) o do adquirente de que se tem notícia; e) o do adquirente que, com a “habilitação” do art. 1.061,
entra no processo. Se chamássemos substituição processual a a) e b), claro é que apenas daríamos nome ao
fato de não coincidirem parte e titular atual da relação de direito material. A palavra “substituto” ainda urai
reniiniscência da concepção privatística. A cessão do crédito, como a alienação, sejam transíativas sejam
constitutivas, e mesmo a desopropriação, atuam no processo, de si sós. O cedente ou o alienante continua
sendo parte, até que o cessionário, ou, em geral, o sucessor singular, assuma. Por onde se vê que o nome
“substituição processual” é de flagrante impropriedade; e Jos~’ KOIILER não o empregou, nem KoNx~
HELLWIG (Lehrbuch, 1, 320 s., 340., Anspruch und Klagrecht, 207 s.) e foi extremamente infeliz em usá-
lo GXSEPPE CHio-VENDA (Frincipii, 596). Contra a figura em si, RICIIARD SCHMIDT (Lehrbuch, 2~.
ed., 315) e ENRICO REDENTI (11 Giudizio civile con pluralità di parti, 111 s.).
Se a demanda foi somente quanto à posse e o adquirente da coisa, depois da lide, invoca o domínio ou outro
direito, nem por isso se há de reputar terceiro se o seu direito provém de uma das partes (MANUEL
GONÇALVES DA SILVA, Commentaria, III, 299: “Ac proinde ex sententia lata super possessorio potest
agi exequutive adversus tertium, qui lite pendente super possessione, incepit possidere; nam ex hoc redditur
litigiosa ipsa possessio, quae valide acquiri, & ín alium transferri non poterat in praeiudicium actoris...”).
Disse o Decreto-lei n. 960, de 17 de dezembro de 1938, art. 42: “O terceiro de mesmo tempo senhor e
possuidor dos bens penhorados poderá, até a assinatura da carta de arrematação, adjudicação ou remissão,
alegar e provar o seu direito, por meio de embargos opostos dentro de cinco dias, contados da data em que
teve ciência do ato que lhes deu lugar, e processados e julgados, em auto apartado, na forma~ prevista nos
arts. 16 e seguintes”. O Presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 1.a Região, a 17 de junho de 1969
(D. da J. de 30 de junho), disse que é o art. 42 de Decreto-lei n. 960 que, na justiça do Trabalho, rege a
propositura dos embargos de terceiro, e não o Código de Processo Civil. Está certo, porque o art. 889 do
Decreto-lei n. 5.452 se refere às regras jurídicas “que regem o processo dos executivos f is-cais para a
cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda Pública Federal”, e o Decreto-lei n. 960 contém o que se lê no
art. 42. Mas o bisonho legislador de 1938 longe estava de atender a que os embargos de terceiro podem ser
opostos pelo que é titular do direito, sem que o direito seja de propriedade ou de posse. O art. 707 do Código
de Processo Civil de 1939 não derrogou o Decreto-lei n. 960, mas explicitou a doutrina dos embargos de
terceiro. Qualquer titular de direito, se esse seria ofendido pela sentença, tem legitimação ativa para os
embargos de terceiro. O Código de 1973 contém o art. 1.046, com os §§ 1.0, 2.0 e 3~O, e o art. 1.047.
(7) O alienante é terceiro quanto à ação c à sentença entre o adquirente e o seu contendor, se não foi
chamado e não se introduziu na relação jurídica a processar, ou se foi repelida a sua intervenção como
chamado. Não há coisa julgada material da sentença quanto a ele. Tem a execptio rei inter alios iudicatae e
contra a eficácia reflexa da sentença a exceptio mali processus, na ação de evicção. O julgado entre o
adquirente e o seu contendor é-lhe estranho, por isso mesmo que o não chamaram e não entrou na relação
jurídica processual, Aliis neque prodesse neque nocere. Esse terceiro pode antecipar a sua defesa contra a
eficácia reflexa, com a sua intervenção no recurso (art. 499), onde, inclusive, pode arguir o mau tratamento
do processo (exceptio mali processus) e até a matéria do dolo, da simulação ou da fraude, se lhe convém, e,
a seu risco, desde logo articulá-la, em vez de o fazer principaliter, ou em embargos de terceiro.
Aliás, a respeito de sucessores de direito material (não ~de sucessores de direito processual), é preciso
advertir-se que o principio Nemo pius iuris transi erre potest quam ipse habet pertence a cada um dos planos
(originariamente só ao do direito material), e nunca a dois planos ao mesmo tempo:
ao sucessor pendente a lide é aplicável, dentro do direito processual; ao sucessor antes da lide, não, se
alguma sentença se interpõe antes de se invocar o princípio, porque casos há em que seria falso, pela
diferença possível entre incidência e aplicação da lei. O mesmo raciocínio cabe fazer-se quanto ao princípio
Resoluto iure dantis, resolvitur ius accipientis, que é de direito material e, para ser posto no plano
yrocessual, exigiria que tudo somente nesse plano se passasse (e. g., dentro do mesmo processo).
Depois da sentença, trânsita em julgado, todo sucessor singular é sujeito à regra Nemo plus iuris trans ferre
potest quam ipse habet, porque o plano é o do direito processual, na estrada temporal que se lhe abriu com a
irradiação da coisa julgada material. A força da sentença tem essa eficácia. Em todo caso, porque os direitos
e pretensões, no plano da incidência das leis, não ficam substituidos pela situação que a sentença, no plano
da aplicação, estabelece, o sucessor post rem iudicatam recebe o que vem da sentença, mais e, de que se
pode servir contra a sentença (e. g., a ação rescisória).
O sucessor post rem iudicatam “sucede” na pretensão, não na coisa julgada material, que é eficácia. Não há
sucessão na eficácia: a eficácia é que se estende no tempo. Por isso, a despeito da série de sucessões, ocorre
a identitas personae. Falar-se de partes e seus sucessores é apenas analisar-se, através do tempo e das
circunstâncias, essa pessoa idêntica.
Se a sentença, ou, a fortiori, a litispendência, foi posterior à alienação, aquela não atinge os sucessores,
porque esses estão fora da linha processual. São terceiros (sem razão,GIUSEPPE CHIOVENDA, Principii,
1012, que exige o fundamento de dolo ou da colusão para se poderem opor; com razão, A.
MENDEL5soHN-BA2RTHOLDY, Greneen der Rechtslcraft, 136). Em todo caso, a transcrição do título
sentencial da parte, antes da transcrição do título do sucessor, produz efeitos erga omnes, o que se passa no
terreno do direito material. Ganha-se em se prestar atenção aos conceitos, que são distintos, e em se evitar
confusão entre eles.
O alienante ou cedente permanece na causa, a despeito da alienação ou da cessão; se a abandona, arrisca-se,
porque está sujeito a todos os deveres e ônus processuais, e pode sofrer mesmo, sendo autor, que se absolva
da instância o réu. Enquanto o adquirente ou cessionário não entra na causa, pode desistir, com eficácia
terminativa do processo, sem prejuízo para a outra parte que ignora a alienação ou cessão; e não se lhe veda
a confissão, nem outros atos processuais semelhantes, inclusive transigir (JoSEF KOHLEH, ~ber die
Sukzession in das Prozessverhãltnis, Zeitschrift, 12, 117; KoNRAD HELLWIG, Lehrbuch, 1, 346; Wesen
und sub jektive Begrenzung der Rechtskraft, 158 s., que seguiram a lição de AnOLF WACH, no célebre
artigo dos Gruchots Beitrãge, 30, 792, s., em 1886). A opinião contrária, inaceitável, de FónsTER-ECCIUs
(Theorie und Praxis des heutigen gemeinen preussischen Privatrechts, 7.~ ed:, 1, 676), que se ressentia da
velha concepção privatística do processo, ainda repercutiu em GIUSEPPE CHIOvENDA (Principii, 598) e
noutros processualistas menores.
(8)O sucessor causa mortis pode embargar como terceiro se condenada foi a herança e se são seus, e não da
herança, os bens executados. Não importa se estão exauridos, ou não, os bens da herança, porque o direito
brasileiro repeliu a responsabilidade do herdeiro ultra vires hereditatis. Naturalmente, se já recebeu os bens
da herança, os seus embargos são do executado, por excesso de execução, se a dívida lhe foi partilhada (é
ele, então, legitimado passivo da ação de execução), ou os de terceiro, se a dívida foi, segundo os princípios,
inclusive ciência do credor, assumida por outrem. Ai, o ônus da prova do excesso de execução toca ao
herdeiro (Código Civil, art. 1.587, 2.~ parte). Salvo, portanto, se já recebeu a herança e a dívida não ficou a
cargo de outrem (ciente o credor), o sucessor causa mortis é terceiro, agens ex suo iure distincto. Pode
repelir, como terceiro, a
.execução nos seus bens próprios, como ocorreria, no direito anterior, com o herdeiro a beneficio de
inventário (MANUEL ALVARES PÉGAS, Resolutiones Forenses, 1, 357). A técnica, de lege ferenda,
pxleria permitir que se considerasse o herdeiro ou legatário universal, em tais casos, executado, com
exceção de separação, ou como terceiro-embargante em ação de separação. Cedo, a processualística luso-
brasileira seguiu, com acerto, o segundo caminho, e para isso concorreram lições de ALvARo VALASCO e
de MIGUEL DE REINoso, sobre eficácia da partilha e da adjudicação, mas, principalmente, os -raciocínios
do Senado português sobre a cumulação de várias pessoas numa só, como acontece com o herdeiro sem
,sucessão ultra vires hereditatis, o que ANTÔNIO DE SOUSA DE MACEDO (Decisiones, 196-198) expôs
com toda nitidez. O julgado de 19 de agosto de 1678 (Lisboa), que MANUEL ALVARES PEGAS
reproduziu (1, 357 5.) e comentou, referia-se mesmo a sucessor que nada recebeu, o que representava, já
naquele século, a transição para o direito de hoje.
O herdeiro é condenado, é parte, e é terceiro, porque entra na4quela classe de pessoas em que duas figuras se
cuinulam: “confusio excludatur, et patrimonia distincta permaneant”, frisavam os velhos juristas.
(9)Quem usou dos embargos do devedor, porque entendia não estar sujeito à execução e perdeu, ou quem
usou da oposição de terceiro, e foi julgada inadmissível ou improcedente, por não ser terceiro, logicamente
não tem legitimação para embargar como terceiro, quanto à mesma eficácia do ato judicial e devido ao
mesmo fundamentO.
(10)O que uma vez usou de embargos de terceiro e foi vencido não fica privado de embargar, como terceiro,
por outro fundamento, que não tenha sido repelido, uma vez que: se não tenha dado preclusão do prazo para
embargar. Cada causa impedimento tem o seu cômputo e a sua preclusão.
(11) Espécie de interesse prático e de certa elegância doutrinal é a do terceiro na própria demanda: A,
digamos~ não recorreu da sentença, nem contra ele recorreu o seu adversário, mas B recorreu, e a sentença
foi modificada, de modo a causar prejuízo a A; A é terceiro no agravo do recurso porque, quanto a ele, não
se deu a extensão da relação jurídica processual. Em todo caso, se a sentença do segundo grau o inclui, tem
de lhe ser comunicada para início de eficácia: deve então vir com embargos de declaração, ou com a. ação
rescisória; se a sentença do grau superior alterou a primeira sem incluir o não-recorrente, há de entender-se
que a primeira sentença, quanto a ele, transitou em julgado. Ainda nos casos de litisconsórcio necessário
(não unitário!), não há dever das partes de estarem presentes ao julgamento dos recursos das outras partes se
a sentença quanto àquelas já passou em julgado.
A regra jurídica sobre suspensividade, no recurso dos~ embargos do devedor por falta ou nulidade da
citação, é invocável pelo não-recorrente, cujo nome consta da sentença; aliter, se o juiz, a despeito de não
estar incluido o nome do-não-recorrente, interpretou a sentença como se tivesse eficácia contra ele. A
sentença includente, quanto a ele, é nula ipso jure. São invocáveis a coisa julgada da primeira sentença e a
ilegitimidade de parte no executivo, mas essa depende daquela, que é prejudicial. De modo que não é
matéria para embargos de terceiro. A situação do que já teve a coisa.
julgada e ainda assim a instância superior o apanhou, incluindo-o na sentença, não é como a daquele contra
o qua revel, correu o processo sem citação ou com citação nula. A sentença da segunda instância é, para
esse, nula de pleno direito. Como, porém, aquela pessoa tem por si a coisa julgada material, não se lhe pode
negar a exceção. Por outro lado, quanto ao não-recorrente cujo nome não consta da sentença, são embargos
de terceiro o remédio próprio.
(12)O que foi nomeado à autoria, e não interveio, fica privado da ação de embargos de terceiro. Se interveio,
e foi repelida a sua intervenção, ainda lhe resta a pretensão a embargar, que exercerá quando lhe nasça a
ação (cf. ANTONIO SEGNI, L’Interlento volontario in appello. 55). Se o nomeado à autoria confessa o
pedido e o nomeante prossegue na defesa, não é terceiro.
Enquanto a nomeação à autoria exclui, no chamado, a exceptio mali processus, que esse terceiro teria na
ação de regresso, a falta da nomeação mantém-lhe tal exceptio, que pode excluir a eficácia reflexa do
julgado entre o que teria de nomeá-lo e a outra parte no processo precedente. A rigor, o nomeável, que não
foi nomeado, foi terceiro, ao tempo do processo, e continua, depois, como sempre foi, terceiro.
A questão de ser, ou não, sujeito à execução (portanto, não ser, ou ser terceiro, com a pretensão a embargar)
o nomeado à autoria, que tomou sobre si a defesa da causa, foi resolvida, desde o velho direito luso-
brasileiro, no sentido de não ser terceiro, nem o nomeante, se está com a coisa, nem o nomeado; podendo,
porém, a sentença condenar desde logo pelos frutos, interesses e custas o nomeado (SILvEsTRE GoMEs DE
MoRAIs, Tractatus de ExecutiOnibus, VI, 114: “in assistente liti in auctorem vocato, & simile defeilsore,
necessano effecto litis consorte, ex sententia enim adversus reum principalem lata potest contra huiusmOdi
personas executive procedi”; depois, firmado em AGO5TINI~O BA1~nosA: “... ut procedat cum
condemnatio rem egreditur, scilicet in fructibus, interesse, vel expensis; nam pro repetita solum in re ipsa
penes reum existente executio necessario facienda est”).
A sentença na ação rescisória (iudicium rescindens) do julgado de mérito entre o autor e o réu, sendo um
deles litisdenunciante (art. 70), em que houvera repulsa, permite que, no juízo rescisório, se nomeie, de
novo, o responsável, pois a sentença em que se dera a absolvição do nomeado apenas o fora em ação
eventual (JAlvIEs GOLDSCHMIDT, Der Prozess ais Rechtslage, 481 s.), que fica no vácuo se a açao
principal é repelida. Enquanto não foi julgada a ação rescisória, o pretenso responsável foi terceiro; passada
em j ulgado a sentença da ação rescisória, sem que tenha sido nomeado, terceiro continua de ser; se foi
cindido o julgamento em rescindente e rescisório e, nesse, nomeado à autoria e admitido como tal, deixou de
ser terceiro.
Se o nomeado à autoria não comparece, ou se ele nega a qualidade que se lhe atribui, e o autor prossegue
contra ele (art. 66, 2.~ parte), é parte, e não terceiro, se a sentença explícita ou implicitamente o julga tal.
(13)O terceiro pode, nos embargos de terceiro, oPor a fraude contra credores (Código Civil, arts. 106-113), a
simulação (Código Civil, arts. 102-105) e o dolo (Código Civil, arts. 92-97), tanto quanto se lhe permite no
plano do direito material, a respeito dos negócios jurídicos de direito material. Essa a jurisprudência e a boa
doutrina. Para isso, duas verdades concorrem: a sentença entre o devedor e a outra parte, na fraude contra
credores, ou o dolo das partes, ou qua~quer outra atitude lesiva, não pode ter eficácia contra o terceiro, e
esse tem o direito de ignorá-la; o negócio jurídico que esteve à base do processo, como res in iudicium
deducta, não deixa de ser atacável porque sobreveio a sentença. O terceiro pode defender-se da eficácia
contra ele, que se pretende fazer
prevalecer, com a exceptio rei inter alios iudieatae, porém nem sempre essa exceção lhe basta, devido a não
estar com ele o bem. Outros meios de ataque são a ação constitutiva negativa de invalidade e a ação de
embargos de terceiro, ação de mandamento, que envolve aquela (A. MENDEL5SOXN-BAR-moiay,
Grenzeu der Rechtskraft, 75, nota 2, e 145 s.). Para a discussão histórica na França, A. TIssIER (Théorie et
Pratique de la Tierce Opposition, 27, 310 s. ). Exemplo frequente é o dos embargos de terceiro na ação
executiva contra o marido se a mulher alega a simulação da divida (5.a Câmara Cível do Tribunal de
Apelação do Distrito Federal, 19 de maio de 1944, J. do T. de A., 23, 10 s.). Errada a afirmação de que a
imatéria da actio Pauliana não cabe nos embargos de terceiro (e. g., D. da J. de 29 de junho de 1946, 4226).
Temos de focalizar a situação do chamado ao processo ~arts. 77-80), porque foi assunto novo do Código de
1973. Se o chamado ao processo, tenha sido o devedor, por ser réu na ação o fiador, ou tenha sido um ou
alguns fiadores, porque só fora citado um deles, ou tenha sido um dos devedores solidários, se a ação foi
proposta apenas contra um ou alguns, têm de ser citados e defender-se. A sentença é que dirá da
responsabilidade, mas, antes dela, o comparecimento do citado o faz litiseonsorte. Se na contestação nega
que pudesse ser chamado ao processo e isso foi acolhido, tal pessoa é terceiro e pode embargar como
terceiro se alguma constrição judicial vai ou veio a sofrer.
Os juristas pelejam, ora acentuando o caráter de oppositio tertii, ora o caráter de ação revocatória, que teria a
ação fundada no dolo, ou outro vício, para impugnar o negócio jurídico (processual). A construção cientifica
é, porém., a seguinte: o terceiro tem as ações constitutivas clássicas, que se exercem sem se dirigirem ao
negócio jurídico processua7 dirigem-se ao negócio jurídico de direito material, pelo qual se fraudou, ou que
se simulou, ou no qual houve o dolo contra o terceiro, sem se precisar indagar qual a espécie de negócio
jurídico; a sentença, não tendo eficácia contra ele, permanece como simples laço negocial entre as partes,
sem poder fazer válido o negócio oculto ou viciado; o terceiro tem a ação própria, que dissemos clássica, e
diante do “ato judicial” que caiba na menção feita pela lei dirige-a contra esse ato, pedindo o mandamento
negativo contra a eficácia da sentença quanto a ele, não contra a sentença mesma. Para isso, tem de provar o
dolo, a fraude, a simulação, e a causalidade entre o dolo, a fraude, ou a simulação, e a eficácia da sentença.
Os embargos de terceiro são apenas, nesses casos, a ação constitutiva negativa, em que o elemento manda-
mental negativo passou à frente. Já se insistiu antes quanto à estrutura da ação de embargos de terceiro,
mandamental, de conteúdo variável.
A bilateralidade do dolo, por exemplo, é elemento que deriva da natureza corrente das coisas, sem excluir, a
priori,. regra de direito material que se satisfaça com o dolo unilateral: a) não se pode embargar pelo dolo
unilateral contra o vencido, porque, ex hypothesi, as vantagens da sentença estão com o vencedor, e esse é
terceiro em relação ao negócio, ou situação, entre vencido e pretendente aos embargos: seria antijurídico
arrancar-lhe o que obteve sem qualquer participação sua no vício; b) não se pode embargar pelo dolo
unilateral contra o vencedor, porque ele ou tinha razão ou não tinha: se tinha, não a tem o terceiro; se não a
tinha, ou houve dolo concorrente (o que é contra a hipótese), ou não houve,. e então a admissão dos
embargos de terceiro seria reexame do mérito da sentença entre ele e o vencido.
No mais, os embargos de terceiro impugnativos são submetidos aos princípios gerais. A ação pauliana ou
revocatória apenas enche o pedido de mandamento negativo; por isso mesmo, tanto erram os que procuram
reduzir os embargos. de terceiro, nesse caso, à ação pauliana, revocatória, ou de simulação, como os que
tentam apagá-lo. Cumpre, porém, observar-se que a procedência dos embargos de terceiro não revogam a
sentença como tal. A sentença foi dada entre as partes, transitou em julgado e, de regra, somente está
exposta, dentro do prazo legal, à ação de rescisão, para a qual o “terceiro”, legitimado aos embargos de
terceiro, logicamente não e legitimado. O que se ataca é o negócio jurídico, que se pós como res in judicium
deducta, usando-se para se lhe dar valor, a sentença. Doloso, fraudulento, simulado, é esse negócio de
direito material, ou essa relação ou situação de direito material, não como se tem aventurado a sentença.
Falar-se, ai, de sentença simulada (sem razao, GÍUSEPPE MEsSINA, Contributo alia Dotrina deila
Confessione, 60 s.) orça pelo absurdo. Nem, ademais, a sentença nos embargos de terceiro destrói a eficácia
inter partes da sentença embargada. Ter-se-iam transformado os embargos de terceiro em recurso de alguma
das partes. A procedência dos embargos de terceiro não altera, de modo algum, a eficácia da sentença no que
ela estatuiu entre as partes.
Não se confunda a simulação do negócio jurídico, ou da situação, de direito material, com a simulação do
processo, ou com a só aparência do processo, em que a sentença mesma é atingida, segundo os princípios
que regem o procesSo simulado e o processo aparente, em que a atividade processual não foi “real”.
Também é invocável pelo terceiro o seu direito à resolução, à denúncia, ou outros direitos expectativas ou
formativos.
(14) No direito brasileiro, a ação de embargos de terceiro, de conteúdo impugnativo, não é obrigatória, ou
necessária; fica ao terceiro o uso da ação própria. Todavia, os prazos para os embargos de terceiro são
peremptórios, sem se ter de indagar do momento em que o terceiro teve conhecimento do dolo, da fraude ou
da simulação, contra ele, ou se esse conhecimento do vício ocorreu antes ou depois do ato judicial
embargável. Aliter, porém, quanto ao recurso do terceiro. Na processualística européia, a questão da
obrigatoriedade ou da facultatividade da chamada “oposição de terceiro” (que é a mesma ação de embargos
de terceiro do direito brasileiro, e não a de intervenção de terceiro) tem sido questão extremamente renhida.
Pela obrigatoriedade, ENRICO GALLUPPI (Teoria deila Opposizione del terzo, 270 5.), J. AMIGUES (De
la Tierce Opposition, 112) e A. TISsIER (Théorie et Pratique de la Tierce Opposition, 96 5., 224); contra, A.
MENDELSSORN -BARTHOLDY (Grenzen der Rechtskraft, 81 s.). Ora, os embargos de terceiro são
apenas o exercício da pretensão ao mandamento negativo: os prazos legais para os embargos de terceiro
referem-se a esse exercício, não ao da pretensão à constutividade negativa, que está à base da ação de
impugnação. (Não cabe aqui a critica, de lege condenda, da inclusão de todas as questões de simulação
como de “questões de anulação”, nem a de poder haver ação declarativa da simulação. absoluta, que é sobre
inexistência da relação jurídica.)
O não-emprego, nos prazos legais dos embargos de terceiro, não extingue a exceptio rei inter aUos
iudicatae, nem as. ações próprias, autônomas, do terceiro. Uma das conseqtiências é poder o terceiro
impugnar créditos, nos graus superiores da justiça, ainda se já se lhe vedam os embargos de terceiro. Ao
meio jurídico faltará, então, o elemento mandaineutal negativo da “ação”: será recorrente do art. 499, que é
o “terceiro prejudicado”, ou estará a exercer a exceptio rei inter alios iudicatae, ou outro meio jurídico.
Advirta-se em que não importa indagar-se se o direito do terceiro é anterior ou se é posterior ao ato judicial
embargado: há atividades dolosas, fraudosas, ou simulantes, contra direitos futuros, ou para futura invasão
da esfera jurídica de outrem.
(15) O cessionário pode opor embargos de terceiro. Os que afirmam o contrário leram mal o aresto
português de 1638 (em MANUEL MENDES DE CASTRO, Practica Lusitana, 1, 207); pois o caso
examinado, naquela feita, era o de cessão de bens penhorados e de devedor já falido ao tempo da penhora.
Naturalmente, não é legitimado o cessionário se se trata de cessão ineficaz; e. g., se a cessão somente foi
registrada após a penhora (1.R Câmara Cível do Tribunal de Apelação de Goiás, 7 de junho de 1943, R. dos
T., 146, 333), ou contra outra constrição. No mesmo sentido e referindo-se ao que escrevemos na 1.a ed. dos
Comentários ao Código de 1939, a 2Y-Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 11 de
abril de 1957 (D. da J., de 13 de março de 1958).
(16) Ao sócio é facultado intervir como terceiro na execução contra a sociedade se foram penhorados bens
de sua propriedade particular (Corte de Apelação do Distrito Federal, 23 de setembro de 1913, R. de D., 32,
185, o que corrigiu o enunciado demasiado geral do Tribunal da Relação do Rio de Janeiro, a 28 de
setembro de 1906 e 27 de março de 1908, Rel. de 1908, 136, que o negava, sem descer ao exame dos casos
possíveis). Também a sociedade é legitimada, se os bens são sociais, na execução contra o sócio, exceto
quanto à quota (Corte de Apelação do Distrito Federal, 28 de junho de 1927, R. de li., 87, 100). As
sociedades irregulares podem ser terceiros (Corte de Apelação do Distrito Federal, 8 de setembro de 1921,
R. de D., 61, 562).
O executante pode opor a fraude, ou a simulação, o do1o, ou o erro (sobre a fraude oposta à sociedade, por
ser o sócio “testa de ferro” de outrem, Tribunal de Justiça de São Paulo, 26 de janeiro de 1934, R. dos T.,
93, 328).
(17) O fideicomissário tem a legitimação para embargos de terceiro desde que prove invasão ou ameaça
específica de invasão na sua esfera jurídica (sem razão, o Tribunal de Justiça de são Paulo, a 6 de abril de
1934, R. do~ T., 90, 272).
O Código de 1973, como o de 1939, abstraiu de ser executiva a ação pendente a qual pode o terceiro opor os
seus embargos. Sempre que o Estado está no exercício da jurisdição m e há, com alguma medida constritiva,
ofensa a direito de terceiro, a ação de embargos de terceiro é a ação adequada; aliter, se a ofensa ou a
ameaça provém de ato de particular, ou do próprio Estado (qualquer entidade estatal), sem que se trate de
função judicial. Aqui, de modo nenhum se há de pensar em embargos de terceiro, mas sim em ação
possessória, ou de condenação, ou cominatória. A distinção entre a ação de embargos de terceiro e as ações
possessórias baseia--se em que, para aquela, é pressuposto essencial a constrição estatal, em função judicial.
Mesmo quando se trata de ação proposta por titular de posse, o que se exige é que se tenha de atender à
pretensão à tutela jurídica por parte do terceiro. Não se diga que tal não acontece se os embargos de terceiro
são opostos pelo credor com garantia real (hipoteca, penhor ou anticrese) porque se tem por fito obstar a
alienação judicial. O ato que a isso leva é ato constritivo, como os outros.
1.A sentença, se esse é o ato embargado, lá está, em sua existência, em seus pressupostos de validade (existe
e vale, ou existe, porém não vale) e de eficácia. Vejamos as diferentes construções e explicações,
respectivamente:
a) Quando algum jurista põe a questão ~, subsiste, ou não, a sentença, se o embargante-terceiro vence?
coloca-a no plano da existência da sentença, o que levaria ao absurdo. Subsistir é existir (exister). A
sentença existiu, existe e subsistirá.
b) Os embargos de terceiro teriam caráter de meio de reforma da sentença embargada no todo ou em parte?
O juiz retratar-se-ia ou decretaria a nulidade, como ocorre com os embargos infringentes do julgado (arts.
530-534), Note-se que aí se poriam os embargos de terceiro como remédio jurídico processual quanto à
validade ou à procedência da sentença. Tal construção confundiria com eficácia imediata ou mediata a força
da ação de embargos de terceiro.
c)~, A sentença existe, quaisquer que sejam os pressupostos de validade, e os embargos de terceiro não a
atingem na sua existência e na sua validade? O que está em causa é a sua eficácia. Os embargos de terceiro
seriam tendentes a cortar, a favor do terceiro, essa eficácia. A eficácia da sentença seria em toda a extensão
que lhe deu o juiz, com o seu mandado, contra o qual se opõem os embargos. Esses teriam o fito de aparar a
eficácia da sentença. Tal opinião exagera o elemento germânico, responsável pela concepção de res iudicata
para todos os presentes, ou que deveriam estar presentes ao julgamento. Não se há de negar algum influxo,
porém esse não foi, de modo nenhum, igual ao que exerceu oposição do terceiro (arts. 56-61), razão de
serem julgadas na mesma sentença a ação e a oposição (intervenção principal). Cf. J. W. PLANcIC (Das
deutsche Gerichtsverfahren im Mittelalter, 1, 169, 325 5.). Se nós atendermos a que, no direito brasileiro,
ainda se o terceiro não usou da oposição de terceiro, pode, por exemplo, reivindicar a coisa, a todo tempo,
logo percebemos que, mesmo na oposição dos arts. 56-61, aquele influxo não foi tão grande, nem ta
profundo, quanto noutros sistemas jurídicos.
d) A eficácia de sentença, como a sua validade e a sua existência, é a que foi, desde o começo. Os embargos
de terceiro não a atacam. Apenas tendem a remover o prejuízo sofrido ou ainda por ser sofrido pelo terceiro
embargante. Anui, uns (a) falam de interpretação da sentença, no tocante à sua eficácia, como J.
PROUDHON (Traité des Droits d’usufruit, II, 101), com repercussão em ENRICO GALLUPPI (Teoria
deila Opposisione dei terzo, 355 e 357 5.) e na doutrinia francesa.
(Convém ter-se sempre presente que os embargos de terceiro são mais largos que a exceptio rei inter alios
iudicatae, porque o juiz vai estabelecer, entre o terceiro e, pelo menos, os embargados, a eficácia de nova
sentença, e porque não é só contra a força ou o efeito de coisa julgada material que se exerce a ação de
embargos de terceiro. Os que supõem esse paralelismo e essa coextensão colocam-se ao tempo de J.
PROUDHON, em opinião que já àquela época era chocante.)
Outros (b) falam de declaração, o que assimilaria os embargos de terceiro a embargos de declaração (arts.
463, tI, 464 e 465), como, ate certo ponto, A. MENDELSsOMN-BARTHOLDY (Grenzen der Rechtskraft,
831 5.): pois que a sentença, raciocinam, não pode ter eficácia contra o terceiro, e dar a razão ao terceiro é
declarar (no sentido do art. 463, II) a sentença. Tivemos ensejo, várias vezes, neste livro, de frisar os erros
de se exagerar elemento secundário, ou ínfimo, das sentenças.
As duas atitudes deve-se juntar terceira (c), que é a verdadeira. A sentença embargada, entre as partes, tem a
eficácia que resulta do seu conteúdo, e é possível que a tenha erga omnes. Indo contra ela, o terceiro opõe-se
a que lhe cause prejuízo a res inter alios, ou a que a eficácia erga omnes seja levada ao ponto que se quer.
Não está preocupado com os limites da eficácia da sentença embargada, e sim com a extensão de eficácia do
seu direito. Ataca a sentenna porque defende a sua esfera jurídica, não defende a sua esfera jurídica porque
ataca a sentença: não pede que a sentença não
exista, nem valha, nem tenha eficácia que lhe é lesiva; opóe-lhe a sua posição jurídica. O que se passa
pertence àquele estado de interinvasão. Em vez de concepção negativa dos embargos de terceiros, o que
faria o incidente processual dar sentido à pretensão, devemos manter concepção positiva. O terceiro-
embargante é ativo, como qualquer autor cuja pretensão, res in iudicium deducta, não tem causa na sentença
impugnada (aliter, o autor dos recursos ou o da ação rescisória). A eficácia, que a sentença teve, continua de
tê-la, O que o terceiro embargante pede é a eficácia da sentença que acolher os seus embargos, julgando a
ação que tem, e em conseqúência deferindo-lhe o pedido de mandamento negativo. Essa força, a sentença
nos embargos de terceiro a tira de ter sido a ação proposta acessoriamente, fazendo passar àfrente o
elemento mandamental; o resto da eficácia depende da natureza da pretensão de direito material, que foi a
res in iudicium deducta, e da pretensão à tutela jurídica que serviu de prejudicial à pretensão mandamental.
É possível que a sentença esteja perfeita no que decidiu e na sua eficácia, mas o direito, a pretensão ou a
ação do embargante tenha de ter atendimento, pela existência desse direito, dessa pretensão, ou dessa ação, e
pela não-eficácia contra o terceiro.
Aqui, nasce o problema da alegabilidade da mi-fé, nos embargos de terceiro. A resposta há de ser afirmativa,
pelas razões mesmas da evolução que se operou no direito, conforme expusemos sob os arts. 16 e 17.
A concepção dos direitos, pretensões e ações como se fossem linhas retas, inflexíveis, indeformáveis, em
mundo em que não se chocassem, passou: viu-se-lhe toda a profunda inadequação aos fatos da vida, todo o
seu quanto despótico que pontilhava de setas pontiagudas o ambiente inter-humano. A medida constritiva,
que, em virtude de exercício irregular do direito, material ou processual, lesa a terceiro, é atacável, em sua
eficácia, pelo terceiro, em embargos dos arts.1.046-1 .054, porque ele ai está, como em quaisquer outros
casos, defendendo a sua esfera jurídica.
A alegabiliclade da simulação, nos embargos de terceiro,é tradição do direito brasileiro. A ação do Código
Civil, art.105, pode ser em processo livre, ou em processo acessório. Assim julgou (e fez jurisprudência) a
Corte de Apelação do Distrito Federal, a 9 de outubro e 7 de dezembro de 1933 (A. J.,30, 233).
A cuesQáo sobre a existência ou inexistência de relação de sociedade, inclusive de relação de sociedade
irregular (e. g., que veio após a comunhão hereditária), é conteúdo de sentença declarativa, e não de
sentença constitutiva (status); e não se confunde com as ações de nulidade das sociedades, que são
constitutivas. A diferença é importantíssima, devido à extensão da eficácia. A sentença declarativa não tem
força contra terceiros, porque a sua eficácia específica é inter partes, nunca inter alios. Por isso, os prejuízos
que ela acarreta para os terceiros são sempre de fato, e não permitem que sejam alegados para a propositura
da ação de embargos de terceiro. O terceiro reconhece a eficácia inter partes, como teria de reconhecer a
eficácia do contrato ou outro negócio jurídico entre elas. Esse fato que nada tem com a eficácia inter alios
levou alguns juristas a considerar tal atitude de respeito à esfera jurídica dos outros como extensão da
eficácia, inclusive a de coisa julgada material das sentenças, o que conspurcava todo o edifício do direito
processual.
A sentença declaratória da existência da sociedade, em processo entre todos os socios menos x, somente tem
eficácia de coisa julgada material entre os sócios partes no processo. Faltou, como parte, x, que devia ser
citado, como litisconsorte necessário, para que a causa fosse entre e os ad quos ea res pertinebat. Se é dito
que nenhuma relação entre eles existe, ou que existe a de comunhão de herdeiros, ou a de comunhão inter
vivos (de condomínio, por exemplo), e não a de sociedade, o terceiro tem a exceptio rei inter alios iudicatae,
ou, se os outros pressupostos dos arts. 1 .046 e 1.047 se juntam, os embargos de terceiro, O sócio ou sócios
x têm a exceptio rei inter alios iudicatae. Na execução, se o autor vai contra ele ou eles, há os embargos do
executado, se os seus nomes figuram sem terem sido citados, ou se figuram tendo sido citados nulamente.
II. Se não há sentença, naturalmente é preciso que haja ato processual do juiz para justificar que o terceiro
peça o mandamento negativo. O art. 1.046, que é exemplificativo, admite que seja qualquer ato judicial
invadente da esfera jurídica do terceiro. Note-se que esse ato invadente é plus, em relação à oposição do
terceiro com base nos arts. 56-61:o opoente dos arts. 56-61 intervém no processo; o dos arts. 1.046-1.054,
que opositor também é, “embarga” o ato judicial, para que, vencendo, se lhe dê o mandamento negativo.
III. Cessando, por força de outro ato judicial, a constrição (o que equivale a contra mandamento), ficam sem
objetos os embargos de terceiro; e. g., levantada a penhora (Supremo Tribunal Federal, 10 de setembro dc
1942, A. J., 65, 5) ou atendida, antes dos embargos, a reclamação do terceiro.
6) PossE OU DIREITO. As Ordenações Filipínas, Livro III, Título 86, § 17, conheciam os embargos de
terceiro senhor e os de terceiro titular da posse. Além desses, os de terceiro prejudicado, que alegava outro
motivo que a posse (embargos do terceiro prejudicado). A construção resistiria hoje às mais minudentes
críticas científicas. Estava o Brasil em 1890 na sua plena evolução agrícola, os embargos de terceiro
possuidor levavam os colonos plantadores a defender as suas posses contra a plutocracia latifundiária, que
obteve se estendesse o Reg. n. 737 ao processo civil (era só relativo ao processo comercial), para que os arts.
604 e 597 cortassem
aos possuidores o uso dos embargos de terceiro. O Reg. n. 737 fora feito para as causas comerciais e de
repente se aplicava ao cível, apagando um dos dois conceitos. Voltou-se, com o Código de 1939, art. 707,
acertadamente, a apanhar as três espécies. A superioridade das Ordenações ressaltava; e a jurisprudência
sentiu, durante mais de meio século, a deficiência resultante da mediocridade dos autores do Reg. n. 737 e
do infeliz gesto do Decreto n. 763, de 19 de setembro de 1890.
A referência a “posse” e “direito”, no Código de 1939, art. 707, foi explícita. Caiu, pois, como obsoleta, toda
a jurisprudência anterior, que, firmada na exigência de ser “senhor e possuidor”, restringiu, contra a tradição
luso-brasileira, os embargos de terceiro. Um tanto fruto daquele nefasto Reg. n. 737, obra de medíocres,
louvada por medíocres, que interrompeu, ainda mais, com o advento do Decreto n. 763, de 19 de setembro
de 1890, a evolução do direito processual brasileiro, que estaria, desde cedo, ao nível ou acima dos outros
sistemas jurídicos. O Reg. n. 737, deficiente, errado em muitos pontos, foi a causa maior da decadência do
direito processual brasileiro.
A jurisprudência que negava embargos de terceiro ao credor pignoratício, aliás repelída pela Corte de
Apelação do Distrito Federal (26 de maio de 1899, R. de J., 6, 195; 3 de novembro de 1914 e 22 de abril de
1915, 1?. de D., 37, 102; 23 de maio de 1917, 45, 377; 12 de abril de 1927, 84, 537) e pelo Tribunal de
Justiça de São Paulo (16 de agosto de 1915, R. dos T., 15, 103; 27 de abril de 1915, 13, 231, e 23 de
fevereiro de 1929, 69, 500), já era errada então e, sob o Código de 1939, seria contra texto de lei explícito
(“posse”, “direito”). O credor hipotecário tem legitimação (Tribunal de Justiça de São Paulo, 29 de agosto
de 1906 e 9 de setembro de 1908, São Paulo J., 11, 441, e 18, 86; Corte de Apelação do Distrito Federal, 23
de abril e 24 de setembro de 1914, R. J., 3, 116),como o credor anticrético, o locatário, ou quem tenha
direito sobre a coisa ou a sua posse.
Se a constrição atinge o direito, que tem o terceiro, tal constrição nem sempre fere ou vai ferir a posse, ou o
direito de posse. Comparando-se o texto de 1973 com o de 1939, podiam surgir discussões e dúvidas. O
Código de 1939, no art. 707, dizia que “quem não for parte no feito e sofrer turbação ou esbulho em sua
posse, ou direito, por efeito de penhora, depósito, arresto, seqüestro, venda judicial, arrecadação, partilha, ou
outro ato de apreensão judicial, poderá defender seus bens, por via de embargos de terceiro”. No Código de
1973, o art. 1.046 é de outra redação (dissemos:
outra redação): “Quem, não sendo parte no processo, sofrer turbação ou esbulho na posse de seus bens por
ato de apreensão judicial, em casos como o de penhora, depósito, arresto, seqüestro, alienação judicial,
arrecadação, arrolamento, inventário, partilha, poderá requerer lhes sejam manutenidos ou restituidos por
meio de embargos”. Não se falou de “direito”, como no Código de 1939; mas seria absurdo que não se
admitissem embargos de terceiro se a penhora foi de créditos, ou outros direitos pessoais (cf. art. 655, X:
“direitos e ações”; arts. 671, 672, 675 e 676), ou se arrestaram créditos ou outros direitos pessoais (art. 821),
ou se seqúestraram créditos ou direitos pessoais (cp. arts. 825, 822, onde “propriedade” está em senso lato),
ou em caso de alienação judicial de créditos e de outros direitos pessoais (art. 670), ou de arrecadação de
créditos ou outros direitos pessoais (artigos 1.159-1.161, 1.142-1.151 e 1.170), ou de arrolamento,
inventário ou partilha de créditos ou outros direitos pessoais (artigos 1.031-1.038, 855-860, 1.146-1.148,
982-1.030, 1.039-1.045, 1.165, 1.022-1.030, 1.036 e 1.037). ~ vulgar, em muitos livros de juristas, falar-se
de posse de créditos, que não são títulos de direitos reais; e as menções do art. 1.046, como a exemplificação
do art. 1.047, de modo nenhum permitem que se leia o art. 1.046 como se só se referisse à posse, senso
estrito.
Muitas espécies ocorrem para embargos de terceiro, não tendo o titular direito real, nem posse estrito senso.
O ato constritivo há de partir do juiz, para que caibam embargos de terceiro. A ameaça específica de tal ato
basta; porque a ameaça específica implica negação de algum direito, pretensão ou ação do terceiro,
suficiente para a conseqüência constritiva como conteúdo daquela. Ai o ponto: a declaração pura não é
bastante; é-o, porém, a declaração que leve consigo, dentro de si (conteúdo), a constrição por efetuar-se. ~
inábil para a constrição a sentença condenatória, salvo se com 4 de mandamentalidade; o despacho na
petição da actio iudicatí, ou o deferimento ou a expedição do mandado, já pode constringir. Alguns efeitos
que podem completar a carga de eficácia de sentenças declarativas constringem. Há, pois, longa exposição a
ser feita da doutrina dos embargos de terceiro, na execução de sentença, ou fora dela, após a necessária
investigação de tudo que entra na classe
“ato constritivo”. Naturalmente, tal pesquisa não pode ser levada a cabo sem se empregarem os necessários
métodos da lógica contemporânea.
(a)A pretensão a embargar, por parte do possuidor, dá a quem quer que tenha posse indireta, ou direta
(imediata), a legitimação ativa. O terceiro, possuidor embargante, pode ser: (a) o que possui a titulo de
proprietário, ou com posse de que resulte, eventualmente, usucapião; (b) o credor pignoratício, conforme a
velha lição dos processualistas lusitanos (ANTÔNIO DE SOUZA DE MACEDO, Decisiones, 195;
MANUEL GoNÇALVE5 DA SILVA, Commentaria, III, 317 5) e a jurisprudência (MANUEL ALVAJiES
PÊGAS, Resolutiones Forenses, 365; Decisões de 10 de janeiro e de 14 de maio de 1671; MANUEL
MENDES DE CASTRO, Practica Lusitana, 1, 113, s, Decisão de 1612); (e) o credor anticrético, à
semelhança do credor pignoratício; (d) o usufrutuário; (e) o credor adjudicatário dos rendimentos do imóvel,
se tem posse (J. J. C. PEREIRA E SOUSA, Primeiras Linhas, III, 101), de que já se falou, sendo que, se não
tem posse, o fundamento está noutro pressuposto, que é o de ter direito; (f) o locatário, pelo tempo em que
tem direito à posse (2.a Câmara Cível da Corte de Apelação do Distrito Federal, 10 de janeiro de 1913, R. de
D., 33, 165-167; e leis emergenciais); (g) qualquer dos que poderiam propor ação possessória, e. g., o
depositário (1.~ Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 13 de janeiro de 1941, 1?. F., 86,
634); (h) o que tem pretensão a se imitir na posse direta, cumulando a ação com a de embargos de terceiro,
observado, porém, o rito da ação de imissão de posse, posto que em autos existintos, sem suspensão do
processo principal e com julgamento, desde logo, dos embargos de terceiro, se não contestados; (i) o que
tem pretensa.o as benfeitorias ou ao valor delas se está na posse do prédio (MANUEL MENDES DE
CAsTEo, Practica Lusitana, 1, 105: “Item amplia in nudo possessore reni meliorante et reficiente propter ius
retentionis ob impensas”; SILVESTRE GOMES DE MoRAIs, Tractatus de Executionibus, VI, 209, que deu
a razão poderia o executado mesmo, em tais casos, usar dos embargos de executado, “fortiori tertius, cum
quo nihil actum est, nec auditus, nec victus, executionem impediet”, o que se repete em FELICIANO DA
CUNIIA FRANÇA, Additiones aureae que Iilustrationes, 220, completando a MANUEL MENDES DE
CASTRo); (j) o colono com posse dos frutos da última colheita (MANUEL GONÇALVES DA SILVA,
Commentaria, III, 310); (1) quem tem direito a frutos, com eficácia erga omnes, ou perante os disputantes.
(b) A pretensão a embargar, por parte do terceiro que tem domínio, e não tem posse ou a tem, entra na classe
das pretensões a embargar como terceiro por turbação ou esbulho do “direito” (art. 1.046). As Ordenações
Filipinas, Livro III, Titulo 86, § 17, falavam de “vindo alguma pessoa embargar alguma coisa, em que se
peça execução, assim móvel como de raiz, por dizer que a dita coisa pertence a ele, e que não foi ouvido
sobre ela”. MANUEL ALVARES PÉGAS (Resolutiones Forenses, 1, 374) explicou que tal pretensão se con
funde com a pretensão dos direitos reais, e não abrange só o domínio. Quando o que tem pretensão a ser
imitido na posse não tem qualquer posse, mas tem o direito a ela, e alega o domínio só, deve-se exigir que
prove esse direito. Sobre os embargos do senhor sem posse, JORGE DE CABEDO kPracticarum
Observationum sire Decisionum, 1, d. 66) e MANUEL ALVAREs PÊGAS (Resolutiones Forenses, 1, 369).
Os embargos de terceiro senhor da coisa são ação semelhante à de reivindicação, ao passo que os embargos
do terceiro possuidor são à semelhança da ação de manutenção, e os de senhor e possuidor, à feição das
duas, combinadas. Porém, evidentemente, seria erro se identificarem tais ações. Os embargos de terceiro
senhor ou possuidor, ou de ambos, opõem-se ao ato judicial de penetração na esfera jurídica do terceiro; e
não ao ato do executante.
(e)O direito, que se supõe, turbado ou esbulhado (“prejudicado”, melhor fora dito), não é o direito a que se
referiam as Ordenações Filipinas, Livro III, Titulo 81, ao se falar do direito de apelar, que tem o terceiro,
porque ali se tratava da intervenção na relação jurídica processual, na discussão da pretensão à sentença, e
não da execução, ou, em geral, da constrição : é o direito do terceiro, que foi objeto de constrição judicial.
Ora, os bens arrestáveis, seqüestráveis , depositáveis, penhoráveis, etc., não são só os que são objeto de
propriedade (senso estrito), de direito das coisas, e de posse. São também direitos, pretensões, ações.
Portanto, sempre que a constrição judicial apanhou “direito” (títulos de crédito, direitos, pretensões, ações),
está autorizado o emprego dos embargos de terceiro prejudicado, sendo que o legislador preferiu Considerá-
la compreensiva dos embargos de terceiro senhor. Quando a eficácia do ato judicial fere a órbita do direito,
pretensão, ou ação do terceiro, constringe-o.
No fundo, o que se deu foi a retomada da tradição jurídica luso-brasileira (MANUEL GONÇALVES DA
SILVA, Commentaria, III, 306), porque “coisa”, nas Ordenações Filipinas ,Livro III, Titulo 86, § 17, era
qualquer “bem” suscetível de constrição judicial, qualquer “direito”. A palavra “posse”, aí, está em sentido
larguíssimo, assim no art. 1.046 como em textos anteriores. O credor adjudicatário de títulos de crédito, por
exemplo, que vê arrestados esses títulos, ou mesmo creditos que apenas constam de escritura pública ou
particular, ainda que não tenha posse, tem o direito, e pode opor embargos de terceiro, se lhe são arrestados,
sequestrados, ou por outro modo apreendidos pelo juiz, como bens de outro. Outrossim, o credor de
benfeitorias se não tem a posse do bem e a sua pretensão não se restringe a reter. Por isso, SILVESTRE
GoMEs DE MoRAIs (Tractatus de Executionibus, VI, 209), escrevendo depois de MANUEL MENDES DE
CASTRO, riscou a referência ao ius retentionis, no que foi seguido por FELICIANO DA CUNHA
FRANÇA (Additiones aureae que Iliustrationes, 220). J. J. C. PEREIRA E SOUSA (Primeiras Linhas, III,
102) e A.J. RIBAS (Consolidação, art. 1.365, § 6.0) não perceberam a finura dos dois. O Reg. n. 737, art.
604, limitou a pretensão do que não era “senhor e possuidor” ao direito ao preço da arrematação, o que era
extinguir três espécies de embargos de terceiro (do senhor, do possuidor e do prejudicado) e criar uma só,
com a combinação de duas (senhor e possuidor). JoÃo MONTEIRO (Programa, III, 346) ficou impassível
diante da grande cincada de 1850 e ignorava que, além do domínio e da posse, o direito filípino
contemplasse outros direitos. A expressão “direito” restabeleceria a boa solução técnica (SILVESTRE
GoMEs DE MoRAIs, Tractatus de Executionibus, VI, 219: “vel sibi deberi”; MANUEL GONÇALVES DA
SILVA, Commentaria, III, 360: “tertii praeiudicati”; cf. MANUEL ALVARES PÉGAS,~ Resotutiones
Forenses, 1, 403).
(d) Turbação, ou esbulho, na posse, ou no direito, significa ofensa efetiva, atual, e, com essas expressões,
afastou-se, de iure condito, a simples ameaça. ~ preciso r~ue já tenha havido o prejuízo, a turbatio iuris, ou a
turbatio possessionis, ou o esbulho da posse, ou do direito. Mas, se, por um lado, essa atualidade da ofensa
exclui a embargabilidade pelo dano possível, compreende, por outro, aqueles casos em que há prejuízo sem
que o ato judicial embargado haja negado, ou desconhecido (ENRICo GALLUPPI, Teoria deita
Opposizione dei terzo, 147), ou de algum modo declarado inexistente, ou menor, ou menos intenso, ou
desconstituído, direito do terceiro. O prejuízo há de ser jurídico ou possessório, sem se exigir, do lado do
juiz, mais do que ato de mandamento, ou de execução, ou de constrição. Afastando a simples ameaça (cf.
arts. 932 e 927), o Código optou por uma das soluções que a doutrina possuía: a) bastar a pura ameaça
(ANTONIO SEGNI,L’Intervento volontario in appeilo, 33; GIU5EPPE CHIO-VENDA, Principii, 1.012); b)
não bastar (toda a jurisprudência e a doutrina brasileiras supõem o ato judicial pronto para a eficácia).
Cumpre, porém, atender-se (a) a que, por exemplo, a eficácia de coisa julgada material é eficácia atual, e não
futura (e. g., quando se precise da exceptio rei iudícatae), e (b) a que a força condenatória da sentença de
condenação é atual enquanto futuro o seu efeito executivo, etc.
Podemos exprimir isso em termos mais científicos:
a)Cabem os embargos de terceiro sempre que haja mandado do juiz e a expedição, ou o cumprimento dele,
seja prejudicial, ou seja prejudicial a sua simples decretação (o que é a regra, pela ofensa ao direito, que se
dá antes do fato material do cumprimento). O despacho, que defere o mandado, já é mandamento e, pois,
suficiente. A ameaça já é específica, e não simples ameaça.
Mandado, entenda-se, ou alvará, ou ordem, que são mais. Conforme antes foi dito, a referência a mandado é
de entender-se feita brevitatis causa.
b) Também cabem embargos de terceiro sempre que o despacho ou a sentença seja mandamental, porque o
mandamento já turba ou viola direito, e o ato de invasão na esfera jurídica do terceiro já é força do despacho
ou da sentença.
Quando o mandado for apenas efeito, é preciso que se tenha cumprido, ou expedido, ou deferido. Quando a
sentença for constitutiva (e. g., expeditiva de alvará de venda, ou de autorização), ou executiva (e. g.,
sentença do art. 641), ou, em geral, quando conteria constrição, se passasse em julgado, atua, por si mesma,
e basta.
Nos casos de arresto, de seqüestro, de busca e apreensão , de exibição de livros, de coisa ou de documento,
de vistorias, de arbitramentOs, de inquirições, de cauções, de obras de conservação, de arrolamentos e de
descrições de bens do casal ou próprios de cada cônjuge, de entrega de objetos e bens de uso pessoal, de
entrega ou depósito de menores etc., desde que foi deferida a medida, se já houve a citação na causa, ou, se
não houve, desde o inicio do cumprimento do mandado, cabem os embargos de terceiro, se concorrem os
outros requisitos.
Em decretação de separação de corpos, como casados, entre A e C, B, marido ou mulher de A, é terceiro que
se pode opor à decretação no que ia declara existir casamento entre A e C (pois que “manda” separar) com
os seus embargos, em que deduza a inexistência do casamento (ação mandamental apoiada em ação
declarativa negativa do casamento). Idem, quanto à nulidade.
Na entrega do menor, filho de A a C, B é terceiro que pode opor embargos ao despacho ou à sentença
mandamental.
c)Cabem ainda embargos de terceiro sempre que o despacho ou a sentença tem eficácia constritiva, o que
chamam, comumente, “despacho executivo”, “sentença executiva”. Por exemplo: tratando-se de prestação
alimentícia, desde a comunicação, ou pelo menos desde o deferimento do pedido de comunicação (turbatio
iuris), desde a decretação da prisão, no caso de não cumprimento da obrigação de alimentos, se não
descontável a dívida conforme a lei, ou de outro deferimento, desde que o devedor nomeou bens e tal
nomeação lhe foi prejudicial, ou que o fez o credor; quando do mandado de penhora constar bem móvel ou
imóvel, ou direito, que deva ser penhorado, e daí nasça o prejuízo ao terceiro, ou quando o oficial o estiver
penhorando, ou o juiz o ordenar; desde o momento em que se deferir qualquer requisição; desde que o juiz
ordene ou os oficiais de justiça iniciem o arrombamento de portas; desde que se requisite a força pública em
caso de resistência; desde o deferimento da averbação em autos, ou do início dessa; do deferimento da
notificação, ou da notificação de terceiro que guarda o dinheiro ou outros bens; desde a decretação das
medidas concernentes a títulos cambiários ou não, como a apreensão (art. 672), ou da sua realização; do
deferimento da intimação para substituição de bem, ou da intimação; desde o momento em que o devedor,
oferecendo outros bens, para os efeitos de garantia, ocorre o prejuízo jurídico ou da posse; se o terceiro é o
Estado, ou o Estado-membro, ou o Município, ou outrem interessado, que é, ainda que somente na
regularidade do serviço ao público, desde a decretação, ou expedição, ou cumprimento do mandado; idem,
no caso de se ter de evitar ou afastar dano à empresa; desde a citação do devedor para a entrega da coisa, na
execução por dívida de coisa certa, ou na ação de excussão de penhor (R. de D., 29, 573).
Se o ato judicial, que o terceiro inquina de prejudicial, é a penhora ou o mandado de entrega, na execução de
sentença, é preciso que a angularidade da relação jurídica processual esteja estabelecida; isto é, que tenha
havido citação do executado. Antes disso, a actio iudicati não se angularizou:
e qualquer ação mandamental do terceiro seria contra a sentença com efeito executivo, ou outro ato judicial,
anterior a ela, e reger-se-ia por seus princípios próprios.
Nos casos de obrigação de fazer, ou de não fazer, o prejuízo pode ser desde a citação do devedor. Nos casos
de execução para declaração de vontade, é diferente: tal sentença é executiva; a ação, de que se trata, foi
executiva e de cognição, em cumulação sucessiva, predominantemente executiva.
a sentença que pode causar o prejuízo, antes mesmo dd passar em julgado. O prejuízo pode resultar da
sentença mesma que mande assinar o prazo, ou da assinatura do prazo ao réu condenado.
Nas ações executivas de títulos extrajudiciais desde a citação do devedor é possível que se dê o prejuízo.
d) A sentença condenatória ou o despacho condenatório, isto é, a decisão judicial de força de condenação,
pode causar prejuízo ao terceiro. Exemplo: se o nome do terceiro aparece na sentença como se a eficácia da
sentença se estendesse a ele; se a interpretação dada à sentença fere-lhe direitos.
Quanto ao efeito da sentença condenatória, além, pois, da força de condenação, cumpre indagar se é incluso
ou imediato, ou se é mediato (e. g., o efeito executivo). Esse não permite, desde logo, os embargos de
terceiro (sobre a suficiência da eficácia mediata, sem razão J. AlVIIGuES, De ia Tierce Opposition, 148;
contra, A. MENDELSSOHN-BARTHOLDY, Grenzen der Rechtskraft, 69).
Apenas deu o despacho o juiz deferindo a citação nos casos de entrega de coisa certa, ou de ato ou omissão,
o dano ao terceiro pode estar iminente e somente revogação do despacho poderia evitá-lo. Aí, tem-se de
atender a que os embargos de terceiro são ação mandamental negativa e, pais, o legitimado tem ação desde o
mandamento positivo, se já seu conteúdo atinge a esfera jurídica do terceiro, ainda que em conseqüência
imediata. Ora, isso não ocorre, de modo nenhum, se a petição da ação executiva é de quantia certa.
e) O despacho e a sentença declarativa também podem causar prejuízo a terceiro. Fez bem o legislador
federal de 1939 em deslocar para processos acessórios os embargos de terceiro, que as legislações
processuais, ao tempo da pluralidade processual, teimavam em limitar às execuções. Felizmente, em 1973,
manteve-se a solução. Na própria ação declaratória típica, positiva ou negativa, pode haver interesse
oposto de terceiro e, pois, oposição de terceiro, bem como ato judicial lesivo à esfera jurídica de terceiro. A
sentença que declara a existência de casamento entre A e C, por ser inexistente o registro de outro que seria
entre A e B, ~ já não pode ir com a ação de oposição de terceiro e já pode embargar. Aí, os embargos de
terceiro vão contra o efeito constitutivo negativo ou mandamental do ato declarativo, que esbulhou o seu
direito de cônjuge. Qualquer outra ação lhe seria inútil contra a eficácia da sentença lesiva a ele, uma vez
que passou o tempo para a oposição de terceiro e a exceptio rei inter alios iudicatae não teria o mesmo
alcance. Idem, no caso de registro de sentença (eficácia erga omnes).
f)O despacho constitutivo e a sentença constitutiva podem produzir prejuízo a terceiro. Por exemplo: o filho,
na ação de nulidade do casamento dos pais, como se um deles requer o internamento do menor em colégio,
pendente a apelação uma vez que o menor pede o respeite à situação juridica ainda não desconstituida; o
terceiro, ainda depois de transitai em julgado a sentença, se o réu, seu sócio, perdeu. na ação de invalidade
de contrato de compra-e-venda.
a)O “interesse e necessário. Tal interesse é exigido para a propositura da ação de embargos de terceiro; não é
assunto, ainda, de “procedência”, stricto scnsu, da ação. (Não basta o interesse para a vitória na ação; é
preciso ter havido o prejuízo, invadente da esfera jurídica do terceiro conforme veremos.)
b) Entre as duas correntes extremas, a da insuficiência do interesse moral (A. MENDELSSON-
BARTHOLDY, Grenzen der Rechtslcraft, 68, 85) e a da plena suficiência (GIusEPPE CHIOVENDA,
Principii, 929), havia tentativas de síntese. Porém o caso não é para síntese. Não há dois princípios, um de
suficiência, que seria a tese, e outro de insuficiência, que seria a antítese. Tem-se apenas de perguntar
(princípio do terceiro excluido) se o sistema jurídico de que se trata (e. g., o brasileiro) põe, ou não põe, o
interesse moral no mesmo plano que o interesse econômico. Se responde afirmativamente ambos, interesse
moral e interesse econômico, servem ao ingresso da ação. Já se não pode chamar ao interesse econômico
“interesse” (jurídico, legitimo, etc.) e ao interesse moral “interesse extrajuridico”. Aliás, cumpre não
confundir o interesse para a ação e a contestação com o interesse acaso protegido pela lei (res in iudicium
deducta, “procedência”, stricto sensu, da ação).
(f)O prejuízo, que não é invasão da esfera juridica (não só jurídico-patrimonial) do terceiro, não basta para
os embargos de terceiro serem procedentes. Tal prejuízo pode assentar em ponto comum de direito:
a) Se o ponto comum de fato não causa turbação, 011 esbulho, de direito ou de posse de terceiro (esfera
jurídica do terceiro), não é suficiente para a procedência. Na doutrina, o problema foi discutido fora dos
devidos termos; mal posta a questão, não se respondia satisfatoriamente. Forma lava-se ela do seguinte
modo:~basta o prejuízo de fato? Em verdade, nem sempre basta; mas, devido à feição da pergunta, em
termos de “sim” ou “não”, os juristas respondiam “não”, e erravam, porque a resposta seria “talvez”. Ao
conceito de prejuízo de fato contrapõe-se o prejuízo de direito, não o prejuízo que invade a esfera jurídica do
terceiro, impropriamente dito “prejuízo jurídico”. Em ação declaratória de falsidade do documento, foi
declarado falso o documento, onde a assinatura do terceiro (e. g., endossador) também figurava. No direito
comum disputava-se quanto à eficácia erga omnes da sentença sobre falsitas instrumen ti, mas isso ocorria
porque se ignorava qual a verdadeira nauureza da ação principal ou incidental de falsidade (repercussão
ainda em Louovíco MORTABA, La querela incidentale di falso, Annuario, III, 11 s.). Ação declaratória, a
sua eficácia é só inter partes. Desde que o ato judicial, a que se refere a regra jurídica sobre embargos de
terceiro, lhe dê eficácia além das partes, claro que pode sofrer prejuízo o terceiro. Toda a sentença ou
despacho é o seu conteúdo; a sua eficácia depende dele, e, no entanto, fugindo à natureza da eficácia
sentencial específica, ela está a ultrapassar essa eficácia e, pois, esse conteúdo.
Se a ação é movida com públicos proclamas (editais), a eficácia ainda não é erga omnes, mas em relacão a
todos os compreendidos, como persona incerta, no edital.
Na Itália, a jurisprudência nega a opposi~ione di terzi. os embargos de terceiro do direito brasileiro, se foi
declarada a falsidade do documento (inter partes), porque lhe caberia outra ação declaratória para provar a
autenticidade.
F.G. LIF’AIu (Caratteri e presupposti, Rivista, III, Parte 1,44)sustentou ser admissível.
A questão, posta nesses termos, não poderia levar a solução certa. Em ciência, o problema é de outra
natureza. Não se pode negar que a declaração de falsidade de documento possa causar prejuízo de fato: os
juizes são propensos a julgar entre C e B, ou C e A, ou mesmo C e D, o que uma vez foi declarado falso
entre A e B. Foi essa consideração uma das que inspiraram o art. 46, para a concepção do litisconsórcio.
Mas litisconsórcio e embargos de terceiro são dois institutos tecnicamente inconfundíveis. Tem-se de
indagar se houve prejuízo, qualquer que seja, e se foi causado pelo ato judicial. Isso somente se pode saber,
a posteriori, analisando-se o ato judicial para se lhe conhecer a natureza e a telação entre ele e o prejuízo.
W Na França, a jurisprudência e a doutrina entenderam que seria suficiente para a propesitura dos embargos
de terceiro, para a tierce opposition, o fato dc ser “lesivo~~ ao terceiro (em certos casos), como tese jurídica,
o julgado. Tal prejuízo foi sofrido por A, que tem caso idêntico ao de B e C, posto que distinto e separado.
Está errado (A. MENDELssOHN-I3ARIHoI DY, Grenzen der Rcchtskraft, ~ Lonovrco MoRT~Â,
Commentario, IV, 529). No direito brasileiro, seria caso de litisconsórcio; não de embargos de terceiro.
Litisconsórcio voluntário. Se não houve litisconsórcio e se a sentença manda, por exemplo, que subam à
conclusão todos os casos idênticos, já se estabelece a invasão na esfera jurídica do terceiro.
O interesse é pressuposto pré-processual; o prejuízo ou a invasão injusta da esfera jurídica do terceiro é
pressuposto suficiente da sentença favorável (“procedência”, stricto sensu). Por isso mesmo, desde que haja
o interesse, deve ser admitida a ação, para se apurar se houve ou se não houve o prejuízo.
(O interesse, tratando-se de recurso, é sempre preliminar, porque se decide sem ser quanto à forma
processual.)
(g) Sempre que o prejuízo do terceiro seria irreparável,
cabem os embargos de terceiro. Nas ações de constituição negativa e nas mandamentais (e. g.,
cancelamento de registro, baixas etc.), a irreparabilidade quase sempre ocorre, porque nem sempre o terceiro
é legitimado à oposição (artigos 56-61) e nem sempre se daria a legitimação litisconsorcial. Pense-se no
caso da hipoteca que o juiz mandou cancelar e perderia, com isso, o grau em que se achava, prejudicando,
assim, o terceiro que foi fiador da divida.
(fi) Além dos pressupostos da ação própria, coberta, nos embargos de terceiro, pelo elemento mandamental
é preciso que haja, da parte do juiz, o ato contra o qual se peça o mandamento. Os juristas não atendiam, de
ordinário, a esse ponto, ligado à natureza da ação, e estranhavam que, sendo a coisa julgada material só entre
partes, o terceiro precisasse de outro meio que a exceptio rei inter alios iudicatae; outros que, restrita como é
tal eficácia das sentenças, pudessem prejudicar o terceiro. Primeiro, tais raciocínios supunham ser a coisa
julgada material a única eficácia. Segundo, não distinguiam o dever ser e o ser: o despacho ou a sentença do
juiz, tal como deveria ser, com os precisos limites subjetivos da eficácia; e o despacho, ou a sentença, com
os limites que lhe deu o juiz. A. TIssIER (Théorie et Pratique de la Tierce Opposition, 284) chegou a dizer
que. na exceptio ~ inter alios iudicatae e nos embargos de terceiro, a única diferença está em que, ali, o
excipiente se posta na defensiva, e aqui se põe na ofensiva. Imagem inadequada.
Os embargos de terceiro aludem, pelo menos, aos limites subjetivos da eficácia da sentença, e concernem a
qualquer eficácia. Por isso mesmo, se a sentença não tem efeito executivo, mas tem força ou efeito de
alguma outra classe, que baste à constrição, nada obsta a que se produza o prejuízo do terceiro.
Nem se reduzam os embargos de terceiro a “meio” para se evitar o futuro conflito entre dois julgados. como
fazia GIUSEPPE CHIOVENDA (Principii, 1012-1014); nem histórica, nem sistematicamente , os embargos
de terceiro têm alguma coisa que ver com o princípio Ne bis idem, nem, sequer, com a exceção de
litispendência.
Erro igual ao de assimilarem os embargos de terceiro à exceção de coisa julgada entre estranhos (exceptio
rei inter alios indica tae), ou à de litispendência, é o de os reduzir a mera oposição à eficácia executiva. Foi
de repelir-se essa limitação, que rebaixava o instituto, e não resistia à necessidade de exceção para casos
como o do arresto e o do seqüestro.
(i) Os embargos de terceiro protegem com toda constrição, ainda que se trate de execução de obrigação de
fazer ou de não fazer. Não importa se o interesse é material, OU moral. A execução de obrigação de declarar
pode ferir a terceiro. Por outro lado, não só o domínio, os direitos reais e a posse podem ser invocados pelo
embargante. Livrerno-nos, nois, da francesia que nos ia levando para a limitação des embargos de terceiro
ao proprietário, em inteincestivo romanismo (L. 15, ~ 4, D., de re iuclicata et de effectu senientiarum et de
interlocutionibus, 42, 1). A fórmula do direno processual brasileiro tem extensão que satisfaz às exigências
da ciência do direito processual, de iure condendo. Aliás, os povos que se foram inspirando nas Coutumes
de Berry (1, art. 29) aos poucos tiveram a experiência da estreiteza da concepção francesa da tierce
opposition, tanto mais quanto viram, aquém da imitação e superior a ela, injustamente preterida, a tradição
dos Estatutos italianos (MARco TuLLIo ZANzuccIfi, L’Azione in opposizione, 11 e 42 5.) e do direito
português. Assim, qualquer relação de direito material real ou pessoal que a constrição ofenda pode ser
invocada pelo embargante. Por exemplo: o locatário, que ainda não recebeu as chaves, pode embargar a
entrega da coisa ao comprador, com prejuízo seu, se o locador-vendedor tivesse de respeitar o contrato de
locação. É escusado acentuar que essa relação , que faz parte da res in iudicium deducta, há de ser acima, ou
incólume, ou precipua, em contraposição à que originou a constrição. Não basta, pois, a incompatibilidade
abstrata. É preciso a eficácia em choque.
Ao lado dos direitos de domínio e de enfiteuse, dos direitos reais sobre coisa de outrem (do usufruto, do uso
e da habitação, da hipoteca, do penhor, da anticrese), são susectiveis de invocação os direitos de retenção, os
ônus reais, ao rendas, os privilégios creditórios, os direitos ligados à propriedade intelectual, ou ao nome, o
direito às ações constitutivas negativas (ações de nulidade com eficácia ex tunc), os direitos de obrigação (e.
g., pretensões à entrega da coisa em comodato, locação, pagamento de divida, cf. ENRIco REDENTI, Profili
pratici 2. ed., 90 s.),inclusive, em certos casos,
se só resta o preço (CAIiLo FURNO, Disegno sistematico, 222), e o direito de denúncia, o de resolução, os
direitos expectativos em geral. Sempre que o direito, ou a pretensão, ou a ação do terceiro tem eficácia no
tocante ao que obteve a medida constritiva , os embargos de terceiro cabem.
Os direitos e pretensões de direito das obrigações tanto podem consistir em créditos de dinheiro, ou em
dinheiro em que se convertam bens móveis ou imóveis, ou em direitos, pretensões ou ações apenas
avaliáveis em dinheiro.
Desde que alguma coisa tenha de ser entregue ao terceiro, ou algum ato tenha de ser praticado, ou omitido, e
a constrição pelo juízo o impeça, o terceiro tem pretensão à tutela jurídica e à ação de embargos de terceiro.
Para se decidir se o elemento constritivo é ou não é atacável pelo terceiro, apenas se há de perguntar se, no
plano de direito material, o direito, a pretensão ou a ação do terceiro tem, ou não, eficácia quanto aos que
figuram na relação juridica processual em que a constrição se dá. Aqui, os próprios direitos, pretensões e
ações com causa praelationis, ou à restituição, ou à impugnação (denúncia, resolução, rescisão) contra o que
sofreu a medida constritiva. Se B contratou com C e ocorreu a mora de C, tendo A obtido contra C medida
constritiva, B é terceiro que pode embargar, opondo a C e a B o seu ius resolutionis, fundado na lei. Os que
negam essa oponibilidade não atendem a que há eficácia real, ex tunc, da resolução. (Quanto aos direitos
expectativos, pode haver ofensa a eles antes de poder haver ao direito que eles expectam).
Os direitos expectativos podem ser ínvocadcs (SALXTATORE SATTA, L’Esecuzione forsata, 411; M. T.
ZANzuccHí, Diritto Processuale Civile, 3.~ e 4.~- ed., III, 330); porque são direitos como os outros.
Também são invocáveis as pretensões e ações expectativas, de si sós. E os direitos formativos criadores,
extintivos ou modificativos. Quanto à posse, acentua-se, para todo o Brasil, a pretensão a embargar dos pos-
suidores terceiros. Não cabe distinguir-se se a coisa está com o possuidor, ou com o que sofre ou vai sofrer a
constrição . Naturalmente, estando com o possuidor a coisa, pode ele de~ fender a sua posse e não ser
preciso embargar como terceiro; porém, a despeito de estar com ele a posse, mesmo a material, casos há em
que a constrição não é evitada, ou, contra as suas comunicações de conhecimento, ou, até, despacho de
petições, a constrição se deu. Por isso, a afirmativa tem de ser explícita.
Nas próprias ações de direito de família podem ser opostos embargos de terceiro. Por exemplo: se foi pedida
a apreensão de menor, ou o depósito, em ação entre A e B, sendo o terceiro o verdadeiro pai ou a mãe, ou o
tutor ou o curador; se bens comuns foram arrolados como bens comuns de A e C, sendo A bígamo , ou
acusado de bigamia, e B legítimo consorte
9)LEGITIMAçÃo PROCESSUAL PASSIvA. Sujeitos passivos das ações de embargos de terceiro são
todos os que são ou foram parte no processo. Nos embargos de terceiro opostos na ação de execução da
sentença, claro que todos os exequentes; mas hão de ser incluídas as partes que não pediram execução se
contra elas quer força e efeitos o embargante. A unitariedade, necessariedade ou voluntariedade do
litisconsórcio passivo não depende de princípios a priori. Tem-se de atender, ai, à natureza da relação
jurídica entre as partes do processo; e pode ocorrer que tenham de ser citadas as partes autoras e as partes rés
(e. g., dolo bilateral, colusio). A única regra prática é a de se tratarem os embargos de terceiro como ação per
se e sujeita aos princípios de direito processual como qualquer outra. O próprio juiz tem os mesmos deveres
de integração processual.
15)INTERESSE E MOTIVAÇÃO. O interesse e a motivação para embargos de terceiro pedem surgir antes
da “medida” de contrição. Desde que o pedido, o despacho ou o mandado, apanha o bem do terceiro, ainda
que não cumprido , já os embargos de terceiro são oponíveis. Não é preciso que se pode expedido o
mandado, desde que o despacho já contenha designação específica do objeto da constricão (cf. MARCO
TurrÃo ZA TZUCCI-fl, Diritio Processuale Cizh~e, 3) e 4) ed., III, 295; sem razão os que exigem ter havido
a penhora, como CARrO FURNO, Disegno sistematico dei/e Opposizioni, 216, e SALVATORE SATTA,
Guida pratica, 2.~- ed., 192). Se o mandado está antes da sentença, como acontece nos casos de ação
executiva de títulos extrajudiciais, claro é que os embargos de terceiro podem ser opostos desde que se vai
expedir o mandado. Se o mandado é força ou efeito da sentença, então é da sentença que começa a
oponibilidade. A sentença nas ações de condenação não permitiriam os embargos de terceiro, porque a
constrição não seria oriunda da sentença, e sim do despacho que deferisse O pedido de mandado já na ação
executiva de sentença: a sentença de condenação tem efeito executivo, 3 de executividade, de que surge a
actio indicati. Assim, a constriçãO é produzida pela propositura dessa, e não pela. sentença na ação de
condenaçao. O instituto dos embargos de terceiro, tal como o direito brasileiro o recebeu do velho direito
português, e o desenvolveu, tem estrutura própria, sem se afastar de certos princípios da ação mandamental
contrária, nos outros povos ocidentais.
A pendência do processo em que se possa constringir o terceiro, e esteja previsto que se contringirá , basta
para fundamentar o interesse do terceiro que tem embargos a opor. A iminência específica é pressuposto
suficiente; a constrição efetiva, aí, já excede a exigência, é um plus. O dano atual, a fortiori, é pressuposto
suficiente, pois que o é o dano futuro, se a eficácia específica, iminente, se caracterizou.
A 2•a Turma do Supremo Tribunal Federal, a 24 de outubro de 1947 (R. E., 119, 106), admitiu embargos de
terceiro em caso de ameaça de turbação ou de esbulho. O termo é equívoco.
:17) CÔNJUGE. A respeito dos cônjuges, pode ocorrer a comunhão de bens, de todos, de alguns ou de um
só. .Para ~ os embargos de terceiro, surgiu o problema de se saber se, havendo bem ou bens comuns, a
posição jurídica do cônjuge havia de ser sempre a de litisconsorte, ativo ou passivo, razão para as medidas
que . levassem à mesma . sorte.. Todavia, ~
tem-se de atender haja constrição em que o cônjuge nãO foi posto como autor ou como, réu. Por exemplo:
C, credor de A, pede a penhora do bem a, que é de A e B, casadoS sob o regime da comunhãO universal de
bens, ou sob regime em que o bem a é dos dois (portanto, em meação ). De modo nenhum se pode ignorar
que B nãO é devedor, nem que A só é dono da metade do bem. E é. terceiro e pode .embargar. No art. 1.046,
~ 39, o Código de 1973 foi explícito considera-se também terceiro o cônjuge que defende a posse (LatO
sensu) de bem “de sua meação”;
Quanto aos bens dotais, tem-se de levar em consideração, preliminarmente~ que o dote tem as regra~
jurídicas especiais, constantes do Código Civil, quer relativa à transferência dos bens dotais, à alienação e
às dividas pasSiVas, bem como à restituição.
Quanto aos bens próprios e aos reservados, a situação -do cônjuge, a que couberam e cabem, é?i a de
terceiro, porque a constrição nãO os pode atingir, salvo - se há alguma cláusula que os exponha,
excepcionalmente, a alguma eficácia.
19)CREDOR COM GARANTIA REAL. Sempre que se vai alienar judicialmente bem que está gravado
(hipoteca, penhor, anticrese), pode o credor, para que a esfera jurídica que lhe corresponde não seja ferida,
opor embargos de terceiro. Já repelíamos, em comentários ao Código de 1939, a jurisprudência que os
afastara. O Código de 1973 acercadamente redigiu o art. 1.047, II. Antes, nota 5).
Árt. 1 . 048. Os embargos podem ser opostos a qualquer tempo no processo de conhecimento enquanto não
transitada em julgado a sentença, e, no processo de execução, até cinco (5) dias depois da arrematação,
adjudicação ou remição, mas sempre antes da assinatura da respectiva carta 1).
Art. 1 . 049. Os embargos serão distribuidos por dependência 2) e correção em autos distintos4) perante o
mesmo juiz 3) que ordenou a apreensão .
Art. 1 . 050. O embargante, em petição 1) elaborada com observância do disposto no art. 282, fará a prova
sumária de sua posse e a qualidade de terceiro, oferecendo documentos e rol de testemunhas.
§ 1.0 É facultada a prova da posse em audiência preliminar designada pelo juiz4).
§ 29 O possuidor direto pode alegar, com a sua posse, domínio alheio 5)~
Art. 1 . 051. Julgando2) suficientemente provada a posse, o juiz deferirá liminarmente os embargos e
ordenará a expedição de mandado de manutenção ou de restituição3) em favor
do embargante 6), que só receberá os bens depois de prestar caução de os devolver com seus deferimentos
7), caso sejam a final declarados improcedentes.
1) PETIÇÃO INICIAL. A petição inicial dos embargos de terceiro tem de indicar (art. 282, 1, III, IV e VI)
o juiz ou tribunal em que corre o processo principal, os fatos e os fundamentos jurídicos do pedido, que há
de ser especificado, as provas que o autor pretende produzir para demonstrar a veracidade dos fatos
alegados, além do que exige o art. 282. II e V. A citação é do exeqúent e, ou de outro autor da ação, ou da
outra parte, ou das partes, porque autor e réu da ação principal podem contestar a ação de embargos de
terceiro. Volvamos ao assunto das citações.
Na fase do art. 1.051, o deferimento liminar não é sentença na ação de embargos de terceiro. A sentença
pode julgar improcedente a ação de embargos de terceiro, o que leva às conseqüências previstas no art.
1.051, in fine.
Pode haver ou não haver contestação. Findo o prazo para contestar, que é de dez dias, se não houve
contestaçãO, presumem-se aceitos pelo embargado ou pelos embargados, como verdadeiros, os fatos
alegados pelo embargante (cf. arts. 1.053, 803, 285, 302 e 319). A contestação tem de ser para afastar a
procedência dos embargos de terceiro, cabendo ao contestante alegar qualquer dos pontos, ou alguns, ou
todos os pontos do art. 301.
Tem de ser citado o embargado, de que proveio, com a nomeação de bens, a ofensa do embargante, seja o
réu ou seja o autor na ação, ou citadas as partes, se a nomeação por uma não foi repelida pela outra; mas
qualquer das partes e mais interessados podem contestar.
4)PROVAS NA PRIMEIRA FASE DO PROCESSO. Na primeira fase dos embargos de terceiro, quando o
embargante pede ou poderia pedir vista, há sumária instrução, de que a velha praxe dá notícia e foi assente
desde esse tempo. Quaisquer provas são admissíveis, ainda à segunda fase, embora o seu valor tenha de
atender, às vezes, a regras de direito material: testemunhas (1.~ Câmara Cível da Corte de Apelação do
Distrito Federal, 11 de abril de 1907, R. de D., 12, 99; antes, Tribunal de Justiça de São Paulo, 23 de
setembro de 1899, 27 de maio de 1905, 10 de novembro de 1909, S. P. J., VIII, 110, 21, 374), perícias de
identificação, exibição de livros etc. Não se podem excluir, a priori, indícios e presunções (sem razão a 1.a
Câmara Cível da Corte de ApelaçãO do Distrito Federal, 12 de julho de 1909, R. de D., 14, 318, que
desatendeu às circunstâncias).
É facultada a prova da posse em audiência preliminar designada pelo juiz. Ainda não houve a contestação.
Se ela ocorre, então já se está na segunda fase, que é a do art. 1.053.
A alegação de domínio sobre imóvel só se prova com a transcrição ou por outro ato do registro que a lei
admita. Ocorre o mesmo quanto aos direitos reais limitados (2.a Câmara Cível da Corte de ApelaçãO do
Distrito Federal, 10 de Junho de 1913, R. de D., 29, 398; Câmaras Cíveis Reunidas, 3 de julho de 1913, R.
de D., 30, 328). É preciso que o registro seja anterior à medida constritíva (2.~ Câmara, 29 de novembro de
1910; Câmaras Cíveis Reunidas, 25 de agosto de 1913, R. de D., 32, 136 e 137). Neles pode ser discutido se
há coisa julgada material a respeito, qual a verba testamentária, desde que para a decisãO dos embargos de
terceiro é questãO prejudicial (2.a Câmara, 15 de julho de 1913, R. de D., 32, 184). É de suma importância
verificar-se se o instrumento particular que prove o direito ou a posse do embargante tem efeitos contra
terceiros (1.~ Câmara, 4 de junho de 1917, R. de D., 45, 380), ou se o tem a própria sentença constitutiva.
O art. 1.050, § 1.0, permite que na audiência preliminar se proceda à prova da posse. Se o possuidor
embargante é dono do bem, pode provar a propriedade e a posse.
6) RECURSO. Da decisão que concede o contramandado inicial não havia recurso. Trata-se de efeito de
adiantamento. Mas, diante do art. 522, há agravo de instrumento.
1) SUSPENSÃO DO PROCESSO. Já antes tratamos do assunto, chamando atenção para a diferença entre a
solução
- do Código de 1973 e a do direito anterior. Hoje, se os embargos de terceiro atingem todos os bens da ação,
porque são objeto da constríção, a suspensão é total. Se a medida constrítiva ou as medidas constritivas
apanham algum bem ou alguns bens que são dentre os outros aqueles do interesse do embargante, então
apenas no que toca a esse ou a esses bens ocorre a suspensão .
2) BENS NÃO EMBARGADOS. Aquele bem ou aqueles bens que aos embargos de terceiro nãO
interessam têm o prosseguimento do processo, indo-se até o fim. O auto ou os autos ficam sujeitos à
sentença que se proferiu, ou que se vai proferir, após a contestação, ou por se não haver contestado o pedido
do embargante.
8)PRAZO E oposição A QUALQUER TEMPO. O art. 1.048, referindo-se “a qualquer tempo”, antes da
sentença de cognição m, ou antes da assinatura da carta, no processo de execução, supõe que o terceiro não
tenha sido notificado antes, precluindo-se algum prazo, e que nãO tenha havido oposição, cuja sentença haja
passado em julgado, ou cuja propositura produza litispendência . Cf. Tribunal Regional do Trabalho
(Guanabara), 29 de novembro de 1962 (D. da J., de 13 de dezembro): “Acertadamente, sustenta a decisão
agravada que tal prazo não se conta quando a parte não tem ciência do fato. Quando, tendo conhecimento da
penhora, não manifesta qualquer oposição, deixando que a mesma produza todos os seus efeitos, nãO poderá
mais impugná-la. Nesse mesmo sentido se manifesta PONTES DE MIRANDA: O art. 708 do Código de
1939, referindo-se “a qualquer tempo”, antes da sentença “final” de cognição, ou antes da assinatura da
carta, no processo de execuçãO, supõe que o terceiro não tenha sido notificado antes, precluindo-se algum
prazo, e que não tenha havido oposição, cuja sentença haja passado em julgado, ou cuja propositura produza
lítispendência”. Já antes a 4.~ Câmara Cível do Tribunal de ApelaçãO do Distrito Federal, a 4 de janeiro de
1946 (D. da J., de 14 de novembro de 1947):
“Quando o legislador, no art. 708 do Código de Processo Civil, dispôs que os embargos de terceiro serão
admissíveis em qualquer tempo, antes da sentença final, ou na execução, até cinco dias depois da
arrematação, ou adjudicação, mas sempre antes da assinatura da respectiva carta, dirigiu-se, evidentemente,
àquele que, até então, não tenha intervindo no feito, o que se não verificou com a agravante, que, como já
salientou, ciente da penhora, se defendeu logo, como lhe permitia o art. 948 do dito Código de Processo
Civil”.
O art. 1.048 diz que os embargos são admissíveis “em qualquer tempo”, mas, em seguida, enuncia:
“enquanto não transitada em julgado a sentença”. Pergunta-se: ~, (a) antes de passar em julgado a sentença
e, mais tarde, (b) na execução da sentença, tratando-se de sentença com efeito executivo (condenatória); ou
(a) antes de haver sentença ou passar em julgado, (b) depois de passar em julgado, na execução?
O atender-se demasiado ao momento da exeqúibílidade da sentença levou alguns sistemas jurídicos,
inclusive legislações brasileiras, a dificultarem ou impossibilitarem os embargos do terceiro antes da
execução. Na própria doutrina, ainda GIUSEPPE CHIOVENDA (Principii, 1011) não se furtou à influência
de alguns juristas franceses quando excluiu a embargabilidade da sentença sujeita a recurso, porque lhe cabe
o recurso de terceiro prejudicado. Certamente, os embargos de terceiro não poderiam ser contra a sentença
desprovida de qualquer eficácia; mas a razão seria outra: exige-se, como requisito essencial dos embargos de
terceo, que tenha havido turbação ou esbulho, portanto ofensa, constrição lesiva, e essa não poderia provir
de tal sentença desprovida de qualquer eficácia. Se houve a constrição outro ato judicial, praticado antes
dela, o causou, e esse ato é que há de ser embargado. Como, porém, as sentenças têm eficácia quanto, por
exemplo, a cobrirem as nulidades e estarem a ponto de passar em julgado, seria difícil conceber-se a
existência de ato judicial lesivo do terceiro e sentença de todo sem eficácia. O Código fez bem em deixar
claro que, durante os processos das ações de declaração, de constituição, de condenação e de mandamento, e
não só durante as de execução, se podem opor embargos de terceiro.
Resta saber se, havendo sentença e sendo ainda desprovida de toda a eficácia, pode ela ser “embargada”. Se
houve algum ato, antes dela, ou contemporâneo dela, ou antes de passar em julgado a sentença, que podia
ser embargado, não há dúvida que o ter-se proferido tal sentença de modo nenhum poderia ser obstáculo aos
embargos de terceiro: embargado éo referido ato judicial, não a sentença. Por isso mesmo, na hipótese de
nãO ter qualquer eficácia a sentença, turbação ou esbulho do terceiro, ou qualquer constrição dela oriunda
nãO pode haver; nem a ação de embargos de terceiro se confunde com a oposiçãO em intervenção. Quando
se fala de “execução”, a palavra está em sentido larguíssimo que abrange, e. g., o de cumprimento de
mandamento, força, ou efeito. Portanto se há 5 ou 4 de executividade.
Os embargos de terceiro são admissíveis, em qualquer tempo (= a qualquer momento do trato de tempo em
que se admitem), antes da sentença trânsita em julgado (isto é, antes de haver sentença de que não caiba, ou
de que não houve recurso), ou, na execução (= nas ações executivas, inclusive a executiva de sentença),
“até cinco dias depois da arrematação, ou adjudicaçãO, ou remiçãO” (portanto não contando o dia da
arrematação, ou da expiração). A assinatura da carta de arrematação ou de adjudicação ou da remição não
pode encurtar o prazo da expiração.
Algumas sentenças têm a sua eficácia imediata, portanto 4 de executividade. Por exemplo: a ação de
alimentos provisionais, que é constitutiva; a ação de entrega de objetos próprios e a açãO de posse em nome
do nascituro, ambas mandamentais ; a ação de habilitaçãO em inventário e partilha, a ação de habilitaçãO
incidental se tem saisina o sucessor, que sãO declarativas. É interessante observar-se que há sentenças
declarativas de executibilídade imediata. Também há ações que são condenatórias e, em vez de 3 de
executivídade (o que mais acontece)~ têm 4 e tal eficácia imediata aparece na açãO de prestação de contas
ou de pedir contas havendo saldo, na açãO de resposta à imprensa e nas ações penais . Sobre esses pesos de
eficácia sentencial, leia-se o Tratado das Ações, Tomo VII (Ações executivas), principalmente as suas
Tabelas.
A antítese foi suscitada por ENRíco GALLUPPI (Teoria deila Opposizione dei terzo, 95 s., 261, 308, 310);
na França, por A. TIs5IER (Théorie et Pratique de la Tierce Opposition, 247); cf., na Itália, F. G. Li (a
interponibilidade ou oponíbilidade pelo terceiro), têm conteúdo diverso, de modo que pode haver e pode
nãO haver a coincidência. b) Os embargos de terceiro sãO ação, e não recurso, o que afasta qualquer alusão
à pluralidade de recursos e nos remete aos textos especiais do direito processual. Ao terceiro, nos embargos
de terceiro, é dado propor, por sob o pedido mandamental negativo, característico dos embargos, a sua ação
própria, variável conforme a posse ou o direito turbado ou esbulhado, para empregarmos terminologia da lei,
e isso bastaria para se destruir qualquer invocacão do princípio de economia dos meios processuais (ou do
caminho mais curto, que seria o recurso de terceiro). d) O emprego do recurso de terceiro e dos embargos de
terceiro, em dúplice defesa, que a lei nãO veda, teria o inconveniente de fazer possível a contradição entre
as sentenças no grau do recurso e nos embargos de terceiro, mas esse inconveniente de nenhum modo
demoveu os legisladores de todos os tempos, em que houve embargos, de reputar embargável pelo terceiro a
própria sentença passada em julgado e já na execução: a contradição, aí, daria aos interessados o emprego da
exceptio rei iudicatae, pois o terceiro recorrente se defronta com as outras partes, tal como o terceiro
embargante. e) Os juristas esqueceram-se de levar em conta a eficácia imediata e a eficácia inclusa das
sentenças, somente considerando a sentença condenatória e a eficácia mediata da execução das sentenças
condenatórias. Daí haverem confinado o problema entre a sentença e a execução da sentença, cujo caso mais
relevante é o da execução provisória dos arts. 587, 2.~ parte, e 588. As sentenças constitutivas, as
mandamentais, o valor de preceito sine clausula das declarativas, a própria eficácia anexa da sentença de
condenação, podem turbar ou esbulhar o terceiro. O estudo das cinco classes de ações era (e é) demasiado
novo para que os juristas pusessem o problema noutros termos e latitude que ao tempo de LoDovíco
MORTARA.
Aqui temos de mais uma vez lançar a crítica contra confusões legislativas e de interpretação. Advirtamos, de
início, que tudo muda se o ato constritívo nada tem com o assunto da ação e a parte sofreu a constríção que
nada tem com a lide e alega e prova que o ato judicial o ofendeu como terceiro, e não como parte (e. g., o
autor reivindica o bem a e a medida judicial atinge o bem b, que está com o réu, dono ou possuidor). Sempre
que a constriçãO é ilegítima, por não ser ligada às medidas da ação pendente, quem a sofre é terceiro,
mesmo que coincida ser o réu da ação.
Tudo que dissemos a respeito da ação pendente também se aplica à reconvenção, se o ato judicial é dentro
dela, que ação é.
Art. 1 . 053. Os embargos poderão ser contestados 1) no prazo de dez (10) dias, findo o qual proceder-se-á
de acordo com o disposto no art. 8032) 3) 4) 5) 6) 7)
Art. 1 . 054. Contra os embargos do credor com garantia real8), somente poderá o embargado alegar que:
1 o devedor comum é insolvente 9);
II o titulo é nulo ou não obriga a terceiro 10);
111 outra é a coisa dada em garantia 11)
a) A 2.~ Câmara do Tribunal de ApelaçãO de SãO Paulo, a 13 de novembro de 1939 (R. dos T., 131, 678),
aventurou que a oposiçãO dos embargos nãO interrompe a prescrição. Nada mais equívoco do que essa
afirmaçãO. Quanto ao recurso de embargos, é ele ato processual que mantém a interrupção oriunda do
último ato anterior (Código Civil, art. 173, ver bis “do último ato do processo para a interromper”). Quanto
aos embargos do devedor, trata-se de ato do devedor executado e seria sem sentido a questão. Quanto aos
embargos de terceiro, fora do concurso creditório e da falência, a ciência pelo embargado é citaçãO, pois
que se trata de ação de embargos de terceiro (Código de Processo Civil, arts. 1.050 e 282); a interrupção é
no momento em que começa o prazo ao executado, mas desde o despacho, se observado o art. 219. § 1.0, do
Código de Processo Civil. Tal como se passa em relaçãO à reconvenção (art. 316).
A execução da parte líquida da sentença não interrompe a prescrição quanto à parte ilíquida (sem razão, a
4•R Câmara do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 12 de abril de 1945, R. dos T., 160, 131); quanto à
parte ilíquida, o que a interrompe é a citação a que se referem, implicitamente, os artigos 605, 607, parágrafo
único, e 609.
Se na sentença há parte liquida e parte ilíquida, permite-se ao credor promover simultaneamente a execução
daquela e a liquidação dessa (art. 586, § 1.0). Aí, há uma citação para as duas partes, o que nos impõe
atribuirmos a tal citação a eficácia interruptiva da prescrição, antes das medidas dos arts. 605, 607, parágrafo
único, e 609.
Uma vez que a lei, de direito material, fala da apresentação do título de crédito em concurso de credores,
não importa se se trata de crédito garantido com hipoteca, anticrese, penhor, ou cauçãO, ou com privilégio
especial sobre determinado bem, ou com privilégio geral, ou simplesmente
crédito quirografário. Porém nãO têm eficácia interruptiva os pedidos de restituiçãO e os embargos de
terceiro, pois que, quanto aos pedidos de restituição, a interrupção só se dá com a audiência do devedor em
concurso, ou do falido e do síndico, ou o escoamento do prazo para falarem, mas desde a audiência;
tratando-se de embargos de terceiro, ou com a contestaçãO ou o escoamento do prazo (cf. ERNST
JARGER, Kommentar zur Konkursordnung, 1, 405, nota 26; sem distinguir,G.PLANCK, Kommentar, 1,
537), mas desde a contestaçãO. Se o credor retira a apresentaçãO a concurso, antes de ser ciente o devedor,
ou o falido e o síndico, tudo se passa como se não tivesse havido a apresentação; portanto, não houve
apresentaçãO. Se houve pedido de restituiçãO, ou embargos de terceiro, a desistência do pedido ou dos
embargos de terceiro, antes de ser ouvido o devedor, ou de serem ouvidos o falido e o síndico, tem o efeito
de excluir que haja havido interrupção.
b)O Supremo Tribunal Federal, a 31 de outubro de 1934 (J. do S. T. F., 20, 344), entendeu que a prescrição
não corre se o juiz ordena que o processo permaneça em cartório, para se julgar a causa segundo a ordem
dele, ou ordem que o juiz dê. Não há tal regra jurídica no direito brasileiro, O último ato do processo é, ex
hypothesi, a conclusão. Nenhum texto do Código Civil ou de outra lei permite que se tire a ilação que o
relator tirou. A 2.~ Câmara do Tribunal de Justiça do Paraná, a j•O de setembro de 1949 (Paraná J., 53, 17)
admitiu suspensãO da prescriçãO por força maior. Mas tais decisões, sem apoio em lei, ou bebidas em
outros sistemas jurídicos, de modo nenhum se podem admitir. A 2.R Câmara do Tribunal de Apelação de
Minas Gerais, a 1.0 de abril de 11944 (Minas Jurídica, 1, 66), entendeu que os embargos de terceiro sãO
causa de suspensão (?) da prescrição. Sem razãO, a suspensão, aí, seria quanto ao processo principal, de
modo que teria havido interrupção com o último ato do processo principal e somente se contaria o prazo
prescripcional a partir do levantamento da suspensãO processual. É preciso não se confundir eficácia
suspendente, atribuida a embargos de terceiro (art. 1.052), com suspensãO do curso da prescriçãO. A
suspensão do processo principal pelos embargos de terceiro, ou pelos embargos do devedor (arts. 741 e
745), apenas tem o efeito de interrupçãO da prescrição desde a suspensãO até a decisãO que levante a
eficácia suspendente.
7) FoRo DO JUÍZO CONSTRITOR. O foro do juiz, que praticou o ato de constrição, impõe-se, de modo
que cedem todas as outras regras jurídicas de competência, e não pode ser declinado. O principio já estava
em JoRGE DE CABEDO (Practicarum Observationum sire Decisionum, 1, d. 210, ns. 1 e 2). Não se
observa a ordem das instâncias, porque se apresentam os embargos de terceiro onde foi feita a cons~rição.
O valor da ação é o dos bens constritos, e não o da ação contra cuja eficácia se vai (1.R Turma do Supremo
Tribunal Federal, 16 de julho de 1945, A. J., 77, 199).
Tem-se de atender ao momento da cognição, da decisão, para se determinar a competência, leva-se em
consideração a fonte, e nãO o momento da constrição. Uma vez que a diferença, no tocante ao momento,
causa diferença no espaço, cogita-se do lugar em que se conheceu do pedido e, em conseqüência , se
deprecou, ou se rogou; só se presta atenção é. fonte do ato processual constringente. É esse ato, o do
conhecimento do pedido, que se embarga. Acertadamente, o Código de 1973 riscou a regra jurídica do art.
711 do Código de 1939, que fazia competente para conhecer dos embargos de terceiro o juízo deprecado,
onde se fez a constriçãO. Ora, o ato constritívo foi deprecado, ou rogado, por outro juiz,
o deprecante ou o rogante. O causador foi o juiz deprecante ou o rogante.
Se a constrição de modo nenhum foi assunto da deprecação ou da rogação, e o juiz deprecado ou rogado foi
o responsável, isto é, constrigente ilegal foi ele, mas isso tem de ser apreciado pelo juiz deprecante ou
rogante.
Tais os princípios, que dão os limites ao conceito de embargos de terceiro e criam regra especial de
competência.
8)CREDOR COM GARANTIA REAL. Se quem embarga é credor com garantia real, o embargado
somente pode alegar que o devedor comum devedor ao exeqüente e devedor ao embargante está
insolvente, ou que o título de direito real de garantia é inexistente, ou nulo, ou que não é título que obrigue a
terceiro, ou que a coisa atingida pela constrição judicial não é a que se dera em garantia.
9)DEVEDOR COMUM E INSOLVENTE. O art. 1.054 abre exceção ao principio de amplitude das
alegações do embargado, desde que se perfizeram os pressupostos para a ação de embargos de terceiro. Uma
vez que, na ação , de cuja mealda constritiva resulta ofensa ao terceiro, a constriçãO atinge crédito com
garantia real (qualquer que seja), tem-se de atender a que é excepcional poder-se constringir direito real. Daí
só se admitir a alegação pelo embargado se se tratar de insolvência e ser comum o débito, ou de que o título
do terceiro é nulo, ou que o titulo cio terceiro de modo nenhum o vincula, ou o bem sobre que recaiu a
constrição não é aquele a que se refere o título do terceiro.
Quanto à hipótese da insolvência, cumpre advertir-se que a só alegação da insolvência não basta: é preciso
que, a despeito de se tratar de crédito com garantia real, o fato de estar insolvente o devedor permita,
conforme o direito material respectivo, que se desatenda ao direito real de garantia. Ora, na falência e na
insolvência, o que se poderia admitir seria a alegação de fraude contra credores. Houve defeito na redação
do art. 1.054, 1, porque a insolvência não faz comum, em tal caso, o devedor. Se o devedor é insolvente, as
dividas excederam a importância dos bens do devedor (art. 748). Os bens gravados de direito real de
garantia são arrecadáveis e classificados, sendo que eles vêm em primeiro lugar. O direito real de garantia
está fora das somas das dívidas do insolvente, seja pela entrega do bem, se o valor dele é o valor do crédito
com garantia real, ou pela prestação da diferença pelo credor com garantia real, se o valor é acima do valor
do crédito, ou pela entrega do valor do crédito pela massa.
10)NULIDABE OU INATINGIMENTO DO CREDITO. As duas espécies do art. 1.054, II, são assaz
diferentes. a) O título pode ser inexistente ou nulo ou anulável. b) Pode ser título que a medida constrítiva
não atingiu, nem atinge, nem vai atingir. Se a), ou a nulidade é absoluta, ou se trata apenas de anulabilidade,
ou de ineficácia. Se o título nulo, existe porém não vale. Pergunta-se: ~,nos embargos de terceiro pode o
embargado alegar que é anulável o título do crédito com garantia real, e pedir, na própria ação dos embargos
de terceiro, no ensejo da contestação, a decretação da anulação? Os atos jurídicos anuláveis (incapacidade
relativa do agente, vício resultante de erro, dolo, coação, simulação ou fraude, Código Civil, art. 147)
dependem, para a eficácia negativa, de haver sentença a respeito deles (sentença constitutiva negativa), o
que suscita a questãO: ~,pode na contestação ser inserta tal açãO constitutiva negativa? Temos de entender
que o art. 1.054, II, só alude ao título “nulo”, e nãO ao anulável , de que o juiz dos embargos de terceiro de
modo nenhum poderia decretar a anulação. Ao embargado cabe propor outra ação, que é a de anulação do
título. Se acaso advém a decretação, o terceiro embargante tem de devolver os bens recebidos, com os
rendimentos, para o que ele prestou caução , por analogia com o que se estatui no art. 1.051, 2.~’ parte.
Quanto à ineficácia, em vez de inexistência ou de invalidade do título, ou a espécie cabe no art. 1.054, II, 2.~
parte (“não obriga a terceiro”), ou não houve ofensa com a constrição que ocorreu, ocorre ou vai ocorrer.
Quanto aos pressupostos para a nulidade do crédito com garantia real, Código Civil, arts. 145, 135, 761,
796, 831 e 848.
11)INATINGIBILIDADE DO BEM. Se o bem gravado não é o bem que a constrição atingiu, ou atinge, ou
vai atingir,o embargado pode alegá-lo, porque é sem o pressuposto essencial a oposição dos embargos de
terceiro: não foi ferido qualquer direito do terceiro.
Se o devedor comum é insolvente, é claro que se tem de constringir judicialmente o bem gravado de direito
real limitado. Ao juízo da insolvência concorrem todos oi~ credores do devedor, comum, com o respeito às
preferências. Se o devedor comum não é insolvente, cabe-lhe não nomear bens gravados de direitos reais
limitados, pois, tendo bens livres e desembargos (art. 656, IV), se nomeia outros que o não sejam, é
ineficaz a nomeação .
Quanto ao art. 1.054, temos de frisar que não constava do Código de 1939. O credor com garantia real está
ofendido pela constrição judicial se o bem sobre o qual recai o seu direito real limitado foi atingido pelo
ato. O embargado somente pode alegar que o devedor comum é insolvente, que há nulidade do título, ou que
outra é coisa dada em garantia. Quanto à primeira alegação, diremos o suficiente na nota 9. As notas 10 e 11
tratam do art. 1.054, II e III. No Código Civil, art. 135, diz-se, com clareza, pois que se trata de regras
jurídicas de direito material. “O instrumento particular, feito e assinado, ou somente assinado por quem
esteja na disposição e administração de seus bens, sendo subscrito por duas testemunhas, prova as
obrigações convencionais de
qualquer valor. Mas os seus efeitos, bem como os de cessão, não se operam, a respeito de terceiro (art.
1.067), antes de transcritos no registro público”. No art. 796 estatui-se: “O penhor agrícola será transcrito no
Registro de Imóveis”. Cf. Lei n. 58, de 30 de agosto de 1937 (penhor rural e cédula pignoratícia), Decreto-
lei n. 2.612, de 20 de setembro de 1940 (registro do penhor rural); Lei n. 2.666, de 6 de dezembro de 1955
(penhor de produtos agrícolas). No Código Civil, art. 831, estabelece-se que “todas as hipotecas serão
inscritas no registro do lugar do imóvel, ou no de cada um deles, se o título se referir a mais de um”. No art.
848: “As hipotecas somente valem contra terceiros desde a data da inscrição. Enquanto não inscritas, as
hipotecas só subsistem entre os contraentes”. Aí, mais uma vez, o legislador confunde existência, validade e
eficácia: se foram feitas entre os contra-entes como deviam ser, elas exigem e valem; o registro é que lhes dá
eficácia contra terceiros. Pode ser que o título tenha sido inválido e então, apesar do registro, pode o
embargado alegar a nulidade (incapacidade absoluta, ilicitude ou impossibilidade do negócio jurídico de
gravame, infração de
principio da solenidade necessária ou de exigência de alguma lei. O art. 761 do Código Civil firma que os
contratos de penhor, antícrese e hipoteca têm de declarar “são pena de não valerem contra terceiros”, o total
da dívida, ou sua estimação , o prazo fixado para pagamento, a taxa de juros, se há, a coisa dada em garantia
(aliás, gravada, porque, nem sempre se dá a coisa em garantia, o que pode ocorrer, distinto da hipoteca, com
o gravame pignoratício).
Pode acontecer que haja incerteza, no tocante à coisa em garantia, ou que tenha ocorrido substituição, e
então há assunto para a contestação pelo embargado. O que se tem de verificar é se foi atendida, como
devia, a regra jurídica do art. 761, IV, do Código Civil (sob pena de não valer o negócio jurídico de garantia
real contra terceiros se não houve as especificações da coisa sujeita à garantia real).
Não se diga que o art. 1.047, II, é excepcional, porque admite embargos de terceiro para o credor com
garantia real obstar a alienação judicial do objeto da hipoteca, da penhora, ou da anticrese. Não se precisava
de tal regra jurídica, nem ela afasta os embargos de terceiro por parte do titular de direito de usufruto, uso,
habilitação ou outro direito real limitado, nem quaisquer embargos de terceiro por qualquer curador ou
titular de direito pessoal que sofreu a constríção judicial. O art. 1.054 aponta o que o embargado pode
alegar.
Fazer dos embargos de terceiro ação relativa à propriedade ou à posse é deturpá-lo. Não se explicaria que as
constrições judiciais que ofendem bens que não são de propriedade ou de posse de terceiros ficassem
incólumes aos embargos de terceiro. Seria tratarem-se os terceiros abaixo dos devedores que sofrem
constrições e têm os embargos do devedor.
Trata-se de duas ações mandamentais, sem caráter possessório, posto que algumas vezes o ato constritivo
ofenda a posse. Os embargos do devedor pedem contratandado e os embargos de terceiro também. Toda
preocupação de limitar à defesa da posse os embargos de terceiro orça por horrível confusão entre posse e os
outros direitos.
CAPÍTULO XI
DA HABILITAÇÃO 1)-2)-3)
Pergunta-se: apode promover a ação de habilitação quem era assistente? A resposta é afirmativa, e o próprio
herdeiro do assistente do morto pode ter interesse em que a assistência continue e, assim, apenas precisa
provar a sucessão no direito material do assistente. Quanto ao opoente, parte é, e nenhum problema surge. O
herdeiro do assistente não é obrigado a suscitar a habilitação, nem a morte do assistente suspende o
processo.
Quando um direito se extingue com a morte, tal como acontece com o direito de usufruto, não há pensar-se
em habilitação de herdeiros na ação do proprietário contra o usufrutuário, se declaratória negativa, porque,
com a morte, a propriedade está incólume. Aliter, por exemplo, se condenatória (por não ter feito as
reparações ordinárias , ou não ter pago foros, impostos devidos pela posse ou pelo rendimento da coisa
usufruida). Se a ação era do usufrutuário contra o proprietário, não se dá o mesmo. Há sucessão processual
e, pois, habilitação era a ação condenatória, e. g., no tocante a reparações que eram obrigação do
proprietário, ou se a ação declaratória era para obrigar, depois, o proprietário a entregar o uso e o fruto. Não
se diga, portanto, que com o fato de se extinguir o usufruto com a morte do usufrutuário nunca há
transmissão. O proprietário que negou o direito no usufruto (ação declaratória ou desconstitutiva), se falece,
os seus herdeiros têm interesse em prosseguir na açãO contra o usufrutuário e podem habilitar-se. Se o
usufrutuário nega a propriedade do autor ou réu, que se diz proprietário, legitimação dos herdeiros à
habilitação .
O processo da habilitação acidental (termo que o texto de 1973 evitou) só se refere às habilitações que se
têm de fazer depois de estabelecida a relação jurídica processual e, pois, a partir da litispendência; e até a
extinção do processo, porque, faltando o autor ou o réu, ou alguém que se fez tal, necessariamente, se a
causa não é das poucas que se extinguem com a morte da parte (e. g., desquite) se dá a inserção do sucessor
no processo e na relação jurídica processual e a habilitação acidental provê a isso.
No sistema do Código, a inserção do sucessor causa mortis na relação jurídica processual (não se confunda
com a inserção nas relações de direito material, que, de regra, é ipso jure, Código Civil, art. 1.572), só é ipso
jure nas espécies do art. 1.060, 1. Em quaisquer outras, depende da sentença, ainda que se tenha dado a
inserção na relação de direito material ou da inclusão do herdeiro no inventário, sem qualquer oposição (art.
1.060, III). Tal particularidade do direito brasileiro não deixa de ser reminiscência do direito material
anterior ao Alvará de 9 de novembro de 1754; mas há a lex lata. Com a morte de qualquer dos litigantes
suspende-se o processo (art. 265, 1).
A substituição do herdeiro renunciante não é objeto de habilitação acidental (sem razão, a 4•~ Câmara Civil
do Tribunal de Justiça de São Paulo, 7 de junho de 1951, R. dos T., 193, 899). A habilitação é como se
prevê no art. 1.060, 1, posto que se haja feito a prova da renúncia.
3)LEGITIMAÇÃO PROCESSUAL ATIVA. Qualquer interessado na causa principal, quer de lado do autor
quer do réu,quer do lado do falecido quer da parte contrária, pode promover a habilitação. Não há qualquer
limitação das habilitações às causas principais em que há contentio inter partes. A alusão dos processualistas
à “habilitação incidente nas causas contenciosas” era errada, por excluir a habilitação noutras causas. Desde
que a ação não se extingue com a morte do autor ou do réu, ainda que não haja, desde logo a angularidade
da relação jurídica processual, cabe a habilitação, ativa ou passiva, ou somente ativa, nas ações declarativas,
constitutivas, de condenação, mandamentais, ou executivas. A relação jurídica processual lá está, e há a
falha cIo sujeito.
A ~ Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 8 de outubro de 1946 (R. F., 110, 135), disse
que não pode promover habilitação incidente o terceiro a quem foi negada a qualidade de litisconsorte por
acórdão trânsito em julgado. Está certa a decisão se o acórdão não fundou a afirmação de não ser
litisconsorte em falta de prova ou de não caber habilitação acidental.
Art. 1 . 056. A habilitação 1) pode ser requerida 2): 1 pela parte, em relação aos sucessores do falecido 3);
II pelos sucessores do falecido, em relação à parte 4)
1)LEGITIMAÇÃO ATIVA. A habilitação é de sucessor do falecido; mas quem pode pedi-la é a própria
parte, para que se habilite o sucessor, ou se habilitem os sucessores do falecido, ou é o próprio habilitando,
ou os próprios habilitandos. A relação jurídica processual é entre a parte e o Estado, em angularização com
o sucessor, ou os sucessores: ou entre o sucessor ou os sucessores e o Estado, anguarizando-se com a parte.
2) ANGULARIZAÇAO A angularização ocorre com a citação da outra parte, ou das outras partes, ditas,
no art. 1.057 “requeridos”, a despeito de se tratar de petição em ação, nos próprios autos da ação principal
(cf. art. 1.060).
3) LEGITIMAÇÃO DA PARTE. O art. 1.056, 1, fala de poder propor a ação de habilitação a parte, se
falece a outra parte, ação que se dirige, com a angularização, aos “sucessores do falecido”. Sucessores do
falecido são os herdeiros legatários, isto é, quem quer que o suceda mortis causa. Não se fala de sucessores
entre vivos, porque o fato-cerne da ação é ter falecido a parte. Vai-se ao ponto de, no Capítulo XI (Da
habilitação), inserir-se o art. 1.061, que somente cogita de ter havido aquisição ou cessão e ter-se de
prosseguir na causa se, antes de se juntar o título e provada a identidade , falece o alienante ou cedente. O
art. 1.061 apenas dispensa, de certo modo, a chamada “habilitação”: pode o adquirente ou cessionário
prosseguir na causa, com simples documento. Não se pense em habilitação independente de sentença (art.
1.060), posto que haja algo de simile no art. 1.061.
A legitimação da parte, no art. 1.056, 1, pode ser de alguma das partes, em relação aos sucessores do
falecido, ou de algumas das partes, ou de todas as partes, porque a ação pode ser com um ou alguns autores
ou um ou alguns réus.
Conforme antes frisamos, há interessados que têm de ser tratados como o autor ou o réu, se aquele ou esse
falece.
Pode acontecer que a parte, que se acha diante da morte da outra parte, seja pessoa jurídica. Ela é que pode
suscitar a habilitação, e não os sócios, salvo se de acordo com as regras estatutárias: o que ai importa é haver
a apresentação ou a representação em juízo.
O art. 1.056 pôs em primeiro lugar a parte contra a parte falecida e em segundo lugar os sucessores do
falecido. Fez bem, ~,por que o interesse maior não é o dos sucessores, porém da parte contrária? Não cabe
discutir-se. Pode a parte que permanece ter interesse em que não se promova a habilitação, para que ocorra a
extinção do processo, como podem ter tal interesse os sucessores do falecido. Por outro lado, não se diga
que a iniciativa, na falta dos sucessores da parte que faleceu, se transfere à que no seu lugar persistiu.
4)LEGITIM.AçÃO DOS SUCESSORES. O art. 1.056, II, cogita da ação de habilitação proposta pelos
sucessores do falecido, mas a sucessão há de ser na relação jurídica processual, ou na relação de direito
material que faça surgir o direito a suceder no processo. No Código de 1939 dizia-se que a habilitação podia
ser promovida pelos herdeiros da parte falecida, ou por qualquer interessado. O art. 1.056, II, pôs à frente a
sucessão processual, que supõe existir o interesse. A despeito das diferenças, na redação, os princípios
jurídicos são os mesmos.
Art. 1 . 057. Recebida a petição inicial 1), ordenará o juiz a citação2) 3) 4) dos requeridos para contestar a
ação no prazo de cinco (5) dias.
Parágrafo único. A citação será pessoal se a parte não tiver procurador constituído na causa 5).
1) PETIÇÃO. A petição tem de satisfazer os requisites dos arts. 282 e 283. As citações, se não se sabe
quem são os herdeiros do falecido, fazem-se por edital (art. 231); bem assim nos demais casos do art. 231. O
art. 9•O, II. é aplicável. Idem, os arts. 877 e 878 se for o caso.
2)CITAÇÃO. Se a habilitação é ativa, a parte contrária não precisa de ser citada pessoalmente, pois já está
em juízo, nele continua e o seu procurador lhe faz í~s vezes, se o tem na ocasião (2.a Câmara Cível da Corte
de Apelação do Distrito Federal, 30 de junho de 1905, O D., 97, 643).
3)HERDEIROS INCERTOS. Arts. 231, 1, e 9•O, II. O correr a causa com o Ministério Público não
dispensa o curador especial.
No Código de 1939, art. 748, § 2.0, dizia-se: “Quando incertos, os herdeiros serão citados por edital, na
forma determinada neste Código, correndo a causa com o curador nomeado e com o órgão do Ministério
Público, se, findo o prazo, os citados não comparecerem”. Não o reproduziu o Código de 1973. No art. 231,
1, estatui-se que a citação se traz por edital quando desconhecido ou incerto o réu; e no art. 9, II, 2.~ parte,
que se dá curador especial ao réu revel, citado por edital. A citação por edital pode ocorrer noutras espécies
que a de ser incerto o citando, como se é desconhecido, tal como está no art. 231, 1, 1.~ parte, ou se é
ignorado, incerto ou inacessível o lugar em que se encontra (art. 231, II). No art. 9•O exige-se o curador
especial se o revel foi citado por edital ou com hora certa, bem como (art. 9~O, 1) ao incapaz que não tem
representante legal ou se os interesses desse colidirem com os daquele (e. g., o citando teve a sua habilitação
contestada por seu representante legal).
Nas comarcas em que há representante especial de incapazes ou de ausentes, compete-lhe a função de
curador especial (art. 9~O, parágrafo único).
4) FAZENDA PUBLICA. Discutia-se no direito anterior a 1939, se (a) a Fazenda Pública tinha o direito-
dever de promover a habilitação dos herdeiros dos devedores, ou (b) podia prosseguir na ação, independente
daquela, respondendo A. M. PERDIGÃO MALHEIRO (Manual, 1, 65, nota 273), com a invocação das
Ordenações Filipinas, Livro II, Título 52, §5, no sentido (b), porque a habilitação só serviria para retardar a
execução, mas exigia a citação, ad i~n.star do que ocorria nos arts. 747, 1, e 750 do Código de 1939 (hoje,
Código de 1973, arts. 1.060, 1, e 1.061) (note-se a equiparação).
O Decreto n. 19.885, de 29 de fevereiro de 1888, art. 41, foi além: dispensou a citação. Depois, o Decretolei
n. 960, de 17 de dezembro de 1938 (sobre dívidas da união), estatuiu que se prosseguisse e que o juiz, logo
que tivesse conhecimento da morte da parte, nomeasse curador à lide. Advirta-se, porém, que nessa nota só
se referia a causas fiscais (dívidas), e não a todas as causas em que a Fazenda Nacional era parte. Nessas, a
regra jurídica do art. 62 do Decreto-lei n. 960 infringiria o art. 141, § 1.0, da Constituição de 1946.
O Poder Legislativo não pode quebrar o principio de isonomia, porque, ai, os pressupostos do imperium
falhariam. O art. 153, § 1.0, da Constituição de 1967, com a Emenda n. 1, tem de ser obedecido.
5)PARTE COM PROCURADOR CONSTITUÍDO NA CAUSA. No art. 1.057, parágrafo único, apenas se
alude à ação de habilitação proposta pela parte, e pelos interessados na sucessão, em relação àquela, porque
pode ocorrer que os habilitantes ou os habilitandos já tenham procurador nos autos, o que nem sempre
acontece. Pense-se na ação de habilitação se autores ou réus da ação eram dois ou mais e os sucessores e
interessados são um dos autores ou um dos réus, ou mais. Por exemplo: falece A, na ação em que havia
outro ou outros autores, ou réus, e um deles ou alguns deles é que sucedem ao falecido. Aí, há procurador
constituído na causa e o art. 1.057, parágrafo único, incide. Se o sucessor ou os sucessores do falecido são os
autores da ação incidental de habilitação, de ordinário basta a citação do procurador na causa principal. O
que pode ocorrer é que na procuração excepcionalmente se diga que para qualquer ato relativo à mudança
dos figurantes seja preciso nova procuração. Aí, tem de ser pessoal a citação.
Art. 1 . 058. Findo o prazo da contestação 1), 4), observar-se-á o disposto nos arts. 802 e 8032) 3) 5).
1)PRAZO PARA A CONTESTAÇAO . O prazo para contestação é de cinco dias (art. 1.057), indicando-se
as provas que se pretende produzir. Conta-se o prazo da juntada aos autos do mandado de citação
devidamente cumprido. N~ sendo contestado o pedido, presumem-se aceitos pela outra parte, como
verdadeiros, os fatos alegados, caso em que o juiz tem de decidir dentro de cinco dias (art. 803). Sendo
contestado o pedido no prazo legal, o juiz designa a audiência de instrução e julgamento, havendo prova a
ser produzida (art. 803, parágrafo único). Tem de motivar a decisão, indicando as provas e as razões em que
se funde. Surge, aí, a questão das custas para a qual pode parecer haja solução satisfatória nos arts. 19-35. A
mesma perplexidade ocorria no direito anterior a 1939 e depois, por se tratar de interesses dos habilitados.
ALEXANDRE CAETANO GOMES (Manual Prático, 137) apenas cogitou da habilitação ativa, a que se
aplicaria, a seu parecer, a regra do atual art. 20. A habilitação incidente, que se não confunde com a
habilitação em inventário ou em arrecadação, supõe herdeiros do autor ou herdeiros do réu, ou outros
sucessores. a) Se é ativa, promovida pelos herdeiros do autor e procedente, as custas devem ser saldadas a
final pelo vencido na ação principal. Se promovida pelos herdeiros do réu, é justo que também o vencido na
causa principal as salde. Se improcedente, claro é que as custas do incidente correm por conta exclusiva do
perdente, que se dizia, sem o ser, herdeiro do autor ou do réu. b) Se passiva, promovida pelo autor ou pelo
réu, e procedente, não há razão para que não as salde, a final, o vencido na ação principal. Se improcedente
paga-as o perdente.
4)COM A CONTESTAÇÃO OU SEM ELA. Com a contestação, ou sem ela, incide o art. 1.058,
resolvendo-se, como, antes, o Código de 1939, art. 749, talvez sem que nisso pensassem os autores do
Código, sutil disputa do direito anterior. Em 1913, discutiu-se se, não tendo contestado o réu, a não-
contestação valia confissão, ou se não valia. Quer dizer:
(a) se seria de se aplicar o art. 319, ou (b), em vez desse, regra jurídica sobre confissão presumida. O
Supremo Tribunal Federal, a 12 de fevereiro de 1913 (R. de D, 32, 85), entendeu que a solução (b) era a
certa, confundindo, a grandes riscos, com a simples comunicação de conhecimento a comunicação de
conhecimento mesclada à manifestação de vontade, que é a confissão. O art. 803, a que remete o art. 1.058,
resolve, com acerto, a questão, no sentido da solução (a); aliás essa já era a opinião de PAULA BATISTA
Art. 1 . 059. Achando-se a causa no tribunal ‘), a habilitação processar-se-á perante o relator2) e será julgada
conforme o disposto no regimento interno 3)~
2) RELATOR. Se o relator estiver processando a habilitação e for apresentado o documento do art. 1.060,
II, ou a petição do art. 1.060, V, não prossegue na habilitação e deve mandar que se junte, por linha, se o
ordenar o Regimento Interno.
Pode dar-se que a parte faleça antes da remessa do recurso para o tribunal. Donde três soluções: ou (a) só se
tem por pendente o feito remetido, e então, morta a parte, tudo se passa no juízo inferior enquanto não se
remete; ou (b’j se tem por pendente o feito em que as partes já postularam o recurso, e tem de ser remetido,
ou (c) se há de considerar pendente desde a interposição do recurso. A solução (a) tem o inconveniente de
permitir que o juiz da inferior instância funcione em processo a tempo de ser remetido. A solução (c) teria o
de obrigar o tribunal a baixar os autos para atos restantes da interposição do recurso, inclusive para o
cumprimento do art. 507. A solução (b) é a verdadeira. As Ordenações Filipinas, Livro III, Título 27, § 2
(hoje, o art. 265, 1), Livro III, Titulo 82, pr., e § 2 (hoje, o art. 507), não resolviam a questão, nem no
fizeram os comentadores. A praxe firmou-se no sentido de (b) e deve ser seguida.
Art. 1 . 060. Proceder-se-á à habilitação nos autos da causa principal e independentemente de sentença
quando 1) 7) 8):
1 promovida pelo cônjuge e herdeiro~ necessários, desde que provem por documento o óbito do falecido e
a sua qualidade2);
II em outra causa, sentença passada em julgado houver atribuído ao habilitando ~i qualidade de herdeiro ou
sucessor3);
111 o herdeiro for incluído sem qualquer oposição no inventário4);
IV estiver declarada a ausência ou determinada a arrecadação da herança jacente 5);
V oferecidos os artigos de habilitação, a parte reconhecer a procedência do pedido e não houver oposição de
terceiros6).
2)HABILITAÇÃO ACIDENTAL DO CÔNJUGE. A habilitação acidental do cônjuge supóe que não haja
herdeiros antes do habilitando, necessários ou testamentários; a do herdeiro necessário somente precisa da
prova do parentesco. O óbito tem de ser provado, na habilitação ativa; prova-o o promovente, na habilitação
passiva.
No direito material, o cônjuge sobrevivente é herdeiro legítimo se o morto não deixou descendentes nem
ascendentes (Código Civil, art. 1.603, III). No art. 1.611 explicita-se:
“Em falta de descendentes e ascendentes será deferida ação de sucessão ao cônjuge sobrevivente se, ao
tempo da morte do outro, não estavam desquitados”. No § 1.0: “cônjuge viúvo, se o regime de bens do
casamento não era o da comunhão universal, terá direito, enquanto durar a viuvez, ao usufruto da quarta
parte dos bens do cônjuge falecido, se houver filhos deste ou do casal e à metade se não houver filhos,
embora sobrevivam ascendentes do de cujus”. No § 2.0: “Ao cônjuge sobrevivente, casado sob regime da
comunhão universal, enquanto viver e permanecer viúvo, será assegurado, sem prejuízo da participação que
lhe caiba na herança, o direito real de habilitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família,
desde que seja o único bem daquela natureza a inventariar”.
Em todos esses casos, o cônjuge tem de habilitar-se com a prova documental do óbito do falecido e a sua
qualidade. Não se precisa de sentença (art. 1.060, 1).
A espécie do art. 1.060, II, é de outra causa que a da ação de habilitação. O que se exige é que a sentença,
em tal ação, haja transitado em julgado e que no seu conteúdo esteja afirmada a qualidade de herdeiro ou de
sucessor entre vivos. Tem-se de exigir que a res iudicata tenha em si a eficácia declarativa dos dados quanto
à morte da pessoa e se atribua ao habilitando a qualidade de herdeiro ou sucessor.
(Note-se bem: não é necessária a sentença de habilitação; seria plus, e non nocet. Apenas se encurtou o
processo, metendo-se na ação principal o rápido acidente, mas habilitação acidental há. De modo que é
impróprio ler-se o art. 1.060 como se houvesse dito: “É dispensada a habilitação...,,>
3)COISA JULGADA MATERIAL DE ALGUMA SENTENÇA. O .art. 1.060, II, é simples regra jurídica
de respeito à coisa julgada material de outra sentença; e refere-se a qualquer herdeiro, legitimo ou
testamentário.
6)PRESSUPOSTOs DO RECONHECIMENTO. Reg. n. 737, art. 405; Código de Processo do Rio Grande
do Sul, art. 818; da Bahia, art. 1.037; do Maranhão, art. 791; do Rio de Janeiro, art. 1.770, § 3~O~ A
jurisprudência firmara que, aí, o simples “nada tenho a opor”, isto é, a afirmação do art. 209 do Código de
1939 bastava para se compor a confissão. Tanto no direito anterior quanto no direito de 1939 (art. 230, §
2.0), seria perigoso, por falso, generalizar-se tal confusão entre a comunicação de conhecimento, desprovida
de manifestação de vontade, e a confissão, que contém esse elemento a mais e tem efeitos que transcendem
os da não-refutação dos simples enunciados de fato, com as conseqUências da mais limitada retratabilidade.
A questão estava ligada à outra, que discutimos, nos Comentários ao Código de 1939, a respeito da
confissão em geral: se o “não se opor” ou o “não querer discutir” envolve realmente confissão, e quando
envolve. Assim,a proposição “quem diz não se opor confessa expressamente” (Supremo Tribunal Federal, 8
de agosto de 1915, D. O. de 14 de novembro de 1917, 11908) não pode ser tida como a priori. O juiz teria de
verificar se houve, realmente, “confissão”. Em todo caso, não poderia a confissão incidental ter o efeito do
art. 747, III, do Código de 1939, porque, contestada a habilitação ou não contestada, se teria de julgar (art.
749). Portanto, para efeito do art. 747, III, era preciso que a parte contrária tivesse sido chamada a depor
(arts. 229 e 230) e confessasse em petição, ou tivesse confessado espontaneamente (art. 230, § 2.0). Se era
chamada a depor, e depunha, julgava-se a habilitação, porque o art. 747, III, distingui-la. Quem depusesse
fora da petição, na instrução, queria que se julgasse a habilitação. Obsoleto o acórdão do Supremo Tribunal
Federal, a 12 de novembro de 1913 (R. de R., 32, 85).
Tudo isso que exprobramos pela confusão entre comunicação de conhecimento e confissão passou, porque o
texto de 1973, no art. 1.060, V, foi claríssimo: quando não se precisar de sentença se “oferecidos os artigos
de habilitação, a parte reconhecer a procedência do pedido e não houver oposição de terceiros”. Sempre que
há erro de terminologia, as dificuldades surgem, razão para que, em leis como em textos de ciência, se tem
de evitar qualquer expressão que não corresponde com o conceito a que se alude.
Não se diga que o art. 1.060 dispensa a figura do juízo, ou decisão, nem que não haja ação de habilitação
acidental. A petição do habilitando tem de satisfazer todos os requisitos que a lei exige, pois que se trata de
petição inicial (art. 282). Portanto, entre outros, o juízo ou tribunal a que é dirigida, os nomes, prenomes,
estado civil, profissão, domicílio e residência do habilitando e da outra ou das outras partes, o fato e os
fundamentos jurídicos do pedido, cujas especificações tém de conter as provas e a citação. A relação
jurídica processual estabelece-se com a angularização . Se o juízo verifica que não foram atendidos os arts.
282 e 283, determina que o habilitando emende ou complete a petição, no prazo de dez dias (art. 284). A
petição será indeferida se ocorre algum dos casos do art. 295, decisão de que cabe recurso (art. 296). Nas
espécies do art. 1.060, ou há despacho de deferimento, com manifestação reconhecente da parte contrária,
ou, nas espécies do art. 1.060, 1-1V, com o simples advento do que se aponta em tais incisos.
No art. 1.060, V, fala-se do oferecimento de artigos de habilitação, a que se reconhece a procedência do
pedido e não há oposição de terceiro: “oferecidos os artigos de habilitação, a parte reconhecer a procedência
do pedido e não houver oposição de terceiro”. A expressão “reconhecer” é a adequada. No Regimento
Interno do Supremo Tribunal Federal (18 de junho de 1970), o art. 272 já dizia: “Não dependerá de decisão
do relator o pedido de habilitação: 1 do cônjuge, herdeiro necessário, ou legatário, que provem, por
documento, sua qualidade e o óbito do de cujus, e promovam a citação dos interessados para a renovação da
instância; II fundado em sentença, com trânsito em julgado, que atribua ao requerente a qualidade de
meeiro, herdeiro necessário ou legatário; III quando confessado ou não impugnado pela outra parte o
parentesco e não houver oposição de terceiro”. No Código de 1939, art. 747, III, estava o erro de falar de
“confessar”, em vez de “reconhecer”. O Código de 1973 corrigiu-o. Infelizmente, ainda juizes e escritores
estão a confundir “reconhecer” com “confessar”. Pode ser que alguém confesse que deu causa à gestação de
alguém, ou que alguém confesse que uma pessoa foi do seu útero. Não é disso que se cogita no art. 1.060, V.
Devemos ter o máximo cuidado no emprego das palavras, quer de direito quer de outra ciência. A confissão
pode ser meio de prova (EDLER SCHRUTKA VON RECHTENSTAMM, (Grundriss des
Zivilprozessrechts, 194; RUDOLF PoLLAK, System cles ôsterreichischen Zivilprozessrechts, 643; mesmo
se confissão extrajudicial, ANDREAS VON ThuE,Der Alígemeine Teu, III, 249, nota 9, embora seja ato
jurídico stricto sensu). Porém, no art. 1.060, V, o que acontece é reconhecimento, e não confissão. No
Código de 1939, art. 747, 1, também se falou de “renovação da instância”, o que exprobráramos, e o Código
de 1973, corrigiu. Com a entrada do sucessor não se renova processo, nem inst&ncia; o que ocorre é a
inclusão de quem juridicamente devia estar incluso. Daí a declaratividade da habilitação, dependente ou
independente de sentença.
7)RÉU REVEL E HERDEIRO QUE AINDA NÃO ACEITOU A HERANÇA. Se o réu ou um dos réus é
revel e foi citado na qualidade de herdeiro de alguém, mas se desinteressou do pleito, por não ter aceito a
herança, surge a questão de se saber qual seja a eficácia da sentença, e. g., de condenação, quanto a ele. A
conduta de tal herdeiro foi, pelo menos, equivoca. Tem de ser examinada no piano processual e não no
plano do direito material. Ainda não renunciara, por escritura pública, ou termo judicial (Código Civil, art.
1.581), de modo que ainda poderia, durante o processo, e ainda pode, depois da sentença, renunciar à
herança. A Corte de Apelação de Messina (Itália), a 15 de março de 1934 (Rivista di Diritto Processuale
Civile, 12, Parte II, 54-59), decidiu que a sentença passou em julgado, portanto não se pode mais discutir a
renúncia superveniente (F. DEGNI, Effetti di sentenza contumaciale, Rivista, 10, Parte II, 285-295; Ancora
degli effeti, Rivista, 12, Parte II, 54-59).
No direito brasileiro, o interessado em que o herdeiro aceite, ou não, a herança pode requerer ao juiz que
marque o “prazo razoável” para dentro dele pronunciar-se o herdeiro, sob pena de se haver a herança por
aceita (Código Civil, art. 1.584). Se o não fez concomitantemente com a propositura da ação, ou a tempo,
expõe-se a que o herdeiro renuncie. Quanto a ele, se o prazo razoável não correu, a sentença condenatória
ou outra não tem eficácia.
8)DISSOLUÇÃO E LIQUIDAÇÃO DAS SOCIEDADES. Foi dito que a habilitação de herdeiros nos
processos dos arts. 655-674 do Código de 1939 (dissolução e liquidação das sociedades) tinha a mesma
natureza que a habilitação dos arts. 480, 572 e 584 do Código de 1939, e não a de habilitação acidental, de
modo que seria de aplicar-se ao seu processo o art. 480 (despacho de A. J. MACEDO SOARES, O D., 47,
252). Com razão: como em inventário e na arrecadação , a morte é causa da ação; mas, em se tratando de
dissolução e liquidação das sociedades, a morte (necessariamente posterior) da parte não é causa, e sim
acidente do curso do processo, puro acidente. A habilitação é, então, acidental.
Há algo de inventário e partilha nas dissoluções de sociedade por morte do sócio; mas a morte do sucessor
do morto ou a morte do sócio que vivia ao tempo da dissolução da sociedade é caso de habilitação acidental.
Art. 1 . 061. Falecendo o alienante’) ou o cedente 2), poderá o adquirente ou o cessionório prosseguir 3) na
causa juntando aos autos o respectivo título e provando a sua identidade4).
1)ADQUIRENTE E CESSIONARIO . O art. 1.061, como o art. 750 do Código de 1939, como o Reg. n.
737, art. 409, e como o Código Civil, arts. 1.065 e 1.069, na esteira da doutrina luso-brasileira que rompera
com o romanismo do acordo entre cedente e devedor, equipara, processualmente, o sucessor a título
particular ao sucessor a título universal do art. 1.060, 1. O sucessor universal inter vivos também se inclui na
expressão “cessionário” do art. 1.061 (Supremo Tribunal Federal, 2 de outubro de 1915, caso Braz-
Camurano versus Borlido Munis).
Na doutrina anterior, errados, quanto à cessão, J. J. C. PEREIRA E SOUSA (Primeiras Linhas, 1, 73),
PAULA BATISTA (Teoria e Prática, 3.a ed., 120) e TEIXEIRA DE FREITAS (Primeiras Linhas, 1, 117).
A solução, a respeito do cessionário e do sub-rogado, é velha, no direito luso-brasileiro, de mais de três
séculos, no que os processualistas portugueses, já, pelo menos, desde o começo do século XVII (MANUEL
MENDES DE CAsTRo, Practica Lusitana, 1, 96, cita decisão do Senado, sem dizer a data, que tem de ser
anterior a 1619), tiraram a palma aos civilistas. A regra jurídica, hoje inserta no art. 1.061, já se entendia
para os processos executivos.
4)ALUSÃO PELO JUIZ. O juiz somente deve referir-se ao cessionário, ou ao adquirente, se esse entrou na
relação jurídica processual. Se alude a ele, é porque algum conhecimento teve, pelos autos, de que, no plano
do direito material, se deu a sucessão; porém nem a falta de tal alusão, nem a sua aparição na sentença têm
qualquer relevância processual, ou qualquer eficácia de coisa julgada entre a parte sucedida e o seu sucessor.
Tudo muda se esse sucessor entra na relação jurídica processual, porque então se corta o tempo em dois
pedaços, um dos quais é aquele em que é parte o sucessor. Ou o sucessor segundo o direito material se
habilita como sucessor de direito processual, e é a isso que se refere toda habilitação acidental; ou o sucessor
acede como litisconsorte, ao lado do alienante ou cedente (art. 46). Se o sucessor entra na relação jurídica
processual, o alienante está posto fora como parte, embora ele possa continuar pela acessão, invocando, por
exemplo, o art. 54. Não é de excluir-se a deliberação do sucessor processual de chamar à autoria o alienante
a que sucedera, se nos três dias a que se refere o art. 71. Fora desse prazo, tem ele, ao apresentar-se, de
deixar bem claro que não quer processualmente suceder, mas apenas litisconsorciar-se. A transformação do
litisconsórcio em sucessão é possível; a da sucessão em litisconsórcio depende do prazo do art. 71.
Não se tendo dado sucessão processual, nem litisconsórcio do sucessor, a outra parte não pode invocar o
direito processual para quaisquer situações suas. Só o direito material pode resolver; e esse direito dirá se a
outra parte, e. g., o cedido, se libera, satisfazendo o cessionário. Não há, aí, problemas de direito processual.
A exceção de liberação, como é, entre outras, a de pagamento, faz parte do direito material, e é, sempre,
exceção de direito material, com todas as suas conseqüências .
Art. 1 . 062. Passada em julgado a sentença de habilitação 1), ou admitida a habilitação nos casos em que
independer de sentença, a causa principal retomará 2) o seu curso.
A ação de habilitação acidental é ação declarativa, como a de habilitação de herdeiros em ação de inventário
e partilha. Também a ação em que se afirma ou nega a existência de relação jurídica de divida é ação
declarativa. Isso não impede que ações constitutivas negativas tenham sentenças favoráveis que decretem a
nulidade desse negócio jurídico ou desse ato jurídico, de que resultou a relação declarada, ou sentenças
favoráveis que decretem a nulidade do testamento, de que proveio a qualidade declarada de herdeiro, ou a
nulidade do casamento de quem o invocou para a assunção do processo, ou a falsidade do registro de
nascimento ou de óbito. A eficácia de coisa julgada material não é obstáculo à eficácia de sentença
constitutiva que desconstitua a relação de direito que se declarou.
Em todo caso, quem, por exemplo, se deixa ficar em relação jurídica processual, de que não é mais um dos
termos, ou que, sem ter sucedido ou substituído a alguém, parte no processo, se faz passar como parte, em
sucessão ou substituição, acarreta com a eficácia da sentença que contra si for proferida. Se ganhou, a parte
contrária não pode exonerar-se, cumprindo a sentença, perante outrem, que deveria ter sido a parte.
Quando as sentenças declarativas, ou de efeito declarativo, declaram a existência ou inexistência de alguma
relação jurídica, não a declaram imune à eficácia constitutiva negativa de outra sentença. Até aí não chega a
força sentencial ou o efeito de coisa julgada material.
2)RETOMADA DO CURSO. Trânsita em julgado a sentença de habilitação, ou admitida nos casos em que
independe de sentença, recomeça o curso do processo. Dá-se o mesmo se a sentença ou acórdão foi
desfavorável a quem pedir habilitação.
No Código de 1973, o art. 265, § 1.~, estatui-se que, no caso de morte ou de perda da capacidade processual
de qualquer das partes, ou de seu representante legal, provado o falecimento ou a incapacidade, se suspende
o processo, salvo se já se tiver “iniciado” a audiência de instrução e julgamento.
No Código de 1939, art. 199, só tinha eficácia qualquer ato processual que fosse após a suspensão da
instância, mas o juiz proferia a sentença quando a causa da suspensão fossedenunciada depois da audiência
de instrução e julgamento.
CAPITULO XII
3)AçÃo DE RESTAURAÇÃO DE AUTOS. A ação de reforma ou restauração de autos vem dos textos
reinícolas (Ordenações Filipinas, Livro 1, Título 24, §§ 24-26), só relativos aos casos em que era
responsável o escrivão, mas lidos tomo caso da espécie “perda ou deterioração de autos”. O processo é exten
sivo às perdas e extravios de autos extrajudiciais, mas regidos pelo direito judiciário, e. g., as escrituras
públicos (livros dos tabeliães ); outrora, segundo as Ordenações Filipinas, Livro III, Título 60, § 6, e hoje,
por interpretação dos arts. 1.063-1.069.
Nas Ordenações Filipinas, Livro III, Título 60, § 6, 2Y parte, dizia-se “... E se acontecer que a dita Nota seja
perdida, e quiser o autor provar por testemunhas, como o instrumento foi notado, e a dita Nota e instrumento
perdidos, sera recebido e ouvido, com a parte, a que pertencer”. Aliás, já assim era nas Ordenações
Afonsinas, Livro III, Titulo 65, § 5, 2.~ parte, e bem assim nas Ordenações Manuelinas, Livro III, Título 46,
§ 6, 2.~- parte. Cumpre, porém, distinguir-se do processo da restauração ou reforma a instrução de algum
processo em que se postulou ter sido perdida ou destruída a Nota, isto é, o livro de notas ou alguma nota do
livro. Ali, o processo é autônomo. Veja nota ao art. 1.067.
O art. 1.063 apenas se refere às partes, mas havemos de entender que vai além o interesse (e. g., Ministério
Público, terceiro embargante), o que dilata a legitimação ativa.
Os autos mostram. como se irradiou a relação jurídica processual e tudo que se passou no processo, uma vez
que dos autos se fez constar. ~ verdade que o que nele não estava não era ato do processo que pudesse ser
restaurado; mas pode acontecer que alguma parte ou interessado tenha prova bastante do que ocorrera, e
então há a restauração dos autos e a inserção do que neles tinha de estar e não estava.
Os autos permanecem em cartório, guardados pelo escrivão e a lei apenas permite que saiam do cartório
quando tenham de subir ao juiz, ou com vista aos procuradores, ao Ministério Público, ou remetidos ao
contador ou ao partidor, ou, em caso de ‘modificação de competência, a outro juízo (art. 141, IV). O art.
1.069 atende à possibilidade de tais ocorrências de responsabilidade.
Pergunta-se: ~.pode o juiz, de ofício, determinar que se restaurem os autos? Imaginemos que o juiz levou os
autos e eles desapareceram do lugar em que trabalha em casa, ou mesmo do automóvel em que o levava. Tal
juiz responde pelas custas da restauração e pode, até, ser responsabilizado civil e penalmente (art. 1.069).
Seria absurdo que, diante disso, ele, que teria de responder pelas custas e honorários do advogado de algum
autor da ação de restauração de autos, não pudesse, por ato seu, propor a ação de restauração. Não se poderia
negar a pretensão à restauração dos autos se lhe cabe, de ofício, determinar as provas necessárias à instrução
do processo (art. 130). O juiz responde por perdas e danos se recusa, omite ou retarda, sem justo motivo,
providência que deva ordenar de ofício, ou a requerimento da parte (art. 133, II). Pode a parte, por
intermédio do escrivão, requerer ao juiz a restauração dos autos e, se ele não o atender dentro de dez dias,
configura-se a espécie do art. 133, II (cf. art. 133, parágrafo único). Tem ele, então, de propor a ação de
restauração perante quem o tinha de substituir.
As partes podem ter acordado, secretamente ou não, que o processo fique parado, por mais de um ano, para
que se produza a extinção (art. 267, II). O juiz, para que isso aconteça, tem de ordenar a intimação da parte
ou das partes, para que, no prazo de quarenta e oito horas, se supra a falta. Nem sempre a intimação tem de
ser de uma só parte, a despeito dos termos do art. 267, § 1.0. Se o acordo das partes foi expresso e explícito,
o que na verdade acontece é que houve desistência do autor em negócio jurídico bilateral, como se daria
com a convenção de se suspender o processo (art. 265, II). Outro problema. O art. 1.063 só se refere à parte
(qualquer das partes) e já demos a necessária interpretação. Mas, se o desaparecimento dos autos derivou de
falta ou de ato do escrivão, de outro serventuário, ou do órgão do Ministério Público ou da Fazenda Pública,
apode o responsável ou o que apenas foi vítima de furto, roubo ou assalto, propor a ação
de restauração dos autos? Não seria razoável que esses interessados (que podem ser responsabilizados,
conforme o art. 1.069) apenas pudessem comunicar ao juiz o que ocorreu e a libito desse ficasse a intimação
das partes, aguardando que providenciem ou alguma providencie. Essa é urna das soluções, porém não se há
de negar a quem pode ser responsabilizado o direito, a pretensão e a ação de restauração. Se alguma das
partes ou outro interessado faleceu, com a habilitação dos sucessores foram declarados o seu direito, a
pretensão e a ação para a restauração.
Se alguém é intimado para tomar a providência da ação de restauração dos autos, pois que se lhe atribui a
responsabilidade, pode alegar e provar que os autos não estavam com ele. É o que acontece com o juiz, a
que não foram remetidos os autos, ou com procuradores ou órgãos do Ministério Público ou da Fazenda
Pública.
Art. 1 . 063. Verificado o desaparecimento’) dos autos, pode qualquer das partes promover-lhes a
restauração.
Parágrafo único. Havendo autos suplementares 2), nestes prosseguirá o processo.
2)AUTOS SUPLEMENTARES. Se existem autos suplementares (art. 159 e §§ 1.0 e 2.0), a falta dos autos
originais não constitui pressuposto para a pretensão à restauração dos autos, tal a verdadeira construção
jurídica cio art. 1.063, parágrafo único. Os autos originais e os suplementares igualmente encorpam o
processo, de modo que a perda daqueles não põe o processo em situação de seqüência de l3ensamentos sem
escrita. Isso não significa que, havendo autos suplementares, não haja interesse e pretensão a que se
reproduzam, prevenindo-se, assim, desaparição futura. Passemos ao assunto. Como a reprodução dos autos é
fato material, qualquer pessoa, que tenha interesse, pode pedir certidão de todo um processo (reprodução-
multiplicação dos autos). Tal certidão se distingue dos autos originais e dos autos restaurados em que o seu
momento é somente à data em. que o escrivão terminou a última página da certidão completa dos autos até
aU, portando-o por fé e assinando-a. Se algum ato sobrevém, tem de ser certificado à parte, e entende-se que
é à parte, ainda, que o escrivão dê a certidão em seguimento à outra e se refira à ligação sem intervalo, entre
as duas. As certidões, em tais casos, falta impulso vital, dinamismo. Distinguem-se dos autos suplementares,
ainda quando seguidas e feitas à medida que os autos originais crescem, porque, nos autos suplementares, a
reprodução se processa mecanicamente, ao passo que a cada certidão dos autos, para a reprodução material
por certidão, intervém comunicação de fatos, e tudo se passa como superposição temporal de certidões,
entremeada de comunicações de vontade.
Se os autos estão findos e o interessado pede certidão do todo, não há aquela superposição, e parecem-se,
enormemente, a certidão do todo e os autos suplementares. Mas, ainda aí, os autos suplementares e a
certidão são inconfundíveis:aqueles têm história; essa não tem; aqueles, na falta dos outros, vão servir a
pedidos de certidão, essa somente a públicas-formas; aqueles são “autos”, para qualquer ato ou diligência de
ação posterior (e. g., ação rescisória ou de má-fé em ato de direito processual), essa é apenas “certidão do
inteiro teor”. Para se transformar tal certidão em. corpo do processo, em “autos”, é preciso que se proponha
a ação de restauração de autos dos arts. 1.063-1.069, com sentença que tome tal certidão como afirmação e
prova (art. 1.064), ou somente como afirmação (arts. 332, 333 e 319) e parte da prova, devendo-se apurar se
havia algo mais. A sentença é que faria autos o que era certidão, prova testemunhal, cópia, perícia etc.
No Código de 1939, art. 776, dizia-se, sucintamente, que a reforma de autos perdidos somente se admitiria
quando faltassem os autos suplementares. Foi isso o que se pôs no art. 1.063, parágrafo único; mas,
acertadamente, se referiu antes (art. 1.063) ao direito à pretensão e ação de qualquer das partes para a
restauração. “Partes” está aí em sentido larguíssimo, porque, além das pessoas que têm inserção no
processo, não se pode negar que possa pedir a restauração terceiro que prove o seu interesse na restauração
dos autos. O que se lhe há de exigir é que na petição inicial satisfaça o que o art. 1.064 aponta como
pressupostos. Pense-se no credor do réu ou do autor que, embora terceiro, estaria prejudicado com a
desaparição dos autos. Se a sentença ainda não fora proferida, pode o terceiro que tem interesse em assistir
(arts. 50-55), ou oferecer oposição (arts. 56-61), pedir a restauração dos autos. Também o devedor em que o
fiador fora o réu (chamamento ao processo, art. 77, 1), ou outro fiador se para a ação Só foi citado um deles,
ou só foram citados alguns (art. 77, II). Também pode acontecer se a ação foi contra algum ou alguns
devedores solidários apenas da parte da dívida comum (art. 77, III), pois é de interesse do devedor, que não
foi acionado, conhecer o que constava dos autos, bem como de terceiro que foi apontado como devedor
solidário sem o ser.
Nas ações em que foram partes pessoas que tinham de promover litisdenunciação dá-se o mesmo.
Quanto aos sucessores da parte que morreu, ou do cônjuge de uma das partes, que têm em andamento
desquite litigioso ou amigável, ou mesmo se desistem do regime de bens do casamento, ou de possível
prejuízo, alegam e provam o seu interesse.
Art. 1 . 064. Na petição inicial’) declarará a parte o estado da causa 5) ao tempo do desaparecimento dos
autos, oferecendo:
1 certidões dos atos constantes do protocolo de audiências do cartório por onde haja corrido o processo2);
II cópia dos requerimentos que dirigiu ao juiz3);
III quaisquer outros documentos que facilitem a restauração4).
Art. 1 . 065. A parte contrária será citada 6) para contestar o pedido no prazo de cinco (5) dias, cabendo-lhe
exibir as cópias, contrafés e mais reproduções dos atos e documentos que estiverem em seu poder.
§ 1.0 Se a parte concordar7) com a restauração, lavrar-se-á o respectivo auto que, assinado pelas partes e
homologado pelo juiz, suprirá o processo desaparecido.
§ 29 Se a parte não contestar8) ou se a concordância for parcial), observar-se-á o disposto no art. 803.
1) PETIÇÃO INIcIAL. Trata-se de ação de restauração de autos, que há de começar por petição, e o Código
tem-na como processo acessório ao da ação do processo perdido ou destruído, acessório regerador. No
velho direito, pouco mais se possuia sobre tal ação e processo que algumas linhas de MANUEL MENDES
DE CASTRO (Practica Lusitana, 1, 42 e 43) os arts. 810 e 811 da Consolidação de ANTÔNIO JOAQUIM
RIBAS e algumas regras dos Códigos de Processo Civil locais de que vieram os arts. 777-781 do Código de
1939 e, hoje, os arts. 1.063-1.069 do Código de 1973. O Assento de 23 de maio de 1758, supondo, aliás, a
prática de tais ações, distinguiu o caso da reforma antes de haver sentença definitiva, devendo haver
apelação, e o de não a ter havido, sendo de agravo o recurso. Hoje, a distinção é posta de lado; mas há outras
questões que examinaremos em nota ao art. 1.067.
Na petição inicial, a parte, ou o Ministério Público, ou quem tenha interesse suficiente para isso, há de
comunicar qual a causa e o tempo da desaparição. Pode ser, por exemplo, que o terceiro embargante, ou o
terceiro recorrente, ou o Ministério Público, alegue que foi a parte que os subtraiu ou destruiu.
2)ELEMENTOS DOCUMENTAIS. Além da certidão dos termos e das notas constantes do protocolo das
audiências e dos livros dos registros do cartório, por onde haja ocorrido o processo, pode a parte juntar,
desde logo, as certidões que tenha de outras peças do processo. No caso de certidões de todo o processado
até então, a sua afirmação e a prova ganham em valor e extensão.
Na ação de restauração de autos, pode acontecer que nem todos os atos se possam restaurar. Mas, por
exemplo, já se proferiu a sentença com eficácia executiva, tal título basta. Para se restaurarem os autos
concorrem as certidões que algumas das partes tinham ou mesmo terceira pessoa, bem como as certidões de
atos processuais constantes de livros do cartório, escrituras públicas e particulares, documentos particulares
com registro ou não, contrafés, livros comerciais ou de sociedades ou fundações em geral, fotocópias
autenticadas.
3)CÓPIA DOS REQUERIMENTOS FEITOS AO JUIZ. Uma vez que alguns dados necessários para a
restauração dos autos dependem de requerimento ao juiz, o autor da ação de restauração tem de oferecer,
com a petição inicial, cópia de requerimento, ou cópias dos requerimentos dirigidos ao juiz.
Basta a cópia, ou bastam as cópias, desde que assinadas pelo autor da ação que assinou o requerimento ou
fotocópias autenticadas. Convém que desde logo informe quanto ao acolhimento ou indeferimento do que
requereu.
4)DOCUMENTOS ÚTEIS A RESTAURAÇÃO. Alguns documentos podem não ser necessários, mas
apenas úteis. O art. 1.064, III, fala de quaisquer outros documentos, mas havemos de entender que se trata
de documento ou de qualquer informe que sirva à ação restaurativa. Pode ser simples carta ou telegrama de
pessoa que esteve no procedimento.
Não se alude ao que comunicou o responsável pelo desaparecimento, mas é conveniente que se inclua na
narração, mesmo porque não se pode negar a essa pessoa interesse jurídico. Tal pessoa pode mesmo intervir
no processo, porque não só assiste a uma das partes mas às duas ou mais (art. 50-55).
5) “STATUS cAUSAE”. A parte tem de comunicar qual a data última em que se produziu ato do processo,
o que se não confunde com a data em que foi destruido ou se perderam os autos. A indicação da data última
em que se produziu algum ato processual, qualquer que seja, e a narração do que ocorreu até então, de modo
a caracterizar em que ponto se achava o processo, são a comunicação do “estado da causa”, a que se refere o
art. 1.064. Comunicação, essa, de conhecimento (arts. 333 e 319). Status causae.
6)CITAÇÃO. A citação obedece aos princípios gerais e faz-se conforme as circunstâncias do momento, e
não as do tempo em que foram citadas as partes do processo desaparecido ou destruído. É possível mesmo
que não as tenha havido, se o autor da ação de restauração de autos foi réu na outra.
7)CONcORDÂNCIA DA OUTRA PARTE. Outra parte ou outras partes, porque pode o autor da ação de
restauração de autos ser uma das pessoas que eram autores ou réus da ação cujos autos desapareceram.
Diante de tal atitude, têm-se os autos como restaurados e para isto é suficiente o auto assinado pelas partes e
homologado pelo juiz.
8)NEGAÇÃO PELA OUTRA PARTE. O Código supõe o caso vulgar, o quod plerum que fit, de ter sido o
processo instruído com as sós certidões dos termos e notas, constantes do protocolo das audiências e dos
livros do registro do cartório, mais as afirmações do autor. Naturalmente, aquelas certidões prescindem da
“concordância” (aliás não-impugnação, não-negação) do réu. O que dela precisa é a comunicação de
conhecimento, abrangente de tudo que seria o processo, além do que consta das certidões juntas. Se o autor
não fez qualquer comunicação de conhecimento, que fosse a mais do que consta das certidões, a negação do
réu teria de ser contra essas certidões, segundo os princípios, e o processo de restauração de autos é lugar
impróprio para essa questão prejudicial sobre a falsidade do documento. Processar-se-á o incidente de
falsidade (arts. 390-399). Vencido o réu, a reforma tem de ser julgada, porque a negação caiu no vácuo.
Lê-se no art. 803 do Código: “Não sendo contestado o pedido presumir-se-ão aceitos pelo requerido, como
verdadeiros, os fatos alegados pelo requerente (arts. 285 e 319); caso em que o juiz decidirá dentro em cinco
(5) dias”.
Art. 1 . 066. Se o desaparecimento dos autos tiver ocorrido depois da produção das provas em audiência, o
juiz mandará repeti-Ias1).
§ 1.0 Serão reinquiridas as mesmas testemunhas; mas se estas tiverem falecido ou se acharem
impossibilitadas de depor e não houver meio de comprovar de outra forma o depoimento, poderão ser
substituidas 2)•
§ 2.0 Não havendo certidão ou cópia do laudo, far-se-á nova perícia, sempre que for possível e de
preferência pelo mesmo perito 3)•
§ 39 Não havendo certidão de documentos, estes serão reconstituídos mediante cópias e, na falta, pelos
meios ordinários de prova4).
§ 40 Os serventuários e auxiliares da justiça não podem eximir-se de depor como testemunhas a respeito de
atos que tenham praticado ou assistido 5)•
§ 5•0 Se o juiz houver proferido sentença da qual possua cópia, esta será junta aos
autos e terá a mesma autoridade da original6) 7)~
3)LAUDO PERICIAL. Do laudo de perícia pode haver certidão ou cópia. Quer se trate de exame, ou de
vistoria, de avaliação, por ter havido necessidade de conhecimento especial de técnico, o juiz nomeia o
perito, sobre o qual se manisfestam as partes, que apresentam os quesitos. Na ação de restauração dos autos
pode ocorrer que não haja certidão nem cópia do laudo, nem mesmo cópia dos quesitos apresentados. Se há
cópia autenticada dos quesitos, não se pode alterar o que fora apresentado (art. 420, parágrafo único, II).
Sobre eles têm de se manifestar as partes e interessados, para que se proceda à pericia. Se não há cópia
autenticada dos quesitos, têm de ser apresentados para que sejam admitidos e o juiz tem a função do art.
426, 1 e II. Tudo tem de obedecer à lei (arts. 420-439), inclusive no tocante ao assistente técnico ou aos
assistentes técnicos.
4) OUTROS MEIOS DE PROVA. Os outros meios de prova, e todos os meios não-documentais, têm de
limitar-se à prova da existência das peças dos autos; não assim os documentos multiplicativos (e. g., arts.
383-385 e 366). Memoriais dos advogados, de que constem peças, máxime se concordantes, são boa prova.
O juiz tanto pode, de ofício ou a requerimento, inspecionar as pessoas ou coisas, a fim de se esclarecer sobre
fato que interessa à decisão da ação da restauração dos autos, como para verificar se o que se tem como
restaurado foi ou podia ser o que constava da ação cujos autos desapareceram (cf. arts. 440-443).
5) DEPOIMENTOS DOS QUE SERVIRAM NO PROCESSO. Como se trata de recompor o processo em
que os oficiais de justiça, peritos e depositários tomaram parte, ou assistiram, eles, autores no processo,
depõem, como espectadores, na restauração dos autos, pela circunstância de se ter tornado passado o
próprio ato. As suas comunicações de conhecimento são, nesse caso, comunicações de conhecimento sobre
a citação, a notificação, a intimação, a perícia, e não comunicações de conhecimento constantes e
formadoras do laudo. N~ há, a fortiori, declaração de vontade do depositário ou
comunicações do depósito, e sim comunicação sobre se ter decretado ou ter sido feito o depósito. Aliás, o
depoimento dessas pessoas pode não ser sobre o fato próprio, ser sobre o que assistiram. Nesse caso, são
testemunhas sobre o processo cujos autos foram destruídos ou desaparecidos, testemunhas do processo da
restauração, que não foram testemunhas do processo cujos autos se restauram.
6)COPIA DA SENTENÇA. A cópia da sentença, que o juiz possui, há de ser junta aos autos e tem a mesma
“autoridade” (força e efeito) do original. Ela é junta para prova Todavia, prevalece a sentença original, se os
autos ou parte dos autos, em que ela está, aparecem.
7)ESPÉcIEs EM QUE TINHA HAVIDO RECURSO. No caso de ainda ter de haver recurso, a regra é sem
dificuldades; no de ter havido recurso, que reformou totalmente a sentença, o valor prático da sentença é
apenas histórico; no de ter sido apenas confirmada, as questões surgem. a) A sentença de superior instância
confirmou-a, reproduzindo-a na decisão (mérito): a autoridade da sentença de primeira instância, se o juiz
tem cópia e é diferente, cede ante o texto da instância superior, ainda que outra a cópia, pois “juiz”, no ari.
1.066, § 5~0, é qualquer juiz, singular ou coletivo (desde que a cópia seja assinada pelos que constam. da
publicação ou outra prova dos votantes no julgamento). b) A sentença de superior instância reformou-a em
parte: tem de ceder em tudo que a decisão da superior instância se atribua. A presunção derivada da eficácia
da cópia, que tem o juiz, não é absoluta, embora legal. É possível prova contrária.
Enquanto não se faz essa prova, a sentença é suscetível de força e efeitos (autoridade). Por exemplo,
invocando-a pode ser pedida a execução provisória (arts. 587, 2.~ parte, e 588), ainda que pendente a
restauração dos autos. Se há prova de ter passado em julgado, tem força de coisa formal.
Se sentença mandamental cujo mandado se cumpre a despeito de recurso, cumpre-se por sua força.
A cópia pode ser fornecida pelo juiz que passou a certo juízo, instância ou tribunal, ou pela pessoa que
deixou de ser juiz, salvo se incurso em incapacidade física ou moral para volver a sê-lo.
Se a sentença é de tribunal coletivo, a cópia, que tem o relator, pode ter a autoridade que se lhe confere; mas,
se algum dos votantes impugna a cópia, tudo se passa como a respeito das presunções de direito que
admitem prova em contrário. Depois da sentença de restauração trânsita em julgado, essa discussão não é
mais possível.
Em todo caso, pode ocorrer ação rescisória da sentença na ação de restauração dos autos.
Volvamos a um dos problemas anteriores. Houve a confirmação da sentença, no juízo recursal, mas as duas
cópias mostram que, a despeito de se não ter dado voto de reforma, a respeito de qualquer ponto, há
contradição em algum ou alguns pontos. O juiz da ação de restauração de autos tem de atender ao verdadeiro
conteúdo da decisão recursal: ou o erro consistiu em ser dito que se conformava a sentença e na verdade se
lhe alterou alguma ou se lhe alteraram algumas das conclusões, ou o erro consistiu em se falar de
confirmação quando, rigorosamente, algo se decidiu em sentido contrário em algum ou alguns pontos ou
mesmo em todos. Como o assunto teria sido para embargos de declaração e não os houve, tem-se de acolher
o que está no acórdão, salvo se a interpretação do próprio acórdão não permite tal atitude.
3)APARIÇÃO DOS AUTOS ORIGINAIS. Se aparecem os autos originais, quatro são as espécies: a) a
restauração foi completada e perfeita; b) a restauração foi completa, porém não perfeita; c) a restauração foi
incompleta mas perfeita nas partes restauradas; d) a restauração nem foi completa nem perfeita. Ainda há,
quanto ao tempo, dois casos: (1) a aparição dos autos antigos deu-se antes de serem’ praticados atos
processuais e lavrados termos; (2) a aparição dos autos antigos deu-se depois de qua1~quer prosseguimento,
inclusive por se tratar de feitos terminados.
Na espécie (1), a substituição dos antigos aos novos faz-se, facilmente, mediante simples despacho do juiz
com que estiverem os autos ou do relator do feito ou do presidente do tribunal, tratando-se de autos
terminados.
Na espécie (2), os autos antigos podem não ser completos, e os novos têm atos e termos que precisam ser
trasladados aos antigos, ou serem os autos mesmos considerados “continuação”, a partir do momento em
que os outros apareceram.
Na espécie a), que é a de ter havido restauração completa e perfeita, nenhuma questão surge. Não assim nas
espécies b), c) e d), porque em tudo em que os autos antigos obrigariam a seguimento ou efeito que não foi
dado, ou excluiram seguimento, ou efeito, que foi reconhecido, ou conferido, vige apenas o que está de
acordo com os autos antigos. O princípio é o de que é eficaz todo o processado posterior que não seria se os
autos antigos estivessem à mão. Exemplo:
se não havia expirado o prazo para certo recurso; ou se foi tomado o recurso, e o prazo precluíra . As não-
negações do réu não fazem os autos novos, ainda na parte continuativa, retificações do antigo. Toda
restauração de autos é constituição de forma com reserva da aparição dos autos antigos:
se os autos reaparecem, “super illis ludicare debet, non super secundis” (MANUEL MENDES DE
CASTRO, Practica Lus!tana, II, 43). Naturalmente, se os autos, que aparecerem, são completos até o
momento c), a substituição é fácil; porém não no é onde há parte incompleta, ou foi praticado ato processual
nos autos novos, que não coincide com o que consta dos autos velhos, ou não poderia, segundo esses, ser
praticado. O trabalho dos juizes, nessa senda de atos, prazos e termos velhos e novos, torna-se sutil e
penoso.
4)DESAPARIçÃO DOS AuTos Do RECuRSO. Se o que desapareceu foram os outos do recurso, e. g’.,
agravo de instrumento, o tribunal pode, se não há contra-indicação, satisfazer-se com a requisição dos autos
originais. No acórdão hão de constar o ocorrido e a aplicação do princípio de economia, porém não há
julgamento de restauração o que se não procedeu com a forma dos arts. 1.063-1.069 (em caso de recurso
extraordinário, Si~premo Tribunal Federal, 21 de setembro de 1943, D. da J. de 1.0 de abril de 1944).
Art. 1 . 068. Se o desaparecimento dos autos tiver ocorrido no tribunal ‘), a ação será distribuída, sempre que
possível, ao relator do processo 2).§ 19 A restauração far-se-á no juízo
de origem quanto aos atos que neste se tenham realizado4).
§ 2/’ Remetidos os autos ao tribunal3),
aí se completará a restauração e se procederá ao julgamento.
2)FUNÇÕES DISTINTAS DOS JUIZES. Cumpre distinguir do funcionamento como juiz processante, por
ter sido relator do feito, o que depende de ainda ser o juiz membro do tribunal (não precisa ser da câmara, ou
turma), a contribuição probatória do juiz com esclarecimento por escrito, que independe disso. Também a
cópia, a que se refere o art. 1.066, §~•O, atende apenas ao passado.
No Código de 1973, não se fala de ser apresentada ao Presidente do Tribunal a petição de ação de
restauração de autos. Mas as ações não se propõem perante o relator. A distribuição é que é ao relator. O
julgamento é pelo Tribunal, ou pela Turma ou pela Câmara: o que importa é saber-se qual o corpo que
proferiu o despacho, decisão ou acórdão. Não se precisa de princípio a priori, porque os autos podem ter de-.
saparecido: a) depois do acórdão; b) depois de iniciado o julgamento pela Turma, ou Câmaras, ou pelo
Tribunal pleno; c) depois de ter havido algum ato coletivo; d) depois de ser designado o relator. Na espécie
d), o que tem de fazer o relator é submeter o caso ao corpo coletivo, que há de, pela Presidente, fazer
baixarem os autos à instância de que vieram. Lá é que pode o juiz tomar as providências e julgar a ação de
restauração dos autos. Aliás, em qualquer espécie, a prova testemunhal ou principal, que fora feita na
instância inferior, é nela que se há de proceder às inquirições (repetição. de provas, art. 1.066 e §§ 1.0 e 2.0
e 4.0).
2)LITIGANTE DE MÁ-FÉ. O art. 18 é aplicável. Se a desaparição dos autos tiver resultado de ato cujo
conceito for inserível nos conceitos do art. 18 e seus parágrafos, antes de haver sentença trânsita em julgado,
a sentença que ainda puder ser proferida (inclusive em embargos de declaração) pode aplicar qualquer
daquelas regras jurídicas.
3)ABUSO DO DIREITO PROCESSUAL. Se o autor da ação de restauração de autos procedeu com má-fé
(arts. 16 e 17), ou, durante o processo, praticou ato reprovável segundo o art. 18 e §~ 1.0 e 2.0, as regras
juridicas são aplicáveis. Na ação do art. 16 contra ele, pode ser-lhe pedida a aplicação do art. 20. O réu, na
própria ação de restauração de autos, pode incorrer, por sua conduta de má-fé, em abuso do direito
processual (arts. 16 e 17).
CAPITULO XIII
1)“PACTUM RESERVATI DOMINII”. O nome, moderno e não romano, de pactum reservati dominii,
corresponde ao negócio jurídico pelo qual, na compra-e-venda, o vendedor se reserva o domínio, entregando
ao comprador a posse livre e exclusiva. Mas essa tradição, esse transferir da posse ime-. diata (pois ressalta
não se tratar de vacuam possessionem tradere), não exauria o conteúdo do pacto, nem no exaure hoje em dia.
A coisa era “vendida”. A cisão entre efeitos de direito das coisas e efeitos de direito das obrigações (ainda
mais entre efeitos de posse e efeitos de direito da propriedade, entre efeitos do usus e efeitos do abusus)
permite cortar-se a propriedade, ficando o “domínio” ao vendedor, sem necessidade de se recorrer à
condição resolutória, ou ao contrato de locação. Construía-se como tradição da posse precária, com riscos e
perigos a cargo do comprador. Tal o que a concepção da época podia construir.
No direito grego, as vendas ficavam dependentes do pagamento do preço, tal como em Roma, de modo que
não existia pacto, nem Roma o teve. Existia alteração no sistema ou na concepção da conclusão do contrato
de compra-e-venda, provavelmente introduzida no direito romano pelo VIS gefltium, isto é, pela sugestão
do trato com os estrangeiros. Na verdadeira concepção romana, o contrato de compra e venda é contrato em
que a pretensão, que dele nasce, é pretensão à prestação contra prestação, donde a exceptio nou adimpleti
contractus. A obrigação do comprador (para a contraprestação da coisa) é obrigação de dar o preço,
obligatio dandi; a do vendedor, contra a prestação do preço, a de fazer a tradição, obligatio faciendi. Não
rem dare, como hoje; mas só rem tradere. A diferença é sutil, mas relevante. A aquisição da propriedade
dependia da tradição. De modo que a execução do contrato, e não a conclusão, transferia. A regra legal de
que, sem estar pago o preço, não se transferia o direito de propriedade, nada tinha, portanto, com o contrato,
e sim com a iusta causa da tradição, consultava, segundo B. W. LEIsT (Mancipation und
Eigentumstraclition, 46 s., 199 s.), necessidade natural, e resultava do direito contratual antigo não-provido
de actio venditi, nem de condictio (A. ExNER, Die Lehre vom Rechtser-werb durch Tradition, 341 5.), ou
da primitiva troca de prestação (não de obrigações), conforme AUGUST BECHMANN (Der Kauf, 198), ou
do direito grego (F.HOFMANN, tYber das periculum beim, Kauf e, 170). Houve os que a tiveram como
simples regra jurídica interpretativa (G.L.STREMPEL, H. THOL, G. F. PUCHTA, HEINRICH
DERNBURG).
Não é aqui o lugar para se discutir isso, mas, posto que A.EXNEE tenha razão (o que não é inconciliável
com a opinião de AUGUST BECHMANN), a concepção de um pacto de reserva de dominio, como a pôr-se
a acentuação naquela regra, obedeceu a intuitos de exploração, primeiro dos estrangeiros e depois dos
cidadãos.
Nos inícios do capitalismo industrial, fecundo, empreendedor, dos primeiros decênios do século XIX, o que
importava era criar, romper obscuridade, produzir, e as invenções serviram a isso, dando-nos, ao lado de
homens como James Watt, Stephenson e outros, até Liebig e Bunsen e as grandes descobertas químicas,
Arkwright e Cartwright, Werner Siemens (antes do “von”), Friedrich Krupp, Matthias Stinnes e o comodoro
Vanderbilt. Aumentou-se a capacidade aquisitiva do mundo ocidental e a população européia e atlântica teve
surto que nunca, antes, teria sido possível. Antes, o capitalismo quisera vender os seus produtos sem aumen-
tar o nível de vida, e começou a ser arriscado vender a prazo.
Assunto que era conteúdo de notas de livro, ou de artigos de revistas, passou a interessar os juristas a ponto
de surgirem dissertações, como a de J. B. FRIESE (De pacto domini’um in emtione venditione usque ad
pretii solutionem reservante, Ienae, 1706), a de SCHNE1DER (Dissertatio de validitate et effectu
reservationis dominii et hypothecae in securit atem residul pretii, Goettingae, 1753), a de A. F. GOESSEL
(De vi reservati dorninii et hypothecae in re vendita, Col., 1793), a de FETzER (Diss. de iure separationis,
quod exorto super bonis emtoris concursu venditori in. re venclita competit, Tubingae, 1799). J. C.
GENSLER, em 1819, no Archiv fiir die civilistische Pra~xis (II, 291-293), não lhe concedeu mais de duas
páginas. CER. FR. voN GLÚCK (Ausfilhrliche EriÉiuterung der Pandecten, 16, 229 5.) somente oito, em
1868. Em vez do interesse jurídico de dissertações acadêmicas, quando o Estado sentiu as primeiras
inadaptações do direito à economia, tentou estatalizações (tendo sido Bismarck quem fez a primeira), e o
capitalismo da segunda geração prosseguia, apenas menos eficiente, na política de mudar as condicões em
tomo. Ao tempo da dissertação de E. THORSCH (1875), sobre Der pactum reservati dominli, o interesse era
mais do que acadêmico. Porém, só ao começo da terceira geração do capitalismo contemporâneo, depois,
necessariamente, de se haver completado a emancipação da burguesia e de se ter passado a curva de 1871-
1873, foram publicadas leis de vendas com reserva do domínio, de inspiração extranacional, quaisquer que
fossem os países. Principalmente depois da falência da Wechsel-Bank de Viena, da crise do algodão, da
suspensão de pagamentos da Argentina, da falência de Baring Brothers e da marcha de desempregados sobre
Washington. A geração não via que o problema estava em aumentar a capacidade aquisitiva das massas, em
vez de escorchá-la, ou arrancar-lhe pedaços de carne, à Shylock. Daí as leis alemãs de 16 de maio de 1894 e
austríaca de 27 de abril de 1896, as. leis estaduais dos Estados Unidos da América, os Hire-Purchase Acts,
escocês de 1932 e inglês de 1938, precedidos pela prática britânica e adaptados às novas circunstâncias.
Essas leis refletiram a maior ou menor capacidade do povo para se defender; mas, todas, a velhice de
propósitos em mundo diferente. O erro dos que vendem ou querem vender sem fazer compradores e o dos
que se deixam enganar sob o peso do duplo e combinado efeito da propaganda e da legislação neo
-opressiva patenteiam-se nos penhores de máquinas e utensílios e nos alugueres internacionais de máquinas,
assunto que dizem respeito ao futuro dos povos fracos, submetidos a governos imorais.
Na reserva de propriedade, de ordinário o vendedor antecipa a sua prestação, ficando com a propriedade em
garantia do pagamento do preço. A reserva pode ser do dominio, ou de outro direito real (enfiteuse,
usufruto, uso, só se transferindo o exercício).
Na vida econômica de hoje, a reserva de domínio facilita o crédito sobre mercadorias, sem que deixe de
haver inconveniência político-jurídica, por atingir a publicidade da posse e por outras razões de ordem
capitalística. Muitas vezes se empresta por se ver o estoque, sem se poder saber, salvo investigação de
escrita e de documentos, se as mercadorias pertencem ao mutuário. Se o vendedor acordou em que o preço
fosse, no todo ou em parte, pago depois da entrega do bem, expôs-se ele inadimplemento pelo comprador, a
despeito de já haver cumprido a sua obrigação. O contrato de compra-e-venda pode fixar prazo, depois de
cujo transcurso será de exigir-se a indenização. Se não se resolve o contrato, pode o comprador não ter
meios para pagar, a despeito de ficar com o bem comprado, que talvez já tenha alienado. Se não há interesse
na entrega do bem logo após a conclusão do contrato, podem ser concebidos como simultâneos o adim
plemento pelo vendedor e o ad.implemento pelo comprador. são a prazo, aí, ambos os adimplementos. Se há
interesse do comprador, ou do vendedor, em que se dê antes a entrega do bem vendido, tem o vendedor de
exigir segurança, se não lhe basta a confiança no comprador. As seguranças mais freqúentes são a fiança, o
penhor e a reserva de propriedade.
Reserva de domínio é a cláusula entre vendedor e comprador, que estabelece ficar com o vendedor o
dominio, até que se pague totalmente o preço, a despeito da entrega ao comprador. Com essa cláusula
segura-se contra inadimplemento o vendedor. A hipoteca melhor o consegue, a respeito dos bens imóveis;
de modo que a cláusula mais se emprega a respeito de bens móveis.
Em comparação com o direito de penhor, a cláusula de reserva de domínio é mais intensa, porque se permite
ao vendedor, em caso de inadimplemento, reaver a posse do bem, em vez de se proceder à extração do valor.
A sua finalidade é, por bem dizer-se, a de restaurar a simultaneidade das prestações, se se quer evitar a
resolução do contrato (HELMUT RÚHL, Eig’entumsvorbehalt und Abahlungsge chàft, 10 s. e 105).
Ocomprador que recebeu a posse do bem, com a cláusula de reserva de domínio, tem a faculdade de usá-lo,
ou de usufruí-lo. Só não tem o domínio. Perde o uso ou o usufruto, em geral a posse se deixa de cumprir o
prometido. Não pode transferir o domínio porque não o tem.
A cláusula de reserva de domínio necessariamente é cláusula do negócio jurídico bilateral de compra-e-
venda e do acordo de transmissão da posse, porque retira a esse o efeito de transmitir a propriedade. No
direito brasileiro, como no direito alemão e noutros que escaparam à confusão oriunda do Código Civil
francês, há a distinção entre o contrato de compra-e-venda e o acordo de transmissão (Einigung). É preciso
que haja a tradição, em virtude de acordo de transmissão, para que se transfira a propriedade dos bens. Se há
reserva de domínio, tradição há sem a eficácia que a lei confere ao acordo de transmissão: o tradente
continua proprietário, a despeito da transmissão da posse. O ato-fato real ocorre, mas falta, por sobre ele, o
acordo de transmissão com eficácia de transmissão da propriedade. O acordo de transmissão foi sob
condição suspensiva. Se se falou em reserva de domínio, ou se a interpretação impõe que se pense em ter
havido reserva de domínio, tem-se de entender que o acordo de transmissão foi suspensivamente concebido.
N~ se pretenda que foi o contrato de compra-e-venda que se concebeu com a condição suspensiva. Foi o
acordo de transmissão. Por isso mesmo, a reserva de domínio pode ser posterior ao contrato de compra-e-
venda, desde que ainda não se haja feito o acordo de transmissão da propriedade ou inserta nesse, como
cláusula.
Se a reserva de domínio foi inclusa no contrato de compra-e-venda, o que se há de assentar é que esse
contrato está acompanhado do acordo de transmissão clausulado, mesmo quando se haja fixado data
posterior para a entrega (pré-formulação do acordo). Se no contrato de compra-e-venda se diz “só se
transferindo a propriedade por ocasião do pagamento total do preço”, o comprador tem direito a exigir a
entrega do bem. Toda reserva de domínio é cláusula do acordo de transmissão. Se se disse a data em que
seria de exigir-se, há suspensividade para a entrega e para a transmissão do domínio.
Se a reserva de domínio é nula, nulo não é, por esse fundamento, o contrato de compra-e-venda. Pode valer
o próprio acordo de transmissão sem valer a cláusula de reserva de domínio.
O pacto reservati dominli pode ser ligado a outro acontecimento que ao adimplemento integral, como se o
vendedor estipula que só se há de transferir a propriedade se o comprador compra, até certo prazo, o prédio
em que possa instalar o bem vendido.
Se o vendedor se reserva a propriedade até o pagamento integral do preço e, em virtude disso, não tendo
havido o pagamento integral, toma a posse do bem, há resolução do contrato, com a restituição das
prestações recebidas. Dá-se o mesmo se a posse do bem é retirada ao comprador devido a medida executiva
ou cautelar, ou quando por outra causa exerce a pretensão à restituição da posse (JOHANN LAZARUS, Das
Recht der Abzahlungsgeschãíts, 96).
As vezes, os contraentes chamam “promessa de compra-e-venda com reserva de domínio” à compra-e-
venda com reserva de domínio. Não tem relevância a impropriedade da linguagem. Pode haver promessa de
compra-e-venda com reserva de domínio se em verdade só se promete compra-e-venda, com reserva de
domínio, ou se houve alusão a elemento (reservado) que não poderia existir. Se, porém, se entregou o bem e
se vai prestar a propriedade quando solvida a dívida, o que há é compra-e-venda com reserva de domínio.
Exemplo no acórdão da 2Y- Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, a 7 de novembro de 1938
(R. dos T., 119, 234).
A cláusula de reserva de domínio é parte integrante do acordo de transmissão da propriedade. Quando se faz
reserva de domínio em contrato de compra-e-venda, em verdade houve contrato de compra-e-venda e acordo
de transmissão, com a cláusula. É encontradiça, mesmo nos juristas alemães, confusão a respeito (e. g.,
KAIRL LARENz, Lehrbuch des Schuidrechts, II, 68).
A cláusula pode ser explícita ou implícita. As circunstâncias e outras cláusulas do contrato de compra-e-
venda podem compô-la.
Pode acontecere sói acontecer que o vendedor,ao ter de fazer a entrega, estipula a reserva de domínio
(declaração unilateral de vontade), e. g., na fatura, ou no documento que a acompanha. Não houve a
transmissão da propriedade, posto que tivesse havido a entrega. O comprador tem a exceção non adimpleti
contractus, ou a non rite adimpleti contractus, se entende que o vendedor tinha de transmitir-lhe a
propriedade. Se o vendedor não atende e tem razão o comprador, só a novação poderia atingir o contrato de
compra-e-venda. Se o comprador, que não pagou, recebe o bem, com a reserva de domínio, nenhuma
alteração houve no contrato de compra-e-venda, salvo se o vendedor teria de prestar antes (HELMUT
RÚHL, Eigentumsvorbehait und Ab~ahiungsgeschãft, 191). Se o comprador já pagou, ou se o vendedor
teria de prestar antes, a aquiescência do comprador é a do comprador que recebe prestação incompleta. O
comprador pode exigir o cumprimento do contrato de compra-e-venda. Em principio, a reserva feita por
manifestação unilateral de vontade é ineficaz.
Se o comprador anui em que a entrega seja com reserva de domínio, o que não se previa, ocorre isso, de
regra, porque ainda deve e talvez queira adiamento para a paga do preço, ou do restante. O não cumprimento
pelo comprador implica resolução do contrato e pode o vendedor exigir a posse. Se o comprador adimple,
cabe a pretensão à transmissão da propriedade.
A reserva de domínio, ao tempo do contrato de compra-e-venda, supõe que o acordo de transmissão é que a
contém, simultâneo àquele. Se posterior, falta a simultaneidade, mas a cláusula é do acordo, como se
simultâneos fossem contrato de compra-e-venda e acordo de transmissão.
A mora do comprador, como a do vendedor, dá ensejo a resolução.
Se houve cláusula de reserva de domínio, a entrega do bem ao comprador, com a transmissão da
propriedade, e adimplemento pelo vendedor. Daí em diante as despesas e os riscos são contra o comprador.
Tem esse o direito à posse, oponível ao vendedor proprietário, fundado no acordo de transmissão sob
condição suspensiva, e não no direito expectativo do comprador. Ao não-implemento da condição
suspensiva quanto à propriedade corresponde a condição resolutiva quanto à posse.
Com a cláusula de reserva de domínio, o vendedor assegura-se contra o possível inadimplemento pelo
comprador, inclusive se sobrevém decretação da abertura de concurso civil de credores, ou decretação de
abertura de falência, ou liquidação coativa. O direito do comprador à posse do bem comprado se extingue e
nasce ao vendedor a pretensão a reaver a posse se sobrevém concurso de credores, qualquer que seja, ou
mora. Tem de exercê-la, embora o comprador perca o direito à posse desde o momento em que ocorre a
eficácia da decretação de abertura do concurso, ou a mora, segundo os princípios que a regem.
Quando o vendedor reclama a posse, que entregara, não exerce, necessariamente, a pretensão à resolução do
contrato, posto que possa haver cláusula contratual que assim o predetermine. O exercício da pretensão a
reaver a posse, pretensão ligada ao acordo de transmissão, distingue-se do exercicio do direito à resolução
do contrato de compra-e-venda. Os dois direitos podem ser exercidos separada ou simultaneamente
(HELMUT RÚHL, Eigentumsvorbehalt und AbzahlungsgeschÉift, 92 s., 105, 256 5.). O vendedor, que
recebeu de volta o bem vendido, pode exigir o cumprimento do contrato d3 compra-e-venda, enquanto não
se dá o exercício da pretensão à resolução ou não ocorre essa, em virtude de cláusula especial do contrato de
compra-e-venda. A resolução prende-se a esse; a pretensão a reaver a posse resulta da cláusula de reserva de
domínio inserta no acordo de transmissão. Se, a despeito da volta da posse ao vendedor, há a purga de mora,
ou se desfaz ou extingue a relação jurídica concursal, ao comprador renasce o direito à posse, ou o direito à
posse e à propriedade.
O vendedor é proprietário, a despeito do contrato e No concurso de credores, qualquer que seja, o vendedor~
se não lhe é pago totalmente o preço, pode pedir a restituição do bem vendido com reserva de propriedade.
O vendedor pode interpelar o síndico para que, dentro de cinco dias, declare se cumpre, ou não, o contrato.
A declaração negativa ou o silêncio do síndico, findo esse prazo, dá ao vendedor o direito à indenização,
cujo valor, apurado em processo ordinário, entra na classificação dos créditos como crédito quirografário.
Os mesmos princípios regem o direito do vendedor em caso de concurso civil de credores, ou de liquidação
coativa.
No direito brasileiro, se o vendedor prefere que se venda o bem que está sob a posse da massa, tem de expor
o que deseja e pedir, em vez da volta da posse, a venda em hasta pública, pois assim se podem apurar o
valor prestado e o que se ia restituir.
No concurso de credores, qualquer que seja, por ocasião do pedido de restituição, é possível discutir-se se o
vendedor cumpriu todas as suas obrigações (LETZGUS, fie Anwartschaft des KÉiufers unter
Eigentumsvorbehalt, 66 5.; WALTER ERMAN, Handkommentar zum BGB., 10).
A transmissão da propriedade, em virtude do acordo de transmissão em que há a cláusula de reserva de
domínio, é sob condição suspensiva. O vendedor é proprietário exposto à vinculação. Para que o comprador
adquira a propriedade não mais se precisa de qualquer acordo, ou de manifestação unilateral de vontade do
vendedor. Implida a condição, opera-se a aquisição. Por onde se vê, mais uma vez, quanto é de importância
atender-se a que a reserva de propriedade é cláusula do acordo de transmissão.
Uma das conseqüências de ser aquisição sob condição suspensiva está em que o vendedor, durante a posse
do comprador, nenhum ato de disposição pode praticar, eficazmente, no tocante ao bem entregue com
reserva de propriedade, sem que possa haver a reserva. Duas vezes, o Reichsgericht entendeu que seria
preciso novo acordo (Entscheidungen dês Reichsgerichts, 64, 206 e 95, 107); mas a doutrina reagiu
energicamente (e. g., ANDREAS voN TURE, Der Aligemeine Teu, III, 318; FE. LEONIIARD, Besonderes
Schuldrecht, 106; cf. Entscheidungen, 140, 226).
O comprador não pode gravar o bem de que tem a posse:
falta-lhe a propriedade. Pode dispor do seu direito expectativo. Pode empenhá-lo (Código Civil, art. 790). O
direito expectativo é arrestável, seqúestrável, penhorávei e arrecadável. Trata-se de direito patrimonial atual
(HoLTz, fie Anwartschaftsrecht aus bedingter tlbereignung ais Kreditsicherungsmittel, 23 5.; LETzGU5,
Die Anwarstschaft des KÉiufers unter Eigentuinsvorbehalt, 85; HELMUT RÍIHL, Eigentumsvorbehalt und
Abzahlungsgeschãft, 87). Cf. Tratado de Direito Privado, Tomo V, § 544, 1, 4, 545, 5, 9; XXVIII, § § 3.297,
3; 3.333, 5.
A disposição do direito de expectativa rege-se pelos princípios concernentes à propriedade. O adquirente ou
recebe a posse, tal como a tem o comprador com reserva de propriedade, ou posse mediata. Com a
alienação, o comprador perde a possibilidade de adquirir a propriedade, salvo se desconstituído o seu ato de
disposição.
A pessoa que adquiriu do comprador o direito expectativo adquire a propriedade se a condição suspensiva se
imple. Não há aquisição intermédia do comprador (HELMUT RÚHL, Eigentumsvorbehalt und
AbzahlungsgeschÉift, 97; LETzGU5, fie Anwartschaft des Kdufers unter Eigentuinsvorbehalt, 11 5.;
HOLTZ, fie Anwartschaftsrecht aus bedingter Vbereignung ais Kreditsicherungsmittel, 47 5.; JosEr EssER,
Lehrbuch des Schuldrechts, 231; HARRY WESTERMANN, Lehrbuch des Sachenrechts, 216).
Não é necessário o assentimento do vendedor (KARL LARENz, Lehrbuch des Schuldrechts, II, 72), quer
para pré-contrato, quer para contrato de compra-e-venda do direito de expectativa, quer para o acordo de
transmissão desse direito. Quanto à posse, que o vendedor lhe transmitiu, o comprador que aliena o direito
de expectativa somente pode atribuir ao outorgado posse mediata, que não ofenda a posse mediata do
vendedor, ou posse imediata, mas a seu risco. Aí, o assentimento do vendedor é imprescindivel para que se
afaste a possibilidade de se caracterizar infração do contrato de compra-e-venda, ou do próprio acordo de
transmissão.
Se o comprador, dispondo do direito de expectativa, ofende a posse do vendedor (ou o seu dever de possuir
o bem), pode o vendedor exigir do terceiro a devolução da posse ao comprador (HARRY WESTERMANN,
Lehrbuch des Sachenrechts, 136).
O direito de expectativa pode ser objeto de medida constritiva e de medida executiva (penhor). Qualquer
dessas medidas importa constrição da posse que o comprador recebeu. Se o comprador vem a adquirir a
propriedade, a medida constritiva pode ser estendida à propriedade, o que depende de pedido do interessado
e deferimento pelo juiz.
Se o vendedor não é proprietário, a entrega do bem vendido com a cláusula de reserva de propriedade é
como seria a entrega do bem vendido sem reserva, pelo vendedor não--dono; há ineficácia. No direito
brasileiro, a aquisição a ou domino é excepcional. Tratando-se de bem móvel, rege o art. 622 do Código
Civil; ou, se o bem é adquirível pelo outorgado de boa-fé (e. g., títulos circuláveis), pela lex specialis.
Quanto aos bens imóveis, é de mister a transcrição no Registro de Imóveis (Código Civil, art. 530, 1).
O comprador que dispõe do bem que lhe foi entregue com reserva de propriedade, sem que já se lhe haja
transferido a propriedade, comete crime.
Se o comprador adquire os bens com reserva de propriedade, mas ocorre especificação (Código Civil, arts.
611-614), ou confusão, ou adjunção, ou mistura (arts. 615-617), regem os princípios do direito das coisas. O
comprador, que somente tinha a posse, pode vir a adquirir. Surge, aqui, a questão da cláusula de afastamento
da aquisição originária peio comprador. Se no contrato de compra-e-venda se disse que o comprador pode
ou deve transformar o bem “para o vendedor”, é,entende-se que o comprador não adquire a propriedade? A
resposta é negativa (sem razão, WALTER ERMAN, Handkcrnmentar zum BGB., 8; duvidoso, HELMUT
RÚHL, Eigentumsvorbehalt und Abzahlungsgeschãft, 138). O que se pode pactuar é constituto possessório,
para que, no caso de inadimplemento, a propriedade do novo bem passe ao vendedor (KARL LARENZ,
Lehrbuch des Schuldrechts, II, 73).
2) TÉCNICA LEGISLATIVA. O Brasil defendeu-se contra a legislação sobre vendas com reserva de
domínio até 1938 (Decreto-lei n. 869, de 18 de novembro de 1938, art. 3•O, IV), figura que, contra lei e a
nossa atitude, se implantara anos atrás, e se fez legal exatamente no diploma que pretendia reprimir os
crimes contra a economia popular, sua guarda e seu emprego: “São ainda crimes contra a economia popular:
IV violar contrato de venda a prestações, fraudando sorteios ou deixando de entregar a coisa vendida, sem
devolução das prestações pagas, ou descontar destas, nas vendas com reserva de domínio, quando o contrato
for rescindido por culpa do comprador, quantia maior do que a correspondente à depreciação do objeto”. O
Decreto-lei n. 1.027, de 2 de janeiro de 1939, art. 1.0, exigiu a transcrição, “no todo ou parte”, no registro
público de títulos e documentos do domicílio do comprador. Ainda o Decreto-lei n. 1.041, de 11 de janeiro
de 1939, artigo único, ressalvou do art. 3~O, IV, do Decreto-lei n. 869 os contratos celebrados antes de 21
de novembro de 1938, quando rescindidos por culpa do comprador, continuando os mesmos a reger-se pelo
direito anterior. Cf. Decreto n. 4.857, de 9 de novembro de 1939, art. 136, 5•0
O Código Civil de 1916 havia proibido o penhor com cláusula constitui. Ainda em 1931, o Tribunal de
Justiça da Bahia repelia o pacto de reserva do domínio (24 de julho de 1931), mas aqui a cláusula vencia,
recorrendo-se a sofismas lamentáveis (venda “retratável”, Distrito Federal, 27 de ju
lho de 1922, R. de D., 69, 320; depósito, 11 de abril de 1922, R.S.T.F., 51, 509; locação, etc.). Pela primeira
vez, já a jurisprudência se refletia, sem máscara, sob pressão abertamente capitalista e exterior.
A legislação processual civil veio modificar a disciplina material e formal do pacto de reserva de domínio,
de modo que há, hoje, quatro pretensões diferentes: a) a pretensão de execução da coisa vendida para haver
o saldo apurado do preço; b) a pretensão de recuperação da posse da coisa vendida e entregue (a posse foi
entregue, por isso é que se reenvidica), ressalvada ao comprador a alternativa de purgar a mora e cumprir o
contrato; c) a pretensão de cobrar o saldo; ci) a pretensão à execução para cobrar o saldo.
A arrecadação do bem móvel vendido, com reserva de domínio , ao falido, obedece à legislação falencial (lª
Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, 8 de maio de 1951, 1?. dos T., 193, 346).
Em alguns países, os juristas lançam mão de construção jurídica com a aquisição sob condição resolutiva.
Mas o erro é manifesto. Resolução há do negócio juridico de compra-e--venda, se advém inadimplemento
por parte do outorgado; não da propriedade, porque essa não se transferiu.
Porque a cláusula de reserva de domínio é concernente ao adimplemento do contrato de compra-e-venda, a
impossibilidade, que pode existir, da transmissão formal condicional do imóvel afasta, radicalmente, tal
cláusula, em se tratando de contrato de compra-e-venda de imóveis. O que é possível é pacto comíssório,
resolutividade. Raramente, mas dentro dos princípios, pode dar-se que a cláusula de reserva de domínio se
interprete como cláusula de condição resolutiva ou de termo resolutivo.
Quanto aos bens móveis, não há impossibilidade da transmissão condicional. O acordo de transmissão pode
ser sob condição suspensiva, o que não importa dizer-se que o contrato de compra-e-venda tenha sido
condicional. Condicionou-se o acordo de transmissão. O contrato de compra-e-venda é a prazo quanto ao
preço e quanto à entrega da coisa. O comprador não teria posse própria, mas posse imprópria, como o
mandatário, o locatário, ou o administrador. Na venda com reserva de domínio, há entrega da posse própria,
sem se perfazer a transmissão da propriedade; algo falta, não para que a posse imprópria se faça posse
própria e engendre a transmissão do dominio, mas sim para que o acordo de transmissão da propriedade se
torne eficaz. Melhor: complete a sua eficácia. (No mesmo sentido, com a transcrição integral de trecho
acima, o Tribunal Regional do Trabalho da í.a Região, a 19 de agosto de 1960, D. da J. de 2 de setembro.)
Com o advento da condição, não mais se exige qualquer ato ou manifestação de vontade do vendedor. Antes
desse advento, a manifestação de vontade do vendedor seria renúncia (OTTo WARNEYER, Kommentar, 1,
778). Por isso mesmo que se não transferiu a propriedade, o bem é do vendedor,
e sujeitar-se-ia à falência desse; mas entende-se que o comprador, em tal espécie, já tem algo de execução
do contrato de compra-e-venda e certa eficácia do acordo de transmissão. O administrador da massa
concursal do vendedor pode exigir a execução e pode exercer as outras ações do vendedor; o administrador
da massa concursal do comprador pode adimplir e tudo passa como se o comprador houvesse adimplido (R.
JAFEE, Der Eigentumsvorbehalt beim Kauf, 88).
Há a condição suspensiva mexa no acordo de transmissão. A propriedade só se transfere quando o preço for
totalmente pago. Portanto: o acordo de transmissão foi condicional, a despeito da entrega; de jeito que, pago
o preço, completamente, a transmissão se opera (o acordo de transmissão já se tornou eficaz para a
transmissão e tradição já houve.ra). Como a transmissão, antes disso, não se opera, o inadimplemento pode
dar ensejo à resolução do contrato de compra--e-venda.
O pactum reservati dominii inclui-se no contrato de compra-e-venda, ou em outro, em que se prometa
alienar a coisa, mas em verdade supõe que se haja inserido o acordo de transmissão sujeito a condição ou a
termo. Não é a transmissão que se torna condicional ou a termo; é o acordo de transmissão . Nem a
promessa à transmissão, nem. a transmissão mesma estão em causa: o que está em causa é o acordo de
transmissão. A transmissão mesma não foi condicional. Transmissão formal condicional tem-se explícita, no
direito imobiliário, a propósito da propriedade resolúvel.
É preciso ter-se muito cuidado em se não confundirem acordo de transmissão da propriedade e transmissão:
nada obsta a que se acorde em que se adquirirá a propriedade no dia em que se realize certa condição (e. g.,
se o governo resolveu não mais desapropriar o prédio); satisfeita a condição e transcrito o acordo, transfere-
se a propriedade: não houve acordo de transmissão com condição para se transmitir. Quanto a móveis, a
reserva de domínio concerne ao acordo de transmissão, e não ao contrato causal. Transmissão resolúvel há
no direito de propriedade imobiliária, porque está nos textos legais. Aí, é a propriedade que se transmite e a
propriedade (efeito da transmissão!) toma-se resolúvel, porque no acordo assim se estabeleceu, ou se
estabeleceu no ato jurídico unilateral de disposição.
Quando o vendedor da coisa móvel se reserva a propriedade até se lhe pagar o preço, ou todo o preço, o que
se há de entender é que o acordo de transmissão é sob condição suspensiva, embora se haja entregue a coisa.
De transmissão da propriedade só se há de cogitar quando a condição se implir; por exemplo, quando se
satisfizer o preço. O contrato de compra-e-venda foi incondicional; o que foi condicional foi o acordo de
transmissão da propriedade. Se o devedor incorre em mora, há inadimplemento do contrato de compra-e-
-venda; donde a possível resolução, por inadimplemento do contrato.
Uma vez que a cláusula de reserva de domínio se refere ao acordo de transmissão, e não ao contrato de
compra-e--venda, os riscos da coisa passam, com a entrega, ao comprador. Porém não fica imune à
exigência da caução de pagar no tempo ajustado, sobrevindo-lhe insolvência, posto que tenha havido entrega
da coisa.
Se o acordo de transmissão foi com condição suspensiva, só é registrável, tratando-se de bem imóvel,
quando se implir a condição; tratando-se de bem móvel, há reserva de domínio. Se a condição foi o
pagamento do preço, a propriedade só se transmite quando seja pago.
5)PRÉVIo EXAME DOS ARTS. 1.070 E 1.071. Na compra--e-venda a crédito com reserva de domínio,
ainda não há transmissão da propriedade, pois que houve e ainda há a reserva. A aquisição ficou dependente
do pagamento das prestações; portanto, sob cláusula suspensiva. Os contratos de compra-e-venda não
geram, só por si, a transmissão; daí se lhes anexar de ordinário o acordo de transmissão. Na espécie da
compra-e-venda com reserva de domínio, em vez de haver, desde logo, o acordo de transmissão, há o pacto
adjecto, que é adjeção ao acordo de transmissão. Compra-e-venda houve e há; o que falta é a transferência
da propriedade, que a cláusula suspensiva atinge. Com o solver da última prestação, o acordo de
transmissão, que foi com cláusula suspensíva, se eficaciza. Nada tem isso com os pré-contratos, nem mesmo
com a promessa de transmissão futura, que dependeria de novo negócio jurídico. Há automaticidade, e não
apenas eficácia de novo negócio jurídico. O direito à transmissão já existia e existe, até que essa se opere,
sem outra exigência que a do pagamento integral. De modo nenhum se diga que o comprador tem direito
real sobre a coisa: tem posse e direito expectativo; portanto, está em relação jurídica de acordo de
transmissão, com cláusula suspensiva.
Nos textos dos arts. 1.070 e 1.071, há referência a ação executiva de terceiro que atinge, com a penhora, a
coisa vendida, como pode haver ação que, com a penhora, apanhe o direito do comprador. Há a ação do
vendedor contra o comprador que incorreu em mora, o que pode levar ao adimplemento: o que se pede é o
restante, porque a sua pretensão é a de receber o preço, uma vez que vendeu sem ter tra::sfzrido a
propriedade, e sua ação é de execução para pagamento de quantia certa (arts. 646-658). A respeito do
contrato, a resilição é pedida se o comprador incorreu em mora e o autor, com o protesto do título, requer,
liminarmente e sem audiência do comprador, a apreensão e o depósito da coisa vendida.
Não se fala de ação de resolução ou resilição típica do contrato por inadimplemento, porque não foi esse o
assunto dos arts. 1.070 e 1.071.
No art. 1.070, § 1.0, fala-se de penhora da coisa vendida. Seria absurdo pensar-se que o vendedor com
reserva de domimo pudesse penhorar a coisa. A coisa é sua. ~Como pensar-se em se penhorar o bem que é
do autor da ação executiva?
No caso de se haver penhorado a coisa vendida (art. 1.070, § 1.0), qualquer dos figurantes da relação
jurídica da compra-e-venda com reserva de domínio pode requerer, no caso do processo, a alienação judicial
em leilão. A ação, ai, foi contra o vendedor, porque com ele está a propriedade, e não com o comprador, que
só tem um direito, que é o expectativo. Mas, porque é titular desse, a lei permite que ele requeira a alienação
judicial em leilão. Alienada judicialmente a coisa, o comprador, que não está em mora, tem oportunidade de
remir o bem comprado com reserva de domínio.
Se o vendedor pede a penhora de algum bem ou de alguns bens do comprador, que só tem a posse da coisa
vendida, no tocante a essa coisa a penhora somente pode recair no direito expectativo do comprador, dentre
os outros bens que são desse.
Se algum terceiro pede a penhora da coisa vendida, por ser devedor o vendedor, a constrição judicial
somente alcança a propriedade, deducto o direito expectativo. Penhora da coisa vendida pode ser em virtude
de ação executiva proposta por terceiro, ou, até mesmo, pelo devedor que ainda não solveu toda a dívida e,
pois, não se fez dono, mas tem título executivo judicial ou extrajudicial contra o vendedor com reserva de
domínio. Nunca tal penhora pode provir de ato do vendedor com reserva de dominio, porque a coisa é dele.
O que ele poderia penhorar seria o direito expectativo.
Assim, tanto o vendedor quanto o comprador podem requerer a alienação judicial em leilão. O produto do
leilão será depositado, como objeto da penhora. Desse produto tem de ser retirado o que compete ao
comprador, pelo que pagara.
Quanto ao terceiro, autor da ação executiva, quem adquiriu a coisa vendida, em leilão, ou por outro meio, só
adquiriu a coisa que está sujeita à aquisição pelo comprador,
que pode invocar o art. 1.071, § § 1/a, 2.0, 3•O e 4•O, por analogia.
Art. 1 . 070. Nas vendas a crédito com reserva de domínio 1), quando as prestações estiverem representadas
por título executivo 2) 3), o credor poderá cobrá-las, observando-se o disposto no Livro II, Título II,
Capítulo lV.
§ Efetuada a penhora6) 7) da coisa vendida 4), é lícito a qualquer das partes, no curso do processo, requerer-
lhe a alienação judicial em leilão 8) 9)
§ 2.0 O produto do leilão será depositado, sub-rogando-se nele a penhora 5) lo) 11).
1)VENDAS A CRÉDITO COM RESERVA DE DOMíNIO. Nas vendas a crédito, com a cláusula de
reserva de domínio, o vendedor pode, por meio da ação que compete ao titulo de crédito, exigir o pagamento
das prestações vencidas e das vincendas. Se a ação competente se inicia pela penhora do direito expectativo
à aquisição da posse da coisa vendida, qualquer das partes pode requerer, no curso do processo, a venda
imediata em leilão. O produto do leilão será depositado, nele sub-rogando-se a penhora. A ação somente
concerne a créditos provenientes da venda da coisa. Supõe reserva de dominio, não transferência da
propriedade ao credor, em garantia: o devedor tem o usuario, tem posse, está suspenso (não sujeito a
resolutividade) o seu direito à coisa “comprada”.
O vendedor ou a) se utiliza da via ordinária, para a sua ação de condenação; ou b) propõe a ação, que, pela
eficácia do título, se inicia pela penhora da posse da coisa vendida; ou c) propõe ação executiva especial que
compete ao título; ou d) introduz a ação de apreensão e depósito.
A ação c) é ação de execução com a penhora do direito (não há, aí, penhor convencional: penhora-se o
direito expectativo à propriedade, e executa-se). Ação executiva, dita, aí, de excussão. Não se pode
considerar ação de declaração. Pertence à mesma classe que as outras ações de execução, com a
particularidade de se executarem o direito expcetativo do comprador e a posse.
Se o contrato de compra-e-venda com reserva de domínio não foi registrado, existe, pode ser válido, mas
falta-lhe a eficácia erga omnes que o registro lhe conferiria.
3)AçÃo QUE COMPETIR AO TÍTULO DE CREDITO . “Título” está ai em sentido lato, e não no sentido
estrito, técnico, de títulos de crédito. Pode ser, por exemplo, a ação executiva, desde que se satisfaçam os
pressupostos legais. Pode ser, ainda, a ação executiva, cambiária, constituindo a compra-e-venda com
reserva de domínio negócio subjacente, sendo os títulos cambiários e cambiariformes negócios jurídicos
abstratos, e não sofrendo novação aquele negócio de compra-e-venda, mas sendo sem atuação nos títulos a
existência de tal negócio.
A ação de recuperação da posse da coisa vendida, com reserva de domínio e com a entrega, é ação de
condenação, com transformação parcial alternativa em ação executiva, se não houve pedido de moratória; e,
aqui, o depósito da coisa é diferente do depósito de que se fala na ação de consignação em pagamento. Mais:
é cautelar, e não executivo; nem, sequer, se há de pensar em depósito para execução. A primeira fase é de
ação “preparatória” mandamental, embora posta no mesmo processo; a segunda, executiva, se houve
contestação, sem se requerer a moratória por ter satisfeito os pressupostos para obtê-la, ou se não houve
contestação, porque então se dá, requerida, a recuperação da fosse. No processo o autor restitui o saldo,
dando-se a consignação em pagamento, se preciso.
Na ação de execução (execução da posse da coisa vendida), para se haver o saldo apurado do preço, há ação
para obter o adimplemento do contrato, mais execução ; portanto, o elemento executivo é o que prepondera:
a ação é executiva. A ação para cobrança do saldo é ação de condenação. Se o autor pode invocar regra
jurídica sobre ação executiva de titulo extrajudicial, a executividade passa à frente. Se houve condenação ao
pagamento do saldo, a ação é actio iudicati.
4)PENhORA DA POSSE DA COISA VENDIDA. Supõe -se, aí,o exercício da pretensão de excutir, não a
de executar noutros bens, ainda que entre eles se ache a coisa vendida, de modo que não têm razão os
comentadores em tomar as liberdades, que espanta estejam a tomar, com a interpretação da lei, a ponto de
lerem “penhora da coisa vendida” como “penhora de quaisquer bens existentes no patrimônio do devedor,
inclusive da coisa sobre que versou a venda com a reserva de domínio” (1). De modo nenhum, nas ações de
excussão, se penhoram outros bens. No caso, penhora-se e. usus, a posse (o domínio é do credor), como se
pode penhorar o domínio reservado do credor com o respectivo direito à resilição , ou, se já nasceu, com a
pretensão a resilir. O direito do credor é penhoriforme, assemelha-se ao do penhor, e há até quem. o
identifique com ele, como H. KLANG. A retcnsão cominatória, se houve impugnação, como a da ação
hipotecária e a da ação pignoratícia, constitui resto do beneficium excussionis realis (seu ordinis). A lei
processual não revoga a lei material no tocante a esse benefício, que é integrante limitativo da pretensão de
direito material para o credor e ele mesmo pretensão de direito material para o devedor. O próprio direito à
penhora do bem hipotecado é direito de penhor no sentido do direito material. Bem assim, o de penhorar a
coisa vendida com reserva de domínio (assim, RUDOLF POLLAX, Syst em, 905). Ambos são o direito de
penhor, em direito material, convergindo, através da execução, para captar o próprio valor. Por isso mesmo,
se o credor exerce a ação executiva de título cambiário , ou não, renuncia ao seu direito
de excussão real, à diferença do que se passa com o credor pignoratício exeqüente , porque a lei distinguiu
as vias para as pretensões, e o direito material não autoriza pensar-se noutras pretensões que as do art. 3~O,
IV, do Decreto-lei n. 869, de 18 de novembro de 1938, e nas previstas em Código de Processo Civil. O
Código Civil desconheceu o pactum reservati dominii. Tínhamos de ser rigorosos no construir o instituto,
sob pena de cairmos em contradições e dificuldades graves, na prática. Porém, principalmente, em dia com
a ciência, e não com assimilações apressadas.
7)DIREITO EXPECTATIVO E PENHORA. Supõe-se que se tenha começado pela excussão da coisa
vendida, não pelo pedido das prestações vencidas e vincendas, para resilição do contrato. O que vale, para
ser penhorado, é a pretensão a adquirir a propriedade, o direito expectativo, de que se falou, e essa pretensão
só permanece com valor se o contrato se mantém. Portanto, se não foi pedida a resilição. O que vai a leilão é
o direito à aquisição da coisa, não o domínio; o dominio continua com o vendedor, e o direito expectativo
com o comprador, “crescendo com as prestações pagas”. Devido à coexistência do domínio de um e do
direito de outrem, se se penhora a coisa (dominio e direito expectativo), vende-se em leilão a coisa, para,
com ela, se pagar o valor das prestações vencidas e vincendas, que é o valor do domínio reservado, e
entrega-se o restante ao comprador, que nessa quantia terá o valor daquele direito atual e futuro que ia
crescendo. Passa-se então o seguinte: o direito do comprador, uma vez penhorado, garante o direito
obrigacional do vendedor; é vendida a coisa como se vende, por exemplo, a coisa indivisível de que se
penhorou parte; não se precisando recorrer à construção dc que usou a Circular suíça de 31 de março de
1911 (~transformação da propriedade condicional em pura e simples, transformação da propriedade
“reservada” em penhor!).
8)PEDIDO DA VENDA. Pedida pelo vendedor a penhora, por haver o devedor recusado o pagamento, faz-
se a penhora do direito expectativo, sem que o autor perca sobre a coisa o dominio reservado; e o réu terá
prazo legal para contestar. Mas, desde o momento em que se ultimou a penhora, é possível o pedido da
venda. O juiz é que decide de haver, ou não, conveniência na venda imediata, tanto mais quanto a
contestação já lhe pode indicar os pontos da questão e o despacho saneador supõe certa cognição superficial,
em todo o caso eventualmente bastante para se negar a venda em leilão desde logo. Nunca nos esqueça que a
ação do vendedor, com reserva de domínio, se há penhora, é ação de cognição incompleta (superficial) que
se vai completar afinal. Não se dispensa, além disso, em quaisquer casos, a avaliação da coisa.
Não há o leilão de que se fala, se alguém não o requereu (1X~ Câmara Cível do Tribunal de Apelação do
Rio de Janeiro, 24 de maio de 1943, B. J., 29, 69). A medida em caso de fácil deteriorização, ou de
desvalorização, essa pode ser requerida pelo depositário, pelo Ministério Público, ou determinada, de oficio,
pelo juiz.
A ação de apreensão ou de depósito judicial é ação do vendedor com reserva de domínio; não pode ser
atribuida ao pré-contraente vendedor, que entregou a posse (pré-contrato de compra-e-venda), nem a quem
outorgou opção de compra e locou o bem (cf. 4.a Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito
Federal, 18 de agosto de 1944, R. F., 101, 512; R. dos T., 156, 755).
9)LEILÃO; REMIÇÃO E ADJUDICAÇÃO. O leilão não sus~ pende o processo, que nada sofre com o
incidente. Cabe remição, como também adjudicação. A adjudicação é a do valor do direito expectativo (não
a do dominio); a remição transfere o domínio ao comprador executado, desde o depósito.
O leilão que se prevê no art. 1.070, § 15~, que é antes de decisão definitiva, depende de se haverem
observado os artigos 652-654, 659 e outros. Pergunta-se: se o credor-vendedor fez citar o devedor-
comprador e, no prazo de vinte e quatro horas, o devedor-comprador nomeou outros bens à penhora (art.
655), que bastem para o pagamento das prestações vencidas ou da prestação vencida, não pode o credor-
vendedor fazer penhorar-se a posse da coisa vendida com reserva de domínio, porque o devedor-comprador
é titular do direito expectativo e da posse, e o sistema jurídico brasileiro não equiparou a situação do
devedor-comprador a de quem figura como devedor no crédito pignoratício, ou no anticrético ou no
hipotecário, porque o art. 655, ~ 2.0, é regra jurídica especial, não suscetível de interpretação dilatante.
Se o devedor-comprador nomeou à penhora o seu direito expectativo, que lhe atribuiu a posse, então se hão
de atender, estritamente, os § § 1.~ e 2.0 do art. 1.070. (Mais uma vez frisemos que a referência a “penhora
da coisa vendida~~ só seria acertada nas espécies em que credor do vendedor com bem com reserva de
domínio fosse terceiro, ou o próprio comprador-devedor, se esse tem crédito contra o vendedor-credor.) Se
foi o vendedor-credor que propôs ação contra o comprador-
-devedor, a penhora somente poderia ser do direito expectativo, com a posse. Não se diga que o devedor-
comprador, ao ter de nomear bens à penhora, possa nomear a coisa vendida. Aí, a coisa vendida ainda
pertence ao vendedor-credor. O que o comprador-devedor pode restituir é a posse, porque coisa que somente
foi objeto de contrato de compra-e-venda de modo nenhum passou a ser do comprador, seja tal negócio
juridico com a cláusula de reserva de domínio ou sem ela. Apreensão e depósito da coisa vendida pode
ocorrer (art. 1.071 e § § 1.0, 2.~, 3~O e 4.0). O art. 1.071, 3•O, acertadamente fala de poder o autor
(vendedor-credor), se o réu não contestou, nem pediu o prazo para o adimplemento (§ 2.0), mediante a
apresentação dos títulos vencidos e vincendos, “requerer a reintegração imediata da posse da coisa
depositada”. Tudo isso já supõe ter sido arbitrado o valor da coisa (art. 1.071, § 1.0).
10) SUB-ROGAÇÃO DA PENHORA. Só se sub-roga a parte que corresponde às prestações vencidas e
vincendas; não o resto do valor, que corresponde ao que o comprador adquirira (direito expectativo). Regem
os princípios gerais da sub-rogação real.
11)LEILÃo SOMENTE DO DIREITO EXPECTATIIVO. Se as partes acordarem, pode ser levado a leilão
só o direito expectativo, não a coisa. Aquele é alienável em separado, e já separado estava. A venda da
coisa, em leilão, reengloba-os de todo.
Art. 1 . 071. Ocorrendo mora do comprador 1) 2), provada com o protesto do titulo, o vendedor poderá
requerer liminarmente e sem audiência do comprador, a apreensão4) e depósito da coisa vendida 3)•
~ 1.0 Ao deferir o pedido, nomeará ~ juiz perito, que procederá à vistoria da coisa e arbitramento do seu
valor 6), descrevendo-lhe o estado e individuando-a com todos os característicos.
§ 2.~ Feito o depósito será citado o comprador para, dentro em cinco (5) dias, contestar a ação í)~ Neste
prazo poderá o comprador, que houver pago mais de quarenta por cento (40%) do preço, requerer ao juiz
que lhe conceda trinta (30) dias para reaver a coisa 8~>, liquidando as prestações vencidas, juros, honorários
e custas.
§ 30 Se o réu não contestar9), deixar de pedir a concessão do prazo ou não efetuar o pagamento referido no
parágrafo anterior lo), poderá o autor, mediante a apresentação dos títulos vencidos e vincendos, requerer a
reintegração imediata na posse da coisa depositada 5); caso em que, descontada do valor arbitrado a
importância da dívida acrescida das despesas judiciais e extra judiciais 11), o autor restituirá ao réu o saído,
depositando-o em pagamento 12). 49 Se a ação for contestada, observar-se-á o procedimento ordinário, sem
prejuízo da reintegração liminar 13) 14)•
4)PROVA DA MORA E PROTESTO. O que se tem de provar é a mora de pagamento; não o direito de
resiliçào . Porque esse resulta da lei. Além desse pressuposto objetivo, há de ser provado o protesto, com o
respectivo instrumento. Tem-se procurado limitar a ação aos casos de títulos de créditos, para os quais o
negócio reservati domin.ii seja subjacente. Não é isso o que se há de entender. A lei processual exige o
protesto em quaisquer casos. Não cabe invocar-se regra jurídica sobre mora de pleno direito. Por isso
mesmo, a apreensão e o depósito se fazem non audita altera parte.
A referência a protesto tem de ser interpretada no sentido de o protesto ser pressuposto necessário. O
argumento da ~ Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Distrito Federal, a 30 de janeiro de 1945 (A. J.,
155; E. F., 101, 312; J. do T. de A., 25, 35), de poder tratar-se do contrato de compra-e-venda e a cláusula
resolutiva operar automaticamente, é de impertinência gritante: nenhum esbulho há em deixar-se de pagar
prestação de venda a prazo; nem a ação de restituição da posse prestada é ação possessória. Trata-se de ação
executiva, sim, mas para restituição da posse. O protesto atende a que se exige o registro do contrato de
compra-e-venda para eficácia erga omnes e a que a ação, aqui, não é a que resulta do título. Na ação
condenatória ou executiva do vendedor pode acontecer que se haja de protestar,
mas tal protesto é estranho aos pressupostos da ação: se é de exigir-se, é porque a cobrança do título o exige.
Na de restituição da posse preceitada, não se dispensaria protesto de títulos para se ter prova da mora no
pagamento, se o titulo o exige, mas o protesto, que se tem de fazer, em virtude dele, é por inadimplemento
do contrato (a forma é a dos protestos pedidos em juízo). Sem razão, também, a Turma Julgadora do
Tribunal de Apelação do Rio Grande do Norte, a 10 de junho de 1944 (O D., 25, 346).
8)PRAZO LEGAL. O prazo legal é para se reaverem a posse e o uso da coisa, e não o domínio; de modo
que se tem de prestar o vencido, e não o vincendo. O vencido no momento de se esgotar o prazo que a lei
fixa. O vendedor continua com a sua propriedade reservada; e o comprador, com a posse. porque a
propriedade é condicional. Aliás, com a apreensão . o depósito (e até restituição provisória, dita, em lei,
preliminar), em nada se altera (nem a restituição provisória altera) a situação jurídica dos contraentes.
Houve, apenas, pelo exame superficial do caso e as ocorrências, depósito cautelar. O juiz não tem arbítrio
para se negar a marcar o prazo, nem mesmo invocando a regra jurídica sobre diminuição, posterior ao
contrato, do patrimônio do devedor.
No Código de Processo Civil de 1973, art. 1.071, § 2.0, repete-se o que constava do art. 344, §§ 2.0 e 3~O,
do Código de Processo Civil de 1939, de modo que nenhuma relevante mudança ocorreu. Feito o depósito,
cita-se o comprador para, dentro de cinco dias, contestar a ação (= oferecer a defesa). Se já havia pago mais
de quarenta por cento do preço, pode requerer prazo de trinta dias para liquidar as prestações devidas, juros,
honorários e custas e reaver a posse da coisa bem como, entenda-se, haver o domínio que estava reservado.
A lei atual, como a anterior, fala de “reaver a coisa”. Temos de levar em consideração que o comprador,
com reserva de domínio, tinha a posse e o direito expectativo, e mio o dominio, a res. Houve apreensão e
depósito da coisa, que estava em posse do comprador, de modo que, feito o pagamento integral, o
comprador, que tinha perdido a posse, passa a haver o dominio (a res) e a reaver a posse.
processual supõe que o réu conteste, ou que o que não conteste (a diferença entre comparência e revelia é,
aqui, sem relevância). Se não contesta, pode o autor requerer a entrega da coisa. Se contesta, tem de pedir o
prazo legal, para evitar a restituição. Há disjuntiva implícita quanto aos dois pressupostos independentes
para se requerer a restituição : “não contestar”, “contestar e não requerer o prazo”. Nada tem que ver com o
pressuposto para pedir o prazo. O réu que não contesta, mas pede o prazo, escapa a sofrer a restituição
provisória, que é só nos casos de não contestar ou não pedir que se lhe dê prazo. Intercalar, aí, “não
contestar e não pedir que se lhe dê prazo” não traduz o que o legislador entendeu, tanto mais quanto se o
“ou” funciona em lógica e na técnica de interpretação das leis, muitas vezes, como “e”, não é o que mais
acontece: “basta” um dos pressupostos; e as proposições providas de negativas têm tal feição, com
freqüência . “Se não vou, ou não telegrafo, caio em falta”; não caio em falta se vou e telegrafo, nem se não
vou e telegrafo. “Se o réu não contestar, ou não pedir que se lhe dê o prazo” significa: “Se o réu contestar e
não pedir, ou não contestar, ou n~o pedir”. Demais, o prazo é com o deferimento, sem qualquer coisa com a
mora do pagamento (sem razão, Luís MACHADO GUIMARÃEs, Comentários, IV, 465), que deve ter
existido, como pressuposto objetivo da ação, em qualquer caso.
10)REU QUE NÃO CONTESTOU, MAS REQUEREU DAÇÃO DO PRAZO; RÉU QUE NÃO
CONTESTOU NEM REQUEREU DAÇÃO DO PRAZO.
a) Se o réu não contestou, mas requereu que o juiz lhe desse prazo, espera-se que esse corra. Esgotado, se o
comprador não pagou todas as prestações vencidas até o prazo expirar, pode o vendedor, com a apresentação
dos títulos vencidos e vincendos, pedir reintegração imediata na posse. b) Se não contestou, nem requereu se
lhe marcasse o prazo, dá-se entrega ao vendedor, se o requer. c) Se contestou, e não pediu o prazo, tudo se
passa como nos casos b), exceto quanto ao processo, que prosseguirá com rito ordinário. d) Se contestou e
pediu o prazo, prossegue-se com o rito ordinário e aguarda-se que o prazo decorra, podendo dar-se que,
findo ele, tudo mais se passe como em qualquer dos outros casos, exceto quanto ao processo, que continua.
11)CONCEITOS EMPREGADOS. Há vários conceitos que devem ser notados: “valor arbitrado”;
“importância da dívida”, importância que resta quando se subtraiu do preço o que o comprador já pagou;
“acrescida das despesas”, somadas à importância da dívida.
A apreensão do bem vendido com reserva de domínio faz do Estado, do juiz, possuidor mediato, e do
depositário, possuidor imediato. A entrega da posse ao vendedor que, ex hypothesi, não tem posse própria,
pois a prestou por se tratar de venda com reserva de dominio somente pode ocorrer após o depósito em
consignação do saldo. No mesmo sentido, a 5•a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 21 de
abril de 1950 (R. dos T., 186, 261). A 1~a Câmara Civil, a 6 de junho de 1950 (187, 841) parece ter
invertido, sem razão, a ordem. O que devemos entender é que o autor requer a restituição da posse; o juiz
defere, tem o autor de fazer o depósito do saldo, se houver, antes de ser expedido o mandado ao depositário.
Entregue, passa o vendedor a ter toda a posse. Essa é interpretação acorde com o principio de que não se
expede mandado executivo antes de provada a contraprestação. Por outro lado, para que exista saldo e se
saiba qual é, tem-se de ter feito o arbitramento do valor do bem (= avaliação que foi julgada) e o cálculo das
despesas, judiciais e extrajudiciais, comprovadas.
12)RESTITUIÇÃO DO SALDO. A restituição do saldo pode dar-se de dois modos: a) Se houve ou se não
houve concessão de prazo, e houve restituição da coisa, porém não houve processo ordinário. O autor tem de
pedir que os autos sejam remetidos ao contador, primeiro, porque, se o réu não contestou nem pediu prazo,
preço, dívida e valor arbitrado, despesas judiciais e extrajudiciais estão documentadas, e, se o réu não
contestou e pediu prazo, a restituição só se pode ter dado findo o prazo, estando claras todas as quantias. O
autor consigna a quantia, pois ficou com a coisa e o valor arbitrado excede; ou consigna-o o réu, se o valor
não dá para cobrir a dívida. b) Se houve contestação, é diferente: ou a sentença confirma a restituição, ou
não confirma. O autor pode ter recebido, ou não, as prestações vencidas. Desde que não as recebeu, nada
tem de restituir, mas tem de restituir o em que foi condenado. Também o réu condenado tem direito à
restituição do saldo. A consignação em pagamento é aplicável, se for preciso. As despesas judiciais e
extrajudiciais são somadas ao valor da divida do comprador a fim de se apurar quanto o vendedor tem de
restituir ao receber a coisa vendida com reserva de domínio (Tribunal de Apelação de São Paulo, 21 de
julho de 1941, R. dos T., 133, 117).
O que persiste, a despeito do processo ter passado a ser ordinário (art. 1.071, § 4.0), é a medida que de início
se tomou: a apreensão e depósito. A incolumidade é do depósito liminar tidas do valor da depreciação ou
aumentadas cio valor majorado. A massa conserva o seu direito de pedir prazo.
A regra jurídica tem de ser respeitada, sem que se possa atender a cláusulas contratuais em contrário. Trata-
se de ius cogens (1.R Turma do Supremo Tribunal Federal, 10 de setembro de 1958, que se apoiou no que
escrevemos nos Comentários ao Código então em vigor, na 1.a ed., e repetimos na 2.a.).
No que toca a instrumentos a serem constituídos, não podem árbitros se substituir a tabeliães, ou a oficiais
de registro, ou a legislações ; mas nada impede que se tenha de pronunciar sobre a existência, validade ou
eficácia de escrituras públicas, ou de transcrições, inscrições, averbações ou anotações em registros
públicos, ou sobre a existência, validade ou eficácia de regra jurídica.
O capitalismo tem festejado, em muitos Estados, a dirimência de controvérsias entre as corporações e os
trustes, por meio de arbitragens sem homologação, para escapar à publicidade e à fiscalização estatal.
Principalmente, à justiça de outro Estado, quase sempre à justiça do Estado mais fraco. Esses compromissos
feririam a letra do art. 153, § 4~O, da Constituição de 1967, com a Emenda n. 1, se se lhes atribuísse
eficácia fora do que é a vontade dos figurantes em se submeterem, ou se com isso se ofendem direitos de
terceiros.
É de direito pré-processual a regra juridica que permite o juízo arbitral em matérias que não sejam
incólumes à transação, bem assim a que se faça pendente litígio o compromisso arbitral (Código Civil,
1.037-1.048), onde estão as regras de direito material sobre o compromisso.
Também é de direito pré-processual a regra jurídica que abre exceção quanto à pretensão à justiça arbitral,
em se tratando de determinada matéria (e. g., Decreto-lei, n. 960, de 17 de dezembro de 1938, art. 59, que
veda juízo arbitral para cobrança de dívida ativa da Fazenda).
Com o juízo arbitral excluem~-se os juizes estatais, não, porém, os especiais (e. g., matéria dos tribunais de
segurança pública, matéria contra cartéis ou trustes).
Houve quem entendesse que o juízo arbitral é incompatível com o art. 153, § 4~O, da Constituição de 1967,
com a Emenda n. 1; mas isso foi repelido, como devera ter sido (cf. 5.a Câmara Cível do Tribunal de
Justiça do Distrito Federal, 29 de janeiro de 1952, D. da J. de 28 de julho).
2)EFICÁCIA DO COMPROMISSO. Quanto à sua eficácia, o compromisso é negócio de direito material
com eficácia negativa no direito pré-processual (exclusão dos juizes estatais) e eficácia positiva no direito
processual (submissão das partes aos efeitos do laudo arbitral homologado).
Se o compromisso é ligado a certo contrato, a sua validade depende da validade desse, salvo se é de
interpretar-se que se quis aquele sem esse. Não é de afastar-se a promessa pública, unilateral, de juízo
arbitral.
Se o compromisso é para o caso de surgirem divergências na interpretação ou cumprimento do contrato,
somente há compromisso enquanto há contrato.
Ainda mais: tem-se de considerar que o compromisso não se confunde com o pactum de com promittendo,
que é pré-contrato, nem com a promessa unilateral de comprometer-se, em que a obrigação é a de assinar
compromisso.
5) DIREITO ROMANO. No direito romano, as partes podiam renunciar à tutela jurídica estatal a respeito
de questão pendente entre elas e pactar a nomeação de árbitro que examinasse o caso e proferisse decisão.
Assim, em verdade, em todos os povos; tanto mais quanto a resolução das questões somente pelo Estado foi
solução posterior à justiça de mão própria e à justiça dos árbitros.
O direito privado romano teve de enfrentar o problema da não-aceitação da função por parte do arbiter.
Criaram tribunal arbitral, o iudicium privatum do direito clássico, à base da litiscontestação (negócio
jurídico privado, ou processual, pelo qual os interessados ou as partes prometiam submeter ao iudex a
resolução de litígio). A princípio, havia a solenidade de palavras expressivas e taxativas (legis actio); depois,
admitiu-se o escrito (judicium).
Por onde se vê como se veio do árbitro para o juiz estatal, que independe de escolha dos interessados.
O iudicium privatum constava de lista de cidadãos, dentre os quais se escolhia o árbitro. Não podia esse
recusar, porque fazia parte do iudicium privatum. O estado assegurava o cumprimento dos julgados, caso
não o fizesse o vencido.
A arbitragem, livre de todas as peias com o Estado, perdurou. Os árbitros só eram constrangidos a julgar a
causa se houvesse aceito a função.
Discutiu-se se em direito romano podia ser designado árbitro o juiz ordinário. Certo, o iudex pedaneus não
podia ser nomeado (L. 9, § 2, D., de receptis: qui arbitrium receperint ut sustentiam dicant. 4, 8), na mesma
causa, por estar ligado à formula iudicii; mas a L. 3, § 3, foi expressiva:
quem quer que fosse designado e houvesse recebido a arbitragem teria de desempenhar a função, qualquer
que fosse a sua dignidade, salvo se, pelo cargo, não pudesse haver imperium.
(Quando o juiz era nomeado árbitro, o Código Civil, art. 1.045, dispensava a homologação, se a decisão
fosse proferida por juiz da primeira ou da superior instância, nomeado árbitro pelas partes; mas o Código de
Processo Civil de 1939, art. 1.041, derrogou, nesse ponto, o Código Civil, art. 1.045, 2.~ parte. Hoje, o art.
1.097 do Código de 1973 seguiu o que em 1939 se estabelecera. Ainda que tenha sido nomeado árbitro juiz
da primcira ou da superior instância é como qualquer outra pessoa e a lei exige a homologação.)
6)DIREITO MODERNO. O Estado não somente chamou a si a tutela jurídica, como também submeteu a
exame dos seus juizes, no que lhe parece essencial, a decisão dos árbitros, no tocante a validade do
compromisso e do laudo (cf.G.SCADUTO, Gli Arbitratori nel diritto privato, 137 s.).
de 1867, art. 69, a expressão empregada fora mais feliz: “sem efeito”. No Código de 1973, o art. 1.101,
parágrafo único, estatui: “A cláusula “sem recurso” não obsta à interposição da apelação, com fundamento
em qualquer dos vícios enumerados no artigo antecedente; o tribunal, se negar provimento à apelação,
condenará o apelante na pena convencional”.
Na Itália, há mais de sessenta anos, GHIRARDINI (Sull’arbitrato, Rivista di Diritto Civile, 1910, 674 s.,
679) propós explicar o laudo arbitral como produto de iurisdictio minus plena. Tal terminologia borraria as
fronteiras da jurisdição e as linhas entre direito público e direito privado. Aliás, não era nova a escápula. No
século XVII, o jurista português AGo5TINHo BmosA aludia à função dos árbitros como “iurisdictio quasi
ordinaria”, onde ressaltava a contradição nos termos.
J. J. C. PEREIRA E SousA (Primeiras Linhas, 1, 9, nota 29) andou à busca de distinguir a peça lógica do
laudo e o valor da homologação estatal, quando escreveu: “Os nossos magistrados unem e’m si o poder de
conhecer das causas e o de fazer executar as suas sentenças. Os árbitros. porém, não têm a jurisdição
coativa, porque o seu poder somente se restringe a julgar”. E a jurisdição coativa, como ele entendia, haveria
de abranger a imissão na posse, o preceiUo com cláusula ou sem cláusula, a prisão, a penhora, etc. Portanto,
o laudo não tinha, sequer, a eficácia que tem a sentença declaratória da lei processual civil.
A verdadeira construção científica da função do árbitro está em MANUEL GONÇALvES DA SILVA
(Commentaria, 1, 22), que, há mais de dois séculos, e tão acima da “iurisdictio
quasi ordinaria”, a que se referiam AGosTINHo BARBOSA, no século XVII, e GHIRARDINI, no século
XX, ou “minus plena”
proclamou: ..... neque iurisdictionem habent, sed tantum cognitionem”. Há o conhecer só (perito,
jurisconsulto, árbitro), e o conhecer jurisdicionalmente. O árbitro conhece ajurisdicionalmente, e julga; não
pode declarar forçadamente,
nem constituir forçadamente, nem condenar forçadamente, executar forçadamente, nem sequer mandar
forçadamente.
Antes da recepção do direito romano em Portugal já havia compositores, como referia PASCOAL JosÉ DE
MELO FREIRE (Institutiones, 1, 30: “In Lusitania arbitrorum usus iam ante iuris Romani receptionem
inoleverat, et hic initio simplicissimus litium dirimendarum modus”). Nem podia deixar de assim ser,
porque o terceiro pacificador foi fato inicial da evolução da justiça, antes do aparecimento do pacificador
estatal. As Ordenações Afonsinas, Livro III, Título 113, as Ordenações Manuelinas, Livro III, Titulo 81, e as
Ordenações Filipinas, Livro III, Titulo 16, já receberam o direito romano. ~ interessante observar-se que a
Constituição Imperial de 1824, art. 160, continha a seguinte regra jurídica: “Nas causas civeis e nas penais
civilmente intentadas, poderão as partes nomear juizes árbitros. Suas sentenças serão executadas sem
recurso, se assim o convencionaram as mesmas partes”. Depois vieram certas regras de juízo arbitral
necessário (Código Comercial, arts. 245, 294, 302, § 5~o, 348, 736, 739, 750 e 846), contra o que reagiu a
Lei n. 1.350, de 14 de setembro de 1866, art. 1.0, § 1.0. Agora, a Constituição de 1967, com a Emenda n. 1,
art. 153, § 4.0.
Uma das conseqúências do art. 153, ~ 4•O, da Constituição de 1967, com a Emenda n. 1, está em não se
poder, na legislação ordinária, pré-eliminar o exame judicial de qualquer direito individual. A propósito do
juízo arbitral, ou se admite, na legislação ordinária, o recurso, ou é possível, devido à irrecorribilidade, a
apreciação em ação judicial, inclusive, se os pressupostos são satisfeitos, em ação de mandado de segurança.
Admitido o recurso, nos termos dos arts. 1.101 e 1.102 do Código de Processo Civil, não se pode dizer que
haja infração do art. 153, § 4•O, da Constituição de 1967, com a Emenda n. 1, por parte da lei. O único
ponto em que poderia haver discussão seria no tocante ao julgamento por equidade; mas foram os próprios
compromitente~, no negóciojurídico do compromisso, que preferiram o julgamento por equidade.
o compromisso pode ser feito em testamento (SIEGMUNi) SCHLosSMANN, die letzwillige
Schiedsgerichtsklausel, Jherings Jahrbiicher, 37, 202).
O contrato é de direito material privado; a instalação do juízo arbitral ainda o é. ~ de direito público, se a
pretensão de direito material (res deducta) é de direito público (cp. LEo RosENBERG, Lehrbuch, 2.~- ed.,
551; RUDOLF POLLAX, System, 775).
O que é processual é a homologação, de modo que somente com os olhos fitos nesse ato final é que se
considera negócio jurídico processual o compromisso.
Nada impede que as partes se comprometam para que novos árbitros apreciem a validade de laudo arbitral
anterior (RUDoLF POLLAK, System, 776).
Urna das conseqüências de não haver mais, no Código de 1973, como não havia no anterior, diferença entre
o árbitro, que também é juiz estatal, e o árbitro, que o não é, está em que não mais se pode pretender que se
atente à sua categoria para se saber qual o juízo para o qual se apela, nem se há, ou não, recurso.
É de crer-se que a estatui a ação do árbitro, se o árbitro é juiz estatal, tenha entrado em Portugal pela lição
imitativa do padre BATISTA FRAGOSO, na disp. 14, n. 25, que recebeu, de FELINO, de J. MENÓQUIO e
de CAMILO BOREL. As Ordenações Filipinas, Livro III, Título 16, § 3, apenas diziam: “E poderão as
partes tomar por seu juiz árbitro o Juiz ordinário, ou delegado”. Tal como as Ordenações Manuelinas, Livro
III, Titulo 81, § 3, e as Ordenações Afonsinas, Livro III, Título 113, § 8. Portugal não a tinha, porque em
Portugal, antes da recepção do direito romano, os juizes estatais não estavam privados de ser escolhidos para
árbitros. Com a recepção, a dúvida surgiu (tese lusitana, antítese romana) e não se buscou a síntese tortuosa
do privilégio, que foi a estatalização do juiz privado. No século XIII, provavelmente,
D.Dinis manteve a tese lusitana, no citado § 8: “E porque segundo Direito não pode ser tomado por Juiz
Alvidro aquelie, que he Juiz Ordinario ou Deleguado, entre aqueilas partes, que o escolherem por Alvidro,
esto nom embarguante foi antiguamente uzança geral em estes Regnos o contrario;
Mandamos que se guarde a dita uzança antigua, e que livremente possam as partes escolher por seu Juiz
Alvidro (sic) aqueile que for seu Juiz Ordinario ou Deleguado, ainda que o Direito Commuum aja
estabelecido o contrario, como dito he”.
(e) Pode o árbitro condenar em frutos, após a lide percebidos, e nas despesas (MANUEL GONÇALVES DA
SILVA, Commentaria, 1, 26).
Quanto ao atentado, também é possível que dele conheçam os árbitros; mas <~,a aplicação da pena de não
ser ouvido o atentante não pode ser por ato deles? A decisão somente concerne a ter de voltar-se, ou não, ao
estado anterior, o que ~ decisão que tem de ser homologada, para que se dê a eficácia adequada, e de
homologação também depende aquela parte da decisão em que se deixe de ouvir o atentante até que purgue
a mora. Assim, não há limitação ao poder de julgar, e da homologação cabe recurso.
Se surge alguma questão, que seja matéria de ação declaratória acidental, como a de falsidade de
documento, a decisão tem de ser homologada, e também aí há de ser respeitado o prazo do art. 1.099 do
Código de Processo Civil.
Quanto aos embargos de terceiro, somente se admitem quando se inicia a eficácia mandamental ou
executiva da decisão homologada, porque somente nesse momento começa a possibilidade de ofensa a
direito ou posse de terceiro (arts.
9)INCIDÊNCIA E APLICAÇÃO DA LEI, ARBITRAGEM E COGNIÇÃO . Nas ações de cognição, a
procura de conclusões exige série de raciocínios, que apliquem a lei, e sejam a afirmação de que a lei
incidiu. Esse trabalho, que é feito pelo juiz, de modo nenhum se diferença dos outros raciocínios, que os
outros homens, em iguais níveis de inteligência e cultura, realizariam. O cientista somente se distancia
deles, e dos juizes, pelo rigor dos seus métodos e pelo material das suas pesquisas, em que, de regra, não há
interpretação de leis feitas pelos homens (aplicação das leis).
Assim, a atividade do juiz, na matéria de cognição, é a mesma que exercem os outros homens,
principalmente os jurisconsultos e os advogados. Os jurisconsultos, desligados é de supor-se do Estado e
dos clientes, e os advogados, a serviço dos interesses dos seus clientes, são os extremos típicos, teóricos,
entre os quais fica o juiz. Outra figura é a do juiz alterador autoritário da lei, o Praetor, que hoje não temos,
posto que se assista a certa criação mecânica do direito. A diferença de valor entre o parecer do
jurisconsulto, a petição ou minuta (postulações) do advogado e a sentença do juiz está, precipuamente, em
que o valor do parecer só se afere pela ciência, o do trabalho do advogado, pelo que é de ciência e pela
eficiência prática (arte de defender), que pode afastar-se da pureza do raciocínio científico, e o da decisão
do juiz, pelo valor da ciência se e enquanto não se impõe pelo elemento característico da jurisdição,
elemento tipicamente estatal, que é o poder de decidir. Com a coisa julgada formal, esse valor extracientífíco
prevalece, ainda que errada a aplicação da lei ou a apreciação dos fatos. Noutros termos: ainda que cubra a
verdade.
A ação de nulidade de sentença tem por fito evitar que se decida sem observância de pressupostos
necessários. A ação de rescisão de sentença, o de permitir reexame da matéria em circunstâncias especiais,
que se hão de atender a despeito do trânsito em julgado. A homologação do laudo arbitral é apreciação
limitada do laudo; o recurso, exame da homologação, com eventual descida à matéria julgada.
A função do juiz chamado arbitral é resíduo de eras primitivas, antes da estatalizaçao da justiça. A técnica
acomodou-a aos novos tempos. No processo do julgamento arbitral, podem ser vistos os estratos de épocas
imensamente distantes uma das outras: a) o tertius, não-estatal, que junta as mãos dos contendores (arts.
1.080-1.084); b) desde o julgador, que revela a regra jurídica no momento de a aplicar, até o Praetor, com a
aequitas (art. 1.100, VI), ou até o juiz adstrito à lei (art. 1.100, II); c) a superposição do Estado, com o seu
processo e o seu juiz homologante (arts. 1.096-1.102).
O árbitro tem a sua escolha disciplinada pelo Estado e regulada pelo Estado, no direito material. Não se
pode dizer que o Estado só se tenha interessado pelo resultado da sua atividade (a decisão). Interessou-se por
sua criação.
Em grau de apelação é possível a retratação do art. 350 (PEDRO BARBOSA, Commentario, 354, com apoio
em BAuo DE UBÁLDIS e em PAULO DE CASTRO): “in gradu appellationis potest doceri de errore
confessionis”. Os arts. 350, parágrafo único, 351-354 são irrecorriveis.
Interesses de ordem moral, ou não-suscetíveis de transação, não podem ser objeto de compromisso.
Temos aqui de considerar que, durante a lide, pode uma das partes alegar que preexiste, a respeito da res iii,
iudiciurn deducta, compromisso. Então, quem o alega tem de prová-lo, e prova-o com a juntada do
instrumento, ou certidão, ou pública-forma, ou cópia fotostática. Não há, ai, algo de homologação, porque
não se fez por termo nos autos: o juiz tem apenas de julgar se a relação jurídica processual estatal se há de
desconstituir pela procedência da exceção de compromisso. O pacto de com promittendo também gera essa
exceção. Para obrigar ao contrato de compromisso, há a ação do art. 641 do Código de Processo Civil e a de
condenação à pena. Nada obsta a que se invoque o art. 641 do Código de Processo Civil (B.
WINDESCHEID, Lehrbuch, II, 9.~ ed., 851, a despeito do que se dizia em contrário).
Lê-se no art. 1.045 do Código Civil: “A sentença arbitral só se executará depois de homologada, salvo se for
proferida por juiz de primeira ou segunda instância, como árbitro nomeado pelas partes”. Não se disse que
não se pode firmar compromisso sem a necessidade da homologação disse-se que a sentença só se pode
executar (em sentido amplo de ter cumprimento) depois de homologada. Sem a homologabilidade, a decisão
arbitral é sem a tutela jurídica do Estado. Já assentamos que o art. 1.045 do Código Civil foi derrogado na
parte em que permitia a execução da sentença arbitral, independentemente de homologação, se o árbitro era
juiz.
Quanto aos compromissos interiores, em que se regula o que há de ser matéria estatutária ou regulamentar
privada, em verdade não substituem eles à justiça estatal a justiça particular ou arbitral.
Assim, as sanções podem ser morais, ou de simples desligação (e. g., eliminação de sócio), ou disciplinares
(e. g., suspensão do sócio). O poder disciplinar é de reconhecer-se a quaisquer sociedades, em relação a seus
sócios, ou a empresas, no tocante a atos dos seus fregueses ou freqüentadores . Desde que aqueles ou esses
aderem às regras privadas o compromisso se conclui entre eles e as sociedades ou empresas.
As multas são permitidas, mas para que sejam executadas forçadamente, é de mister a homologação, ainda
nas espécies que se previam pelo art. 1.045, 2Y- parte, do Código Civil. Por isso mesmo, a publicidade, que
se dê às decisões que se refiram a atos reprováveis de alguém, pode ser tida como difamatória. Não basta
terem os interessados admitido, previa-mente, a publicação, porque se há de entender que se submeteram à
publicação das decisões justas, e a nenhum direito individual pode ser retirada a tutela jurídica de que cogita
o art. 153, § 4~O, da Constituição de 1967, com a Emenda n. 1. As advertências, repreensões ou
reprimendas, ou censuras são de acolher-se. Bem assim, a recusa, da parte da sociedade ou empresa, de
prestar algum serviço, ou de vender, locar ou emprestar. A expulsão ou eliminação e a suspensão constituem
medidas que se prendem ao vínculo entre os interessados e se podem conceituar como efeitos de condições
resolutivas.
As repreensões e os avisos, se apenas se operam no interior da sociedade, de modo nenhum precisam de
exame estatal, salvo se o exigem os estatutos, ou outra regra jurídica interna, ou lei referente a tais infrações
de regras jurídicas internas.
Quanto às sanções pecuniárias, só se podem exigir se a entidade está de posse de valor pertencente ao
condenado e se a cláusula de dedução da multa não envolve, pelas circunstâncias, autotutela executiva
contrária à estatalidade da execução forçada.
No que toca à vedação de acesso, é preciso que haja subordinação do condenado a sanções de proibição de
ingresso e a prova de que se deu a infração suficiente. Isso não quer dizer que não possa ser invocado o art.
153, § 4•o, da Constituição.
Por sua natureza, o compromisso é negócio jurídico, quase sempre bilateral. São-lhe extensivas algumas
regras jurídicas sobre a transação (Cita. Fa. vox GLUCK, Ausfiihrliche ErlÉiuterun.g der Pandecten, VI, 72;
Código Civil, art. 1.048: “Ao compromisso se aplicará, quanto possível, o disposto acerca da transação (arts.
1.025 a 1.036)”; cf. Código Civil espanhol, art. 1.821). A remissão do Código Civil, art. 1.048, aos arts.
1.025-1.036 há de ser recebida em termos. Quem transige não se compromete; não se submete à decisão de
alguém. Quem se compromete não transige, porque exige o julgamento sem nada conceder. Por isso mesmo
poderes para transigir não envolvem poderes para assinar compromisso; nem poderes para assinar
compromisso implicam os de transigir. A semelhança é por exclusão, em ambos os negócios jurídicos, da
jurisdição estatal, mas, ainda ai, não é completa: a) a transação, feita em juízo, precisa de homologação para
se cumprir; aliter, se extrajudicial; b) o compromisso, para que seja cumprido forçadamente, tem de ser
homologado. Apenas, entre os dois institutos ficam os compromissos e as arbitragens interiores, cujas
variantes são, por isso mesmo, dignas de exame à parte.
O compromisso e a transação são negócios jurídicos indivisíveis (Código Civil, art. 1.026). Só aproveitam
ou prejudicam os que se comprometeram ou transigiram (art. 1.031). Não perimem a ação penal (art. 1.033).
Ambos somente têm por objeto direitos, pretensões, ações e exceções de ordem patrimonial (art. 1.035).
16)CLÁUsULA COMPROMISSORIA . A cláusula com promissória (e. g., “as controvérsias que surgirem
na interpretação ou execução deste contrato serão submetidas a juízo arbitral”) é contrato de compromisso,
ou, mesmo, negócio por declaração unilateral de vontade (e. g., inserta em títulos ao portador), em que ainda
não se determinou a demanda, ou não se determinaram as demandas que têm de ser decididás por árbitros. O
compromisso é o contrato, dificilmente o negócio jurídico por declaração unilateral de vontade, em
que já se determina a demanda submetida ao juízo arbitral. A. eventualidade é que dilata em cláusula,
aplicada a demanda apenas determináveis, o pacto de compromisso.
17) DIVIDAS FISCAIS. A cobrança de dívida fiscal não é suscetível de compromisso (Decreto-lei n. 960,
de 17 de dezembro de 1938, arts. 59 e 76). A convenção das partes, a esse propósito, é nula ipso iure
(nulidade de direito material, Código Civil, art. 145, II; Supremo Tribunal Federal, 16 de junho de 1942, D.
da J., de 24 de novembro e 17 de outubro de 1942, 3011 e 2984, dois acórdãos).
Todavia, a lei especial pode submeter controvérsias de direito fiscal a arbitragem. O Poder Executivo, só por
si, não pode assinar compromisso arbitral.
Em causa própria, ninguém pode ser árbitro (L. 51, D,, de receptis: qui arbitrium receperint ut sententiam
dicant, 4, 8: “Si de re sua quis arbiter factus sit, sententiam dicere non potest, quia se facere iubeat aut petere
prohibeat: neque autem irnperare sibi neque se prohibere quisquam potest”).
19)CLÁusULA PENAL. Assim no negócio jurídico de compromisso, como no negócio jurídico entre o
comitente e o árbitro, pode ser inserta cláusula penal (poena compromissa, pecunia com promissa).
A pena convencional para o caso de insubmissão ao laudo arbitral estabelece alternativa: ou submeter-se ao
laudo arbitral, ou prestar o quanto da pena (L. 2, L. 34, § 1, e L. 38, D., de receptis: qui arbitrium receperint
ut sen.tentiam dicant. 4, 8). Solvida a dívida da pena, pode o compromitente ir ao juízo estatal (L. 30). Essa
a doutrina que chegou até os nossos dias, com SAMUEL STRYK, WOLFGANG ALBRECHT
LAUTERBACH e outros. A diferença está em que, se não há a pena convencional, não há alternativa: o
compromisso gera, no direito brasileiro, a exceção, como gera a ação para que se instale o juízo arbitral.
24) ÂMBITO DA QUESTÃO. São determinadas as controvérsias que possam surgir do negócio jurídico,
ou quanto à divida existente, ou de certas cláusulas ou cláusula negocial. Se a questão sobre a existência da
dívida fica entregue aos árbitros, ou se, antes ou simultaneamente com o compromisso, o devedor
reconheceu a dívida, é questão de interpretação.
Também é questão de interpretação, por exemplo, a de se saber se só se reconheceu a dívida, ou se se
reconheceram a divida e a pretensão, ou se apenas se trata de liquidação.
25)NOMEAÇÃO DOS ÁRBITROS NO COMPROMISSO. O Código Civil, no art. 1.039, 2.R parte, diz
que o compromisso há de conter os nomes, sobrenomes e domicílios dos árbitros, bem como os dos
substitutos, no caso de falta ou impedimento; mas havemos de entender ser permitido deixar-se a outrem, e.
g., à Ordem dos Advogados, a designação. O art. 1.074, II e III, do Código de Processo Civil tem de ser
respeitado, sob pena de nulidade.
26) NOMEAÇÃO PROTRAÍDA. Se os compromitentes declaram que, na ocasião em que algum deles
verificar a instalação do juízo arbitral, cada um designará o seu árbitro, vale a cláusula. Volveremos ao
assunto.
31) LIMITES DO JULGAMENTO. O compromisso delimita as petitiones. Não se pode pedir fora das
linhas que o compromisso traçou. Outrossim, fora da matéria que foi submetida pelas afirmações e
contrariedades.
Pergunta-se:se a decisão excedeu os limites do compromisso, ~,é nula toda ela, ou só a parte? Aqui, cai.e o
principio jurídico de que o inútil não prejudica o útil, ou de que a parte nula não contagia ao todo a sua
nulidade.
32) NOMEAÇÃO DOS ÁRBITROS . A infração das regras jurídicas para a nomeação dos árbitros
determina a nulidade
da nomeação; e essa, a do processo e julgamento arbitrais. Em todo caso, não argúida até a homologação
(Código de Processo Civil, art. 1.099), está sanada. A infração do art. 1.079, 2.R parte, 1, II e III do Oódigo
de Processo Civil, ou regra semelhante, causa nulidade insanável; mas a homologação é sentença que,
trânsita em julgado, somente pode ser rescindida.
34) HOMOLOGAÇÃO. Se o juízo arbitral foi concebido em dois graus, o laudo que se há de publicar em
audiência (art. 1.096) e levar à homologação é a decisão proferida pelo árbitro ou pelos árbitros do segundo
grau.
Proferida a decisão do juiz estatal, em homologação, ou em recurso, a decisão, que é estatal, tem de ser
tratada como as outras decisões estatais, inclusive quanto aos recursos que se podem interpor, sem ser o de
apelação.
Pode ser embargável por infringência do julgado a decisão na apelação. Pode, finalmente, ser interposto
recurso extraordinário
37)PERDA DE OBJETO. Pode ter perdido objeto a controvérsia, como se pereceu o bem sobre cuja
propriedade se havia de decidir e não persiste a questão como prejudicial de indenização, ou outra pretensão.
O compromisso perde a eficácia.
38)ATOS PROCESSADOS NO JUÍZO ARBITRAL. Morto o árbitro, ou mortos os árbitros, ou por outro
motivo tornado sem base o laudo que se não perfez, o juiz ordinário, a quem for apresentada a petição da
ação, não pode fazer eficazes no juízo estatal atos processuais do juízo arbitral, ainda que o árbitro fosse
juiz, ou o próprio juiz ordinário. As provas feitas têm apenas o valor de provas extrajudiciais.
Se a relação jurídica processual estatal foi apenas suspensa, em virtude de só se tratar de um dos pontos
controversos, caso em que só a homologação do laudo, trânsita em julgado, a extinguiria, os atos processuais
anteriores ao compromisso são eficazes e apenas se prossegue no procedimento como se compromisso não
tivesse havido.
Se foi prejudicado apenas o laudo, os atos processuais do juízo arbitral são eficazes para novo julgamento
arbitral. Se a não-homologação alcançou algum ato processual, tudo se resolve segundo os princípios do
direito processual comum.
Seção 1
Do compromisso
Art. 1 . 072 As pessoas capazes de contratar poderão louvar-se 5), mediante compromisso2) escrito, em
árbitros1) 3) 4) 8) que lhes resolvam 6) as pendências judiciais ou extra judiciais 7) de qualquer valor,
concernentes a direitos patrimoniais, sobre os quais a lei admita transação9) lo).
1)CONcEITO DE JUÍZO ARBITRAL. O juízo arbitral é juízo como qualquer outro, quanto à sua função
de julgar, posto que ao seu julgamento falte a homologação que torna
o laudo arbitral decisão a que se há de juntar o “ingresso estatal”. Para que se dê intervenção adesiva é
estrito que o interveniente aceite as conseqüências do julgado arbitral como se o pronunciasse o juiz estatal.
Também se permitem a denunciação da lide e a nomeação à autoria, porém não cabem efeitos contra o
litisdenunciado ou o nomeado se antes não os admitiram ou não os aceitam expressamente.
Quanto aos litisconsórcios unitários ou simplesmente necessários a eficácia da sentença arbitral, mesmo
homologada, não os atinge, salvo: a) se se comprometeram também, explicitamente, posto que
posteriormente, aderindo ao compromisso; b) se admitiram, por atos inequívocos, o compromisso, como se,
citados, para a integração da relação jurídica processual, não alegaram a incompetência do juízo arbitral, que
tanto importa dizer-se que não argúiram a falta de compromisso da sua parte.
A força de coisa julgada material da sentença arbitral não obriga além dos termos do compromisso; nem,
claro, o juiz estatal tem de atender a ela de ofício. Os efeitos quanto a terceiros dependem da situacão desses
terceiros no compromisso.
O Código supõe o compromisso regido pelo direito material. Quanto ao direito processual, ele regula o
juízo arbitrai, mas invade o direito material, com regras remissivas, ou heterotópicas .
3) ÁRBITRO E ARBITRADOR. O arbitrador é perito; o árbitro julga; por isso é, a despeito de não ser
completa a sua decisão, juiz.
Árbitros são os judices compromissarji ou arbitri compromisarji. O árbitro, iudex compromissarius, ou
simplesmente compromissarius (L. 41, D., de receptis: qui arbitrium receperint ut sententiam dicani, 4, 8; L.
4, D., de tutoribus ei curatoribus datis ab his qui jus dandi habeni, ei qui ei in quibus causis specialiter dari
possunt, 26, 5). Compromissário é a pessoa a que se confiou, no compromisso, a função de dar a sentença.
Compremitentes são as que entre si se prometeram sujeitar-se a decisão de árbitro ou de árbitros e ao mesmo
tempo designaram os árbitros ou preestabeleceram o modo de escolha. Comprometer-se é invicem
promitiere.
O árbitro recebe o arbítrio, a nomeação. O negócio jurídico é outro, e o receptum arbitrii não se confunde
com o compromissum. De regra, é voluntária a aceitação, o receptum arbitril; mas é possível que haja
vinculo entre o designado como árbitro e o compromitente, ou entre o árbitro e outrem, que prometeu ao
compromitente, de modo que tenha dever de receber a função.
4)ARBITRAMENTO E ARBITRAGEM. A terminologia jurídica, para ser precisa e evitar erros a que a
sinonímia levaria, chamou “arbitramento” a atividade ou o ato do arbitrador, e “arbitragem” a atividade ou o
ato do árbitro.
7) DEVER DE DECIDIR. Os árbitros, desde que aceitam a função, ou desde que estão ligados a dever de
exercê-la, têm o dever de decidir. Resta saber-se se há ação contra os árbitros que não querem funcionar, ou
não querem dar o voto, e qual é essa ação. A actio in factum de receptis foi fantasia de Ax’roNIus
CONTIUS (Disputationes iuris civilis, 1, 524). O Pretor, conforme a L. 15, D., de receptís: qui arbitrium
receperint ut sententiam dicant, 4, 8, disse que obrigaria o árbitro a dar sentença (sententiam se arbitrum
dicere coacturum), mas GERH. NOODT (Commentarius in Pandectas, 138) chamou atenção para a omissão
de “quod iudicium de ea se dare velit”, que aparece noutros edictos do Pretor. .JULIANO, na L. 11, § 5,
alude à pena cominada ao árbitro no compromisso.
A cominação pode ser inclusa em petição condenatória, de modo que essa é a solução certa, ainda se não foi
preestabelecida a pena no receptum. Na L. 32, § 12, PAULO refere-se à multa que o Poder podia cominar:
“Si arbiter sese celare temptaverit, practor eum investigare debet, et si diu non paruerit, multa adversus eum
dicenda est”. Se não foi preestabelecida a pena, pode cominar multa o juiz. O que não temos hoje é qualquer
outro meio de constranger de que, no plano do direito público, podiam lançar mão os juizes romanos cum
imperio maíori.
Além da ação de condenação, com a cominação, há a ação de condenação pelas perdas e danos causados
pelo inadimplemento do dever de decidir, ativamente legitimado qualquer dos compromitentes.
Nas ações que contra ele se proponham, pode o árbitro alegar: a) que houve calúnia da parte à sua honra (L.
9, § 4, D., de receptis: qui arbitrium receperint ut sententiam ciicant, 4, 8: “lulianus ait, si eum infamaverunt
litigatores, non omnimodo praetorem debere eum excusare, sed causa cognita”; J. VOET, Commentarius ad
Pandectas, 1, 230); b) que está impedido de funcionar, ou por doença grave, ou cargo necessário (necessaria
profectio), ou múnus público, que lhe retire o poder ser árbitro, ou noutro impedimento superveniente, que
seja “iusta excusationis causa” (J. VOET, 1, 230), como incapacidade, cegueira, perda da r~acionalidade
brasileira; c) que se tornou ou descobriu que era impedido ou suspeito para funcionar como árbitro (Código
de Processo Civil, arts. 1.079, III e 135).
No caso de viagem necessária e urgente, primeiro há de o árbitro pedir às partes prorrogação do prazo que
lhe foi dado para a decisão (cp. L. 21, § 5, L. 25, § 1, L. 32, § 21, L. 50). Na L. 33 e na L. 50 preexcluía-se a
prorrogabilidade se a sentença teria de ser proferida em determinado dia. Se as partes acordam em que ainda
se profira a sentença, a despeito de já ter transcorrido a data, outro compromisso se concluiu.
Se ainda não se esgotou o prazo, pode o árbitro ou podem os árbitros pedir aos compromitentes que
prorroguem, e o pacto de prorrogação insere-se no negócio jurídico do compromisso e no negócio jurídico
entre o árbitro ou os árbitros e os compromitentes, de modo que não há falar-se de outro compromisso, nem
de outro negócio jurídico entre árbitro ou árbitros e compromitentes.
8) FALTA DO DESEMPATADOR. Lê-se no art. 1.042 do Código Civil: “Se as partes não tiverem
nomeado o terceiro árbitro, nem lhe autorizado a nomeação pelos outros (art. 1.040, n. V), a divergência
entre os dois árbitros extinguirá o compromisso . Aí, o que se previa era o empate, sem que tivesse havido
nomeação do desempatador e sem que se houvesse deixado aos próprios empatantes, ou a terceira pessoa,
designar o desempatador. Os árbitros podem ter sido dois, quatro, seis, ou mais, ou em número ímpar, mas
com a excluibilidade de algum ou alguns por impedimento, ou recusa, ou outro fato que o haja de afastar. Se
não foi nomeado árbitro desempatador, a despeito de serem os árbitros em número par, não se pode hoje,
invocar o art. 1.042 do Código Civil. O que importa é o que está no art. 1.076 do Código de Processo Civil.
Se os árbitros divergem quanto à nomeação do terceiro, então se extingue o compromisso (arts. 1.076 e
1.077, V).
9)LEGITIMAÇÃO ATIVA NO COMPROMISSO. Quem quer que seja capaz de contratar, isto é, de ser
figurante em contrato, pode louvar-se em árbitros, em documento escrito, O que se supõe é que possam
contratar, no tocante ao assunto que vai ser julgado pelos árbitros, ou pelo único árbitro, se é o caso. Não se
trata, porém, de única exigência, que seria a de capacidade negocial. ~ preciso que, no que respeita ao
objeto, possa dispor, transigir. Não basta, portanto, ser apenas “capaz de contratar”. A capacidade é
elemento subjetivo. No art. 1.072, fala-se de revelar “pendências judiciais ou extrajudiciais”, como se só se
pudesse figurar em compromisso se alguma questão pende. Houve, aí, impropriedade de expressão. Por
outro lado, leis especiais podem afastar qualquer juízo arbitral, como ocorreu no Decreto-lei n. 960, de 17 de
dezembro de 1938, art. 59, que não admite submeter-se a juízo arbitral a cobrança de divida ativa da União.
Art. 1 . 073. O comprOmissO é judicial ou extra judicial 1). O primeiro celebrar-Se-á por termo nos autos,
perante o juízo ou tribunal por onde correr a demanda; o segundo, por escritO público ou particular,
assinado pelas partes e por duas testemunhas 2)
1) EsPÉCIES DE COMPROMISSO. O compromisso pode ser celebrado fora de juízo, ou, em juízo, por
termo nos autos, perante juiz ou membro do tribunal por onde correr a demanda, conforme a lei de
organização judiciária e o regimento. Já caracteriZamoS, em nota ao Capitulo XIV, as duas espécies.
o compromisso extrajudicial não supõe que esteja a correr a demanda, razão por que a expressão
“pendências judiciais”, que apareceu no Código Civil, art. 1.037, e passou ao Código de Processo Civil de
1973, art. 1.072, tem de ser apontada como errônea. Interessados em alguma relação jurídica podem
vincular-se a juízo arbitral sem que haja controvérsia e até mesmo em cláusula de negócio jurídico,
contratual ou não, do qual possa provir a relação jurídica. Ai, o compromisso se antepõe até a irradiação de
efeitos do contrato ou de negócio unilateral.
Tem-se chamado à cláusula negocial que submete a juízo arbitral as questões, que exsurjam do negócio
jurídico em cujo instrumento ela está, cláusula compromiSsória . É compromisso posto em instrumento
público ou particular como cláusula. Tal inserção não deforma o instituto. Apenas ocorre a unidade da
instrumentação. Não se diga que ela se distingue do compromisso, em que nela se prevêem questões
oriundas do contrato em que ela está e o compromisso já se refere ao ocorrido (a posteriori). Seria a priori a
função autorizada. Sem razão, ENRICO REDENTI (Diritto Processuaie Civile, III, 461). Pode ser feito
compromisso, em contrato separado, a respeito de direitos, pretensões e ações oriundos de outro contrato,
anterior ou posterior. A diferença é apenas formal e não de conteúdo. A cláusula compromissória é apenas
uma das espécies de compromisso, no tocante à colocação do negócio jurídico.
2) ESCRITO PÚBLICO OU PARTICULAR. O art. 1.073, 2.~
parte, alude a escrito público, ou particular, assinado pelas partes (aliás, pelos figurantes, porque pode ainda
não ser parte em qualquer processo). Advirta-se, porém, que iex specialis, aqui e ali, exigem escritura
pública a respeito de determinados objetos de negócio jurídico, e não se pode admitir compromisso em
escrito particular, por exemplo, se a controvérsia é quanto à propriedade de imóvel.
4)OBJETO DO LITíGIO. Acertadamente se fez elemento necessário, sob pena de nulidade, a referência ao
objeto do litígio, com todas as especificações, inclusive o seu valor. Dir-se-á que seria afastar-se a cláusula
negocial em que se estabelece o compromisso relativamente a todas as causas surgiveis ou surgidas entre os
figurantes. Mas, ai, a nulidade seria inalegável pelos figurantes, ou entre o promitente unilateral e unus ex
publico, como se da declaração unilateral de vontade contra a indicação do árbitro ou dos árbitros. O Código
de 1973, no art. 243 (Código de 1939, art. 273, II), estatui que, se a lei procurou determinada forma, sob
pena de nulidade, a decretação desta não pode ser requerida pela parte que lhe deu causa. Exigem-se as
especificações do objeto do litígio, sem que isso afaste que apenas se diga qual a espécie de litígio (e. g.,
“todas as ações relativas a compras entre os figurantes do compromisso”, “as ações de redibição e de
rescisão de contratos entre os figurantes por sócios das coisas vendidas”). A cláusula “todas as causas
ligadas ao contrato que assinamos acerca de móveis” é satisfatória, porque determina a espécie.
5)VALOR DA CAUSA. Se o compromisso se refere a determinada ação, sabe-se qual o valor, pelo menos
aproximadamente. Se o compromisso é quanto a quaisquer causas entre os figurantes do compromisso que
venham a ocorrer, não se sabe o valor. Não se poderia incluir na especificação o que ainda se ignora.
6)Honorários DOS PERITOS E DESPESAS PROCESSUAIS. Fácil é atender-se ao art. 1.074, IV, mesmo
se a ação não foi proposta, isto é, se não há pendência da lide. Ou a responsabilidade é do vencido, ou de
ambos os figurantes, ou de quem fez a declaração unilateral de vontade, de que emergiu o compromisso. Em
princípio rege o art. 20.
Art. 1 . 075. O compromisso poderá ainda conter:
1 o prazo em que deve ser pro ferido o laudo arbitral 1);
II a condição de ser a sentença arbitral executada com ou sem recurso para o tribunal superior;
III a pena para com a outra parte, a que fique obrigada aquela que recorrer da sentença, não obstante a
cláusula “sem recurso” 2) 3).
IV a autorização aos árbitros para julgarem por eqúidade , fora das regras e formas de direito 4).
1) PRAzO PARA O LAUDO ARBITRAL. O compromisso pode conter o prazo em que há de ser proferido
o laudo arbitral. Se expirado o prazo, extinguiu-se o compromisso (art. 1.077, III). Se o compromisso se
refere a dois ou mais litígios ou possíveis controvérsias, a regra juridica de extinção somente atinge aquele
litígio ou controvérsia que estava em julgamento arbitral.
O art. 1.081 cogita do dever dos árbitros quanto ao prazo e desde quando o prazo começa.
2)RECORRiBILIDADE E IRRECORRIBILIDADE. O Código de 1973 explicitamente prevê que possa
haver ou não haver recurso da decisão arbitral. A referência é a recurso “para tribunal superior”, mas
havemos de entender que o recurso pode ser para algum juízo singular, ou para alguma entidade com função
que se possa assimilar à de justiça. No art. 1.101 trata-se de recurso em caso de homologação ou recusa de
homologação do laudo arbitral; e o art. 1.101, parágrafo único, frisa que a cláusula “sem recurso” não obsta
a interposição de apelação, com fundamento em qualquer dos vícios enunciados no art. 1.100. Nada tem tal
recurso, que está na lei, com o recurso concernente ao conteúdo do laudo arbitral.
3)RECURSO INTERPOSTO, CONTRA A CLAUSULA “SEM RECURSO”. O Código Civil, art. 1.040,
III, prevê a cláusula relativa a pena, a que fica obrigado qualquer dos figurantes, se recorre, a despeito de
haver a cláusula sem recurso, pena que não pode exceder o terço do valor do pleito. O Código de 1973 pôs
isso no art. 1.075, III, porém sem alusão ao máximo da pena. Tem-se de respeitar o direito material.
4)JULGAMENTO POR EQUIDADE. Os árbitros decidem por equidade, como os juizes, nos casos
previstos em lei (art. 127), ou se os figurantes do compromisso lhes deram tal autorização (art. 1.075, IV).
Se podiam fazê-lo, os árbitros têm de dizer, no laudo, expressamente, que a decisão foi dada por eqúidade
(art. 1.095, II).
Se não foi autorizado o julgamento por equidade, a decisão, que nela se baseou, é nula (art. 1.100, VI); salvo
se foi a lei que disse ser caso de se julgar por equidade, porque então a equidade, a aequitas, se fez lex. Cf.
Tomo II, 345-351.
Os árbitros recebem os poderes para julgar: ou somente para a aplicação das regras jurídicas constantes do
direito vigente, tal como acontecia se fossem órgãos do Estado, juizes no sentido estrito; ou também
conforme a equidade. Para isso, é preciso que os figurantes do compromisso lhe tenham dado tal autorização
especial, sem que se possa afastar que, em vez da palavra “eqúidade”, se haja empregado outra, que diga o
mesmo. O que é preciso é que a respeito não haja dúvida. Por exemplo: “quanto possível, levar a
composição amigável”, o que nem sempre equivale a “quanto possível, buscar solução eqúitativa” (cf.
GUIDO ZANOBINI, L’Esercizio privato deite funzioni e dei servizi pubblici, n. 146; PIERO
CALAMANDREI, Studi sul processo civite, II, 4 s.).
Para que se peça solução à eqUidade, é preciso que a regra jurídica que, no caso, incide não afaste qualquer
temperamento do seu rigor, isto é, que não haja ofensa da lei. Isso não significa que os figurantes do
compromisso, com intuito de conciliação (cp. arte. 447-449), autorizem os árbitros a encontrar soluções que
conciliem as partes. Advirta-se que, quer quanto à eqUidade, quer quanto a isso, a sentença homologatória
do juiz aprecia o exercício dos poderes e de seus limites, conforme expressamente constam do compromisso
as autorizações.
Quando a lei prevê a decisão por eqUidade, os árbitros podem julgar por eqUidade, porque o próprio
sistema jurídico o estabelece para os órgãos do Estado. Trata-se de parte integrante da legislação, o que
dispensa a autorização dos árbitros.
Se alguma regra jurídica que os árbitros teriam de aplicar é de ordem pública, até aí não pode ir a
autorização pelos figurantes do compromisso para que se atenue a implicação com invocação da eqUidade.
Mesmo se no compromisso foi atribuido aos árbitros o poder de julgar por eqUidade, ~,podem eles abster-se
de chegar até ai e satisfazer-se com a rigorosa observância da lei? A resposta não é fácil, porque, se, no caso,
a solução por equidade não ofende regra jurídica e, em vez disso, a completa, há dever dos árbitros; se não é
caso para se recorrer à eqUidade, não há dever. Tem-se de deixar à decisão homologatória a apreciação da
existência de tal dever e da falta em que os árbitros incorreram.
Art. 1 . 076. As partes podem nomear um ou mais árbitros 1), mas sempre em número impar. Quando se
louvarem apenas em dois (2), estes se presumem autorizados a nomear, desde logo, terceiro árbitro 2)•
1) NOMEAÇÃO DE ÁRBITROS A nomeação de árbitros ficou sujeita ao número ímpar: um, ou três, ou
cinco, etc. Com isso se tem por fito evitar, o mais possível, o empate; e dissemos o mais possível porque em
juízo de três membros, ou cinco, ou mais em número ímpar, pode ocorrer que não haja maioria, por ser
diferente dos votos dos outros em discordância o voto de um. Não se fez regra jurídica cogente a do art.
1.076, no tocante à imparidade. Há apenas algo de recomendação. Por isso, se os figurantes do compromisso
se louvam em dois, podem eles, desde logo, nomear o terceiro árbitro. Pergunta-se: <;se se louvaram em
quatro, ou em seis, ou em oito, etc.? O que se há de assentar é que o art. 1.076, in une, apenas exemplificou.
2)EscusA DE ARBITRO, SEM HAVER SUBSTITUTO. A regra jurídica do art. 1.077, 1, supõe que os
figurantes do compromisso não hajam previsto a possibilidade de algum dos árbitros se recusar a aceitar a
nomeação, verbis “escusando-se qualquer dos árbitros”. Trata-se, portanto, apenas de não-
-aceitação. Se já aceitara, não pode mais afastar-se da incumbência.
4) DO PRAZO PARA O LAUDO ARBITRAL. O artigo 1.075, 1, faz inserível no compromisso a cláusula
de prazo para o laudo pericial. Se há desatendimento, extingue-se o compromisso. Dá-se o mesmo se há
prazo legal, o que pode acontecer. No direito brasileiro, o prazo para se proferir a decisão arbitral não é
requisito essencial do compromisso (Código Civil, art. 1.040, 1, verbis, “poderá também declarar”; Código
de Processo Civil de 1973, art. 1.075, 1). Se foi “fixado” o prazo, faz parte do compromisso feito, e o
compromisso exige a forma escrita do art. 1.038, 2.~ alínea, do Código Civil, cf. Código de Processo Civil
de 1973, art. 1.075, para ser alterado. Se o prazo não foi marcado, a fixação e a alteraçao do prazo são af
ormais, podendo reger-se pelas normas comuns de prova. A prorrogação do prazo não é novo compromisso
(certo, já L. MATTIROLO, Trattato, 1, 761; sobre a acidentalidade do prazo, E. CODOVILLA, Dei
Compromesso e dei Giudizio arbitrale, 220 e 221). Mas a simples alteração do contrato formal subordina-se
também a regras jurídicas de forma, sem se precisar recorrer ao argumento de se tratar de prazo e ser esse
elemento essencial ao compromisso (certo, já, na fundamentação, por exemplo, LODOVICO MORTARA,
Comentario, III, 3.~ ed., 126, porém não na conclusão).
O art. 1.077 supõe o prazo estipulado no compromisso ou fixado na lei. No compromisso, entenda-se; ou na
alteração, que compromisso é. Se a decisão arbitral é dada fora do prazo, rege o art. 1.100, VIII, da lei
processual que, em vez de considerar inexistente a sentença arbitral e, pois, não homologável, a considera
(existente e) nula. Tal nulidade se sana com a sentença de homologação, que, ainda assim, pode ser
rescindida se cabe invocar-se o art. 485, V. Note-se que a sentença de homologação, que é estatal, cobre
nulidades, se transita em julgado, expondo-se apenas, à ação rescisória. Naturalmente, a sentença de
homologação pode ser inexistente (não-sentença), ou nula ipso jure, como qualquer outra sentença de juiz
estatal.
No art. 1.040 do Código Civil, disse-se que o compromisso pode declarar o prazo em que deve ser dada a
decisão arbitral. Se o prazo foi a contar da instalação do juízo arbitral, extingue-se-lhe, concluído ele, a
competência. Se foi a contar da data do compromisso, e não se instalou, competência não há para se iniciar o
juízo arbitral. Extingue-se o compromisso, conforme o Código de 1973, art. 1.077, III.
“Si in compromisso certus tempus praefinitum sit”, escreveu MANUEL GONÇALVES DA SILVA
(Commentaria, 34), com toda a precisão técnica, “nisi intra illud sententia proferatur, fiitur compromissum”.
A permissão de ser dada, em maior prazo, a sentença arbitral, é outro compromisso, que faz conteúdo seu o
que existiu, devendo obedecer às regras jurídicas de forma. BATISTA FRAGoso quem, depois de
AGosTíi~mo BARBOSA, mais aprofundou, no velho direito, o instituto do compromisso no seu livro
Regiminis Reipublicae Christianae, em 1641, 1, d. 14, n. 31, acentuou que cessa toda a função do árbitro
com a expiração do prazo e, ainda quando se dê aos árbitros, no compromisso, a faculdade de prorrogação,
só uma vez podem dela usar, salvo se foi dito o número de vezes. O prazo de prorrogação não há de exceder
o prazo original.
A diferença entre renovação e prorrogação á da máxima importância. Os árbitros não podem renovar; os
árbitros podem ter o direito, que se lhes atribua, de prorrogar o prazo. Renovar só o podem os
compromitentes. Se o prazo expirou sem que se ultimasse a função dos árbitros, o direito de prorrogação
extinguiu-se. Porque só se prorroga o prazo que ainda está a correr. E renová-lo não o podem os árbitros,
pois seria renovar o compromisso, em que não foram figurantes, ou o negócio jurídico entre os
compromitentes e os árbitros, em que foram figurantes, bilateralmente, e perdeu toda a eficácia.
Algumas vezes, os juizes árbitros, para ganhar tempo, ou por simples comodismo, convertem o julgamento
em diligência, a fim de escaparem à expiração do prazo para o laudo, ou aos prazos legais (arts. 1.077, V,
1.093 e 1.096). Tais resoluções arbitrais não são “sentenças”, pois não decidem; e toda conversão do
julgamento em diligência é substituição da sentença que havia de ser proferida, por interlocutário, que não
se previra. Não interrompem nem suspendem o prazo a que se refere o art. 1.075, 1, e 1.077, III, qualquer
que ele seja (faltou à resolução o conteúdo de sentença, cf. FRANCE5CO CARNELUTTI, Sentenze
arbitrali di comodo, Rivista, VII, Parte II, 58-62).
Cumpre, porém, atender-se a que, se houve a indevida conversão , ou ela foi (a) seguida de expiração do
prazo, que ela mesma pretendia dilatar, sem ter tal força, ou não no foi (b). No caso (a), a infração é do
prazo mesmo e o artigo 1.077, III, faz extinto o compromisso: a sentença, que se proferir, é nula, pela falta
de função de juiz. No caso (b), a fraus legis, aí, não importa, de jure condito, nulidade, ou ineficácia, nem
extinção, de modo que, embora abusiva a conversão, é irrelevante.
A regra jurídica do art. 1.077, IV, não se aplica se o compromisso foi instituido em testamento para ações
deixadas em disposição testamentária.
Seção II
Dos árbitros
Art. 1.078. O árbitro é juiz de fato e de direito 1) e a sentença que pro ferir não fica sujeita a recurso, salvo
se o contrário convencionarem as partes2).
1) FUNÇÃO DO ARBITRO. O árbitro é como o juiz, porque se desestatatizou, ai, a função de atender à
pretensão à tutela jurídica. Há algo de intercalar, entre a primitiva justiça de mão própria e os órgãos do
Poder Judiciário, como se algo da proteção tivesse saído do Estado; mas algo ficou, que foram as regras
jurídicas sobre a nomeação dos árbitros e a exigência da homologação pelo órgão do Estado. A sentença
arbitral, com ou sem se levar em consideração a homologação, não é sujeita a recurso, salvo se os
compromitentes incluíram no compromisso ou em adendo a ele a cláusula de recorribilidade. Da sentença do
juiz estatal, que homologue ou não, o laudo arbitral, cabe apelação (art. 1.101). A irrecorribilidade da
sentença arbitral nada tem com a sentença de homologação.
O árbitro ou os árbitros decidem quanto às quaestiones Jacti e quanto às quaestiones iuris. O que é de grande
relevância é saber-se qual a controvérsia ou quais as controvérsias submetidas ao juízo arbitral (art. 1.100,
m), o objeto do litígio (arts. 1.074, III e 1.095, 1, 2.~ parte), bem como a extensão subjetiva da relação
jurídica (pessoas que instituem o juízo arbitral, art. 1.074, 1).
No art. 1.078 diz-se que o árbitro é juiz de fato e de direito e a sentença que proferir não fica sujeita a
recurso, salvo se o contrário estabelecerem as partes. No art. 1.101, estatuído está que cabe apelação da
sentença que homologa, ou não, o laudo arbitral, e o parágrafo único frisa que a cláusula “sem recurso” não
obsta à interposição da apelação, com fundamento em qualquer dos vícios enumerados a respeito
da invalidade do laudo arbitral (art. 1.100). Assim, pode haver cláusula de recorribilidade da sentença
arbitral (laudo arbitral), o que permite recorrer-se antes da homologação; e a apelabilidade inafastável da
sentença que homologar ou negar homologação ao laudo arbitral. No Código de 1939 não havia a regra
jurídica do art. 1.078, 2.~ parte (“e a sentença que proferir não fica sujeita a recurso, salvo se o contrário
convencionarem as partes”). Aliás, já então era possível convencionar-se haver árbitro que sentenciasse, ou
árbitros, que sentenciassem, mais árbitro ou árbitros que recebessem a função recursal, uma vez que ainda
não fora homologada ou denegada a homologação da decisão arbitral (Código de 1939, art. 1.046).
Mesmo se há recorribilidade da decisão arbitral, têm as partes a proteção, em recurso de apelação interposto
contra a sentença homologatória, não só quanto às questões de direito e de fato como também no que
concerne à invalidade do laudo arbitral (arts. 1.100 e 1.101, parágrafo único), ainda que tenha sido inserta a
cláusula “sem recurso
A convenção quanto à recorribilidade tem de ser atributiva, em se tratando de laudo arbitral, e restringente,
no que toca à sentença homologatória. Ali, não há recorribiidade, salvo cláusula que a estabeleça; aqui, há
sempre a apelação e, mesmo que se haja convencionado a cláusula da irrecorribilidade, a apelação persiste
quanto a todos os vícios que o art. 1.100 enumera.
Art. 1 . 079. Pode ser árbitro quem quer que tenha a confiança das partes.
Excetuam-se 1):
1 os incapazes2);
II os analfabetos3);
III os legalmente impedidos4) de servir como juiz (art. 134), ou os suspeitos de parcialidade (art. 135) 5) 6)
8)
Parágrafo único. A exceção de impedimento ou de suspeição 7) será apresentada ao juiz competente para a
homologação.
Passa-se o mesmo com o legatário se a arbitragem concerne ao objeto legado, ou se a decisão poderia tornar
cumprivel ou não o legado.
3)ANALFABETOS. De lege ferenda, diz-se, assaz criticável é a regra de que os analfabetos são incapazes
para o juízo arbitral. Se têm a confiança da parte, difícil é atinar-se com a ratio legis.
Mas os argumentos a favor da exclusão são fortíssimos:
dificilmente poderiam analfabetos conhecer textos de lei ou ler ou examinar documentos; não poderiam
escrever; a própria Constituição de 1967, com a Emenda n. 1 (art. 147, § 3•O, a), lhes veda a legitimação
ativa eleitoral.
4)IMPEDIDOS E SUSPEITOS. Quem seja impedido de servir como juiz ou suspeito de parcialidade não
pode ser árbitro. As espécies de impedimento são as que aponta o art. 134: se é parte na controvérsia (art.
134, 1), se interveio com outorga de poderes da parte, ou como representante legal (não só como
mandatário, como está no art. 134, II), ou funcionou como perito, órgão do Ministério Público, ou prestou
depoimento como testemunha; se, como juiz, já funcionara, tendo proferido sentença ou decisão (quem fora
juiz na ação e não chegara a proferir qualquer decisão, pode ser nomeado árbitro), tal como se há de
entender o art. 134, III; se, no momento, está postulando como advogado da parte o seu cônjuge ou qualquer
parente seu, consangüíneo , ou afim, em linha reta, ou na linha colateral até o segundo grau (art. 134, IV),
salvo, portanto, se já se afastara tal advogado; se a pessoa
é cônjuge, ou parente, de algumas das partes, em linha reta, ou na colateral, até o terceiro grau (art. 134, V),
aliter, se cônjuge desquitado; se órgão de direção ou de administração de pessoa jurídica, parte na causa
(trata-se aqui, conforme o art. 134, VI, de presentante, porque a representação já foi objeto do art. 134, II e
IV). O art. 134, parágrafo único, é invocável. Há suspeição de parcialidade suficiente para se vedar a
nomeação do árbitro: se amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer das partes (art. 135, 1), o que exige
alegação e prova; se alguma das partes é credora ou devedora da pessoa a que se quer dar a missão de árbitro
ou do seu cônjuge, ou de parentes deles em linha reta ou, na colateral, até o terceiro grau (art. 135, II); se a
pessoa é herdeiro presuntivo, donatário ou empregador de algumas das partes (art. 135, III); se a pessoa
receber dádivas antes ou depois de nomeado árbitro, aconselhar alguma das partes a respeito do objeto da
causa ou subministrar meios para atcnder às despesas da causa (art. 135, IV); ser interessado no julgamento
da causa em favor de uma das partes (art. 135, V). A despeito de a nomeação ser a líbito de cada parte,
compreende-se que exija não haver qualquer das situações que a lei enumera, porque quem se escolhe é
como juiz, para função arbitral.
8) LÍNGUA PORTUGUESA. Uma vez que se não excluiram da competência para ser nomeado árbitro os
estrangeiros, surge o problema da língua. ~Estão privados de ser árbitros os Brasileiros ou estrangeiros que
não saibam exprimir-se na íngua do Brasil? Não; podem exprimir-se noutra língua que a portuguesa e até
exigir que se traduzam documento& e testemunhos que não entendam. O que foi dito em língua estrangeira
tem de ser traduzido para se levar à homologação.
Art. 1 . 080. O árbitro, que não subscreveu o compromisso, será convidado 1) a declarar, dentro de dez (10)
dias, se aceita 2) a nomeação; presumindo-se que a recusou se, nesse prazo, nada responder 3)•
1)INvITAÇÃo DO5 ÁRBITROS. Instituído o juízo arbitral, invitam-se os árbitros nomeados. Pode ser que
o compromisso tenha sido feito diante deles e eles já aí se manifestem. A nomeação é dependente de
aceitação; não aceita, é como se não tivesse havido. O dever de aceitar somente existe se alguma lei ou
regulamento de sociedade ou outra pessoa jurídica o determina.
Se o interpelado não responde, entende-se que recusou (silêncio como resposta negativa). Se há lei ou
regulamento que estabeleça o dever de funcionar, essa presunção desaparece, porque é iuris tantum; e
entende-se que aceitou. Salvo se a lei mesma ou o regulamento adotou outra sanção.
2)“RECEPTUM”. Nomeado o árbitro, ou aceita ou não aceita. Se não aceita, extingue-se o compromisso, e
o mesmo ocorre se falece, ou cai em incapacidade, ou, simplesmente, não pode decidir, e não há substituto.
Pode ocorrer que aceite e, depois, recuse ou aconteça impedimento ou suspeição, e tudo se passe com a
extinção do compromisso, se não há substituto. O Reg. 737, de 25 de novembro de 1850, art. 439, não
admitia a recusa depois da aceitação; daí, a regra jurídica constante do art. 440.
3) PRESUNÇÃO DA RECUSA. Feita a invitação que pode ser em ato intimativo, ou por outro meio, como
se o árbitro está presente à audiência, ou ao ato do compromisso e o assina tem ele dez dias para responder
se aceita a nomeação. Se não responde, há a presunção de que recusou.
Art. 1 . 081. O árbitro é obrigado a proferir o laudo no prazo 1) do art. 1 . 075, n. 1, contado do dia em que é
instituido o juízo arbitrai2) 3)•
1)PRAZo PARA O LAUDO ARBITRAL. Se há prazo para que se profira o laudo arbitral (advirta-se que o
prazo no compromisso não é elemento essencial, apenas pode ser fixado), tal prazo se conta do dia em que
se instituiu, portanto, do dia em que foi aceita a nomeação pelo único árbitro, ou por todos, se há dois ou
mais (art. 1.085). pergunta-se: se os figurantes do compromisso não inseriram no instrumento ou em
aditamento a referência ao prazo, ~.como se há de entender que houve o prazo, ou qual tem de ser? O que se
tem de assentar é que o prazo pode constar de alguma lei especial, ou regulamento, ou não constar; se não
consta do compromisso, nem de outro ato, nem de qualquer regra jurídica, qualquer dos compromitentes tem
legitimação a requerer que o juízo marque o prazo, ou eles o marquem, seguindo-se a intimação.
2) PRORROGAÇÃO DO PRAZO. Pode dar-se que se preveja em cláusula negocial, posta no instrumento
do compromisso, ou em aditamento, ou em lei, a prorrogabilidade do prazo, ou ao arbítrio dos árbitros, ou
mediante requerimento ao juízo, ou diretamente aos compromitentes. Não se supõe haver prorrogabilidade
se não há texto em que se baseie o requerimento. A renovação do prazo depende dos compromitentes, mas é
preciso que se haja afastado a incidência da regra jurídica de extinção do compromisso.
3)CONVENÇÃO DAS PARTES E FORÇA MAIOR. Os compromitentes podem convencionar
prorrogação do prazo para o laudo arbitral (analogia com o art. 265, II). Também a força maior pode ser
alegada antes de findo o prazo que estava estabelecido (cf. art. 265, V).
2) Motivo JUSTIFICADO. Justo é o motivo se não foi voluntário o afastamento, isto é, se proveio de razão
que existia para não ser árbitro e fora ignorada, ou se adveio à aceitação e tinha o árbitro de ir à renúncia. De
qualquer modo, há de ser feita a prova, para que o juiz examine o que ocorreu. Qualquer impedimento ou
suspeição basta; mas o árbitro tem de submeter a exame o que alega.
Art. 1 . 083. Aplicam-se aos árbitros1) no que couber, as normas estabelecidas neste Código 2) acerca dos
deveres e responsabilidades3) 4) dos juizes (art. 133).
2)EsPÉCIES MAIS RELEvANTES. Entre as regras do direito processual comum, aplicáveis ao juízo
arbitral, estão as relativas à comparência da parte. Uma das primeiras questões é a da revelia de alguma
delas; outra, a da não-presença, segundo se tira do art. 1.092.
Foi-se o tempo em que a contumácia significava infração do dever de comparecer, indispensável à função do
processo, então principal, de composição da lide. * Contra contumaces omnia iura clamante A concepção do
processo-luta apagou-se aos poucos, apenas ficando o “irredutível” correspondente aos fatos da vida e onde
esse elemento é verdadeiramente irredutível. Já nos referimos, alhures, a que concepção posterior, política e
econômica, serviu a ficta confessio (a não-comparência como falta de argumentos contrários e, pois,
confirmação pelo adversário). Nem a uma nem a outra pertence a concepção contemporânea, precisamente,
no Código. Temos, no Código de 1973, o art. 343, § 2.0, de que adiante falaremos. Se a parte, intimada não
comparecer, ou, comparecendo, se recusar a depor, o juiz aplica-lhe a pena de confissão (art. 343, § 2.0). Os
fatos alegados têm-se como confessados (art.
343 § 1.0). A lei processual (art. 9•O, II) provê quanto ao curador do preso, ou do citado por edital, ou com
hora certa, o que elide quaisquer conseqüências exageradas da revelia. Temos dito que o Código exige
angularidade a algumas relações jurídicas processuais; mas a angularidade produz-se a despeito da revelia.
Daí, exatamente, o tratarem-se os casos do art. 741, 1, como de nulidade ipso jure, e não como de
inexisténcia. ~ assaz expressivo, na técnica do Código, que se tenha a falta de citação como causa de
nulidade, e não como causa de inexistência da relação jurídica processual em ângulo.
Advirta-se em que não foi essa, sempre, a solução. Os juristas repeliam o processo à revelia no juízo arbitral.
O 06-digo não permite tal atitude. O juízo comum tem de homologar a sentença contra o revel, aplicando as
regras jurídicas comuns.
Perante os juizes árbitros (a) não se pode exigir a caução às custas de que fala o art. 835 (MANUEL
GONÇALVES DA SILvA, Commentctria, 1, 29); nem (b) serem condenados àcondução ou a despesas as
testemunhas, como permite o art.
412, no juízo estatal (MANUEL GONÇALVES DA SILVA, COmrflefltarja, 1, 22). Não cabiam penas de
preclusão por ausência, mas hoje cabem.
3) CoxríssÃo PERANTE O JUÍZO ARBITRAL. A confissão, feita perante o árbitro, faz a mesma prova
que a confissão perante o juízo estatal (MANUEL GONÇALVES DA SILvA, Commentaria, 1, 30), apenas
a sentença mesma está dependente da homologação. Se não se pede a homologação da sentença, ou se é
negada, a inestatalização do laudo ou a coisa julgada da sentença denegatória destrói a confissão mesma.
Nada obsta (frisou BATISTA FRAGoso, Regiminis Reipublicae Christianae, II, Livro V, disp. 14, § 1.0, n.
47) a que, em grau de apelação, se dê algunia confissão .
~,Qual a solução para o caso de não quererem as testemunhas depor? <;Podem os árbitros rogar os juizes
estatais para que as intimem a depor no juízo arbitral, ou para que as intimem para eles mesmos tomarem os
depoimentos?
Há terceira solução, que é a melhor. Os árbitros, que para isso são legitimados, pedem aos juizes estatais o
depoimento das testemunhas, com base nos arts. 846-848, 863-865.
Assim, evita-se que se impossibilite o julgamento, e ao mesmo tempo que se atribua aos árbitros a
constrição pessoal.
As partes, no juízo arbitral, podem ter de depor (depoimento pessoal). A determinação de depoimento da
parte é sob pena de confessa. Os arts. 342-347 SãO invocáveis.
Uma vez proferido o laudo arbitral, cessava qualquer poder dos árbitros, de modo que não mais podiam
alterar a decisão (L. 17, § § 6 e 7, L. 18 e L. 27, § 3, O., de receptis:qui arbitrium receperint ut sententiam
dicant, 4, 8).
Na l.~ ed. dos ComentáriOs ao Código de 1939 (VI, 563, s.), ficamos com MANUEL GONÇALVES DA
SILVA, que em verdade concebia regra jurídica dispositiva, segundo a qual, se não foi atribuida aos árbitros
a facultas corrigendi ou declarandi sententiam, é de entender-se que não a têm. Hoje, pensamos que se hão
de inverter os termos da regra jurídica: se lhes não foi negada, têm-na eles.
O Código de Processo Civil, art. 1.083, diz que, nos casos omissos, se hão de invocar as regras jurídicas do
processO comum. o argumento contra a permissão da reclamação do art. 463, 1, do Código de Processo
Civil e da oposição dos embargos de declaração, que é o de existir o prazo do art. 465, pode ser afastado,
facilmente: O tempo para a reclamação é antes da homologação; e os embargos de declaração têm prazo
curtíssilno (Código de Processo Civil, art. 465). Não há, porém, suspensão do prazo para o depósito.
Art. 1 . 084. O árbitro tem direito a receber os honoráriOs que ajustou pelo desempenho da função’>. À falta
de acordo ou de disposição especial no compromiSso, o árbitro, depois de apresentado o laudo, requerera ao
juizo competente para a homologação que lhe fixe o valor dos honorários por sentença2), valendo esta como
título executivo.
1) DEsPESAS. No juízo arbitral não há custas,~ há despesas. As despesas com a produção de provas,
inclusive arbitramento, têm de ser pagas pelos compromitentes interessados, aos quais os árbitros podem
exigir depósito de quantia suficiente. A condenação ao pagamento das despesas deve ser feita no final do
laudo arbitral, conforme os princípios que regem a condenação a custas e despesas, no juízo estatal. O que
foi prestado pelas partes tem de constar do laudo arbitral, bem assim as custas e despesas que foram pagas
no juízo estatal, competente para a homologação da sentença dos árbitros, inclusive se ao juízo estatal foi
requerida alguma diligência ou ato, como a carta precatória, para a produção de alguma prova, ou algum ato
processual.
2)HONORÁRIos DOS ÁRBITROS . O art. 1.084 estatui sobre o direito dos árbitros a percepção de
honorários. Ou no compromisso, ou em ato separado, foram estipulados os honorários e a forma de
pagamento, os árbitros têm de pedir ao juízo competente para a homologação do laudo arbitral que os fixe
por sentença, que tem 3 de executividade, razão para se lhe atribuir a classificação como titulo executivo
sentencial (art. 584, 1), como sentença em ação condenatória (5 de condenatoriedade, e 4 de
declaratividade). De tal sentença do juiz que é o competente para a homologação do laudo arbitral, cabe
recurso de apelação. Dá-se o mesmo se os honorários, no seu quanto, constavam do compromisso ou de ato
jurídico separado.
Seção III
Do procedimento 1) 2)
1)COMPROMISSO E guizo ARBITRAL. Conforme antes dissemos, ou o juízo arbitral é instituído após o
compromisso, talvez em data que foi determinada, ou consta do próprio negócio jurídico do compromisso,
o que é difícil ocorrer
antes do compromisso, para que com ele se ratifique.
Art. 1 . 085. Considera-se instituído 1) o juízo arbitral, tanto que aceita a nomeação pelo árbitro, quando um
(1) apenas, ou por todos, se forem vários 2)~§ j•O Quando o juízo for constituído de mais de um (1) árbitro,
funcionará como presidente 3) o mais idoso, salvo se as partes, no compromisso, convencionarem de outro
modo.§ 2.~ O presidente ou o árbitro designará o escrivão4).
ser que só um seja o árbitro e ele aceite. Também pode ser um, com substituto: se o nomeado não aceita,
com a aceitação pelo substituto, instituído, eficacizado, está o juízo arbitral. Se há dois ou mais, sem que um
deles aceite, extinto está o próprio compromisso. Aliter, se há substituto que
aceite.
3)PRESIDENTE DO jUízo ARBITRAL. Se há dois ou mais árbitros, é presidente do juízo arbitral o mais
idoso. Com isso se acentua a rigorosa observância do igual tratamento dos árbitros. Mas, se as partes, antes
da nomeação dos árbitros, ou mesmo depois, entenderam que algum deles, que não éo mais idoso, seja o
presidente, tem-se de atender ao que se acordara. A escolha posterior à aceitação de modo nenhum é motivo
justo para que algum dos árbitros renuncie à função.
Art. 1 . 086. O juízo arbitral pode tomar depoimento das partes, ouvir testemunhas 1) e ordenar a realiza çâo
de perícia 2). Mas lhe é defeso ~):
1 empregar medidas coercitivas, quer contra as partes, quer contra terceiros;
Ii decretar medidas cautelares;
Art. 1 . 087. Quando for necessária a aplicação das medidas mencionadas nos nu-
meros 1 e li do artigo antecedente, o juízo arbitral as solicitará à autoridade judiciária competente para a
homologação do laudo4).
2) PROVA PERICIAL. Trata-se de exame, vistoria ou avaliação. Quem nomeia o perito é o árbitro único,
ou o presidente do juízo arbitral. É indeferida a perícia se a prova do fato não depende de conhecimento
especial de técnico, que faça a vistoria, que examine, avalie, ou se desnecessária por haverem provas
produzidas que bastem, ou se está verificado que é impraticável (art. 420, parágrafo único). Nomeado o
perito, podem as partes, dentro de cinco dias, contados da intimação do despacho de nomeação do perito,
indicar o assistente técnico e apresentar os quesitos (art. 421, § 1.0). O art. 421, § 2.0, é invocável. Também,
os arts. 422-439.
3)MEDIDAS COERCITIVAS E MEDIDAS CAUTELARES. Qualquer constrição é vedada, de regra, no
juízo arbitral. As próprias medidas cautelares. Por exemplo: se o terceiro, sem justo motivo, se recusa a
exibir documento ou coisa, e descumpre a ordem de depositar, no prazo de cinco dias, o juiz expede o
mandado de apreensão, requisitando, se necessário, força policial (art. 362); no juízo arbitral, tem o árbitro
ou o presidente do juízo arbitral de solicitar à autoridade judicial competente para a homologação do laudo
que ordene o depósito, ou, no caso de desatendimento, a expedição do mandado. As outras medidas
coercitivas obedecem à mesma regra jurídica, se há necessidade, o que ao juiz solicitado caLe apreciar.
Passa-se o mesmo com qualquer das medidas cautelares (arresto, seqüestro , caução, busca e apreensão,
exibição, produção antecipada de prova, alimentos provisionais, arrolamento de bens, justificação, protesto,
notificação e interpelação, homologação de penhor legal, posse em nome do nascituro, atentado, protesto e
apreensão de títulos, arts. 796-887 e dos arts. 888 e 889).
Art. 1 . 088. Instituído o juízo arbitral nele correrá o pleito em seus termos’).
Art. 1 . 089. Se já estiver pendente a causa 2), o presidente ou o árbitro, juntando o compromisso ou depois
de assinado o termo (art. 1 . 073), requererá ao juiz do feito que mande entregar-lhe os autos mediante
recibo e independentemente de traslado 3) 4)~
1)PLEITO PERANTE O JUIZO ARBITRAL. O procedimento do pleito perante o juízo arbitral tem de ser
como se o árbitro ou os árbitros fossem juizes estatais, razão por que excepcionalmente se passa a função ao
juiz competente para a homologação do laudo arbitral. Não importa se já estava pendente a lide no juízo
estatal, ou se não estava.
Aqui surgia questão, que era de grande relevância, e havia de ser resolvida de lege lata, uma vez que, de lege
ferenda, os argumentos pró e contra a regra jurídica dispositiva que desse por cessada a instância, se ocorreu
compromisso, eram fortes, de lado a lado, mas, em verdade, uns não destruiam os outros. De lege ferenda,
seriam, aliás, cinco, pelo menos, as soluções possíveis: a) se nada se dispôs no negócio jurídico do
compromisso, que é negócio jurídico de direito material, haviamos de entender que a relação jurídica
processual cessou (regra jurídica, dispositiva, quanto à eficácia anexa, desconstitutiva da relação jurídica
processual); b) se nada se dispôs quanto à cessação da relação jurídica processual, tinha-se de considerar que
somente houve negócio jurídico de direito material sem a eficácia anexa, de que acima se falou (regra
jurídica, dispositiva, quanto à ineficácia desconstitutiva de relação jurídica processual); e) quando se
comprometiam as partes, o compromisso, dito judicial, tinha a eficácia que teria a transação ou a desistência
(regra jurídica, cogente, quanto à eficácia anexa, desconstitutíva da relação jurídica processual, como se dá
com a transação e a desistência); d) quando se comprometem as partes, a relação jurídica processual
continua, de modo que somente se extingue com o trânsito em julgado da decisão homologatória do laudo;
e) em caso de dúvida, era de se assentar que se não extinguiu a relação jurídica processual.
A solução era a solução e). Na falta da convenção, a solução a) leva a ter-se por extinta a relação jurídica
processual, de modo que se trata a espécie como se tivesse havido desistência. A homologação mesma não
se referiu a desistência, nem se convencionou extinguir-se a relação jurídica processual. Podia bem ser que
se aproveitasse tudo que definitivamente ocorreu na relação jurídica processual até o momento em que se
firmou o compromisso. O efeito da homologação é o que resulta da lei ou do acordo de suspensão (art. 265,
II); na lei, o que provém da homologação tem O mesmo efeito que tem a desistência ou a transação. O
compromisso, hoje, é tratado como a desistência: a transação resolve a controvérsia; o compromisso é para
se resolver. O juizo em que, pendente a lide, se firmou o compromisso, já os compromitentes haviam
reconhecido como competente. O compromisso não o afasta, no que ele, processualmente, colabora
digamos assim na arbitragem: cabe-lhe nomear desempatador, se é o caso, julgar a suspeição do árbitro, se
esse ou a parte, que o nomeou, não a admitiu; os autos são entregues aos árbitros, mediante recibo,
independentemente de traslado, porém volvem sempre que não terminou por homologação do laudo o juízo
arbitral; a homologação do laudo cabe ao juízo em que se acordou no juízo arbitral, de jeito que, se há dois
ou mais juízos originariamente competentes, está preventa a jurisdição.
Na ordinariedade dos casos, o compromisso já implica saída condicional do juízo estatal. A convenção é que
pode estabelecer a eficácia da simples suspensão.
A exceção de compromisso obsta à formação da relação jurídica processual; o compromisso, pendente a
lide, extingue-a, salvo cláusula do compromisso. Aí, se se quis que a relação jurídica não se extinguisse,
apenas se fez pacto que entra na classe de que cogitou o art. 265, II, do Código de Processo Civil, quando
enunciou que se suspende o processo por convenção das partes. Se se deixou que se extinguisse, cabe à
homologação do contrato de compromisso eficácia semelhante à da transação e à da desistência. Mais com a
desistência, porque não se julgou o mérito.
Se a lei entendesse que se há de ter como regular a conservação da relação jurídica processual, teríamos a
solução a). Se os árbitros excedessem o prazo, ou por outra qualquer razão perdesse eficácia o compromisso,
inclusive por ter sido decretada invalidade, as partes retomariam o curso do procedimento estatal, como se
interrupção não tivesse havido.
Se se admitiu como regular a extinção, tem-se de iniciar outra relação jurídica processual estatal, se por
alguma causa se ineficacizou o compromisso, inclusive se lhe foi decretada a invalidade.
Se a relação jurídica não se extinguiu, como que dorme. Observe-se, portanto, que, na esteira da tradição do
direito nacional, o lapso de estatalidade, enquanto se procede à arbitragem, tem a seguinte explicação: a
relação jurídica processual subsiste, mas condicionalmente, e o que se substitui, também condicionalmente,
é o juiz.
Temos, hoje, o art. 267, VII, que atribui ao compromisso arbitral a eficácia extintiva.
Art. 1 . 090. O juízo arbitral responde pela restituição dos autos 1), depois do julgamento ou da extinção do
compromisso 2)•
1)REsTITuIÇÃO DOS AUTOS. Tenha havido, ou não, extinção do processo, os autos têm de ser
restituidos ao juízo, que os entregou ao presidente do juizo arbitral ou ao árbitro único. O que mais acontece
para a restituição é ter havido compromisso pendente a causa; mas, se não estava pendente, o compromisso
pode ser levado para homologação, a fim de se evitar qualquer dúvida que possa surgir. Julgada a ação,
objeto do compromisso arbitral, tem de ser homologada, necessariamente, a decisão do juízo arbitral. Os
autos ficam no juízo estatal em que houve a homologação. Não se levam os autos.
Quer seja judicial o compromisso, quer extrajudicial, o procedimento é no juízo arbitral. Aí, operada está a
desestatalização, mesmo se estava pendente a causa. Se autos havia em ‘órgáo judiciário, são entregues ao
juízo arbitral. Ou ao presidente do juízo arbitral ou ao árbitro. Uma vez que há três ou mais árbitros e um
presidente, a ele é feita a entrega; se não há presidente, todos têm de assinar o recibo. Não seria de admitir-
se a entrega a qualquer deles. Quem recebeu ou quem substituiu quem recebeu é responsável pela
devolução.
2)ExTINÇÃo DO COMPROMISSO. Qualquer que tenha sido a causa da extinção do compromisso (art.
1.077), os autos do compromisso homologado (feito nos autos perante o juízo ou o tribunal, ou por
instrumento público ou particular) têm de ser restituidos, e. g., se o árbitro ou qualquer dos árbitros se
escusou de aceitar, ou se faleceu ou foi impossibilitado de votar, sem haver substituto, ou se expirou o
prazo do art. 1.075, 1, ou se faleceu uma das partes e deixou herdeiro incapaz, ou houve divergência dos
árbitros quanto à nomeação de terceiro.
Art. 1 . 091. As partes podem estabelecer o procedimento arbitral 3), ou autorizar que o juízo o regule’) 2)~
Se o compromisso nada dispuser a respeito, observar-se-ão as seguintes regras ~):
1 incumbe a cada parte, no prazo comum de vinte (20) dias, assinado pelo juízo, apresentar alegações e
documentos;
Ii em prazo igual e também comum, pode cada uma das partes dizer sobre as alegações da outra;
lii as alegações e documentos serão acompanhados de cópias, para serem entregues a cada um dos árbitros e
à parte adversa, sendo autuados pelo escrivão os originais.
Art. 1 . 092. Havendo necessidade de produzir prova ~) (art. 1 . 086), o juízo designará audiência de
instrução de julgamento5).
2) DECIsÃO ARBITRAL. O julgamento dos árbitros é suscetível de força e efeito peculiares à sentença na
ação de que se trate. Não é possível dizer-se que o laudo é declarativo, porque o laudo pode ser em ação
declarativa como em ação de condenação, constitutiva, mandamental, ou executiva. A palavra “execução”
que aparecia no Código de 1939, art. 1.041, não tinha o mesmo significado que a palavra “execução”, na
expressão “execução de sentença”, ou na expressão “sentenças executivas”. Felizmente, o Código de 1973,
art. 1.097, deixou de empregá-la.
Art. 1 . 093. O juízo pro ferirá laudo fundamentado no prazo de vinte (20) dias1).
§ 1.0 O laudo será deliberado, em conferência, por maioria de votos e reduzido a escrito por um relator 2)
3).
§ 2!> O árbitro, que divergir da maioria, fundamentará o voto vencido.
Art. 1 . 094. Surgindo controvérsia acerca de direitos sobre os quais a lei não permite transação4) e
verificando-se que de sua existência ou não dependerá o julgamento, o juízo suspenderá o procedimento
arbitral5), remetendo as partes à autoridade judiciária competente.
Parágrafo único. O prazo para pra ferir o laudo arbitral recomeça a correr, depois de juntada aos autos a
sentença, passada em julgado, que resolveu a questão prejudicial.
1)PRAZO PARA SE PROFERIR O LAUDO ARBITRAL, O prazo para se proferir o laudo arbitral é de
vinte dias. Dentro de tal prazo há de estar a audiência de julgamento (art. 1.096), ou a audiência de instrução
e julgamento (art. 1.092). Se, porém, surge controvérsia acerca de direitos sobre os quais a lei não permite
transação e se verifica que de sua existência dependerá, ou não, o julgamento, o próprio juízo arbitral
suspende (note-se bem: suspende) o procedimento arbitral, para que as partes remetam a questão ou às
questões ao juízo estatal competente para tal julgamento, ou tais julgamentos.
2) JULGAMENTO. A deliberação há de ser em conferência, por maioria de votos; e reduzida a escrito por
um dos árbitros, que é o relator, ou o vencedor, se aquele foi vencido. O art. 1.092, combinado com o art.
1.096, mostra que a deliberação é na audiência de instrução e julgamento, como ocorre nos juízos estatais,
ou só de julgamento; porém as duas audiências do art. 1.092 são no mesmo dia, ou com intervalo, se foram
marcadas antes, ou a segunda depois da primeira, com ciência e aquiescência das partes.
Aí, no art. 1.093, §§ 1.0 e 2.0, apenas se referiu o caso de serem três ou mais árbitros, porém há o de só
haver um árbitro, juízo singular. Tem ele o prazo de vinte dias para proferir o laudo, que há de ser
fundamentado como se o juízo fosse coletivo.
A falta de fundamentação é causa de invalidade (artigos 1.100, VII, e 1.095). Se o juízo é coletivo, qualquer
ou quaisquer votos divergentes, vencidos têm de ter a sua fundamentação. Advirta-se que a fundamentação
pode ser dos divergentes, acordes entre si, e até no tocante aos vencedores ou vencidos cada um, a despeito
de conclusões idênticas, podem ter de mostrar os seus fundamentos.
Os fundamentos podem ser concernentes às quaestiones e às quaestiones iuiis, sem se afastar a possibilidade
da divergência ser apenas quanto aos fundamentos. O relator escreve o laudo, com os dados exigidos pela
lei; ou, se o juízo for de um único árbitro, por esse. O que importa é que os vencedores e cs vencidos dêem
as razões para decidirem e para divergirem. Sempre que os vencedores ou divergentes entre si discordem
com os fundamentos, a despeito da unicidade da conclusão ou das conclusões, devem fundamentar cada um
dos seus votos. Isso é um assunto para exame do juízo que tem de analisar e homologar o laudo arbitral.
3) EMPATE. Se há empate, o árbitro desempatador, se o há, decide, porém não é obrigado a decidir pela
adoção de uma das decisões, o que constituiria traço do primitivismo do juízo arbitral, no qual ainda
interessava mais resolver que resolver bem, mais “cortar o litígio” do que realizar o direito objetivo. Se,
porém, os pedidos são diferentes, pode aqui seguir a um, e ali a outro árbitro. A conferência do
desempatador com os outros árbitros não é necessária. O desempata-dor pode exigi-la.
O compromisso pode autorizar os árbitros a nomear desempatador (Código Civil, art. 1.040, V). Hoje, rege
o art. 1.076.
Sempre que os árbitros nomeiam o desempatador têm de dar ciência às partes; se o não fazem, nulo é o
processo, porque o desempatador se insere na relação jurídica processual como julgador. MANUEL
GONÇALVES DA SILVA (Commentaria, 1, 38) foi claro: “in casu vero, quo possent arbitri eligere tertium,
debent illum eligere vocatis partibus, quae possunt suspectos nominare, alias nuílitas esset”.
Surgem alguns problemas. Se os árbitros, embora em número ímpar, empatam (e. g., dois no sentido a, um
no sentddo b, e dois no sentido c, e não se previu o empate, <como se há de resolver? Ou o compromisso, ou
algum ato posterior em aditamento, previa a solução com a nomeação de desempatador, ou alguma lei a
estabeleceu, ou o julgamento não se ultimou. ~ Os compromitentes têm de nomear o desempatador? A
solução, por analogia, é a do art. 1.076, 2.~ parte. Os árbitros nomeiam o desempatador.
4)DIREITOs INTRANsACIONAvEIs . Uma vez que se pode concluir negócio jurídico de compromisso se
o objeto pode ser objeto de transação, tinha-se de atender à circunstância de depender do exame da espécie
antes de se proferir o laudo arbitral. Não seria de admitir-se que a prejudicialidade da questão fizesse
julgável por árbitros o que a lei não lhe permite.
Se o julgamento depende de existir tal direito, ou mesmo de não existir, ou de poder ser exigido, ou não
(pretensão e ação), só o juízo estatal pode proferir sentença a respeito.
5)SUSPENSÃO DO PROCEDIMENTO ARBITRAL. Uma vez que alhures tem de ser julgado o que
concerne a direito que não pode ser objeto de transação, compreende-se que se suspenda o procedimento.
Uma vez que já se iniciara o prazo para o julgamento arbitral, a suspensão somente pode cessar quando haja
transitado em julgado a sentença e tenha sido junta aos autos. A data da juntada é que recomeça a correr o
prazo para o laudo arbitral. Observe-se que a lei não fez o intervalo ser interruptivo do processo, mas sim
suspensivo. Quanto ao prazo, não; houve interrupção. Portanto, recomeçar, aí, é continuar de correr, findo o
intervalo.
No art. 1.094 supóe -se que surja controvérsia sobre direitos que não permitem transação. Se isso enche todo
o objeto do litígio, o juízo arbitral é incompetente, por força de lei. Pode acontecer, porém, que o seu
julgamento apenas dependa do que se decidiria no tocante ao que é intransacionável. Por exemplo: trata-se
de questão de verba testamentária e uma das partes alega que o testador não podia deixar de respeitar a
legítima, porque seria filho ou neto do testador, e precisa dar prova da filiação ou da descendência. A
questão sobre respeitar-se a metade necessária não é estranha ao juízo arbitral, mas a questão de ser a
pessoa, ou não ser, descendente é estranha ao juízo arbitral. Tem-se de remeter tal questão à autoridade
judiciária competente. Dá-se o mesmo se alguém se apresenta para alegar ou se um dos compromitentes
alega que era cônjuge do falecido, ou que a ação de desquite não tinha sido julgada, com a necessária
eficácia.
A decisão do juízo arbitral fica dependendo do que o juízo estatal julgar. Trânsita em julgado tal sentença,
tem de ser junta aos autos, porque se tratou de questão prejudicial. O árbitro ou árbitros respeitam a res
judicata e o prazo para o laudo, que fora interrompido, recomeça a correr.
4)ASSINATURA, DIA, MÊS, ANO E LUGAR EM QUE FOI ASSINADO O LAUDO ARBITRAL.
Todos os árbitros têm de assinar o laudo arbitral, seja um ou sejam alguns vencedores e outro ou outros
vencidos. No Código de 1939, art. 1.038, § 1.~, dizia-se:“Será válido, entretanto, o laudo assinado pela
maioria dos árbitros, uma vez que assim hajam todos resolvido em conferência”. Nos Comentários ao
Código de 1939, Tomo XV, 201, dissemos: “outro traço do primitivismo do juízo arbitral: os árbitros
restantes, vencidos, não estão sujeitos a prestigiar a decisão; nem, sequer, obrigados a assinar o laudo”. O
Código de 1973, art. 1.093, § 2.0, explicitamente estatui: “O árbitro, que divergir da maioria, fundamentará
o voto vencido”. Os árbitros tem os deveres e a responsabilidade dos juizes estatais. Cf. art. 1.081, 1.082,
1,1.083 e 133.
Art. 1 . 096. O laudo será publicado em audiência de julgamento 1)~ O escrivão dará, no mesmo ato, a cada
parte uma (1) cópia do laudo e remeterá os autos, em que este foi proferido,, ao cartório do juízo competente
para a homo logação2), dentro em cinco (5) dias.
1)JULGAMENTO E PUBLICAÇÃO . Ou a audiência foi para instrução e julgamento, por ter sido
indispensável produção de provas, ou foi só para julgamento. Em ambas as espécies, a publicação é na
audiência, com o que o Código de 1973 simplificou a solução. No mesmo ato, tem o escrivão de dar a cada
parte uma cópia do laudo e de remeter os autos ao cartório do juiz competente para a homologação. O prazo
para isso é de cinco dias. Não mais se exige que as partes peçam a homologação, o que constava do Código
de 1939, art. 1.044 (“assinado pelas partes o pedido de homologação”). Já não é mais preciso. Com o dever
que se dá ao escrivão, o pedido está implícito com a remessa e há automaticidade. Se as partes não querem a
homologação, têm de manifestá-lo ao juízo competente, porque isso corresponderia a desfazimento do
compromisso arbitral.
2)COMPETÊNCIA DO guizo A QUE SE TEM DE REMETER 05 AUTOS. O laudo tem de ser remetido
ao juízo que seja competente para a homologação. Se a remessa se fez a juízo que não era o competente, e
não se transferiu a tempo, isto é, dentro do prazo dos cinco dias, contados da data da assinatura, discute-se,
em alguns sistemas jurídicos estrangeiros, se é ineficaz o laudo, ou se o não é. Atendendo a que o prazo do
art. 1.096 (antes, sob o Código de 1939, art. 1.043) é ato essencial à constituição do juízo homologatório,
por ser integrativo do laudo, o Código de 1939, art. 1.045, VII, dera resposta à questão do excesso do prazo
do depósito: “é nula a decisão arbitral”. Não se tratava, pois, de mera formalidade, nem, sequer, de nulidade
não-cominada. Era possível, de fure condendo, resolver-se diferentemente; mas a lei fora clara, fazendo o
depósito ato integrativo do laudo, ato sem o qual ele era ineficaz. Poderia ter ido além: tê-lo como
inexistente. Em vez disso, reconheceu-lhe a existência, e tachou-o de nulo. A sua consistência jurídica era
somente essa: existia, e era nulo. Existia como laudo; não, como futura sentença. Como sentença, precisaria
ele, antes, do depósito e do exame pelo juiz da homologação.
Restava saber-se se a superveniência da sentença de homologação sanava a nulidade do laudo. Se o prazo
fora excedido, claro que não. Se o prazo não fora excedido, porque o
juiz estava nas situações do Código de 1939, art. 279, então a questão não se punha. Se o prazo foi excedido,
ou pela falta do depósito, ou pelo depósito ritual, inclusive em caso de incompetência sem prorrogabilidade,
se houve sentença pelo juiz competente, a que foram os autos, ou pelo juiz que se tornou competente por lei
nova, a nulidade resistia à sentença passada em julgado. Portanto, tal nulidade era alegável na apelação; e,
depois do trânsito em julgado, era alegável, quer da sentença homologatória, quer da sentença na apelação,
não nos embargos do devedor, porém pela ação de nulidade, a actio nuílitatis, ou pela ação rescisória, se se
compuseram os seus pressupostos. (A respeito da ação de nulidade absoluta, cf. G. A. MICHELI, Nullità del
lodo arbitrale por deposito presso pretore incompetente, Rivista, 14, Parte II, 141-154, onde também admitia
a oposição à execução, os nossos embargos do devedor, mas os arts. 1.010 e 1.011 do Código de 1939 não
os permitiam).
Ponhamos em termos precisos a questão da homologação se ao juízo competente chegam depois do prazo
dos cinco dias. A falta de observância do art. 1.096 pode resultar de ter sido errada a remessa (em vez de ir
ao cartório do juízo competente para a homologação, foi ao de outro juiz) e ao juiz competente somente
pôde ser feita após os cinco dias. Desde logo afastemos o problema da pluralidade de varas competentes,
pois aí tudo se resolve pela distribuição.
Se os autos do juízo arbitral foram remetidos ao cartório do juízo competente, mas no dia seguinte alguma
lei ].he retirou a competência, é missão do juiz que deixou de ter competência remetê-los ao juiz que passou
a ser competente.
Se ele retarda, a culpa é sua, e não das partes. Se os autos foram ao cartório de juízo que judicializara o
compromisso e deixara de ser competente, o dever é o n±esmo. Se o compromisso fora extrajudicial, tem o
escrivão de providenciar para que a remessa seja ao juiz competente.
Sempre que a remessa foi a juiz incompetente, temos de admitir que, com a extinção do prazo de cinco dias,
infringe a lei qualquer remessa posterior. Não pode ser invocado o art. 181, onde se diz que podem as partes,
de comum acordo, reduzir ou prorrogar o prazo dilatório, mas a convenção só tem eficácia se, requerida
antes do vencimento do prazo, se funda em motivo legítimo. Tal prazo para o escrivão é peremptório. O que
pode acontecer é que seja difícil a remessa e o juiz excepeionalmente o prorrogue (art. 182), ou ter ocorrido
calainidade pública (art. 182, parágrafo único). Demais, há o art. 183, em que se ressalva a prova de que não
se remeteu por justa causa: ao receber os autos, o escrivão submete o caso ao juiz estatal. Também pode dar-
se que tenha sido determinado o fechamento do forum, ou que o expediente se haja encerrado antes da hora
(art. 184, § 1.0). Todos esses fatos têm de ser apreciados pelo juiz competente para a homologação. Advirta-
se, mais uma vez, que a regra jurídica do art. 1.045, VII, do Código de 1939, foi eliminada do art. 1.100
do Código de 1973.
Passemos ao problema hoje em dia. É difícil que o escrivão do juízo arbitral não saiba qual o juízo
competente para a homologação do laudo arbitral. O prazo de cinco dias épara ato dele, e não das partes.
Essas não precisam agir. Seria de repelir-se que o laudo arbitral em que se observaram as regras jurídicas
ficasse sem eficácia pelo fato do erro ou da ignorância do escrivão. O cartório judicial que recebe os autos
sabe se o juízo a que serve é o competente para homologar o laudo arbitral. Se tem dúvida, tem de perguntar
ao juiz. Somente depois de recebidos os autos é que o juiz tem de determinar que as partes se manifestem
dentro de vinte dias, que se contam da intimação. No Código de 1973 não há a regra jurídica do art. 1.045,
VII, do Código de 1939, em que se dizia “ser nula a decisão arbitral quando o laudo não for depositado no
prazo do art. 1.043”.
Temos de seguir o caminho que não levaria a inutilização de compromisso e de laudo arbitral.
Art. 1 . 097. O laudo arbitral, depois de homologado, produz entre as partes e seus sucessores os mesmos
efeitos da sentença judiciria 1); e contendo condenação da parte 3) 4), a homologação lhe confere eficácia de
título executivo 2) (art. 584, n. III).
2) Juiz ESTATAL No Código Civil de 1916, art. 1.045, dizia-se: “A sentença arbitral só se executará (?)
depois de homologada, salvo se for proferida por juiz de primeira ou segunda instância, como árbitro
nomeado pelas partes”. De jure condendo, era de exprobrar-se, o que fizemos. O Código de 1939, ad. 1.043,
derrogou o art. 1.045 do Código Civil, acertadamente. No sentido do que dissemos na 1.a ed. dos
Comentários ao Código de 1939, a 1.a Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 28 de outubro de
1952 (R. dos T., 207, 130). Daí as consequências: a) de ter de ser homologado o laudo arbitral, ainda que o
tenha proferido árbitro que coincide ser juiz de primeira ou de superior instância, e b) estar sujeito o laudo
ao prazo legal. O Código de 1973 tomou a mesma medida.
Surge problema. Se o árbitro foi o próprio juiz que teria de homologar o laudo arbitral, ~a quem compete a
decisão homologatória? A solução de se subir de grau é de repelir-se:
no sistema do direito brasileiro vigente, abstrai-se da função estatal que possa ter o árbitro. Tem de ser
levado o laudo arbitral a outro juiz igualmente competente, se ainda não havia relação jurídica processual
estatal, ou se, havendo, se extinguiu. Se havia e persistiu, o juiz competente para a homologação é o juiz que
substituira o juiz que aceitou a arbitragem, em caso de impedimento.
4)LAUDO ARBITRAL CONDENATÓRIO . No art. 1.097, 2 parte, está escrito que, “contendo condenação
da parte, a homologação lhe confere eficácia de titulo executivo”. Entenda-se: qualquer que seja a sentença
com 3 de executividade, é título executivo. Se há 4 ou 5 de executividade, a homologação contém (5) ou
permite (4) para a execução da sentença, sem se precisar de aludir a titulo executivo. A homologação fez
sentencial a força ou a eficácia imediata do laudo arbitral. Pense-se no laudo arbitral em controvérsia de
depósito (ação de depósito), de reintegração de posse, de vindicação da posse, de imissão de posse, de
indenização em caso de nunciação de obra nova, todas, como muitas outras, com 5 de executividade; e em
ação com 4 de executividade, como a decretação de nulidade, de entrega de objetos próprios, de prestação
de contas.
Seção IV
Da homologação do laudo’)
Conforme veremos, com a remessa, está submetido ao juiz competente o laudo arbitral, ainda que todos os
compromitentes entendam que não deva ser homologado. O prazo, para o juiz, é de dez dias.
Fraticamente, a remessa do laudo é remessa, de ofício,pelo escrivão, e não pelos árbitros, o que permite ao
juiz para a homologação conhecer do laudo arbitral, homologando-o, ou não. O recurso é processado desde
a interposição, mas há a necessária intercalação da decisão homologatória, ou não homologatória. A lei
processual criou tal situação, de modo que a matéria do recurso é examinada pelo juiz homologante e,
depois, pelo tribunal a que compete o conhecimento da homologação.
Se todos os compromitentes quiseram a homologação e essa não foi dada, o recurso é só da decisão de não-
homologação.
Se o laudo arbitral chegou ao juízo competente para a homologação e aí foi depositado, mesmo sem que se
haja apresentado pedido de homologação assinado pelas partes, pode o juiz homologá-lo, sendo intimadas as
partes. É o que resulta do art. 1.099 do Código de Processo Civil.
Se, antes da homologação, chega ao juízo competente para ela, pedido de homologação, ou foi esse
assinado por todos os compromitentes, ou somente por um, ou por alguns.
Assinado por todos, não há qualquer assinação de prazo para alegações. Se algum deixa de assinar o pedido,
ou se alguns o deixaram de assinar, então, tem o juiz de determinar que as partes se manifestem dentro de
dez dias.
A homologação do laudo arbitral não é ato meramente homologatório, que se pudesse incluir na classe dos
atos de que cogita o art. 486 do Código de Processo Civil.
Se os árbitros não remetem o laudo arbitral, ou algum deles, encarregado, não o remete, o que os
compromitentes podem fazer é pedir a homologação, juntando o laudo arbitral. Mas isso tem ser feito no
prazo do art. 1.096.
A remessa necessária e dentro do prazo de cinco dias mostra que o Código de Processo Civil, art. 1.096,
concebe a homologação como elemento integrativo necessário da sentença arbitral. Ela é que faz “sentença”
o laudo. A infração do art. 1.096 do Código de Processo Civil acarreta a ineficácia do laudo (“nulo”, diz o
Código de Processo Civil, art. 1.100, VIII). Laudo houve, mas não tem qualquer efeito.
Art. 1 . 098. É competente para homologação do laudo arbitral o juiz a que originariamente tocar o
julgamento da causa1) 2)
Art. 1 . 099. Recebidos os autos, o juiz determinará que as partes se manifestem, dentro de dez (10) dias,
sobre o laudo arbitral; e em igual prazo o homologará, salvo se o laudo for nulo 3)•
1)CRITÉRIO PARA APRECIAR A COMPETÊNCIA . Competente é o juiz a que está entregue a causa,
ou aquele a que caberia a competência, se tivesse sido proposta a ação.
Se foi escolhido como árbitro o juiz que seria competente para a ação e, pois, para homologar o laudo
arbitral, a função cabe ao seu substituto, ou a outro juízo, que também seria, na espécie, competente.
3)AUDIÊNCIA DAS PARTES. Recebidos os autos pelo juiz competente para a homologação do laudo
arbitral, têm de ser ouvidas as partes: apenas podem elas se manifestarem sobre o laudo arbitral, e não sobre
o conteúdo das conclusões.
O que há de ser apreciado pelo juiz homologante é a existência e a validade do laudo arbitral, conforme se
tira do art. 1.100.
As partes são intimadas e têm o prazo de (lez dias para se manifestarem. Prazo, aí, que se conta da intimação
de cada parte.
4) Pi~zo PARA O JUIZ. O juiz tem o prazo de dez dias para a homologação, ou o indeferimento da
homologação. Somente pode indeferir se há um dos fundamentos apontados no art. 1.100. A eles só um se
pode acrescentar não existiu laudo arbitral. Adiante examinaremos um por u:n. Há limites legais (art. 128)
rara sua função de juiz homologante. Assume a responsabilidade de que cogita o art. 133. Pode ser impedido
ou suspeito (arts. 134-138). O prazo não se interrompe nos feriados (art. 178). O art. 174, i, é invocável.
2)INvALIDADE DO COMPROMISSO. O art. 1.100, 1, do Código de Processo Civil diz nula a decisão
arbitral se nulo é o compromisso. Mas, enquanto o laudo arbitral é tratado como decisão, que vai ter, com a
homologação, eficácia de sentença estatal, o compromisso é negócio jurídico de direito material, que se
submete aos princípios, comuns aos negócios jurídicos, sobre nulidade e anulabilidade e sobre ineficácia. As
regras jurídicas sobre incapacidade absoluta e relativa incidem, de modo que a anulabilidade do
compromisso também expõe o laudo à eiva de invalidade. Então, é preciso, para que se decrete a nulidade
do laudo arbitral, que se haja decretado antes, portanto a desconstituição do compromisso. Ou já foi
decretada a invalidade do compromisso e transitou em julgado a decisão a respeito, de jeito que não mais
existe compromisso, pelo efeito desconstitutivo da sentença; ou à ação de decretação de nulidade do laudo
arbitral está a ser cumulada à ação de nulidade ou de anulação do compromisso. O que acima se disse
também se entende com quaisquer outras causas de anulabilidade, e. g., por erro, dolo, violência, fraude
contra credores (Código Civil, arts. 86-91, 92-97, 107, 109 e 111).
Nos casos de ineficácia do compromisso, não há poderes para os árbitros, de modo que se tem por
inexistente a decisão arbitral.
Já no direito romano as decisões arbitrais eram ineficazes, por inexistentes, não obstante a eficácia do
compromisso,se o árbitro excedia os poderes, que lhe haviam sido determinados, inclusive no tempo (L. 32,
§~ 15, 18 e 19, e L. 46, D., de receptis: qui arbitrium receperint ut sententiam dicant, 4, 8).
3)DELIMITAÇÃO DOS PEDIDOS. O compromisso delimita as petitiones. Não se pode pedir fora das
linhas que o compromisso traçou. Outrossim, fora da matéria que foi submetida pelas afirmações e
contrariedades.
Pergunta-se:se a decisão excedeu os limites do compromisso, ~,é nula toda ela, ou só a parte? Aqui, não
cabe a regra de que o inútil não prejudica o útil, ou de que a parte nula não contagia ao todo a sua nulidade.
O laudo arbitral foi proferido, fora dos limites do compromisso. Não se confunda com o objeto do litígio.
4)OBJETO DO LITíGIO. Na determinação do “objeto do litígio” a ser submetido aos árbitros está exclusão
dos seus poderes. Outra outorga de poder de julgar é a que se contém na atribuição de decidir por eqúidade,
a que os arts. 1.075, IV, 1.095, II, e 1.100, VI, do Código de Processo Civil, deram trato diferente.
(a)Se, para decidir a respeito de b, não recebeu poderes o árbitro, ou não receberam poderes os árbitros, a
nulidade do laudo é somente quanto à parte das quaestiones para a qual não receberam poderes. O decidido
sobre a vale.
(b)Se, para decidir a respeito de b, recebeu poderes o árbitro, ou receberam poderes os árbitros, mas esses
poderes não podiam ser conferidos, a nulidade é somente quanto à decisão sobre b.
Tanto a propósito de (a) como de (b), supõe-se a separabilidade das decisões. Desde que tal separabilidade
não exista, a nulidade é de todas as partes inseparáveis da decisão.
No caso de uniões de negócio jurídicos, com dependência bilateral ou unilateral, não se pode arbitrar sobre
negócio jurídico dependente, se não se arbitrou sobre aquele de que tal negócio jurídico depende, salvo se
sobre aquele já há sentença, estatal ou arbitral, com eficácia de coisa julgada.
Se houve união alternativa de negócios jurídicos, não se pode arbitrar a respeito de um, sem se saber se, pelo
implemento da condição que estabelecera a alternatividade, foi ele o que se tornou eficaz, com exclusão do
outro.
6)INCAPACIDADE, IMPEDIMENTO E SUSPEIÇÃO PARA SER ARBITRO . O art. 1.100, IV, apenas
concerne à ilegitimação das pessoas a serem nomeadas árbitros. Portanto, remete-se ao art. 1.079, 2.R parte,
1, II e III. A exceção de impedimento ou de suspeição é apresentada ao juiz competente para a
homologação. A de ineficacidade (art. 1.079, 2Y parte, 1 e
II) a qualquer momento pode ser declarada, de ofício, pelo juiz competente para a homologação.
8)JULGAMENTO POR EQUIDADE. Para que o árbitro ou os árbitros julguem por eqúidade, é preciso que
tenha havido a autorização a que se refere o art. 1.075, IV. Isso não afasta que o árbitro ou os árbitros
possam julgar por eqúidade e ser válido o laudo arbitral se tal função lhe advém de regra jurídica: aí, está ele
ou estão eles a obedecer a lei.
A ratio decidendi é delimitada pelas partes. Ou (a) elas só admitiram que os juizes árbitros julguem como
julgariam os juizes estatais, segundo os princípios (lura novit curia e art. 337); ou (b) permitiram que o
julgamento abstraia do direito expresso (escrito ou não-escrito) e decida por eqúidade. Aqui, a palavra
“equidade” tem sentido que é muito mais largo que o de “equidade” no art. 127, onde a regra de eqúidade é
regra jurídica revelada, complementar das outras fontes de direito. É ponto, esse, de extrema importância,
porque põe em relevo a função derrogatória potencial da eqúlidade, no sentido do art. 1.075, IV. O juiz ficou
autorizado a, embora sujeito à eqúidade, julgar contra direito expresso, mesmo escrito.
(a)Se os árbitros só têm os poderes de julgar segundo o direito, claro que somente podem aplicar regra de
eqúidade quando essa for a fonte do direito, segundo o Método de Fontes do Direito que rege a res in
iudicium deducta, isto é, quando o sobredireito das fontes e métodos de interpretação assim o ordene. Rege,
aí, o art. 127.
(b)S os árbitros receberam poderes para “desprezar” as regras de direito estatal, tais poderes lhe conferem a
apreciação do valor da equidade de quaisquer regras jurídicas, exceto as de ordem. pública (aliás, o
compromisso mesmo seria nulo), porém não lhes veda reputarem aplicáveis as regras de direito expresso
(escrito ou não-escrito). Podem eles, portanto, aplicar o direito que incidir, ou o que eles “fariam”, se
tivessem de meter em lei o que a equidade sugere (diferente do que “fariam” se tivessem de legislar segundo
a eqúidade e outras sugestões de política jurídica, isto é, “como se fossem legisladores”). O poder de julgar
segundo a eqúidade constitui poder de apagar a incidência e de aplicar “outro” direito que aquele que
incidiu; portanto, volta à revelação, à incidência e aplicação da regra jurídica simultâneas. O juízo arbitral é
juízo primitivo, regressivo mesmo, a que pretendem volver, por atração psíquica a momentos pré-estatais, os
“anarquistas” de esquerda e os de alto capitalismo. Muitas vezes, simples expediente para obrigar a outra
parte a aceitar justiça extra-estatal e impor aos titulares (mais fracos) das pretensões de direito material outro
direito que o direito que realmente incidiu e regeu o caso. É arma eficacíssima do capitalismo tardio,
eliminador da concorrência e da segurança extrínseca (da certeza sobre qual a lei que regeu e rege os
negócios de cada um).
Nos casos (b), se o juiz aplica o direito expresso (escrito ou não-escrito), inclusive os de que fala o art. 337,
sem recorrer a equidade derrogatória (conceito acima fixado), a sentença é válida, porque não é contra a
equidade aplicar a
lei que incidiu. Não estava o juiz vinculado ao direito estatal, porém também não ficara obrigado a
prescindir dele.
Nos casos (a) viola-se o direito expresso e, pois, é nulo (art. 1.100, VI) o laudo, se se aplica a regra de
eqúidade, que não incidiu. Se o laudo aplicou regra de equidade que não era direito segundo as normas de
sobredireito (Método de Fontes e Interpretação), é nulo. Nos casos (a), os poderes do juiz árbitro, quanto à
ratio decidendi, são aqueles mesmos que tem o juiz estatal.
Tem-se pretendido que a autorização, para julgar por eqúidade (art. 1.075, IV), dá aos árbitros o arbitrium
merum, que, segundo a insinuação de GíoAccHíNO SOADUTO (Gli Arbitratori nel diritto privato, 69 e 56),
tornaria “constitutiva”, em vez de “declarativa”, a sentença. Ora, o poder de julgar por equidade não vai até
o puro arbítrio. A eqúidacie não éanomia, a ausência de regras. Alude-se, exatamente, a regras. Por outro
lado, de modo nenhum a diferença entre julgar segundo o direito e julgar segundo a equidade permite que se
pense em correspondente diferença na classificação das sentenças. Se GloAcomNo ScPDUTO tinha na
mente, então, a classificação binária (ações declarativas, ações constitutivas), fácil seria perceber que
algumas sentenças, do árbitro adstrito à lei, são constitutivas, e outras, do árbitro autorizado a julgar por
eqúidade, não são constitutivas. Se adotasse a classificação ternária, ou quaternária, ou quinária
(declarativas, condenatórias, constitutivas, executivas, mandamentais), ainda mais fora da realidade estaria a
sua proposição. Aliás, distinção entre juizes árbitros e arbitradores tem de ser feita, pela natureza das
funções, mas o arbitrador mesmo não tem arbítrium merum: é “perito”. Outra coisa seria, por exemplo, a
fixação inconsiderada de preços.
Diz-se no art. 1.041 do Código Civil de 1916: “Os árbitros são juizes de fato e de direito, não sendo sujeito o
seu julgamento a alçada ou recurso, exceto se o contrário convencionarem as partes”. Era o que se
estabelecia no Decreto n.3.900, de 26 de junho de 1867, art. 46, no tocante à í.a parte. A 2.~ parte compõe-
se de duas proposições: uma, sobre a não-sujeição a alçada, o que se há de entender como se estivesse
escrito “qualquer que seja o valor da causa”; outra, referente a recurso, que se havia de combinar com o art.
1.046 do Código Civil, onde se estabeleceu que, ainda que o compromisso contenha a cláusula “sem
recurso” e pena convencional contra a parte insubmissa, terá essa a pretensão recursal para o tribunal
superior, nas espécies au apontadas. Hoje, o art. 1.100, VI (cf. art. 1.075, IV), do Código de 1973, como o
art. 1.045, IV, do Código de 1939, implica derrogação ao art. 1.046 do Código Civil, no que concerne as
infringências do direito expresso. O Código Civil foi exceção ao art. 1.041; o art. 1.100, VI, do Código de
Processo Civil de 1973 abre outra exceção ao art. 1.041 do Código Civil, dilatando a abrangência do art.
1.046 do Código Civil.
A cláusula de decidir ex aequo et bono autoriza os árbitros a prescindir de regras de direito, porém, no
Código de 1973, tal permissão não se estende à atividade dos árbitros iii procedendo. Quer dizer: rege o art.
1.091. Em todo caso, as regras que tenham de ser aplicadas pelos árbitros são iuS dispositivum. Tal a
diferença entre regras jurídicas do Código de 1973 e os artigos, também do Código, a que se refere o art.
1.083, para os fazer, no processo arbitral, regras dispositivas quando sejam (o que é a regra) regras
dispositivas no juízo estatal.
No regime do Decreto n. 3.900, as regras jurídicas processuais seriam, também, havendo a cláusula de
julgamento por equidade, ius dispositivum. Porém então existia o art. 47 do Decreto n. 3.900, que hoje não
temos: “Quando os árbitros tiverem poderes para julgar por eqúidade, independentemente das regras e
formas do direito, poderão prescindir do processo estabelecido nos artigos antecedentes, e darão a sua
decisão ouvindo verbal e sumariamente as partes e testemunhas; reduzindo a termo os depoimentos aas
testemunhas,
e admitindo os memoriais que as partes oferecerem”. O Código tomou outro caminho: o de reduzir as regras
processuais a um mínimo, fazendo-o dispositivo; admitiu as outras como ius dispositivum (art. 1.083).
Aliás, o Código Civil já havia preparado essa solução, dando a entender que se deixava ao direito processual
a feitura das regras de processo, sem que no direito material se cptasse pela dispositividade delas (Código
Civil, art. 1.044:
“Instituido, judicial ou extrajudicialmente, o juízo arbitral, nele correrá o pleito os seus termos, segundo o
estabelecido nas leis de processo”). Havia, então, a pluralidade de leis do processo. O Código de Processo
Civil de Minas Gerais, art. 29, alínea 2.~, o de Santa Catarina, art. 1.337, parágrafo único, o do Estado do
Rio de Janeiro, art. 1.665, e o de São Paulo, art. 1.145, haviam seguido as pegadas do Decreto n. 3.900, de
1867, a que o Código de Processo Civil do Distrito Federat, art. 730, símpliciter, remetia.
A cláusula de eqúidade, a que se refere o art. 1.075, IV (art. 1.100, VI), somente concerne à atividade do
árbitro in iudicando. O art. 1.040, IV, do Código Civil também só se reportava ao “julgarem” (os árbitros)
“por eqúidade, fora das regras e formas de direito”, deixando o processo às leis processuais (Código Civil,
art. 1.044).
Em conclusão:
a)Se os compromitentes deram ao ái’oitro, ou aos árbitros, o poder de julgar por eqúidade, não o
autorizaram a afastar-se das regras jurídicas processuais: somente quanto ao mérito pode intervir a eqúidade.
Há o pacto de julgar por eqúldade, de que resulta o poder do árbitro ou dos árbitros, in. iudícando; e o pacto
de poder o árbitro ou de poderem os árbitros se afastar das regras jurídicas processuais (cf. art.
1.091).
b)Se os compromitentes deram ao árbitro, ou aos árbitros, o poder de julgar em procedimento de que eles
derem as regras jurídicas, os arts. 1.092 e 1.093 do Código de Processo
Civil podem ser substituidos pelo que pareça mais conveniente, cientes os compromitentes. Podem os
próprios compromitentes alterar as regras jurídicas dos arts. 1.092 e 1.093, mas ai não há o poder, para o
árbitro ou árbitros, de preestabelecerem regras jurídicas. Seja como for, não podem os árbitros ou não pode
o árbitro pré-eliminar o que se reputa essencial à angularidade da relação jurídica processual e à defesa das
partes.
No art. 127 diz-se que o juiz só decidirá por eqúidade nos casos previstos em lei. No art. 1.100, VI, taz-se
nulo o laudo arbitral se proferido por eqúidade, se não houve, no compromisso, a autorização aos árbitros
para julgarem por eqúidade, e se houve infração de regras e formas de direito. Assim, se houve a autorização
e não desobedeceu o que a lei exige, o laudo arbitral pode julgar por eqúidade . Pergunta-se: ~,cabe a ação
rescisória se houve a autorização e violou a lei? Sim. Mais: ~,cabe a ação rescisória se a decisão arbitral
homologada se fundou em eqúidade e não foi com base na equidade, a despeito da referência, a solução
dada pelo laudo arbitral homologado? A resposta tem de ser afirmativa, porque a autorização, exigida pela
lei, foi para se decidir por eqúidade, e o juiz competente não deveria homologar (fazer sua) decisão que
violou a lei e a cláusula negocial. Aí, a rescisão é do laudo arbitral e da sentença homologatória, que,
cobrindo-o, transparentemente, fez seu o conteúdo. Se o autor da ação rescisória apenas aludiu ao laudo
arbitral, não importa: a homologação fez uno, homo, o que foi levado ao juiz para o seu exame e o
proferimento da sentença envolvente.
Na ação rescisória do laudo arbitral e da sentença homologatória, os pressupostos são os do art. 485, 1
(prevaricação, concussão ou corrupção do juiz), II (impedimento ou absoluta incompetência do juízo), III
(dolo da parte vencedora em detrimento da parte vencida, ou de colus5o entre as partes, a fim de fraudar a
lei), IV (ofensa à coisa julgada, uma
vez que a questão ou as questões já tenham sido resolvidas com trânsito em julgado de alguma sentença,
inclusive se homologatória de outro laudo arbitral), V (violação do direito objetivo), VI (falsidade da prova,
em que se fundou o laudo arbitral, mas cuja falsidade foi apurada em processo criminal, ou vai ser provada
na própria ação rescisória), VII (depois da homologação, o autor da ação rescisória obteve documento novo,
cuja existência ignorava, ou do qual não pudera fazer uso, se tal documento basta a fazer-lhe favorável o
laudo arbitral), IX (se houve erro de fato, resultante de atos ou de documentos da causa).
Quanto aos pressupostos do art. 485, VIII, pode ser que o laudo arbitral se haja firmado em confissão de
alguma das partes, uma vez que o juízo arbitral tomou depoimento (art. 1.086) e a tal confissão possa ser
decretada a invalidade. Dá-se o mesmo com a desistência e a transação, mas é preciso, então, que naquela ou
nessa se haja baseado o laudo arbitral. Muito diferente é o que ocorre se há transação posterior que atinja o
cumprimento. Aí, rescindível pode ser a sentença homologatária da transação . Quanto à desistência, seria
impertinente, porque de compromisso arbitral não se desiste: o que pode acontecer é o distrato, em que os
figurantes são os compromitentes, ou o exercício do direito negocial ou legal de resolução, ou, se cabe, a
renúncia de todos os direitos e à pretensão ao cumprimento do compromisso. Se, antes da homologação, os
compromitentes cumprem, voluntariamente, o que foi decidido no laudo arbitral, como conteúdo de negócio
jurídico, esse torna sem objeto o compromisso. Aí, do compromisso pode, também, ser decretada a nulidade,
ou a anulação, conforme as regras jurídicas concernentes aos negócios jurídicos, e com a eficácia da
sentença o compromisso extingue-se, mesmo se já foi proferido o laudo arbitral, ou está em via de
homologação. Se depois da sentença homologatória, é preciso que se rescinda essa sentença (e. g., com base
no art. 485, VII, relativo à obtenção de documento novo, cuja existência se ignorava, ou de que não se pode
fazer uso para o pronunciamento favorável a um dos compromitentes, ou no art. 485, IX, que se refere a erro
de fato, resultante de atos ou documentos da causa). Enquanto não se dá a rescisão da sentença
homologatória, pode-se alegar, contra a ação de nulidade ou anulação , a coisa julgada, porque o juiz
examinou o compromisso e o laudo arbitral.
Quanto à transação, pode ser feita durante o tempo que vai do compromisso à homologação da sentença
homologatória. Se após a homologação, entende-se relativa ao que o laudo arbitral declarou ou constituiu
entre os compromitentes, e não ao que antes do laudo arbitral existia entre os figurantes do negócio juridico
do compromisso.
Homologado o laudo arbitral, podem advir embargos de terceiro, que se admitem se iniciada a eficácia
mandamental ou executiva da sentença homologatória, porque só então começa a possibilidade de ofensa a
terceiro. Isso não afasta que o terceiro seja na espécie, juridicamente interessado, e possa propor a ação
rescisória (art. 487, II).
A sentença da ação rescisória no laudo arbritral e da homologação é rescindível, conforme os princípios do
art. 485.
O prazo pode ter sido assinado no compromisso, ou pela lei (arts. 1.075, 1, 1.081 e 1.093).
Os árbitros estão sujeitos a determinado prazo para proferir a sentença. ~ a esse prazo que se refere o art.
1.100, VIII, do Código de Processo Civil. Quanto ao prazo para instalação (ou provocação) do juízo arbitral,
e nulo por ineficácia do compromisso (art. 1.100, 1) o laudo que não o observou.
Se o laudo, que pode ter satisfeito todos os requisitas de validade e de eficácia, não foi remetido no prazo de
cinco dias a que alude o art. 1.096 do Código de Processo Civil, há nulidade. A nulidade e anulabilidade são
deficiências do suporte fáctico do ato jurídico, de modo que nem aquela nem essa pode ocorrer depois da
conclusão do ato. Falta de estudo científico é que leva a essas impropriedades de expressão, às vezes
danosas na doutrina e na prática.
Se, a despeito de se ter esgotado o prazo para a remessa do laudo arbitral e sem ter havido novo negócio
jurídico dos compromitentes, subordinando-se ao laudo arbitral (~ eficacizando-o), foi homologado, em
primeiro grau ou em grau posterior, a ação rescisória tem de ser proposta, contra a sentença, que a justiça
estatal proferiu; com fundamento no art. 485, V, do Código de Processo Civil, pois houve infração do ari.
1.096 da lei processual. O laudo não depositado no prazo do art. 1.096 é ineficaz (perdeu a eficácia);
portanto, não pode ser homolagado.
Do assunto já tratamos. Mas é conveniente frisar-se: a) que somente outro negócio jurídico entre os que
haviam sido compromitentes pode eficacizar o laudo, que passa a ser conteúdo do negócio jurídico
declaratório ou transacional entre os interessados, conforme a figura que for a adequada; b) a sentença
homologatória ou a que se prof ira na via recursal infrínge a lei se reputa eficaz esse laudo e o homologa.
Qualquer infração do art. 1.095 é causa de nulidade do laudo. N~ se confunda a nulidade do laudo (exceptio
nuilitatis, portanto decisão constitutiva negativa) com a ineficácia (decisão declarativa).
Pode acontecer que a sentença estatal, homologatória ou já na via recursal, seja nula; e então o trato é
diferente.
Se foi perdido o prazo para o depósito do laudo arbitral, não há interesse na desconstituição dele, porque se
ineficacizou. Isso não quer dizer que cessem as ações criminais e as ações declaratórias concernentes a
falsidade ou falsificação da prova.
Se o laudo se fundou em prova falsa, ou falsificada, e não foi alegado na ação de homologação, ou na via
recursal, a sentença estatal cobriu a nulidade, porém ela mesma pode ser rescindida, enquanto não transcorre
o prazo preclusivo.
12) NULIDADES PROCE55UAIS. As nulidades processuais do processo arbitral são sanáveis nos mesmos
casos em que o são as nulidades processuais dos processos estatais. A Aceitação do laudo arbitral, se o prazo
foi excedido, ou se faltou ou foi nula a citação, ou se ocorreu outra causa de nulidade do laudo, sana a
nulidade. Se houve infração de direito expresso, ou falta de poder do árbitro, ou infração do art. 1.095, dá-se
o mesmo. Se não houve árbitro, isto é, se o laudo é inexistente (proferiu-o B, e não A, que era o árbitro), a
aceitação pode valer como negócio juridico bilateral de direito material, se contém adoção do que foi
decidido. Não é o laudo, então, que se aceita; é a solução.
Para tal aceitação são de mister poderes de transigir e de reconhecer; não há compromisso: há solução da
questão por pessoa estranha, que os interessados aceitam. Mas atenda-se a que o que se chama aceitação, ai,
é a declaração de vontade de um dos interessados de aceitar a declaração de vontade do outro, que deu por
acertada e admitida (oferta!) a solução que o terceiro dera.
14)CoMPRoMIssO NULO E COMPROMISSO INEFIcAz. ‘Nulo”, no art. 1.100, 1, está por ferido de
nulidade, ou por ineficaz, ou extinção (art. 1.077). Basta que o compromisso, embora válido, seja ineficaz,
ou se extinga, para que o juízo arbitral, que dele se emanou, seja nulo e, pois, nulo o laudo proferido por
esse juízo.
Não se precisava, por isso mesmo, repetir o que se enumerou no art. 1.077. A lei atendeu a essa
consideração, exceto quanto ao art. 1.100, VIII, que confirma ser nulo o laudo proferido pelo juízo arbitral
sendo ineficaz o compromisso (art. 1.077, 1111).
15)INEFICACIzAÇÃo DO LAUDO ARBITRAL. O art. 1.097 diz que a eficácia da sentença arbitral
depende da homoiogaçao .
Em verdade, não há nulidade por fato superveniente ao ato jurídico. Se o ato jurídico é nulo, ou anulável, é
porque o seu suporte fáctico foi deficiente. A deficiência tinha de ser, necessariamente, anterior ou
simultânea ao ato jurídico. Quando alguns escritores, falhos de ciência, se referem a nulidades que teriam
sobrevindo ao ato jurídico, incidem em erro grave. Ou teriam de falar de ineficácia, ou de resolução, ou de
resilição. (No art. 1.045, VII, do Código de 1939, o que se tinha de dizer era que a falta (superveniência da
omissão!) do depósito tornaria ineficaz o laudo arbitral, ainda que válido fosse. Felizmente, o Código de
1973, art. 1.100, retirou tal regra jurídica.)
Alguns sistemas jurídicos consideram eficaz a sentença arbitral (irrevogável pela vontade das partes), ainda
se não foi homologada. Mas é o nosso sistema que havemos de considerar, e não o dos outros.
O laudo tem de ser remetido no prazo de cinco dias (art. 1.096). Se se excedeu o prazo e nada se alegou,
trata-se de nulidade não-cominada, e o juiz pode homologá-lo. A decisão denegatória do juiz homologante
decretaria a ineficácia, de modo que após ela o laudo seria inexistente (todo ato que dependeria da eficácia
de outro é ineficaz e se torna, depois de decretada a sua ineficácia, inexistente): o que não existe nenhuma
eficácia tem.
A inobservância da regra jurídica do art. 1.096 produz a ineficácia do laudo arbitral; não a do compromisso.
O compromisso pode ainda conter prazo para a nova decisão. Sem razão, GIUSEPPE CHIOVENDA
(Principii, 117). conforme antes dissemos. O laudo é que se faz ineficaz (caduco, melhor diríamos); sem que
se afaste a possibilidade de eficacização.
Art. 1.101. Cabe apelação1) da sentença que homologar ou não o laudo arbitral.
Parágrafo único. A cláusula “sem recurso” 3) não obsta à interposição de apelação, com fundamento em
qualquer dos vícios enumerados no artigo antecedente; o tribunal, se negar provimento à apelação,
condenará o apelante nu pena convencional.
com fundamento em MANUEL BAitsosA). A solução (a) vale, mesmo se a reforma foi devida a novos
documentos. Os nossos juristas receberam isso de CuJÁcIo.
Se o tribunal entende que os árbitros violaram direito, porque não estavam autorizados a decidir por
eqúidade (art. 1.100, VI), decreta a nulidade do laudo; mas tem de remeter os autos, para nova decisão, ao
juiz das questões de fato, pois ele mesmo não as decide, porém aplica o direito que deveria aplicar. Note-se,
porém, que o art. 1.102 não somente se refere ao tribunal da apelação. Se outro, o dos embargos, ou o do
recurso extraordinário, foi que chegou à conclusão de ser caso do art. 1.100, VI, e deu provimento ao
recurso, e o juiz que há de julgar o feito. O art. 1.102, II, regula a relação entre o tribunal e o juízo arbitral.
A 5~8. Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a 28 de outubro de 1952 (R. dos T., 207,
130), disse:“PONTES DE MIRANDA, examinando o assunto, através da história do nosso direito e
admitindo a apelação parcial, focaliza os critérios adotados nas antigas leis (Ordenações Afon•sinas,
Ordenações Filipinas e Decreto n. 3.900, de 1867, art. 65) e afirma achar-se derrogado o art. 1.046 do
Código Civil, por isso a apelação que se pode referir a error procedendo
e a errar in iudicando. Se o tribunal entende, diz ele, que os árbitros violaram direito expresso, decreta a
nulidade do laudo, mas, ao invés de devolver os autos para nova decisão, aplica o direito como deve ser na
hipótese. Cabe, pois, na segunda instância, a revisão do mérito, quando possível, se os árbitros não forem
autorizados a decidir por eqúidade e ocorre violação de direito expresso, sendo o exame suscetível de
referir-se a questões diversas, independentes uma das outras”.
O tribunal, ao reputar nulo o laudo, por ser nulo o compromisso, decretou, necessariamente, a nulidade do
compromisso, articulada pela parte como prejudicial do mérito do pedido de não-homologação: houve dois
pedidos dos apelantes, um, contra o compromisso, pedido prejudicial, quanto à constituição negativa do
compromisso (nulidade); outro, contra o laudo, que seria nulo, pois que foi (também pedido de constituição
negativa). Decretadas as duas nulidades, uma em virtude de o ter sido a outra, compromisso não existe mais,
e seria absurdo que se permitisse aos árbitros julgar de novo, nulamente.
Também quando o tribunal decreta a nulidade do laudo, porque foi proferido fora do prazo assinado aos
árbitros no compromisso, a sua decisão impede novo laudo em virtude do mesmo compromisso. Muito
diferente é o que se passa quando o laudo é nulo por infração da forma ou dos limites (art. 1.100, II, III, VI e
VII).
e)O art. 153, § 4~O, da Constituição de 1967, com a Emenda n. 1, impede que se retire, em leis ordinárias, a
recorribilidade das sentenças relativas a homologação de laudos arbitrais, no tocante a errores in procedendo
e in iudicando. Deu, portanto, a solução, em técnica constitucional, ao problema que se pusera ao tempo da
codificação manuelina: nem o Princípe, legislador, poderia confirmar a renúncia ao benefício. O art. 153, §
4P, não protege apenas quanto à exclusão do exame judicial nos casos em que os poderes públicos seriam
interessados em que não houvesse tutela jurídica. Protege também quanto a essa exclusão se a lei a permite
aos particulares. A técnica das Constituições emprega normas jurídicas que se concebem na dimensão da
liberdade, ou da democracia, ou da igualdade. Antes de se haver caminhado na dimensão da democracia, um
dos expedientes técnicos mais relevantes era o da linha de legalidade (dito principio da legalitariedade),
segundo o qual, ainda que as leis, alvarás, decretos, avisos e portarias fossem do mesmo foco ejector, se
exigia, para algum ato ou fato, que o previsse a lei. O princípio do juiz legal foi fusão do princípio de
igualdade perante a lei com o principio de legalitariedade. O art. 153, § 4•O, em vez de exigir lei, dirige-se
às leis: não é regra jurídica que entre no princípio de legalitariedade; é regra de competência do Poder
Judiciário, e precisa, materialmente, o que toca, sem exceção possível, a um dos poderes. Tem exatamente a
função, a respeito do Poder Judiciário, que as regras jurídicas de legalidade, depois que só os Parlamentos
podem fazer lei, exercem a respeito do Poder Legislativo. Por brevidade, não há, nas Constituições
brasileiras, o princípio escrito do juiz legal: basta que lá estejam o de igualdade perante a lei e o de vedação
do foro privilegiado, ou dos tribunais de exceção (Constituição de 1967, com a Emenda n. 1, art. 153, § 15).
Se o Congresso Nacional votasse lei que dissesse: “As questões de limites entre terrenos, fazendas, sítios ou
outras propriedades rurais serão decididas pelo Instituto Brasileiro de Agrimensura”, isso não seria contra a
igualdade perante a lei, nem, a fortiori, contra a garantia do juiz legal (o Instituto Brasileiro de Agrimensura
seria juiz legal). Mas violaria o art. 153, § 4~O, porque o Instituto Brasileiro de Agrimensura não pertence
ao Poder Judiciário. O art. 153, § 4~O, tem por fito assegurar que a lei não edicte regras jurídicas cogentes,
dispositivas ou interpretatiivas, que excluam a cognição dos litígios pela Justiça estatal. Não se promete só o
juiz legal; exige-se que o juiz faça parte do Poder Judiciário A lei que elidisse a cognição, pelos juizes
providos, de certas espécies, sem infração do art. 153, § 15> (igualdade perante a lei), não violaria a esse,
mas violaria àquele. A garantia cio juiz legal não contém a vedação do art. 153, § 45>. Com a infração do
princípio do juízo legal, violar-se-ia o de igualdade perante a lei em que ele entra; porém, sem se violar a
esse, poder-se-ia violar o art. 153, § 45>. E. g., “As questões civis entre jornalistas e ofendidos acabarão no j
uri de imprensa”, “As questões de acidentes de automóveis serão dirimidas por árbitros e o recurso será
limitado ao exame das nulidades de direito material ou de direito processual”.
2)Novo JULGAMENTO DA CAUSA PELO JUÍZO . A atitude do tribunal, no recurso interposto quanto à
sentença homologatória, ou denegatória, não é mais semelhante àquela que tem na ação rescisória do art.
485, V. Discutia-se se o juiz da homologação, ao decretar a nulidade do laudo, podia aplicar o direito à
espécie. Quer dizer: substituir o direito em tese. O Código de 1939, art. 1.046, parágrafo único, b) somente
falava do tribunal, mas era óbvio que o juiz tinha o mesmo poder.
Temos hoje regras jurídicas diferentes.
As espécies em que se decreta a nulidade (nulidade não se declara) e se declara a ineficácia do laudo arbitral
são as que se fundam em ter sido decretada a invalidade do próprio compromisso (art. 1.100, 1), ou ter o
laudo provindo de quem não podia ser nomeado árbitro (art. 1.100, IV), ou terem sido os árbitros nomeados
sem se terem obedecido as legras jurídicas da lei ou as normas contratuais (art. 1.100, V) ou ter sido
proferido fora do prazo (art. 1.100, VIII). Só há novo laudo nas demais espécies (proferido fora dos limites
do compromisso, ou em desacordo com o seu objeto, art. 1.100, II; não foi julgada toda a controvérsia
submetida ao juízo, art. 1.100, III; julgou-se por equidade, sem ter havido autorização para isso, arts. 1.100,
VI e 1.075, IV; não houve o que se exige, no art. 1.095, ao laudo, art. 1.100, VII. Assim, ocorrendo o que
acima se aponta, fora, portanto, dos incisos 1, IV, V e VIII do art. 1.100, o Tribunal manda que o juízo
profira novo laudo (art. 1.102, II). A relação jurídica continuou incólume, o que não acontece nas outras
espécies (art. 1.100, 1, IV, V e VIII).
No direito anterior, a infringência de direito expresso, se foi por equidade o julgamento (se tal se permitira),
o Tribunal aplicava a regra jurídica expressa (Código de 1939, art. 1.046, parágrafo único, b). Hoje, não: o
Tribunal manda que o juízo profira novo laudo.
Trata-se de judicialização do ato de cumprimento da obrigação, com a eficácia da interpelação, se não foi
antes feita, e a formação da relação jurídica processual, em ação cuja sentença é declarativa, positiva ou
negativa. A solução técnica poderia ser diferente. Ou a) se constrói a ação de consignação em pagamento
como declarativa, e então é produtora de coisa julgada a sentença; ou b) se constrói como executiva (em vez
de ser ação de execução forçada, ação de execução voluntária).
A concepção da ação de consignação em pagamento como executiva atribuiria à sentença força executiva. É,
pois, da maior importância conhecer-se qual a espécie de que se trata.
A admissão de “embargos” revela a concepção b); a admissão de “contestação”, a concepção a). A força de
coisa julgada material acompanha a sentença segundo a concepção a).
A alternatividade em que importa ou virem ou mandarem receber, sob pena de ser feito o respectivo
depósito, é semelhante à que se observava e se observa nas ações provocativas de exercício de direitos
formativos e na ação de preceito cominatório, tal como era disciplinada, ou nas ações executivas de títulos
extrajudiciais.
É contestação que se opõe à consignação em pagamento (em vez de embargos, como antes do Código de
1939): o ataque
é, pois, às afirmações que concernem ao direito do depósito. Se comparecia o réu e contestava, depositava-
se, porém em virtude do pedido, e não para execução. Quem executava era o devedor, depositando; não o
juiz. São pontos dignos de toda a atenção, por separá-los diferença conceptual de toda a relevância.
O petitum do consignante é declaração de vontade, no plano do direito processual; a entrega ou depósito
satisfativo, não: porque pagamento, solutio, não é declaração de vontade. Quem paga pratica ato, não
declara; pode ser que comunique vontade de pagar. Havendo concurso de credores, que se instale, a ação
declarativa ficou para trás.
II.AÇÃO DE DEPÓSITO
A ação de depósito tem eficácia de execução. A executividade é onimoda: execução de coisa certa, ou
execução de equivalente, ou execução psicológica e física (prisão). Cf. arts. 901-906. O elemento imediato é
o condenatório. Há expedição de mandado, inicialmente, e o de prisão, se não for entregue a coisa
depositada. Portanto, adiantamento de execução, firmado em inicial cognição incompleta. A sentença
favorável completa-a; a desfavorável destrói a cognição incompleta com que se iniciou a ação executiva.
Do despacho que nega a prisão, no caso do art. 902, § 1.0, não cabe agravo, nem apelação; mas, se envolve
indeferimento da petição inicial, por se não tratar de depósito hábil ao processo, o recurso é o de apelação,
por entrar no mérito ou caber no art. 267 (art. 513). A Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Espírito
Santo (11 de novembro de 1942, Acórdãos, 1942, IV, 111) considerou irrecorrível o despacho que revoga a
ordem de prisão. É preciso distinguir: a) se o primeiro despacho do juiz, de que, aliás, cabe agravo de
instrumento, transitou em julgado, não mais pode ser revogado pelo juiz, que somente o poderia fazer por
ocasião de sustentar o seu despacho; de modo que a revogação é infração da coisa julgada formal, que pode
revestir-se de indeferimento do mérito, ou não; b) se o primeiro despacho ainda não transitou em julgado,
posto que já tenha tido execução, ainda é reformável (= revogável). A prisão, a “ação” de depósito e a
classificação da ação de depósito (em direito material) estão tão intimamente ligadas entre si, em
proposições conseqüentes
, que é difícil imaginar-se denegação de prisão sem se entrar no mérito.
O código de 1939, art. 366, falava em “depositário ou pessoa que lhe seja equiparada”. Essa extensão ora
feita com alusão ao plano do direito material: não há conceito de pessoa equiparada a depositário, no plano
do direito processual; o conceito é de direito material. O caso do art. 885 e do art. 733, § 1.0, são de direito
material inserto no Código de Processo Civil: aquele proveio do art. 31, parágrafo único, da Lei n. 2.044, de
31 de dezembro de 1908; esse, de inspiração mais conspícua, é direito material heterotópico.
Quanto à legitimação passiva na ação de depósito, é a equiparação, de que se falou, estabelecida em direito
material, que decide.
(a) A ação do subscritor, para haver o titulo que lhe foi subtraido, é ação de vindicação, ou ação de posse da
cártula, não do título ao portador, pois que, ex hypothesi, não foi emitido.
(b) A ação vindicatória do possuidor para haver o titulo de que foi injustamente desapossado (Código Civil,
art. 521), ou ação de vindicação da posse, dita pelos juristas alemães, “Besitzrechtsklage”, ligada à pretensão
do direito de posse exercível pelo que perdeu coisa móvel (e. g., título ao portador), ou a quem foi furtada,
contra quem a tem, possuidor imediato, ou mediato, ainda de parte dela (HA.Ns NELKES, Die Klage aws §
1.007 des BGB., 22), ou contra o amo, se há servidor da posse (O¶rro voN GIEnx~s, Die Bedeuvung des
Fahrnisbesitzes, 52), ou contra o incapaz, ou pelo marido contra a mulher (Huoo KREss, Besitz und Recht,
222), ou vice-versa. Cf. art. 907.
Tal ação se dirige contra o detentor, não contra o emissor (l.~ Câmara Cível do Tribunal de Apelação do Rio
Grande do Sul, 25 de maio de 1943; R. F., 96, 366), salvo se detentor é.
(c)A ação do que foi injustamente desapossado do título para obter a substituição, é ação constitutiva
restaurativa de instrumento (cártula), como há ações constitutivas de forma e as ações constitutivas
(cautelares) de instrumentos, que instauram, em vez de restaurarem (e. g., as inquirições ad perpetuam rei
memoriam). Há possível transformação em ação de condenação.
(d)A ação do possuidor para, mediante a apresentação e em consequência dela, lhe ser entregue a prestação
prometida, é mais forte que a ação declaratória da existência (ou inexistência) da relação jurídica, por
declaração unilateral de vontade e, ainda mesmo, que a ação declaratória da existência (ou inexistência) da
relação jurídica (já bilateral e direta) entre o possuidor que apresentou o titulo e o promitente. Trata-se de
ação de condenação. Ou ação executiva de título extra judicial.
(e)A ação do possuidor para que, apresentado o título, lhe seja entregue outro título, ou lhe sejam entregues
outros títulos, a) em caso de substituição cartular, é ação semelhante à ação (c), apenas sem o pressuposto
(de direito material) do injusto desapossamento. Ao passo que a ação b) para obtenção de títulos-filhos, em
virtude de bonificação, ou sorteio, é ação constitutiva, de eficácia ex tunc ou só ex nunc, conforme a lei ou
os estatutos da sociedade (pretensão formativa geradora da instrumentação ou da forma).
A substituição cartular, em caso de perda ou de destruição, entra na espécie (c), e não na espécie (e). As
ações das
espécies (c) e (e), a), chamam-se ações de amertização, aquelas, ações de amortização de causa acidental, e
essas, de amortização legal ou estatutária.
Há títulos sem a pretensão a que corresponde a ação (c).
Observe-se que a ação de amortização não é, quanto ao titulo novo, de eficácia constitutiva: apenas declara
obrigação nova do subscritor a restauratividade e no plano obrigacional, como obrigação de fazer e assim
executável; de modo que, ao dizermos que é constitutiva negativa, designamos com toda a propriedade o
que se passa, porém não temos a mesma exatidão ao falarmos de restaurativa.
(A ação de amortização poderia parecer ação como a do art. 641; mas a confusão seria perniciosa: na ação
do art. 641 cuja classificação é um dos mais interessantes pontos do direito processual e dos mais delicados
há execução de obrigação de prestar declaração de vontade; na ação de amortização, de modo nenhum. Não
presto declaração de vontade quando faço novo título de declaração de vontade, a (declaração de vontade
foi fato do passado, que vem até o presente; o titulo apenas a reenforma, hoje.)
O Código de 1973 pós no Livro IV, Título 1 (dos procedimentos especiais de jurisdição contenciosa), os
arta. 914-919, a ação de ação de contas, de que o Código de 1939 tratara como um dos fundamentos para a
ação comínatória, que disciplinara com minúcias. Nele, o art. 302, V, atribuiu a ação comínatória “a quem
tiver direito de exigir prestação de contas ou for obrigado a prestá-las”, o que está no art. 914 do Código de
1973, que apenas não alude à cominatoriedade. Os arts. 303, 307, 308, § 32, 309 e 310 de certo modo
persistiram nos arts. 915-919 do Código de 1973. O legislador quis apagar a figura geral da ação
cominatória típica, quer quanto á ação de prestação de contas quer quanto às outras.
(a)A ação de reintegração é ação executiva. Se o mandado foi concedido inicialmente, deu-se adiantamento
de execução; ao juiz bastou a cognição superficial. Se não foi concedido, a eficácia executiva será
contemporânea da sentença. Não há actzo iudicati de sentença favorável em ação possessória, para que se
reintegre a posse; a sentença mesma já é sentença executiva, e não sentença de condenação.
Se o juiz aplica o art. 505, 2.~ parte, do Código Civil, por se tratar de quem tem o domínio e de quem alega
possuir como dono, provando aquele o seu direito, a sentença é a favor do dono, contra o possuidor, é de
reintegração, ou de manutenção, nas ações, respectivamente, de manutenção e de reintegração.
(b)A ação de manutenção é mandamental, podendo haver, ou não, adiantamento de mandado. A ação de
manutenção de posse é mandamental, porque o elemento que prepondera é o mandado. Depois, vem o
elemento declarativo, que a aproxima da ação declaratória da relação jurídica de posse: ela é declarativa,
com o plus, preeminente, do elemento mandamental, e carga maior de elemento condenatório. Ao passo que,
na ação declaratória da posse, o elemento mandamental é apenas responsável pelo efeito de preceito
(Tratado das Ações, Tomo II, 147 s., 62 e 76). (~I interessante observar que, antes de se haverem “isolado”
as ações manda-mentais, ERNST ECK, Die sogenannten doppeiseitigen Klagen, 64, via na luta em torno da
posse, sem uma das partes acusar de turbação, ou de se bulho, a outra, ação declarativa, porém não
caracterizou, como devera, o interdito de retinência.)
Não há preparatoriedade no mandado initio litis (Tribunal de Apelação do Ceará, 14 de abril de 1944, R. de
J. e D., 1, 54; 1.a Turma do Supremo Tribunal Federal, 28 de agosto de 1944, R. F., 104, 494), daí não caber
agravo de instrumento; nem preventividade pendente a lide, que justificaria
o agravo de instrumento retido nos autos (2.a Turma do Tribunal de Apelação de Pernambuco, 10 de março
de 1941, A.F., 14, 160): há, apenas tipícamente, adiantamento do mandado, se se trata de ação de
manutenção, ou de execução, se se trata de reintegração. Nem se pode pensar, contra a concessão no início
da lide, em mandado de segurança (2.8 Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, 16 de maio de
1944, R. dos T., 155, 496), porque os pressupostos mesmo do mandado de segurança não poderiam existir
onde o ato de decisão se funda em cognição incompleta. Não há, pois, qualquer recurso da concessão ou
denegação no início da lide (1.~- Turma do Supremo Tribunal Federal, 28 de agosto de 1944, R. F., 104,
494; 2.~ Câmara Cível do Tribunal de Apelação de Minas Gerais, 1.0 de março de 1945, R. F., 104, 85),
dada a incompletitude em adiantamento de mandado, ou de execução (cf. 3.~ Câmara Cível do Tribunal de
Apelação do Rio Grande do Sul, 27 de maio de 1943, Decisões, 1944, 48), não por se tratar de puro arbítrio
(!) do julgado (sem razão, a mesma Câmara, a 22 de junho de 1944, J., 25, 563). Se a denegação não é por
insuficiência dos pressupostos da medida initio litis, porém envolvida noutro motivo de indeferimento, o
recurso é o dessoutro motivo (e. g., por incompetência ou ilegitimidade de parte ad causam, ou
impropriedade de ação processual o que extingue o processo com ou sem julgamento do mérito.
A “manutenção” e a “reintegração” liminares são provisóri as; não é provisória a coguição: a cognição é
superficial, Incompleta. A sentença final ou a completa, ou a desfaz, deferindo, ou não deferindo, o pedido
inicial. No possessortum summariissimum, a cognição é interina, de modo que a sentença mesma é sem
definitiva solução da questão: é a isso que se refere o Código Civil, art. 500, verbis “manter-se-á
provisoriamente”. Cogníção superficial, interina, é decisão, portanto, sem força de coisa julgada material. A
sentença do art. 500, de manutenção interina, tem carga mandamental, executiva (pela duplicidade do
pedido, que envolve reintegração ou manter, do modo que, aí, o manter também executa), condenatória,
constitutiva e declarativa. Na sentença de cognição completa, se reintegrativa, passará à primeira linha a
executividade, diminuirão a mandamentalidade e a constitutividade e aumentarão a declaratividade e a
condenatoriedade; se de manutenção, tornar-se-á manda-mental e declarativa. A ação do art. 500 do Código
Civil (possessorium summari~ss’imum) é dúplice, e a prioridade entre os litigantes não é o pressuposto para
a manutenção (art. 507); e sim o é a tença, a posse material (Eo ipso quod possideo, potior est; Possideo quia
possideo).
(c) O interdito proibitório é menos ação com elemento condenatório do que o interdito de manutenção; a
fortiori, do que o interdito de reintegração. Essa é a razão por que o não consideramos ação com
adiantamento de condenação:
é acão de mandamento, ligada à proteção do status quo, em que há veto, e não condenação. A “cominação”
não funciona, aí, como adiantamento de condenação, confundindo-se com o preceito cominatório; e sim
como sanção do mandamento. Donde não ser condenatória. Mais se parece com a sanção do atentado do que
com a alternativa das ações em que há elemento cominatório. Ação autônoma, também se não há de incluir
na classe das ações mandamentais ditas pelo Código cautelares, posto que o legislador hoje preferiu pôr o
interdito proibitório nas ações possessivas. A ação obsta; não somente acautela.
O interdito proibitório nasceu da proteção do locus sacer,do lugar sagrado (L. 1, pr., D., ne quid in loco
sacro fiat,43, 6), onde na fórmula se diz: “In loco sacro facere inveeum immittere quid veto”. Era ato
jurídico solene, donde VALÉXIO pensar em nuncu pare e SÊNECA em carmen. Passou a proteger loca
religiosa e chegou até a proibição de alienar o sepulchrum, os muni e postae municipais, as coisas destinadas
ao uso público.
Historicamente, só os interditos proibitórios eram chamados interdicta; dava-se aos outros remédios
jurídicos o nome de decreta. A finura é digna de nota, pelo que há de executivo e de constitutivo no
determinar que se restitua ou que se exiba e pelo que se revela de mandamento puro no interditar. Quando às
espécies diferentes se começou a chamar interditos, foi possível falar-se dos interditos proibitórios como
subclasse. Seja como for, o “Veto”, o “Interdicam”, somente a eles é inerente: quem reintegra ou mantém,
não somente veta; nem interdiz o que somente comina. Por mais que os tempos hajam mesclado, misturado,
fundido, o interdito proibitório e o preceito cominatório, os dois institutos vieram até nós e estavam no
Código de 1939, em lugares diferentes, ainda quando se trate do remédio jurídico e do remédio cominatório
da abstenção de ato. O juiz, ao deferir a cominação para que o citado pratique ou se abstenha do ato (cf. arts.
633, 634, 636, 638, parágrafo único, 641, 643-645), não veta, não interdiz: comina, adianta condenação.
A ação da manutenção, com a fórmula Quominus possideatis vim fieri veto, é a que mais se aproxima do
interdito proibitório propriamente dito e o “veto” poderia iludir-nos. A tutela possessória retinendae vem dos
vindiciae que o pretor “concedia” a uma das partes, pendente a demanda, portanto sem se levar em conta a
turbação, como a interinws dominus. Dai foi que se veio à “discussão” e “decisão” da questão de posse,
para se discutir e decidir em vez de se conceder a retinência, a manutenção.
O interdito era expressão da vontade estatal. Donde o seu objeto; a liberdade das pessoas, as coisas públicas
e as coisas privadas (no interesse do Estado). O que está em causa é o fim cultural do Estado; não só o
interesse dos individuos. De modo que, para alguém obter a proteção interdital, não só seria preciso que
afirmasse e provasse o “seu~~ interesse, mas também o da ordem pública. Se a liberdade do cidadão romano
era ferida, feridos seriam
todos os cidadãos romanos; daí competir a todos o interdito de exibição do homem livre.
A aparição de interditos em que o interesse público é mediato marcou-se pela extensão em que importava; e.
g., o interdito de itinere actu que privato, relativo a servidões rústicas, em que ainda ressaltava o interesse
público no status quo. A analogia com o interdito de via publict et de itinere publico retificiendo é evidente.
Também o interdito de uxore exhibenda et ducenda se moldou no de liberis exhibendis item ducendis.
O interdito proibitório foi o que mais conservou a marca do interesse público, de defesa da ordem pública.
Já a respeito dos interditos retinendae possessionis se notara a permanência do interesse público (para H.
WITTE, Das interdictum uti possidetis, 109 s., esse interdito seria mesmo, originariamente, interdictum sim
plex). Ainda hoje, a angularidade da relação processual é posterior ao mandado, de forma que se percebe o
interdictum sim plex, e a discussão posterior relativa à cognição.
Ora, na ação de manutenção e na de reintegração, a angularidade começa desde o início, posto que, segundo
o art. 928, excepcionalmente se permita a linealidade (autor, Estado), que com a citação se estenda em
ângulo. Aliás, a expressão uti possidetis, em vez de uti possides, revelava a angularidade desde o pedido
(cada uma pedia que fosse mantido). Interdictum duplex, que o deixou de ser; porém não completamente,
pois o réu pode reconvir, salvo se sumaríssímo o procedimento (art. 275, 1 e II, a). Cf. art. 315, § 2.0.
A ação de manutenção e a de reintegração fizeram-se actio, o órgão do Estado passou a ser juiz, iudex, em
vez de pretor. Em lugar de mandado só, isto é, veto, exhibeas, restituas, a ação de manutenção, conservando-
se mandamental, encheu-se de elemento declarativo e condenatório; a ação de reintegração
desinterditalizou-se por completo e fez-se ação executiva, com adiantamento de execução, fundado em
cognição inicial incompleta, ou simplesmente executiva com a cognição completa final. Mas o interdito
proibitório dos arts. 932 e 933 conservou-se mandamental, antepretoriano, quer dizer para aquém do texto
de GAIO (IV, § 139): “...Praetor aut Proconsul principaliter auctoritatem suam finiendis controversiis
interponit”. (Não “proponit” como está em F. O. voN SAVIGNY, nota 2, ao § 34 de Das Rech.t des
Besitzes.)
O interdito em sentido próprio é o dos arts. 932 e 933; as ações de manutenção e de reintegração, a despeito
do elemento mandamental daquela, que suplantou os outros, por influência daquele interdito, contém decreta
(GAIo, IV, 139-140).
Poder-se-ia discutir, hoje, se a ação de manutenção é mandamental, ou executiva, ou de condenação
(começada com adiantamento). De execução não é, porque nenhuma prestação é feita pelo Estado, em vez
de o ser pelo réu. Aliter, a reintegração. De condenação, sim, é que poderia ser, porém isso teria o defeito de
sublinhar o caráter delitual (teoria de F. C. VON SAvIGNY) das ações possessórias. Há mais, na ação de
manutenção, do que mandado de não fazer. Lá estão em GAIO (IV, § 140) as diferenças entre o “ne sine
vitio possidenti vis fiat” e o “ne in loco sacro aliquid fiat”, entre o “vim dieri veto” e o simples “veto”, ou
“ne fadas”, “ne immittas”. Os interditos proibitórios dos arts. 932 e 933 são a forma mais próxima dos
interditos públicos, primitivos. Não se alude à vis, não se examina matéria para condenação, nem, a fortiori,
para execução, veta-se, manda-se. A simples ameaça é pressuposto suficiente, porque o interesse público
continuou sendo imediato, e não de segundo plano ou mediato.
“Quando alguém edifica novamente alguma obra, que a mim é prejudicial, embargando-me a vista das
minhas casas ou alguma outra minha servidão, que me seja devida, eu por mim posso denunciar ao dito
edificante, lançando certas pedras na obra, segundo Direito, e usança da terra, que mais n~o faça naquela
obra, pois a mim é prejudicial”. Esse princípio, acolhido pelas Ordenações Afonsinas, Livro II, Título 80, §
4, atravessou os séculos (Ordenações Manuelinas, Livro III, Titulo 62, § 4; Ordenações Filipinas Livro III,
Título 78, § 4). A eficácia da sentença favorável na ação de nuneiação de obra nova ou é a de força
mandamental, porque só se manda que a obra pare, ou é executiva-condenatóría, se se decreta a demolição
do que se edificou. Porém não nos escape que, urna vez feita a cominação do preceito, aí a sentença é
condenatória eventual. Quanto à indenização, executiva-condenatoria.
Tem-se, pois, de atender a que há duas ou mais sentenças na mesma sentença, formalmente uma, o
adiantamento da eficácia mandamental ou da eficácia executiva provém da origem da ação, da ação de mão-
própria, do iactum lapilli, ou sentenças distintas quanto ao conteúdo e quanto à forma
VII.AÇÃO DE USUCAPIÃO
A ação de usucapião é declarativa. A eficácia, que vem após a de declaratividade, é a mandamental, razão
por que a sentença é transcrita. O elemento constitutivo só se passa no plano da eficácia de direito registrário
e enche o elemento mandamental.
Os citados, ainda que editalmente, têm de contestar, não de opor; porém os não citados, inclusive por editais,
são terceiros. Donde a conveniência do processo edital amplo (e. g., “os interessados”). Ação declarativa, a
sentença favorável somente tem força de coisa julgada material contra os citados.
Antes de qualquer consideração sobre ações de partilha e ações de divisão, convém insistir nos conceitos de
partir e de dividir. Nem sempre parte quem divide; nem sempre divide quem parte. O direito romano colheu
a essência das duas categorias quando distinguiu, precisamente, o campo da actio familíae erciscundae e o
campo da actio communi dividundo, a ponto de só permitir que se usasse daquela uma vez. Por quê? Porque
aquela se refere a uma relação que não é a da comunhão pro indiviso de direito das coisas puro. Se o monte
partível se compõe de três prédios e os herdeiros são três, a partilha dos três, sendo um para cada herdeiro,
não divide. Somente parte. Se são quatro os herdeiros e dois têm de ficar num só prédio, em vez de se
dividir, criou-se a indivisão: no entanto, partiu-se o monte e uma das linhas da partilha deixou de coincidir
com as coisas e atravessou uma delas. Se esse prédio é divisível, ao tempo de se partilhar também se pode
dividir o prédio, e então haverá partilha mais divisão. Ou se há de deixar para depois, como exercício de
actio cominuni dividundo.
A partilha tanto abstrai da res, que se partilha aquilo mesmo que não está no patrimônio do morto (bens
sujeitos a colação), e se satisfaz com o quid inteliectuale. Porém ~qual a natureza da ação de partilha e da
ação de divisão, em classificação das ações segundo a eficácia da respectiva sentença? O assunto é da
máxima importância teórica, porém não é menor o seu interesse prático.
(A) De início, observemos que, sendo dividir e partilhar conceitos distintos, a natureza das duas ações pode
não ser a mesma. Ou o que há, nelas, de comum as põe na mesma classe, sem que possam elas ser mais do
que subclasses; ou elas ocupam classes distintas. Respondida afirmativamente a primeira questão, está
prejudicada a segunda.
(E)A primeira disputa foi em torno de serem declarativas ou constitutivas as ações de partilha e de divisão,
O dilema já sacrificava o bom andamento da investigação:
e. g., em vez de um “<~,Qual é a classe?”, o contrangente “~é da classe a ou da classe b?”. Assim, não se
poderia ter campo livre para as investigações e para a solução.
No plano do direito material, a propensão dos civilistas e para acentuar a natureza declarativa do negócio
jurídico da divisão. No plano do direito processual, entre processualistas, é para a apontar como constitutiva.
Em todo caso, civilistas alemães e austríacos entenderam que há constitutividade no negócio jurídico (e. g.,
ERNST ECK, Die sogefl~annten doppelseitigen Klagen, 140); e não faltaram processualistas que o vissem
como declarativo (e. g., WILHELM KIsCH, Beitràge, 64 5.; H. LAMMFROMM, Teilung, Darlehen,
Auflage und Umsatz-Vertrag, 266). O dilema era posto onde não cabia. No plano processual, a ação não é
declarativa, nem constitutiva.
Os civilistas não sem causa em menor esforço intelectual tendiam a considerar declaratório todo negócio
jurídico ou ação de eficácia ex tune. As doutrinas, franseça e italiana, com toda a repercussão nos países
latino-americanos, incorreram nessa fácil identificação. Nada restaria a discutir. A partilha e a divisão
seriam declarativas, uma vez que vão ao passado, retroativamente. O mais grave é que se levou ao processo
civil, como elemento para a classificação das ações e das sentenças, tal conceito, que descurava assim do
conteúdo como do fim dos negócios jurídicos. A prova de que havia sentenças constitutivas de eficácia ex
tuno deixou perplexa a doutrina. Mais ainda a estarreceu a descoberta de sentenças declarativas de relações
já extintas ou futuras.
Assim, o problema da natureza das pretensões a dividir e a partir foi sacrificado pelos que se preocuparam
com o eventual negócio jurídico divisório ou partitivo, que uns queriam declaratório e outros constitutivo.
Aqueles deslocavam a questão para terreno tão árduo quanto o dela, próprio, o da natureza dos negócios
jurídicos ditos declaratório ou de reconhecimento (negócios jurídicos cognitivos). Esses, para o terreno das
discussões em torno dos negócios jurídicos constitutivos, além de irem da mais leve espécie de negócio
jurídico constitutivo aos mais típicos. Para isso, tinham eles de afastar a obrigação de dividir ou de partir; e
quem os lê bem contempla o esforço, a pertinácia e o insopitável wishfuil thinking, com que procederam a
essa penosa e deformante cirurgia. Seja como for, tal atitude deslocava para o terreno do direito material
problema que deveria confinar-se no terreno do direito processual, por ser problema de eficácia de sentença.
Na primeira fase de juízo de divisão ou de partilha, há exame de relação jurídica de comunhão e dos direitos
de cada comuneiro, ou pelo menos dos que suscitaram a relação jurídica processual. O elemento declarativo
tinha de ser, aí, de primeiro plano, e é o elemento declarativo que se encontra em tantas ações não
declarativas. Porém, quer histórica, quer sístematicamente, não era esse o elemento preponderante, nem o é
hoje, ainda quando se tenha atenuado a impermeabilidade do processo divisório às “questões de alta
indagação”. Verdade é, porém, que essa secundariedade do elemento declarativo, ou a exigência de se
pleitear fora algum incidente de natureza declarativa, concorreu para que se tentasse construir a divisão ou a
partilha, sem se aprofundar o estudo da pretensão a dividir ou a partilhar. N~ se via, sob-tudo, que o não se
levantarem questões sobre a qualidade de condômino, ou de co-herdeiro, ou, em geral, de comuneiro, mal
disfarçava que se supunha, ou supõe, a cognicão completa disso, embora sem se preparar, a respeito, a futura
coisa julgada material. Se o chamado à divisão, ou à partilha, propunha, ou propõe, ação contra o pretenso
comuneiro, aquela suposição somente operava, ou opera, para a eficácia da ação de divisão ou de partilha, à
semelhança do que se passa com a ação de desquite, se está proposta ou depois dela se propõe a ação de
nulidade de casamento, ou mesmo a ação declaratória negativa (inexistência do casamento).
Na primeira fase do processo da partilha como da divisão, ou a) há interesse de cada um dos figurantes em
se pôr termo ao estado de comunhão, ou partindo-se ou dividindo-se, ou b) os que não pediram a partilha ou
a divisão, e relutam, são chamados ao processo e à decisão judicial. Ê desprezar os casos b) negar a
existência de conflito de interesses, ou de lide, nas ações de divisão e de partilha, ao que
se não forraram HEINRICH DEGENKOLB (Einlassungszwang und Urteilsnorm, 68 5.), ZIMMERMANN
(Uber die Teilung, Archiv fúr die civilistische Praxis, 34, 196) e recentemente SALVATORE SATTA
(Teoria e Pratica del Processo, 11). Na apreciação b), alguns juristas exageram o papel do juiz, em
detrimento do caráter negocial que, ainda fora dos casos a), persiste; e outros o reduzem de mais, para
justificar a negação de qualquer contenciosidade e, pois, a classificação das ações de divisão e de partilha
como de jurisdição voluntária (assim E. WrNDSCHEID, Lehrbuch, II, 937; OrTo GEIB, Die rechtliche
Natur der actio communi dividundo, 62 s., e o comum dos escritores). Mas OTro KARIOWA (Rõmisclie
Rechtsgeschichte, II, 456) mostrou que isso não tem, sequer, justificação histórica. O juiz, nos processos
divisórios, não se póe no lugar dos interessados, suprindo a falta do negócio jurídico, pela razão muito
simples de que, no direito clássico, não existia negócio de divisão ou de partilha.
Na opinião isolada de OTTO GEIB (Die rechtliche Natur der actio communi dividun4do, 25 s., 88 5.,)
trata-se de um desses casos em que há a ação, e não há a pretensão, o que representaria, além da desatenção
do autor às alusões do direito positivo ao direito (e a pretensão) a dividir e partilhar, obliteração do que as
fontes antigas nos apresentam sobre a pretensão e a obrigação de dividir. A ação veio atender à execução
dessa obrigação.
Por outro lado, a tentativa de classificar a pretensão a dividir ou a partilhar como direito formativo gerador
(ou transformador), excluiria a cooperação dos outros, e a obrigação, que eles teriam de adirxiplir ou de ser
adimplida em juízo. A situação do comuneiro, na divisão ou na partilha, está longe de ser como a do titu~1ar
do direito de opção, nos contratos de opção; é da mesma classe que as pretensões àprestação, que surge das
própria essa de contratar. A construção da pretensão a dividir a partilhar como direito formativo gerador (ou
transformador) é de artificialidade gritante, porque implica o excluir-se a obrigação à divisão ou à partilha
(traços disso já em. E. 1. BEKKER, Die Aktionen, 1, 226 s.), para se apontar, sem fundamento, o “direito
potestativo” (GIovANNI PAVANIN-I, Natura dei Giudizi ctivisori, 41-76). Em todos os tempos, quando se
descobre algum fato, c!asse ou estrutura, em ciência ou em aplicação de ciências, como a medicina, se
procura explicar pelo novo achado mais do que ele pode explicar.
Nem tanto ao mar, nem tanto à terra. Nem havemos de cair na concepção dos iucUcia duplicia, exagerando a
reciprocidade, nem havemos de escorregar para o apagamento dessa reciprocidade, “isolandG” cada
comuneiro, a ponto de torná-lo sozinho, como o titular do direito de opção (nosso Tratado de Direito
Predial, Torno III). Nesse ponto foi ERNsT ECK (fie sogenannten doppels-eitigen Klagen, 140 5.) o que
mais perto chegou da verdade, mostrando a semelhança da situação dos comuneiros com a dos que têm
pretensão a contratar.
A sentença declarativa não tem eficácia ex tunc, exatamente porque nada desconstitui, só declara. A
sentença que declara nada pode ajuntar; se ajuntasse, faria mais do que declarar. Nem se diga que’ a situação
ou relação “declarada” é que tem tal eficácia, porque a confusão, aí, é ainda
mais grave. Esse erro, de WILHELM Kíscn (Beitríiige, 77), deve ser repelido energicamente. Dificilmente
se admite que tenha caído em tão grande cincada de falar de eficácia ex tuno do negócio jurídico declarado.
A esses e outros absurdos levou o chamar-se “declaratória” a eficácia retroativa de certos atos jurídicos. Um
engano leva a outro; e acaba-se por tecer toda uma rede de equívocos. Nem o contrato de divisão, nem a
sentença de divisão são declarativos. O contrato de divisão
e a sentença de divisão não são, ainda, constitutivos: nem aquele constitui, nem essa. O que os comuneiros
fazem, com o negócio jurídico de divisão, é executar, por si sós, a divisão, que era uma das pretensões de
cada um; propondo todos, um ou alguns, ação de divisão, o juiz executa por eles. Executar não é constituir,
nem desconstituir. Menos ainda declarar. A concepção da sentença de partilha, ainda no sistema francês,
como declarativa, é semelhante à do Sol que giraria, noite e dia, em torno da Terra imóvel. O jurista que não
consegue libertar-se desse equívoco dificilmente se libertará de outros. Havemos de ver os fatos para
podermos classificá-los: se os trocamos por outros, é aos outros que classificamos, e não a eles. Uma das
maiores provas do interesse prático da classificação científica das ações, por suas sentenças favoráveis, está
no esclarecimento da executividade de certas ações, que discussões pré-científicas tentavam classificar
segundo a velha classificação dual, e na análise lógica dos conceitos que estão à base das ações.
Demais, ~,como explicar, se a ação de divisão ou de partilha fosse declarativa, a adiudicatio das partes
divisas (Orro KARI.owA, Rõmische Rechtsgeschichte, 458) e a eficácia só obrigacional do contrato de
divisão ou de partilha? O direito clássico teve de enfrentar o problema do que se pagaria a mais ao que não
recebeu na coisa toda a sua parte e resolveu-o como condenação (condemnatio) a cumprir obrigação nova;
donde, na decisão, a adiudicatio e a condemnatio.
O negócio jurídico dito declarativo e a sentença declarativa somente têm de comum o adjetivo e ambos
conterem enunciado de fato sobre relação jurídica. Mas o plano em que se acha o juiz não é negocial: é o
plano processual, por sobre as partes, em vez de entre partes. O negócio juridico declarativo é negócio sobre
eficácia de outro negócio ou situação. Às vezes os juristas confundem esses negócios ou esses atos com a
convalidação (e. g., FRANcEsCo CARNELUTTI, Teoria Generale, 402 s.), ou com a ratificação, o que é
fora de toda a técnica. Nem sempre o negocio jurídico declarativo traz à relação ou situação declarada
qualquer plus em eficácia. Alude à eficácia, porém não lha dá, ou não lha aumenta necessariamente.
A pretensão e a obrigação a dividir e a partir nascem com a comunhão mesma. são pretensões e obrigações
oriundas da comunhão. O status quo subsiste enquanto não há exercício da pretensão a dividir, que ali opera
à semelhança das denúncias, declarações unilaterais receptícias de vontade (semelhança, não identificação).
O mal dos juristas tem sido esquecerem-se da comunhão, que é matéria de direito das obrigações, relação
jurídica inelidível entre condôminos, co-
-herdeiros, ou comuneiros em geral, e somente prestarem atenção ao direito real que há no condomínio (e
não há, aliás, em muitas comuri,hões).
A ação communi dividunclo e a ação familiae erciscundae têm por fito transformar a comunhão em não-
comunhão, ou em comunhão de outra natureza (e. g., em vez de co-herdeiros, condôminos de certos
prédios). Essa transformação só se obtém por execuções das obrigações de dividir e de partir. Vai-se mesmo
à tenda da coisa, se é preciso. A conversão da coisa, aí, ainda não é tão caracteristicamente execução como a
arrematação, mas há o elemento executivo que é pequeno nas ações de venda, locação e administração da
coisa comum e de alienações judiciais.
Temos pois:
(a) Não há regra a priori para se saber qual o conteúdo e a eficácia das decisões do juiz no processo de
divisão ou de partilha. Cada questão decidida tem o seu conteúdo e a decisão sua eficácia. A particularidade
dessas ações está exatamente em se atribuir ao juiz certa coguição de toda a pretensão a dividir ou a partir,
simplificadas, portanto, as cognições fragmentárias de quanto seja necessário à divisão e à partilha, salvo o
que já, estiver subtraído à sua cognição, e. g., pela litispendência, ou pela coisa julgada material, ou por
eficácia de algum negócio jurídico. Naturalmente, se ele nada disse a respeito, pois não foi levantada
questão, não se aproveitou a sua cognição potencial e não cabe pensar-se em eficácia de coisa julgada
material. Tudo ocorre, então, como a propósito da sentença de desquite, que não produz coisa julgada
material que obste à ação de inexistência ou de nulidade de casamento, se não foi suscitada essa questão
prejudicial, ou não foi proposta a reconvenção. (Cumpre não confundir a coisa julgada material com a coisa
julgada formal das questões que foram resolvidas ou podiam ter sido levantadas e não foram, devendo-se ter
como fora de tempo.)
A sentença do juiz não manda só dividir, ou partir, nem só condena a dividir, ou a partir; a sentença do juiz
divide, parte (O’rTo KARLOWA, Rõmische Rechtsgeschichte, II, 457). Dividindo, partindo, não constitui,
porque não se trata de substituto do negócio jurídico divisional ou particional: executa. Nenhum negócio
jurídico entre os comuneiros poderia ter a eficácia dessa sentença, em que, ao lado da adjudicatio, pode
haver condemnatio, ou, nos casos em que o juiz ordena que previamente se depositem as “reposições”,
condemnatio (elemento declaratório ou condenatório) e execução dessa condenação. Se essa medida não foi
tomada, há parte da sentença que precisa ser executiva: a sentença é executiva; mas, quanto às reposiçócs,
coridenatórias, suscetível de execução à parte (actio iudicati). Ao direito positivo dar-lhe a natureza de
mandamento ou de ação executiva. Onde houve
adjudicação, por certo não se há de falar mais em execução futura, isto é, em efeito executivo; houve e há a
força executiva. Com o iudicium accept um, ficou o juiz com o poder de conversão para executar a
obrigação de dividir ou de partilhar. O poder de conversão abrange o adjudicare das partes divisas ou das
partes no valor, se não cabe a divisão material. Por onde se vê, com claridade, quanto o fundo histórico
sustenta a dogmática jurídica.
(b)A sentença de divisão ou de partilha não é constitutiva, porque a eficácia divisional, já preestabelecida
em partes e modalidades, não é nova, mas apenas realização, execução.
Nem 1 já prefigura II, porque A teria de ser de A, B de B e C de C; nem II pode ter eficácia ex tunc, sem
supor força de lei que estabeleça essa incursão ao passado. Em vez de, em (1), se cancelarem B e C, dando
(1’), ou em (2), A e O, dando (2’), e em (3), A e B, poder-se-iam cancelar A e O em (1), ou A e B, e assim
por diante.
A assiniilação da pretensão a dividir e a partir a direito formativo gerador (ou transformador) também
desatenderia a que o comuneiro, no momento de querer a divisão, ou a partilha, emitiria declaração
unilateral de vontade de conteúdo tão indeterminado quanto antes: não saberia qual a porção da coisa que
lhe tocaria; e essa determinação dependeria do exercício das pretensões similares à dele, ou preferentes à
sua, em certas circunstâncias, e de toda uma série de situações de natureza “executiva”.
A só declaração unilateral de vontade do comuneiro é insuficiente, teórica e praticamente, o que põe abaixo
qualquer construção que recorra ao conceito de direito formativo.
(c) A sentença de divisão e a de partilha não são declativas, porque há um plus que se não explicaria com a
simples declaratividade. O dividir e o partilhar exigem acordo de vontades. Um só dos interessados não
pode dividir ou partir. No status quo, todos querem permanecer no estado de comunhão. Quando um dos
interessados, pelo menos, quer a divisão, ou a partilha, e há algum óbice, inclusive legal, nasce-lhe a ação,
que ou é exercida também pelos outros, assinando todos a petição, ou por um ou alguns, vindo os autos a
juízo depois, com a in ius vocatio. Algo se vai passar e seria impróprio de ação declarativa. Há tantas
pretensões à divisão quantos os comuneiros. Essa pretensão não é de direito real (JOSEF KOHLER,
Gesammelte Abhandlungen, 183, s.; H. LAMMFROMM, Teilung, Darlehen, Auflage und Umsatz-Vertrag,
267), nem, sequer, mista (P. STEINLECHNER, Das Wesen der iuris communio und iuris quasi communio,
II, 141). A pretensão a dividir e a partilhar é puramente pessoal (OrTo KARLOWA, Rõmische
Rechtsgeschichte, II, 455).
A actio com~nuni dividundo é actio in personam. Dita in rem scripta, por passar ao sucessor do condômino.
A divisão e a demarcação dentro do processo do inventário e partilha podem ser simplesmente operatórias,
e. g., o decujo deixou um terreno, com x metros de frente e 2 x de fundo, tendo-se, no esboço, atribuído x/2
a A e x/2 a B, com os mesmos 2 x de fundo, ou x com x de fundo a A e a B, e x com x de fundo a C e a D,
ou em frações diferentes, se os
herdeiros acordaram, no correr do processo, quanto aos limites. Ainda a divisão e a demarcação podem ser
ação incidente, que se processa dentro do processo de inventário e partilha.
(d) j, São executivas ou mandamentais a ação de partilha e a de divisão? Naturalmente, a pergunta refere-se
a preponderância, isto é, à força da sentença.
A discussão sobre serem executivas ou constitutivas as ações de divisão e de partilha termina por ser
vitoriosa a primeira afirmativa. Restaria decidir-se se são executivas ou mandamentais, uma vez que o juiz
manda a órgãos da justiça que partam. Ora, a ação mandamental tende exatamente à obtenção de mandado
judicial a outro órgão do Estado. Aqui, porém, o mandado não é eficácia da sentença, mesmo adiantada. O
mandado, tanto na ação de divisão quanto na de partilha, é para operação que vai servir à sentença (cuja
eficácia é que há de ser classificada), e não operação em virtude de sentença, que aí tivesse sua eficácia
específica. O agrimensor e o partidor prestam serviços técnicos à execução; não exaurem, com o seu ofício,
a função de dividir e de partilhar. Os próprios co-herdeiros podem partir (art. 1.031, 1); e os condôminos,
dividir. A partilha feita pelo pai, ou pela mãe, não executa; donde o caráter constitutivo integrativo da
sentença do juiz. A partilha amigável executa; a homologação integra a execução. (Note-se a diferença entre
integração da declaração unilateral de vontade do pai, ou da mãe, no art. 1.031, 1, e integração da execução.
Ali e aqui, a sentença é constitutiva integrativa, porém não são idênticas.)
Onde há pretensão há exigibilidade. Onde há exigibilidade pode haver, da parte daquele a quem se exige,
recusa à exigência. Qualquer atividade para que se satisfaça a pretensão é positiva, do lado do autor,
podendo não ser positiva do lado dos outros interessados; e, ex hypothesi, não no é de parte de quem não
quer dividir ou partilhar. Por aí facilmente se vê que, mesmo se tivesse havido, no direito clássico,
negócio jurídico de divisão e de partilha, a que se houvesse substituído a ação de divisão ou a de partilha,
isso não seria argumento, menos ainda bastante, para se postular a jurisdição voluntária das ações de partilha
e divisórias.
Quem vai a juízo, por exemplo, pedir a homologação da partilha, não contende; mas basta que tenha agido
sozinho; porque a lei impõe o processo judicial, exerce pretensão em ação adequada, pretensão
“insatisfeita”. Não importa à contenciosidade da jurisdição contestar, ou não, a outra parte a pretensão, ou a
ação. Ações declaratórias, em que o réu não nega a pretensão, nem apresenta contestatação, ou em que desde
logo confessa, não deixam de ser “contenciosas
Outra questão foi a de se saber se as ações de partilha e de divisão eram “contenciosas”. (Cercados de
problemas que só nos últimos séculos, ou neste, lograram solução, era fácil aos juristas encherem o tempo
com essas discussões acadêmicas.)
(e) A ação tem de nascer para que de ação se possa falar. É tanto ação em processo contencioso a que tem
por fito obrigar os outros interessados à divisão, ou à partilha, quanto o seria, por exemplo, a ação
declarativa do art. 4~O~ Ora, é preciso que alguém suscite para que à pretensão se some a ação. O que se
passa, depois, f~ execução pelo juiz em vez de pelas partes, ainda quando com essas coopere, apenas
homologando. A regra não é ser amigável a partilha; a partilha amigável é excepcional e toma o caráter
negocial dependente de integração. Não é muito diferente o que ocorre com outros negócios jurídicos que
têm de ser feitos nos autos, ou fora deles, mas juntáveis, e integrados pelos juizes. (Note-se que, na partilha
amigável, a eficácia preponderante está ligada a momento antes da sentença, ainda quando dependa da
homologação; a sentença, embora quando necessária, é posterius.) Aliás, nas ações cominatórias, o juiz põe
a alternativa “execute ou sofra”. Na partilha amigável, executa-se, e pede-se que o juiz homologue. Homés,
logos; dizer em termos semelhantes, homólogos ; dizer, pois, como nas outras sentenças; dar a força de
sentença ao ato dos declarantes.
A coincidência de pretensões dos interessados todos têm a pretensão de dividir ou de partir não basta para
se dizer voluntária a jurisdição. Nem é certo que todos tenham ação para dividir ou para partir, porque a
ação, aí, depende de se querer que se satisfaça a pretensão e pode bem ser que somente um ou alguns
queiram. A nota promissória que tenho em mãos está vencida e é exigível, porém ainda não cobrei (não
quis), de modo que nascesse a ação cambiária. Herdei, com outros, o prédio x, posso exigir a divisão, se é
divisível, ou a venda, para extrair do valor a minha parte. Se não acordam comigo os outros interessados>
nasce-me a ação. Quando estabelece que a divisão ou partilha tem de ser judicial, o Estado elide a
comunicação de vontade, que havia de ser feita, para dividir ou partir, inserindo-a na petição: nesses casos, a
petição leva consigo a comunicação de vontade para dividir ou partir; o Estado fez simultâneos o exigir e o
propor a ação. Há insatisfação geradora de ação; e a sua concomitância com a ação e com a propositura foi
causada pela exigência da judicialidade, na falta de regra que separasse o nascimento da ação e a
propositura. Essa concomitância também aparece nos casos de direito das obrigações em que se dispensa
interpelação prévia do devedor, sem se poder pensar, portanto, em qualquer insatisfação anterior à citação.
Que o casamento perante o juiz seja ato de jurisdição voluntária, é inegável, que o reconhecimento do filho,
pela comunicação para registro civil, seja ato de jurisdição voluntária, como os demais atos de registro civil,
ou comercial, também é inegável. Muitos atos, que eram de jurisdição voluntária, perderam esse caráter, por
terem deixado de ser perante juizes. Voluntários, porém não jurisdicionais. Não há prestação jurisdicional
sem iurisdictio.
O processo da ação de divisão, como o da partilha, estabelece relação jurídica processual em que o juiz fica
investido de jurisdição contenciosa para todas as questõe3 prejudiciais que surjam, não dependentes de outro
rito. A sentença de homologação longe está de ser somente integrativa do que os interessados acordaram.
Por isso mesmo, onde o juiz decidiu questões prejudiciais, com o elemento declarativo, ou condenatório
preponderante, há eficácia de coisa julgada material. A exigência de ter havido, quanto a essas questões,
discordância específica e concreta, é absurda, porque equivaleria a adotar-se para a eficácia de coisa julgada
material das quaestiones praeiudiciales pressuposto que se não adota para o petitum propriamente dito, nas
ações declarativas e condenatórias. A sentença de homologação é sentença como qualquer outra; é prestação
jurisdicional, cuja extensão executiva vem à frente, porém que se mescla com outras eficácias
correspondentes a elementos mesclados ao elemento predominante.
(f) Tem-se usado e abusado da alusão ao “interesse comum”, nas ações de divisão e de partilha.
A concepção da divisão e da partilha como interesse comum atribui ao adjetivo “comum” significado que,
em lógica, não pode ter: o que é comum é o objeto: alguns interesses são comuns, como o de se conservar a
coisa; porém o interesse de cada comuneiro quanto à sua quota, ou a sua pars futura, não é comum. Cada um
tem o seu, semelhante, não o mesmo que os outros. Há interesses semelhantes em se desfazer a comunidade
de interesse. Há interesse comum em ação dos herdeiros para declaração da existência da relação jurídica
derivada da herança, e nem por isso seria voluntária a jurisdição para essa ação declaratória típica do art.
4.0; não há interesse comum se um deles, ou alguns, ou todos pedem a divisão ou a partilha: A pede a sua
para A na herança, B a sua para B, O a sua para C.
Pedir divisão não é pedir que se divida o bem, e sim que se divida para se dar ao autor a “sua” parte divisa,
isto é, a res. Tanto isso é a verdade científica que A, B e O, donos do edifício divisível, podem pedir a
“divisão” dele em apartamentos, sem pedirem que se lhes dêem partes divisas; e D, E e F, donos de fazenda,
podem pedir a divisão da fazenda em três fazendas, sem que a D se atribua a fazenda 1; a E a fazenda 2, e a
F a fazenda 3: A, B e O continuarão donos do edifício; D, E e F, donos das três fazendas. Vê-se bem que a
ação de divisão dividiria, aí, o objeto, sem cortar a comunhão. Ora, a actio communi dividundo é “mais” do
que isso:
é execução pela substituição de sujeitos de direito; A passa a ser dono dos apartamentos A; E, dos
apartamentos B; e O, dos apartamentos O; ou D, da fazenda 1; E, da fazenda 2, e F, da fazenda 3, deixando
cada um de ser dono do que atribuído aos outros. A idéia de declaração seria fraca para exprimir isso.
Quando se diz que pertence à jurisdição voluntária tudo que conduz à constituição de nova eficácia jurídica,
vai-se demasiado longe: as ações executivas estariam incluídas, pelo forte elemento constitutivo aue há
nelas
Ora, em certos momentos, ainda quando ausente o herdeiro, os que processam divisões ou inventários e
partilhas percebem claramente o que há, neles, de contenção.
Certamente, tem o juiz da divisão ou da partilha a função concreta, pragmática, de pôr em contacto os
interessados. Mas livremo-nos de pensar em pretensão de cada um deles a cooperação, como pareceu a
KONRAD HELLWIG (Lehrbi-tCh, III, 115, nota 71): a cooperação resulta da confluência das pretensões a
dividir, que todos, um, ou alguns exerceram em ação adequada, talvez com a relutância, ou a contragosto de
um ou de alguns. Pensar-se em pretensão à cooperação, de direito público, é artificialidade sem interesse
prático. E sem fundamento teórico, ou histórico.
(g) A diferença entre a venda da coisa executada, em virtude de processo de cognição incompleta, ou em
virtude de processo de cognição completa, e a venda da coisa comum, na ação communi dimdundo, ou na
ação familiae erciscundae, está em que ali se vende a coisa que pertence ao executado, contra o que ele quer,
ou pelo menos contra a sua atitude, e aqui a coisa é comum. A executividade existe numa e noutra, porque
ambas servem à execução: as pretensões de direito material é que são diferentes. Por isso mesmo, H.
LAMMFROMM (Teitung, Darlehen, Auflage und Umsatz-Vertrag, 273) fez bem em notar o elemento
comum, tal como, muitos antes, ZIMMERMANN (t~ber die Teilung, Archiv flir die civilistische Praxis, 34,
207). Ressalta a importância da observação quando se considera a açao sem qualquer propósito executivo,
como a do bem em ruína pertencente a menor.
Na venda da coisa comum, sem ser em execução de dívida dos comuneiros ou em ação de divisão ou de
partilha, tem natureza diferente a ação; e a eficácia da sentença é surpreendente para os que não
aprofundaram o estudo cientific3 das ações: a ação deixa de ser executiva para ser constitutiva, como a de
locação ou a de administração da coisa comum. Constitutiva com forte elemento declarativo e efeito manda-
mental, em vez de executivo, o que explica bastar o ofício ou o mandado para a entrega do dinheiro. Não se
precisa de partilhar, nem, com maioria de razão, de actio iudicati. Porém pelo simples fato de se tratar de
dinheiro, a mais facilmente divisível das coisas. Em todo o caso, se surge dúvida quanto às quotas, logo se
vê que se trata de ação de divisão ou de partilha, ações (executivas) encurtadas ao extremo. Então, o
elemento executivo retoma o que a mandamentalidade ganhara.
A unicidade de órgão e de processo que o direito luso-brasileiro e o brasileiro adotaram mais progredido,
teoricamente, do que os outros sistemas (e. g., francês, e alemão) teve a vantagem de mostrar que a
executividade obrigava à unidade formal.
B)PARTILHAS AMIGÁVEIS
(a) A partilha amigável por instrumento particular, que tem de ser homologada, não se pode esconder o
elemento negocial, o negócio de solução recíproca das obrigações de partir, cada um dos interessados
executando a sua obrigação. A sentença é integrativa de forma dessa “deliberação” extra-judicial. Como a
partilha amigável executa, a sentença, integrando-a, tem força executiva, que lhe vem do conteúdo mesmo
do ato negocial.
(b) A partilha amigável por escritura pública, sem homologação, nos casos em que a lei a permite, é puro
negócio jurídico executivo (solutivo), de direito material, que deixa subsistir a relação jurídica processual,
enquanto não se junta aos autos do processo de inventário e partilha.
(c) A partilha amigável por escritura pública, que se leva à homologação ou a) é apresentada a juízo porque
ela se previu essa formalidade (então integrativa da eficacia), e a sua eficácia executiva começa com a
sentença, tendo sido o negócio jurídico condicionalmente suspensivo (da eficácia), ou b) nada se previu na
escritura pública, e então o que se passa é comunicação de vontade dos interessados no sentido de se obter a
força executiva, própria das sentenças (eficácia que se sabe, por muitos outros casos, ser mais intensa que a
das escrituras públicas).
(d) A partilha amigável, por termo nos autos, segue-se a homologação, que é a sentença integrativa de
forma, no que se aproxima da espécie (a) e de (c) a) e se distancia de (c) b) e, ainda mais, de (b). Tem força
sentencial, como em a)e em (c). Não há, quanto à eficácia das sentenças nos três casos, (a), (c) e (d),
qualquer diferença, a despeito de serem diferentes os negócios jurídicos de partilha, que a sentença integra.
IX.AÇÃO DE DEMARCAÇÃO
A ação de demarcação (arts. 946-966), que é ação real,funda-se em direito de propriedade. A pretensão a
delimitar declarativa, com elementos secundários de constitutividade e de condenatoriedade. Somente na
segunda fase o elemento executivo passa à frente. Veja Tratado de Direito Predial,vol. 1, 329-336.
a) A ação de embargos de terceiro é contra outra ação. Nada tem com embargos recursais. N~ há embargos
de terceiro sem outra ação em que a constrição se dê ou se possa dar e contra ela se dirija o terceiro, com o
seu “embargamento” como se dizia em Portugal, já no século XIII.
(a)A ação de execução da coisa vendida, isto é, a excussão (art. 1.070 e § 1.0), para se haver o saldo apurado
do preço, é ação para obter o adimplemento do contrato mais execução; portanto o elemento executivo é o
que prepondera: a ação é executiva.
(b)A ação de recuperação da posse da coisa vendida com reserva de domínio e entrega é ação de condenação
com transformação parcial alternativa em ação executiva, se não houve pedido de moratória, devendo-se
notar que aqui o depósito da coisa é diferente do depósito de que se fala na ação de consignação em
pagamento. Mais: é cautelar, e não executivo; nem sequer se há de pensar em depósito para execução. A
executividade começa com o pedido de reivindicação da posse da coisa depositada. A primeira fase é de
ação preparatória” mandamental, embora posta no mesmo processo; a segunda, executiva, se houve
contestação, sem se requerer a moratória do art. 1.071, § 2.~, ou se não houve contestação, porque se dá,
requerida, a recuperação da posse (art. 1.071, § 3.0). No processo, o autor restitui o saldo do art. 1.071, §
3•o, in une, dando-se a consignação em pagamento, se preciso.
(c)A ação para cobrança do saldo é ação de condenação (art. 1.070).
(d)A ação para cobrança do saldo toma a natureza executiva se se satisfazem os pressupostos do art. 585, 1 e
II, ou é executiva da sentença na ação (c).
XIV.JUÍZO ARBITRAL
Depois do que escrevemos sobre os arts. 1.072-1.102 pouco teríamos a dizer, ainda em sistemática. Mesmo
no plano supra-estatal, as decisões dos juízos arbitrais não estão sujeitas a recurso, porque esse princípio é
fundamental na Convenção da Haia, mas, com isso, não se afasta a revisão se se descobre fato novo, salvo
se houve cláusula contrária. Isso não significa que não se possa propor ação de nulidade ou anulação do
laudo ou do próprio compromisso. Entendemos isso no plano do Direito das Gentes, no do Direito
Internacional Privado e no plano do direito estatal.
No direito brasileiro, o compromisso pode conter a condição de ser a sentença com recurso pala o tribunal
superior (art. 1.075, II): e, se há a cláusula sem recurso, pode ser inserta a pena para quem recorra (art.
1.075, III).
Uma coisa é a) o exercício da pretensão a ser nomeado inventariante, ou o exercício da pretensão a que se dê
inventariante ao processo de inventário e partilha, e outra b) a ação de investidura da inventariança, que toca
ao interessado, não-nomeado inventariante, para chamar à investidura o inventariante (art. 990, parágrafo
único). Trata-se de processo provocatório. Ou comparece e assina o termo, ou é nomeado outro
inventariante, sequestrando-se-lhe (elemento mandamental) os bens de que acaso esteja de posse.
A estrutura do remédio jurídico é complexa: intimação para comparecer e assinar o compromisso
(praeceptum); comparecimento e contestação da obrigação de dar bens a inventário, isto é, de ter consigo
bens do decujo (contraditório, com a alternativa para o juiz: ou cognição superficial positiva, com repulsa da
contestação e seqüestro dos bens, acompanhado de nomeação de outro inventariante, ou cognição superficial
negativa, com sentença de reserva, para que em via ordinária se apure a existência de tais bens); não-
-comparecimento, julgamento da intimação, quer dizer do pracceptum, com a expedição do mandado de
seqüestro (eficácia mandamental) e nomeação de outro inventariante (eficácia constitutiva negativa, que é a
eficácia destitutiva, e a positiva, nomeação de outro). Cf. Ordenações Filipinas, Livro 1, Titulo 88, § 4, e
Livro IV, Título 96, §§ 12 e 13.
A impugnação do art. 1.000 é ação constitutiva, e não defesa em ação de aditamento de constituição. Daí a
sua semelhança com a remoção, e não a identidade com a nomeação. Se desfavorável a sentença, o recurso é
o de apelação, e não o de agravo de instrumento.
A ação de remoção de inventariante (art. 995) é constitutiva, mas de forte elemento condenatório. A eficácia
preponderante é, porém, a das sentenças constitutivas. O seqüestro dificilmente se explicaria como efeito; é
força mandamental de parte da sentença. Em verdade, há duas sentenças numa só.
O elemento condenatório que se nota, na ação e na sentença, é semelhante, em intensidade, ao de outras
sentenças constitutivas negativas, e não prepondera. É o caso do desquite litigioso, ou o de algumas ações de
nulidade de casamento por culpa do cônjuge. Esse elemento desaparece quando o inventariante perde o
cargo por alguma causa estranha à sua culpa (incapacidade, escusa). Tal como acontece nos desquites
amigáveis.
O)AÇÃO DE SONEGADOS
A ação de sonegados é constitutiva. Quando o Código Civil, no art. 1.782, parágrafo único, diz que “a
sentença que se proferir na ação de sonegados, movida por qualquer dos herdeiros, ou credores, aproveita
aos demais interessados”, não redige regra de extensão da eficácia da sentença (e. g., fazendo
excepcionalmente atingente dos outros interessados a coisa julgada material da sentença “declarativa”, ou
“condenatória”): a regra apenas explicita a eficácia própria da ação constitutiva. No direito civil alemão (§
2.005), a ação é apenas de condenação; no direito civil francês (art. 792), constitutiva.
a)A ação de separação de bens para pagamento de dívidas da herança (arts. 1.017 e 1.018) é constitutiva.
Não prepondera o elemento mandamental. Poder-se-ia, de iure condendo, conceber a essa separação como
força de sentença mandamental. Em verdade, porém, o que prepondera é o elemento constitutivo; e o art.
1.017, § 2.0, verbis, “concordando as partes”, é expressivo.
A ação de separação somente cabe se não se vai pagar imediatamente a dívida. O art. 1.017 não exclui
pagamentos antes da partilha, ou do julgamento do inventário negativo.
b)A ação de reserva de bens para solução de dívida impugnada (art. 1.018, parágrafo único) é mandamental,
baseada em cognição incompleta superficial, e entra na classe das medidas cautelares, embora não se ache
no Livro III.
c)A ação, “embutida” no mesmo processo de inventário e partilha, de pagamento de imposto é declarativa.
Não há condenação nem execução.