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Projeto

PERGUNTE
E
RESPONDEREMOS
ON-LIME

Apostolado Veritatis Spiendor


com autorizagáo de
Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb
(in memoriam)
APRESENTAQÁO
DAEDigÁOON-LINE
Diz Sao Pedro que devemos
estar preparados para dar a razáo da
nossa esperanca a todo aquele que no-la
pedir (1 Pedro 3,15).

Esta necessidade de darmos


conta da nossa esperanca e da nossa fé
hoje é mais premente do que outrora,
visto que somos bombardeados por
numerosas correntes filosóficas e
religiosas contrarias á fé católica. Somos
assim incitados a procurar consolidar
nossa crenca católica mediante um
aprofundamento do nosso estudo.
Eis o que neste site Pergunte e
Responderemos propóe aos seus leitores:
aborda questóes da atualidade
controvertidas, elucidando-as do ponto de
vista cristáo a fim de que as dúvidas se
dissipem e a vivencia católica se fortaleca
no Brasil e no mundo. Queira Deus
abengoar este trabalho assim como a
equipe de Veritatis Splendor que se
encarrega do respectivo site.

Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003.


Pe. Esteváo Bettencourt, OSB

NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR

Celebramos convenio com d. Esteváo Bettencourt e


passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual
conteúdo da revista teológico - filosófica "Pergunte e
Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicagáo.
A d. Esteváo Bettencourt agradecemos a confiaga
depositada em nosso trabalho, bem como pela generosidade e
zelo pastoral assim demonstrados.
AINW V

D E Z E M B R (

1 9 6
ÍNDICE

I. CIENCIA E REUGIAO
PáB.
1) "Recentemente os dentistas tussob consepxáram modificar
o eomportamento psíquico de ctrtos pacientes apticando-lhes o i?<u$
magnético.
Nao será islo indicio de que o homem i mera materia, total
mente sujeito A acao e á reacáo dos elementos materiais, sem ter
algo de transcendente ou espiritual dentro de si f
Nao seria o materialismo a concluxao obvia das ciencias mo
dernas ?" ¿S7

II. DOGMÁTICA

S) "Qnr rri'litu mrnccm ns vinücit de Ana-Cntarina Kmmc-


rir!; referente* ñ vida e a Pnixfio de Nosso Senhor Jesús Cristo ?
Seriam autenticas rcvclaeóes ?" i!>5

III. SAGRAI>A ESCRITURA

3) "Há dttan passagens da historia sagrada, cm que Deus pune


os liomcnx com a morte, xem que para ¿sío partea haver cvlpa pro
porcional : I Smn C,Í9 (o episodio dos habitantes do Betzamés) c
S Sam C.fís (o episodio de Oza). Como ¡>r hú de entender que o
Senhor tctthti s¡'l<> tñu eruet ?" 50:1

TV. MORAL,

4) "Que dizer das operaeües eirúryicaa destinadas a corrigir


ou mudar o sexo do paciente ?" 510
5) "As operaeñes plásticas, que visam dar urna configurado
tnais estética ao paciente, seráo lícitas ?" SIS
6) "Como julgar os regimes para emagrec&r, tüo freqüente-
mente adotados pela nossa sociedade t" 515

V. HISTORIA DO CRISTIANISMO

7) "Como se explica o propalado divorcio de Luis Vil, rei do


Franca, e Eleonora da Aquitánia, concedido pelo concilio de Beau-
geney em 1152 ?
Será entáo que a lgreja nao admite divorcio ?" 522
8) "Entre os casos escabrosos da historia da Igrcja, costu-
ma-se contar que o Papa Alexandre VI concedeu o divorcio ao rei
Luís XII da Franca.
Como se terá dado o episodio ?" 525

COM APROVACAO ECLESIÁSTICA


«PERGUNTE E RESPONDEREMOS»

Ano V — N" óO — Dezembro de 1962

I. CIENCIA E RELIGUO

FÍSICO (Belo Horizonte):

1) «Recenteniente os dentistas russos conseguiram modi


ficar o comportamento psíquico de certos pacientes aplicando-
-lhes o ímá magnético.
Nao será isto indicio de que o homem é mera materia, total
mente sujeito á aciio e á reacáo dos elementos materiais, sem ter
algo de transcendente ou espiritual dentro de si?
Nao seria o materialismo a conclusáo obvia das ciencias
modernas?»

Em primeiro lugar, examinaremos o trámite preciso das experien


cias ácima mencionadas. A seguir, orocuraivmos da i dcduzir algumas
«•videntes coitclusócs, que o testemunho dos próprios eientistas russo?
eoiToborai'i'i.

1. As experiencias realizadas

1. Urna das últimas e mais significativas provas efetuadas


no setor da Psicología se deve ao Dr. Vassiliev, membro corres
pondente da Academia de Ciencias da U.R.S.S. e diretor do
Instituto de Parapsicología de Leningrado. Ésse médico fez que
um de seus pacientes entrasse em sonó hipnótico, sugerindo-lhe
entño que era tremendo bandido. O doente, dócil como cía, logo
coniogou a revolver os olhos furiosos, e proferir ameacas. toman
do ao mesmo lempo as atitudes de quem está armado de urna es
pingarda. Ent cementes o clínico, sem que fósse percobido, apro-
ximou da nuca do enfermo um fragmento de poderoso ímá
magnético. Imediatamente o cenário se mudou : o doente se
acalmou: sem que tivesse recebido alguma ordem -ou sugestáo
neste sentido, passou a comportar-se como um operario pacato,
consciencioso e cumpridor do dever; em vez da espingarda, pare-
cia manejar urna enxada.
O Dr. Vassiliev aínda quis prosseguir na experiencia, colo
cando dessa vez em urna das máos do paciente um revólver, e na
outra um novelo de lá. Sugeriu-lhe, a seguir, que se comportasse
simultáneamente como bandido (do lado em que empunhava a
arma) e como dona de casa (do lado do novelo de lá). O enfermo

— 4S7 —
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 60/1962, qu. 1

obedeceu sem titubear, fazendo os gestos e tomando as atitudes


correspondentes as duas sugestóes recebidas; estava táo compe
netrado dos dois papéis que nunca os teria reproduzido com
tanta exatidáo se com plena lucidez de espirito tivesse a intencáo
de os reproduzir. A vista disto, o médico lhe aplicou mais urna
vez o imá, e com grande surprésa verificou que o lado «bandido
do paciente passou a se comportar como dona de casa, ao passo
que o lado, até entáo «feminino», exibiu a conduta de malfeitor.

2. Esta experiencia, por mais estupenda e impressionante


que seja, nao é nova no setor da ciencia. Com efcito, ja em fins
do século passado, certos estudiosos aplicavam o imñ aos seus
pacientes, obtendo reagóes assaz curiosas. Contudo naquela
época semelhantcs provas nao mereceram grande atencáo por
parte dos cientistas, pois ficou averiguado que nao poucos dos
relatos que as anunciavam envolviam dados mentirosos ou fan
tásticos; dai se originou entre os sabios urna atitude de descré
dito generalizado frente a todos os relatórios que falassem de se-
melhantes fenómenos.
A contribuicáo dos estudiosos modernos consiste apenas em
ter retomado as experiencias antigás dentro de quadros rigoro
samente científicos, isto é, cercados de todas as cautelas neces-
sárias para evitar mistificagáo ou ilusáo.

3. Sendo assirn. será útil rcrensenr tamhcm alburnos das expe


riencias eíctuadas ha decenios atrás.

a) Os dois médicos Bianehi d Sommer levaram urna de suas pa


cientes a estado de sonó hipnótico, sugerindo-lhe cntáo :
«Que espléndido dia de veráo vamos agora vivendo! Entremos nesse
va^áo íerroviário e ompreendamos urna excursáo!»

O semblante da enferma passou conseqüentemente a exprimir ale


gría; levantou-se do leito c pós-se a caminhar, aprestando-se para sair
como se estivesse em belo dia do primavera. Nesse interim, o Dr. Biary
chi aproximou por detrás unía barra de imá, colocando-a a meio-centí-
metro da nuca da paciente. Esta entáo se perturbou; a sua fisionomía
passou a exprimir pavor; finalmente exclamou :

*Ó que terrivel desastre! O trom saiu dos trunos, de- modo que ,iá
nao podemos viajar! ■■

b) O célebre psiquiatra e jurista italiano Lombroso repetiu esta


e semelhantes experiencias, verificando que cada um dos dois polos do
ima pode ter sua influencia própria. Foi o que se deu, por exemplo, com
um jovem, R. P., de treze anos de idade, filho de máe histérica; em
conseqüéncia de urna Ies3o, sofría dos ñervos; veio a contrair grave
coxalgia; ao cabo de quarenta dias, quando já se sentía melhor, foi
repentinamente colocado em estado de transe hipnótico, perdendo entüo
os sentidos da dor, da visáo e do ouvido; nesse estado, porém, passou a

— 488 —
ALMA HUMANA E MAGNETISMO

soírcr de ataques nervosos. A experiencia foi repetida sucessivas vézes,


registrándose que tais ataques podiam durar alguns segundos como
também varias horas. Lombroso, diante disso, resolveu aplicar o íma,
e observou que o mal desaparecía ¡mediatamente, sempre que aplicava
ao doente os dois polos de urna barra magnética; o mesmo efeito bené
fico podía ser obtido pela aplicagáo do polo norte apenas, ao passo que o
polo sul da poca magnética, apurado exclusivamente, só concorria para
agravar os malos do enfermo.
Lombroso explorou tal género de estudos, auxiliado por seu colabo
rador Ottolenghi. Com nove pacientes os dois cientistas realizaram um
total de 170 provas, eheyando ás conclusóes seguintes : a aproximacáo
do ímá provoeava a invcrsao das reacóes alueinatórias listo so den cm
62r,'r dos casos exudados); a mesma aproximado n;"to invertía, mas
apenas modifieava as reacóes nao própr¡amento alueinatórias, como,
por cxemplo, as ¡lusót's psicosensoriais t foi o que se registrón nos 38'r
dos casos restantes i.
Experiencias semelhantes íoram efetuadas também pelo Dr. Carlos
Samson Feré, famoso psiquiatra de íins do séeulo passado, assim como
pelo Dr. Alfredo Binet, diretor do Laboratorio do Psieo-fisiologia na
Sorbonne fin París.

c> Também merecem atencao as provas feitas mediante aplicacáo


nao do ímá. mas de certas drogas químicas.
O Dr. Julio Bernardo Luys, por exemplo. mumbro da Academia
Francesa de Medicina, em 1SS9 publicou seus resultados na obra
-Legons cliniquos sur les principaux phénoménos de l'hypnotismes.
Rekitou suas experiencias feitas com urna pessoa histérii-n colocada
cm estado di- sonambulismo; em conclusño, averiguara que a mesma
substancia química aplicada á parte posterior da cabera da paciente,
provocava determinadas expressóes no semblante da mesma. exprés-
sños, porém, <|iie diferiam urnas das outras. de acordó com o hemis
ferio cerebral ao qual se nplirasse a drot;a ios traeos fisionómieos obti-
dos pela aplicacáo ao lado direito eram, sim. diversos dos que resul-
tavam da aplicacáo ao lado esquordo). Luys repetiu suas experiencias
utilizando trinta e cinco drogas diferentes encerradas em tubos rigoro
samente idénticas, di- modo que a paciento nao podía discernir o con-
teúdo; os resultados eram, em todos ésses casos, análogos : assim um
tubo ile jaborandi provocava insalivacáo e vultuosos suadouros na pa
riente; o álcool eiilico produzia crises de tioliritim tremons < delirio
convulsivo). Corto extrato de ceri'ja causava convulsóes. alienaeño dos
sentidos <■ visóos imaginarias. A fim de se assegurar di' <iuo tais rea-
coes nao se di-vjnm a urna mímica maliciosa ou mistificadora da pa
ciente. Luys resolveu recorrer ao seguinte expediente : íé-la adorme
cer, e durante o sonó extraiu-lhe pequeña quantidade tic saliva, que o
médico submeteu á análise química; a seguir, aproximou da nuca da
enferma um tubo de pilocarpina; retirou-lhe nova dose de saliva, e
analisou-a, verificando entáo que a cota de acucar havia subido. Éste
teste parecía demonstrar suficientemente que as reac&es da enferma
frente as drogas n.'io eram produto de mistificacá".
O Dr. Luys valeu-se dos resultados de tais estudos a fim de acal
mar pacientes sujeitos a ataques e convulsfies nervosas; pronto alivio
rra obtido mediante o simples contato do tubos de valerianaio de amo
nio com ó paciente.

d) Lombroso também íéz seus ensaios neste setor : hipnotizou


urna paciente e aplicou á sua mao um frasco fechado chelo de álcopl.

— 489 —
PKRGUNTE E RESPONDEREMOS- ffl 19fi2, q». 1

Inmediatamente tal pessoa apresentou síntomas de embriaguez, e velo


a sofrer de perturbacñes nervosas, língua presa, etc. — Hipnotizou
também um marinheiro epiléttco que podía, sem conscqüéncías, beber
extraordinarias doses de álcool e doral; durante o transe hipnótico,
tocou-o com pequeños frascos de Alcool e cloral; em conseqüéncia, o
marujo caiu vitima do terrível crise de embriaguez. Mais aínda : tra-
balhando com urna pessoa que padecía de histeria, Lombroso lhe colo-
cou ñas máos urna solucáo de morfina em extrato de louro-cereja;
ora éste simples fato provocou na enferma um estado de sonó e alu-
cinacoes jubilosas... Com outros pacientes, semelhantes efeitos foram
obtidos pela simples sugcstfio do nome de certas drogas.

4. A guisa d<? ilustracáo. seja onfim registrada urna das noticias


mais recentes divulgadas pela imprensa a éste propósito :

■ As panículas do ar «irrogadas do oletricidaclc podem oxorcor in


fluencia importante sobre os astronautas no espaco ou nutras pcs.soas
sob trnsfio. aumentando-lhes a eficiencia ou tornando-as preguicosas.
Os ionios com carga positiva, como os que sao produzidos pelas
lámpadas fluorescentes, aumentam a atividade e a capacidade das pes-
soas sob tensao física ou mental, ao passo que os ionios de carga
negativa tendem a produzir o efeito oposto, segundo deelarou o Dr.
Alian H. Frey. do Centro do Eletrónica Avancada da General Electric
Company. em Ithaca, no Estado de Nova York, talando nutna reunüio
da Assoéiacáo Estadunidense de Engenheiros Agrónomos.
Os ionios de carga negativa vém sendo usados há varios anos
para curar íerimentos e outras infoccoes. Também ja foram experi
mentados no combate ao cáncer c outras enfermidades. e ompregados
de varias outras formas a servico do homem.
As experiencias realizadas pelo Dr. Frey indicam que os ionios
de carga positiva sao os mais úteis p os de carga negativa feralmente
usados .«ño nocivos» (transcrito fio '-O Globo de 28/fi/(52i.

5. Experiencias tais, cujo número hoje em día é assaz


elevado, levam alguns homens de ciencia a admitir que os fenó
menos nervosos sao de naturezaelétrica; há mesmo quem pre-
fira usar o termo «Bioeletrónica» para designar a disciplina dita
comumente «Parapsicología».
O leitor, ao tomar conhecimento déstes dados, nao se poderá
furtar á questáo :

2. Quais as consecuencias de tais fatos ?

1. Seja logo mencionada a observacáo de Michel Garnier,


que, na revista «Science et Vie» n" 538 (julho de 1962) pág. 98,
descreve as experiencias de Lombroso e dos cientistas contem
poráneos. O articulista lembra, sim, que tais feitos abrem mais
urna via para se explicarem os fenómenos do «Espiritismo». Por
falta de conhecimentos científicos adequados, tais fenómenos
eram no fim do século passado atribuidos 'á intervengáo de espi-
rltos do Além; eram tidos como preternaturais ou sobrenaturais;

— 490 —
ALMA HUMANA E MAGNETISMO

em nossos días, com o progresso da ciencia, váo sendo mais e


mais elucidados racionalmente; sao reagóes da natureza humana
como tal colocada em circunstancias extraordinarias.

Sem dúvida, muito sabia c a obsorvacáo tle Garnier : ñas manifcs-


tacóes atribuidas a dupla personalidade, por c.xcmplo, nao ha cm abso
luto dcscida do algum espirito do AJém nem indicio de reencarnaráo;
ludo se explica pelo funeionamento mesmo da natureza humana, tai
como ola é condicionada pelos limites c as circunstancias desta vida
terrestre.

Contudo esta observacáo, por sua vez, poderia sugerir ulte


rior questáo : mas entáo tudo dentro do homem é materia?!
Aquilo mesmo que se chamava «espirito» ou «psique» até os últi
mos tempos, nao deverá ser considerado como energía eletrica
ou fluido da própria materia? Nao cairemos assim no puro mate
rialismo?

2. Nao. Seria exagerada ou mesmo tendenciosa urna tal


conclusáo. As experiencias da ciencia moderna levam, antes, a
compreender melhor o que é o homem. Em outros termos :
levam-nos a perceber claramente que

a) o homem possui, sim, urna parle material, que lhe ó


comum com os demais seres materiais (calcio, ferro, hidrogénio,
oxigonio..., carga de eletricidade, etc.). Isto o torna sujeito a
reagir aos estímulos materiais que lhe sejam aplicados,... e a
reagir á semelhanga das outras criaturas materiais. É também
o que possibilita a fabricacáo de «robots» ou «cerebros artifi
ciáis»; estes sao produtos da maquinaria e da eletrónica portado
res de urna engrenagem material semelhante á do cerebro e por
conseguinle capazes de reproduzir os efeitos que o cerebro im
mano produz.

Há porém. urna diferonca essencial entro o cerebro humano r o


cerebro artificial — diíerenca esta que obriga a asseverar que o ho
mem nao ó apunas materia ou energía eletrica, mas que

b) no ser humano há algo mais do que materia, algo que


transcende ou ultrapassa o alcance da materia e que é chamado
«espirito».

Esta diferenea já foi detidamentc focalizada em «P-R-» 15/1959,


qu. 1, de modo que aquí nos limitamos a recordá-la sumariamente.

O cerebro artificial executa, sim, com extraordinaria rapi


dez urna determinada atividade (um cálculo, por exemplo) seme-
Jhante á do ser humano; mas executa-a cega e necessariamente.

— -191 —
«PERPUNTE E RESPONDEREMOS> 60/1902, qu 1

É incapaz de conceber o próprio programa. É o operador humano


quem deve por o problema em equagáo; urna vez formulada a
equagáo (trabalho arduo que requer inteligencia estritamente
dita ou a faculdade de apreender proporcóes), a máquina dis
pensa o homem de fazer o cálculo subseqüente; basta ao traba-
Ihador colocar os termos da equagáo (sob forma de cartees per-
furados, fichas, etc.) dentro da máquina e mové-la a fazer as
operacóes programadas; estas entáo sao rigorosamente executa-
das, pois a máquina jamáis recusa o roteiro que Ihe é imposto.
Dado que o operador so engañe ao colocar os elementos do pro
blema no autómato ou ao indicar a vía de solugüo, a máquina
nao percebe o erro, nao corrige o homem, mas fica estritamente
presa aos limites de aoáo que o operador humano lhc tenha de
terminado.

Em outrcis lí-rmns nimia se (liria : n máquina ó incapaz do inven


tar. O operador nfto encentra nos resultados do • robot coisa alguma
que nao estoja implícitamente contida nos dados que 61c colocou den
tro do autómato. Como notava Einstein, -por muito que a máquina
se aperfeicoe. ela poderá resolver todos os problemas que quisermos,
mas nunca por um problema ■ i por, isto é, formular em cqiiacíio).

A máquina tambóm nao ó suscetivel de educac.no. ou seja,


de aperfoi^oamonto inspirado pela reflcxíio sobre sucessivas ex
periencias. Só se aperfeicon na medida em que o homem, refle-
tindo sobre as suas experiencias, se aperfoicoa.

Urna ilustraeáo típica desta ¡ifirmncáo (• sugerida pelo <robol>


que joga xadrez, ou melhor, que joga as etapas fináis de urna partida,
destinado a obter a Vitoria sobre o adversario. O <^robot» vence sempre
mediante a mesma serie de lances; nem após o milésimo jógo muda
o seu plano, seja para melhor, seja para pior.

Analisando um dos tipos mais modernos de máquinas eletrónicas,


o chamado «Mobot*. comenta R. de Narbonne ma revista «Science et
Vio n» 538, pág. 92» :
«É. .. um aparelho de utilidade excepcional; só Ihe falta realmente
a eapacidade de foniur tniriuiivas».

Ora justamente a eapacidade de tomar iniciativas, que 6 própria


e exclusiva do ser humano, significa que o homem vé o porque de de
terminada engrenagem, percebe as ri-lacóes que há entre as diversas
pecas da máquina, avália as proporcóes existentes entre tais meios e
tal flm... Assim o homem se emancipa da intuicáo déste ou daquele
dado concreto sensivel que os sentidos exteriores (a vista, o ouvido, o
tato...) Ihe fornecom, para perceher as proporcóes ou relagoes que
se realizam em todos os casos análogos. Por cxemplo, diante da serie
de equa.coes

2 + 3 = 5
5 + G = 11
3 -f 9 = 17
12 )- 13 = 25

— 492 —
ALMA HUMANA E MAGNETISMO

o homem percebe a cstrutura única que está «por debaixo» désses


variados casos concretos, isto é, percebe a leí do proporcionalidadc
que rege as diversas equacóes ácima e que ele assim formula :

a -h (a Hh li = b

ou a Hh a H = b

ou 2an- 1 = b

É tal capacidade de ultrapassar os dados concretos e individuáis,


íornecidos pelos sentidos, que nos leva a dizcr que no homem há algo
mais do que materia; há, sim, um principio de acao e de vida que é
¡material e que nos chamamos «espirito». Naturalmente o espirito hu
mano só exerce sua atividade própria e só se maniíesta em dependen
cia da materia (particularmente em dependencia do cerebro, o qual é
como a central eletróniea que reúne os dados colhidos por cada um
dos cinco sentidos externos do homem). É o que dá a impressáo de
que o espirito ou a faculdade intelectiva do homem coincide com o
cerebro ou com a materia mesma; etn verdade, niio coincide.. ., mas
supera a materia: contudo só se maniíesta em dependencia da mate
ria, de tal modo que. quando o cerebro está lcsado. a inteligencia fica
latente ou sujeita a cxpressóes imperfeitas e descr.eontradas <embora
permanoca ilesa >:... quando os sentidos externos c o cerebro sofrem a
agáo de um eslimulo estranho. como seja um polo magnético, ocasio-
nam naturalmente um comportamento novo ou estranho da própria
alma ou da intolijiónria <¡a pessoa afolada.

O materialismo, fjortanto, está lonije do ser o sistema de


filosofía que as experiencias da ciencia moderna sugerem; o ma
terialismo nao é conscqüéncia necessária dos progressos do
conhecimento humano, mas é urna tentativa de explicacáo que
depende de fé. depende de unía crenea, e nao de ciencia. Sim;
por mais estranho que isto pareca, a posieáo materialista supóe
fé nos seus adeptos, como a supóe a posicáo idealista ou espiri
tualista ou crista, É o que ensinam os próprios ateus da Rússia
contemporánea, como se depreenderá do parágrafo abnixo.

3. O dupoimento da ciencia russa

1. Nos últimos tempos tem-se intensificado na Rússia a


propaganda anti-religiosa... Seus arautos procuram utilizar os
dados da ciencia e as descobertas da técnica moderna para fun
damentar o ateismo e o apresentar como exigencia do saber con
temporáneo.
No mes de novembro de 1961, realizou-se, pois, em Moscou
urna serie de estudos sobre «os sistemas de educacáo científica
atéia». Um dos oradores, M. G. Gourev, fez entáo a seguinte de-
claracáo:

«Tenho encontrado pessoas instruidas que dizem nao crer no Deus


antropomórfico da Biblia e que estáo de acordó conosco em criticar

— 493 —
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 60/1962. qu. 1

a fé num Dcus Criador. Contudo... cssas pcssoas, ao abandonar a


religiáo, nao chegam até o ateísmo, mas passam por fases intermedia
rias, e muitas vúzcs a¡ ficam».

E acrescentava o motivo dessas atitudes : o ateísmo, dizia


cíe, nao é conclusáo decorrente da ciencia; nada tem de cientí
fico. Com efeito, a ciencia só professa o que ela observa ou veri
fica. Sendo assim, está totalmente inabilitada para ver ou averi
guar que o mundo é eterno ou que se fez por si mesmo; por con-
seguinte, ela nao pode pravar que Deus nao existe.

A estas observares corresponden! os sesuintes dizores de um


cientista <la Estonia. E. Spinnkiru\ que* afirma ser ateu desde a sua
infám-ia... Éste pensador cni 1fM«> dir&iu umn caria a um colega
russu, o Professor Alcxandre Ossipov, (ine. poneos meses antes, decía-
rara abandonar t¡u.!l(|iier trenca religiosa para proíessar doravanle o
ai cismo. Era tal curta léem-se as considerarles abaixo :

Tivoste a possibilidade «le confrontar os argumentos da lógica e


df comparar os fatos que mililam cm favor da roligiao, com os que
militam cm prol do ateísmo. E aceitaste o ateísmo na sua forma
a nial. Isso, cu n;':o o posso ''ompreender... \

A seguir. Spinakino f'"isa que ole mosmo so considera atou desde


a infancia, c prosse^uc :

Che-íii-'i ;"i i'iinvii'í.vKi de que. em s<m forma atnal, o ateísmo nao


pode pretender pnssuir valor científico.. . Alualmente o ateísmo pa
reen ut renunciado a procurar a wrdrule. visto que ól»* silencia r\ res-
peilo do.s falos e i!os argumentos 'pie Ihe eontradizem. Os atells jiro-
metem explicar ludo, mas, já 'i'.ii.- uño o conseguem, dissimulam sua
incapacidade. Nao concordo com essa lática...
Os ateus sao etn favor do bom senso. É éste um dos seus argu
mentos preferidos. Todavía, como dizem os físicos, o bom senso nao
c sonao a experiencia limitada do Ronero humano, experiencia limitada
á qual os homens, sem o querer, dáo importancia íjeneralizada. O bom
senso nao era — e nao é — no selor da ciencia um criterio digno de
confianga...
A impossibilidade de se eonceber o 'pcrpetuum mobile' (o móvel
perpetuo i foi científicamente demonstrada: apenas os ateus nao aere-
ditam nessa impossibilidade. Conforme oles, o sistema do universo
está em movimenlo desde todo o sompre, sem receber o mínimo acrés-
cimo de cner^ia. Em conseqüéncia. nao sabemos quem está lio erro :
a ciencia ou os ateus...
Em suas formas atuais, o ateísmo representa urna concepcüo pos-
simista que inspira desespero... É éste o ponto fraco que o ateísmo
dissimula... Dir-sc-ia que as suas concepcócs nao estáo fundadas sobre
a razúo nem sobre a ciencia... Nao tens a impressáo, tu como eu,
de que a religiSo crista foi a fó de ontem, o ateísmo ó a fó de hoje.
enquanto a fé de amanha aínda nao existe? Nao tens assim a impres
sáo de que ninguém pode viver sem fé? Encontrarías em ti a coragem
necessária para renunciar as tuas atuais idéias e empreender novas
pesquisas?...
Como é que... aínda poderás usar da palavra cm nome do pro-
Srcsso o da verdade, para condenar a íé de ontcm, depois de teres

— 494 —
AS VISOES DE ANA-CATARINA EMMERICK

tomado conscióncia do que a fé de hoje é igualmente imperfeita? Nao


é um dedo de foj;o, mas sao canetas-tin'.eiro que escrevem a respeito
do ateísmo : 'Mené, mené, thequel, oupharsin1; o que quer d:ze:\ se
n.ño me engaño: 'Nos o ponderamos u ñáo julgamos que merecesse fé
o confianc.a'^ <dooumentacáo colhida em <Informations Catholiques
Internationales n" 1GS. pág. 20si.
A posicao c!e Spinakine, assim enunciada, ostá longo de ser urna
proíissüo de fé religiosa. Cahc-lhc todavía o mérito de mostrar com
Joaldade a inconsistencia da irreligiao ou do ateísmo. Tamhém o ateu
tem sua fé, eré num Absoluto, que é a matéiia em perpetuo :novi-
mento ou dialéüca. Evidentemente, porém. essa f<> do ateu é cle.sarra-
zoada, ao passo que a íé do cristáo nao é desarrazoada; sim. uina
materia o.ue ustivesse em cvolucíio desde toda a eternidade, deveria
ter chocado desde todo o somprc ao equilibrio ou ao repouso... Evo-
lucáo eterna é contradicao nos termos i evolii^So diz miihilUlude, ao
passo que eterno diz imohilidadc). O eterno é necessáriamente imutá-
vel ou iscnto de evolucáo! — E esse genuino conceito de Eterno ó jus
tamente u que o Cristianismo professa qunndo fala de Deus.

Vé-se assim que a ciencia moderna, mesmo como c cultivada


na Rússia, está longe de fornecer suporte ao ateísmo ou ao ma
terialismo. Na realidatle, alóm do mundo o do homem existe
Dphs, e, dentro do homem, alóm da materia existe o espirito,
como acabamos de ver a través das con.siderac.ues sobre robots»
e inleliiróncia humana.

II. DOGMÁTICA

LATINISTA (Porto Alegre) :

2) «Que crédito merecem as visóos de Ana-Catarina


Kinnu'ríck referentes á vida e a. Paixiio de Nosso Senhor Jestus
Cristo? Seriam auténticas revelac.oes?»

Antes do mais, convem lcmbrar que entramos aqui no tema


das revelacücs particulares, revelaeñes que nao se impóem á fé
dos cristáos (nao sao dogmáticas), quaisquer que sejam as cre-
denciais que as abonem.
Para poder responder adequadamente á questáo, vamos pri-
meiramente trabar um esbóco biográfico de Ana-Catarina
Emmerick (assim se deve escrever o nome, e nao «Emmerich»);
feito isto, procuraremos conceituar as visóes a ela atribuidas.

1. Esbóco biográfico

Ana-Catarina nascuu aos 8 de setembro do 1774 em Flamske,


perto do Coesfeld na Vestíália (Alemanha). Era filha de pobres eam-
poneses, que educaram seus nove filhos no amor de Deus e do pró
ximo, incutindo a todos um profundo sentido do dever.

— 495 —
tPERGUNTE E RESPONDEREMOS* 60/1962. qu. 2

Ana-Catarina desde cedo mostrou ter saúdc muito débil; entre-


gava-se com prazer á oracáo solitaria, nutrindo especial devocáo para
com a Paixáo do Redentor, devocáo muito favorecida pela contempla-
gao de famoso crucifixo medieval de Coesfold.
Aos dezesseis anos, sentiu-se chamada á vida religiosa. Mas, em
virtude da oposicáo de seus pais, só realizou seu ideal em 1802, en
trando no convento das Agostinianas de Agnetenberg, perto de Dülmcn
(Bavicra). Passou a viver em estrita íidelidade aos seus votos, apli-
candóse zelosamente á pobreza e á oracáo, sempre movida por gene
roso espirito de expiacao dos pecados.
Em 1811 o convento foi fechado pelo govérno do Jerónimo Bona-
parte; Ana-Catarina ofereceu ontáo seus prestimos ao sacerdote Joño
María Lamben, cotn o cjual íicou colaborando em Diilmen; morava em
casa de urna viúva riessa cidade, onde a partir ríe fins de 1S12 comecou
a experimentar os fenómenos fie estigma! izaeño que liaviam de a tor
nar famosa junto á postoridade. Frecuentemente enferma, veio a pa
dorer acídente de graves consenüénHas, que desde marco de 1S13 a obri-
¡.ion n um retiro finase continuo ató a mo'rie. Recebia com limita pación-
<m;i e caridacle numerosas visitas, que nao podiam deixar d-.' Ihe sor pe
nosas : ao passo que r.lgumas pnssoas iam pedir-lhe favores v preces,
outras, ao contraigo, iam observá-Ia e interroga-la de maneira cavilosa
e hostil. Apesar de seus achaques, n digna Iteli'jiosa passou os últimos
anos em intonea or.ncrn), ofereeendo suas 'lores em reparae/io dos peca
dos do mundo: tumhéin trn!inl!iava assidunmentó pelos pobres, pro
curando aliviar-llies as afücóes materiais e moráis. O desenlace final
oeoiTCU aos 0 dn f<>vciviro rif* !S2-l.
Após a «tía ninr!1.1, i'i-_'i>ti""U-s<" i-r<'«rt-nie v('iii'ia<.'rio 'los fit'ris caló-
lieos para i:.>m Ana-Catitrina Emmeriek; pelo que em !S;)2 se introdu-
7.\\x em Roma o respectivo i)rorc!so de neaíificacáo.
lmporui-n«>« as.'ora dt-ter a nien'.-ífO .sobre o son aspf<-w> >ie

2. Alma agraciada

Urna serie cié fenómenos extraordinarios, como estigmas,


éxtases e visees, narrados a respcito de Ana-Catarina Emmerick,
tem chamado a atencáo dos estudiosos, suscitando arduas con
troversias no século passado e na primchv. metade do século pre
sente : os novos conhecimenlos da Medicina, da Psicología e da
Mística foram evocados, ora para insinuar que em Catarina tais
fenómenos nada tinham de sobrenatural, mas eram meras rea-
cóes psicológicas c naturais, ora, ao contrario, para inculcar a
órigem divina dos estigmas e das visóes dessa alma fervorosa.
Os estudos levados a efeitos no decorrer désses decenios
sugerem hoje com toda a probabilidade a seguinte conclusáo :
faz-se mister distinguir entre a pessoa de Catarina Emmerick e
as revelaeoes que Ihe sao atribuidas. Aquela merece ser estimada
nao sómente como santa Religiosa, mas, a quanto parece, tam-
bém como verdadeira alma mística, a quem Deus concedeu gra-
cas extraordinarias. Quanto as revelacóes respectivas, exigem
reservas.

— 496 —
AS VIS6ES DE ANA-CATARINA EMMERICK

Procuremos elucidar e explicitar esta conclusáo.

A. A pcssoa de Ana-Catarina Emmerick.

No que se refere á pessoa de Catarina, sabe-se que, desde a


juventude, manifestou extraordinaria delicadeza para com as
realidades sobrenaturais; dir-se-ia que possuia um sentido espe
cial para as perceber.

Assim, a grande distancia, sabia que se aproximava o SS. Sacra


mento quando era levado aos enfermos; distinguía de qualquer imi-
tac.áo artificial c fraudulenta as genuinas reliquias dos santos; dado
que algum ato mau tivesse sido cometido em determinado lugar, ela
nao podia ai ficar scm experimentar mal-estar físico; ao contrario,
nos lugares consagrados a Deus, experimentava verdadeiros enlevos.

Também desde os mais tenros anos de idade, era muito dada


a visóes : dizia, sim, ter a intuiclo do Bom Pastor, da SS. Virgem
e do seu anjo da guarda, como se lhe fóssem personagens fami
liares. Aos dezoito anos, refere-se que foi agraciada por urna
aparicáo do Senhor Jesús : Éste trazia na máo esquerda urna
coroa de flores e na direita urna coroa de espinhos, propondo-lhe
que escolhesse. Catarina optou pelos espinhos. Desde entáo mul-
tiplicaram-se os éxtases acompanhados de dolorosas provac.5es.
Tais fenómenos repercutiam profundamente no seu orga
nismo.

Narram os biógrafos que em 1S23 Catarina teve urna visüo em


que as fainas religiosas dos homens lhe aparcciam sob a forma de
um campo cheio de urtigas; a vidente fazia entáo o gesto de quem as
quisesse arrancar pela raíz; cm conscqüéncia, suas máos íicaram total
mente vermelhas. — Éste episodio era urna amostra do que se devia
dar mais amiudadamonlo para o futuro : hnvia de roceher om sua
carne as marcas das rhagas do Senhor. objeto das suas meriitacóes.

Já por ocasiáo da visño que tivera aos dezoito anos, sentirá


violenta dor de cabeca, como se a coroa de espinhos lhe tivesse
sido imposta, sem deixar, porém, chaga visível. Na solenidade de
Natal de 1802 comecara a experimentar agudo sofrimento no
coracáo. Aos 28 de agosto de 1812, quando orava em éxtase, um
sinal em forma de cruz se delineou do lado esquerdo do seu peito;
e essa cruz pós-se a sangrar habitualmente as quartas-feiras.
Aos 25 de dezembro do mesmo ano, outro sinal apareceu por
cima de tal cruz. E quatro dias mais tarde, aos 29, Catarina viu
o Senhor Jesús crucificado: das suas chagas emanavam raios,
que a feriram ñas máos, nos pés e no flanco direito; entáo tam
bém os ferimentos da coroa de espinhos se gravaram visivel-

— 497 —
>PKKGUNTE E RESPONDEREMOS i- 60/1962, qu. 2

mente na sua cabega. Catarina doravante nada mais comeu,


Iimitando-se apenas a beber agua.
Informado do que se dava, o bispo de Münster em 1813
mandou proceder a severo Lnquérito a respeito de lais fenóme
nos, confiando a diregáo do mesmo ao seu Vigário Geral, Mons.
Clemente Augusto de Droste-Vischering (mais tarde, arcebispo
de Colonia); intervieram varios médicos, que isolaram as chagas
de Catarina e procuraram tratá-las; fizeram que a estigmatizada
mudasse de residencia, ficasse sob controle permanente durante
dez dias (10-19 de junho de 1813), etc. Terminadas as pesquisas,
concluía Mons. Droste-Vischering :

♦•Coube-mo indagar uní só ootea : Ana-Catarina estará mistifi


cando ou estará sendo mistificada? O iiuiuerito leve por resultado con-
vencor-me de fino... n;'io se pode encontrar ai impostura alguma. Por
conseguí nte. nada mais me resta a indagar. Ou os estigmas de Ana-
•Catarina sao fenómeno natural raro, a respeito do qual nao me toca
proferir um juizo, ou tém causa sobrenatural, que difícilmente pede
ríamos tornar evidente* 'cf. Pourrat, La Spiritualitó chrétienne IV.
Paris 1930, pág. 521).

A sobriedade de termos do presidente do inquérito explica-sc pelas


circunstancias da época. Os filósofos de entüo tendiam a ridicularizar
o domina o o culto catolices; dai decorria a oportunidado de niio Ihes
liar nova materia ¡vira sarcasmos mediante urna decíaracáo mais ex
plícita a propósito da orijrem divina dos estigmas de Ana-Catarina
Kninierifk.

Mais lardo, o próprio govérno alemáo instaurou scu inquó-


rito. ric 5 a 2í) de agosto de 1819, averiguando por sua vez que
nao havia piova de fraudulencia ou mistificacáo para qualquer
dos fenómenos apresentados por Catarina.
As sentengas assim proferida? no sóculo passado foram con
firmadas por estudiosos dos últimos tempos. Entre estes figura
o famoso Pe. Aloisio Mager, professor da Universidade de Salz-
burgo (Austria), o qual assim se exprimiu :

«Os estigmas de Catarina constituem urna íontü rara para o es-


tudo psicológico-religioso e médico da estigmatizasAo o dos fenómenos
análogos... Ai o natural e o sobrenatural se er.trelae.am...
O aspecto natural da estigmatizacáo da Religiosa agostiniana nao
excluí urna intervencáo sobrenatural; ao contrario, exigo-a como expli-
cacao derradeira* (Literarischer Handweisor, col. Kritische Monats-
chriít 63. Freiburg i./Br. 1926/7, col. 8271.

Nada desabona tal conclusáo : Catarina parece realmente


ter sido urna alma efusivamente agraciada por Deus.

Passemos agora á critica dos escritos respectivos.

— 498 —
AS VISOES DE ANA-CATARINA EMMERICK

B. Os escritos referentes ás visdes de Catarina Emmerick.

Nove anos após a morte de Catarina, ou seja, em 1833, apa-


receu na Alemanha um livro intitulado «Das bittere Leiden
unsers Herrn Jesu Christi. Nach den Betrachtungen der gottse-
ligen A.K.E., Augustinerin des Klosters Agnetenberg zu Dül
men», isto é, «A dolorosa Paixáo de Nosso eSnhor Jesús Cristo.
Conforme as meditagóes de Ana-Catarina Emmerick, Religicia
agostíniana do convento de Agnetenberg em Dülmen».

O autor da obra era Clemente Brentano, poeta alemño da Escola


romántica. Nascera cm Coblenga no ano de 1768; convertera-se á. prá-
tica do Catolicismo cm 1816; em setembro de 1S18 fóra visitar Ana-
Catarina em Dülmen e resolverá ai fixar residencia; a partir dessa
época, dizia, a Religiosa, solicitada por seu Diretor Espiritual, o Pe.
Overberg, Ihe contara tudo que so dava com ela, principalmente as
vis6es com que era agraciada, dia por dia. Brentano. a principio, tinha
a intencáo de escrever urna biografía da vidente; depois, porém. pon
derando a grande imponáncia das visóos, decidiu tomar como tarefa
providencial do sua vida a divulgado dos relatos de Catarina. Execu-'
tando ésse propósito, dava a lume cm 1R33 o citado Iiv¡-o.

Brentano falecou em 1840. Doze anos mais tarde, ou seja.


em 1852, apareceu outra obra sobre o assunto: iniciada pelo
poeta, fóra continuada por seu irmáo Cristiano Brontano o sua
cunhada. TVatava da Virgem SS. sob o título «Lcbcn der heili-
Ken Jungfrau Maria. Nach den Betrachtungen der gottseligen
A. K. E.», isto é, «Vida da Santa Virgem Maria. Conforme as
meditacóes da bem-aven turada A. CE.».
Ainda mais tarde, entre 1858 e 1860, um Redentorista, o Pe.
Karl Erhard Schmoeger, usando manuscritos de Clemente Bren
tano, publicou urna vida de Jesús intitulada < Das Leben unsers
Herrn und Heilandes Jesu Christi. Nach don Gcsichtcn der
gottseligen A.K.E.... aufgeschrieben von Cl. Brentano», isto
é, «A vida de Nosso Senhor e Salvador Jesús Cristo. Conforme
as visóes da bem-aventurada A.CE.... anotadas por Cl. Bren
tano». — Note-se a diferenca no subtitulo : em vez da fórmula
«Conforme as meditacóes» das obras anteriores, lé-se «Conforme
as visóes».
Tal mudanca parece contrariar as intencóes do próprio Cle
mente Brentano, que, referindo-se aos seus manuscritos, decla
rara o seguinte :

«Estas consideracoes devem ser tidas, na melhor da& hipóteses,


como meditacóes de quaresma da piedosa Religiosa, narradas sem
arte e simplesmente reproduzidas de acordó com os relatos da mesma
Religiosa. Sao meditacóes ás quais ela jamáis quis atribuir outro

— 499 —
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 60/1962, qu. 2

valor que nao valor puramente humano e que ela so comunicou por
obediencia» ílntroducüo & «Vida de Nosso Senhor», 2a. p.K

Esta observacáo bem denota a sobriedade com que Catarina


e o próprio Clemente Brentano consideravam os relatos concer-
nentes á vida e á Paixáo do Senhor : nao os queriam apresentar
como o resultado de «visóes» extraordinarias ou de gracas caris-
máticas concedidas á Religiosa.
Por fim, em 1881, o Pe. Schmoeger editou novamente «A
Dolorosa Paixáo», «A Vida da Sta. Virgem Mana» e «A Vida de
Jesús Cristo», retocadas e aínda acrescidas do relato de novas
visóes (sobre o Antigo Testamento), atribuidas a Ana-Catarina.
A obra inteira constava de tres volumes intitulados «Das arme
Lebcn und bittere Leiden unsers Herrn Jesu Christi und seiner
heiligsten Mutter María, nebst der Geheimnissen des Alten Blin
des, nach den Gcsichten der gottseligen A.K.E., aus den Tage-
büchern des Cl. Brentano herausgegeben», isto é, «A vida pobre
e a dolorosa Paixáo de Nosso Senhor Jesús Cristo e de sua San-
tissima Máe Mana, junto aos misterios da Antiga Alianca, con
forme as visóes da bem-aventurada A.CE., publicadas a partir
dos livros de apontamentos diarios de Clemente Brentano».
Ésses livros encontraram aceitagáo extraordinaria; sem do-
mora foram traduzidos para diversos idiomas. Contudo. a bem
da verdade, tres obseivaeóes decisivas lhes devem ser feitas :

1) Nenhuma dessas obras se deriva dirctamentc da pena


de Ana-Catarina Eminerick; nem sequer foi o seu texto revisto
ou examinado pela Religiosa. A primeira só apareceu nove anos
após a morte da vidente, ao passo que a última se sitúa a 57 anos
de distancia desta. Ora táo graves lacunas exigem reservas da
parte do leitor prudente; com razáo éste poderá perguntar se tais
escritos referem com fidelidade o pensamento de Catarina.

2) Varias pessoas que conviviam amigávelmente com Cle


mente Brentano, declararam que ele havia atribuido a Catarina
muitas proposicóes que nao provinham da vidente, mas, sim, da
imaginagáo poética do próprio Clemente. Em outros termos :
Brentano nao foi uní simples transmissor, mas um intérprete,
que aumentou e adaptou o que ele ouviu de Catarina.

Tcnha-se em vista o depoimonto de Luisa líense!, íilha de pastor


protestante, a qual, urna vez convertida ao Catolicismo, despertou o íé
de Cl. Brentano, tornándose sua sabia conselheira. Escrevia ela em
1S59:
«Devo aqui recordar o seguinte: Clemente Brentano me repetiu
varias vézes que, em sua 'Paixáo', publicou varios dados que nao
provinham déle. Transcrevera muitos traeos das obras do Pe. Cochem;

— 500 —
AS VISÓES DE ANA-CATARINA EMMERICK

assim as visóos, em seu conjunto, muito se assemelhavam a essas


obras, pois élo quisera publicar uma narrativa continua, e nao frag
mentaria. Rcspondi-lhe que julgava lora de propósito fazer que Cata
rina falasse ininterruptamente [na historia da Paixáo]; considerava-o
mesmo como falta de veracidade. A éste propósito Clemente nada
pode responder-».

Em carta de 11/111/1855 dirigida ao Proí. Schlüter, observara ela :

«A respeito da 'Vida de Maria', pergunta-se se as coisas se doram


realmente assim e se a cara C. Emmerick as viu désse modo; lalvez
eu acredite ainda menos do que vés».

«Por detrás dos vultos e das visóes [da 'Dolorosa Paixáo'], apa
rece o próprio Clemente em carne e osso».

Entre as principáis fontes utilizadas por Clemente Brentano,


foi possivel reconhecer, como ficou ácima insinuado, os escritos
do Pe. Martinho de Cochem (v 1712), capuchinho. autor de uma
«Vida de Cristo», ao qual se devem cérea de trinta passagens da
«Dolorosa Paixáo»; além disto, foram identificados trechos de
Brentano que fazem eco aos Evangelhos apócrifos (secjuiosos de
traces pitorescos, com detrimento para a verdade) ou a comen
tarios bíblicos de Dom Calmet (v 1757) ou ainda a obras judaico-
-maomctanas e. em particular, ao Corito de Maomé.
A sadia crítica moderna chega mesmo a asseverar que já
nao ó possivel distinguir o genuino pensamento de Ana Catarina,
o de Clemente Brentano e o de outros documentos que éste reda-
tor envolveu nos seus relatos. Em 1912/13, Schüddekopf editava
as obras completas de Clemente Brentano, apresentando os dois
primeiros livros das «visóes» como obras pessoaLs déste poeta.
Mais ainda. Por ocasiáo do processo de heatificacjáo de Cata
rina foi instaurada uma pesquisa sobro a gonuinidndo das visóes
atribuidas á Religiosa. Um agostiniano, o Pe. Winfried Huempf-
nor, depois de ter estudado as" fontes da obra de Brentano, asse-
verou que se podiam admitir ai apontamentos rápidos e nao sis
temáticos, por Brentano colhidos dos labios de Catarina: ao lado
disso, porém, reafirmava que o poeta alemáo utilizara larga
mente a sua imaginacáo assim como numerosos livros já ante
riormente publicados. Em conseqüéncia, no ano de 1927, a
S. Congregagáo dos Ritos desistiu de considerar os escritos de
Brentano como se fóssem expressáo do pensamento de Catarina;
esta deixou de ser responsabilizada pelo conteúdo das famosas
«visóes».

Um íator aparentemente secundario, mas, na verdade, pondera-


vel, que, aos olhos de alguns críticos, pouco recomenda a obra de
Brentano, é a pretensa <missao especial» que ele atribuí a Catarina

— 501 —
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS> 60/1962, qu. 2

Emmerick e a si mesmo. O poeta alemao julgava, sim, que Catarina


recebera de Deus o encargo de transmitir revelacoes ao mundo e que
ele, Brentano, com o epíteto de «Peregrino:», devia fazer as vézes de
Secretario da vidente. Catarina terla tido a revelacáo dessas duas
missOes, conforme os dizeres de Brentano. Ora os contemporáneos de
Catarina atestaram que a Religiosa jamáis pensou em tal missáo.

A titulo de ilustracáo, vai aqui consignado um tópico importante


do prefacio da <Vida de Jesus>, em que Brentano atribuí a Catarina
os seguintcs dizeres :

«Acabo do Icr urna visito : foi-me revolado que cu já devia ter


morrido há muito tempo se a minha mensagem nao tivesse que ser
publicada polo Peregrino. É preciso que ele escreva tudo. pois a minha
missáo consisto precisamente em profetizar, isto é, proclamar as mi-
nhas visSes. Somonte quando o Peregrino tiver posto tudo em ordem
e tiver terminado tudo 6 que ¿le morrorá».
Ora Brentano, o «Peregrino», morreu, sim, antes de terminar a
publicacáo de tudo que ¿-le atribuía a Catarina Emmerick.

3) As «Meditacóes» ou «Vis6es> de Catarina Emmerick


contém traeos contraditórios, pucrís ou erróneos, entrando por
vézes em confuto com o que nos referem documentos fidedignos
da vida de Cristo, entre os quais os próprios Evangelhos canó
nicos.

TVnham-se em vista os seguimos tópicos, que. por sua minuciosi-


dade, trazem o caráter do imaginario :
«Jesús fala muitas %-ézo» de Jaco o de Jasé, assim como do modo
como José foi vendido aos Egipcios. Disse Jesús que um dia outro
varáo havia de ser vendido por'uní de sous irmáos, ao mesmo preco
que José, o que ésse outro varúo também havia do acolher os scus
irmáos arrependidos e os saciaría durante o periodo de fome com o
pao da vida eterna. Entáo fiquei sabendo que José foi vendido por
trinta dinhelros».
Conforme as «vis6es> consignadas por Rrentano, os anjos apare-
cem a: Jesús sobre o Tabor no momento da Transfigura?üo, a Vir-
gem SS. abengoa os Apostólos antes que partam para as diversas re-
gióes do globo... (tragos encontrados na ¿Vida de Cristo> de Co-
chem); Jesús conta grande número de parábolas que pouco ou nada
de verossimil trazem em si (o' que se deve á mente do poeta, amigo
dos símbolos e das metáforas).

O fato de se reconhecer a inautenticidade das revelacóes


atribuidas a Catarina Emmerick nao afeta de modo algum a
estima que essa heroica alma merece. Ela nao tem culpa dos
abusos que hajam sido praticados em torno do seu nome. Ao con
trario, a figura de Catarina se esboca mais digna de admiragáo
aos olhos do historiador e dos devotos quando desembarazada
dos pormenores artificiáis que lhe sao erróneamente atribuidos.

— 502 —
O DEUS QUE FULMINA NA BIBLIA

III. SAGRADA ESCRITURA

INTERESSADO (Jaboticabal) :

3) «Há duas passagens da historia sagrada cm que Deas


pune os honiens com a mortc, sem que para isto pareja haver
culpa proporcional : 1 Sam 6,19 (o episodio dos habitantes de
Betsamés) e 2 Sam 6,6$ (o episodio de Oza). Como se há de
entender que o Senhor tenha sido táo cruel?»

Analisaremos separadamente cada qual dos trechos refe


ridos.

1. Os habitantes de Betsamés (1 Sam 6,19)

O trecho faz-nos retroceder aos tempos de Samuel (cérea


de 1050 a.C). Refere-se á volta da arca do Senhor para o seu
santuario em Israel, depois que, raptada pelos filisteus, estivera
em térra paga. Numa das etapas do itinerario, a arca pousou em
Betsamés, aldeia israelita; foi entáo que, conforme o texto he
braico atual e a tradugáo latina da Vulgata, se deu o seguinte
episodio:

«O Sonhor prostrou os habitantes de Botsamés. por torom olhado


para a arca; prostrou setenta liomens den tu- o povo e rln<|üentn mil
da multidüo» M Sam 6,19).

O texto oferece ao leitor dificuldades de interpretagáo tanto


de índole literaria como de caráter teológico. Os exegetas Ihe
tém dado explicacóes diversas, que passamos a considerar :

a) Olhares indiscretos

Cortos comentadores julgam que os habitantes ele Betsamés lan-


caram para a arca do Senhor olhares indiscretos, curiosos ou irreve
rentes. Ora a falta de respeito para com o Divino íoi sem pro conside
rada grave culpa no Antigo Testamento, como se depreende de varias
prescricoes da Lei de Moisés.
Assim, por exemplo, rezava urna cláusula referente aos caatitas
ou ministros subalternos do culto :
«A íim de que ios caatitas) vivam e nao morram quando se apro-
ximarem dos objetos sagrados, Aaráo e seus filhos assinalaráo a cada
qual o seu oficio... para que nao entrem, por um só instante que seja,
para ver os objetos sagrados e, em conseqüéncia, morranu (Núm
4,19s>.
Os levitas mesrnos, horneas exclusivamente dedicados ao santua
rio, nao se podiam, sem perigo de morte, aproximar da arca do Senhor
antes que os sacerdotes a tivessem recoberto (cf. Núm 4,5.15).

— 503 —
tPERGUNTE E RESPONDEREMOS» fiO/1962. qu. 3

De modo geral, a nenhum profano era licito, sem arriscar a vida,


entrar em contato com o Santo, aínda que fósse por mero olhar (cf. Éx
19,21); por isto, quando a gloria do Senhor se tornou manifesta sobro o
monte Sinai, Moisés cerrou o acesso a montanha da aparicüo (cí. Éx
19,23).
Sábese, alias, que os antigos, mesmo pagaos, julgavam que o sa
grado é intangivel, invisivel, inacessivel ao homem nao iniciado; todos
os objetos religiosos, principalmente os que serviam ao culto divino,
eram tidos como portadores da presenea de Deus, misteriosa e temivel.
Entre os judeus, a irreverencia para com as leis do culto era punida
com especial rigor, dado o perigo que ameacava o povo, de adotar usos
e crencas do paganismo.
Que dizer do tais consideracóes?
Nao há dúvida, o conhecimento désses particulares contribuí para
esclarecer a passagem analisada. Contudo perjíunta-se : podia realmente
haver culpa grnve nos habitantes de Botsamés por terem considerado
a arca, que se oíerccia aos olhares ele todos? O íato de haverem pre
viamente oforecido sacrificios ao Senhor (como se lé pouco antes, ora
1 Sam 6,15i nüo atesta o scu respeito religioso?

b) Otitras faltas

Considerando tais dificuldades, há quem julgue que os homens de


Bctsamés foram punidos por anteriores pecados do povo aínda nao
expiados.
Flávio José, historiador judaico <io fim do séc. I d.C., supúc que,
simultáneamenU' oom o olhar, ¡ilguns israelitas hajum indovidameiitc
tocado a arca 'ef. Ant. <>,1.-1'.
Nenhuma dossas explico enes satisfaz plenamente.

c) Elucídaeiio : problema mal formulado

Procurando entender melhor a passagem, bons exegetas mo


dernos observam, em primeiro lugar, que o texto hebraico dos
livros de Samuel chegou até nos em estado de conservagáo defi
ciente; em particular, a frase de 1 Sam 6,19 parece ter sido mal
tratada pelos copistas, pois refere duas enumerac.óes (setenta
homens e cinqüenta mil homens). das quais a segunda é eviden
temente errónea; a quantia de cinqüenta mil ultrapassaria o nú
mero de habitantes de toda a regiao de Betsamés; além disto,
nao é mencionada por certos manuscritos hebraicos nem por
Flávio José; terá sido interpolada, como julgam abalizados co
mentadores. Considerando isto, os críticos bíblicos dáo preferen
cia á forma do texto de 1 Sam 6,19 apresentada pela traducáo
grega dita «dos LXX Intérpretes» :
«Os futios de Jeconias, dentre todos os moradores de Bctsa
més, foram os únicos que nao se alegraram ao ver a arca do
Senhor. O Senhor entao prostrou setenta homens dentre éles».
Na base déste texto, o problema já se restringe muito.
E como o elucidam entáo os comentadores?

— 504 —
O DEUS QUE FULMINA NA BIBLIA

Em Betsamés, dizem, devia haver urna familia diva «dos


filhos de Jeconias» (que, de resto, nao nos sao conhecidos), os
quais teráo tomado urna atitude de indiferenga, contrastando
com o entusiasmo sagrado do povo. O escándalo entáo se produ-
ziu na multidáo e terá provocado a punicáo de setenta membros
de tal familia!

Mas, mesmo assim, nao terá sido duro demais tal castigo?

Levem-se em conta dois elementos importantes na espiritua-


lidade do Antigo Testamento :

a') O povo de Israel era «gente de dura cerviz», como diz


freqüentemente o texto sagrado, significando a rudez de menta-
lidade e de costumes dos antigos judeus; geralmente só se ren-
diam a demonstracóes fortes. Nao obstante, eram portadores
da verdadeira fé para o mundo, ou seja, portadores- de tesouro
preciosíssimo e muito delicado... Em conseqüéncia, para preser
var a verdadeira fé e excitar a consciéncia do povo de dura cer
viz, podiam-se tornar necessárias severas intervengóes de Deus
(intervencóes que, se nao fóssem realmente retumbantes ou
impressionantes, nenhum efeito obteriam na mentalidade daque-
los homens). Ora julga-se que foi justamente urna dessas mani-
festacóes que se deu em Betsamés em vista dos interésses reli
giosos de Israel (o episodio ocorreu, sem dúvida, numa fase
muito remota da historia, quando o povo aínda era realmente
muito rude). E — note-se bem — o texto sagrado nos diz que a
advertencia produziu seus efeitos, pois refere (6,20) que os habi
tantes de Betsamés reconheceram no ocorrido um sinal, nao da
crueldade, mas da santidade de Deus!... Em geral, os israelitas
temiam, mas nao criticavam, os castigos infligidos pelo Senhor.

b') Também nao se poderia deixar de lembrar que táo


rude castigo corpóreo nao significa condenacáo dos respectivos
pecadores ao inferno. Deus terá permitido a violenta prostracáo
para impressionar e exortar o povo rude, dando, porém, a cada
qual dos réus a graga para se arrepender e salvar a sua alma.
Nao nos é possível nem lícito definir a sorte eterna de pessoa
alguma; só Deus vé o intimo das consciéncias. Apenas podemos
ter certeza de que o Senhor, que é a Justiga mesma, nao comete
as injusticas que nos obviamente sabemos repudiar e nao ousa-
mos cometer (pode-se até dizer que é mais lógico nao crer em
Deus do que crer num Deus que seja menos justo do que os
homens).
Trecho que, por análogos motivos, chama a atengáo é o de
2 Sam 6,6s (paralelo a 1 Crón 13,7-10).

— 505 —
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS> 60/1962. qu. 3

2. O episodio de Oza (2 Sam 6,6s)

Qual o conteúdo de tal passagem?


O autor sagrado continua a descrever o itinerario da arca
do Senhor em Israel, itinerario interrompido pela permanencia
da mesma em Cariatiarim ou Baalá, pouco após o episodio de
Betsamés atrás referido (cf. 1 Sam 7,1). Tendo estado setenta
anos em Cariatiarim, o santuario foi transferido para Jerusalém,
onde Davi erguera a capital do seu reino. Aconteceu, porém, que
durante o trajeto certo varáo chamado Oza percebeu que a arca,
posta sobre um carro de bois, corría o risco de cair por térra;
tocou-a entáo com as máos a fim de ampará-la; logo, porém, o
Senhor o fulminou com a morte.
Tal punieáo bcm pode desnortear a boa mente do leitor...
Como interpretá-la?

a) Excluindo...

Antes do mais, rejeitar-se-á, como íora de propósito, a sentenca que


o exegeta moderno Prockseh propSe: cA arca aparece como que car-
regada de elctricldade sagrada, da qual urna centelha ferc o homcm
profano como um raios (artigo publicado cm «Kittel, Thcologisches
Wocrterbuch zum Ncuon Tcstamcnt I. Stuttgart, pag. 92). Outros auto
res (Fritz, Kahn, Denis Papin), cociendo a imaginacüo, explieam que os
sacerdotes de Israel, conhcccdores dos segredos da detricidade, haviam
feito da arca «um auténtico condensador elétrico, que se carregaya
mediante eletricidade atmosférica»; e isto, a íim de explorar a rcligio-
sidade do povo (curiosa exposicáo da tese encontra-se em «Anhembú
XVIII. 1955, pág. 171-173). Esta sentenca, dado o seu caráter gratuito,
é irrisoria, carece de fundamento tanto no texto sagrado como na pro-
pria historia da civilizacüo humana I que assinaia a utilizacáo das fórgas
elétricas a época relativamente recente). Entre outras coisas, note-se
que a causa da morte de Oza nSo parece proceder da arca mesma; ao
se ler a narrativa, dir-se-ia que houve urna intervencáo de Deus entre o
toque e a fulminacSo.

Mas porque terá o Senhor procedido de maneira tflo prepotente?

b) O sentido do episodio.

A acáo de Oza, considerada em si, representava urna falta


contra as prescricóés de culto israelita. Com efeito, nao era per
mitido aos hebreus violar os objetos sagrados com olhares indis
cretos (como já atrás dissemos); muito menos lhes era licito
tocá-los. Táo rigorosa era mesmo esta última proibigáo que os
próprios levitas, embora fóssem encarregados de transportar os
objetos do culto (turíbulos, pingas, bacías, etc ), deviarn
fazé-lo sem os atingir com as máos (cf. Núm 4,15); só podiam
carregar a arca do Senhor servindo-se de barras, e barras que

— 506 —
O DEUS QUE FULMINA NA B1BUA

jamáis deveriam ser separadas do móvel, a fim de nao se dar


ocasiáo a que alguém o ousasse tocar diretamente (cf. Éx 25,15).
A pena de morte infligida a Oza por haver transgredido a
proibigáo poderá parecer excessivamente severa. O episodio,
porém, há de ser estimado á luz da concepcáo particularmente
rigorista com que em Israel era tachada a violáceo das coisas
santas (tenha-se em vista o que há pouco diziamos sobre ó ás-
sunto); ademáis é preciso nao esquecer que no Antigo Testa
mento nos defrontamos com um povo que muitas vézes só se
rendía as impressdes fortes.
Contudo parece que aínda fica

c) Urna dúvida.

Terá tido Oza ao menos a consciéncia de que praticava algo


de condenável? Nao parece que, ao contrario, era boa a sua
intengáo, já que desejava preservar de incidente a arca do
Senhor?
O texto biblico nao é muito claro neste particular. O original
hebraico diz que Oza foi punido por sua «falta» (= al-hassal,
também «erro, negligencia»). Como quer que seja, os antígos
israelitas nao distinguiam muito exatamente entre pecado for
mal, voluntario, consciente, e pecado material, inconsciente, in
voluntario; consideravam nao raro apenas a acáo externa, sem
levar em conta a intencáo de quem agía.

Alias, nem a teología, muito apurada, dos rabinos contemporáneos


de Cristo íazia distincáo entre pecado formal e pecado meramente ma
terial, inconsciente. Assim é que no Antigo Testamento a longa secao
de Lev 4,1-5,6 trata de faltas cometidas por ignorancia t prescreve, n3o
obstante, sacrificios expiatorios para tais acoes. Conforme 1 Sam
14,2445, Jdnatas se viu ameacado de sofrer a morte por ter violado um
voto que Saúl, seu pai, fizera em nome de todo o exército, voto, porém,
de que Jónatas nao tinha conhecimento; salvou-o o bom senso do povo,
que lntercedeu pelo réu inconsciente. A vlüva de Sarepta, tendo perdido
o íilho, julgava que isto lhe podia ter acontecido em punicáo de faltas
que cía mesma ignorava (cf. 3 Rs 17,18).

«Levando em conta as idéias professadas no Antigo Testamento, e


em toda a literatura judaica, podemos definir o pecado como sendo a
transgressao da vontade divina... expressa pela lei; é a violacao de
um mandamento, quer seja conhecido, quer nao, quer seja a transgres
sao consciente e deliberada, quer nao; há falta porque há desordem; é
esta urna conseqüéncla direta do caráter jurídico da moral judaica.
A prova de que essa desordem era injuria íeita a Deus é que deveria
ser reparada por um sacrificio» (J. Bonsirven, Le Judaisme palestinien
au temps de Jésus-Christ II. Paris 1935, pág. 82).

Importante : o autor julga qué a concepcáo rabínica é a expressao


fiel do que se acha nos livros do Antigo Testamento, assim como da

— 507 —
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS> 60/1962, qu. 3

. mentalidade judaica, que dava valor preponderante as acfies exteriores,


negligenciando a intencáo do agente.

Eis o testemunho de outro abalizado autor :

«Para as geracóes antigás, a ofensa contra Javé toma a forma de


um ato proibido em sua materialidade mesma. Ainda nao se percebe
claramente que, para haver falta, é preciso haver responsabilidade pes-
soal do pecador. Também nao se percebe devidamente que as exigen
cias de Javé sao conformes & sua Sabedoria tanto quanto ao seu poder»
(A. George, Fautes contre Yaweh dans les livres de Samuel, em «Revue
biblique» 33 [1946] 182).
Verifica-se, porém, em um ou outro caso, a distincáo entre pecado
cometido por industria maliciosa e pecado cometido como que involun
tariamente. É o que ocorre ao se tratar de homicidio, em Ex 21, 12-14.

Considerados estes particulares, nao causa estranheza que


Oza, pelo simples fato de ter cometido um ato em si mau, em-
bora animado por boa intencáo, se possa ter tornado merecedor
de castigo. Éste castigo — frisemo-lo bem — tinha significado
primariamente no foro externo, servindo de admoestacáo para os
israelitas contemporáneos de Oza; nao é necessário dizer que, em
conseqüéncia, Oza foi condenado ao inferno ou á reprovagáo
eterna, pois no foro intimo da consciéncia Deus terá levado em
conta a boa intencáo que animava Oza (tenha-se por certo que,
se nos, homens, possuimos o senso da justica, muito mais Deus
o possui).

Contudo nao faltam exegetas que, em última análise, julgam ne


cessário renunciar ao cntondimento pleno do episodio de 2 Sam 6,6s,
já que o texto sagrado nao fornece indicaedes suficientes para tal.

3. Conclusao

Os episodios ácima analisados nao foram consignados ñas


Escrituras para fazer tropezar o leitor cristáo; tal finaiidade
seria indigna de Deus. Trazem, antes, um ensinamento religioso :
veja-se néles mais um aspecto dos preparativos pelos quais o
Senhor quis fazer passar o género humano a fim de que nos,
cristáos, pudéssemos finalmente compreender a «justica melhor»
do Evangelho (cf. Mt 5,20).
Ao lado dos trechos que manifestam rude mentalidade reli
giosa em Israel, encontram-se outros que os completam, pois
dáo a ver que o Senhor Deus, ao mesmo tempo que se revelava
como «Deus de Justica*, mostrava também ser o Deus de Bon-
dadeeAmor.

— 508 —
O DEUS QUE FULMINA NA BIBLIA

Com efcito, o primelro preceito da Leí de Moisés era o do amor,


amor a Deus:

«Amarás o Senhor teu Deus, de todo o teu coracáo, de toda a tua


alma e com todas as tuas torcas» (Dt 6,5).

O segundo lhe era semelhante :


«Amarás o teu próximo como a ti mesmo» (Lev 19,18; cí. 19,8-10).
A estes dois mandamentos se podiam reduzir toda a Lei, todas as
admoestaedes dos Profetas e, em geral, a Escritura do Antigo Testa
mento, como reconhecia o Doutor da Lei perante Jesús (cf. Mt 22,34-40;
Me 12,28-31; Le 10,27).

Da sua parte, o Senhor, por meio de Moisés, lembrava que se reve


lara aos Patriarcas e exercera a sua Providencia para com Israel, nao
em virtude de algum direito ou merecimento do povo, mas por mero
amor :

<»O Senhor vosso Deus vos escolheu... dentre todos os povos que
estáo sobre a íace da térra. O Senhor aderiu a vos e vos escolheu, nao
porque ultrapasseis em número qualquer dos outros povos; sois o mí
nimo de todos os povos. Mas porque o Senhor vos ama e quis cumprlr
o juramento que íéz a vossos pais» (Dt 7,6s).

«Sabe! que nao é por causa da vossa justica que o Senhor vosso
Deus vos dá ésse belo pais (Canaá) como propriedade; sois um povo
de dura cerviz» (Dt 9,6; cf. 4,37).

Voltando-nos agora para os livros de Samuel em particular,


donde procedem os episodios aqui analisados, observamos os se-
guintes tragos complementares :

O Senhor que pune, é também Aquéle em cuja benevolencia o povo


deposita profunda confianca, pois é o grande Aliado e Tutor de Israel,
principalmente na guerra : 1 Sam 4,5; 2 Sam 5,10; 8,6-14.
Talvez nenhum livro histórico da Sagrada Escritura ponha tanto
era realce a piedade pessoal, as intimas relagCes dos fiéis com o Senhor,
como os livros de Samuel. É o que se verifica na historia de Ana, que,
devota e confiante, pede um íilho (1 Sam 1,11.20.26), ná celebracao
íreqüente dos sacrificios populares (1 Sam 2,13.18s), no entusiasmo das
«escolas de proíetas> (1 Sam 10,5; 19,20), no zélo religioso sincero, em-
bora pouco esclarecido, de Saúl (cf. o voto de Saúl em 1 Sam 14,24-35;
seu desejo de oferecer sacrificios em 1 Sam 13,9-12; 15, 9.15; outras
aíirmacSes em 11,13; 17,37; 28,6); principalmente no amor de Davi, que
promove o culto sagrado (1 Sam 26,19s; 2 Sam 6,5. 14-16. 22; 12, 13-23;
15, 25.31). Davi sabe que a sua vida é cara a Deus (1 Sam 26,24; 2 Sam
7, lSs.21); o seu arrependimento, após o pecado, testemunha amor,
nao temor apenas (2 Sam 12,13; 24,10).
Por fim, embora multo valor se desse ao aspecto exterior da .santi-
dade ou da virtude, o autor sagrado inculcava que Deus vé além das
aparéncias: «O homem considera a face; Deus, porém, vé o coraefio»
(1 Sam 16,7).

— 509 —
cPERGUNTE E RESPONDEREMOS» 60/1962, qu. 4

IV. MORAL

C. B. (Rio de Janeiro) :

4) «Que dizer das operacóes cirúrgicas destinadas a corri-


gir ou mudar o sexo do paciente?
(O famoso Cocinelli era figura multo conhecida nos 'cabarets' de
París. Após urna operacSo clrúrgica, passoa a viver como urna insi
nuante mulher, chegando a contralr nupcias com o seu emnresário. Em
viagem para Buenos Aires, Cocinelli se deteve no Rio de Janeiro, onde
declarou que se sentía feliz com a mudanga de sexo, mas deplorava
nunca poder ter fiihos)».

Os casos de operacáo destinada a «corrigir» ou modificar a vida


sexual de alguém sao assaz complexos, pois o comportamento sexual
da personalidade humana é dependente nao apenas de íatóres fisioló
gicos, mas também de elementos psicológicos. Por isto, a fim de se pro
ferir um juízo adequado sobre a liceidade de tais Intervencóes cirúrgi
cas, requer-se a considerado de caso por caso, com as circunstancias
e os tragos que o caracterizam; sómente depois disto se poderá falar
de liceidade ou iliceidade da intervengáo cirürgica.
Em conseqüéncia, limitar-nosemos aqui a enunciar os principios de
Moral que devem reger toda e qualquer operagao désse tipo. Ao sacer
dote, ao médico e as pessoas intcressadas toca fazer a aplicagáo de tais
normas ás situacóes concretas que ocorrem na vida prática.

Eis, pois, o que em qualquer caso se deverá tomar em considerado:

1) Qualquer intervencáo cirúrgica na vida sexual de al


guém há de ser consentánea com as demonstracóes de scxuali-
dade (masculina ou feminina) espontáneas ou inatas nuc o pa
ciente aprésente; deverá, portento, favorecer o desenvoívimento
da natureza na sua própria linha ou segundo a orientacáo (varo
nil ou feminina) que o Criador tenha assinalado a tai pessoa.
Donde se vé que é ilícita qualquer tentativa de mudar o sexo
de um individi iq ou de fazer passar de um sexo esbogado na ana-
tomia do sujeito para o sexo oposto. Urna tal obra equivaleria a
contrariar a natureza — coisa que já nao é do alcance moral do
homem. Vé-se também que, em casos de dúvida sobre as verda-
deiras tendencias sexuais de um paciente (casos de ambigüidade
sexual), o cirurgiáo se.deve abster de intervir. Só operará desde
que tenha certeza de estar desenvolvendo a acáo mesma da na
tureza.

Éste principio de Moral restringe muito o ámbito da liceidade das


operacóes cm foco. Nova restrifüo é imposta pelo principio n* 2 :

2) A intervencáo cirúrgica só c licita caso se possa pre


ver (ao menos com forte probabilidade) que tornará o paciente
capaz de gerar prole, ou seja, capaz de contrair matrimonio.

— 510 —
CORRIGIR OU MUDAR O SEXO?

Esta regra se deriva imediatamente do fato de que o uso das


funcóes sexuais s6 é licito dentro do contrato matrimonial, con
trato matrimonial cuja fínaiidade primaría é a geracáo da prole
(em casos de impotencia absoluta e incurável, o casamento é
nulo, pois nao há materia de contrato matrimonial; cf. «P.R.»
11/1958, qu. 6). Por conseguinte, urna intervengáo cirúrgica que
deixe a pessoa impotente ou incapaz de gerar, e apenas vise
libertar o paciente de um complexo de inferioridade, proporcio-
nando-lhe comportamento sexual aparentemente normal, nao se
justifica perante a consciéncia. Tal intervencáo só serve para fa
vorecer o hedonismo, o gozo ilícito, qui?á mesmo o adulterio e a
fornicacáo; a pessoa assim «beneficiada» poderá dissimular a sua
impotencia e tentar contrair matrimonio, que na verdade será
abusivo e nulo, mas terá a aparéncia de casamento válido.

Para ilustrar estas normas, o Dr. Alborto Niedermeyer, Catedrático


da Universidade de Viena na Austria, reíere um exemplo de interven
cáo cirúrgica ¡licita :

Um jovem do fisiología masculina aprésente reamóos sexuais ambi


guas ou, em aparéncia, hermafroditas. Erróneamente é educado como
so pertencesse ao sexo fominino. Na idnde oportuna, essa presumida
flnnzcla conenhe o desojo de «contrair matrimonie» com determinado
rapaz. Cai entáo sob os cuidados de um médico, que *se compadeco de
tal paciente e resolve favorecer «de maneira científicas os seus planos
matrimoniáis, a fim de lhe levantar o ánimo e dar-lhe certa alegría na
vida. O cirurgiño decide, pois, proceder do seguinte modo : mediante
castracfio faz que o individuo se torne eunuco, ou seja. estéril: a seguir,
tomando um pedaco de intestino, forma urna vagina artificial e en-
xerta-a no organismo do paciente; éste assim adquire a possibilidade
de ter rclacóes sexuais do tipo feminino. Claro está, porém, que tais
relacóes sexuais íicaráo totalmente esteréis e nunca constituiráo mate
ria de contrato matrimonial. Por conseguinte, o tratamento cirúrglco
assim concebido é ilícito, tocando mesmo as raias da hediondez (cf. A.
Niedermeyer, Compendio de Medicina Pastoral. Barcelona 1957,
pág. 275).
De quanto acaba de ser dito, depreende-se sem dificuldade que

3) Nao é lícito tentar corrigir o homossexualismo era-


preendendo alguma intervencáo cirúrgica que vise dar ao pa
ciente a fisiología do sexo oposto.
Um tal empreendimento nao sómente seria' contrario &
Moral, mas estaría também em oposigáo as tendencias da Medi
cina moderna. Esta geralmente considera o homossexualismo
como um defeito psíquico, derivado da educacáo, de influencias
do ambiente ou de preconceitos, mais do que um defeito fisioló
gico ou hormonal (verdade é que nao se podem negar também
causas de homossexualismo anatómicas ou orgánicas).

— 511 —
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 60/1962, qu. 5

Sobre a maneira de tratar o homossexualismo, cí. «P.R.» 5/1958,


qu. 7.

4) Há casos de pessoas do sexo feminino cuja conduta


sexual é sadia, mas que, em determinada fase da vida, vém a
sofrer de desequilibrio das glándulas endocrinas. Em conseqüén-
cia, apresentam características secundarías sexuais do tipo mas
culino. Éste fenómeno, dito «de masculinizacáo», deve-se princi
palmente a certas tumores no ovario (arrenoblastomas); urna
vez eliminado o tumor, dá-se, na maioria dos casos, a completa
regressáo ao sexo feminino. Evidentemente a intervencáo cirúr-
gica, nesses casos, é de todo legitima, pois nao faz senáo restituir
a pessoa ao seu comportamento natural e normal.
Estes principios sao suficientes para sugerir toda a cautela
em se tratando de operacóes táo complexas do ponto de vista da
Medicina e táo fácilmente condenáyeis do ponto de vista da Mo
ral. Qualquer intervencáo no funcionamento sexual da pessoa
humana, seja por via cirúrgica, seja por via psicológica, é ilícita.
caso venha a ser empreendida fora das normas ácima formula
das. Torna-se assim muito restrito e rarefeito o número de casos
em que a consciéncia moral pode consentir em tratamentos
désse tipo.
Quanto ao procedimento de Cocinelli em particular, apre-
senta-se, no foro externo, evidentemente com todos os síntomas
de iliceidade; quanto ao foro interno ou á consciéncia, o Supremo
Juiz julgará.

ENFERMEIRA (Curitiba) :

5) «As operacóes plásticas, que visam dar urna configura-


cao mais estética ao paciente, seráo lícitas?»
Em primeiro lugar, exporernos o problema como tal, afim do pro-
por com clareza os principios de solucáo respectivos.

1. O problema

As operacóes plásticas (também ditas «ortopédicas», em sentido


largo) nSo tém por objetivo restaurar a saúde, salvar a vida ou mitigar
dores veementes, como as demais intervencoes cirúrgicas, mas visam
únicamente corrlglr deíormacOcs do corpo, sem que essa correcüo seja
sempre necessária ou útil para que o paciente tenha vida e saúde. Por
conseguinte, as opéraedes plásticas süo inspiradas únicamente pelo de-
sejo de beneficiar e aperfeieoar o aspecto físico do paciente.
Já os médicos gregos Hipócrates tt 377 a.C.) e Galeno it 200 d.C. i
praticavam tais Intervencoes (naturalmente em escala muito requziua,
dada a precariedade de seus recursos profissionais). Os antigos apos
Cristo e os medievais pouco se interessaram por essa técnica. Foi apenas

— 512 —
LICITAS AS OPERACOES PLÁSTICAS?

no século passado que surglu própriamente a ortopedia científica,


apoiada em estudos e publicaeSes importantes, principalmente na Ale-
manha. Hoje em dia váo-se descobrindo e multiplicando receitas e ope-
rac5es destinadas too sómente a corrigir deformidades do corpo hu
mano. A radioterapia é íreqüentemente utilizada nesse ramo da medi
cina, com resultados notáveis para a estética do paciente.
Sabe-se, porém, que ésses tratamentos muitas vezes acarretam
graves riscos para a saúde da pessoa interessada ou requerem despesas
vultuosas. Dai a dúvida que espontáneamente se origina no íntimo de
cada consdéncia: que dirá a respeito a Moral crista? O Senhor Deus
nao condenará tais usos ou abusos da ciencia?
Vejamos o que a essas questóes responde a sá ñoutrina.

2. Os principios de solutSo

1. Evidentemente as operagóes plásticas acarretam con


sigo perigos ou riscos de todo indesejáveis. Sim,

a) podem constituir alimento para a vaidade do sujeito,


que mais e mais tenderá a fazer de sua pessoa e de seu aspecto
físico o ponto de convergencia, consciente ou inconsciente, de sua
atencáo. Egocentrismo, vá complacencia em si podem destarte
ser fomentados, com detrimento para a dignidade moral do ser
humano;

b) despesas avultadas váo sendo efetuadas por ocasiáo das


intervencóes sem que haja necessidade nem proporcional com-
pensacáo. Ora a Providencia distribui aos homens o dinheiro e os
bens déste mundo para que os respectivos proprietários glorifi-
quem a Deus e sirvam ao próximo, santificando-se a si mesmos,
nao para que se depauperem espiritualmente, definhando egoís
ticamente em si próprios;

c) a saúde física do paciente nao deixa de correr seus ris


cos por ocasiáo de urna intervencáo cirúrgica. Ora a saúde tam-
bém é dom de Deus, que ninguém tem o direito de esbanjar para
satisfazer a caprichos desarrazoados, como freqüentemente
acontece quando se trata de operagóes plásticas.

2. Ponderando isto, a Moral crista, embora nao condene


peremptóriamente as operagóes plásticas, ensina que elas só
podem ser tidas cómo lícitas mediante o cumprimento de certas
condigóes:

1) Haja motivo proporcionalment* grave para se empreen-


der semelhante intervengáo. As vantagens que com probabili-
dade possam provir da operagáo plástica, devem superar os peri
gos a ela anexos. Tais vantagens seriam, por exemplo :

— 513 —
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 60/1962, qu. 5

a) o exercfcio normal e pacato de urna profissao para a qual o


paciente experimenta vocacáo ou atrativo, exercicio normal ao qual urna
deformacáo física constituiría serio obstáculo;
b) o gozo da autoridade e do prestigio necessários para que o cida-
dáo desempenhe convenientemente na sociedade o papel que lhe com
pete:
c) a consecucao de um casamento licito e digno;
d) a remoeáo de complexos psicológicos que deíormam a persona-
lidade moral do paciente, travando ou impedindo seu desenvolvimento
natural (há casos, sim, em que determinado deíeito físico inílui profun
damente no comportamiento psíquico e moral do respectivo sujeito).

Para a Hceidade de urna operacáo plástica, requer-se outros-


sim que

2) A intervencáo em si mesma nada tenha de imoral. —


Como se compreende, nunca é licito empregar meios maus a fim
de obter efeitos bons. Em outros termos: a moral de um ato
humano deve ser avaliada nao sómente a luz do respectivo fim,
mas também através das circunstancias; caso alguma destas seja
condenável, o ato mesmo se torna condenável.

Ademáis a sá consciéncia exige que

3) A importancia do paciente na sociedade nao seja tal que


se torne temerario comprometer a sua saúde ou a sua vida em
algam risco, por menor que seja.
Tratando-so, por exemplo, de um cheíe de familia cuja existencia
seja, humanamente falando, absolutamente necessária para assegurar
o sustento dos seus, a prudencia recomenda nao se submeta, sem motivo
muito grave, a urna intervencáo que o possa afastar, provisoria ou defi
nitivamente, do exercicio de suas funcoes. O mesmo se diga de urna
personalidade pública cuja atuacáo na sociedade seja de grande relevo
isuposto, naturalmente, que a deformidade íisica nao constitua obstá
culo notável ao bom desempenho das respectivas funcoes).

Por último, é preciso que

4) O paciente nao seja submetido a operacáo plástica sem


estar informado dos riscos que éle assim há de correr.

Todo individuo tem a obrigacáo de zelar pela conservacáo


de sua vida. Desde que esta venha a sofrer algum perigo, é de de-
sejar que éle o saíba a fím de se poder desincumbir de táo grave
obrigacáo com o devido conhecimento de causa, assumindo assim
a plena responsabilidade dos seus atos.

Desde que se preencham as condigoes ácima, a Moral crista


nao tacha de ilícita tdda e qualquer operacáo plástica.

_ 514 —
MORAL E REGIME PARA EMAGRKCER

JOVEM (Sao Paulo) :

6) «Como julgar os regimes para emagrecer, táo frcqüen-


adotados pela nossa socicdade?»
A saúdc do corpo é dom tíc Dc-u:, ü criatura, dom que esta deve
administrar de modo a dar gloria ao Criador. Dai decorre, para todo
individuo, a necessidade de conservar o seu corpo em condicóes de servir
a Deus; nao nos é licito, portanto, usar da saúde simplesmente para
pozar ou para satisfazer a caprichos íúteis; toda criatura deverá um
dia dar ao Criador contas do emprégo de suas fórcas ou dos talentos
(da saúde) que o Senhor tiver confiado ao seu zélo.

As normas gerais de comportamento do cristúo frente ao seu corpa


já foram explanadas om cP.R.» 30/1960, qu. 2 e 3. Aqui soltaremos a
nossa atencáo para um aspecto especial da questáo, que c o dos regi
mos de omagrecimento, na medida em que afetam os deveres do hom^in
para com o seu corpo e o seu Criador.

Antes do mais, exporemos alguns dos tragos mais significativos do


problema; após o que, consideraremos os principios que eneaminham a
solucáo dos diversos casos ocorrentes na vida cotidiana.

1. Aspectos do problema

A tendencia a engordar é fenómeno cujas causas até hoje


nao puderam ser plenamente elucidadas. Nao é raro ouvir-se
dizer tanto da parte de jovens como da parte de pessoas já ple
namente desenvolvidas e equilibradas : «Quase nao como; nao
obstante, contüiuo a engordar». Contudo, a fim de esclarecer o
problema, podem-se registrar algumas observagóes já feitas
neste setor.

1) A tendencia a engordar, em alguns casos, parece decor-


rcr de urna predisposigáo inata na respectiva pessoa ou de urna
modalidade própria de constituicáo do organismo; deve-se entáo
«i um desregramento dos tecidos, que se tornam propensos a acu
mular gorduras por reagáo instintiva das células.

O Prof. Joros, de Hamburgo, fez a éste propósito experiencia muito


significativa : a um paciente que havia sofrido profundas queimadu-
ras, enxertou ñas máos tecidos retirados do abdomen. Verificou entao
que, mesmo ñas máos, ésses tecidos eram invadidos por gordura, exa-
tamente no ritmo em que isto se dava ñas paredes abdominais!...

2) Certos estudiosos admitem um «hormónio de mobiliza-


cáo das gorduras». A insuficiencia désse elemento explicaría o
acumulo de tecidos adiposos. Em verdade, já se descobriu tal
hermónio no sóro do cávalo; supóe-se que seja segregado pelo
lobo anterior da hipófise. Contudo ainda nao foi possivel isolá-lo
a fim de o experimentar no organismo humano.

— 515 —
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 60/1962, qu. 6

3) Outros autores julgam que certas pessoas sofrem de de


sequilibrio do centro nervoso do apetite; em conseqüéncia, sao
levadas a consumir mais alimentos do que aquilo de que seu or
ganismo precisaría normalmente.

Nao há dúvida, os estudiosos conseguiram fazer que certos animáis


atingissem dimensñes enormes, exercendo influencia sobre o respectivo
hipotálamo, zona inferior do cerebro que preside as íuncóes da vida
vegetativa. Nao foi possivel, porém, até hoje exercer semelhante in
fluencia sobre o cerebro humano a fim de comprovar a veracidade da
hipótese.

4) Certo é que, no ser humano, os fenómenos de gordura


excessiva e obesidade se acham de muito perto relacionados com
a civilizagáo. Os animáis selvagens, por exemplo, nao estáo su-
jeitos a tais fenómenos; podem, porém, tonnar-se vitimas disso
desde que sejam domesticados. Um estudioso do «College de
France», Jacques Le Magnen, explica o fato á luz da arte culina
ria dos povos civilizados, que sabem multiplicar as iguarias, usar
temperos e variar os condimentos, a ponto de destruir o senso do
'.«quilibrio no animal irracional e ño próprio homem.

fisse cicniisia avi'tigüou, por exemplo, que o instinto de alimentacáo


nos irrarionais é diri«i<lo polo sentido (lo olfato; ora, iludindo o olfato,
ole fonsoRiiiu qui* um rato. <>ni nina só reíeicáo, consumisse urna racáo
aumentar tres vézus maior do que a normal: para o obten apresentou
ao animal um co/.ido mais ou menos sem sabor, ao qual. por tres vézes
consecutiva;;. <l»-u o «ósln <!>■ um alimi-nto diforcinto; o rato cntáo comeu
cssas tros vózi.-s consecutivas, fa/endo tres rcfeigóes numa so.

Eis algumas observacóes que nao deixam de ter sua impor


tancia para se avaliar a moralidade dos regimes de emagreci-
mento.

2. Os principios de solucáo

Passemos das propasicóes mais gerais as mais especiali


zadas.
1) A saúde é, como foi dito atrás, um dom de Deus, que o
homem deve administrar de modo a glorificar o Criador.
O cristáo tem cónsciéncia de que o corpo, embora seja ma
terial e mortal, é criatura boa de um Criador Bom, criatura que
tem de ser utilizada para o servico do seu Supremo Senhor. Dai
se deriva, para todo homem, a necessidade de conservar e desen
volver as potencialidades do seu organismo, zelando equilibrada
mente pela sua saúde, a fim de dar ao mundo, da maneira mais
eloqüente possivel, o testemunho da sabedoria e da santidade
de Deus.

— 516 —
MORAL E REGIME PARA EMAGRECER

2) A conserva$áo da saúde nao depende própriamentc de


(luanlidade de alimentos. Ao contrario, sobriedade e reserva
impóem-se a todo homem, em nome tanto da Medicina como da
snbcdoria crista.
Com efeito, a Medicina recomenda, nao seja sobrecarregado
o organismo, nem se exija esfórco demasiado das cstruturas da
vida, a fim de que nao se desgastem prematuramente.
Verifica-se mesmo que há correlagáo entre o regime alimen
tar e a duracáo da vida do respectivo sujeito. Tenha-se em vista,
por exempJo, a seguinte experiencia : o Prof. BouIktc separou
dois grupos de ratinhos recém-nascidos. Ao primeiro serviu ali-
mentagáo abundante; ésses animáis viveram 70U días om media.
Ao nutro grupo deu nutricáo severamente racionarla: ora seus
componentes, longo de sofrer detrimento em conser.¡üéncia, vive
ram urna media de 1400 días, isto é. o dóbro da loneovidade de
spus semeihantes!
Provas dcste tipo foram reproduzidas com outros animáis
e om grande número, levando sompre a mesma conclusáo : os
animáis sobriamente alimentados no inicio da sua existencia,
vjvem muito mais do que os que recebem nutrimento copioso.
— Julga-se que o mesmo se pode dizer a respeito do ser humano.
Esta advertencia tem especial importancia para os pais de
familia, pois tondem muitas vézcs a fazor que seas filhos comam
demasiadamente.

A (¡Hito do üustracúo. transcn-verr.os ac¡ui urna pussnyem do


Dr. Varenne no seu livro * Fique Niimpiv jovem o viva mais tempo» :
•/A maneira como a erianea fór nutrida, tf-rá importancia imensa.
muitas vézes capital, para a sua longevidad»? e o prolonsamonto de sua
.íuventudc. Que as mamáes nao se 'squecam! Mas quantos preconceitos
a derrubar nesse assunto! Se nao consigo ronvoncer as maes, pelo
menos proclamo feliz a erianca que tem pouco apetite; feliz aquéle a
quem os pais nao conseguem impor o alimento! Feliz aquéle que, ás
vózns, tiver fome! Tem todas as probabilidades de viver oiíenta anos,
e nao conhecerá velhice precoce.
Charia, se ousasse, meu caso pessoai : até os quatorze anos, prá-
ticamente nao comia coisa alguma. Fui a causa do desespero de minha
máo, que me via recusar tudo quanto me oferecia. Quanto mais se
esmerava em aprosentar-me pratos variados, mais obstinado ficava cu
em desprezá-los. Acredito píamente que essa falta de apetite e a sub-
alimentacáo durante minha infancia sao as causas de minha saúde exce
lente e do prolongamento da minha juventude após os setenta anos.
Se, pois, mamáes, voces tiverem um filho sem apetite, que recusa
os pratos gostosos que voces Ihe preparam, nao se lamentem; alegrem-
•sc, pelo contrario : ele tem todas as probabilidades de viver muito, sem
os dissabores de urna velhice prematura-» (ob. cit. 46).

A fé crista, por sua vez, recomenda sobriedade na aJimenta-


qáo. Embora a Igreja nao se empenhe por algum regime dieté-

— 517 —
*PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 60/1962, qu. 6

tico (nem mesmo pelo vegetarianismo), Ela impóe a seus filhos o


jejum e a abstinencia em alguns dias do ano, a fim de lhes lem-
brar a reserva que durante o ano inteiro devem manter perante
os alimentos.
Os homens religiosos, como também os sabios, de todas as
partes do mundo sempre verificaran! que a continencia frente
aos alimentos garante maior liberdade ou leveza á mente hu
mana para que se aplique aos valores do espirito, ou seja, á ora-
gao, ao estudo e á contemplagáo. As fungóes vegetativas nao
podem deixar de dividir e diminuir as energías do homem, embo
tando de certo modo a agudez da mente.

A respeito do vinho cm particular, dizia o Papa Pió XII :

'-O vinho é em si coisa excelente... Cornudo pode haver serias


razóes para que alguém se abstenha de o tomar: razfles de prudencia
pessoal, de amor ao próximo, de reparaeao religiosa pelos pecados da
própria pessoa ou do próximo» <Directivcs 2570).

Estas idéias já dáo a ver que bem pode ser lícito empreen-
der um regime de emagrecimento. A liceidade dependerá do mo
tivo que inspire tal iniciativa. Á luz déste principio, formulam-se
mais duas proposicóes :

3) Um regime de emagrecimento observado por pura va¡-


dade será sempro moralmente ilícito.

Poder-se-ia repetir aqui o que já íoi dito a respeito do «operatoes


plásticas ■ devidas a motivos de vaidade, á pág. 513 déste fascículo : a
vaidade, desviando da sua verdadoira finalidadc as aptidóes c qualida-
des que o Criador deu a criatura, é, em si m«sma, má, e, por isto, torna
maus ou moralmente ilícitos os atus que ela inspira ou sustenta.

4) Gcnuínos motivos profissionais, sociais, terapéuticos e


religiosos podem perfeitamenfc» justificar um regime de emagre
cimento.

Em outras palavras : ó aceitável todo c qualqucr motivo qui


nao se oponha ao servido de Deus, mas, ao contrario, concomí
para que o Senhor seja direta ou indiretamente glorificado pelo
corpo do paciente.
Os motivos profissionais e sociais já foram discriminados
á pág. 514 déste volume. Seja apenas mencionado o fato de que
a obesidade e, em geral, os excessos de gordura muitas vézes
tornam a pessoa passivel de comentarios o palavras levianas;
isto pode diminuir o prestigio e a autoridade de que todo homem
precisa para exercer devidamente suas fungóos profissionais e
técnicas ou um cargo de autoridade ou também... para encon-

— 518 —
MORAL E REGIME PARA EMAGRECER

trar um matrimonio. Dai decorre a possibilidade de se empreen-


der licitamente um regime para emagrecer : na verdade, o cris-
iño deve procurar ocupar a sua posigáo na sociedade com toda
a eficacia possível, a fim de dar ao mundo o mais eloqüente tes-
temunho de Cristo.
Está claro outrossim que razóes terapéuticas o-,i a explícita
indicagáo do médico justificam (podem mesmo, em consciéncia,
tornar obrigatório) um regime para emagrecer. Tal regime, vi-
pando o equilibrio de saúde do paciente, concorrerá para que esta
venha a servir melhor a Deus.

Nos casos, porém, em que o regime é moralmente licito,


ulterior questáo impóe-se á nossa consideracáo : que tálicas ado
tar a fim de se conseguir emagrecer sem tropecar no plano da
consciéncia ou da Lei de Deus?
É o que vamos examinar.
a) O recurso a remedios e drogas que facam perder peso,
nao ó recomendado nem pela Medicina nem pela Moral, pois nao
raro prejudica a saúde. Pode-se mesmo considerar ésse recurso
como um meio elegante de favorecer inconscientemente a covar-
dia e o comodismo do paciente : os remedios dispensam de certos
sacrificios ou restricóes alimentares, pois quem os toma julga
assim neutralizar os efeitos da nutricfio. Ora um regime em-
preendido dentro desta perspectiva diminuí a personalidade.

A pouca eficacia dos tratnmentos artificiáis para einn^recor pode


ser ilustrada pola cstatistica seguinte : calculase que. nos EE.UU. da
América do Norte, diariamente mais de 16.000 pessoas fteqüentam ins
titutos devidamente aparelhados. onde se submetem a banhos, suadou-
ros exercicios físicos, etc., pagando elevada quantia por cada aplicacao;
véndese também um alimento artificial em quantidade correspondente
ao prego de 1 bilhño e 250 milhoes de novos fraVicos (franceses) por
ano, alimento que dá a impressáo de «.estómago cheio», mas nao nutre.
Isto tudo impóe esforgos e sacrificios ao sistema nervoso, ás glándulas
e ao estómago do respectivo paciente, causando finalmente irremedia-
veis prejuizos á saúde. — Pois bem; dois médicos norte-americanos, os
Drs Stiinkara (• Mac Laren-Hume, resolveram submeter á observacáo
uní j'rupo fie pessoas quo havinm pnssado por tais n'KÍ>n«'S : verifica-
ram i-ntíio que. dois anos após haveiem eessado o tratamiento, ajionas
27c dessas pessoas tinham conservado a sua estatura esbelta.

b) Recentcmemte (inicio de 1962) nos Estados Unidos o


Dr. Hermán Taller, chefe de servico num hospital de Nova lor-
que, publicou um Hvro («Calories don't count») que causou
grande alarde, atingindo a tiragem de dois milhóes de exempla-
res em cinco meses.
Afirmava, ao invés de quanto se tcm dito até nossos días,
que a gordura e a obesidade nao dependem de calorías nem da

— 519 —
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 60/1962, qu. (»

quantidade de alimentos ingeridos, mas de metabolismo, ou seja,


de química interna do organismo. Sustentava, por conseguinte,
que nao há coisa mais fácil do que emagrecer : nao exige que a
pessoa se prive de refeicóes nem que se levante da mesa ainda
com fome. Bastaría apenas aplicar o seguinte principio : sao os
hidratos de carbono, isto é, os amidos e as sacaroses, que se con-
vertem em gorduras no organismo; tornar-se-ia suficiente, por-
tanto, evitar tais alimentos (pao, farináceos, frutas, álcool);
quem assegurasse isto, poderia, á vontade, comer de qualquer
outra iguaria do cardápio. Asseverava ainda o Dr. Taller que,
para emagrecer, é mesmo necessário consumir muitas gordu
ras..., nao, porém, quaisquer gorduras.mas aquelas que quími
camente sao ditas «nao saturadas» (pois sao elas que nos possi-
bilitam queimar as nossas reservas); e, dentre as gorduras me
nos saturadas, citava os óleos de peixe e certos óleos vegetáis
(como o do milho e o do cártamo, planta oleaginosa tropical).
As receitas do Dr. Taller encontraram extraordinaria acei-
tacáo no público «leigo em medicina» (nao se sabe com que re
sultados, pois nao foram feitas estatisticas a propósito). Os mé
dicos, porém, tanto na Europa como na América, tém rejeitado
tais idéias; insistem em asseverar que todos os alimentos, e em
primeiro lugar as gorduras, se podem transformar em gorduras
no organismo. Assim. por exemplo, se exprimiu o Dr. Ahrens, do
Instituto Rockfeller :

«Taller afirma que é inútil contar as ralorias, mas élo mesmo as


conta muito cuidadosamente. Examinei as receitas que ele publicou a
título de exemplo, e veriíiquei que importam em urna ragüo diaria do
1 600 calorías, quantidade esta que corresponde á de um tratamento
normal para emagrecer. O Doutor Stare, professor de Dietética na Uni-
versidade de Harvard, acreseonta : a única vantagem de um regimo
rico em gorduras está tal vez em cortar o apetite» (transcrito de «Scicncr
et Vie» ng 540, setembro de 1962, pág. 55).

Para elucidar o debate, a revista «Science et Vie» instituiu


um inquérito junto a diversos especialistas dos hospitais de París.
Em conseqüéncia, pode apurar um depoimento unánime, que se
resume nos seguintes termos :

«Queira-o ou nao o Dr. Taller, enquanto nao se tiver descoberto a


causa primordial da obesidade, so haverá um recurso a Ihe opor, recurso
provisorio, mas eficiente : a dura lei das calorias. Para emagrecer, é ne-
cem&rio e suficiente comer menos. Seria erróneo, porém, querer apli
car esta regra de maneira mecánica. Torna-se indispensável adatá-la a
cada temperamento,... encontrar a fórmula que permita a cada pa
cíente, dentro dos seus hábitos e das suas circunstancias de vida pes-
soais, dobrar-se a essa lei sem soírcr ciernáis nem recalcitrar. Por falta
desta cautela é que tantos regimes. iniciados com entusiasmo, terminam
em baque» <nv 540, pág. 55 >.

— 520 —
MORAL E REG1ME PARA E.MAC.RKCER

Com outras palavras : nos casos etn que se torna nccessário


emagrecer, nao há outro expediente se nao o da abstinencia, isto
é, o da disciplina e do dominio da pessoa sobre si mesma. Fugir
a isto em nome de outra «bela» receita vem a ser o mesmo que
engañar a si e quicá ceder inconscientemente á covardia, ao co-
modismo, com detrimento para a personalidadc humana. Acres-
centa o articulista no citado periódico :

«Nao é funcáo de um livro ou do urna revista substituir o médico;


o tratamcnto da obesidade... ficara sen- e di-pcticnd' da consideracáo
de cada caso em particular.1- (pAg. "i5>.

Sim; a fim de evitar urna abstinencia inadcquada para o


paciento, c nociva mais do que útil, torna-so r< comendável a
consulta a um médico, que ditará as normas precisas tío regime.

De maneira geral, valeráo sempre os seguintes principios :

1) É oportuno comecar a abstinencia uYmIo «pie se tome


consciéncia da sua necessidadi?.

Urna tal abstinencia, iniciada desde que tiecessíuia. sera mais suave
e tolorável do que se íór empreendida após indevido adiamento. O adia-
mento, no caso, s6 concorrerá para agravar os males físicos (engorda
e obesidade) e amolecer o ánimo dos pacientes ou o dominio sobre si
mesmo. Logo, portanto, que alguém note indevido aumento de peso,
procure suprimir manteiga e queijo, comer carne sem gordura, renun
ciar ao tempero da salada, nao sn servir mais de urna vez do mesmo

Contudo -rserá mister ter paciencia e certa fórea de vontade para


que a pessoa permaneca vigilante e resista á seducüo das refeicóes
tomadas em mesa da soriedado («Science et Vie» n' citado, pag. 56). —
Oportuna advertencia, que toca de perto a consciéncia crista!

2) Será preciso usar de discemimento a fim de se escolhe-


rem alimentos tais que, de um lado, nao deixem na pessoa a im-
pressáo de fome, mas, de outro lado, nao engordem.

Assim carne sem gordura e legumes verdes (que contém relativa


mente poucas calorías) seráo sempre recomendados, íicando ao contra
rio, severamente excluidos os hidratos de carbono e as gorduras. Cem
gramas de manteiga equivalen! a 761 calorías, ao passo que cem gramas
de carne perfazem apenas 164 calorías.

3) O exercício de andar será muito útil. Verifica-su que os


exercicios violentos pouco adiantam, pois excitam o apetite, de
modo tal que o peso perdido é rápidamente recuperado. Os exer
cicios moderados, porém, evitam tal inconveniente; e, dentre
estes, o melhor é o caminhar, que movimenta os maiores mús
culos do organismo.

— 521 —
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 60/1962. qu. 7

Admita-se o caso de urna pessoa sedentaria que pese 75 quilos e


consuma um excesso de 80 calorías por dia; no íim de um ano terá
engordado seis quilos; ora, se essa pessoa caminhasse todos os dias um
quilómetro e meio (indo, por exemplo, de casa á reparticSo de trabalho
ou á escola ou á feira, ao armazém do géneros...), gastaría essas 80
calorías excessivas e conservaría o seu porte esguio.

Acontece, porém, que a prática de andar contraria as ten


dencias do comodismo e da moleza de temperamento, máxime
em nossos dias... Haja, pois, mais disciplina ou autodominio
•também neste ponto!

Tais sao as principáis indicacóes que a consciéncia crista


pode fornecer a respeito dos regimes de emagrecimento, táo fre-
qüentes, mas táo mal aplicados na vida moderna.

A guisa de ilustragao, vai abaixo registrado o número de calorías


contidas nos alimentos mais usuais :

. Em 100 gr Nv de calorías

de óleo de azeitona 890


do manteiga 761
de chocolate 300
de acucar 400
de queijo «gruyere» (creme) 372
de porco gorduroso 332
de creme (í- leí te 255
de piio branoo 250
do carne bovina 164
um ovo contém 162
de íigado 145
de batatas 89
de leite 67
de laranja 45
de legumes verdes 39

V. HISTORIA DO CRISTIANISMO

CURIOSO (Curitiba) :

7) «Como se explica o propalado divorcio de Luis VII, rei


de Franca, e Eleonora da Aquitánia, concedido pelo concilio de
Beaugency em 1152?
Será entao que a Igreja nño admite divorcio?»

As dúvidas sobre o assunto foram recentemente avivadas por um


trecho da obra «As Cruzadas* de Sergio Macedo (Distribuidora Record,
Sdo Paulo), onde se le o seguinte :

íLuis VII era um rei-monge, como existiam tantos durante o pe


riodo medieval, preocupado quase que exclusivamente com a prática
da religiáo... Apreciando imensamente a poesia, Eleonora reuniu em
O .DÍVÓRCIQ. DE LUIS VII DA TRANCA

volta de si urna verdadeira c6rte de trovadores. Semelhante situacüo


desagradou a Luis VII, que, de regresso da Térra Santa, por ocasiao
da segunda Cruzada, reuniu um Concilio de Bispos, conseguindo a dis-
solueáo legal e religiosa dos vínculos matrimoniáis)- (pág. 40-41).

1. Procuraremos elucidar a questáo, formulando primeira-


mente, num relato objetivo, o que se pode dizer sobre o desenro-
lar dos acontecimentos em foco.

Luis VII, dito «o Jovem» da dinastía dos Capctíngios, reinou na


Franca do 1137 c 1180, casándose com Eleonora da Aquitánia, pouco
antes de comecar a governar. No ano de 1147 empreendeu, juntamente
com outros governantes europeus, a segunda Cruzada á Térra Santa;
acompanhava-o a sua esposa Eleonora. Esta era sobrinha de Raimundo
<ic Poitiers, cntao principe de Antioqula na Siria. Quando os dois conju
res chogaram a Antioquia, ai encontraram urna corte assaz opulenta,
freqüentada por nobres damas da Franca dadas as festas e ao luxo.
Atraente e leviana como era, Eleonora aproveitou-se de todas as opor
tunidades para gozar, chegando a conceber amor por um jovem turco.
Para se justificar, alegava que os hábitos de continencia do seu ma
rido lhe davam o direito de procurar compensacóes; julgara esposar
um rei. mas na verdade esposara um monge...
Entrementes o principe Raimundo de Antioquia muito desejava
que os cruzados permanecessem no seu territorio a fim de o auxiliaren!
ñas suas campanhas militares. Para o conseguir, resolveu solicitar a
Da. Eleonora, persuadisse o marido de ficar em Antioquia. Luis VII.
porém, homem do piedade austera, respondeu que havia feito o voto
fin ir ao Santo Sepulcro em Jerusalém; deveria, portento. d<\s¡ncumbir-se
primeramente desta obrigacSo; a seguir, atendería ao principe Ral-
mundo e aos senhores da Siria em tudo que interessasse aos cristáos
disto país. Diante da recusa. Da. Eleonora se deu por ofendida o maní-
íeslou o propósito de pleitear a doelnracíio d<> nuHdadr do seu casa
mento, pois idizia elaj existiam lacos do parentesco entre Luis e sua
esposa, lacos desconhecidos ao público, mas suficientes para impedir a
validade do casamento conforme o Direito Eclesiástico da época.
Nessas circunstancias, Luís VII apressou a sua partida de Antio
quia, arrebatando a esposa á corte de Raimundo, o qual jurara empre-
gar até mesmo a violencia para conservar a sobrinha em seu territorio.
Quando, de volta da Palestina, os dois cónjuges chegaram a Tivoli
na Italia, o Papa Eugenio III obteve que se reconciliassem entre si; nSo
quería dar crédito á alegacáo de que existia parentesco clandestino
entre Luis VII e Eleonora.
Já, porém, que os rumores de consangüinidade mais a mais se pro-
palavam, Eugenio III houve por bem aceitar a instauracáo de um ln-
quérito sobre o assunto: aos 18 de marco do 1152, na Abadía de Beau-
geney (Sens, Franca), reuniram-se, a pedido de Luis VII, os arcebispos
de Sens, Reims, Ruáo e Bordéus, além de grande número de bispos e
senhores da nobreza; a presidencia do sínodo assim instalado coube ao
arcebispo de Bordéus, Godofredo de Loroux, que o Papa Eugenio III
havia designado para ser seu legado : éste e varios outros bispos (entre
os quais. Hugo de Ruáo e Sansáo de Reims) tinham sido especialmente
nomeados pelo Pontífice para julgarem o caso do monarca e de sua
consorte. A assembléia comparecerán! também alguns familiares do rei
Luis VII, que se haviam oferecido para dar eselareeimentos; estas tes-
temunhas, devidamente interpeladas, asseveravam sob juramento que

— 523 —
tPERGUNTE E RESPONDEREMOS» 60/1962, qu. 7

de fato existiam vínculos de consangüinidade entre os dois cónjuges,


vínculos tais que, perante o Direito Eclesiástico" medieval, o matrimo
nio até tal data presumido válido, fóra na verdade inválido. Táo cate
góricas afirmagóes obtiveram o reconhecimento dos conciliares, que
terminaram o inquérito declarando que na verdade, por motivo de con
sangüinidade, íóra nulo o contrato matrimonial entre Luis VII o
Da Eleonora. Estavam, portanto, quites. Da. Eleonora, pouco depois.
esposou o jovem principe Henrique Plantageneta, que se tornou rei da
Inglaterra com o nome de Henrique II.

2. Que dizer no caso, do ponto de vista jurídico e moral?

a) Os documentos-fontes nao indicam o grau de consan


güinidade clandestina que existia entre Luis VII e Eleonora da
Aquitánia; nem referem ulteriores noticias, necessárias para se
poder reconstituir de maneira clara a situacáo jurídica dos cón
juges e o trámite dos acontecimentos referentes á separacáo. O
episodio fica, em conseqüéncia, subtraído a urna investigagáo
mais precisa do historiador moderno. — Note-se, porém, que
b) a consangüinidade (ao menos até certo grau) sempre
foi impedimento matrimonial reconhecido em toda a historia da
Igreja, e mesmo entre os povos pagaos. Na legislacáo da Idade
Media, éste impedimento era muito mais estenso e avaliado com
muito mais rigor do que em nossos días. Cf. «P.R.> 49,1962,
qu. 6.
c) O caso focalizado, portanto, poderia ser assim formu
lado : havia realmente motivos para aplicar a Luís VII e Da.
Eleonora a legislacáo vigente a respeito de consangüinidade e
matrimonio? Isto é : existia de fato o alegado impedimento de
parentesco?
d) O criterio para dirimir tal questáo só podia ser o depoi-
mento das testemunhas presentes ao sínodo de Beaugency. Ora
as autoridades encarregadas do inquérito, tendo tomado conheci-
mento da situacáo, julgaram que tais motivos realmente exis
tiam. Nos, á distancia de oito séculos, carecentes da documen-
tacáo necessária para reconstituir claramente o curso dos acan-
tecimentos, ousariamos pretender julgar a situacáo com mais
acertó do que os respectivos peritos?
A sinceridade leva-nos a responder que nao. O simples fato
de nao podermos reconstituir plenamente o trámite das ocorrén-
cias nao nos permite asseverar que a Lnjustica e a desonest idade
inspiraram os juizes. Em todo e qualquer julgarnento, a fraude
e a perversáo dévem ser provadas; presume-se sempre o uso da
honestidade até que o contrario fique devidamente demonstrado.
Vé-se, pois, que é váo falar de derrogacáo das leis da Igreja
ou de concessáo de divorcio no caso de Luis VII o Jovem e Eleo
nora da Aquitánia.

— 524 —
ALEXANDRE VI E DIVORCIO

A única narrativa'das circunstancias e do proceder do sínodo de


Beaugency se deve a Sugério, Abade de Sao Dionisio na Franca; éste
prelado participou da asscmbléia e conslgnou por escrito, em termos
breves e informáis, algumas de suas reminiscencias. Cí. Mansi, Sacro-
rum Condliorum nova et amplissima collectio t. XXI. Venetiis 177G,
751-54.

CECILIA (Rio de Janeiro):

8) «Entre os casos escabrosos da historia da Igreja, costu-


mn-sn contar que o Papa Alexandre VI concedeu o divorcio ao
re i Luís XII da Franca.
Como se tora dado o episodio?

(Hiiju vista o comentarlo tic «O GLOBO*» <lc 18/7/(52, i»ág. 4)».

A rospeito do Papa Alexandre VI (1492-1503) e do scu papel na his


toria tía Igreja em geral, já foi publicada urna resposta em «P.R.»
4/1958, qu. 11. O católico nao nega os testemunhos de fraqueza humana
désse Pontífice; vé, antes, nisso um sinal de que é o próprio Dcus, e nao
sao os homens, que sustentam a Santa Igreja. Esta aparece dotada de
fórca e valores que nao coincidem simplesmente com os dos homens
que a compóem.
Contudo, no caso do matrimonio de Luis XII da Franga com Joana
de Valois icaso que punha cm íoco o dogma da in'lissolubilidadp do ca
samento), nüo houvc deslizo da parte do Pontifico, apesar dos múltiplos
rumores que suscitou.
í; o que se deprcenderá <la narrativa fiel dos aeontecimentos.

1. Joana de Valois (ou Joana de Franga) nasceu em 1464


como filha do rei Luís XI da Franca e de Carlota da Savoia. Dois
meses após o nascimento, foi por seu pai destinada a ser esposa
do duque Luís de Orleáes...

Aos cinco anos de idade, entregue aos cuidados de um primo de


Luis XI, o nobre Francisco de Bourbon-Eeaujeu, passou a viver no cas-
telo do Liniéres; Luis XI quería vé-la longe da sua mar Carlota, que
nela fomentava a piedade. á revelia do pai.

Joana foi crescendo, com disposigóes religiosas cada vez


mais acentuadas. Abstendo-se dos divertimentos que o mundo
proporciona, desejava retirar-se para o claustro; nao experimen-
tava propensáo para o matrimonio. Contudo aos nove anos de
idade recebeu de seu pai ordem de se preparar para o casamento
com o duque de Orleáes, menino de onze anos. Nem os nubentes
nem os respectivos familiares desejavam tal uniáo; apenas os in-
terésses políticos do rei a indicavam. O enlace se deu em 1476 na
cápela de Montrichard, sem aparato algum; o próprio Luís XI
nem sequer assistiu á cerimónia, a qual se desenrolou Jium am-

— 525 —
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 60/1962, qu. 8

biente de consternac.áo geral, tendo o duque de Orleáes protes


tado contra a violencia que lhe era feita.

Após as nupcias, o jovem marido nao se intercssou pela esposa,


dandolhe mesmo provas de indiferenca : assim Joana voltou a vivpr
no castelo de Unieres, nao sómente ¡solada do esposo e da sociedade,
mas também desprezada e escarnecida, pois nao era bela de semblante.
Entrementes entregavase k prática das virtudes e do amor a Deus.
O duque de Orleáes, tendose de urna feita revoltado contra Luis XI,
foi por tres anos entregue ao cárcere; Joana entáo interveio junto a seu
tio Carlos (irmño de Carlota i a íim de lhe obter a libertacüo.

Finalmente em 1498 o duque de Orleáes subiu ao trono de


Franca com o nome de Luis XII. Urna de suas primeiras medidas
foi a de pedir ao Papa a declaragáo de nulidade do seu casa
mento, baseando-se para isto ñas quatro razóes seguintes :

1) ele era consanguíneo de Joana de Valois em quarto grau f im


pedimento dirimente, segundo a praxe da Igreja em tal época);
2) Luis XII era afilhado de batismo de Luis XI, pai de Joana; ora
isto criava entre Luís XII e Joana urna afinidade espiritual, que diante
do Direito Eclesiástico constituía obstáculo ao casamento;
3i o duque contraira o matrimonio sob o efeito da violencia exer-
cida pelo rei, dando um consentimento extorquido pelas circunstancias:
4) Joana so mostrara táo contrariada com o enlace que os médi
eos a julgaram incapaz de jamáis ter filhos; além do que, acrescen-
tava Luis XII. os <lois esposos jamáis haviam habitado sob o mesmo
teto (o matrimonio nao íóra consumado por relacoes conjugáis).

Tendo recebido o pedido do rei assim concebido, o Papa


Akxandre VI aos 20 de julho de 1498 nomeou urna comissáo
de prelados para estudar o caso, comissáo que, aos 17 de dezem-
bro do mesmo ano, concluiu seus trábalhos reconhecendo a vali-
dade da motivagáo apresentada por Luis XII. Em vista disto, o
Pontífice declarou nulo (isto é, inválido desde o principio, o que c
diferente de «anular» ou de «tornar nulo algo que comecou
válidamente») o matrimonio de Joana de Franca com o duque
de Orleáes, ficando portanto cada um dos dois pretensos cónju-
ges habilitado a contrair novas nupcias (as quais nao seriam
segundas nupcias, mas as primeiras nupcias válidas). ..
Eis a sentenga que causou especie a certos historiadores.

2. Que pensar a respeito?

al Os dols nrimeiro» motivos do invalidada alegados por Luis XII.


embora nao sejam dirimentes no Direito natural, eram no Direito Ecle
siástico medieval classiíicados entre os impedimentos que tornavam
nulo o casamento. Acontece, porém, que no caso de Luis XII. e Joana
de Valois os óbices de consangüinidade (remota) e de aíinidade esplrí-

— 326 —
ALEXANDKE VI E DIVORCIO

tual haviam sido, como declarou Joana, previamente removidos por


dispensa papal; verdade é que a infeliz esposa nao p&de apresentar aos
juizes scnño urna copia do documento de dispensa, o que deixava mar-
geni para duvidar da autenticidade de tal dispensa.

b) A coacáo violenta é, dos quatros motivos apresentados,


o mais ponderoso. _
A critica reconhece hoje em dia que nao merecern"plena
fé todos os documentos e testemunhos exibidos aos juizes do
processo para os persuadir de que o duque de Orleáes sofrera
violencia por ocasiáo do contrato matrimonial. Contudo parece
nao restar dúvjda de que o nubente nao goza va da devida liber-
dado quando tleu o seu consentimento conjugal.

O ri'i l.uis XI hnvia criado urna atmosfera <lc; conslrangimento e


nmcacii, ionio se depreonde, por exemplo, da se^uinle declaragáo do mo
narca foita ao conde de Dammartin :

«Deliberei promover o casamento de minha filha Joana com o


duque de Orleáes... Esteja V. M. ciento de que espero realmente efe-
tuar tal matrimonio. Caso nao se realize, aqueles que me houverem
contrariado nao poderáo estar seguros de sobreviver no meu reino. Por
isto creio que tudo conseguirei segundo o meu designio».

Por sua vez. o hispo de Orleáes atestou que, tendo interrogado o


duque Luis de Orleáos a respeito do seu consontimento em tal enlace,
o jovom Ihe rrspondou : «Infelizmente, monsenhor de Orleáes, meu
amij-o, que haveria eu de íazer? Nao posso resistir; preferiría estar
morto a ver-me obrigado a consentir. Bom sabéis com quem estou tra
tando; nao ha fúrca nem remedio a opor*.

A outros contemporáneos teria Luis XII asseverado :

«Mais feliz fóra se pudesse esposar urna simples donzela de


Beaucet>.

Tendo o rei afirmado com solene juramento perante duas testemu-


nhas esta sua posicao, o tribunal eclesiástico houve por bem dar-lhe
crédito, reconhecendo conseqüentemente a nulidade do matrimonio
assim contraído. É claro que ninguém se pode obrigar a cumprir um
contrato involuntariamente aceito sob a amea-,%a da violencia.

c) Luis XII alegava também que Joana era impotente


para gerar e que, de resto, os dois cónjuges nunca haviam con
sumado a sua uniáo conjugal.

Joana replicou que, em consciéncia, ela nao podia concordar com


ésses dizeres, embora Luis de Orleáes muito insistisse néles. Firme em
sua recusa, a rainha rejeitava terminantemente qualquer exame mé
dico, asseverando que isso seria contrario ao pudor e a sua posicáo de
digna dama do país. Acabou, porém, declarando que reconheceria o
juramento do rei Luis XII. Éste entáo declarou, invocando o testemunho
do próprio Deus, que os deíeitos íisicos de Joana constituiam obstáculo

— 527 —
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 60/1962, qu. 8

á consumacáo do matrimonio. O depoimento fol aceito pelo tribunal


eclesiástico, tornándose mais um usteio para a sentenga de nulidade
do casamento.

Como se vé, nao foi arbitrariamente ou sem fundamento


real que a Santa Sé terminou o processo declarando inexistente
ou nulo o aparente enlace contraído por Luis XII e Joana de
Valois. A sentenga nada tinha (ou tem) de escandaloso ou in
justo. Sómente informagóes superficiais ou insuficientes pode-
riam causar mal-entendido a respeito.

AOS NOSSOS AMIGOS E LETTORES, FELIZ ANO NOVO,


RICO DE GRAC.AS DIVINAS !

D. Esteva© Bettencourt O.S.B.

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS»

Assinatura anual (porte comum) Cr$ 400,00


(porte aéreo) Cr$ 680,00
Número avulso de qualquer mes e ano Cr$ 40,00
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REOAGAO ADMINISTOAgAO

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— 528
ÍNDICE 1962

(Os números á direita indicam respectivamente fascículo, ano de edicáo,


questáo focalizada e paginacáo)

ACUSACAO DE SI PRÓPRIO PE- ,


RANTE TRIBUNAL CIVIL 52/1961, qu. 6, pag. 161.
ACUSACÁO DOS PECADOS VENÍAIS 53/1962, qu. 2, pag. 170.
ADAO E EVA EM RELAQAO AO rnMnco c , ,,A
EVOLUCIONISMO 52/1962, qu. 5, pag. 154.
ADORAgAO DA CRUZ 56/1962, qu. 2, pag. 326.
AGNOSTICISMO OU RELATIVISMO. 55/1962, qu. 1, pág. 274.
ALEXANDRE VI E O ''DIVORCIO" o . „„
DE LUÍS XII 60/1962, qu. 8, pág. 525.
ALMA HUMANA E IMORTALIDADE 53/1962, qu. 4, pag. 178.
ALTAR 50/1962, qu. 5, pág. 84.
ALTO FINANCIAMENTO 49/,19í?£ qu' f p*g* «*K
ALUNISSAGEM S6/,llll' qUl i' ptg" |1!'
AMOR E INTOLERANCIA 55/1962, qu. 2, pág.
284.
ANA-CATARINA EMMERICK 60/1962, qu. 2, pag.
495.
APARICAO DE LA SALETTE 55/1962, qu. 3, pag.
288.
APOCALIPSE 50/1962, qu. 4, pag.
67.
APÓCRIFOS DA SAGRADA ESCRI- „«
TURA 56/1962, qu. 7, pág. 346.
APOLÓNIA (SANTA) E SEUS PER- , „
SEGUIDORES 57/1962, qu. 1, pág. 379.
APOSENTADORIA E PENSOES .... 49/1962, qu. 4, pág. 26.
ARIGÓ ■ 58/1962, corr. miuda, pég. 441.
ARQUITÉTÜRA DO TEMPLO CRIS- ' V
TAO 50/1962, qu. 5, pág. 82.
ARS E LA SALETTE 55/1962, qu. 3, pág. 294.
ARTE SACRA EM GERAL 50/1962, qu. 5, pág. 80.
ASSISTENTE SOCIAL 49/1962, qu. 5, pág. 30.

BF.M ESSENCIAL E BENS ACIDEN-


TAIS 52/1962, qu. 4, pág. 151.
BEM-AVENTURANCA CELESTE ... 52/1962, qu. 4, pag. 149.
B15NCAOS E BENZEDORES 52/1962, qu. 2, pág. 136.
BIBLIA E EVOLUCIONISMO DO ,„ ■
CORPO HUMANO 52/1962, qu. 5, pág. 156.
BOM LADRAO 53/1962, qu. 4, pág. 178.
BRIDEY MURPHY 49/1962, qu. 1, pag. 3.

CARICATURA DA RELIGIAO 54/1962, qu. 1, pág. 213.


CARIDADE É HUMILHANTE ? .... 53/1962, qu. 8, pág. 194.

3
CASA DE DEUS 50/1962, qu. 5, pág. 82.
CASAMENTO DE D. JUAN CARLOS
•St g!éC?AHA C0M D • 57/1962, qu. 3,pág. 375.
CENSURA DA IGREJ A A PERÓN .. 54/1962, qu. 6, pág. 247.
CHEFE DO SINDICATO CRISTAO .. 49/1962, qu. 5, pag. 35.
CIENCIA (CULTIVO UNILATERAL

CIRCUÑCYSAO E MOÍSÉS' '.7.7..... 56/1962, qu. 3, pág. 327.

CONCILIO DE CONSTANTINO- ^ qu ^ p,g ^

^Sn^: KS8SSSE»
53/1962, qu. 3, pág. 176.
co^ngüinÍdIIe :::: 49/1962, <*. 5. p** **■
•OOHTEWLACAO DOS JUSTOS NO ^ ^

rnNTTO¿NCÍA 55/1962, corr. miúda, pág. 811.


CORPO HUMANO e'ÉVÓlÚQAO ... 52/1962, qu. 5, pág. 156.
c8Ip8rACOES MlDIEVAK 49/1962, qu. 5, pág. 31
CORPOSRESSUSCITADOS 52/1962, qu. 3, pág. 143.
^?8 S0CI0LÓGICAS..M.°: 49/1962, qu. 4, pág. 24.
«DÍDE.: 57/1962, con- mfa pág. 399.
, ÜSsAffi?¿s-::::::: «,S i ft Sf-
n SáSSÉS1?^^ 52/1962, nu. 6, pág. 161.
CR¿sciA°il Mieuo "wr"r"::: 57/1952, q«. s, Pá* 392.
CRISTIANISMO' E COMUNISMO ... 49/1962, qu. 4, pág. 23.
V/xCxOAXA.1Níoiiiv ej »jw . neo *»ii 9 ti£op ^126
CRUZ ADORACÁO DA ........... ob/lUbiS, ciu. ¿, p»s» MUi
CURANDEIRISMO 52/1962, qu. 2. pág. 136.

DANIEL E AS SETENTA SEMANAS 58/1962, qu. 3, pág. 421.


... 50/1962, qu. 2, pág. 58.
DO
.. 50/1962, qu. 1, pág. 47.

muw±iau 54/1962, qu. 5, pág. 244.


DESEJO DA PRÓPRIA MORTE ... 56/1962, qU. 6, pág. 345.
DEVER DE JUSTIQA E DE CARI- 62 qu 6> p&g 161_
DEVOCAO ' A 'MARÍA ".'.'.'.'.'.'. '■ '■'■ '■ '■'■ '• 50/1962', qu. 3*, págl 63.' •
EFrE^ENgAS DE RA5AS 59/1962, qu. 1. pág. 446.
DIREITO NATURAL ............... 50/1962, qu. 1, pág. 47.
. 49/1962, qu. 4, pág. 26.

— 4 —
DIREITOS DA CRIANZA 50/1962, qu. 2, pág. 58.
DIREITOS DO CIDADAO 50/1962, qu. 1, pág. 47.
DISCERNIMENTO REQUERIDO PA- ;
RA DISTRIBUICAO DE ESMOLAS. 55/1962, qu. 4, pág. 298.
DISCOS VOADORES > 56/1962, qu. 1, pág. 324.
"DIVORCIO" DE LUÍS VII E ELEO-
NORA DA AQUITANIA 60/1962, qu. 7, pág. 522.
"DIVORCIO" DE LUIS XII ...: 60/1962, qu. 8, pág. 525.
DIVORCIO PARA NAO-CATÓLICOS? 49/1962, qu. 2, pág. 11.
DOENCA E «RETRATACAO" DE
VOLTAIRE 57/1962, qu. 1, pag. 361.
DOENCAS E REMEDIOS 56/1962, qu. 4, pag. 332.
DOUTRINA SOCIAL CRISTA 49/1962, qu. 4, pag. 25.
DUPLA PERSONALIDADE 49/1962, qu. 1, pág. 8.

ECUMENISMO 57/1962, qu. 2, pág. 367.


MREIT0S DA 50/1962, qu. 2, Pág. 58.
Sf (ANA;.CA^ARINA.)...E 60/1962, qu. 2, pág. 499.
ENCÍCLICA "MATER ET MAGIS- ,
TRA» 50/1962, qu. 1, pag. 55.
ENCÍCLICA" "QÚADRAGESIMO ,
ANNO" 7 49/1962, qu. 4, pag. 23.
ESMOLA E MORAL CRISTA 55/1962, qu. 4, pág. 298.
"ESPOSO SANGUINOLENTO" 56/1962, qu. 3, pág. 327.
ESTABILIDADE DOS DIREITOS DO
HOMEM 50/1962, qu. 1, pág. 55.
ESTIGMAS 54/1962, qu. 2, pág. 214.
ESTILO LITÚRGICO 50/1962, qu. 5, pag. 80.
ESTREITEZA DE ESPIRITO 54/1962, qu. 1, pag. 211.
EUTANASIA 56/1962, qu. 5, pág. 339.
EVANGELHO E CRIANQAS 54/1962, qu. 1, pág. 210.
EVOLUCIONISMO DO CORPO HU- nMMO . . „„
MANO E BÍBLIA 52/1962, qu. 5, pag. 156. •
EXCOMUNHAO E SEUS EFEITOS . 54/1962, qu. 5, pag. 238.
EXIGENCIA RELIGIOSA DO ESPÍ- ,
RITO HUMANO 50/1962, qu. 1, pag. 56.
ÉXODO (4, 24-26) 56/1962, qu. 3, pág. 327.
EXPERIENCIA RELIGIOSA OU RE- ,
VELACÁO DE DEUS 55/1962, qu. 1, pag. 271.
EXTRAORDINARIO NA VIDA CRIS-
TÁ 59/1962, qu. 2, pag. 452.

PAITA, IRMÁOS, E EUTANASIA .. 56/1962, qu. 5, pág. 339.


FAMILIA 50/1962, qu. 1, pag. 54
FÉ 55/1962, qu. 1, pag. 271.
FÉ SEM OBRAS ? 53/1962, qu. 4, pág. 178.
FELICIDADE TEMPORAL E RELI- ,
GIAO 52/1962, qu. 1, pag. 132.

— 5 —
FENÓMENOS MARAVILHOSOS NA
VIDA CRISTA 59/1962, qu. 2, pág. 450.
FENÓMENOS DOS SONHOS 51/1962, qu. 4, pág. 119.
FIDEL CASTRO E EXCOMUNHAO. 54/1962, qu. 6, pág. 246.
FINALIDADES NATURAIS DO MA
TRIMONIO 49/1962, qu. 2, pág. 11.
FIRMEZA DA IGREJA SUSCITA
ADMIRACAO 55/1962, qu. 2, pág. 278.
FLORES ARTIFICIÁIS NOS ALTA
RES . 50/1962, qu. 5, pág. 86.
FREUDISMO E SONHOS 53/1962, torr. miúda, pág. 202.
FUNCAO SOCIAL DA PROPRIEDA-
DE PARTICULAR 49/1962, qu. 4, pág. 27. ,

G
GAGARIN E RELIGIAO 52/1962, qu. 1, pág. 131.
GOSTO FEBRIL DO MARAVILHOSO 59/1962 qn. 2, pág; 454.
GREVE DE FOME •' 57/1962, qu. 7, pág. 389.
GREVES .. . * 49/1962, qu. 5, pág. 31.
H
HIPNOSE DE BRIDEY MURPHY .. 49/1962, qu. 1," pág. 4.
H STÓRIA DAS RELIGIOES 54/1962, qu. 3, pag. 221..
MEM PRIMITIVO
HOMEM PRIMITIVO64^25 qu }'
64^25o' qu< } pf*' «
■HOMEM SEPARADO DE DEUS 50/1962, qu. 1, pág. 56.

IGREJA CATÓLICA APOSTÓLICA


BRASILEIRA 55/1962, qu. 5, pág. 303.
TrTBTi'T A T TTfrRGICA . 50/1962, qu. 5, pág. 82.
IGREJA E PRObIeMA SOCIAL .... 53/1962, qu. 5, 6 e 7 pág. 184.
1MA MAGNÉTICO E PSICOLOGÍA . 60/1962, qu. 1, pag. 487.
IMAGENS (estatuas de Santos) B0/S qu* 5' Pfg> ?,¿
IMORTALIDADE DA ALMA 53/1962, qu. 4, pág. 178.
IMPEDIMENTO MATRIMONIAL DE ■
CONSANGÜINIDADE 49/1962, qu. 5, pág. 40.
INCREDULIDADE MODERNA 54/1962, qu. 1, pág. 207.
INICIATIVA PESSOAL 49/1962, qu. 4, pág. 25.
INTEGRISMO . . 58/1962, qu. 1, pág. 403.
INTERPRETACAO DO APOCALIPSE 50/1962, qu. 4, pág. 69.
INTOLERANCIA E AMOR 55/1962, qu. 2, pág. 284.
INTRANSIGENCIA E INFLEXIBILI-
- DADE DA IGREJA 55/1962, qu. 2, pág. 278.
ISRAEL, RELIGUO E NAQAO 51/1962, qu. 1, pág. 99.
"IUS PRÍMAE NOCTIS" 49/1962, qu. 5, pag. 425.

JUDAISMO : RELIGIAO OU NA- .


GAO ? ••■• 52/1962, qu. 6, pag. 161";
JUSTICA* 'É' CARIDADE 53/1962, qu. 8, pág. 194.

— 6 —
LA SALETTE (APARICAO DE) ... 55/1962, qu. 3, pág. 288. - l$
LEGITIMIDADE E NECESSIDADE . . ;^
DOS SINDICATOS 49/1962, qu. 5, pág. 31;; v í¿*
LIMBO 55/1962, corr. miúda, pág. 312
LITURGIA'E ARTE''.'.'.'. 50/1962, qu. 5, pág. 83. . ;£
LIVRE, INICIATIVA DOS CIDA- ^^ qu. 4> p% 24. •

^IG^Í^^!..DÍ 50/1962, qu. 5, pág.. 83.


LOMBROSO, CÉSAR 51/1962, qu. 3, pág. 107:
LOURDES E MILAGRES 59/1962, qu. 3, pág. 457.

MAGNA CARTA DO SINDICALISMO k-í-ju


CRISTAO 49/1962, qu. 6, pág. 34.
MAGNÉTICO ÍMA E PSICOLOGÍA .. 60/1962, qu. 1, pág. 487.
MALES DECORRENTES DE REMÉ- .^^ ^ ^ ^ ^

MARÍA E* IGREJA •::.■;.' • 50/1962 qu. 3 pág. 67


MARIOLOGIA ol)/i»b¿, qu. o, pag. oo.
«MARITAINISTAS» 58/1962, qu. 1, pág. 403.
MATRIMONIO MISTO 57/1962, qu. ó, pag. alo.
MEDICAMENTOS E MORAL CRISTA 56/1962, qu. 4, pág. 332.
MILAGRE AUTÉNTICO E FALSO 53/1962, qu. 1, pág. 163;
1WTLAGRE • 59/1962, qu. 3, pág. 455.
MILAGRES DÁS'BÉNCAOS 52/1962, qu. 2, pág. 141.
MODERNISMO 55/1962, qu. 1, pag. 267.
MOISÉS ECIRCÚÑCISAO 56/1962, qu. 3, pág. 327.
49/1962, qu. 2, pág.-12. /•:
MONOPOLIO ESTATAL " 49/1962, qu. 4, pág. 28.
MORAL LEIGA 50/1962, qu. 1, pág. 55._
moro tomaz :::::
MORTE DE VOLTÁÍRÉ
■ • «o/i»«« V 6> ps ^
57/1962, qu. 1, pág. 359.
MOSÍEIRO PROTESTANTE 58/1962, qu. 5, pág. 434.
^. .„.,„,,,„,.
MULHER? SUAS APTIDOES
STÓLIC0 ....
DE 50/1962, corr. miada, pág. 86. ,
54/1962, qu. 1, pág. 210.

NOBILITACÁO DA CRIATURA HU- ■


MANA 49/1962, qu. ¿, pag. 11.
NORMAS PARA CHEFES DE SINDI- .
CATOS CRISTAOS 49/1962, qu. 5, pag. 35.
OBJECAO DE CONSCIÉNCIA- 58/1962, qu. 4, pág. 428.
OBRAS BOAS E FÉ 53/1962, qu. 4, pág. 178.
OPERACAO CIRÚRGICA PARA MU-
DANCA DE SEXO 60/1962, qu. 4, pág. 510.
0PERAC6ES PLÁSTICAS CO/1962, qu. 5, pág. 512.
OPERARIOS PADRES 59/1962, qu. 4, pág. 462.
ORAgAO 55/1962, corr. miúda, pág. 312.
ORDEM DE MALTA 50/1962, corr. miúda, pág. 87.
ORÍGENES, ORIGENISMO E CON-
CÍLIO DE CONSTANTINOPLA II. 51/1962, qu. 5, pág. 123.
ORNAMENTACAO DAS IGREJAS .. 50/1962, qu. 5, pág. 86.
OZA FULMINADO NO ANTIGO TES
TAMENTO 60/1962, qu. 3, pág. 506.

PACIFISMO OU PRINCIPIO DA
NAO-VIOLÉNCIA 58/1962, qu. 4, pág. 431.
PADRES-OPERARIOS 59/1962, qu. 4, pág. 462. •
PAPISA JOANA 55/1962, corr. miúda, pág. 311.
PARADOXO DA VIDA NESTE
MUNDO 55/1962, qu. 2, pág. 283.
PARTICIPAQAO NOS LUCROS 49/1962, qu. 4, pág. 29.
PECADO E PATOLOGÍA 51/1962, qu. 2, pág. 101.
PECADOS ACUSADOS E ABSOLVI-
DOS 53/1962, qu. 2, pág. 173.
PENA DE EXCOMUNHÁO E SEUS
EFEITOS 54/1962, qu. 5, pág. 236.
PERIGOS DÓ HIPNOTISMO 49/1962, qu. 1, pág. 10.
PERMANENCIA NA COMUNHAO
DO TODO 58/1962, qu. 2, pág. 415.
PERÓN 54/1962, qu. 6, pág. 247.
PESSOA HUMANA E SOCIEDADE . 49/1962, qu. 4, pág. 25.
PIEDADE LITÚRGICA 50/1962, qu. 5, pág. 82.
PLÁSTICA OPERACÁO 60/1962, qu. 5, pág. 512.
POLIGAMIA E LEÍ NATURAL 49/1962, qu. 2, pág. 11.
POLIGINIA E POLIANDRIA ....... 49/1962, qu. 2, pág. 12.
PRÉ-ADAMITAS ' 52/1962, qu. 5, pág. ICO.
PRECEITOS PRIMARIOS E SECUN
DARIOS DA LEÍ NATURAL 49/1962, qu. 2, pág. 12.
PROCLAMACAO DOS DIREITOS DA
CRIANCA 50/1962, qu. 2, pág. 60.
PROFECÍAS REFERENTES AO FIM
DO MUNDO 50/1962, qu. 4, pág. 67;
. 56/1962, qu. 1, pág. 323.
PROMESSA DE JESÚS AO BOM
LADRÁO 53/1962, qu. 4, pág. 178.
PROPRIEDADE PARTICULAR E
PROPRIEDADE PÚBLICA 49/1962, qu. 4, pág. 26.

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Q

DUALIDADES DOS CORPOS RES-


SUSCITADOS 52/1962, qu. 3, pág. 144.

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UASPUTIN 53/1962, qu. 1, pág. 163.
RECURSOS A EMPREGAR PARA
UNIÁO DOS CRISTÁOS 57/1962, qu. 2, pág. 369.
REENCARNACÁO 49/1962, qu. 1, pág. 3.
51/1962, qu. 4 e5, pág.
REFORMA AGRARIA 49/1962, qu. 4, pág. 28.
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EEGIMES PARA EMAGRECER 60/1962, qu. 6, pág. 515.
RELACOES ENTRE OS HOMENS EM
TODOS OS DOMINIOS 49/1962, qu. 4, pág. 24.
RELACOES ENTRE INDIVIDUO E
ESTADO 49/1962, qu. 4, pág. 24.
RELACOES ENTRE TRABALHO E
SALARIO 49/1962, qu. 4, pág. 28.
RELATIVISMO DOUTRINARIO MO
DERNISTA 55/1962, qu. 1, pág. 275.
RELIGIAO E POVOS PRIMITIVOS . 54/1962, qu. 1, pág. 211.
RELIGIAO E INTUICAO PROFUNDA
DA REALIDADE 54/1962, qu. 1, pág. 211.
REMEDIOS : USO E ABUSO 56/1962, qu. 4, pág. 332.
RESPEITO A PESSOA HUMANA .. 49/1962, qu. 4, pág. 25.
RESSURREICAO DE CRISTO : FA-
TO HISTÓRICO 54/1962, qu. 4, pág. 225.
RESTAURADO DOS MOSTEIROS
NO PROTESTANTISMO CONTEM
PORÁNEO 68/1962, qu. 5, pág. 434.
RÉU CONDENADO A MATAR-SE A
SI PRÓPRIO 57/1962, qu. 5, pág. 387.
REVOLUCAO FRANCESA DE 1789 . 50/1962, qu. 1, pág. 47.
RIQUEZA E O BELO 50/1962, qu. 5, pág. 83.
ROTARY CLUB E A IGREJA 49/1962, qu. 3, pág. 14.

SALARIO AOS TRABALHADORES . 49/1962, qu. 4, pág. 28.


SCHONSTATT 50/1962, corr. miúda, pág. 86.
SEGRÉDO DA CONFISSAO 52/1962, qu. 6, pág. 167.
SEGREDOS DE LA SALETTE 55/1962, qu. 3, pág. 291.
SEITAS MODERNAS PULULAM .. 56/1962, qu. 1, pág. 324.
SELOS DO APOCALIPSE 50/1962, qu. 4, pág. 73.
SERVO DA GLEBA 53/1962, qu. 6, pág. 184.
SETENTA SEMANAS DE DANIEL. 58/1962, qu. 3, pág. 421.
SEXO. MUDANQA ARTIFICIAL DE 60/1962, qu. 4, pág. 510.

9
O NA ARTE SACHA 60/1962, qu. 5, pág, 80.
DO APOCALIPSE 50/1962, qu. 4, pág. 73.
S ... 49/1962, qu. 5. pág. 30.
SECONÓMICOS 49/1962, qu. 4, pág. 24.
T SISTEMAS -^E - INTERPRETACAO
- }í> DO APOCALIPSE *60/1962,-qu. 4, pág. 72.
$3.&:fc-SOCTALIZACÁO E SOCIALISMO
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fSONHOS E PSICANALISE 63/1962, corr. miúda, pág; 202.
--SUICIDIO 67/1962, qu. 4, pág.' 379. ,
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«¡bíf . T

fef N ■?.;.•• ^ ,
.^TAIZÉ-CLÜNY ...'. 58/1962, qu."^, pág. 436.
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>< ^ TOMAZ MORO E "UTOPIA" 59/1962, qu. 6, pág. 472.
"' --TRABALHO NA PERSPECTIVA
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UNIAO DOS CRISTAOS 67/1962, qu. 2, pág. 367.


"UTOPIA" DE SAO TOMAZ MORO 59/1962, qu. 6, pág. 472.

^'r-VERACIDADE DA RELIGIAO CA-


ti.?-s- .TÓLICA :.. 54/1962, qu.' 3, pág. 224.
"" VERSAO DOS LXX 56/1962, qu. 3, pág. 331.
VIAGENS AO ESPAgO 56/1962, qu. 1, pág. 315.
VIDA E-MECANISMO 54/1962, qu. 1, pág. 212.
VINCULO DO CASAMENTO ... 49/1962, qu. 2, pág. 11;
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DÉ SEGRÉDO PROFIS-
„. ,SIONAL ;. ¿ 57/1962, qu. 6, pág. 888.
%,VISAO DEDEUS FACE A FACE .. ' 62/1962, qu. 4, pág. 149.
ílíVISAC*. DE DISCOS VOADORES .. 66/1962, qu. 1, pág. 324.
HiVÍSAO SOCIAL CRISTA 49/1962, qu. 2, pág. 11.
iVOLTAIRE XONVERTEU-SE ? 67/1962, qu. 1, pág. 359.
VOTOS RELIGIOSOS NA TEOLOGÍA
68/1962, qu. 6, pág. 434.

V1- ZINJANTROPO E ADAO 52/1962, qu. 5, pág. 164.

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