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MARTINS, M. & Castro, F. (2007) Desenvolvimento moral e conduta anti‐social: que relações?
In, V. Trindade, N. Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora:
Universidade de Évora.
‐ A teoria de Kohlberg que pressupõe a primazia da cognição, ao definir o acto
moral como aquele que segue um processo de raciocínio moral baseado em
princípios de justiça, propondo seis estádios de desenvolvimento do raciocínio
moral (ver Kohlberg, 1984a; 1984b);
‐ A teoria de Hoffman que define o acto moral mais em termos motivacionais do
que cognitivos, enfatizando o papel da empatia, enquanto reacção afectiva perante
o sofrimento ou necessidade do outro, que predispõe à ajuda ou acto moral (ver
Hoffman, 1987; 1991).
Gibbs (1991a, 1994, 1995b) tem vindo a propor a integração dos modelos de
Kohlberg e Hoffman a fim de melhor se explicar a conduta moral, ou seja, o autor
considera que é a inter‐relação entre os princípios de justiça e os afectos empáticos
que melhor permitirá compreender a natureza, não apenas das condutas morais,
mas também das condutas anti‐sociais.
Segundo Gibbs (1991a, p.183) «as teorias de Kohlberg e Hoffman proporcionam
contributos importantes e complementares para a nossa compreensão do
desenvolvimento e motivação morais. O trabalho de Kohlberg enfatiza a
construção progressiva, por parte do indivíduo, do significado da moralidade
madura, e explica as motivações morais em termos de um processo de
descentração que desencadeia prescrições de igualdade e reciprocidade, isto é, de
justiça. O trabalho de Hoffman enfatiza a transmissão, por parte da sociedade, de
normas morais através da interiorização e encara o afecto empático e as emoções
com ele relacionadas como a base da motivação moral» Por isso, Gibbs (1991a;
1994; 1995b) tem vindo a propor que se integrem os dois modelos a fim de se ter
uma compreensão mais alargada e profunda do desenvolvimento sociomoral e que
se leve em consideração essa integração em investigações e estudos futuros.
Gibbs (1991a) começa por estabelecer uma comparação entre os dois modelos,
no que se refere a dois aspectos centrais: «primeiro, o desenvolvimento da
moralidade e especificamente o significado para os dois autores das orientações
morais externas e internas; e, segundo, as interpretações cognitiva e afectiva da
motivação moral» (p. 184).
Para Kohlberg (1984) o facto de ser possível verificar‐se uma orientação
progressivamente interna no desenvolvimento moral não deve ser interpretada
como uma interiorização de dados do ambiente, mas antes como um progresso no
sentido da maturidade. Kohlberg (1984) salienta mesmo que seria mais correcto
falar‐se de uma progressão do juízo moral do superficial para o profundo, do que
do exterior para o interior do indivíduo (ver Gibbs, 1991a, p.185).
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MARTINS, M. & Castro, F. (2007) Desenvolvimento moral e conduta anti‐social: que relações?
In, V. Trindade, N. Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora:
Universidade de Évora.
A moralidade interna resultaria, assim, de um processo de construção, por parte
do indivíduo, a partir das oportunidades de descentração (“role‐taking”) que lhe
vão sendo dadas ao longo da vida, na interacção, quer com a família, quer com o
grupo de pares. Kohlberg não nega a importância das práticas educativas parentais
no desenvolvimento moral da criança, tal como sugeridas por Hoffman, mas
considera que a interacção com os grupos de pares, nas diferentes idades,
desempenha um papel igualmente, senão mais importante, nesse desenvolvimento.
A motivação para a conduta moral surge, assim, à semelhança do que acontecia no
domínio cognitivo lógico, como uma necessidade de restaurar a igualdade e
reciprocidade face a situações de injustiça. Gibbs (1991a) recorda a este propósito
as expressões de Kohlberg e de Piaget, respectivamente, relativas ao mecanismo de
actuação da motivação para as condutas sociomoral e puramente cognitiva. O
primeiro autor afirmava que «violar a lógica e violar a justiça despertam os
afectos» (Kohlberg, 1984, p.63) e o segundo disse que «a lógica é a moralidade do
pensamento tal como a moralidade é a lógica da acção» (Piaget, 1932, p.398). A
motivação para agir é pois encontrada no desequilíbrio, momentaneamente
experimentado, ao nível das estruturas cognitivas ou sociocognitivas do indivíduo
e do impulso natural para a restruturação, em um nível superior de maior
integração e coordenação, de perspectivas, no caso do desenvolvimento
sociomoral (ver Kohlberg, 1984; Gibbs, 1995b).
Assim, enquanto para Kohlberg (1984) a orientação moral externa (um juízo
moral superficial) reflecte a imaturidade ou o atraso do desenvolvimento
sociomoral, para Hoffman (1984,1994) a orientação moral externa (uma
orientação para as sanções externas) reflecte uma história de práticas educativas
parentais predominantemente afirmativas de poder. A moralidade interna seria
autoconstruída para Kohlberg e auto‐adoptada para Hoffman (ver Gibbs, 1991a).
Gibbs (1991a, p.207) considera que é plausível que, quer os processos de
construção cognitiva, propostos por Kohlberg, quer os processos de interiorização
moral através da socialização, propostos por Hoffman, contribuam para a formação
de uma orientação moral interna. É curioso o papel que a cognição e o afecto
desempenham na motivação da conduta moral, nas duas teorias. Enquanto que na
teoria de Kohlberg (1984) a cognição é uma fonte de motivação primária e o afecto
é secundário, para Hoffman (1991) o afecto empático é a fonte de motivação
primária, sendo a cognição a secundária. Ambos os teóricos têm afirmações válidas
sobre a questão. A construção cognitiva da atribuição de significado moral a uma
situação vista como injusta, pode bem gerar a motivação moral, tal como o afecto
empático desencadeado por uma vítima em sofrimento o pode também fazer. Pode
ainda acontecer que as duas fontes de motivação entrem em conflito, isto é, a
justiça e a empatia podem impelir a comportamentos opostos em situações de
conflito de justiça distributiva em que, por exemplo, um indivíduo merece mais e
um outro indivíduo, embora menos merecedor, está em situação de maior
necessidade (ver Gibbs, 1991a, pp. 207‐208). Para obviar a este tipo de problema,
Frankena (citado por Gibbs,1 991a, p. 208) propôs mesmo que a «justiça deva ser
temperada pela beneficência quando uma decisão justa resulte num sofrimento
grave, tal como a beneficência deve ser temperada com a justiça quando o acto
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MARTINS, M. & Castro, F. (2007) Desenvolvimento moral e conduta anti‐social: que relações?
In, V. Trindade, N. Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora:
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beneficente resulte em grande desigualdade moral». Embora as duas fontes de
motivação possam estar em conflito, Gibbs (1991a, p.208) considera que «elas
estão intimamente ligadas e frequentemente são compatíveis, e embora a cognição
tenha um importante papel na motivação para corrigir injustiças, a empatia tem
um papel crítico na intensidade e persistência do esforço para assegurar o bem
estar da vítima/receptor de ajuda» e eventualmente pode ter um papel no
desencadear de emoções que poderão depois conduzir ao raciocínio por princípios.
Por tudo o que foi exposto, Gibbs sugere que a descentração cognitiva com a
aplicação dos princípios de justiça e o afecto empático são, provavelmente, ambas
fontes de motivação primária no desencadear da conduta moral. Do mesmo modo,
os conceitos de construção do significado moral e socialização moral, não seriam
incompatíveis mas dois aspectos que se interligam no desenvolvimento moral dos
indivíduos (ver Gibbs, 1991a, 1995b).
O referido autor considera ainda que os dois aspectos discutidos ‐ raciocínio
moral baseado em princípios de justiça e empatia ‐ são importantes não apenas na
compreensão da conduta pró‐social, mas também na compreensão da conduta
anti‐social. Mais ainda, é de opinião que esses dois aspectos devem ser ambos
levados em consideração quando se pensa na elaboração de programas de
educação moral ou reeducação social (ver Gibbs, 1987;1991b,1994, 1995a).
Gibbs (1991b, 1994, 1995b) salienta a importância de, quando se estuda a
relação entre juízo e conduta morais, considerar‐se o que o autor designa por
distorções cognitivas, pois estas parecem desempenhar um papel crucial no
aparecimento e manutenção da conduta anti‐social em adolescentes.
As distorções cognitivas «são atitudes ou crenças não verídicas que estão
enraizadas na pessoa e na sua conduta social. O viés egocêntrico constitui com
efeito uma distorção cognitiva natural na criança pequena (...) a persistência desta
distorção egocêntrica na adolescência coloca o indivíduo em alto risco no sentido
do comportamento anti‐social, dado o tamanho, força, independência, impulsos
sexuais e capacidades do ego dos adolescentes» (ver Gibbs, 1995b, pp.43‐44).
Assim, Gibbs (1991b, p.95) sugere que os adolescentes que manifestam o
distúrbio da conduta anti‐social (no sentido da DSM IV) apresentam um atraso no
seu desenvolvimento sociomoral, no sentido em que evidenciam um grau pouco
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MARTINS, M. & Castro, F. (2007) Desenvolvimento moral e conduta anti‐social: que relações?
In, V. Trindade, N. Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora:
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vulgar de viés egocêntrico, isto é, uma orientação moral centrada no eu e um juízo
moral imaturo (do tipo previsto pelos estádios 1 e 2 de Kohlberg e de Gibbs). Este
dado apresenta ainda alguma polémica, pois alguns autores não encontraram
diferenças significativas ao nível do raciocínio moral de delinquentes e não
delinquentes. Nomeadamente, Fonseca (1993) em um estudo com a escala de
Kurtines & Pimm que avalia as dimensões Piagetianas de heteronomia e
autonomia moral, não encontrou diferenças significativas entre jovens
delinquentes e não delinquentes, e entre crianças com distúrbios da conduta anti‐
social e crianças sem esse distúrbio. O esclarecimento desta questão torna‐se
pertinente quando pensamos nas implicações que tal facto pode ter no tratamento
de jovens delinquentes e na prevenção das condutas anti‐sociais.
Apesar de tudo, tal como avaliados pelas medidas de produção do
desenvolvimento moral (com a M.J.I. de Kohlberg & Colby, 1987; ou com o SRM‐SF
de Gibbs, Basinger & Fuller, 1992), encontram‐se percentagens significativamente
mais elevadas de delinquentes ou jovens com desordem da conduta anti‐social nos
estádios 1 e 2, por comparação aos estádios mais maduros e por comparação aos
restantes jovens. Porém, segundo Gibbs (1991b,1994), o atraso no
desenvolvimento sociomoral, só por si, pode não conduzir a conduta criminosa ou
anti‐social severa, a menos que certos processos defensivos desempenhem o seu
papel. Assim, associadas ao atraso de desenvolvimento sociomoral, aparecem certo
tipo de distorções cognitivas que reforçam a centração no eu e inibem os
mecanismos da empatia e da culpa de actuarem no sentido da inibição da conduta
anti‐social e da desactivação da conduta pró‐social. Nas palavras de Gibbs (1991b,
p. 98): «É preciso considerar que, teoricamente, todos os indivíduos, mesmo os que
evidenciam atraso no desenvolvimento sociomoral possuem: algum grau de
predisposição empática (uma vez que esta seria uma predisposição com raízes
biológicas e inata); e uma motivação para manter a autoconsciência ou evitar a
dissonância cognitiva entre o autoconceito e o comportamento. E particularmente,
quando o dano infligido aos outros é óbvio e difícil de ignorar, os jovens envolvidos
na conduta anti‐social podem sentir tensão psicológica proveniente da: a) culpa
incipiente, sentida a partir da empatia despertada pelas pistas salientes do mal‐
estar da vítima; e b) dissonância cognitiva entre a conduta que é
injustificadamente prejudicial aos outros e um autoconceito que prescreve que não
se deve prejudicar os outros sem justificação. É precisamente na defesa contra a
tensão provocada por estes inibidores potenciais da conduta anti‐social, que o
jovem anti‐social congela o seu atraso no desenvolvimento, através da elaboração
e recurso a certas distorções cognitivas que servem os interesses do eu egoísta»
De facto, o criminologista Stanton Samenow (citado por Gibbs, 1994, p.17)
verificou que «mesmo o mais severo e duro dos criminosos evidencia alguns
sentimentos de empatia genuínos pelos outros, embora superficiais e ocasionais».
Assim, apesar de ser provável que o desenvolvimento da empatia também tenha
algum atraso no seu próprio desenvolvimento (tal como conceptualizado por
Hoffman e para além do atraso decorrente da associação com o atraso moral),
Gibbs (1991b) sugere que o processo das distorções cognitivas actua como
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MARTINS, M. & Castro, F. (2007) Desenvolvimento moral e conduta anti‐social: que relações?
In, V. Trindade, N. Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora:
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mecanismo inibidor quer da empatia, quer da responsabilização pelos actos nos
jovens delinquentes.
Aliás, outros autores já tinham constatado algo de semelhante à ideia das
distorções cognitivas. Nomeadamente, Dodge & Frame (1982) constataram que as
crianças mais agressivas tendiam a atribuir exagerada e excessivamente intenções
hostis aos seus pares, mesmo em circunstâncias nas quais essa atribuição não era
lógica, nomeadamente em situações ambíguas. Crick e Dodge (1994) consideram
que as crianças agressivas reactivas cometem um erro atribucional de hostilidade,
relativamente às intenções dos pares, numa situação de interacção social não
ameaçadora.
No seu trabalho com jovens delinquentes, Gibbs (1991b, p. 95) encontrou
predominantemente duas categorias principais de distorções cognitivas
secundárias: a exteriorização e deslocação da culpa (“externalization of blame”) e a
etiquetagem ou categorização (“mislabing”), com minimização da humanidade do
outro.
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MARTINS, M. & Castro, F. (2007) Desenvolvimento moral e conduta anti‐social: que relações?
In, V. Trindade, N. Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora:
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desenvolvimento moral (embora fosse uma percentagem reduzida), sendo nestes
casos específicos que a actuação das distorções cognitivas era mais acentuada.
Barriga e Gibbs (1996) desenvolveram e validaram um questionário para medir
as distorções cognitivas centradas no eu. Trata‐se do questionário «Como eu
penso?» («How I think?» ‐ HIT), que engloba itens distribuídos por quatro grandes
tipos de distorções cognitivas: viés egocêntrico; exteriorização da culpa ou
culpabilização do outro; etiquetagem com minimização da humanidade do outro; e
atribuição de hostilidade ao outro. Os itens foram também redigidos com base nos
sintomas descritos na DSM – IV a respeito dos síndromas do distúrbio de conduta e
do distúrbio desafiante de oposição.
O questionário HIT foi aplicado a três grupos de adolescentes: um primeiro
grupo que cumpria pena num colégio de reeducação de menores; um segundo
grupo de jovens de uma escola pública que apresentava problemas disciplinares; e
um terceiro grupo de adolescentes de uma escola pública bem considerada na
comunidade. Os resultados obtidos com o HIT permitiram discriminar entre o
primeiro e o terceiro grupo. Contudo no que se refere ao segundo grupo este
apresentava níveis baixos de delinquência (similares aos do terceiro grupo) mas
apresentava níveis elevados de distorções cognitivas (similares aos do primeiro
grupo). De qualquer modo, a validade de constructo do instrumento foi razoável,
pois o HIT correlacionava com duas medidas de comportamento anti‐social
registado pelo próprio e foi parcialmente eficaz na discriminação dos grupos de
critério. Em suma, os resultados obtidos com o HIT foram globalmente
consistentes com o modelo teórico atrás descrito (ver Barriga & Gibbs, 1996).
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MARTINS, M. & Castro, F. (2007) Desenvolvimento moral e conduta anti‐social: que relações?
In, V. Trindade, N. Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora:
Universidade de Évora.
Gibbs (1991b,1994) considera que, uma vez que os jovens delinquentes têm um
atraso no desenvolvimento sociomoral (relativamente àquilo que era esperado
para a sua idade), ao qual se associam as distorções cognitivas já descritas,
qualquer programa de reeducação de jovens com desordem anti‐social deve levar
em consideração esses aspectos e tentar remediá‐los ou ultrapassá‐los de alguma
forma.
O facto dos jovens terem um atraso no desenvolvimento sociomoral implica que
precisam de vivenciar um meio sobre‐enriquecido com oportunidades de
descentração social (“role‐taking”), de modo a estimulá‐los a avançar para níveis
mais profundos e elaborados de raciocínio moral. Isto é, aos sujeitos devem ser
dadas oportunidades de considerar as perspectivas dos outros e de coordená‐las
com a sua própria perspectiva. Isso implica adaptar duas estratégias importadas
dos estudos de Kohlberg: uma micro‐intervenção ao nível da discussão de dilemas
hipotéticos e de vida real; e uma macro‐intervenção no sentido de reestruturar a
instituição de modo a permitir a participação, de todos os que nela vivem, nos
processos de elaboração e cumprimento de regras, isto é, uma abordagem de
comunidade justa (ver Gibbs, 1991b, p. 102‐103).
A respeito desses aspectos, Gibbs (1991b) cita as investigações de Arbuthnote e
Gordon, e de Niles (citado também por Sprinthall & Collins, 1994), que consistiram
em micro‐intervenções com jovens delinquentes e que conduziram a ganhos
sobretudo ao nível do raciocínio moral. Porém, os ganhos ou melhorias ao nível da
conduta eram mais controversos e, por vezes, inexistentes. Esse dado tem levado
Gibbs (1991b,1994) a enfatizar a importância de combater ou corrigir as
distorções cognitivas, no âmbito dos programas de reeducação de jovens
delinquentes.
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MARTINS, M. & Castro, F. (2007) Desenvolvimento moral e conduta anti‐social: que relações?
In, V. Trindade, N. Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora:
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realidade mais ajustadas. Isto significa, por exemplo, conduzir o jovem a atribuir
valor de força e maturidade ao acto de dar e receber ajuda, em vez de atribuir esse
valor às condutas agressivas, como é típico desses jovens (ver Gibbs, 1991b; Gibbs,
Potter & Goldstein, 1995).
Gibbs, Potter & Goldstein (1995) elaboraram um programa de intervenção que
inclui as ideias e técnicas já descritas, complementando‐as com abordagens e
técnicas que têm vindo a ser utilizadas na reeducação de jovens delinquentes, por
vários especialistas desse domínio. O programa foi designado: Programa EQUIPAR,
no sentido em que os autores pretendem motivar e equipar, ou apetrechar, os
jovens delinquentes a ajudar‐se uns aos outros e a si próprios e, também, a viver
em sociedade de forma social e emocionalmente ajustada.
No programa citado, Gibbs conjuga as suas técnicas de promoção do
desenvolvimento moral e correcção das distorções cognitivas (que equipam o
jovem, segundo expressão de Gibbs), com abordagens que utilizam o grupo de
pares enquanto grupo de ajuda mútua, nomeadamente através da promoção de
uma cultura positiva do grupo de pares (PPC) para motivar os jovens para a
mudança, transformando a influência negativa do grupo de pares numa influência
positiva. Esta última abordagem havia sido utilizada por Potter com resultados
limitados, na medida em que, embora motivados para mudar, nem sempre os
jovens estavam preparados (equipados, na expressão de Gibbs) com as estratégias
e competências sociais que lhes permitiam ajudar‐se uns aos outros eficazmente,
reduzindo‐se, por vezes, essas tentativas a ameaças, gritos e intimidação. A
conjugação das estratégias propostas por Gibbs (promoção do desenvolvimento
moral e correcção das distorções cognitivas) com a prática de Potter (utilizar o
grupo de pares enquanto grupo de ajuda mútua, para induzir uma mudança pela
positiva nos jovens) permitia, respectivamente, equipar os jovens no sentido de
serem capazes de se ajudar entre si, e motivá‐los para a mudança ao nível das
condutas. O programa EQUIPAR incluiu ainda o ensino de técnicas de
desenvolvimento e utilização de competências (“skills”) sociais para lidar com
situações interpessoais tensas e problemáticas, técnicas de gestão da raiva e
controlo pessoal (um contributo específico de Goldstein ‐ um dos autores que
participaram na elaboração do programa) (ver Gibbs, Potter & Goldstein, 1995).
O programa desenrolava‐se ao longo dos cinco dias da semana, em sessões que
oscilavam entre a uma hora e a uma hora e meia, com seis a nove jovens, e
orientadas por um adulto. Abordavam em alternância várias componentes
curriculares: educação moral, correcção de distorções cognitivas ou erros de
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MARTINS, M. & Castro, F. (2007) Desenvolvimento moral e conduta anti‐social: que relações?
In, V. Trindade, N. Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora:
Universidade de Évora.
pensamento, gestão da raiva, treino de competências (“skills”) sociais para lidar
eficazmente com situações interpessoais problemáticas. Incluíam também sessões
de ajuda mútua, baseando‐se no registo de problemas específicos e tentativa de
contribuir para a sua resolução em grupo de auto‐ajuda (ver Gibbs, Potter &
Goldstein, 1995).
O programa inclui dois instrumentos de avaliação principais (para além de
várias “check lists” utilizadas no seu decorrer), a saber:
‐ O Inventory of Adolescent Problems ‐ Short‐form (IAP‐SF) que foi construído
para avaliar as competências sociais dos adolescentes face a situações
interpessoais problemáticas ou tensas.
Gibbs, Basinger & Fuller (1992) constataram um facto curioso ‐ era possível
diferenciar delinquentes de não delinquentes, ao nível do raciocínio moral, com
testes de produção, mas não com testes de reconhecimento. Este dado parece
sugerir que os sujeitos seriam capazes de reconhecer juízos morais mais maduros
do que aqueles que eram capazes de emitir espontaneamente, ou seja, do que eram
capazes de produzir por si próprios sem o recurso à leitura de alternativas. É
preciso salientar a este respeito que nos testes de reconhecimento os sujeitos são
confrontados com a leitura de alternativas representativas de todos os estádios, o
que os poderia levar a escolher estádios ligeiramente acima daquele em que
funcionam. Esta interpretação do facto parece, aliás, compatível com a ideia
Kohlbergiana de que a maioria dos sujeitos é capaz de compreender o estádio
imediatamente acima daquele em que se encontra, e fundamenta a ideia de que a
mera exposição a argumentos de um estádio acima daquele em que os sujeitos
funcionam, pode conduzir a níveis mais avançados de raciocínio moral (ver Blatt &
Kohlberg, 1977).
Deste modo, pode dizer‐se que Gibbs, situando‐se ainda no quadro
Kohlbergiano sobre o desenvolvimento da moralidade, ao integrar vários modelos
teóricos na explicação do desenvolvimento moral, deu um contributo válido para a
compreensão e resolução de questões sociais práticas, como sejam a reeducação de
delinquentes, permitindo antever formas de prevenção da conduta anti‐social nos
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MARTINS, M. & Castro, F. (2007) Desenvolvimento moral e conduta anti‐social: que relações?
In, V. Trindade, N. Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora:
Universidade de Évora.
jovens, em contexto escolar, no âmbito das abordagens do desenvolvimento
sociocognitivo combinadas com elementos das teorias psicanalíticas.
Diaz‐Aguado, M., Royo; P., Segura, & M., Andrés, M. (1996) desenvolveram
programas de prevenção da violência escolar com adolescentes que levavam em
consideração as componentes cognitiva (raciocínios, crenças e estereótipos
associados à eficácia das condutas agressivas como forma de resolver conflitos);
afectiva (atitudes e identificação com modelos adultos que valorizam a violência) e
comportamental (falta de competência social para resolver conflitos de forma não
violenta e experiência da violência) que pareceram revelar eficácia na prevenção
das condutas agressivas e também apontam no sentido de uma maior eficácia dos
programas que integram os contributos de diferentes modelos teóricos.
CONCLUSÕES
Gibbs sugeriu que para compreender as relações entre a moralidade e a conduta
anti‐social era necessário integrar os contributos das teorias sociocognitivas com
os contributos teóricos das correntes psicanalíticas e compreender o papel que
determinadas distorções cognitivas ou racionalizações desempenham no
desencadear das condutas agressivas. Sistematizou quatro grandes tipos de
distorções cognitivas como estando associadas à conduta anti‐social, a saber: viés
egocêntrico ou centração nas necessidades e desejos do eu de um modo que os
direitos e necessidades dos outros são ignorados ou mesmo desrespeitados;
exteriorização da culpa e culpabilização dos outros pela sua má sorte, condição de
vítima; etiquetagem e minimização da humanidade do outro desvalorizando o
dano causado, valorizando os actos agressivos e/ ou negando a humanidade do
outro; atribuição de hostilidade às intenções do outro, pressupondo o pior nas
situações sociais e nas intenções dos outros e assumindo a impossibilidade de
mudar o comportamento. Contribuiu também para esclarecer como estes
mecanismos interferiam com a inibição da empatia, bem como da
responsabilização pelos próprios actos e eventualmente do raciocínio sobre
princípios de justiça (ver Barriga & Gibbs, 1996, pp. 333‐334).
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MARTINS, M. & Castro, F. (2007) Desenvolvimento moral e conduta anti‐social: que relações?
In, V. Trindade, N. Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora:
Universidade de Évora.
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