- Sou um menino que vê o amor pelo buraco da fechadura. Nunca fui outra coisa. Nasci menino, hei de morrer menino. E o buraco da fechadura é, realmente, a minha ótica de ficcionista. Sou (e sempre fui) um anjo pornográfico. - A perfeita solidão há de ter pelo menos a presença numerosa de um amigo real. - Amar é ser fiel a quem nos trai. - Toda autocrítica tem a imodéstia de um necrológio redigido pelo próprio defunto. - Só acredito na bondade que ri. Todo santo devia ser jucundo como um abade da Brahma. - O brasileiro é um feriado. - Os jardins de Burle Marx não têm flores. Têm gramados e não flores. Mas para que grama, se não somos cabras? - A burrice é a pior forma de loucura. - No Brasil quem não é canalha na véspera é canalha no dia seguinte. O Otto Lara está certo. O mineiro só é solidário no câncer. - O carioca é o único sujeito capaz de berrar confidências secretíssimas de uma calçada para outra calçada. - Num casal, pior que o ódio, é a falta de amor. - O amor entre marido e mulher é uma grossa bandalheira. - Geralmente, o puxa-saco dá um marido e tanto. - O carioca é um extrovertido ululante. - As bodas de prata são, via de regra, uma festa cínica que finge comemorar um amor enterrado. - O pior cego é o surdo. Tirem o som de uma paisagem e não haverá mais paisagem. - Os que choram pouco, ou não choram nunca, acabarão apodrecendo em vida. - Gosto do cigarro que me queime a garganta. O fumo suave não passa de um ópio de gafieira. - Toda coerência é, no mínimo, suspeita. - Desconfie da esposa amável, da esposa cordial, gentil. A virtude é triste, azeda e neurastênica. - Sexta-feira é o dia em que a virtude prevarica. - Numa simples ginga de Didi, há toda uma nostalgia de gafieiras eternas. - Há homens que, por dinheiro, são capazes até de uma boa ação. - Djalma Santos põe, no seu arremesso lateral, toda a paixão de um Cristo negro. - A educação sexual só devia ser dada por um veterinário. - Eu, como artista, se tivesse de escolher um epitáfio, optaria pelo seguinte: — "Aqui jaz Nelson Rodrigues, assassinado pelos imbecis de ambos os sexos". - Qualquer um de nós já amou errado, já odiou errado. - Não há ninguém mais bobo do que um esquerdista sincero. Ele não sabe nada. Apenas aceita o que meia dúzia de imbecis lhe dão para dizer. - Toda família tem um momento em que começa a apodrecer. Pode ser a família mais decente, mais digna do mundo. Lá um dia aparece um tio pederasta, uma irmã lésbica, um pai ladrão, um cunhado louco. Tudo ao mesmo tempo. - A família é o inferno de todos nós. - A fidelidade devia ser facultativa. - O gordo só é cruel na mesa, diante do prato, com o guardanapo a pender-lhe do pescoço. - D. Helder só olha o céu para saber se leva ou não o guarda-chuva. - Na mulher, certas idades constituem, digamos assim, um afrodisíaco eficacíssimo. Por exemplo:— quatorze anos! - O jovem só pode ser levado a sério quando fica velho. - Hoje, a primeira noite é a centésima, a qüinquagésima. O casamento já é uma rotina antes de começar. - O ser humano está mais para Lucho Gatica do que para Paul Valéry. - O que se está fazendo aqui é uma música popular brasileira que não é popular, nem brasileira e vou além: — nem música. - Aqui o branco não gosta do preto; e o preto também não gosta do preto. - Amigos, eis uma verdade eterna: — o passado sempre tem razão. - Não se apresse em perdoar. A misericórdia também corrompe. - O pobre, para sobreviver, precisa da pornografia. - O presidente que deixa o poder passa a ser, automaticamente, um chato. - O ônibus apinhado é o túmulo do pudor. - É impossível ser ridículo dentro de uma Mercedes. - Num casamento, o importante não é a esposa, é a sogra. Uma esposa limita-se a repetir as qualidades e os defeitos da própria mãe. - A pior forma de solidão é a companhia de um paulista. - No Maracanã, vaia-se até minuto de silêncio e, se quiserem acreditar, vaia-se até mulher nua. - Uma dor de viúva dura 48 horas. - Todo óbvio é ululante. - Toda mulher gosta de apanhar. O homem é que não gosta de bater.
Frases selecionadas e organizadas por Ruy Castro, extraídas do livro "Flor de Obsessão", Cia. das Letras - São Paulo, 1997, págs. diversas