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A AUTO-ESTIMA DO SEU FILHO

Dorothy Corkille Briggs

Material destinado às pessoas com deficiência visual, não podendo ser utilizado com fins
comerciais.

Tradução
Waltensir Dutra
Revisão da tradução
Silvia Giurlani

Martins Fontes
São Paulo 2002

CONTRACAPA “Uma semana depois de minha esposa e eu decidirmos começar uma


família, entramos numa livraria e compramos dois livros sobre como educar filhos. Por
uma série de razões os dois filhos só nasceram seis anos depois e acabamos lendo não dois,
mas 36 livros. Se dependesse de teoria, estávamos preparados. Hoje eles estão crescidos e
um amigo me perguntou que livros nós havíamos utilizado mais. Foi uma boa pergunta a
que demorei a responder. Usamos um livro só, um que educava mais os pais do que os
filhos. Intitula-se A Auto-estima do seu Filho, de Dorothy Briggs, e o título já diz tudo.”
Stephen Kanitz (Veja, 24.04.2000)

A tradução desta obra for publicado originalmente em português com o título “Criança - O
desenvolvimento da auto-confiança”
Título do original: YOUR CHILD SELF-ESTEEM.
Publicado por Doubleday & Company, Inc., Nova York.
Copyright © Dorothy Corkille Briggs, 1970

Copyright © 1986, Livraria Martins Fontes Editora Ltda.,


São Paulo, para a presente edição.

1ª edição abril de 1986

publicada com o título "Criança feliz - O desenvolvimento da auto-confiança"

3ª edição agosto de 2002

Tradução
WALTENSIR DUTRA
Revisão da tradução
Silvia Giurlani
Revisão gráfica
Renato da Rocha Carlos
Rita de Cassia Sorrocha Pereira
Produção gráfica
Geraldo Alves
Paginação/Fotolitos
Studio 3 Desenvolvimento Editorial

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Briggs, Dorothy Corkille
A auto-estima do seu filho / Dorothy Corkille Briggs : tradução Waltensir Dutra ; revisão
da tradução Silvia Giurlani. -3ª ed. - São Paulo Martins Fontes. 2002.
Título original: Your child self-esteem.
Bibliografia.
ISBN 85-336-1608-2

1. Auto-estima em crianças 2. Crianças - Criação 3. Crianças - Desenvolvimento -


Psicologia infantil 4. Psicologia infantil. I. Título.
02-3955 CDD- 155.4

Índices para catálogo sistemático:

1. Auto-estima em crianças ; Psicologia infantil 155.4

Todos os direitos desta edição para a língua portuguesa reservados à


Livraria Martins Fontes Editora Ltda.
Rua Conselheiro Ramalho, 330/340 01325-000 São Paulo SP Brasil
Tel. (11)3241.3677 Fax (11) 3105.6867

e-mail: info@martimfontes.com.br http://www.martinsfontes.com.br

ÍNDICE

Meus agradecimentos XI
A omissão de nossa cultura XIII

1. A base da saúde emocional 3

Primeira parte | O FENÔMENO DOS ESPELHOS

2. Os espelhos criam auto-imagens 11

3. A influência dos espelhos no comportamento 25

4. O preço dos espelhos deformados 31

5. A armadilha dos reflexos negativos 43

6. Polimento dos espelhos dos pais 51

Segunda parte | O CLIMA DO AMOR


7. O encontro autêntico 69

8. A segurança da confiança 83

9. A segurança do não-julgamento 95

10. A segurança de ser amado 103

11. A segurança de possuir sentimentos 111

12. A segurança da empatia 119

13. A segurança do crescimento individual 129

Terceira parte | SENTIMENTOS NEGATIVOS E AUTO-ESTIMA

14. Como tratar os sentimentos da criança 137

15. Como decifrar o código da raiva 161

16. Como desmascarar o ciúme 173

Quarta parte | CRESCIMENTO MENTAL. E AUTO-ESTIMA17. Motivação, inteligência


e criatividade 189

Quinta parte | SEXO E AUTO-ESTIMA

18. O casamento do sexo com o amor 213

19. Conclusão 237

Relação das idéias básicas 241

*
Dedicado à memória de meu pai, Coronel John D. Corkille, e minha mãe, Helen Young
Corkille, pelo muito que contribuíram para a minha pessoa.

*
O homem deseja ser confirmado em seu ser pelo homem, e anseia por ter uma presença no
ser do outro... - secreta e timidamente, ele espera por um Sim que lhe permita ser, e que só
pode vir de uma pessoa humana a outra.
Martin Buber

MEUS AGRADECIMENTOS
Se a leitura deste livro lhe for de alguma utilidade, isso não se deve apenas a mim, mas à
interação com todas as pessoas e experiências que marcaram a minha vida.
Sou particularmente grata a:
* Edward Bordin, Duane Bowen, Max Levin e Lois Southard, pelo ensinamento que me
serviu de inspiração;
* Thomas Gordon, cujas importantes lições esclareceram minhas opiniões referentes a que
a raiva era secundária, à distinção vital entre as mensagens do "Eu" e de "Você", à
manipulação do poder e à mecânica da democracia doméstica;
* Frank Baron, S. I. Hayakawa, Abraham Maslow e Carl Rogers, por seminários e
conceitos que me intrigaram;
* Tom Johnston e Sam Warren, por uma década de apoio enquanto eu trabalhava com
grupos de pais;
* numerosas crianças e adultos, por me terem permitido compartilhar seus mundos
particulares, o que contribuiu para melhorar o enfoque dos conceitos examinados neste
livro. Esta participação permitiu-me escrever a partir de uma experiência pessoal profunda,
e não apenas da teoria;
* Myrtle Spencer, pela segurança e inspiração, e por ter agido como "mãe" quando este
livro estava ainda nas suas fases embrionárias;
* Charles Himber, pelo apoio muito especial num momento crucial deste projeto;

XII * Tom Larson, Mary e Norman Lewis, Nancy Lichina, Judy Miller, Betty Riley, Sylvia
W. Rosen, Jean Schrimmer, Barbara Spaulding e Elsa van Vergen, da Doubleday, pelas
suas reações pessoais, assistência editorial e apoio moral a este projeto;
* Mary Baker, Karen Brown, Dorothy McAuliffe e Mary Starley, pela sua habilidade na
datilografia;
* Laurie e Kerrie Sue, por me ensinarem tanto sobre a natureza humana e por terem, em
numerosas ocasiões, assumido certos encargos liberando-me para escrever.
A todos, os meus sinceros agradecimentos.
DOROTHY CORKILLE BRIGGS
Palos Verdes Península
Califórnia.

A OMISSÃO DA NOSSA CULTURA


Durante décadas os psicólogos voltaram sua atenção para a doença mental e seu tratamento.
Mas desordens psicológicas estão de tal modo difundidas, que simplesmente não há
profissionais em número suficiente para tratar os doentes. Um estudo sobre 175.000
pessoas na cidade de Nova York mostrou que apenas 18,5% não tinham os sintomas de
enfermidade mental. O número de pessoas que se sentem interiormente confusas e cujo
potencial se atola em defesas doentias atinge proporções epidêmicas. Os problemas
neuróticos tornaram-se um modo de vida.
Isto constitui uma denúncia desconcertante de uma lamentável omissão de nossa cultura:
nós, pais, não somos preparados para a nossa tarefa. Quantias enormes são gastas no ensino
acadêmico e profissional, mas a arte de se tornar um pai atuante é deixada ao acaso e a
algumas aulas dispersas. E ainda assim, paradoxalmente, consideramos as crianças como o
nosso recurso nacional mais importante!
Recorremos à vontade a médicos e educadores para controlar o progresso físico e
intelectual de nossos filhos. Mas, para orientar sua saúde emocional, quase só podemos
recorrer a nós mesmos. Mesmo quando surgem sintomas, muitos pais consideram a
consulta a um psicólogo como uma admissão de derrota. É o último recurso de que lançarão
mão.
A discrepância entre o valor que atribuímos às crianças, de um lado, e nossa incapacidade
de proporcionar aos pais um treinamento

específico para a sua tarefa, de outro, parece basear-se na suposição de que um ser humano
deve saber criar outro ser humano. Mas o fato de alguém tornar-se pai ou mãe não lhe
confere automaticamente o conhecimento e a capacidade de criar filhos confiantes, seguros
e capazes de viver como pessoas em perfeito funcionamento, e que possam ter uma vida
significativa. Em suma, não foi dada a devida ênfase à prevenção da doença mental. Não
obstante, essa prevenção continua sendo a nossa melhor esperança de conseguir reduzir a
alta incidência de desordens emocionais.
A maioria das pessoas faz o melhor possível, mas muitas vezes fica desorientada. E a
realidade continua sendo que, tal como nossos filhos, temos que viver com os resultados de
nossos erros involuntários. E esses erros são geralmente transmitidos às gerações futuras. O
impacto da omissão de nossa cultura recai, até certo ponto, sobre todos nós.
Nessa busca de orientação, nós, os pais, voltamo-nos para os inúmeros livros existentes
sobre a educação de filhos. Mas neles encontramos as questões importantes que temos de
enfrentar tratadas em geral, como tópicos isolados, à parte. Não encontramos um quadro de
referência básico, coerente – a auto-estima da criança –, dentro do qual possamos situar
cada aspecto importante da nossa convivência com os filhos.
Este livro pretende dar exatamente esse quadro de referência. Apresentamos uma nova
maneira de ver o desenvolvimento da criança: considerar todo o crescimento e
comportamento em função da busca, pela própria criança, da identidade e do auto-respeito.
Passo a passo, mostraremos especificamente como criar um sólido senso do próprio valor
na criança. Com isso ela estará preparada para a felicidade pessoal em todas as áreas de sua
vida. Se não compreendermos perfeitamente a natureza da personalidade humana, e não
trabalharmos com ela, andaremos às cegas e teremos, talvez, que pagar o preço dessa falha.
Este livro foi escrito devido à minha firme convicção, resultado de vinte e cinco anos de
trabalho em psicologia e educação, bem

XV como da minha experiência de mãe, de que a parentalidade é importante demais para


ser abordada à base do acaso e da intuição. O conhecimento dos fatos pode ajudar-nos a
desempenhar nossas responsabilidades para com os que estão sob os nossos cuidados,
dando-nos segurança como pais, e mostrando-nos o caminho para o nosso desenvolvimento
pessoal.
Durante anos, os pais que freqüentaram minhas aulas apresentaram mudanças comoventes,
em si mesmos e em seus filhos, quando começaram a aplicar algumas idéias deste livro.
Sobre as suas experiências, fizeram afirmações como as seguintes:

Essa maneira de ver o crescimento das crianças proporcionou-me uma nova confiança.
Acho que sou uma pessoa mais livre, sem temer a responsabilidade de ser pai.

Toda a nossa família tornou-se mais unida, e os conflitos diminuíram muito. Com a
mudança de minhas atitudes, muita coisa tornou-se mais fácil em nossa casa.

Estou mais relaxada e paciente – até meu marido notou isso.


Aprendi a me ver, e a ver meus filhos, sob uma nova luz; sinto-me muito mais
compreensiva. E, indiretamente, isso me aproximou mais de meu marido.

Aprendi a viver com os meus filhos, e não mais apesar deles.

Como pai, parecia-me absurdo ter aulas sobre a maneira de educar filhos. Não havia
percebido como estava sendo cego. Abriu-se para mim um mundo totalmente novo. Quisera
apenas ter sabido disso antes de ter filhos.

É muito evidente. Sabendo o que estamos fazendo e tendo como guia um quadro de
referência básico, podemos viver com nossos

XVI filhos de maneira que os tornemos emocionalmente sadios. Assim, não precisamos nos
preocupar: eles terão os pés em terra firme.
O fato de você estar lendo este livro indica que você se preocupa com seus filhos e com o
seu relacionamento com eles. Isso mostra o seu desejo de que eles sejam pessoas que
funcionem perfeitamente. Tal preocupação, associada ao interesse por idéias novas, leva
tanto você como os seus filhos na direção do crescimento positivo.

A AUTO-ESTIMA DO SEU FILHO

1 A BASE DA SAÚDE EMOCIONAL

Sonhos e realidades
Você tinha, sem dúvida, muitas idéias sobre como iria tratar seus filhos, muito antes de tê-
los. E por trás dessas idéias estava a dedicação: você estava disposto a realizar um bom
trabalho. A maioria de nós, os pais, leva a parentalidade a sério; num sentido muito real,
empenhamo-nos totalmente. Mas a realidade interfere em nossos planos. O que nos parecia
tão simples torna-se muito mais complexo.
Ainda que nos venham como um pequeno fardo, as crianças nos despertam grandes
emoções. Alegria, certeza e prazer misturam-se com preocupação, culpa e dúvida. Advém
uma boa dose de cansaço e frustração. Temos que agüentar preguiça, desordem e torrentes
de "nãos", e no dia seguinte tagarelice, beliscões e brigas para atender o telefone.
Problemas diferentes – eles mudam, mas não acabam nunca. Não há como voltar atrás.
Apesar de tudo, lutamos para fazer as coisas da melhor maneira possível. Investimos sem
cessar, e muito, em cuidado, tempo, energia, dinheiro. Não poupamos esforços –
alimentação e vestuário adequados, brinquedos atraentes, assistência médica necessária,
movimentação constante para proporcionar todas as vantagens. Talvez até economizemos
para a universidade e um seguro extra.
Mas, apesar de nossas boas intenções e de nossos esforços sinceros, nosso filho pode não
corresponder exatamente aos resultados

esperados. Suas notas não são boas, ele é emocionalmente imaturo, rebelde ou
excessivamente fechado. Talvez tenha como companheiros jovens não muito
recomendáveis. "Como pode o meu filho ter problemas, quando fiz tanto e me esforcei
tanto?" é uma pergunta que persegue muitos pais bem-intencionados.
Mesmo que nossos filhos não tenham problemas, o fato de ouvirmos falar do aumento dos
índices de delinqüência juvenil, uso de drogas, abandono da escola, doenças venéreas e
filhos ilegítimos aumenta nossas preocupações. Às vezes uma preocupação insistente surge
em nossas consciências para nos fazer pensar num modo de manter nossos filhos afastados
desses caminhos tortuosos. Em certos momentos a incerteza se faz sentir: "Estarei agindo
da maneira certa?" "Devo bater, discutir ou ignorar?" "O que devo fazer agora?" As
grandes idéias que tínhamos – aquelas convicções firmes – tornam-se imprecisas e
desaparecem.
A realidade pode levar-nos a perder a confiança em nós mesmos como pais. Mas mesmo
assim continuamos a sonhar com o que nosso filho pode se tornar. Como transformar esse
sonho em realidade?

O ingrediente crucial
Se você for como a maioria dos pais, suas esperanças baseiam-se em algo mais do que
evitar os colapsos nervosos, o alcoolismo e a delinqüência. Queremos coisas positivas para
nossos filhos: confiança interior, um objetivo e senso de participação, relações
significativas e construtivas com os outros, êxito na escola e no trabalho. E, acima de tudo,
felicidade. O que desejamos é claro. Nossas inseguranças recaem em como ajudar nossos
filhos a alcançar tais objetivos. Nós, os pais, estamos ansiosos por uma regra básica,
prática, que nos guie – particularmente nos momentos de tensão e confusão.

Dispomos, hoje, de indicações suficientes para formular exatamente essa regra: se a criança
tiver uma auto-estima elevada, ela terá sucesso. A pesquisa tem mostrado, de maneira cada
vez mais evidente, que a criança (ou adulto) que reage bem é diferente das pessoas que
fracassam na vida.

A diferença está nas suas atitudes para consigo mesma, seu grau de auto-estima.

O que é a auto-estima? É a maneira pela qual uma pessoa se sente em relação a si mesma. É
o juízo geral que faz de si mesma – quanto gosta de sua própria pessoa.
A auto-estima não é uma pretensão ostensiva. É um sentimento calmo de auto-respeito, um
sentimento do próprio valor. Quando a sentimos interiormente ficamos satisfeitos em
sermos nós mesmos. A pretensão é apenas uma manifestação falsa para encobrir uma auto-
estima precária. Quando se tem uma boa auto-estima, não se perde tempo e energia
procurando impressionar os outros; já se conhece o próprio valor.
A idéia que seu filho faz de si mesmo influencia a escolha dos amigos, a maneira pela qual
se entende com os outros, o tipo de pessoa com quem se casa e a produtividade que terá.
Afeta a sua criatividade, integridade, estabilidade e até mesmo a possibilidade de ser um
líder, ou um seguidor. Seus sentimentos do seu próprio valor formam a essência de sua
personalidade e determinam o uso que fará de suas aptidões e habilidades. Sua atitude para
consigo mesmo tem influência direta sobre a maneira pela qual vive todos os aspectos de
sua vida. Na verdade, a auto-estima é a mola que impulsiona a criança para o êxito ou
fracasso como ser humano.
A importância da auto-estima na vida de nossos filhos dificilmente poderá ser exagerada.
Todo o pai que se preocupa deve ajudar seu filho a criar uma fé firme e sincera em si
mesmo.

Duas necessidades básicas


O auto-respeito sólido baseia-se em duas convicções principais:

"Eu posso ser amado”


("Eu sou importante e tenho valor porque existo.")
e "Eu tenho valor”
("Posso dirigir a mim mesmo, e a meu ambiente, com competência. Sei que tenho alguma
coisa a oferecer aos outros.")

Toda criança, embora completamente diferente das demais, tem as mesmas necessidades
psicológicas de se sentir amada e digna. Tais necessidades não desaparecem com a
infância. Todos nós as temos, e elas nos acompanham até a nossa morte. A satisfação
dessas necessidades é tão importante para o nosso bem-estar emocional quanto o oxigênio o
é para a nossa sobrevivência física. Afinal de contas, temos que conviver conosco durante
toda a nossa vida. A única pessoa que não podemos evitar, por mais que nos esforcemos,
somos nós mesmos. O mesmo acontece com os nossos filhos. Eles convivem consigo
mesmos da maneira mais íntima, e o auto-respeito é da maior importância para o seu
crescimento, bem como para uma vida significativa e compensadora.
A esta altura você poderá dizer: "Mas isso não me diz respeito, porque amo meu filho e
acho que ele tem valor." Um momento, porém. Veja que a receita não diz: "Se você ama
seu filho." Diz: "Se a criança se sente amada." E há uma grande diferença entre ser amada e
sentir-se amada.
Por estranho que pareça, muitos pais têm certeza de que amam os filhos, mas, de algum
modo, as crianças não percebem tal afeição. Esses pais não foram capazes de comunicar o
seu amor. Os sete ingredientes básicos que permitem à criança sentir-se amada serão
examinados detalhadamente na Segunda Parte. A esta altura, o mais importante é
compreender que:

É o sentimento da criança sobre ser ou não ser amada que afeta a maneira pela qual ela irá
se desenvolver.

Acontece com o sentimento de ser digno o mesmo que com o amor. Devemos saber como é
recebida, pela criança, a mensagem de que ela é competente e tem alguma coisa a oferecer.
Assim, também esse sentimento poderá se tornar parte integral da sua auto-imagem.
Se o ingrediente mais importante da saúde mental é uma auto-estima elevada, de onde ela
vem? Um estudo de Stanley Coopersmith (1), entre outros, demonstrou que essa
característica não tem relação com a riqueza da família, a educação, o lugar onde a criança
mora, a classe social, a ocupação do pai, ou com o fato de a mãe estar sempre em casa. Ela
vem da qualidade das relações entre a criança e os que desempenham papel significativo
em sua vida.
(1) Stanley Coppersmith, The Antecedents of Self-Esteem. San Francisco, W. H. Freeman
& Co., 1967.
Toda criança normal nasce com o potencial de saúde psicológica. O desenvolvimento desse
potencial irá depender do clima psicológico em que ela vive. Para saber se o clima
psicológico que cerca nosso filho é estimulante ou sufocante, devemos compreender:

1. como é desenvolvida a auto-estima;

2. como a visão que a criança tem de si mesma afeta o seu comportamento;

3. o preço pago pela criança quando a sua auto-estima é baixa, e

4. o que é possível fazer para estimular a auto-estima.


Essas questões constituem a base da Primeira Parte – O Fenômeno dos Espelhos.
Uma vez compreendido o processo pelo qual a auto-estima surge, precisamos conhecer os
ingredientes específicos que

permitem à criança concluir: "Eu posso ser amada." Esse material será estudado na
Segunda Parte – O Clima do Amor.
Em seguida, para compreender como a criança desenvolve um senso de domínio e
competência – os sentimentos que alimentam a convicção de que ela tem valor –
precisamos familiarizar-nos com as tarefas da individualidade, essas etapas intermediárias
específicas do crescimento que afetam a auto-estima. Quando trabalhamos com uma
criança, em sua escolha psicológica, contribuímos para que ela sinta o seu valor.
Nas seções restantes, examinaremos:

1. a influência que os sentimentos têm sobre a auto-estima e as maneiras positivas de tratá-


los;

2. a influência das diferentes abordagens da disciplina sobre a auto-estima, bem como os


métodos construtivos de disciplina;

3. o impacto da auto-estima sobre a inteligência e a criatividade, juntamente com as


maneiras de estimular o desenvolvimento mental e, finalmente,

4. a influência da educação sexual na auto-estima.


A compreensão das coisas que atingem nosso filho nos proporciona um instrumento para
verificar o clima que lhe oferecemos. Isso pode detectar áreas que precisam ser mudadas e,
o que é mais importante, contribui muito para nos poupar, e aos nossos filhos, dos
resultados de uma atitude paterna baseada na tentativa e erro, na experimentação.
A maioria das pesquisas recentes mostra que as nossas boas intenções como pais terão
maiores possibilidades de se concretizarem se a convivência com nossos filhos lhes
proporcionar satisfação por serem quem são. Não podemos desconhecer, ou ignorar, a
característica mais importante da criança – seu grau de auto-respeito.
Ajudar as crianças a desenvolver sua auto-estima é a chave de uma parentalidade bem-
sucedida.

Primeira parte
O FENÔMENO DOS ESPELHOS

2 OS ESPELHOS CRIAM AUTO-IMAGENS

Conclusões dos espelhos


Você já pensou em si mesmo como um espelho? Você é um espelho – um espelho
psicológico que seu filho usa pra construir sua própria identidade. E toda a vida dele é
afetada pelas conclusões a que chega.
Toda criança nasce sem um senso do eu. Todas elas têm de aprender a ser humanas, no
sentido em que nós usamos esta palavra. Encontrou-se, ocasionalmente, uma criança que
conseguiu sobreviver em total isolamento de outras pessoas. Sem linguagem, sem
consciência, sem necessidade dos outros, sem senso de identidade, a "criança-lobo" só é
humana na aparência. Tais casos nos mostram que o senso da individualidade, ou
personalidade, não é instintivo. É uma realização social, aprendida na convivência com os
outros.

Autodescoberta
Tomemos um bebê típico e vejamos como ele constrói a imagem de si mesmo.
Todo vermelho e enrugado, nasce o pequeno Pedro. Seus pais, orgulhosos, expedem
comunicados proclamando a chegada de um novo indivíduo, de um ser à parte – seu filho.
Ninguém diz a Pedro que ele chegou. E a essa altura ele não entenderia a mensagem.

12

Tendo sido uno com a mãe e com o seu ambiente durante nove meses, ele não sabe onde
acaba e onde começa o resto do mundo. Não sabe que é uma pessoa.
Inúmeras sensações novas – tato, ser tocado, fome, dores, sons, objetos imprecisos –
despertam a sua curiosidade. Por mais primitivo que seja seu equipamento, ele começa a
explorar, tateando, o seu estranho mundo novo. Quando ele toca o pé, sente alguma coisa
ali e em seus dedos. Quando toca seu ursinho, a sensação está apenas nos dedos. Com o
passar dos dias, compreende que o pé é parte dele mesmo e que o ursinho não o é.
Ao mesmo tempo, verifica que as pessoas são diferentes das coisas. Elas se movimentam,
fazem barulhos e o ajudam a sentir-se mais confortável. Um certo dia ele observa a
diferença entre colocar um biscoito na boca de sua mãe e colocá-lo na sua própria boca.
Começa a perceber que ele e a mãe são diferentes, mas, nessa fase, ainda se considera uma
extensão dela, talvez um pouco como a cauda de um cão.
Pedro aprende a falar à medida que seu cérebro amadurece. A linguagem é o instrumento
que lhe permite sentir-se plenamente separado, o que é essencial para sua autoconsciência.
Vamos ver como isso acontece.
Pedro descobre, através da imitação, que certos sons representam determinados objetos. E
verifica logo que os objetos podem ser rotulados qualitativamente. Aprende: "Fogo
quente", "Neném dodói" ou "Papá bom".
Finalmente ele aprende o seu próprio nome. Agora ele tem um símbolo que lhe permite
pensar em si mesmo, separado dos demais. Isso representa um enorme passo à frente.
Permite-lhe atribuir qualidades a si próprio, tal como havia feito anteriormente com coisas.
Pode dizer "Pedro quente", "Pedro dodói" ou "Pedro bom". Agora, pode falar sobre ele
mesmo, descrever-se e julgar-se. Pode pensar em si em comparação com os outros: "Eu
maior que Bobby", e em termos de tempo: "Pedro já vai embora.”

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Entre os quinze e os dezoito meses, Pedro tem uma idéia da separação, mas é imprecisa. A
consciência plena só ocorrerá aos dois anos ou aos dois anos e meio. Antes disso, porém,
seu nome lhe dá um ponto de referência com o qual relaciona vários rótulos descritivos.
Primeiro pelos seus sentidos e, em seguida, pela linguagem, toda criança constrói uma
imagem de si mesma.

Mensagens sem palavras


Muito antes de compreender as palavras, Pedro registra impressões generalizadas sobre si
mesmo (e o mundo) com base na maneira como é tratado. Ele sente se é posto no colo com
carinho, ou sacudido como um saco de batatas; ele sabe se os braços que o envolvem são
aconchegantes, ou se apenas são um apoio vago e desinteressado. Sabe quando sua fome é
respeitada e quando é ignorada. O toque, os movimentos corporais, as tensões musculares,
o tônus e a expressão facial dos que o cercam transmitem a Pedro um fluxo constante de
mensagens. E seu radar é espantosamente preciso. (Todos os bebês são sensíveis, mas em
diferentes graus; alguns são mais sensíveis do que outros.)
As crianças pequenas são particularmente sensíveis aos estados emocionais da mãe.
Quando a mãe de Pedro está apressada ou tensa, ele é exigente e pouco cooperador na hora
de mudar a fralda ou de comer. Quando ela está tranqüila e tem tempo de aturar seus
caprichos, ele é quieto e pacífico como um cordeiro. Uma conspiração? Não, ele está
reagindo à linguagem corporal, que lhe informa se o clima psicológico é bom ou sujeito a
chuvas.
Vamos dar a Pedro duas mães diferentes e ver como as primeiras impressões de si próprio
dependem da qualidade das mensagens corporais delas.
A mãe A centraliza sua atenção em Pedro, e não na tarefa que está executando. Por
exemplo, quando lhe dá banho, os músculos dela estão relaxados e sua atitude é
brincalhona e suave; há uma

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luz doce em seus olhos. Ela examina os pés gordinhos e enrugados, delicia-se com as suas
reações ao pingar água sobre sua barriga. Quando Pedro balbucia, ela responde. Se ele
espalha água com a mão, vê a mãe reagir com uma risada e participar da sua brincadeira.
Não há palavras, mas os dois estão se comunicando. Pedro sente e vê a receptividade dela.
Não sabe que ele é um ser à parte, mas tem as suas primeiras noções de que é valorizado.
A mãe B aproveita sempre a hora da amamentação para ler. Seus braços o sustentam frouxa
e indiferentemente. A atenção não se volta para o menino, mas para o livro. Se Pedro
balbucia, ela não toma conhecimento. Quando ele se movimenta, os braços da mãe não
colaboram. Se agarra a blusa dela, a mãe o faz soltar sem sequer olhar para ele. Pedro e a
mãe não estão partilhando uma experiência. Na verdade, não há um encontro terno,
humano, direto de pessoa para pessoa. A mãe é todo o mundo de Pedro naquele momento, e
suas primeiras experiências ensinam-lhe que não merece atenção. Para ele, o mundo é um
lugar muito frio no qual tem pouca importância. Podemos ver que Pedro teria uma série de
impressões muito diferentes a respeito de si próprio, com a mãe B e com a mãe A.
Algumas experiências com bebês demonstram que o grau de receptividade carinhosa que
proporcionamos cria as bases de uma futura visão positiva do eu. Essa receptividade é
construída pelo tipo de atenção, sorrisos, carinhos, canções e conversas que damos aos
bebês (ver Capítulo 7). Os pais que fazem brincadeiras com seus filhos pequenos – "montar
no cavalinho", "o gato comeu", e outras – podem fazê-lo de maneira que elas reflitam um
respeito carinhoso e um prazer. Esses reflexos colocam a criança no caminho da auto-
estima elevada. Os pais que nunca brincam com os filhos, ou que os tratam com uma
eficiência fria e impessoal, não lhes transmitem as primeiras impressões de sua
importância. Não há muita alegria, para um ser humano, em ser recebido com indiferença
ou rejeição.
Antes de se preocupar com as ocasiões em que ficou irritado, distante ou tenso com seu
filho, você deve lembrar-se de que

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mensagens isoladas, ou pouco freqüentes, não causam danos permanentes. O importante é o


número total de mensagens de amor ou de desinteresse, juntamente com a sua intensidade.
Se os momentos de prazer forem mais freqüentes, a criança receberá a mensagem.
Antes de aprender o significado das palavras, portanto, cada criança recolhe milhares e
milhares de impressões sobre si mesma que lhes são transmitidas pela linguagem corporal
dos outros. Essas impressões só se transformam em juízos claros a seu próprio respeito
algum tempo depois, mas são importantes porque as mensagens posteriores dependem
delas; afinal, as primeiras impressões deixam marcas profundas.

Mensagens com palavras


Quando a criança passa a compreender as palavras, abre-se, para ela, um novo caminho
para se descobrir como pessoa.
Assim que aprende a andar, Pedro arranca o brinquedo do amigo, deliciado com o belo
prêmio que conquistou. Nessa idade, a preocupação com as necessidades dos outros é nula,
e o choro do amiguinho o deixa totalmente indiferente. A mãe repreende: "Pedro! Não faça
isso! Menino feio!"
Para a criança pequena, os outros – especialmente os pais – são espelhos infalíveis. Quando
a mãe o chama de feio, Pedro conclui que essa deve ser uma de suas qualidades e adota
esse rótulo para si naquele momento específico. As palavras (e atitudes) da mãe encerram
um peso enorme (ver Capítulo 9 – A segurança do não-julgamento).
Imaginemos agora que a mãe de Pedro é, para ele, um espelho que devolve os reflexos
negativos de si próprio. Durante anos, ele ouve: "Não posso com esse menino. Ele é
impossível!", “O que você quer?" (num tom impaciente, de "Meu Deus, outra vez!"); "Por
que você não consegue notas melhores, como

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a sua irmã?"; "Pedro foi convidado a passar o fim de semana fora" (num tom de grande
alívio); "Mal posso esperar que as férias acabem e que Pedro volte logo à escola". Quando
ele foi para o primeiro ano, as palavras que a mãe dirigiu à professora foram: "Tenho pena
de você, por ter que agüentá-lo a maior parte do dia!". Pela maneira como Pedro foi tratado,
podemos ver por que ele teria, necessariamente, de formar um juízo negativo a seu próprio
respeito. Não é de surpreender que ele se considere um problema.
Não há dúvidas de que as palavras têm poder. Elas podem destruir ou fortalecer o auto-
respeito. Mas as palavras devem corresponder a sentimentos autênticos. A auto-estima não
vem do fato de se enganar a criança; na verdade, nada poderia ser pior. A menos que as
palavras e as atitudes se harmonizem, as crianças percebem a discrepância. Aprendem,
então, a não confiar no que lhes dizemos. (O Capítulo 8 examina melhor a importância da
coerência entre as mensagens.)
Como ocorre com as mensagens não-verbais, as explosões negativas ocasionais não causam
danos permanentes. Toda mãe perde a calma de vez em quando. (Mesmo assim, os
sentimentos negativos podem ser transmitidos de maneira não-destrutiva; ver Capítulo 9.)
Mas a criança que está mergulhada nas acusações de caráter verbal conclui: "Acho que sou
uma pessoa muito má. Se meus próprios pais não gostam de mim, quem vai gostar?”

Tratamento da auto-imagem
A auto-estima elevada, portanto, resulta dos reflexos positivos que cercam a criança. Você
poderá dizer: "Bobagem, conheço muita gente que, quando criança, teve a pior relação
possível com os pais e com a vida em geral. Apesar disso, tiveram sucesso e hoje parecem
muito seguras de si e realizam coisas notáveis.”

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Realmente há muitas pessoas assim. Mas os elementos exteriores do "sucesso" não


asseguram a paz interior. Muitas vezes pessoas que exteriormente parecem bem-sucedidas
pagam, no íntimo, o preço: vivem atrás de uma máscara de falsa confiança, na alienação,
com defesas neuróticas e insatisfeitas. Solitários, que não gostam de si mesmos, podem usar
constantemente o trabalho como uma fuga. Mesmo assim, sentem a sua inadequação, por
maior que seja o "sucesso" exterior que conseguem demonstrar.
A verdadeira auto-estima, que nos interessa aqui, é a maneira pela qual nos sentimos
intimamente, e não a aparência de felicidade ou a acumulação de riquezas e posições.
Para se considerar uma pessoa realmente adequada e sentir-se bem interiormente, a criança
precisa de experiências de vida que lhe provem que tem valor e que é digna de ser amada.
Não basta dizer à criança que ela é especial. A experiência é que importa. Ela fala mais alto
do que as palavras.

As crianças valorizam a si mesmas na medida em que foram valorizadas.

Vários fatores combinados fazem da mãe ou do pai um espelho extremamente importante


na vida de seu filho: a prolongada dependência dos pais para a sua satisfação física e
emocional, o permanente contato com eles, e o fato de que os reflexos de si mesmo, vistos
através dos pais, constituem as suas primeiras experiências. Para a criança pequena, os pais
são tão grandes quanto Deus.
Um menino de quatro anos expressou a visão típica que as crianças têm dos poderes
paternos, quando ele e seu pai passaram de carro perto de algumas casas, certa noite.
Apontando para uma delas, que estava com as luzes acesas e as persianas fechadas, ele
perguntou: "O que as pessoas estão fazendo dentro daquela casa, papai?".
"Não sei, meu filho.”
"Ora, e por que você não sabe?", perguntou ele.

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Para as crianças pequenas o pai e a mãe são todo-poderosos e oniscientes: são, literalmente,
uma linha de comunicação vital. É perfeitamente lógico que aos três ou quatro anos se
acredite que os pais podem ver através de persianas fechadas.
Portanto, as razões da criança pequena são: "Esses deuses todo-poderosos me tratam como
mereço ser tratada. O que eles dizem a meu respeito é o que sou." Usando suas palavras e
linguagem corporal para construir essa auto-imagem, ela luta para se enquadrar na visão
que tem de si mesma. É uma imagem à qual corresponderá, como iremos ver no capítulo
seguinte.
Como pais, devemos ter sempre em mente que nossos reflexos têm um efeito poderoso
sobre o avanço do senso de individualidade da criança.

As outras pessoas são espelhos


Não somos, é evidente, os únicos espelhos na vida de nossos filhos. Qualquer pessoa que
passe longos períodos com eles afeta a sua auto-imagem. Pouco importa se essa pessoa é
parente, vizinho, babá ou empregada. Os professores contribuem muito para a imagem que
a criança faz de si mesma, já que há um contato constante e também por exercerem
acentuado poder sobre ela. Irmãos e irmãs são outros espelhos. Embora a criança não
dependa deles para as suas necessidades físicas e emocionais, eles oferecem estímulo
social, competição e são parte íntima da sua vida cotidiana. Reagem continuamente a ela
enquanto pessoa.
Mais ou menos aos seis anos, a criança se liberta da dependência total da família. A
maneira pela qual outras crianças, que não as de sua casa, reagem a ela torna-se cada vez
mais importante. Ela verifica logo que os outros valorizam certas qualidades. E o fato de ter
ou não essa qualidade afeta a idéia que faz de si mesma. Os meninos tendem a valorizar a
capacidade atlética, a força física e a coragem. As meninas, em geral, notam mais os

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atrativos físicos, a boa aparência, a sociabilidade e a cordialidade. Dão à ternura e às


virtudes morais maior prioridade do que os meninos.
As crianças que têm suas características valorizadas pelas outras da mesma idade sentem-se
mais adequadas do que ao que não dispõem desses atributos, porque recebem repetidos
reflexos positivos do grupo.
As crianças cujos interesses e valores discordam visivelmente dos das outras de sua idade
provavelmente se sentirão isoladas – e verão a si mesmas como pessoas de menor valor. A
partir dos seis anos, e com maior intensidade à medida que se aproxima da adolescência,
toda criança necessita do apoio social das demais cujos valores correspondem aos seus.

Domínio e realização
Quando a criança que está aprendendo a andar compreende que é um ser à parte, tenta
superar a sua impotência dominando a si mesma e ao seu ambiente. Seus êxitos e fracassos
refletem-se na sua atitude para consigo mesma. Vejamos como isso funciona.
Toda criança recebe mensagens do próprio corpo.Ted, por exemplo, herdou pernas
compridas e músculos fortes e bem coordenados. Qualquer que seja a atividade que ele
praticar, terá bons resultados. Outras crianças querem tê-lo em seus times esportivos; os
professores e os pais o aprovam calorosamente. Sua habilidade lhe permite perceber que há
uma diferença entre ele e seu amigo Clarence, cujo corpo, pequeno e malcoordenado, o
convence de que não possui muitas das coisas valorizadas pelo grupo.
O índice de crescimento, o nível de energia, a capacidade física, a aparência, a força, a
inteligência, a cordialidade, a habilidade e as deficiências de uma criança provocam reações
nos outros. A criança chega a conclusões sobre quem é, em parte, baseada nas suas próprias
observações de si mesma, em comparação com os outros, e, em parte, na reação desses
outros para com ela. E cada reação aumenta ou diminui os seus sentimentos de valor
próprio.

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As atitudes dos outros em relação à capacidade da criança são mais importantes do que a
posse de determinadas características. A existência de uma deficiência na criança não é tão
importante quanto as reações que ela provoca nas pessoas que a cercam. Atitudes de pena e
desprezo fazem com que o menino ou menina se sinta infeliz. Em conseqüência, a imagem
que tem de si mesmo(a), naquela área, torna-se defeituosa.
A escola apresenta, na sala de aula, no recreio, uma série de obstáculos que devem ser
superados para que a criança se veja como uma pessoa capaz. Ali está Jill, que amadureceu
depressa, tanto física como mentalmente. Ela está preparada para enfrentar as tarefas
escolares, sobretudo a leitura, antes de muitas de suas colegas. Aprende a ver-se diferente
de Joel, cujo amadurecimento foi mais lento. Ela desenvolve um respeito pelas suas
capacidades mentais. Tem evidências concretas de que é mais do que simplesmente
adequada na escola.
Uma menina do segundo ano, cujas notas escolares eram altas, escreveu: "Gosto de mim
mesma porque faço bem os meus deveres." A consciência de sua competência aumentou-
lhe o prazer de ser ela mesma.
Ao examinarmos a importância do domínio sobre a auto-estima, não devemos esquecer que
o êxito tem mais peso se ocorrer em áreas importantes para a criança. Harlan, aos doze
anos, destacava-se como aluno de piano, mas era um fracasso nos esportes. Seu talento
musical pouco significava para ele, pois não era valorizado pelos amigos.
Toda atividade da qual a criança participa lhe transmite informações sobre ela mesma. Em
clubes, esportes, igreja e grupos sociais, na escola e no trabalho, ela obtém, constantemente,
reflexos que acrescenta à sua crescente coleção de autopercepções.

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As respostas a “Quem sou eu?"


A imagem que toda criança tem de si mesma é produto dos numerosos reflexos que fluem
de muitas fontes: o tratamento que recebe das pessoas à sua volta, o domínio físico sobre si
mesma e sobre o ambiente, e o grau de realização e reconhecimento em áreas que são
importantes para ela. Esses reflexos são como instantâneos de si mesma que ela cola num
álbum imaginário de retratos, e que formam a base de sua identidade. Tornam-se a sua
auto-imagem ou autoconceito – suas respostas pessoais à pergunta "Quem sou eu?".
É importante ter em mente que a imagem que a pessoa tem de si mesma pode ser, ou não,
exata. Todo ser humano tem um eu e uma auto-imagem. Quanto mais exata a imagem que a
criança faz de si mesma, mais realisticamente ela conduz a sua vida.
O sr. e a sra. K. precisavam de um filho que se destacasse. Lila, absorvendo os elogios
exagerados dos pais, vê a si própria como uma cantora de talento – ilusão alimentada pela
sua professora de canto, ávida por dinheiro. Lila, porém, tem problemas porque o público
não parece entusiasmar-se com o seu canto. Se ela recusar modificar a auto-imagem
alimentada pelos pais e pela professora, poderá esgotar-se tentando se tornar alguma coisa
para a qual não tem talento. Isso só pode levar à frustração e ao fracasso e talvez ao ridículo
puro e simples ante os outros. Lila tem, portanto, menos razões para gostar de si mesma. Se
alterar sua auto-imagem, ajustando-a às suas capacidades reais, não poderá manter a
carreira de cantora como seu objetivo – que é o desejo dos seus pais.
Naturalmente, quanto mais o autoconceito de uma pessoa corresponde às suas capacidades
reais, à sua habilidade e ao seu potencial, mais provável é o seu sucesso. Terá, então,
maiores oportunidades de se ver como uma pessoa adequada.

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Aparecimento da auto-estima
No momento em que a criança absorve as descrições que os outros fazem dela, assimila
também as suas atitudes para com essas qualidades. O sr. T., por exemplo, diz
freqüentemente a Lilly: "Meu Deus, como você é agitada!" Uma segunda mensagem – um
julgamento de valor – está implícita nessa frase cujo tom diz: "E isso é mau!" Lilly aprende
a ver-se como agitada e aprende a pensar nisso como um traço negativo. Ela pode, então,
reprimir uma parte natural de si mesma para conseguir aprovação e aumentar o seu respeito
próprio, ou, se aceitar o julgamento do pai, sentir-se um pouco menos aceitável devido a
essa qualidade.

As palavras são menos importantes do que os julgamentos que as acompanham.

O sr. S. chama Sammy muitas vezes de "monstro". Mas seu tom é de amor e orgulho, como
se dissesse: "Meu filho, você é um grande sujeito!" Sammy refere-se a si mesmo como
monstro, mas usa essa classificação com orgulho. Lembre-se: a linguagem corporal fala
sempre mais alto do que as palavras.
O juízo que a criança faz de si mesma surge a partir do juízo dos outros. E, quanto mais a
criança gosta de sua auto-imagem, maior a sua auto-estima.
Geralmente aos cinco anos a criança já reuniu reflexos suficientes a seu respeito para poder
formar a sua primeira estimativa do valor que tem. Pode não se sentir bem consigo mesma
em todas as ocasiões, mas, se de modo geral se sentir basicamente amada e valorizada, se
alegrará por ser quem é.
Sempre que alguém diz "Não dou para isso", na realidade não está dizendo nada a seu
respeito. Pode achar que está fazendo uma observação sobre seu valor pessoal (seu eu),
mas, na verdade, está fazendo um comentário sobre a qualidade de suas relações com os
outros – a partir das quais construiu a sua auto-imagem.
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Pela maneira como uma pessoa vive a sua vida, pode-se afirmar: "Não é tão importante o
que você é, mas aquilo que acha que é."
Brett, aluno do quinto ano, focalizou esse tema quando lhe pediram que escrevesse sobre o
que gostaria de falar no Dia de Ação de Graças:

Estou contente por não ser um peru! Estou grato por eu ser eu e por você ser você. Estou
satisfeito por me sair bem na escola. Estou contente por estar aqui, e não lá. Estou satisfeito
por ser uma pessoa e não um cachorro ou um gato... Estou feliz por freqüentar esta escola.
Estou contente por ter bons amigos com quem brincar. Estou agradecido por ter um irmão
para conversar em casa. E estou agradecido apenas por eu ser eu mesmo!

Um testemunho eloqüente dos espelhos positivos que cercam Brett.


Lembre-se: nenhuma criança pode "ver-se" diretamente – ela só pode ver a si própria pelos
reflexos que produz nos outros. Seus “espelhos" literalmente modelam a sua auto-imagem.
A chave para a identidade que o seu filho constrói está diretamente ligada à maneira pela
qual ele foi julgado. O que acontece entre o seu filho e as pessoas que o cercam tem,
conseqüentemente, uma importância fundamental.

Uma identidade positiva depende de experiências positivas de vida.

3 A INFLUÊNCIA DOS ESPELHOS NO COMPORTAMENTO

O autoconceito e o comportamento
Lee estava muito contente, brincando com o seu "trem" de caixas, dirigindo-o por uma
linha imaginária. Seu companheiro, Jeff, dava voltas em torno do trem com seu triciclo,
gritando ameaças sérias. "Vou arrancar você desse trem! Tenha cuidado ou dou um soco no
seu nariz! Meu triciclo corre mais do que o seu trem!" Lee manteve-se alegre e indiferente
às ameaças.
De repente, Jeff dirigiu-se à professora do jardim-de-infância, perguntando-lhe
confidencialmente em voz baixa: "Quando você tinha quatro anos era forte como eu?"
Tendo sido uma criança fraca, a professora respondeu enfaticamente: "Você é muito mais
forte do que eu era quando tinha quatro anos."
Jeff ficou sentado em silêncio por um momento, como se estivesse assimilando essa idéia.
Depois, afastou-se lentamente, pedalando com tranqüilidade em volta do trem do amigo,
sem fazer novas ameaças.
O que levou Jeff a essa acentuada mudança de comportamento?
As crianças de quatro anos recebem muitos reflexos de sua impotência, transmitidos pelo
ambiente e pelas pessoas que as cercam. Como todos os seres humanos, as crianças, por
menores que sejam, procuram neutralizar tais reflexos.

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O comportamento inicial de Jeff visava dizer ao amigo: "Veja como sou forte. Fique com
medo para que eu mesmo possa ver como sou poderoso." Atrás da hostilidade estava
simplesmente o desejo de gostar de si mesmo. Quem pode dizer se, naquela mesma manhã,
alguma experiência anterior não ressaltou a sua impotência, deixando, no seu respeito
próprio, um buraco que precisava ser remendado? Quando a professora proporcionou esse
remendo, ele pôde afastar-se com uma nova imagem de força, e suas energias foram
liberadas para a brincadeira tranqüila.
Esse breve episódio mostra que o comportamento é dirigido para a auto-estima.

Toda criança busca a auto-imagem de capacidade e força. E o comportamento corresponde


a essa auto-imagem.

Pense, por um momento, em você mesmo.Você não se comporta de maneira diferente


quando se sente seguro e quando se sente inseguro? No primeiro caso, você faz afirmações
positivas a seu próprio respeito. É, portanto, mais cordial, mais extrovertido e mais
interessado em se relacionar pacificamente com os outros. Quando se sente inadequado e
inseguro você procura não chamar atenção. A própria expressão – autoconfiança – significa
uma segurança interior. No íntimo, você confia na sua capacidade e age de acordo com essa
confiança. O mesmo acontece com as crianças.
Até mesmo a maneira como a criança se expressa é colorida pelo que ela sente a seu
próprio respeito. Se pedirmos a um gago, por exemplo, que diga seu nome, onde mora ou o
que estuda na escola, ele gaguejará de uma maneira agoniante. Se lhe pedirmos, porém, que
assuma uma identidade diferente da sua (recitar um monólogo do Hamlet, por exemplo, ou
fingir um sotaque estrangeiro), sua incapacidade desaparecerá. Quando fala dominado pelo
sentimento de inadequação, ele gagueja; quando fala com um sentimento de segurança, ele
é fluente.

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Autoconfiança irregular
Confiança numa área não significa, necessariamente, confiança em todas as áreas. Barry
por exemplo, recebeu durante anos muitos reflexos positivos de suas proezas intelectuais.
Na aula, nos debates estudantis, nas organizações escolares, sua convicção de que tem algo
a dizer é sempre evidente. Socialmente, porém, Barry se sente como um "bobo". Por isso,
nas festas é tímido, procura não chamar atenção e fica inativo. Nas situações sociais ele
age, caminha e fala de maneira diferente do que nas situações escolares.
Os adultos não são diferentes. Todos nós conhecemos, por exemplo, homens que são
confiantes e participam com firmeza de grupos comerciais. Mas, em reuniões sociais,
sentem-se como peixes fora d'água.
Quanto mais generalizada for a auto-estima da criança, mais ela atuará com confiança em
todas as áreas de sua vida.

A baixa e a alta estima


A maioria das crianças tem sentimentos mistos a seu próprio respeito, mas, como já vimos,
a auto-estima refere-se aos juízos gerais de si mesmas.
Que tipo de julgamentos poderia Bobby fazer sobre si mesmo, se a sua auto-estima fosse
baixa? Diria coisas como: "Eu não sou muito importante. As pessoas não gostariam de mim
se me conhecessem realmente. Não posso fazer as coisas tão bem quanto os outros. Não há
muito sentido em tentar fazer qualquer coisa, porque sei, antecipadamente, que não
conseguirei. Não posso tomar boas decisões. Não falo em grupos porque não digo nada que
valha a pena ser ouvido. Não gosto de ir a lugares novos. Odeio estar só; na verdade, eu
gostaria de ser outra pessoa."
Se a auto-estima de Bobby fosse alta, ele provavelmente diria: "Acredito ter alguma coisa a
oferecer aos outros e posso aprender

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com eles. Meus companheiros me acham digno de respeito. Posso fazer bem várias coisas,
embora ainda tenha muito que aprender. Mas aprender é bom. Se eu não consigo fazer
alguma coisa da primeira vez, gosto de tentar uma segunda. A longo prazo, acredito que
poderei ter êxito. Gosto de estar sozinho ou acompanhado. Estou realmente satisfeito de ser
como sou." A confiança de Bobby é evidentemente maior quando ele está em condições de
fazer essa segunda série de afirmações.
Suponhamos duas adolescentes, igualmente atraentes e inteligentes, e vejamos como sua
auto-estima afeta o seu comportamento.
Jean acredita em si mesma, ao passo que Mary, não. Na sala de aula vemos Jean dar
informações, dirigir-se ativamente aos outros e participar, com ênfase, das discussões. Que
contraste com o comportamento de Mary! Hesitante e sem jeito, ela apenas responde ao que
lhe é perguntado. Prefere calar suas opiniões por ter medo da reação dos outros. Numa festa
de adolescentes, Jean dirige-se aos outros com calor e participa ativamente das
brincadeiras, ao passo que Mary se retrai. Ela espera ser convidada e, mesmo assim, só
participa das atividades comuns com pouco interesse.
Acreditando secretamente que nada tem a oferecer, não se pode esperar que Mary tenha
segurança em qualquer situação. Suas reservas e suas dúvidas a impedem de ter qualquer
participação espontânea e interessada. Esse comportamento reduz seu impacto social sobre
os outros, alimentando-lhe a convicção de que possui pouco valor. Ao contrário de Mary, a
confiança que Jean tem em si lhe dá liberdade para participar, sem reservas, de qualquer
situação. A auto-imagem de cada uma delas é revelada em seus atos.
Sempre que uma criança se considera incapaz, ela espera falhar e comporta-se de maneira
que se torne menos provável o sucesso. Quando deixa de acreditar em si mesma, a criança
está destinada ao fracasso. O menino que já teve êxitos no passado espera continuar

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a fazer bem as coisas. Sua segurança pessoal lhe dá coragem para enfrentar obstáculos e
energia para superá-los.
A pequena Becky foi cercada de amor e aprovação durante toda a sua vida. As pessoas
reagiam carinhosamente aos seus olhos grandes e inquietos, à sua alegria e ao seu senso de
humor. "Ah, mamãe", disse ela certo dia, "eu adoro as pessoas." E por que não iria gostar
delas? Suas experiências deram a Becky um sentimento de importância e de valor. A
maneira pela qual ela se comportava com as pessoas parecia até a de um cachorrinho:
literalmente ela se lançava ao encontro dos outros e esperava agradar. E sua expectativa
influenciava o seu comportamento – confiante, sincero, extrovertido. Esses traços
contribuíam para aumentar-lhe os sucessos.

Por que as crianças se comportam mal


Todos nós queremos evitar o mau comportamento das crianças sempre que possível. A vida
é mais agradável, para nós e para elas, sem tal comportamento. A disciplina é um assunto
muito importante e, se você souber que o comportamento corresponde à auto-imagem,
poderá ver que uma das causas do mau comportamento é um autoconceito negativo. A
criança que se considera má modela seus atos para que se enquadrem nessa concepção. Ela
desempenha o papel que lhe é atribuído.
Normalmente, quanto pior o comportamento da criança, mais ela é censurada, punida ou
rejeitada. E, em conseqüência, mais profunda se torna a sua convicção íntima de que é
"má". O mau comportamento crônico pode se basear numa visão deformada do eu, embora
uma auto-estima precária não seja a única causa do mau comportamento.
Muitos jovens (e adultos) cujo comportamento prejudica a eles próprios e à sociedade como
um todo – os que abandonam a escola, os delinqüentes, os viciados em drogas – acreditam,
no íntimo,

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que são definitivamente inadequados e que não têm nenhum valor. Eles tateiam em busca
do significado pessoal e da realização. Mas seus esforços desorientados levam a um
comportamento autoderrotante.
O jovem que tem uma boa auto-estima dificilmente terá sido uma criança-problema. Ele
anda, fala, trabalha, aprende, brinca e vive de maneira diferente da pessoa que não gosta de
si mesma. Sua segurança interior se irradia para fora, nos seus atos. Como adultos, tais
indivíduos são mais capazes de trabalhar de maneira construtiva na solução dos problemas
e nas desigualdades que existem em nosso mundo. Seus núcleos sólidos os liberam para
serem inovadores e não destruidores hostis. A criança que tem respeito próprio
provavelmente será um membro construtivo da sociedade.

Felicidade e comportamento
Numerosos pais dizem: "Quero apenas que meu filho seja feliz." Mas não sabem como
conduzi-lo a essa felicidade.
Um estudo que visava indicar a diferença entre as pessoas felizes e infelizes concluiu que a
desigualdade mais importante entre os dois grupos era que as pessoas felizes relacionavam-
se bem com as outras; as infelizes, não. Uma auto-estima precária age como um obstáculo à
felicidade pessoal, impedindo as relações pacíficas. Um dos maiores problemas enfrentados
quase que por todas as organizações é o das pessoas que representam verdadeiros espinhos
para as outras. O obstáculo que as relações interpessoais representam para o progresso é
maior do que podemos imaginar.

A chave da paz interior e da vida feliz é a auto-estima elevada, pois é ela que está por trás
de todo relacionamento bem-sucedido com os outros.

4 O PREÇO DOS ESPELHOS DEFORMADOS

A falta de respeito próprio


Em seus esforços para gostar de si mesma, toda criança busca a aprovação e trabalha de
maneira incessante para adquirir as habilidades que eliminam a impotência. Se as pessoas
que a cercam não tomam conhecimento do desenvolvimento de seus poderes, ela não hesita
em chamar-lhes a atenção para seus feitos.
"Papai, veja como sou forte!”
"Sabe de uma coisa? Eu já sei dar o laço no sapato!”
"Eu corro mais do que o Billy!"
Exibicionismo? Não necessariamente. Essas afirmações são apenas pedidos de reflexos
positivos – são a retroalimentação necessária à auto-estima condigna.
Quando as crianças não têm êxito na construção do respeito próprio, seguem caminhos
diferentes, baseados nessas possibilidades (ou combinações de possibilidades). Elas:
criam defesas: elaboram vários disfarces para os sentimentos de inadequação;
conformam-se: aceitam sua inadequação como um fato e levam uma existência apagada; ou
retraem-se: refugiam-se em fantasias que compensam as rejeições de que são vítimas.

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Cada uma dessas opções tem o seu preço, o que reduz a plenitude da vida.
O caminho percorrido pela criança é influenciado pelo temperamento, modelos,
experiências e resultados de suas tentativas e erros. A maioria das crianças experimenta
várias defesas antes de se submeter ou de se retrair, e estas duas opções, em geral, só são
escolhidas em última análise. As crianças não desistem facilmente.

Auto-estima e defesas
Uma defesa é apenas uma arma psicológica contra a ansiedade, o medo, a insegurança ou a
inadequação. Seu objetivo é ajudar a criança a manter sua integridade. Todos nós usamos
recursos defensivos em algumas ocasiões.
A tagarelice constante de Sally é a sua maneira de se colocar em posição de superioridade
ante os irmãos e melhorar a sua própria situação. A conversa incessante de Meg serve para
chamar a atenção sobre si própria: tem fome de ser notada.
Há todo um arsenal de defesas. Compensação, racionalização, sublimação, deslocamento,
negação e projeção são comuns em todos nós. Algumas vezes esses mecanismos ajudam a
nossa adaptação, mas em outras causam problemas, particularmente quando recorremos a
eles freqüentemente. (Comumente, a maioria das crianças acaba aprendendo que a
fanfarronada, a tagarelice e as manobras para chamar a atenção costumam provocar a
rejeição mais do que a aceitação.) Nossa intenção não é tratar a variedade de defesas
detalhadamente, já que esse aspecto é abordado por outros livros, mas sim mostrar quais os
seus objetivos, e examinar os que são comuns.
A maior parte das defesas tem suas raízes na convicção secreta da criança de que é má,
indigna e não merece ser amada. Esse sentimento secreto forma o núcleo da neurose. A
neurose é, afinal de contas, apenas o tecido cicatrizante em torno de uma ferida psicológica.
A criança que tem um respeito próprio profundo não precisa de defesas pouco sadias.
Lembre-se de que:

As defesas são erguidas em torno da debilidade, e não da força e da adequação.

Sentimentos de inadequação e defesas doentias estão sempre juntos.


Vamos ver como uma criança lida com a sua necessidade de respeito próprio. Suzie, uma
menina vigorosa, positiva, sente que decepciona seus pais. Embora acreditando
secretamente que a imagem que seus pais fazem dela é certa, o seu temperamento não lhe
permite submeter-se passivamente. Em idade pré-escolar, ela se lança ao desafio e à
rebelião; tenta abrir à força o caminho da aceitação através da agressão física direta. Aos
seis anos, recorre aos disfarces (compensação) para esconder a sua inadequação.
Interiormente ela se sente pequena e indigna, mas externamente é barulhenta, mandona e se
impõe. Dizer a Suzie que deixe de se comportar dessa maneira é como tentar curar sarampo
pulverizando a pele. Os sentimentos de desvalorização não são atingidos pelas repreensões;
na verdade, são apenas intensificados.
Aos oito anos, Suzie compreende que suas táticas apenas afastam as outras crianças.
Incapaz de obter aprovação em casa, ela procura alguma maneira de contrabalançar isso aos
olhos do grupo. Descobre, então, que tem habilidade para o basquete. Dedicando-se de
corpo e alma a esse esporte, ela assiste aos jogos de sábado pela televisão, sob um olhar
crítico. Depois da escola, usa seu tempo livre para treinar lançamentos e manobras. Aos
dez, ela é a melhor jogadora da classe. Todos querem tê-la em seus times. Ela conseguiu,
assim, um lugar real para si mesma na admiração da sua turma.
Embora o basquetebol tenha sido apenas uma forma de compensar o sentimento original de
falta de importância, essa solução

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ajudou Suzie a conseguir o que ansiava ter – o respeito do grupo. Mas ela poderá enfrentar
problemas mais tarde, quando o fato de ser boa jogadora de basquete já não for considerado
importante pelo seu grupo. Aí então, se não desenvolver outras maneiras de conseguir
aceitação, ela ficará desamparada.
Outro tipo de compensação pode ser visto na criança que está sempre se esforçando para
melhorar as suas realizações. John, por exemplo, convencido intimamente de sua falta de
valor, "coleciona" todo o tipo de realizações para mostrar seu mérito. Mas, por mais
espessas que sejam as suas "camadas de realizações", raramente serão suficientes para
modificar a idéia que ele tem de si mesmo. As evidências externas não apagam a convicção
firme que ele tem interiormente.
A compensação é apenas um dos muitos recursos usados pelos seres humanos para
conseguir o respeito próprio.

Defesas e círculos viciosos


Nem toda criança (ou adulto) encontra maneiras construtivas para elaborar a auto-estima.
Muitas escolhem defesas que as lançam num círculo vicioso de autoderrota. Esses
processos começam, geralmente, em casa.
Suponhamos que Suzie não tivesse encontrado a solução do basquete. Suponhamos que em
lugar disso continuasse a ser mandona, insistente, autoritária. Quanto mais se acentuam
esses traços, mais rejeitada ela é. A inadaptação entre os colegas soma-se à rejeição pela
família, e sua auto-estima cai ainda mais.
No caso de Suzie, o círculo vicioso não pára. Quanto pior a sua relação com as pessoas,
menos capaz ela é de se concentrar nos trabalhos escolares. Do seu ponto de vista – do
ponto de vista de qualquer criança – pertencer a um grupo é mais importante do que a
leitura ou o aprendizado das tabuadas de multiplicação.

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Como ela pode se concentrar em abstrações quando interiormente está sangrando com as
feridas da rejeição total?
À medida que se acumulam as notas baixas, Suzie tem razões ainda maiores para se sentir
indigna. Cada novo fracasso prepara o terreno para uma derrota futura. O fracasso como
pessoa contribui para o fracasso escolar. Não importa, então, se o seu QI é elevado: seu
quociente de adequação pessoal está cheio de falhas.
Uma defesa doentia encontrada em crianças de baixa auto-estima é o apetite excessivo, e
que dá início a um círculo vicioso difícil de ser rompido.
Jane, de oito anos, sente-se como a ovelha-negra da família. A sensação de não ser aceita
cria ansiedade e tensão. Uma de suas mais remotas lembranças é que o ato de comer lhe
proporcionava uma sensação boa, relaxando as tensões internas. Como bebê, o comer
estava ligado a ser colocada no colo e acarinhada. E, ao aprender a andar, observou a
aprovação sorridente da mãe quando comia um bom prato.
Agora, à base dessas lembranças e associações, ela se volta para a comida todas as vezes
que se sente frustrada, tensa, solitária ou rejeitada. Não encontrando carinho entre as
pessoas que a cercam, ela obtém uma satisfação momentânea com a comida. Comer tem as
suas recompensas temporárias: a comida é gostosa. Para Jane, a comida torna-se o símbolo
da ternura, da proximidade, da aprovação e dos sentimentos corporais agradáveis. Por isso
ela se volta cegamente para o símbolo do antigo bem-estar e, alimentando-se, tenta
compensar a si própria.
Numa autotolerância solitária, ela come demais e torna-se cada vez mais gorda. Isso faz
com que seja menos atraente e menos competente nos jogos, e em pouco tempo passa a ser
alvo de piadas. Então ela se volta ainda mais para a comida, e o círculo vicioso se aperta.
Quanto mais gorda fica, mais é objeto de risos. A cada nova rejeição, ela corre para a
comida. E Jane refugia-se num ódio a si mesma e na alienação.

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A fachada falsa
Algumas crianças (e adultos), com sentimentos profundos de inadequação, recorrem à
defesa de usar uma boa fachada. A menina-modelo é um desses casos. Os pais de Marie só
a apreciavam quando ela estava arrumada, era cuidadosa, bondosa e ponderada. Enquanto
ela era boazinha, tinha um lugar seguro na afeição deles.
Ela escondia seus sentimentos normais de raiva, ciúme, frustração e ansiedade.
Superficialmente, tudo parecia ótimo. O problema é que ela sabia que tais sentimentos
inaceitáveis estavam escondidos lá dentro. (As desvantagens dos sentimentos negativos
reprimidos e seu impacto sobre a auto-estima serão examinados no Capítulo 14.) Marie
passava a maior parte do tempo edificando a sua imagem de "boa menina" para agradar aos
outros. Tornou-se uma pessoa dependente, flexível, procurando, em todos os seus atos,
conseguir a aprovação e esconder o seu "lado mau". Apesar de seu sucesso em disfarçar,
não tinha confiança em si mesma. Suas energias eram dedicadas a parecer perfeita e não a
desenvolver seu potencial. Ela tornou-se escrava do "dever" e acumulou, ainda, outras
evidências exteriores de "sucesso". Em tais casos, "a ênfase transfere-se do ser para o
parecer", como disse Karen Homey (1).
(1) Karen Homey, Neurosis and Human Growth, NovaYork, W. W. Norton & Co., 1950, p.
38.
Todos nós conhecemos pessoas que aparentam confiança, mesmo quando não a sentem.
Algumas vezes somos enganados, mas um nervosismo, um exagero ou uma tensão em seu
comportamento freqüentemente denuncia a inadequação que está por trás da aparência.
Larry é um tanto barulhento, agita demais as mãos, ri com exagero e não consegue ficar
sentado por muito tempo. Dá a impressão de que se empenha mais em parecer, do que em
ser confiante. Pessoas como Larry nunca chegam a se mostrar como

37

realmente são. E não conseguimos penetrar além da máscara para chegar à pessoa real.
Toda pessoa que constrói um falso "eu" cai numa armadilha. As reações que obtém são
relativas à máscara que usa, mas não ao seu verdadeiro eu. Essa pessoa sabe que sua
fachada não é autêntica e por isso procura ostentar, na aparência, a aprovação que recebe.
Vive com a convicção de que "As pessoas gostam do meu falso eu, mas esse não sou eu
realmente". A aprovação, nesse caso, tem pouco significado, pois é dirigida para alguma
coisa que não é autêntica.
A pessoa verdadeira nunca tem a oportunidade de desenvolver-se, porque está distanciada
da sua fonte de alimentação: a interação social com os outros. Essa pessoa teme deixar que
alguém a veja como é, porque aprendeu na infância – em geral, dos pais – que seu
verdadeiro eu é inaceitável. Levando tal suposição para a idade adulta, ela perde a
oportunidade de verificar como as pessoas reagirão ao seu verdadeiro modo de ser. Embora
a máscara possa ter sido adequada na infância, mais tarde poderá deixar de sê-lo. Ela supõe
que a fachada a protegerá contra novas rejeições. Mas essa máscara é uma armadilha. E,
enquanto insistir nesse jogo, suas relações com os outros continuarão falsas.
Mildred nasceu numa família extrovertida e aprendeu, desde cedo, que para ser aceita pelos
seus também ela teria que ser extrovertida. Armou-se da fachada necessária, mas a solidão
de viver atrás de uma máscara começou a cansá-la. Minou-lhe as energias até que, como
adulta, ela começou a passar muito tempo na cama, com uma série de doenças.
Aos quarenta anos submeteu-se a um tratamento e aprendeu a aceitar a sua verdadeira
natureza – a de uma pessoa tranqüila, quieta. Compreendendo que sua vida tinha sido um
longo jogo de representação, ela reconheceu que para a sua saúde física e mental tinha de
viver de acordo com a sua própria natureza, embora isso significasse não corresponder ao
que dela se esperava.

38

Ficou espantada quando seus amigos mais íntimos lhe disseram preferir a Mildred
verdadeira à falsa. Ao contrário da família, esses amigos apreciavam a pessoa tranqüila,
gentil, ou seja, o que ela era na realidade.
Com freqüência só o reexame dos velhos padrões absorvidos na infância pode nos fazer
abandonar as máscaras que achamos que devemos usar. Verificamos, para nossa surpresa,
que elas já não têm "valor de sobrevivência". Na verdade, os outros gostam muito mais de
nós sem elas, pois a autenticidade é cativante.
Muitas pessoas acreditam que devem "parecer boas" – aparentar força, eficiência,
competência, perfeição – para serem aprovadas. E passam anos preparando boas fachadas,
sem jamais compreender que elas, a longo prazo, acabam aprisionando o verdadeiro eu.
O adolescente senhor de si, a mulher que prefere morrer a ser vista sem a sua maquilagem,
a outra que fica muito aborrecida se a vizinha aparece no momento em que a casa está
desarrumada, ou o homem baixinho que tem mania de brigar – todas essas pessoas
habitualmente guardam sentimentos secretos de inadequação. Sentindo-se interiormente
pouco adequadas, elas procuram parecer competentes. Inversamente, a pessoa que se sente
bem adequada interiormente não tem de apresentar sempre uma imagem perfeita para os
outros.

As máscaras são usadas para ocultar o "eu indigno".

Elas encobrem uma auto-estima precária. Quando a nossa convivência com os jovens os
leva a gostar genuinamente do que são, eles não precisam de máscaras.

Submissão e retraimento
A criança que não consegue desenvolver defesas adequadas pode recorrer à submissão ou
retraimento. Bárbara e Harold, por exemplo, optaram por elas.

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Bárbara sentia-se pouco aceita pelos pais e, sendo passiva por natureza, fez apenas tímidas
tentativas de conseguir aprovação. O caráter extremamente dominador do pai, e sua aversão
pelas mulheres, predominava na casa. Durante toda a sua infância, Bárbara viu a mãe
aceitar passivamente o papel de capacho. Tomando-a por modelo, Bárbara cresceu
acreditando que não merecia respeito. Como a mãe, escolheu uma vida de abnegação e
submissão.
As primeiras experiências de Harold também o convenceram de que tinha pouco valor.
Tentou conquistar o amor dos pais de muitas maneiras, mas nunca conseguiu. A rejeição
deles e as violentas brigas que presenciou deixaram-no com medo das pessoas. Não tinha
muita coragem para tentar aproximar-se dos outros, e os poucos esforços que fez nesse
sentido falharam da mesma forma.
Para Harold, o mundo real e as pessoas que nele vivem não lhe davam satisfação pessoal,
nem conforto psicológico. Frustrado pela sua incapacidade de obter satisfação no mundo
exterior, ele voltou-se para si mesmo, para o conforto solitário dos devaneios. Em sua
imaginação, organizava o tipo de mundo e de tratamento que desejava. O recolhimento para
a fantasia não só lhe poupava novas rejeições, como lhe dava um lugar só seu, no qual
podia sentir-se menos ameaçado. Ele preferiu se retrair.
Em geral, quanto pior é o comportamento da criança, maior seu desejo de aprovação.
Quanto mais retraída ou desagradável, mais ela precisa de amor e aceitação. Quanto
maiores as suas defesas, mais faminta e alienada está. No entanto, as próprias defesas da
criança tornam menos provável a conquista da aceitação desejada. Assim, ela gira nesse
círculo, tecendo a teia que acaba por transformar-se em seu cárcere pessoal.
Nossas prisões, nossos tribunais e nossos hospitais ocupam-se, diariamente, de pessoas que
sofreram os efeitos dos espelhos extremamente deformados, e dos reflexos negativos em
suas vidas. Na verdade, as páginas da história estão cheias de exemplos

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do impacto brutal que essas pessoas tiveram no decorrer dos acontecimentos.


Nada disso precisa acontecer. Os círculos viciosos podem ser evitados ou rompidos, uma
vez iniciados. (Ver capítulos de 6 a 13.) Cada pai e cada professor tem possibilidade de
oferecer reflexos que impeçam as crianças de ter uma existência infeliz e deformada.
Submissão, retraimento e defesas doentias são escolhas que as crianças podem evitar, se
forem ajudadas nesse sentido. Lembre-se de que:
Se você vive com uma criança de maneira que sufoque sua auto-estima, você impede o seu
crescimento positivo; na verdade, você estimula o desenvolvimento deformado, defensivo.

O ciclo saudável
Quando conhecemos a importância dos reflexos positivos, podemos fazer com que a
criança inicie um ciclo saudável e não um ciclo destrutivo. Esse ciclo funciona da mesma
maneira, exceto pelo fato de basear-se em reflexos positivos.
Joe, por exemplo, sentia-se profundamente amado e valorizado pela sua família. Quando
estava com outras crianças suas brincadeiras eram pacíficas e não-defensivas. Naturalmente
ele fazia amigos logo e os conservava. Não precisando de suas energias para a defesa, ele
podia relaxar na escola, dedicando toda atenção aos estudos, e utilizar toda a sua
capacidade. Os reflexos positivos do lar, dos amigos e da escola o envolveram num círculo
saudável de aceitação e de domínio de si mesmo. O círculo crescente de reflexos positivos
alimentou a sua convicção original de que tinha importância, e a sua felicidade confiante
atraiu os outros.
A maneira pela qual nós vivemos com os nossos filhos, durante os seus primeiros anos de
vida, prepara o cenário para o círculo vicioso ou saudável. Mesmo nas melhores
circunstâncias, porém, as experiências de vida e as pessoas fora da família podem
proporcionar à criança reflexos negativos. Mas quanto menores forem as mensagens
negativas que a criança receber da família melhor ela poderá resistir aos reflexos dos
outros.
Nós, os pais, não somos totalmente responsáveis pelo grau de auto-estima da criança, mas
desempenhamos um papel importante na visão inicial que ela tem de si mesma, e que será
significativa em sua vida, por muitos anos.

5 A ARMADILHA DOS REFLEXOS NEGATIVOS

Modificação dos autoconceitos


A auto-estima não é de caráter definitivo, embora, uma vez formada, não seja fácil
modificá-la. A visão que a criança tem de si mesma geralmente muda com o seu
crescimento e com suas novas experiências. O respeito próprio de Jimmy, por exemplo,
sobe um ponto quando o simples crescimento físico lhe permite andar de bicicleta.
O processo de formação da auto-imagem se faz da seguinte maneira: um novo reflexo, uma
nova experiência, ou o crescimento, leva a um novo êxito ou fracasso, que por sua vez leva
a uma nova concepção, ou a uma concepção revista, de si mesmo. Dessa maneira, o
autoconceito de cada pessoa evolui, em geral, durante toda e sua vida.

Autoconceitos rígidos Às vezes, porém, a atitude da criança para consigo mesmo torna-se
rígida, e isso significa problema. De que modo isso acontece?
Como já vimos, a auto-estima surge com o sentimento, experimentado pela criança, de que
pode ser amada e de que é digna. Desses dois sentimentos, o primeiro – acreditar na própria
importância simplesmente porque se existe – é básico. Quando uma

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criança sente que não é amada, as provas de sua competência ou valor podem ter pouco
significado.
A criança (ou adulto) que está firmemente convencida de que não é boa está preparada, por
assim dizer, para só registrar os reflexos que confirmam essa imagem negativa que tem de
si mesma. A convicção de que "não sou amada" age como um par de óculos de sol, que
filtram mensagens contraditórias. Não gostando de si mesma, a criança desconhece, ou
rejeita, os reflexos que contrariam essa auto-imagem.
A razão disso é que os seres humanos devem ser coerentes consigo mesmos.

Devemos sentir-nos intimamente coerentes – "feitos de uma só peça". Nenhuma pessoa


pode acreditar que não tem importância e ao mesmo tempo acreditar que tem valor para si e
para os outros. Os dois sentimentos são contraditórios.
Tina, de catorze anos, por exemplo, sente que não é basicamente amada, porque registrou
poucas vezes reflexos de seu valor como pessoa. Aprendeu a ver a sua incapacidade de ser
amada como uma qualidade inata; como uma espécie de fato consumado. Faltam-lhe certos
talentos que são valorizados pelo seu grupo: não sabe dançar, nem nadar. A convicção de
que é inferior influi na compreensão das lições que recebeu de seus pais. Ela tem pouca
confiança em sua capacidade de aprender, e, mesmo quando aprende, a imagem
fundamental que tem de si mesma como pessoa não se modifica. Está convencida de sua
inadequação, por mais competente que seja. Ela pensa: "Ah, claro, sei nadar, dançar, jogar
tênis e tocar violão, mas e daí? Muita gente também sabe fazer essas coisas e até melhor.
Minhas habilidades não significam nada!"
Tina não pode usar os seus talentos para melhorar a sua auto-imagem. Sentindo-se
rejeitada, ela tem de centralizar sua atenção nas debilidades e não em seus pontos fortes. As
suas realizações tornam-se, nesse caso, vitórias sem importância. Tendo uma

45

auto-imagem sólida como concreto, Tina perpetua a baixa estima que tem de si mesma.
Firme no processo de continuamente redoutrinar-se, ela se alimenta do que está errado. A
menos que sua convicção sobre si própria se modifique, sua neurose tenderá a crescer com
a idade. Com o passar dos anos ela aumentará sua coleção de provas contra si mesma. Mas,
se em lugar disso Tina tivesse sentido que seus pais a aprovavam, poderia reconhecer seus
talentos, pois seus êxitos a fariam acreditar em seu próprio valor.
Um outro aspecto positivo do sentimento de ser amada é que a confiança em si própria
permite à criança aceitar a ausência de certos talentos, sem colocar em perigo a auto-estima.
Por gostar de si mesmo, Mark não acredita que deva ser perfeito. Ele não vê as suas
deficiências como provas de inadequação pessoal, mas como áreas nas quais pode crescer.
A baixa estima que June tem de si mesma, pelo contrário, faz com que ela utilize todas as
suas fraquezas como uma arma contra si mesma. Ela espera a perfeição, e nada do que faz é
suficientemente bom.

A baixa auto-estima está ligada a exigências impossíveis do eu.

Todos nós encontramos pessoas que parecem incapazes de superar suas inadequações. É
surpreendente observar as manobras mentais que estas fazem para ignorar suas próprias
habilidades. Temos, por exemplo, a jovem convencida de que é burra, embora os testes de
inteligência mostrem o contrário. Há, também, a mulher bonita que acredita ser feia; o
homem que vê rejeição em situações que os outros interpretam de maneira diferente, e a
pessoa de grande competência que sempre fica aquém de seus objetivos para poder
alimentar a idéia de inabilidade. De qualquer maneira, tais pessoas não conseguem acreditar
que têm algo a oferecer. Por quê? A necessidade de coerência interior as leva a proteger e a
preservar a auto-imagem formada anteriormente.

46

Se os que têm uma baixa auto-estima pudessem admitir os reflexos positivos, a convicção
de que não são amados, que serve de base às suas vidas, teria de ser modificada. Isso
significaria a reorganização de suas convicções básicas sobre si mesmos.
Abrir mão da identidade que cultivaram durante anos, mesmo que essa auto-imagem seja
insatisfatória, é desnorteante. Viver com o que se conhece, mesmo sendo desagradável, é
mais seguro. A pessoa que se apega a uma identidade negativa se protege das grandes
mudanças, já que as vê com desconfiança. A mudança implica tentar o que é novo,
aventurar-se no desconhecido; significa abrir mão da segurança das coisas familiares.
A pessoa que viveu com a rejeição e o fracasso tem um medo ainda maior da mudança
porque a novidade pode trazer mais notícias ruins. E ela já teve muitas notícias más. Em
contraste, a pessoa com experiências positivas tem uma base para acreditar que a mudança
lhe trará coisas boas.
Ocasionalmente, encontramos crianças (ou adultos) cujo autoconceito parece estar fixado
numa direção positiva. Elas se comportam como se fossem uma "dádiva de Deus à
humanidade". A imagem que têm de si mesmas, evidentemente, não é exata, pois não existe
um ser humano perfeito. Mas tais pessoas filtram os indícios de suas imperfeições.
(Lembre-se: uma auto-estima elevada não significa pretensão.)
Esse autoconceito aparentemente "positivo" disfarça sentimentos profundos de
inadequação. Não tendo uma imagem realista de si mesma, essa pessoa entra em conflito
com as outras" e com seu ambiente. Por se recusar a admitir fraquezas, não pode superá-las.

Detalhes específicos da rigidez


Vejamos algumas dúvidas que o leitor poderá ter sobre os autoconceitos rígidos.
Se alguém está convencido de que não é amado, essa atitude pode ser modificada?

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Sim, pode. Lembre-se: os autoconceitos são aprendidos, não herdados. Isso significa que as
atitudes para consigo mesmo podem ser modificadas numa direção positiva. O principal
requisito para essa modificação, porém, são as experiências positivas com pessoas e com a
vida. Para sentir-se amada, a criança deve conhecer a aceitação dos que a cercam (ver
Segunda Parte); para sentir-se competente e digna, deve ter êxito em seus esforços.
Se seu filho tem uma baixa opinião de si mesmo, é fácil pensar: "Meu Deus, ele está
perdido!", mas não está. Todo ser humano tem uma espantosa flexibilidade e uma grande
capacidade de crescimento. Os orientadores que ajudam as pessoas em dificuldade
surpreendem-se, com freqüência, como estas se comportam de maneira positiva, apesar dos
problemas que enfrentaram.
Embora uma criança tenha passado por muitas experiências negativas, ela geralmente reage
bem a um clima positivo e ao "sol" dos reflexos positivos. Os arquivos dos terapeutas estão
cheios de relatórios sobre crianças (e adultos) que, tendo apenas uma hora desse "sol" por
semana, fazem progressos enormes nas suas auto-imagens. Pense nisso por um momento.
Apenas uma hora em aproximadamente cem horas de vigília por semana, durante um ano
ou dois, pode ajudar uma criança a modificar a sua auto-imagem. Que testemunho da
enorme capacidade de aprendizado do ser humano! Isso também evidencia que o homem só
precisa de um pouco de "sol" a cada semana para florescer.
Os pais que transmitem aos seus filhos reflexos estimulantes constatam surpreendentes
mudanças positivas num tempo relativamente curto, mesmo quando esses estímulos só são
dispensados aos filhos na adolescência. Muitas vezes, sem qualquer alteração do ambiente
doméstico, uma criança de baixa auto-estima faz progressos significativos quanto a uma
visão mais positiva de si mesma, se ela tiver à sua volta professores, parentes ou amigos
que lhe proporcionem um clima estimulante.
De que modo algumas crianças desenvolvem opiniões rígidas sobre sua inadequação?

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Um dos fatores pode ser a hereditariedade. Se você já teve mais de um filho, provavelmente
terá observado que as suas palavras e os seus tons têm muito mais impacto com uns do que
com outros. Algumas crianças, em virtude de peculiaridades de seu sistema nervoso, são
mais sensíveis ao ambiente que as cerca – aos alimentos, à luz, cor, som, aprovação ou
desaprovação. Cada criança tem um legado genético único e reage de acordo com ele.
Algumas são menos sensíveis aos golpes da vida e por isso têm capacidade de enfrentar
maior volume de experiências negativas antes de sentir as conseqüências. Elas
simplesmente reagem com menor intensidade.
Além disso, a possibilidade de cristalização da baixa auto-estima depende de quão cedo a
criança recebe reflexos negativos, da freqüência e intensidade desses reflexos e de quantas
fontes ela os recebeu.
Em que idade a rigidez começa a manifestar-se?
Como já vimos, aos cinco anos a criança já tem uma opinião formada sobre si mesma,
como pessoa. Se essa atitude se torna ou não rígida nessa ocasião, ou mais tarde, depende
de muitos fatores: sua hereditariedade, suas experiências e a maneira pela qual ela os
organiza. É necessária, porém, a convergência de muitos fatores num mesmo ponto para
provocar a rigidez. Nenhum fator ou experiência isolada é responsável, apesar do que
afirmam os filmes e romances dramáticos.
Em quanto tempo a rigidez pode ser quebrada?
A resposta depende do fator individual. Quanto menor o número de fatores hereditários que
operam contra a pessoa, menos tempo levará. Quanto mais cedo a criança receber reflexos
estimulantes, e quanto mais reflexos positivos ela tiver, menos tempo será necessário para
modificar o desagrado que sente por si mesma. Além disso, certas defesas provocam maior
sofrimento do que outras. Quanto mais dolorosas são as defesas da criança, mais ela
desejará modificar sua atitude básica para consigo mesma.
A superação de uma baixa auto-estima só poderá ser feita com ajuda profissional?

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A terapia poderá ser necessária se a atitude negativa estiver firmemente cristalizada. Mas,
como o caso do sr. W. mostra, as experiências de vida bastam, por si só, para proporcionar,
em muitos casos, os ingredientes terapêuticos para o crescimento positivo.
De modo geral, o sr. W. sentia-se bem consigo mesmo. Aos cinqüenta anos começou a
trabalhar para um supervisor que simplesmente não se contentava com coisa alguma. O sr.
W. era o "sujeito errado" e lentamente passou a perder a confiança em si mesmo. Tornou-se
tenso, retraído, reservado. Depois de ficar sete anos nesse clima negativo, ele mudou de
emprego. Na nova firma, suas idéias e experiências foram muito bem recebidas, e ele foi
considerado como um elemento de valor para a companhia. Sua autoconfiança voltou, e
mais uma vez ele se tornou comunicativo, confiante, tranqüilo.
As experiências do sr. W. são o exemplo clássico do poder que os espelhos têm sobre a
auto-estima. Os reflexos negativos podem destruí-la; os estimulantes podem fazê-la
reaparecer. Esse caso ilustra novamente que o conceito que temos de nós mesmos é
influenciado pelo tratamento que recebemos dos outros, o que afeta o nosso
comportamento. Mostra ainda que algo tão simples como uma mudança positiva de
trabalho pode ser tão terapêutica quanto centenas de horas de orientação.
Muitas mães, que fizeram dos filhos o seu único interesse na vida, passaram por uma
experiência semelhante. Quando os filhos deixam a casa, elas subitamente se sentem
abandonadas e sem importância. Seu autoconceito passa a ser: "Agora, tenho pouco a
oferecer", e com essa nova opinião sobre si mesmas vem a redução da auto-estima. Se elas
se dedicarem ativamente a um trabalho ou passatempo significativo, seu senso de valor
pessoal retornará. Ao sentir mais uma vez que são necessárias, sua alegria de viver se
renova.
A aposentadoria, para uma pessoa cujo trabalho teve papel importante na vida,
freqüentemente provoca uma redução na auto-estima, a menos que ela encontre novas
atividades que lhe proporcionem um senso de realização.

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Há muitas circunstâncias que impedem o aparecimento da baixa auto-estima: uma família


compreensiva, um professor que nos respeite como pessoa, um emprego particularmente
adequado aos nossos talentos, um amigo ou cônjuge carinhoso e confiante, uma filosofia
religiosa que tenha sentido para nós, uma atitude introspectiva e questionadora em relação
aos nossos pressupostos básicos sobre nós mesmos, a leitura de obras significativas, e a
terapia individual ou de grupo. Cada uma dessas situações, na realidade, pode contribuir
para livrar uma pessoa da armadilha da baixa auto-estima.
Qualquer situação de vida que leve um indivíduo a se sentir mais valorizado como pessoa –
que confirme o fato de ser uma pessoa única – alimenta a auto-estima.
A rigidez, portanto, bloqueia o crescimento e limita o desenvolvimento do potencial.
Quando a criança gosta de si mesma, pode absorver novas evidências sobre si durante seu
crescimento. Ela sabe que tem possibilidades não-desenvolvidas e não tem medo de novas
experiências. Seu potencial tem, assim, uma oportunidade de realizar-se. A criança que se
sente basicamente sem qualidades para ser amada apega-se a essa identidade negativa e não
registra as evidências de competência que possam surgir. Ela terá condições de
desenvolver-se apenas quando esse ódio a si mesma desaparecer.
Num certo sentido, uma auto-estima elevada é uma apólice de seguro; é a nossa melhor
garantia de que a criança utilizará suas capacidades da melhor maneira e continuará aberta
às inovações. É da maior importância que verifiquemos, em nossos espelhos, a qualidade
dos reflexos que emitimos, pois podemos "poli-los" de modo que nossos filhos não caiam
na armadilha da baixa auto-estima.

6 POLIMENTO DOS ESPELHOS DOS PAIS

Visão através de filtros


De certo modo, todos nós vemos nossos filhos através de filtros resultantes de nossas
experiências, necessidades pessoais e valores culturais. Tudo isso se combina para formar
uma rede de expectativas. E

essas expectativas podem tornar-se os critérios com os quais medimos uma criança.

Saber o que esperamos, e por que, é o primeiro passo para polirmos nosso espelho como
pais. Vamos examinar alguns filtros comuns e ver como influem sobre nosso
comportamento.

Inexperiência
Como cada criança é diferente de outra, todos usamos, em certa medida, o filtro da
inexperiência. É comum, porém, sentirmos essa inexperiência de forma mais aguda com o
primeiro filho. A sra. B, por exemplo, explode ao ver que o quarto do filho fica sempre
desarrumado, depois que ele acorda. E diz ao garoto que ele é um menino mau. Alguns
anos depois, a grande desordem deixada pelo seu terceiro filho não mais a surpreende. Na
verdade, se ela encontrasse o quarto arrumado, desconfiaria de que ele não estava

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passando bem. A simples experiência com crianças na idade pré-escolar e com a


capacidade delas de se adaptarem à realidade modificou-lhe as expectativas. Ela julgava o
comportamento de seu terceiro filho de acordo com a experiência, considerando-o normal.
Sua atitude, em ambos os casos, resultou de suas expectativas.

Padrões emprestados
Muitas de nossas expectativas são inconscientemente tomadas de empréstimo. Uma noção
muito popular é a de que uma criança tranqüila é uma criança "boa". E nossa aceitação
varia em relação ao barulho que ela faz.
As expectativas que nossos pais tinham a nosso respeito são consideradas por nós como
guias. Essas imagens emprestadas nos permitem agir sem pensar, questionar ou fazer
experiências com o comportamento natural das crianças. Tal atitude economiza energia,
mas tem um preço a ser pago.
Inúmeras são as idéias que tomamos de nossa cultura. "Meninos não choram", "meninas
devem brincar com bonecas; meninos, nunca"; "Irmãos e irmãs devem sempre se amar";
"Os filhos não devem nunca se irritar com os pais"; "os meninos devem ser atletas".
Estamos continuamente avaliando as crianças por meio desses padrões, por menos realistas
que eles sejam.
Os pais de classe média dão grande valor aos êxitos rápidos na escola, ao respeito à
propriedade, à limpeza, à sociabilidade e ao controle sexual. Por mais desejáveis que tais
objetivos possam ser, esperar que eles sejam adotados pelas crianças que ainda não têm a
idade apropriada, ou ainda em todas as circunstâncias, ou esperar que as crianças aprendam
da primeira, da segunda, ou da terceira vez, é o mesmo que condicionar nossa aprovação à
realização do impossível. Nesse caso envolvemos a criança num esforço superior à sua
capacidade, minando sua auto-estima. Se pressionarmos para que tais objetivos sejam
alcançados cedo demais, ou

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depressa demais, estaremos afetando a imagem que cada criança têm de si mesma.

Desejos remanescentes
Algumas de nossas expectativas em relação aos nossos filhos procuram satisfazer nossos
próprios desejos frustrados. Uma mãe contou, chorando, a seguinte história ao orientador
da escola secundária de sua filha: "Economizei durante meses para dar a Ginny um
conjunto de suéter e saia de cashmere, e ela o trocou porque nenhuma de suas amigas usava
isso! Quando eu tinha a idade dela, teria dado qualquer coisa por uma roupa como aquela.
Como pude ter uma filha tão ingrata?"
Um sonho não-realizado fez com que essa mãe esperasse gratidão. O seu desejo
remanescente a impediu de compreender que as necessidades da filha eram diferentes das
suas.

Desejos atuais
Podemos tratar nossos filhos de maneira a que satisfaçamos um desejo nosso atual. A sra.
T., por exemplo, anseia por aprovação. Ela necessita ser aprovada por todos. Se uma visita
é favorável à disciplina rigorosa, ela se torna uma verdadeira ditadora com os filhos. Se a
visita é muito tolerante, ela deixa as crianças fazerem qualquer coisa. Sua reação com os
filhos – resultado de sua necessidade atual não-satisfeita – depende das pessoas que estão
presentes.
Se ansiamos por ter posição social, e não conseguimos obtê-la através do nosso esforço
próprio, podemos, inconscientemente, pressionar nosso filho a preencher a lacuna.
Podemos pretender que ele tenha ótimas notas, que seja o melhor jogador de sua classe, ou
que seja eleito para qualquer coisa; tudo devido aos

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reflexos que sua glória nos trará. Ele deve sobressair para satisfazer nossas necessidades.
Por outro lado, podemos ter colhido muitas honras em nossa própria vida. Mas, se
consideramos os filhos como extensão de nós mesmos, e não como indivíduos à parte,
podemos achar que o brilho de nossa estrela estará prejudicado se nossos filhos não se
destacarem também. Nossa expectativa é de que qualquer coisa ligada a nós deve brilhar
com a mesma intensidade.
As carências em nossa relação matrimonial constituem outra série de filtros. Se nos
sentimos pouco amados ou pouco apreciados pelos nossos cônjuges, podemos cair
facilmente na armadilha de tentar fazer com que nossos filhos satisfaçam tais necessidades.
E nos colocamos contra eles, se tal satisfação não ocorrer. Quanto mais satisfatório o nosso
casamento, menor será a nossa inclinação de pedir aos filhos que preencham os vazios.
Conflitos não-resolvidos
As expectativas que temos em relação aos nossos filhos nos ajudam, com freqüência, a
solucionar problemas não resolvidos na nossa infância. A maioria dos pais cria os filhos à
base de suas próprias necessidades e não da dos filhos. Um conceito um tanto desagradável,
mas verdadeiro.
Quando menino, o sr. P. teve que lutar constantemente com um irmão mais velho e
dominador. Ele nunca se entendeu bem com esse irmão, nem perdeu a vontade de ir à forra.
Sem compreender isso, encontrou uma excelente oportunidade de vingar-se por meio de
seu filho mais velho. Quando o seu filho mais velho dominou o mais novo, as lembranças
do sr. P. foram despertadas. Censurou o filho com exagerada severidade. Não sabia por que
estava fazendo isso, como também o filho não sabia, embora sobre ele recaísse o peso de
um conflito não-solucionado. Mas os problemas não-solucionados do pai afetaram a auto-
estima do filho.

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Impacto das expectativas na auto-estima


Nossos filhos medem sua capacidade pelos padrões que nós lhes oferecemos. O valor que
atribuem a si mesmos tem como base a extensão em que conseguem satisfazer nossas
expectativas.
Um modelo básico encontrado nos lares de crianças que se tornam adultos alcoólatras são
as expectativas altas demais para serem alcançadas. Constantemente sentindo-se incapaz, a
pessoa conclui: "Sou inútil". Não encontrando em si habilidades que sejam dignas de
admiração, ela se volta para o álcool, utilizando-o como muleta para formar um sentido de
adequação. A forte dependência e a baixa auto-estima a fazem iniciar um procedimento
que, afinal de contas, é o da autoderrota.
Os fracassados vêm, freqüentemente, de famílias em que há uma pressão constante para
que tudo seja feito da melhor maneira. O pai e a mãe exigentes dizem, indiretamente, ao
filho: "Tenho pouca confiança em você" e "Você não está correspondendo".
Quase sempre que as expectativas são elevadas ou rígidas demais para serem alcançadas
por uma criança, numa determinada idade e em determinadas circunstâncias, ficamos
decepcionados. E a nossa decepção age como um cupim: come as bases do auto-respeito,
derrubando a auto-estima.

As crianças raramente questionam nossas expectativas; elas questionam a sua própria


adequação pessoal.

Isso significa que para evitar danos à auto-estima devemos jogar fora toda e qualquer
expectativa? Absolutamente não! Assim como as expectativas muito altas fazem a criança
sentir que é um fracasso constante, também a falta de expectativas é interpretada como:
"Por que esperar alguma coisa de você? Você provavelmente não conseguiria, de qualquer
modo." Essa falta de confiança acaba com o sentimento de valor da criança.
Nossos filhos sentem a força de nossas expectativas; e estas afetam diretamente a idéia que
eles fazem de si mesmos. Robert

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Rosenthal, psicólogo de Harvard, verificou que as crianças cujos professores manifestavam
confiança na sua capacidade de aprender tinham QI de 15 a 27 pontos a mais do que as
outras. A valorização não-verbal tornou-se um reflexo positivo para cada criança,
permitindo-lhe dizer: "Eu posso fazer." A confiança do professor transformou-se na
confiança da criança. A linha adequada a ser seguida consiste na combinação das
expectativas realistas com uma grande confiança em cada criança.
A aprovação condicional – "corresponda às minhas expectativas, ou não terá amor" –
destrói o auto-respeito. Mike é, pela sua constituição física, um menino quieto e estudioso,
mas ele sabe que seu pai prefere atletas extrovertidos. Para conseguir aprovação, Mike tem
de abrir mão de suas inclinações naturais e lutar para corresponder à imagem que o pai faz
do que seria um filho digno de seu amor.
A confiança que a criança tem em si mesma é a semente que lhe permite florescer. Quando
ela cede para corresponder às expectativas preconcebidas, que não levam em consideração
seu temperamento essencial, seu auto-respeito é prejudicado. Ser verdadeiro consigo
mesmo significa manter a integridade de sua constituição; é a raiz básica de sua
estabilidade. A submissão às expectativas que são contrárias à natureza da pessoa sempre
provoca danos. Expectativas rígidas, pouco realistas, correspondem a uma imposição: "Seja
o que eu preciso que você seja. Não seja você mesmo!”

A confiança das crianças deve estar no que elas realmente são, e não nas imagens dos
outros.

A tragédia da perda do eu
Um exemplo eloqüente e trágico de uma criança que enfrentou o dilema de corresponder às
expectativas pouco realistas de seus pais, ou não ter amor, pode ser visto neste resumo de
uma entrevista de orientação: Um menino de quinze anos, que morava com os pais, cujos
padrões eram rígidos, autoritários e de modo

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algum adequados à natureza do jovem, disse: "Estou totalmente resignado. Não há nada que
eu possa fazer em relação aos meus pais. Não posso fazer com que se modifiquem, portanto
eu é que tenho que mudar. Qualquer coisa que eu sinta ou queira ser... bem, isso apenas
representa problema. Eu realmente só tenho uma escolha: tenho de seguir o caminho que
eles desejam “
"É claro que outros meninos são totalmente dominados pelos seus pais, portanto eu não
serei o único. Mas sabe de uma coisa? Acho que alguma coisa morre nesses meninos. Você
sabe, eu morri há muito tempo... Acho que morri quando nasci. Aquilo que eu realmente
sou não pode agradar à minha família, nem a ninguém. Como é que a gente se livra do que
é?"
Esse menino resignou-se, tristemente, a seguir o caminho estabelecido. Sem jamais
questionar as expectativas dos pais, ele é que se considerava sem razão. Ele é a tragédia do
eu perdido.
Contudo, ele tinha consciência de que, quando os meninos tomam essa decisão, sofrem uma
morte psicológica. Estava disposto a esse "suicídio" para conseguir a segurança de uma
aceitação e de uma paz aparente. Em sua ingenuidade e imaturidade, porém, tinha uma
comovedora consciência de uma profunda verdade psicológica: muitas crianças não
sobrevivem psicologicamente à tirania da imagem que os pais fazem delas!
Quando as expectativas contrariam a natureza da criança, forçam-na ao dilema de ser ou
não ser ela mesma. Se preferir corresponder às imagens dos pais, ela rejeita a si mesma; e,
enquanto negar o seu eu verdadeiro, será uma pessoa vazia – uma cópia das expectativas
dos outros. Será privada de se tornar a única pessoa que realmente deveria ser – ela mesma!

O duplo dilema
Muitas crianças enfrentam um duplo dilema quando seus pais têm imagens diferentes para
o tipo de filho que poderiam amar.

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A imagem que o sr. R. tem de um filho aceitável é de uma criança extrovertida e agressiva.
A preferência da sra. R. é por um filho apegado a ela e carente. O menino sairá perdendo
seja qual for a imagem que pretenda adotar. Nesse meio tempo, a pessoa, que ele é
verdadeiramente, poderá se perder nessa oscilação.

Receita de dependência
Imagine que seus planos são de tal ordem que o seu filho possa corresponder a eles, ainda
que com grande esforço. Você estabelece quais devem ser os sentimentos, atitudes, valores
e metas dele. Você é quem sabe melhor e você ensina ao seu filho a não ouvir os próprios
desejos interiores. Ele se torna um joguete altamente dependente, movimentando-se de
acordo com as cordas que você puxa. A recompensa dele? A aprovação materna (lembre-
se: a aprovação é vital, especialmente para uma criança pequena). O menino coloca, então,
o seu centro de gravidade psicológico fora de si mesmo. Outros têm as respostas de que ele
precisa, e sua autoconfiança jamais tem a oportunidade de se desenvolver. As imagens
rígidas e as expectativas muito grandes dos pais criam enormes obstáculos no caminho para
chegar à personalidade verdadeira. São a causa do "eu perdido".
Crianças muito dependentes não se transformam em adultos emocionalmente maduros,
confiante. O país sofre quando uma grande proporção de seus cidadãos é muito dependente.
As democracias precisam de adultos confiantes, que tenham a coragem de afirmar as suas
convicções. As crianças com uma grande auto-estima tornam-se os adultos dotados de tal
coragem. Com as suas energias livres para enfrentar os problemas exteriores a eles, podem
contribuir de maneira significativa para o seu país. E nenhum país pode correr o risco de
perder seus cidadãos.

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Expectativas realistas
Se padrões muito altos ou demasiado baixos prejudicam o auto-respeito, como podemos
saber se os nossos são realistas?
As expectativas são adequadas quando se baseiam nos fatos relacionados com o
desenvolvimento da criança, com a observação atenta e a consideração do passado da
criança, e com as pressões a que ela está sujeita no presente.
Não podemos saber o que seria razoável esperar enquanto não sabemos como são as
crianças em geral. Os pais de Ted esperavam, constantemente, um adulto em miniatura, em
lugar de uma criança. Ficavam irritados quando ele não suportava as longas excursões
feitas para educá-lo, ou esperar pelo atendimento num restaurante. Ficavam aborrecidos
quando seus sapatos e calças pareciam sujos no espaço de uma semana. Não entendiam a
sua incapacidade de pegar no sono na hora de dormir quando passava a noite na casa dos
primos. Situações comuns, insignificantes – mas multiplicadas – davam a Ted doses diárias
de reflexos negativos. Não era culpa de ninguém: os pais simplesmente não sabiam como
as crianças se comportam.
Não só devemos saber como são as crianças, como também devemos conhecer as
preocupações que têm a cada fase de crescimento. Assim, as nossas expectativas não se
chocarão com as exigências do crescimento.
Saber o que uma criança normal pode ou não fazer, porém, não é suficiente para formular
expectativas realistas. Ninguém vive com uma criança-em-geral. (A vida seria muito mais
simples se assim fosse!) Cada criança dá um caráter especial ao padrão geral de
crescimento. E devemos estar atentos para isso. Tratar as crianças como se elas viessem da
linha de montagem equivale a não respeitar a sua individualidade. Conhecer as tendências
básicas da criança de quatro anos é útil, mas deve-se estar atento para ver como, por
exemplo, Charlie se comporta nessa idade. A observação atenta é um dever.

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A média das expectativas sempre leva em conta as pressões passadas e presentes. A maioria
das pessoas tende a fazer isso, em grande parte.
"As notas de Billy caíram este semestre, mas ele teve problemas com a morte do avô. Eles
eram muito ligados.”
"Danny passou a chupar o dedo, mas isso não me surpreende, pois ele está se adaptando ao
irmãozinho novo.”
"Agnes anda tão rabugenta ultimamente, mas ela está sob muita pressão em seu curso
intensivo. Ela sempre foi a primeira da classe, mas agora deixou de ser. Deve ser difícil
para ela."
Cada um dos pais que fizeram essas afirmações condicionou sua atitude ao exame das
pressões que seus filhos sofrem. Saber que o comportamento tem uma causa, e examinar
periodicamente o mundo da criança do ponto de vista dela, nos ajuda a determinar, com
acerto, o que devemos esperar. Quando as pressões interiores ou exteriores são fortes, todos
nós apreciamos uma certa tolerância daqueles com os quais vivemos.

Inventário das expectativas


Como as nossas expectativas afetam a qualidade de nosso "espelho", devemos examiná-las.
Fazendo um exame interior, podemos descobrir um dos vários filtros que afetam nosso
comportamento para com nossos filhos. Poderemos, então, analisar esse comportamento,
em lugar de reagir cegamente com expectativas que só atendem às nossas necessidades.
Durante os próximos dias observe o seu comportamento em relação a cada um de seus
filhos. Procure identificar as suas expectativas. Escreva cada uma delas num papel e
analise-as à luz das seguintes indagações:
Por que tenho essa expectativa?
De onde ela vem?
O que existe nela que pode me satisfazer?
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Baseia-se nas minhas necessidades, ou nas de meu filho?


Que finalidade ela tem?
Ela se adapta, realísticamente, a essa criança, na sua idade e com seu temperamento e sua
formação?

Um inventário sincero pode ser doloroso, mas é o prenúncio da mudança. A auto-estima de


seus filhos está em jogo.

Trabalhando com o inventário


Examine cada expectativa, procurando avaliar se é razoável. Que significado ela tem na
realidade, para você e para seu filho?
Talvez você venha insistindo em fartos desjejuns, enquanto seu filho prefere alguma coisa
mais leve. Ao examinar essa expectativa, você compreende que ele come bem no almoço,
no jantar e depois da escola. Raramente adoece, seu peso é normal. Resultado? Você pode
abandonar um padrão emprestado.
Corte todas as expectativas que vem formulando cegamente e que não têm significado real
para você e para seu filho.
Verifique novamente a sua lista para ver quais as expectativas que satisfazem apenas às
suas necessidades. O sr. e a sra. J., por exemplo, eram contrários ao desejo que seu filho
tinha de voar. Apoiavam qualquer outra atividade saudável. O instrutor da escola disse-lhes
que, entre todos os alunos do seu clube de navegação aérea, nenhum era mais interessado
ou mais talentoso que o filho deles. Depois de muita discussão, enfrentaram a questão real.
Suas expectativas eram produto do medo de voar que eles tinham. Decidiram que o filho
tinha o direito de viver sua própria vida, sem ser perturbado pelo medo que eles sentiam.
Deixaram de lado suas objeções e deram todo o apoio ao seu talento genuíno.
Para ajudar seu filho a crescer forte, também você deve ser capaz de abandonar as imagens
que não se harmonizam com a individualidade dele. Você poderá abandonar seu sonho de
ter um filho engenheiro, quando seu filho gosta realmente é de animais? Será que

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Betty tem que continuar sendo escoteira, se não gosta disso? E Tom, tem que estudar
música porque você pensa que é uma boa idéia?
Cada um de nós tem necessidades que não podem ser rejeitadas ou taxadas como pouco
importantes, e que devem ser satisfeitas pelos nossos próprios esforços. Sem isso, corremos
o risco de pedir, inconscientemente, a nossos filhos que as satisfaçam.
Pergunte a si mesma: "Será que me sinto amada? Tenho uma sensação de realização
pessoal, de reconhecimento e de adequação no meu relacionamento com adultos?" (Isso
não quer dizer que as crianças não nos dão amor, um sentimento de participação e de
realização. É de esperar que o façam. Mas a questão é que elas não devem ser
sobrecarregadas com a tarefa de serem nossos únicos fornecedores nessas áreas.)
Examine cada expectativa para ver se ela pode atender aos seus desejos ocultos, aos seus
desejos remanescentes, ou aos seus problemas não-resolvidos. Tenha cuidado, pois é fácil
disfarçar uma necessidade que é sua e vê-la como uma necessidade de seu filho.
Parentalidade significa "alimentar", nutrir as crianças com os "alimentos psicológicos" que
as ajudem a construir o auto-respeito. E nossa tarefa será mais bem executada se nós não
estivermos famintos – psicologicamente; ou seja, se as nossas necessidades forem
satisfeitas pelos nossos próprios esforços.

A alimentação é proporcionada pela abundância, não pelo vazio.

Quanto mais satisfeita você estiver como pessoa, menos usará seus filhos como cortinas
protetoras pessoais.
Se você achar que está usando os filhos como sua principal fonte de satisfação, terá de
modificar essa situação.
Antigamente, a terapia era considerada adequada apenas para os doentes mentais. Hoje,
porém, a orientação psicológica é encarada, cada vez mais, como um recurso que pode
libertar as pessoas de uma auto-estima insuficiente e das expectativas rígidas, ajudando-as a
desenvolver seu potencial de vida de forma mais plena

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e rica. A terapia individual, ou em grupo, a educação dos pais e as aulas de


desenvolvimento do potencial pessoal atraem um grande número de pessoas que não são
mentalmente doentes, mas que têm consciência da possibilidade de crescimento.

A comporta emperrada
A sra. L. confidenciou à sua vizinha: "Se meu filho não começar a se auto-afirmar, eu vou
explodir!".
A vizinha, que conhecia a sra. L. havia algum tempo, respondeu: "É preciso dar-lhe tempo,
ele tem apenas quatro anos. Mas quem é você para falar? Você deixa todo mundo pisar em
você.”
"É exatamente por isso. Não posso tolerar isso em mim e odeio ver essa atitude nele!"
Nossas atitudes para com os outros estão definitivamente ligadas às nossas atitudes para
com nós mesmos. Como disse Frederick Perls: "Fazemos com os outros o que fazemos com
nós mesmos." Se você é duro consigo mesmo, é duro com os outros. Se aceita-se a si
mesmo, pode aceitar aos outros. Quando você tem que lidar com as suas próprias
hostilidades, você é menos ameaçado pela hostilidade vinda de fora. Assim, a sua
capacidade de dar uma sensação de aceitação ao seu filho depende, em grande parte, da sua
capacidade de aceitar a si mesmo.

O caminho da auto-aceitação
Porque vemos os outros – particularmente os nossos filhos – à luz das atitudes que temos
para conosco, a análise necessária do espelho que proporcionamos inclui o exame de nossa
auto-estima. Quais as suas respostas à pergunta "Quem sou eu?"
Escreva os seus sentimentos sobre você mesmo. Que tipo de pessoa você é? Quais as
qualidades que vê em si mesmo, e o que

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sente em relação a elas? Você gosta, basicamente, de ser quem é, ou gostaria de ser outra
pessoa?
Se você não gosta de si mesmo, lembre-se de que essa atitude é aprendida. Lembre-se: a
baixa auto-estima não é um comentário sobre o seu valor, mas sim um reflexo dos juízos e
experiências que você teve. Você tem o poder de escolha para fazer alguma coisa em
relação à sua baixa auto-estima.
Assim como você não pode ignorar as atitudes que o seu filho tem para com ele mesmo,
também não pode ignorar as atitudes que tem para consigo próprio. A sua auto-imagem tem
um papel significativo na qualidade do espelho que você proporciona. Se você tivesse uma
deficiência de insulina ou de tiróide, sem dúvida tomaria medidas para corrigi-la.

É ainda mais importante corrigir uma deficiência na auto-imagem.

Para gostar de si mesmo, procure pessoas que o tratem com respeito, pois você precisa da
experiência de ser apreciado. Participe de atividades que lhe dêem uma sensação de
competência e realização. Se o seu auto-conceito tornou-se inflexível, de forma que você
não pode aceitar evidências positivas a seu próprio respeito, procure assistência
especializada. Ela poderá libertá-lo da rigidez da auto-estima deficiente.
Embora conviver com pessoas que gostem de você e ter experiências de sucesso sejam
importantes para o seu crescimento pessoal, é crucial que você não permita que os espelhos
dos outros influenciem totalmente a imagem que você faz de si mesmo. Todo ser humano
verá você, até certo ponto, através de seus filtros pessoais – de suas próprias necessidades
pessoais. É vital que você se lembre que a imagem que qualquer pessoa faz de você é
apenas um dos muitos reflexos que encontrará. Mas a imagem dessa pessoa pode não ser
exata. Em suma, os espelhos dos outros podem conter algumas deformações.
A criança usa os outros para ter uma imagem de si mesma e tende a acreditar nesses
reflexos. Você, como pessoa adulta,

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também não pode ver a si mesmo sem os espelhos dos outros. Mas, como adulto, você pode
e deve ter em mente que a maneira pela qual é visto pelos outros pode ser, de certa forma,
deformada – os espelhos deles podem não ser totalmente exatos (1).
(1) Agradeço a Verne Kallejian por sugerir essa inclusão.
É de esperar que, à medida que adquirimos consciência da importância da auto-estima,
tomemos medidas ativas para fortalecer nosso respeito próprio. Nosso crescimento é
compensador, não só para nós, mas para incontáveis gerações futuras, pois nossos filhos
transmitirão sua auto-aceitação para os filhos deles e aos filhos de seus filhos. Desenvolver
o potencial que temos como seres humanos é um desafio para toda a vida. Ser ou não ser
você, plenamente – essa a questão de toda a sua vida.
Enquanto você se empenha em melhorar as suas atitudes para com você mesmo, seus filhos
não têm de ficar à espera. Coloque-os em contato com outros adultos e crianças que gostem
deles tal como são. Estimule as atividades que lhes proporcionam êxito. Eles precisam de
espelhos positivos, mas, se necessário, a sua autoconfirmação pode ser proporcionada por
outras fontes, além de você.

Segunda parte
O CLIMA DO AMOR
7 O ENCONTRO AUTÊNTICO

A "substância" da vida
Todos nós sabemos que as crianças precisam de amor. A receita parece simples e clara:
ame seus filhos e eles se sentirão amados. Essa recomendação nos é feita muitas vezes. Não
obstante, numerosas crianças cujos pais se interessam profundamente por elas não se
sentem amadas. Como isso pode acontecer?
Há uma confusão generalizada quanto ao significado da palavra "amor". Peça a uma meia
dúzia de pessoas que a definam e você, provavelmente, terá seis respostas diferentes. Mas a
confusão não fica só nisso. Pergunte às pessoas como acham que o amor é comunicado, e
novamente você encontrará uma grande variedade de idéias. Algumas crianças nunca
ouvem as palavras "eu te amo", mas sentem-se profundamente amadas. Outras,
mergulhadas na afeição verbal, sentem-se não-amadas. Assim, o conselho "ame seu filho"
deixa os pais no escuro, sem lhes dar nada de concreto com que trabalhar.
Antes de poder analisar o clima que você proporciona, precisa saber o que é o amor
estimulante e como ele se comunica.
O amor estimulante é o cuidado carinhoso – é a valorização da criança apenas porque ela
existe. Esse amor se manifesta quando você vê seu filho como alguém especial e querido –
embora você possa não aprovar tudo o que ele faz.

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Se você se sente assim em relação ao seu filho, então a questão fundamental é como
comunicar os seus sentimentos. Temos, em geral, noções muito vagas sobre como essa
substância básica da vida é comunicada. Antes de examinarmos os ingredientes específicos
que traduzem o amor aos filhos, é importante examinar alguns equívocos comuns.

Concepções erradas de amor


Muitas vezes achamos que os pais demonstram amor quando são afetuosos, colocam seus
interesses freqüentemente de lado em favor dos filhos, têm cuidado com eles,
proporcionam-lhes boas condições materiais, passam muito tempo com eles ou os tratam
como se fossem especialmente superiores. Esse comportamento, porém, não faz,
necessariamente, com que as crianças se sintam amadas.
Embora a afeição terna e o contato corporal estimulem o crescimento físico, mental e
emocional, essa afeição não assegura, por si só, que a criança se sentirá amada. O
tratamento frio e impessoal, em especial nos primeiros anos, prejudica todos os aspectos do
desenvolvimento; e, além disso, a afeição recebida, por si só, não convence a criança de
que é amada. A criança precisa de muito mais para ter certeza disso. Muitas crianças de
famílias afetuosas sentem-se não-amadas.
O pai, ou a mãe, que continuamente põe de lado as suas necessidades pessoais para
satisfazer a de seus filhos pode, aparentemente, estar dando amor. Mas esse comportamento
pode também mascarar um egoísmo intenso, uma baixa auto-estima, o medo de conflito e
até mesmo uma rejeição inconsciente. Ser uma espécie de satélite pessoal do filho muitas
vezes provoca ressentimento nos pais, e esse sentimento se comunica por meio da
linguagem corporal. Viver com martírio não é viver com amor.

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O pai e a mãe atenciosos que guiam e dirigem todos os aspectos da vida da criança
transmitem-lhe a idéia de que o mundo é cheio de perigos que ela não pode enfrentar. A
superproteção passa a mensagem "Você não é competente", e não "Você é amado". Ela
reduz o auto-respeito.
Os pais são aconselhados, com freqüência, a dedicar mais tempo aos filhos. No entanto, é a
qualidade do tempo, e não a sua quantidade, que afeta os sentimentos de ser amado. O sr.
H. passa horas com seus filhos, participando, com eles, de empreendimentos e jogos.
Superficialmente, esse tempo parece ser uma prova de dedicação. Mas, se observarmos
melhor, ouviremos uma série de comentários como estes:
"Vamos, Jimmy, é a sua vez, não demore!”
"Você não está segurando o serrote direito. Quantas vezes já lhe disse para segurá-lo
assim?”
"Por que você não joga a bola como seu irmão Quando você vai aprender a jogá-la com o
apoio do ombro?”
"Você estragou esta pintura. Vamos, deixe que eu faço. Pelo amor de Deus, desta vez fique
olhando como eu faço. Se for para você fazer alguma coisa, faça direito!"
As horas passadas com os filhos são cheias de críticas, falta de respeito, comparações e
exigências excessivas. Quanto mais tempo os filhos passam com pais assim, menos
adequados e amados se sentem. O tempo, por si só, não corresponde necessariamente a
amor.
Todos nós conhecemos pais que oferecem aos filhos generosas vantagens materiais.
Contudo, como disse o filho de uma dessas famílias: "Meu pai me dava o melhor de tudo.
Ele insistiu em que eu colocasse obturações de ouro nos dentes, embora pagar por elas
custasse sacrifício. Mas eu nunca me senti amado."
Esse pai dava ao filho tais vantagens por amor, ou para satisfazer as suas próprias
necessidades frustradas na infância? Fazia

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isso para corresponder à imagem que tinha do "bom" pai, ou para esconder, tanto de si
mesmo como da criança, a sua rejeição? As vantagens materiais podem ser oferecidas em
substituição ao amor. É mais fácil dar presentes do que dar alguma coisa de nós mesmos.
O sr. S. está convencido de que seu filho é excepcionalmente superior. Exagera as
realizações do menino e espera que ele realize coisas formidáveis. Observando o sr. S.
poderemos achar que está "cego" de amor pelo filho. Mas, no fundo, o menino sabe que a
imagem que o pai tem dele não é verdadeira e acha impossível corresponder às suas
expectativas. O filho começa a sentir-se incapaz e não-amado, como realmente é.
Atribuir à criança um papel que satisfaz às nossas necessidades, e não às dela, não constrói
amor. Toda criança tem de se sentir valorizada, quaisquer que sejam as suas realizações.
Se não tivermos cuidado, poderemos confundir afeição física, martírio, superproteção, altas
expectativas, tempo dedicado aos filhos e presentes materiais com provas de amor. Elas
podem, porém, obscurecer o carinho, a ponto de este não chegar a se manifestar.

Os ingredientes positivos
Quais são então os ingredientes ativos que transmitem o amor – o tipo de amor que permite
a uma criança desenvolver um senso profundo de respeito próprio?
O amor se evidencia, de maneira clara, quando proporcionamos encontro verdadeiro e
segurança psicológica. Examinemos, inicialmente, o tipo de encontro que estimula, e no
resto desta parte comentaremos os seis ingredientes que criam a segurança psicológica.
Para sentir-se amado, seu filho precisa de porções de cada um dos sete aspectos do amor
estimulante.

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Encontro autêntico
Toda criança precisa ter encontros autênticos, verdadeiros, periódicos, com os pais.

O encontro autêntico é simplesmente a atenção focalizada.

É a atenção com uma intensidade especial, nascida da participação direta, pessoal. O


contato vital significa estar intimamente aberto às qualidades específicas e peculiares de seu
filho.
Crianças muito pequenas demonstram, constantemente, uma atenção focalizada. Quando,
por exemplo, uma criança pequena observa uma lagarta, ela fica totalmente absorvida pelos
movimentos ondulantes do animal, pela maneira como ele come, etc. Fica pessoalmente
envolvida com as "particularidades" da lagarta.
O oposto do encontro autêntico é o distanciamento. Você não focaliza a sua atenção
intimamente; você se contém. Só vê à distância, evitando um envolvimento pessoal. Muitos
pais ficam fisicamente junto de seus filhos, mas, mentalmente, sua atenção está em outra
parte. A proximidade sem encontro autêntico não é a verdadeira proximidade.

Eles sabem quando a têm


As crianças são muito sensíveis ao grau de atenção focalizada que recebem. A sra. C. tinha
duas babás idosas, que à primeira vista pareciam tratar as crianças da mesma maneira. Seus
filhos, porém, preferiam claramente uma delas. Observando melhor, a sra. C. encontrou a
razão: a babá preferida participava de tudo com as crianças. Quando elas se aproximavam
com um inseto ou uma pedra que haviam encontrado, ela lhes dava a mesma atenção
concentrada que dava aos adultos.

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A sra. N. ficou surpresa quando Molly disse o que sentiu na noite de seu aniversário.
Depois do jantar, a mãe havia levado Molly para um rápido passeio. Mais tarde, ao ir para a
cama, Molly disse: "Adivinhe qual foi a melhor parte do dia?”
"Ganhar a bicicleta que você queria?”
"Não, gosto da bicicleta e a festa foi boa, mas a melhor coisa foi nosso passeio agora à
noite – andar de mãos dadas e conversar sobre tudo o que aconteceu durante o dia."
A atenção concentrada – participação direta, "presença" – é, a qualidade que transmite o
amor. Ela estimula o respeito próprio no que há de mais íntimo, porque ela diz: "Eu me
preocupo.”

Eles sabem quando não a têm


Para diminuir o ciúme que Barby tinha do bebê novo, a sra. D. passava algum tempo com
ela todas as tardes. A princípio a atitude da menina melhorou bastante, mas o ciúme voltou
logo com toda a força. A sra. D. não podia compreender por que o tempo que
especialmente lhe dedicava já não produzia efeito. E descobriu a razão. Quando começava
a cansar-se de brincar com a filha, a sra. D. usava esse tempo para falar consigo própria
mentalmente. Pensamentos como "Devo lembrar-me de tirar a torta do congelador" e
"Esqueci de escrever para Sara" passavam-lhe pela cabeça. Ela se transferia para o seu
mundo particular, e Barby percebia, imediatamente, o distanciamento.
Afastando a atenção das brincadeiras e dos seus planos pessoais, ela concentrou-a no nariz
arrebitado de Barby, em suas sardas, na luz que ia e vinha dos seus olhos. Abriu-se para a
"singularidade" de Barby. É claro que, na medida em que a sra. D. envolveu-se diretamente
com sua filha, o ciúme de Barby desapareceu.
As crianças são programadas para uma "presença interior". Sem ela, o tempo passado junto
aos pais é desperdiçado e até

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prejudicial. E, no entanto, com que freqüência damos presentes em lugar de presença!

Os problemas do não-encontro
A falta de encontro é facilmente interpretada como uma mensagem negativa.
Imagine-se conversando com o seu marido (ou com a sua esposa). Ele olha para você, mas
você sente que sua atenção está muito distante. Ele responde: "É, sim", "Sei", "É mesmo?".
Você sente, imediatamente, que ele deseja que você pare de falar para que possa continuar
a ler o jornal, a fazer seu trabalho, ou a dedicar-se aos seus pensamentos íntimos. Por mais
que ele diga que gosta de você, se essa reação ocorrer com muita freqüência, você
começará a pensar: "Ele não está interessado em mim. Ele não se importa – talvez ele não
me ame." O distanciamento constante é interpretado como falta de interesse tanto pelas
crianças como pelos adultos.
O contrário do amor não é o ódio, mas a indiferença. Nada comunica o desinteresse de
maneira mais clara do que o distanciamento. A criança não pode sentir-se valorizada por
pais que estão sempre absorvidos pelos seus próprios assuntos. Lembre-se de que

o distanciamento faz com que as crianças se sintam não amadas.

Por menores que sejam, as doses de encontro autêntico transmitem uma mensagem vital. A
participação direta, pessoal, diz: "É importante para mim estar com você." Do outro lado
dessa linha de comunicação, a criança conclui: "Eu devo ter importância, porque meus pais
dedicam tempo para se envolverem com a minha pessoa.”

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Excesso de ocupação neutraliza a "presença"


Quantos encontros autênticos você dá realmente aos seus filhos?
Nós, pais e mães, somos pessoas tão ocupadas! Temos tanta coisa em que pensar! É certo
que amamos nossos filhos, mas temos tarefas a executar, planos a cumprir, tanta coisa para
fazer, impostos e empregos, lavanderia e lixo, encontros e aulas – e assim por diante, até à
noite. Apressamo-nos em concluir uma tarefa para passar à seguinte da nossa lista. Mas o
excesso de ocupações dificulta os encontros humanos.
A sra. R. preocupa-se muito com seus filhos, mas no que ela pensa durante o café da
manhã? Ela resmunga: "É, é", para a história que Tom lhe conta, enquanto coloca um
grampo no cabelo de Kathy, dá uma olhadela rápida nas manchetes dos jornais, toma um
gole de café e tenta lembrar-se do bacon que está quase queimando.
A família senta-se à mesa para o café da manhã, e novamente Tom começa a tentar
comunicar uma experiência. Ela o interrompe: "Ah, é mesmo, Tom? Kathy, por favor,
incline-se sobre o prato, você está sujando tudo com migalhas de pão. Bobby, você fez os
seus deveres? Tom, você tem de trocar essa camisa, há uma mancha grande nela."
Não intencionalmente, sem compreender a importância do encontro, nós falamos, falamos,
falamos. O envolvimento profundo com nossos compromissos lá fora impossibilita a nossa
presença aqui, agora. Poucas pessoas vivem o presente com uma atenção concentrada.
Fechados no passado, ou concentrados no futuro, não estamos no presente que, afinal de
contas, é o único tempo que na realidade temos. Queremos estar em toda parte ao mesmo
tempo. E assim, num certo sentido, não estamos em parte alguma.

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Toda pressão que é eliminada representa tempo para você dedicar ao seu filho. Todos nós
devemos perguntar: "O meu comportamento dá prioridade a coisas e planos, ou a seres
humanos?"
Um menino definiu os avós como "pessoas que têm tempo para as crianças". O que ele não
disse foi: "Os pais estão, muitas vezes, preocupados demais para ter encontros autênticos
com os filhos.”

Qual é o seu enfoque?


Você se concentra tanto em fazer coisas para o seu filho que se esquece de se concentrar
nele como pessoa? Você corre tanto para preparar os doces, coser as roupas, ganhar
dinheiro para a educação dele, que se esquece de seu filho como pessoa?
Ou você reserva tempo – para aqueles momentos em que ele vem com um pensamento ou
uma emoção, ou durante um momento especial com o qual ele pode contar – para abrir-se
totalmente para ele? Essa pergunta é respondida todos os dias pelo seu comportamento.
Você pode perder de vista a maravilha que é o seu filho, se se preocupa com atividades,
com o passado ou com o futuro, em lugar de se preocupar com a "particularidade" dele
nesse momento.

Pratique seu enfoque


Se você está descontente com seus encontros, pode modificar o seu enfoque. Talvez você
tenha passado muitos anos correndo e concentrando-se nas coisas a fazer, e agora é difícil
passar para o estar-no-presente com a pessoa de seu filho. Se assim for, pratique o enfoque
do presente, a princípio em situações não-pessoais.

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Escolha uma ocasião em que esteja sozinho. Deixe de lado todos os outros pensamentos e
concentre-se no aqui-e-agora. Nada de planejamento, nem de lembranças.
Concentre-se totalmente na sua tarefa, seja ela lavar os pratos ou o carro. Fique
completamente receptivo à sensação da água. Olhe atentamente para as bolhas. Você vê
alguns reflexos? Imagine que está vendo a água molhar o carro, ou os pratos, pela primeira
vez. Quer esteja numa cadeira de balanço, ou dirigindo numa estrada, feche seu pensamento
a qualquer outra coisa e preste atenção – atenção concentrada – apenas no que vê, ouve,
cheira e sente naquele momento.
Em geral, nós só podemos ficar no momento, no aqui-e-agora, por rápidos períodos; depois
deles, nosso pensamento se perde. Mas pratique. Veja se consegue aumentar o tempo de
duração de sua atenção concentrada quando está sozinho.
Em seguida, pratique o estar aqui-e-agora com seu filho. Fique totalmente com ele, mesmo
que seja apenas por alguns minutos. Deixe tudo de lado, exceto o seu encontro direto. Olhe
para ele com novos olhos. Entregue-se a sua admiração por ele. Enquanto você não se abrir
para seu filho, no processo de transformação, de desdobramento e de evolução, você
realmente não o verá tal qual ele é. Quem é ele? Veja novamente com olhos de ver e
ouvidos de ouvir e com um radar sensível. Como é ele agora, neste momento? Verifique
constantemente a sua margem de "atenção concentrada". Pode ser boa este mês, mas sob a
interferência das pressões você pode esquecê-la.
Estar aberto para seu filho é uma habilidade que pode se transformar num hábito. O
encontro verdadeiro traz dividendos consideráveis, permitindo que seu filho se sinta amado.

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Quantidade de encontros
Com que freqüência as crianças precisam de encontros? Quanto mais freqüentes, melhor;
mas o encontro constante não é necessário. Não nos sentimos, habitualmente, rejeitados por
falta de atenção exclusiva. É quando os outros nunca têm tempo de estar realmente
conosco, que nos sentimos pouco importantes. Se seus filhos sentirem a sua presença total,
periodicamente, eles poderão tolerar os momentos em que a sua atenção está em outro
lugar.

O encontro reforçado
A criança precisa da atenção concentrada em maior dose quando está sob pressão. Fatos
novos como o nascimento de um irmãozinho, uma nova escola, uma mudança, competição
excessiva, e grandes decepções, serão mais toleráveis para a criança se ela tiver estímulos
de encontros verdadeiros com as pessoas que considera importantes. As tensões internas
que surgem quando as crianças sofrem mudanças significativas em seu desenvolvimento
são diminuídas pelo envolvimento direto de pessoa-a-pessoa. Esteja alerta para as ocasiões
em que seus filhos precisarem especialmente de sua atenção concentrada. Os encontros
verdadeiros com você reduzem muito a pressão sofrida por eles.

Encontros marcados
Quando você perceber que seu filho está sofrendo pressões interiores, ou exteriores, marque
com ele um encontro permanente em que possa comparecer. Podem ser vinte minutos por
dia, ou uma hora por semana. Esse entendimento é útil, quer seu filho precise dele ou não.
A mãe, que reservava as tardes de segunda-feira para ficar sozinha com a filha, contou que
a criança considerava esse momento como a sua "hora favorita".

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Muitas vezes nós só usamos a atenção concentrada quando há um comportamento
censurável. Nessas ocasiões, interferimos como um relâmpago. Mas as crianças precisam
de encontros vitais, mesmo em épocas tranqüilas. E é claro que, quanto mais a criança
estiver convencida de que você se interessa, menor será a probabilidade de que se comporte
mal.
Você pode dizer a uma criança, muitas vezes, que a ama, mas é a maneira pela qual convive
com ela, dia após dia, que prova esse amor.

Obstáculos ao encontro
Quanto mais realizado você for, mais fácil será oferecer atenção concentrada. As
necessidades interiores podem pressionar tanto que literalmente impeçam você de estar
com seu filho. É impossível estar meio atento e estar plenamente com outra pessoa, ao
mesmo tempo.
A auto-estima da sra. G. era extremamente baixa. Seu desejo de perfeição (sua condição de
auto-aceitação) influenciava sua opinião sobre tudo e todos. Tinha dificuldade em dedicar
tempo à filha porque tinha sempre alguma coisa a melhorar.
Mesmo quando estava a sós com Virgínia, dificilmente lhe dava atenção. Quando a filha
sorria, a sra. G. pensava: "Temos de começar a economizar para os dentes dela."
Observando o perfil de Virgínia, a mãe lembrava-se novamente de quanto havia desejado
que ela herdasse seu nariz arrebitado e não o nariz grande do pai. Quando olhava o cabelo
da filha, preocupava-se com a sua aparência. Sua fome de perfeição deixava-a cega às
singularidades da filha.
Quando você tem uma boa auto-aceitação fica mais livre para focalizar a atenção no seu
filho, sem ser pressionado por necessidades interiores. As inadequações pessoais não
impedem os

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encontros vitais, mas, se forem insistentes, será necessário maior esforço para deixá-las de
lado por alguns momentos.
O encontro autêntico é um fator poderoso para transmitir o amor aos filhos. Mas é apenas
um dos elementos essenciais. Se ele não for combinado com a segurança psicológica, não
surtirá efeito. Vamos examinar cada um dos seis aspectos da segurança isoladamente.

8 A SEGURANÇA DA CONFIANÇA

Antibiótico para a neurose


Nós não tentamos criar problemas para as crianças. Quando os sintomas aparecem - asma,
úlceras, más notas, ou promiscuidade - ficamos realmente surpreendidos.
Em geral, não temos consciência de que a neurose surge quando as crianças se sentem
inseguras. O fato de não sermos capazes de oferecer segurança pode ser um choque para
nós. Na verdade, pensamos na segurança apenas em termos físicos e ficamos no escuro
quando a segurança psicológica é mencionada. Não obstante,

o FUNDAMENTO do amor que alimenta é a segurança psicológica.


Combinado com o encontro verdadeiro, os seis ingredientes da segurança são antibióticos
contra as neuroses. Sem eles, as crianças aprendem a usar máscaras e são levadas à
alienação, às defesas doentias e ao crescimento deformado.

Uma advertência
Antes de examinarmos a segurança devemos fazer uma advertência: nenhum pai ou
nenhuma mãe pode oferecer um clima permanente

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de segurança para todos os filhos, em todos os momentos, porque pais perfeitos não
existem.
Por mais duro que seja admitir, todos nós temos deficiências que, às vezes, ferem aqueles a
quem amamos. Inevitavelmente, a convivência no meio psicológico e íntimo da família
gera atritos. Essa é uma realidade da vida. Felizmente, a maioria das crianças não é
excessivamente frágil. Seus ferimentos psicológicos saram e elas ficam novamente
perfeitas. São levadas a desenvolver interiormente o respeito próprio e, se tiverem
oportunidade, realmente o farão.

A primeira preocupação
Imagine-se sendo enviado subitamente para Marte e cercado de criaturas estranhas. Sua
primeira preocupação seria: "Estarei seguro? Como será este lugar? Poderei confiar nessas
criaturas?"
Toda criança que é lançada em nosso planeta está em condições semelhantes. Embora não
pense nesses termos, suas primeiras sensações lhe dizem se pode contar com a nossa ajuda
para satisfazer suas necessidades físicas e emocionais.

O fundamento da segurança é a confiança.

Sem ela, o crescimento posterior repousará em areias movediças, afetando todo o


desenvolvimento futuro.
A maioria dos bebês, embora nem todos, sente necessidades intensas e imediatas, e não
tolera as frustrações. A mãe que estabelece uma hora para alimentar o filho, atendendo às
necessidades deste, respeita os seus sinais de que está satisfeito, introduz aos poucos novos
alimentos e o desmama lentamente, ajuda o bebê a se sentir seguro. O respeito pelo modo
de ser da criança e a amizade criam a confiança.

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Mães tranqüilas ajudam seus filhos a se sentirem seguros. Alguns pais e mães são
verdadeiros feixes ambulantes de tensões, e seus filhos sentem isso. As tensões entre os
pais, verbalizadas ou não, e as tensões resultantes da inquietação emocional são
rapidamente sentidas pelas crianças. Elas devem ser solucionadas para que as crianças se
sintam seguras.
A confiança é criada de muitas maneiras. Deixe seu filho saber quando você sai e aonde
vai, e quando voltará. Evite surpresas desagradáveis. Ajude as crianças nas consultas ao
dentista, ao médico ou ao hospital, dizendo-lhes francamente o que podem esperar.
Prepare-os antecipadamente para a escola maternal e para o jardim-de-infância. Evite as
promessas que não podem ser cumpridas. Estas são apenas algumas recomendações para
criar um clima de segurança.

A armadilha da mensagem mista


Muitos pais ou mães podem provocar, inconscientemente, a desconfiança nos seus filhos
por deixarem de ser honestos com eles a respeito de seus próprios sentimentos. Vejamos
como isso acontece.
Bobby ao voltar da escola encontra a mãe lavando violentamente o chão da cozinha.
Inclinada sobre o esfregão, com os maxilares muito cerrados, ela levanta os olhos e diz
rispidamente: "Olá."
Sentindo imediatamente alguma coisa de errado, Bobby pergunta: "O que houve, mamãe?”
"Nada, Bobby", responde ela secamente.
Ele conhece a mãe o suficiente e prefere não dizer mais nada; mas sai pensando: "Meu
Deus, será que ela descobriu aquele sapo debaixo da minha cama? Ou está com raiva de
alguma outra coisa que eu tenha feito?"
A confusão de Bobby é compreensível, pois ele recebeu duas mensagens: uma das palavras
da mãe ("Nada"), e uma outra,

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contraditória, do seu tom e do seu corpo ("Alguma coisa está realmente errada"). Sempre
que as palavras contrariam a expressão corporal, a criança se vê numa armadilha mista. A
confusão a força a tentar adivinhar o que aconteceu.
Toda criança aprende a confiar primeiro nas indicações não-verbais. Quando estas entram
em choque com as mensagens verbais, ela naturalmente dá prioridade às primeiras. Confia
nelas, mas, ainda assim, tem de levar em conta as palavras.

As desvantagens das mensagens mistas


As mensagens mistas criam um clima de códigos e de máscaras que ensinam a
desconfiança.
Quando você leu a primeira parte deste livro, que trata da importância dos reflexos
positivos na vida da criança, pode ter se perguntado por que não podia desempenhar apenas
o papel de espelho positivo. O problema é que a maneira como nos sentimos se manifesta
involuntariamente no comprimento de onda não-verbal. Você sabe disso pela sua própria
experiência. Se a sua mulher finge ser a sra. Agradável, você percebe imediatamente a sua
insinceridade. Se o seu marido quer passar pelo sr. Paciente, você descobre logo. Não
podemos conviver com os outros, especialmente com as crianças, dia após dia e enganá-los
quanto aos nossos verdadeiros sentimentos.
Exemplos de que a fachada falsa não funciona encontram-se nas famílias muito tolerantes.
O sr. e a sra. G., por exemplo, desempenham o papel de pais que fazem tudo o que os filhos
querem, mesmo quando, no fundo, são contra. Escondem seus sentimentos com palavras
falsas, mas seus ressentimentos vão se acumulando e acabam por ser revelados em
expressões tensas, sarcasmos ou sorrisos forçados.
Algumas das crianças mais infelizes vêm de famílias mais tolerantes (em que os pais
disfarçam seus verdadeiros sentimentos)
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porque estão mergulhadas numa corrente constante de mensagens mistas. As situações


extremas, nas quais os pais continuamente dizem o oposto do que sentem, contribuem para
a esquizofrenia. O esquizofrênico tem uma desconfiança profunda das pessoas, provocada
pelas comunicações disfarçadas e deformadas com que teve de conviver.
Uma outra desvantagem das mensagens mistas é que as crianças colocam os seus
problemas pessoais na ambigüidade que lhes é transmitida. Em nosso exemplo anterior,
Bobby já se sentia culpado por ter um sapo escondido debaixo da cama e pensou, em
primeiro lugar, que seu segredo havia provocado a raiva da mãe. Mas, se a sua principal
preocupação fosse a dúvida quanto ao amor dela, ele poderia ter incluído essa ansiedade
nas mensagens duplas que recebeu. Poderia ter pensado: "Acho que mamãe não está
contente de me ver de volta da escola. Talvez ela não quisesse que eu fosse seu filho."
Nenhuma criança pode ter confiança a menos que as pessoas à sua volta expressem
sinceramente os seus sentimentos. As mensagens mistas eliminam a segurança e o amor.
O ingrediente isolado mais importante numa relação estimulante é a sinceridade.
Provavelmente nós gostamos tanto das crianças pequenas pela sua sinceridade. Quando
estão com raiva, nós sabemos; quando estão satisfeitas, enviam mensagens bastante claras.
Com elas, nós sabemos onde estamos.
A piada comum, "Vou sair agora, e vocês podem falar mal de mim", é engraçada porque é
verdadeira. Sentimos, muitas vezes, que as pessoas são cordiais conosco de forma
superficial, mas ficamos pensando o que dirão de nós, por trás. Com amigos verdadeiros
não temos essa sensação; na verdade, damos valor àqueles em quem confiamos porque nos
sentimos seguros. E as crianças reagem do mesmo modo.

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Evitar as mensagens mistas


A transmissão de mensagens mistas é um hábito que deve ser suspenso. Nós o fazemos
simplesmente por imitação. Podemos escolher esse caminho por temer a desaprovação ao
expressarmos nossos sentimentos com sinceridade. Podemos hesitar em nos expor ou temer
certas emoções. Por vezes damos respostas falsas por ser mais fácil do que tentar conhecer
os nossos sentimentos reais. Outras vezes, disfarçamos porque temos medo de que a nossa
franqueza fira os outros. (A maneira de evitar essa cilada será vista no capítulo seguinte.)
Há, porém, coisas muito sérias em jogo, e devemos fazer um esforço total para evitar
mascarar os nossos sentimentos.
Como você poderá evitar as mensagens mistas se na realidade não quiser partilhar os seus
sentimentos? Voltemos à mãe de Bobby. Suponhamos que ela estivesse preocupada com
uma questão pessoal, mas não quisesse dizer a Bobby. Poderia, então, ter respondido: "Meu
filho, estou preocupada com um problema de gente grande que não quero comentar com
você." Agora que as palavras e a expressão corporal correspondem, Bobby não se sente
confuso com as contradições.
Por outro lado, suponhamos que ela tenha encontrado o sapo escondido, mas que sinta que
vem implicando demais com Bobby ultimamente. Uma parte dela quer expressar sua
frustração, mas outra sente que seria melhor não dizer nada.
É claro que ela poderia dizer: "Prefiro não falar sobre o que está me preocupando." Mas,
nesse caso, ela corre o risco de acumular irritações que podem explodir mais tarde com um
incidente sem importância. A alternativa é a sinceridade com relação aos dois sentimentos.
Ela poderia dizer: "Bobby, encontrei o seu sapo e francamente estou aborrecida porque
você não seguiu a regra de nossa família. Mas ultimamente, ao que parece, eu venho
implicando muito com você, e um lado meu não quer falar no sapo.

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Estou às voltas com dois sentimentos. Um deles me deixa tão frustrada que tenho vontade
de gritar, e o outro me faz pensar que talvez eu tenha expectativas muito altas."
Compartilhar os sentimentos conflitantes é parte da sinceridade. Raramente temos apenas
uma reação ante um acontecimento; dois sentimentos opostos – ou mesmo quatro ou cinco
– são mais freqüentes. Como as crianças são extremamente sensíveis aos nossos
sentimentos profundos, mostrar-lhes apenas parte do que sentimos pode provocar confusão.

A abertura total é a sinceridade?


Você pode perguntar imediatamente: "Para criar confiança, eu deverei ser totalmente
aberto, em todas as ocasiões?"
Evidentemente, não. Você pode preferir guardar certos sentimentos para você mesmo, mas
seja sincero quanto as suas reservas. Se a mãe de Bobby tivesse dito: "Meu filho, estou
preocupada com um problema de gente grande e não quero falar sobre isso", teria guardado
para si os detalhes, sendo franca sobre as suas reservas.
Se ela tivesse preferido dar-lhe algumas informações, poderia ter dito: "Ora, eu estou
preocupada com uma briga que tive com um vizinho, mas prefiro não entrar em detalhes."
Não importa que ela diga, o que não deve dizer é: "Não há nada", quando alguma coisa a
está aborrecendo realmente – isso se ela quiser que seu filho confie nela.
Simplesmente não é aconselhável ser totalmente aberto em relação a todos os seus
sentimentos, com todas as pessoas e em todas as ocasiões. Você mesmo terá de decidir
quando, onde, para quem e quanto de seu mundo interior deve ser compartilhado. Seja qual
for a sua decisão,

seja sincero sobre suas reservas; não as mascare.

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Mensagens diluídas
Uma forma menor de mascarar os fatos ocorre quando você transmite mensagens
moderadas para disfarçar sentimentos fortes. A raiva é a emoção que disfarçamos com mais
freqüência. (Ver Capítulo 15 – Como decifrar o código da raiva.)
Geralmente nós acreditamos que os sentimentos fortes indicam imaturidade. E, portanto, se
os experimentamos, procuramos controlar a emoção para nos enquadrarmos na nossa
imagem de adulto amadurecido. Muitos homens acham que sua masculinidade poderá ser
posta em dúvida se demonstrarem emoções fortes, com exceção da agressão, da raiva, ou
do interesse sexual. Ensina-se aos meninos ocultar as decepções, a ternura ou o sofrimento,
por exemplo, para não serem considerados maus companheiros ou "mariquinhas".
A pessoa psicologicamente amadurecida reconhece que tem sentimentos e que poderá
compartilhá-los quando lhe parecer adequado. A auto-estima elevada está relacionada com
a capacidade de ser aberto a todas as reações interiores, porque os seres humanos, quer
sejam homens ou mulheres, têm realmente todos os tipos de sentimentos com intensidades
variáveis. A pessoa dotada de uma auto-estima elevada não precisa negar o que sente. A
aceitação de si mesma lhe dá a segurança de ser aberta, pois não procura obter a aprovação
dos outros. Ter sentimentos às claras, portanto, indica uma auto-estima bem desenvolvida.
(Sentimentos muito intensos, ou inadequados, para uma determinada situação, mostram que
alguma coisa está errada.)
As crianças percebem a discrepância quando usamos mensagens moderadas para
sentimentos fortes, mas não sabem por que nós os diluímos. Muitas crianças concluem:
"Não é certo sentir com intensidade. Se meus sentimentos não forem superficiais, é melhor
fingir que são."
O nosso fingimento torna-se um modelo para ser imitado pelas crianças, ensinando-lhes a
desconfiar dos sentimentos fortes. Assim, elas passam a fazer um juízo íntimo de si mesmas
menos

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elevado devido ao que sentem. Nestas condições, a auto-estima não poderá ser sincera e
sem reservas.
Você poderá perguntar: "Se eu resolver mostrar meus sentimentos, deverei mostrar
exatamente a sua força, em qualquer circunstância?”
É preciso considerar sempre a adequação. A sinceridade não significa transformar as
crianças em muro de lamentações emocionais. É possível harmonizar as palavras com os
sentimentos e ainda assim transmitir uma mensagem adequada.
A sra. V., por exemplo, teve um dia difícil, e a falta de cooperação do filho a irrita. Por um
momento ela acha: "Ah, quisera não ter tido filhos!". Mostrar esse sentimento seria terrível
para George. Mas ela pode continuar aberta e fazê-lo de maneira adequada, dizendo:
"George, tive um dia horrível hoje! Preciso ficar só por algum tempo; não posso conversar
nada com ninguém agora!" Essa reação é sincera, pois expressa a necessidade da mãe de
ficar alguns minutos longe do filho, sem prejudicar a auto-estima dele.
Se a sra. V. em lugar disso tivesse falado: "George, você é sempre tão bonzinho para mim;
essa falta de cooperação nem parece que vem de você", é muito provável que a sua
expressão corporal indicasse a George que ela estava disfarçando a sua irritação verdadeira.
Se a sra. V. conclui que preferiria não ter tido filhos, ela precisa, agora, chegar à fonte de
sua rejeição. Ou precisa prestar atenção ao clima que cerca seus filhos e usar a disciplina
construtiva para que o comportamento deles seja menos censurável. Lembre-se:

Modere a sinceridade com a adequação, mas evite as mensagens mistas.

Você ousa ser humano?


A questão implícita aqui é se você ousa ser totalmente humano com os seus filhos, ou se
acha que tem de se comportar sempre sem mostrar irritação.

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Esse pai ou mãe aparentemente "perfeito" é, com freqüência, um disfarce. As crianças


precisam de contato vital com pessoas reais e não com robôs mascarados, agindo segundo
um programa. Como ser humano você pode ter todos os tipos de sentimentos: fraquezas,
desânimo, preocupação, cansaço e confusão. Nem por isso deixa de ser menos digno ou
menos forte. Na verdade, é preciso força para ser franco. Seu exemplo demonstra que os
sentimentos são legítimos. Os pais que reconhecem a sua condição humana evitam que os
filhos escondam a deles.
Muitos pais perguntam: "Devo pedir desculpas ao meu filho quando faço alguma coisa
errada, ou quando digo alguma coisa inoportuna? O meu filho não me respeitará menos se
eu reconhecer meus erros?"
Você perderia o respeito por alguém que admitisse ter errado? Você o respeitaria menos por
ter pedido desculpas? Dificilmente. É muito mais provável que seu respeito aumente devido
à honestidade dessa pessoa.
A sra. T. costumava espancar os filhos quando se comportavam mal. Certo dia achou que
não devia mais bater. Depois de ter mantido sua resolução por algum tempo, em outra
ocasião ela voltou a bater. Imediatamente arrependeu-se e ousou ser franca com a filha.
"Tilly, não foi justo da minha parte bater em você, especialmente porque eu não permitiria
que você revidasse. Lamento profundamente. Eu gostaria de ter podido controlar os meus
sentimentos."
Ela ficou surpresa com a resposta de Tilly:
"Ora, mamãe, tudo bem. Eu sei que você está querendo deixar de bater, assim como eu
estou procurando não trapacear mais no jogo de cartas. Mas às vezes é difícil a gente
cumprir a resolução, não é mesmo?"
Até mesmo as crianças pequenas são surpreendentemente compreensivas quando somos
francos e honestos com elas. Não

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importa se somos crianças ou adultos, todos respeitamos a sinceridade. Quando ela existe,
podemos ter confiança.
Em lugar de decepcionar as crianças, a franqueza as atrai para nós. Faz com que deixemos
de ser como deuses distantes e nos transformemos em pessoas mais reais. Uma idéia falsa
que costumamos ter – e que devemos questionar – é que devemos bancar os deuses para
conquistar o respeito das crianças. Tememos, freqüentemente, que a confiança dos filhos
em nós, como pais, termine se eles nos virem preocupados, perturbados, indecisos ou
confusos. Mas os sentimentos disfarçados e mascarados só tornam as crianças conscientes
de nossa falsidade, destruindo-lhes a confiança e levando-as a acreditar que será melhor
fazerem a mesma coisa. Tanto os filhos quanto os pais estão em melhores condições de
acabar com as inadequações quando se sentem bastante seguros para revelá-las.
Além disso, nossas máscaras estimulam as crianças a erguer suas próprias fortalezas contra
a intimidade psicológica. E, nesse caso, ficam isoladas de toda a fonte do estímulo humano:
as relações estreitas e autênticas com outros seres humanos.
É claro que os comportamentos extremos magoam a criança. Se as explosões de violência
dominam a vida dos pais, um gesto positivo que eles devem ter é procurar assistência
profissional adequada, pois essas violências indicam deficiências interiores. E o pai, ou a
mãe, pode ser honesto com seu filho, dizendo que está procurando não ser dominado por
todos os sentimentos. Essa sinceridade impede que as crianças acreditem que são elas a
fonte das tempestades emocionais.

Confiança e auto-estima
O que um clima de confiança transmite à criança?
Ele lhe diz: "Pode contar comigo para ajudá-lo a satisfazer suas necessidades. Eu não sou
perfeito, mas você pode confiar em minha

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sinceridade – até mesmo em relação às minhas imperfeições. Você pode ser imperfeito
também, e juntos podemos tentar eliminar nossas deficiências. Se eu lhe oferecer algo
menos do que a sinceridade adequada, estarei em falta com você. As máscaras não são boas
porque nos separam. Você está seguro comigo."
Uma atitude assim cria amor e respeito. Dá à criança a segurança de entender-se com os
outros de uma maneira cordial e aberta, porque aprendeu que é assim que deve ser. E os
outros, por sua vez, podem confiar nela e respeitá-la.
Toda criança precisa ter a convicção segura de que pode acreditar no que seus pais dizem e
confiar neles para auxiliá-la na satisfação de suas necessidades físicas e emocionais.
Mas ser franco com a criança não basta. Você pode prejudicar ou favorecer a auto-estima
dela, dependendo da maneira como você lhe fala sobre os seus próprios sentimentos. Se a
criança se sente segura com você é porque você se comunica com ela de uma maneira não-
crítica. No capítulo seguinte examinaremos as maneiras seguras de compartilhar
sentimentos.

9 A SEGURANÇA DO NÃO-JULGAMENTO

Reações versus julgamentos "Como posso ser sincera e franca com meu filho? Quando
manifesto meus sentimentos fortes, ele fica oprimido ou defensivo. Não tenho certeza de
que isso lhe seja útil."
A observação dessa mãe é legítima.
Ser simplesmente franco com as crianças pode trazer resultados indesejáveis, mesmo
quando se tem cuidado. Alguns pais dizem aos filhos como se sentem e, ao fazê-lo, acabam
com a auto-estima. Outros são sinceros e criam o respeito mútuo. Onde está a diferença?
A distinção está na maneira de compartilhar os sentimentos.
"Você é grosseiro!", diz a sra. T. ao filho que a interrompe constantemente, durante uma
visita a uma amiga.
"Estou cansada dessas interrupções", exclama a sra. M., quando seu filho repetidamente
interfere nas suas conversas.
As palavras da sra. T. a colocam no papel de juiz, e ela formula seu veredicto a partir de
uma posição de superioridade. O rótulo negativo, "grosseiro", atinge diretamente a imagem
que seu filho faz dele mesmo.
A sra. M., ao contrário de sua amiga, evita bancar o juiz. Expressa suas reações ante o
comportamento do filho dizendo: "Estou cansada dessas interrupções." Ela transmite seus
sentimentos

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sem julgar. Em conseqüência, ela não atinge a auto-estima do filho.


Os julgamentos negativos transformam você num espelho negativo para seus filhos. E, o
que é mais importante, eles destroem o auto-respeito e a segurança. Diminuem,
envergonham e castigam; fazem com que a criança não se sinta amada. A demonstração das
reações interiores sobre o comportamento, por outro lado, não interfere no auto-respeito,
não enfraquece a segurança, nem corrói o amor.
Para ter segurança as crianças precisam das reações reais dos adultos para manter seu
comportamento dentro dos limites adequados, e devem dispensar os rótulos que lhes
damos. O não-julgamento é o segundo ingrediente da segurança psicológica, pois

a culpa – ou julgamento negativo – está no centro da desordem emocional e da baixa auto-


estima.

Como já vimos, toda criança assimila, em sua auto-imagem, os rótulos negativos e passa a
se ver de acordo com eles. A avaliação pessoal é sempre uma ameaça. Para realmente
estimular, você deve passar do julgamento para o comentário que provoque uma reação.
Imagine que você é uma criança e ouviu as observações das duas colunas abaixo. Quais são
as suas reações? Que grupo de observações reduz pontos na sua auto-estima?
A B "Você é impossível!" "Não posso suportar todas essas brigas!”
"Você é preguiçoso!" "Estou preocupada com as suas notas.”
"Você é pouco cuidadoso!" "Não estou disposta a cuidar de suas coisas!”

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"Você é mau!" "Beliscar o pequeno Mike lhe causa dor, e não quero vê-lo machucado.”

As afirmações da coluna A lançam uma culpa. Não lhe provocam o sentimento de ser
menos adequado como ser humano? Por outro lado, os comentários da coluna B informam
como os seus pais se sentem, sem atacar pessoalmente os seus sentimentos.
Até mesmo as avaliações positivas (elogios) trabalham contra a segurança, pois todos os
julgamentos colocam a criança na posição de ter de viver com alguém que gosta de rotular.
Não é preciso muito tempo para que a criança – ou qualquer um de nós – descubra que a
pessoa que avalia de maneira positiva também pode avaliar de maneira negativa.
Você pode evitar o papel de juiz simplesmente dizendo aos seus filhos qual a sua reação
pessoal ante o comportamento deles. Você pode dizer: "Eu realmente gostaria que você se
lembrasse de arrumar seu quarto", ou "Sinto-me bem sabendo que você se lembra das
regras mesmo quando eu não estou!" Essas reações são mais úteis do que o julgamento
típico: "Você é um bom menino."
Muitas vezes ouvimos um dentista ou um médico dizer: "Seu filho é um bom paciente!".
Seria muito melhor para a auto-estima da criança se ele reagisse ao comportamento dela
dizendo: "Jack não criou caso durante o exame, o que tornou as coisas mais fáceis para
mim. Obrigado, Jack, por me ajudar."
Assim, muitos pais ou mães mandam os filhos para uma festa, ou para a escola, com a
velha observação que é capaz de abalar a confiança: "Veja lá, hein, comporte-se bem!". O
que significa: "Eu tenho minhas dúvidas a seu respeito." Mas, se você disser: "Espero que
você se lembre das regras", estará dizendo à criança

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o que você pensa no momento, sem lhe impor um julgamento. Como iremos ver dentro em
pouco, a dúvida sobre o seu comportamento é muito diferente da dúvida sobre o seu valor
como menino.
Essa é uma distinção que exige uma atenção cuidadosa.
Numerosos livros e artigos estimulam pais e professores a recorrer generosamente aos
elogios. E muitas experiências mostram que eles são bem melhores do que os castigos,
como condicionadores eficientes de comportamento. É claro; as crianças querem reflexos
positivos e farão qualquer coisa para consegui-los. Elas querem a nossa aprovação.
No entanto, há uma diferença sutil, mas ainda assim importante, entre os rótulos positivos
("bom" ou "comportado") aplicados à pessoa de uma criança e a aprovação ("Eu aprecio"
ou "eu gosto") dirigida aos atos. Para acreditar em si mesma a criança não deve ter que
questionar o seu valor como pessoa. Isso deve ser sempre bem compreendido. Essa
distinção não fica clara para a criança quando lhe dizem que ela é boa porque gostaram do
que ela fez.

Separação entre o comportamento e o eu


Há um alto preço psicológico a ser pago para se conviver com os julgamentos: a criança
aprende a considerar seu comportamento como sinônimo da sua pessoa. A idéia de que uma
pessoa e o seu comportamento são coisas separadas talvez fique mais clara se você pensar
no sol e em seus raios. Pense na bola de gases, que constitui o sol, como sendo o núcleo
interior da criança. Os raios de calor do sol podem ser comparados ao seu comportamento.
Porque o comportamento vem da criança, assim como os raios de calor vêm do sol, é fácil
pensar: "Mau comportamento, má

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pessoa; bom comportamento, boa pessoa." Esse raciocínio não separa a criança dos seus
atos.

Sempre que o valor pessoal depende do desempenho, fica sujeito a ser cancelado por
qualquer erro.

O auto-respeito da criança varia constantemente, a menos que ela consiga andar na corda
bamba de um desempenho elevado. Esse "caminhar pela corda bamba", porém, exige uma
vigilância permanente que serve apenas para abalar a confiança.
Nenhuma criança comporta-se sempre de maneira aceitável. Quando as atitudes e palavras
dos adultos igualam os atos da criança com a sua pessoa, ela vive semelhante a um iô-iô.
Seu valor pessoal sobe e desce de acordo com o seu comportamento. Assim, a criança não
pode desenvolver um sentimento sólido de valor pessoal porque há sempre o "se-do-seu
desempenho". Mesmo que você não acredite que o seu filho é aquilo que ele faz, o que
você diz pode levá-lo a pensar isso. As "reações do eu" eliminam esse perigo.

Evitar a armadilha do julgamento


Para evitar julgamentos diga ao seu filho o que está se passando no seu íntimo, sem usar
rótulos.
As palavras rotuladoras - adjetivos e substantivos que descrevem uma pessoa – são as que
causam problemas. Palavras como "preguiçoso", "conversador", "bagunceiro", "grosseiro",
"mesquinho", "egoísta", "levado", "bonzinho", "bom", "mau", "vergonhoso", etc., têm, pela
sua natureza, o caráter de julgamento. Esses rótulos não têm lugar no vocabulário de
adultos esclarecidos.
Em geral, o uso de "você", seguido de um substantivo ou adjetivo que descreva ou
classifique a criança, representa um julgamento.

100

Habitualmente "eu", seguido do que se passa no interior do adulto, constitui uma


mensagem voltada para o comportamento(1). Vejamos algumas outras mensagens enviadas
primeiro como julgamentos e, em seguida, como reações:

1. Agradeço a Thomas Gordon esse conceito.

"Julgamentos: Você" - "Você é um moleirão!”


"Reações: Eu" - "Tenho medo de que você chegue atrasado na escola”

"Julgamentos: Você" - "Você é porcalhão!”


"Reações: Eu" - "Eu não quero tirar esses pedaços de cortiça do chão!”

"Julgamentos: Você" - "Como você é bagunceiro!”


"Reações: Eu" - "Essa desordem realmente me aborrece!”

"Julgamentos: Você" - "Você é mentiroso!”


"Reações: Eu" - "Eu não posso confiar nas suas palavras quando elas não correspondem ao
que você faz!”

"Julgamentos: Você" - "Você tem bom gosto!”


"Reações: Eu" - "Gosto do vestido que você escolheu.”

"Julgamentos: Você" - "Seu palerma! Não sabe fazer outra coisa a não ser brincar na rua?”
"Reações: Eu" - "Fico tão frustrada que não tolero isso. Já lhe disse várias vezes sobre o
perigo de brincar na rua. Fico morta de medo que você se machuque.”

Não se pode exagerar o fato de que os julgamentos criam problemas.


O segredo da segurança é reagir, mas sem julgar.

101

Praticando o não-julgamento
Deixar de julgar é muito difícil porque quase todos nós passamos a vida inteira sendo
julgados. Os rótulos descritivos são nossos companheiros mentais constantes. Quando
alguém conversa conosco, nossos "computadores de julgamento" funcionam a todo vapor.
Julgamos silenciosamente com "Isso é bom", "Isso é bobagem", "Que atitude estúpida!",
"Essa é a maneira certa de pensar".
Podemos até mesmo fazer isso conosco. A sra. S. diz para sua amiga: "Ontem eu fiz isso e
aquilo. Não foi um absurdo?" A amiga responde: "Ora, isso não é nada. Certa vez eu fiz
isto. Você já viu alguma coisa mais idiota?" Pregar rótulos em nós mesmos e nos outros é
um passatempo nacional. E raramente questionamos esse modo de pensar.
Você pode acabar com esse hábito adquirindo consciência de que está julgando. Quando
ouvir a si mesmo fazendo isso, transforme o julgamento numa reação. A sra. S., por
exemplo, pode dizer: "Ontem eu fiz isto e aquilo. Meu Deus, seria melhor que não tivesse
feito" (Uma reação, não um julgamento.). Sua amiga pode responder: "Eu sei o que você
quer dizer. Uma vez eu fiz isto. Como me arrependi!"
Para fugir do carrossel do julgamento, anote algumas das frases que você usa a seu próprio
respeito e a respeito de seus filhos - as frases com "você", seguidas de palavras descritivas.
Em seguida, reescreva cada uma delas como uma manifestação de seus sentimentos
interiores.
Evidentemente, a consciência não eliminará o seu antigo costume da noite para o dia. A
vigilância constante e a prática podem, porém, transformar você, e as recompensas valem
bem o esforço.

102

Vantagens da "reação-eu”

"Sim" - você pode dizer -, "mas meu filho será julgado por amigos, professores e
empregadores, portanto não será melhor que se acostume com isso desde cedo, em casa?”
É certo que toda criança será rotulada, de um jeito ou de outro, no mundo exterior. Mas ela
provavelmente terá mais condições de ignorar esses julgamentos, vindos de pessoas que
para ela nada significam, se as pessoas que realmente lhe importam não a tiverem
mergulhado em avaliações pessoais, principalmente durante os anos de formação. A
ausência de julgamento pelos pais ajuda a criança a transformar os rótulos de outras pessoas
em reações. Assim, a sua auto-imagem é poupada de golpes desnecessários.
Os "julgamentos do tipo você" provocam a defesa e encorajam as crianças a se isolarem. E,
é claro, se acreditarem neles, acabarão prejudicando sua auto-estima, como já vimos.
Além disso, quando você não banca o juiz, seus filhos são muito mais capazes de
compartilhar os sentimentos deles com você. E também as suas "reações-você" lhes dão um
exemplo construtivo para ser usado com os amigos.
Lembre-se:

Os julgamentos são cortinas de fumaça que impedem o amor de ser visto.

Quando seu filho vive com uma pessoa que reage, ele pode dizer:
"Eu sou amado embora nem tudo o que faço seja aceitável." A criança saudável vê a sua
própria pessoa à parte de seus atos. O sentimento do valor pessoal, independentemente do
comportamento, é essencial para uma auto-estima elevada. A maneira pela qual você fala
com as crianças afeta a possibilidade de estas estabelecerem a distinção vital entre o
comportamento e o eu.

10 A SEGURANÇA DE SER AMADO

Aceitação versus amor


Aconselha-se aos pais aceitarem seus filhos tal como são. Mas "aceitação" é uma palavra
muito suave quando examinamos o clima do amor. "Aceitação" pode significar a tolerância
do inevitável – tufões nos Estados Unidos, espinhas na adolescência ou a perna defeituosa
de Johnny.

As crianças sobrevivem com a aceitação, mas não se desenvolvem plenamente.

Elas precisam de alguma coisa mais forte; precisam de amor. Elas devem se sentir
valorizadas, preciosas e especiais, apenas porque existem. Só assim poderão gostar do que
são.
Amar não é algo que você transmite necessariamente da boca para fora; é o sentimento que
você tem para com o seu filho. É sentir a singularidade da criança e descobrir que a quer.
Apesar das irritações intermitentes, você continua vendo as suas qualidades.

Por que o amor se perde


Nós, em geral, amamos nossos filhos; sofreríamos o resto da vida se eles morressem de
uma hora para outra. Em momentos de crise, não deixamos de lhes dar valor. Como, então,
o amor se perde a ponto de nossos filhos não o sentirem?

104

Uma das razões é a nossa tendência em aceitar, sem maiores exames, o que temos todos os
dias. O direito de votar, a liberdade de religião, a boa saúde – nós os amamos muito, mas,
freqüentemente, não nos preocupamos com eles, a menos que estejam ameaçados.
É por isso que esquecemos o milagre que cada criança representa – porque vivemos com
ela o dia-a-dia.
Damos, em geral, um tratamento especial aos bens materiais preferidos. É um estranho
fenômeno que nos impede de adotar a mesma atitude para com nossos filhos. Damos
grande valor a eles, daríamos nossas vidas por eles. Porém, muitas vezes os
menosprezamos.
Essa incoerência merece um exame cuidadoso porque para a criança

o tratamento respeitoso é manifestação de estima.

Faça a si mesmo a pergunta: "Se eu tratasse meus amigos como trato meus filhos, quantos
amigos me restariam?"
Nós nem pensaríamos em envergonhar ou analisar amigos em frente de outros, interrompê-
los com sarcasmo, humilhá-los, constrangê-los, espancá-los, ou dar-lhes ordens como se
fossem soldados sob o nosso comando. É claro que não. Mas pense como estas cenas são
comuns:
"Ned é tão tímido! Por mais que eu o encoraje, ele parece ser incapaz de livrar-se da
timidez", diz o sr. B. ao visitar o vizinho em companhia do filho.
"Você está apenas se exibindo!", a sra. F. censura o seu filho na frente de quatro amigos.
"Por que você é tão mandão, Gene? Não sei como esses meninos brincam com você", grita
o sr. E. para o seu filho, ao vê-lo jogar com os colegas.

105

"Billy, se você comer essas batatas vai ficar ainda mais gordo do que é", diz a sra. T. ao
filho, que sofre de excesso de peso, na frente dos convidados.

Tratamos as crianças, repetidamente, como criaturas de segunda classe, destituídas de


sentimentos; e, no entanto, gostamos delas! Às vezes não levamos em conta a sensibilidade
delas. A sra. A. e sua filha de dez anos estão almoçando com a sra. L. As duas senhoras
conversam animadamente durante quarenta e cinco minutos, esquecendo-se da outra pessoa
(embora seja uma criança), que come em silêncio. Nenhuma dessas duas mulheres pensaria
em se comportar dessa maneira se a terceira pessoa fosse outro adulto. Sem pensar, elas
adotam com a criança um tratamento que seria inaceitável para um adulto. E a necessidade
que a criança tem de ser tratada com respeito? Ela não é menos sensível só porque é
pequena. O desrespeito sempre obscurece o carinho, impedindo que ele seja sentido.
Um comentário comum nas aulas de educação de pais é: "Essas aulas me fizeram começar
a ver meu filho como uma pessoa." Em geral, não desrespeitamos deliberadamente as
crianças. Simplesmente as esquecemos e não nos colocamos no seu lugar. Ou as tratamos
como nós fomos tratados quando crianças.
O seu respeito pelos seus filhos reflete-se na maneira pela qual você os põe no colo, os
segura, lhes dá banho, os alimenta e lhes troca a roupa. Reflete-se no seu modo de falar, de
brincar, de discutir e de castigar. Basta você aplicar a Regra de Ouro para comunicar
respeito.
Sempre que você faz com que a criança se sinta pequena, envergonhada, culpada,
inexistente ou embaraçada, você a menospreza; negar-lhe respeito destrói a segurança e
prejudica a sua auto-estima.
Por vezes, o amor não é sentido pela criança porque você centraliza a sua atenção no que
está errado e não no que está certo.

1O6

Johnny traz para casa uma prova de matemática; vinte e sete problemas foram respondidos
corretamente, mas três não. O que faz seu pai? Censura os três problemas errados! Se
perguntarmos ao pai de Johnny por que faz isso, ele dirá: "Quero que saiba o que estava
errado para não cometer os mesmos erros outra vez." Mas Johnny não ouve nenhum
comentário sobre os vinte e sete problemas que acertou!
Em muitas coisas pequenas esquecemo-nos de focalizar os dotes excepcionais de cada
criança. Focalizamos aquilo que ela não tem. Quando voltamos nossa atenção para as
deficiências da criança, o amor se perde. Se ao seu filho falta confiança em si mesmo,
procure ver o que ele pode fazer. Mencione as coisas que ele consegue fazer e deixe de
focalizar o que não pode fazer. Seu senso de sucesso – vitória – é a chave para que acredite
em si mesmo. Isso estimula sua convicção de que tem alguma coisa a oferecer, levando-o a
novos esforços.
Outro fato que interfere na comunicação do amor é a nossa tendência em ver a criança à luz
dos nossos próprios traços de personalidade. Valorizamos, nela, qualidades que ainda não
se desenvolveram em nós. Inversamente, tendemos a rejeitar na criança o que rejeitamos
em nós mesmos, como já vimos no Capítulo 6. E ela paga o preço de nossa própria falta de
auto-aceitação.
A consciência desse fenômeno, por vezes, nos ajuda a aceitar melhor a nós mesmos e a
nossos filhos. A sra. N. confidenciou: "A sensibilidade de minha filha costumava me irritar.
Mas é claro, eu sou terrivelmente sensível e não gosto disso. Tive de fazer uma certa força,
mas agora, quando ela manifesta a sua forte emotividade, eu digo para mim mesma: 'Tudo
bem, ela está reagindo da mesma maneira que eu – da maneira que eu gostaria de não
reagir', e o simples fato de reconhecer essa ligação torna a sua sensibilidade menos
aborrecida.”

107

Como dissemos no capítulo anterior, se não considerarmos a criança independentemente de


seu comportamento, estaremos dando a ela apenas uma aceitação condicional. As reações-
eu também têm um papel importante para impedir que o amor se perca. Há várias coisas,
então, que impedem que o amor chegue à criança: tratamento desrespeitoso, esquecer que
ela é um ser especial, focalizar as suas deficiências e não as suas realizações, não gostar de
ver nelas o que não gostamos em nós mesmos, os julgamentos do tipo "você", e confundir o
comportamento com a pessoa.

Ampliação da capacidade de amar


Qualquer esforço que você faz para aumentar a sua capacidade de amar reflete-se na auto-
estima de seu filho.
Para começar, pergunte a si mesmo quanto você valoriza a si próprio. (Lembre-se: você faz
com os outros o que faz a si mesmo.) Em geral, não temos tempo para fazer um sério "auto-
inventário". Agora é o momento de fazê-lo. Isole-se e faça um exame interior.
Que qualidades especiais você tem como pessoa? Você compreende que não há nenhuma
outra pessoa como você em todo o mundo? Você tem certas capacidades e certa
sensibilidade que são exclusivamente suas. Você tem uma força especial que, de certa
maneira, difere da força dos outros.
Escreva as qualidades que caracterizam o que você é. Se tiver problema com isso, converse
com um amigo íntimo e veja se juntos podem elaborar uma lista de suas "qualidades
especiais".
Se você for como a maioria das pessoas, terá passado anos focalizando sua atenção no que
você não tem. Agora, inverta o seu enfoque e concentre-se em suas qualidades positivas.
Coisas interessantes podem acontecer quando você começa a se analisar.

108

Você pode tornar-se o otimista que vê o copo meio cheio, e não o pessimista que o
considera meio vazio.
Em seguida, pergunte-se: "Eu trato a mim mesmo com respeito? Ou costumo menosprezar-
me? Viajo de vez em quando, compro alguma coisa, me permito uma pequena
extravagância? Exijo, de maneira tranqüila, mas firme, que os outros mostrem respeito por
algumas de minhas necessidades? Ou faço o jogo do 'não sou importante'?
Respeito as exigências físicas e emocionais de meu corpo e procuro satisfazê-las? Tenho
tempo para ficar com outras pessoas que gostam de mim? Tenho tempo para fazer as coisas
que gosto?" (Lembre-se: quanto mais realizado você for, mais você estimula os outros.)
Pergunte, então, a si mesmo: "Eu acho que sou aquilo que faço?"
Ao ser cumprimentada por um trabalho que havia feito, uma mulher disse: "Fico contente
por você gostar de mim." Ela não separava o seu trabalho da sua pessoa. Um escritor disse:
"Se você não gosta do meu livro, não gosta de mim." Seu senso de valor pessoal não era
intrínseco, mas dependia de seus escritos. Se Mary não gosta do ponto de vista de Sally, ela
não gosta de Sally. Ela não consegue separar as idéias da pessoa.
Infelizmente vivemos numa cultura do "realize ou pereça". Com freqüência, somos
valorizados pelo que fazemos e não porque existimos.
Se você pensa no seu valor apenas em termos de comportamento, é provável que as pessoas
importantes com as quais conviveu durante o seu crescimento lhe tenham transmitido essa
mensagem. Idealmente, você deveria ter vivido com reflexos que lhe diziam que tinha
valor, simplesmente por estar vivo. Mas você não precisa continuar preso aos reflexos do
passado. Você pode mudar sua maneira de pensar, sozinho ou com ajuda.

109

Para libertar as crianças dos laços do "realize ou pereça", você tem de libertar-se primeiro
desses laços. Você transmite essa distinção importante de maneira mais clara através de
suas próprias atitudes para consigo mesmo. Quando você valoriza a sua singularidade
(embora tenha consciência de suas deficiências), quando se respeita e focaliza a atenção nas
suas qualidades positiva, você está mais livre para amar seus filhos.

Quando os pais não podem amar


E se você concordar sinceramente com tudo isso, mas não conseguir valorizar o seu
potencial, nem o potencial de seus filhos? Então seu problema é a incapacidade de amar.
Você precisa de espelhos positivos em sua vida. Procure-os. Se seus amigos não o
valorizam como ser humano, faça novos amigos. É possível que os outros o valorizem e
que você não se deixe atingir pelos reflexos positivos. Ou você pode se esconder atrás de
uma máscara, de modo que os outros não possam estimulá-lo. De qualquer modo, você
pode conseguir ajuda para acabar com a sua auto-estima insuficiente.
Esforços contínuos e o crescimento, por sua vez, podem ser necessários, mas você pode
aprender a encontrar valor em si mesmo se tiver contato com a aceitação. Você pode depor
o juiz tirano que tem dentro de si mesmo; se não puder, procure ajuda.

As vantagens de ser amado


Se o valor pessoal não está condicionado ao comportamento, a criança pode escolher metas
mais realistas e que mais gostaria de atingir. Os sucessos resultantes aumentam o seu
respeito próprio. Quando a criança sabe que os erros de comportamento

110

não diminuem o amor de que é objeto, tem mais tolerância para com os erros dos outros e
pode passar a valorizar essas pessoas. Ela não tem de focalizar a atenção nesses erros
porque as pessoas importantes na sua vida não focalizaram a atenção nos seus. Essa atitude
atrai os outros, permitindo um entendimento melhor com eles.
Quando não há ligação entre os erros e o valor pessoal, esses erros tornam-se menos
arrasadores. E então a criança pode considerá-los como áreas em que poderá melhorar e
não como catástrofes pessoais; eles poderão ser enfrentados e resolvidos.
Scott vinha de uma família que o amava de acordo com o sucesso que obtinha na escola.
Em conseqüência, qualquer nota um pouco mais baixa o fazia tremer. Observá-lo, quando
fazia uma prova, era observar uma figura de pura tensão.
Para ele o desempenho era uma luta de vida ou morte; acreditava que o seu valor pessoal
dependia da nota de cada trabalho. A tensão acabou criando dificuldades ao aprendizado;
ela literalmente o impedia de pensar com clareza. Ele tinha que ter um bom desempenho, e
essa imposição minou a sua criatividade.
"Espere um pouco", você poderá dizer. "No Capítulo 2 li que as crianças precisam de êxitos
para se sentirem competentes e terem idéia do seu valor. Como harmonizar essas duas
afirmações?”
É certo que todas as crianças precisam conhecer a sua competência para criar o respeito
próprio. Mas toda criança precisa sentir que sua pessoa é amada, qualquer que seja a sua
competência.

O desempenho bem-sucedido constrói o sentimento de valor; ser querido como pessoa


estimula o sentimento de ser amado.

Toda criança precisa sentir-se amada e valorizada. Mas a capacidade de ser amada não deve
estar ligada às demonstrações de valor. Quanto mais amada a criança se sente, porém, mais
satisfatório será o seu desempenho, pois ela gostará de si mesma.

11 A SEGURANÇA DE POSSUIR SENTIMENTOS

Rejeitando o domínio "Eu quero um doce agora", choraminga Teddy, de dez anos, às onze
e meia da manhã.
"Você não pode querer doce agora, isso estraga seu apetite para o almoço", responde a sra.
L., sacudindo negativamente a cabeça.
Brian, de nove anos, bate em seu irmão menor. A mãe diz: "Pare com isso, menino. E diga
ao seu irmão que você está arrependido!"
São essas algumas das nossas maneiras de não permitir que as crianças sejam "donas" de
seus sentimentos. Dizemos a elas que suas emoções estão erradas, que são impróprias e
mesmo que não existem. E agravamos o erro determinando quais os sentimentos adequados
à ocasião. A sra. L. diz a Teddy que ele não quer doce agora. A mãe de Brian exige que o
arrependimento substitua a raiva.
Isso quer dizer que a sra. L. deveria deixar Teddy comer o doce sempre que ele quisesse? A
mãe de Brian deveria deixá-lo bater no irmão quando quisesse? Certamente, não! Mas

a segurança psicológica é enfraquecida quando a propriedade dos sentimentos é negada.

O respeito pelos sentimentos da criança é parte do respeito à sua integridade. As emoções


mostram-se de forma espontânea e são parte integral do eu de cada pessoa.

112

Sem nos darmos conta disso, tratamos as crianças como computadores emocionais,
tentando programar nelas reações adequadas. Queremos que elas se sintam arrependidas
quando nós estamos arrependidos, que tenham fome quando nós temos fome, que se
preocupem quando nós estamos preocupados, e assim por diante. Pedimos às crianças que
regulem seus sentimentos pelos nossos e nos irritamos se não o fazem.
Quando você determina os sentimentos que a criança deveria ter, está literalmente pedindo
a ela que abandone a posse de suas experiências pessoais, íntimas. Mas ela não pode fazer
isso. Ela não tem o poder de fabricar emoções: só pode reprimi-las ou fingir. As emoções
ocultas continuam muito vivas (ver Capítulo 14) e a longo prazo, invariavelmente, dão a
última palavra.

Os sentimentos recusam-se a obedecer ordens.

Anote: deixar que a criança seja "dona" de seus sentimentos não significa deixá-la fazer
tudo o que quiser. Há uma grande diferença entre impedir um ato e impor uma emoção. O
comportamento precisa, com freqüência, ser contido. Estamos falando apenas da liberdade
de sentir, não da liberdade de agir. (Voltaremos ao assunto no Capítulo 14).
No caso do doce, é a sra. L., e não Teddy, que deseja que o doce seja comido depois do
almoço. Não intencionalmente, ela pede ao filho que sinta o mesmo que ela. Poderia ter
evitado a armadilha, dizendo: "O doce seria gostoso agora, Teddy." (Isto quer dizer: "Você
tem o direito de achar assim, mesmo que sua opinião seja diferente da minha".) "Mas você
terá de esperar até depois do almoço e comê-lo como sobremesa" (e aqui ela limita a ação
dele). "Se você está com fome, eu preparo logo o almoço."
Brian bateu no irmão porque estava com raiva. As palavras da mãe não acabam com a sua
hostilidade; elas lhe pedem que minta, provocando um ressentimento maior e culpa. A mãe

113

pode deixar que ele continue com os seus sentimentos, enquanto limita o seu
comportamento, dizendo: "Brian, pare imediatamente de bater em seu irmão!" (ela limita
seus atos). "Você está realmente com raiva a ponto de querer bater nele, não é? Use este
travesseiro e mostre-me o que você gostaria de fazer com ele." (Com isso ela estaria
dizendo: "Os seus sentimentos interiores são seus. Embora eu tenha que limitar o seu
comportamento, ajudarei você a manifestá-los de maneira segura.") Para a segurança
psicológica, o direito de ter sentimentos deve ser protegido.

Individualidade e segurança É raro o pai ou a mãe que realmente concede ao filho o


privilégio de ter seus sentimentos próprios e peculiares. Por quê? Porque temos vivido com
outras pessoas que insistiam em que sentíssemos o mesmo que elas. E, se não tivermos
cuidado, trataremos os nossos filhos como fomos tratados.
Além disso, é extremamente difícil deixar que as crianças tenham sentimentos que
aprendemos a considerar inaceitáveis. Suas emoções mexem com os nossos próprios
sentimentos reprimidos e proibidos. Por isso, recuamos alarmados e ensinamos as crianças
a ser como fomos.
Quando a criança percebe, repetidamente, que só será aceita se for uma cópia emocional de
seus pais e professores, sua personalidade e sua segurança estão ameaçadas. Na maioria dos
casos, o programa é: "Sinta como eu sinto para ter o meu amor."
A sra. D. determina quanta comida seus filhos devem consumir em cada refeição e insiste
em que comam tudo. Seus padrões determinam a fome dos filhos.
A sra. W. diz ao filho, quando ele não gosta de um prato preparado por ela: "Você não sabe
o que é bom." Aos seus olhos, ele está

114
agindo de forma errada quando os seus gostos não coincidem com os dela. Essa atitude
predomina em todas as relações da sra. W. Ela não pode tolerar ou compreender nada que
seja diferente de suas próprias experiências.
Muitas vezes achamos que estamos respeitando a individualidade quando permitimos a um
adolescente escolher suas roupas, as matérias de estudo e sua profissão. Apenas benefícios
adicionais! Somente demonstramos um respeito sincero pela criança quando não pedimos a
ela que negue seus próprios sentimentos.
Os pais dão muito valor à individualidade, mas quando estão a sós se perguntam: "Por que
Jimmy é mais positivo do que Bob?”
"Marlene sempre se interessou por ciências. Não posso compreender por que Bob não gosta
dessa matéria. Veja só, eles são da mesma família!”
"Lou gosta de viver em sociedade; que pena que John não goste!”
"Se Eric fosse mais parecido com o meu calmo Van!"
E assim por diante, ad infinitum:
"Viva a individualidade; por que esta criança é tão diferente daquela?" E tudo isso na
mesma hora!
"Viva a individualidade e a criatividade! Ufa! Nosso filho sente exatamente como eu!”
"Não posso compreender. Nossos filhos são tão diferentes quanto o dia e a noite." Essa
observação, expressa com muita freqüência, raramente é feita em tom de prazer, mas sim
com surpresa ou desagrado.
O surpreendente não é que as crianças reajam de maneira diferente, mas que se pareçam.
Cada ser humano, com exceção dos gêmeos idênticos, é um acontecimento único e não se
repete. E a essa individualidade herdada acrescentamos o fato de que não há duas crianças
que possam ter exatamente as mesmas

115

experiências ou o mesmo ambiente, não sendo de surpreender que sejam diferentes.


Sem considerarmos a hereditariedade, poderíamos pensar que três meninos com os mesmos
pais, tendo a mesma alimentação, vivendo na mesma casa, teriam o mesmo ambiente.
Exteriormente isso pode parecer certo, mas seus ambientes psicológicos diferem muito.
Nós não reagimos a cada criança da mesma maneira. Cada um de nós está numa etapa
diferente de crescimento e sofre pressões diferentes de cada criança. Cada uma dessas
crianças tem experiências de grupos e de escolas diferentes. Muitos fatores se combinam
para dar a cada criança um ambiente psicológico único. E cada fator influi na maneira de a
criança organizar suas reações.

De quem são as experiências?


Deixar que a criança seja dona de seus sentimentos levanta a questão sobre os vários tipos
de lições que ela recebe – um problema em muitas famílias. Pergunte a si mesmo: "Quem é
dono da experiência?"
Quem pode saber o que desperta o entusiasmo de outra pessoa? Coloque a criança em
contato com várias experiências, mas conceda-lhe o direito de ter suas reações particulares.
A segurança desaparece quando você decide aquilo de que a criança "deve" gostar. E pisa
num terreno perigoso quando você comunica às crianças que elas devem gostar de certa
experiência, para serem aceitas.
Mary Ann disse: "O que eu queria, ou preferia, não tinha importância. Minhas reações
jamais pareciam ser adequadas. Devia haver algo de errado comigo.”

O respeito à individualidade prova que você se importa.

116

Levar em conta as diferenças


A intensidade da pressão que você exerce sobre seus filhos, para que experimentem
sentimentos iguais aos seus, é evidenciada pela sua capacidade de vê-los como indivíduos e
de tolerar as diferenças.
Examine a sua reação; ela mostra a sua capacidade de mudar e de crescer. E afeta a
possibilidade de você permitir aos seus filhos fazer a mesma coisa. Não deixe a questão de
lado, tão depressa. Ouça o que você diz. Observe como sente. Quando a diferença é vista
sob uma luz negativa, você ensina que é errado ser diferente. E nesse caso você envia
reflexos negativos.
Acampar era muito aborrecido para Thelma, mas a família dela gostava muito. Respeitando
as preferências da filha, seus pais organizavam outros programas para ela quando iam
acampar. Não achavam que ela fosse uma desmancha-prazeres por ser diferente. O respeito
dos pais permitiu a Thelma apreciar seu valor como indivíduo, em lugar de considerar esse
fato como um desgosto para a família.
Portanto, você só pode dar segurança quando

aceita as diferenças sem com isso retirar a sua aprovação.

Avaliando a tolerância à diferença


Para saber como você tolera a diferença, verifique primeiro o seu relacionamento com
pessoas fora de sua família.
A sra. O. tinha dificuldades em se dar bem com os outros. Ela só se relacionava com
pessoas que pensassem como ela. Se você tiver uma atitude dessas para com as pessoas fora
de sua família, é muito provável que seus filhos sejam submetidos a uma dieta ainda mais
concentrada de intolerância.
O poema "Os cegos e o elefante" trata dessa questão. Nele, um grupo de cegos encontrou
um elefante pela primeira vez.

117

Cada um deles tocou uma parte diferente do animal, acreditando saber como era o elefante.
Aquele que tocou a cauda disse que o bicho era como uma corda; o outro, que segurou a
tromba, disse que era parecido com uma cobra; um terceiro, que agarrou a perna, insistia
em que era como o tronco de uma árvore; outro, finalmente, que se encostou no dorso,
estava convencido de que o elefante era como uma parede.
Cada um deles sentia o elefante de maneira diferente, e cada um tinha certeza de que a sua
noção do animal era a única "verdadeira". Nenhum deles levantou a possibilidade de haver
outro ponto de vista igualmente razoável.
Como os cegos, freqüentemente temos uma experiência e acreditamos que, por reagirmos
de determinada maneira, a nossa é a única reação correta. Contudo, se aceitarmos
sinceramente a individualidade dos outros, não deveremos insistir em que nosso ponto de
vista é o único certo.
Somos, até certo ponto, homens cegos que encontramos vários "elefantes da vida". Cada
um de nós usa, em cada situação, a própria singularidade, as experiências e os sentimentos
passados. Cada um de nós vê as coisas de maneira um pouco diferente.Você precisa
lembrar-se sempre de que

seu modo de ver e de sentir não é a única maneira de ver e de sentir.

O ponto de vista da criança é, para ela, tão válido quanto a sua opinião é para você. A sua
atitude deve ser: "A criança é uma pessoa à parte, e os sentimentos dela lhe pertencem."
Com isso será possível demonstrar amor e proporcionar segurança.
Se você tem dificuldades em aceitar as diferenças nos outros, isso pode ser conseqüência de
sua baixa auto-estima. A pessoa que não tem um sentimento forte de seu valor pessoal é
ameaçada pelas diferenças, particularmente em sua família. Ela precisa que a família
aprove seus vários pontos de vista, de modo que possa acreditar neles. Essa pessoa precisa
de apoio, exterior para confirmar

118

sua auto-imagem. Quando não recebe esse apoio, começa a sentir-se ansiosa, rejeitada, ou
não-amada.
Se isso acontece com você, significa simplesmente que você deve procurar superar a sua
falta de auto-estima.

O impacto sobre a auto-estima


Quando permitimos que a criança seja dona de seus sentimentos e reações, causamos um
forte impacto sobre a sua auto-estima, o que lhe permite dizer: "É bom ser como sou.
Minhas experiências íntimas são legítimas, mesmo quando diferem das experiências de
minha família. Ter certos sentimentos em certas ocasiões não diminui meu valor como
pessoa."
A criança com essa convicção não se esconde atrás de fingimentos, nem procura impor suas
percepções aos outros. Em conseqüência, entende-se melhor com as outras pessoas.
É interessante notar que quando nos colocamos no lugar de nossos filhos, tentando ver o
mundo do ponto de vista deles, freqüentemente percebemos que esse ponto de vista é
razoável. E nesse caso podemos oferecer compreensão e segurança. Examinaremos essa
idéia mais detalhadamente no capítulo seguinte.

12 A SEGURANÇA DA EMPATIA

Revelando o íntimo
Bruce está mal-humorado e sua mãe diz: "Vá para o seu quarto, até que possa ser agradável
aos outros." Ela lhe permite que fique irritado, mas evidentemente não o quer por perto
nessas condições. Em suma, ela deixa claro que o seu mau humor é um convite à rejeição.
As emoções negativas fortes criam tensão interior; no entanto, muitas vezes recusamos a
ajuda construtiva quando as crianças mais necessitam dela. Dizemos que queremos a
confiança de nossos filhos, mas nossas reações, muitas vezes, os afastam. E, se não
podemos aceitar os sentimentos de uma criança, também ela aprende a rejeitá-los.

Necessidade de empatia
Pense, por um momento, em você mesmo. Quando você comunica um sentimento não quer
ser desaprovado ou encontrar razões que o façam negar o que sente. Você quer ser ouvido
com compreensão. Quando você espera ser compreendido, sente-se seguro para falar.
Imagine por um momento que está profundamente preocupado com uma operação a que
sua filha deverá se submeter

120

proximamente, e conta suas preocupações a uma amiga. Se ela responde: "Ora, não se
preocupe. Tenho certeza de que tudo correrá bem", você dificilmente se sentirá
compreendido. Essa tentativa de tranqüilizá-lo não representa absolutamente nada. Muito
provavelmente, você pensará: "Grande ajuda dizer isso. Aposto que ela nunca teve uma
filha que precisasse ser operada." Mas suponhamos que, em lugar disso, ela tivesse dito
com ênfase: "Meu Deus, são dias de preocupação para você!" Essas palavras e esse tom
mostram que ela compreende como você está se sentindo no momento. Você não expressa
seus receios para que lhe digam que são infundados; você quer compreensão para diminuir
o peso da preocupação. Sofrer sozinho é sempre mais difícil do que saber que os outros
"estão" com você. A compreensão humana provoca conforto e segurança e vence a
distância da alienação.

O que é a empatia
Há uma palavra especial para esse tipo de compreensão que todos desejamos. É empatia.
Algumas pessoas confundem simpatia com empatia. Mas a primeira expressa uma atitude
de "Ah, coitadinha de você!". Embora em certas ocasiões possamos necessitar de piedade,
esta nunca pode ser tão útil quanto a verdadeira compreensão.

A empatia é ser compreendido de acordo com nosso ponto de vista.

Significa que outra pessoa entra em nosso mundo e mostra que compreende nossos
sentimentos, refletindo de volta a nossa mensagem. Ela deixa, temporariamente, o seu
mundo para estar conosco em todas as sutilezas de significados que uma determinada
situação tem para nós. Como Carl Rogers observou, a pessoa empática está conosco não
para concordar ou discordar, mas para compreender sem julgamento.

121

Nós nos comunicamos com os outros, normalmente, por dois caminhos: as palavras e a
expressão corporal. Em geral, as palavras contêm os fatos, enquanto nossos músculos e tons
revelam nossos sentimentos em relação a esses fatos. O significado total de nossas
mensagens está combinado, e nossa esperança é que as outras pessoas compreendam
integralmente. Mas essa compreensão se baseia no seguinte:

As atitudes e sentimentos são mais importantes do que os fatos.


Quando seu filho conversar com você, só encontrará um entendimento autêntico se você lhe
refletir de volta a totalidade do seu significado. Se, por exemplo, Ted se deixa cair na
poltrona da sala de estar e diz, num tom desanimado: "Finalmente terminei aquele trabalho
da escola", suas palavras indicam que o projeto foi completado. Mas seu tom e sua postura
revelam como ele se sentiu a respeito: está deprimido e desanimado.
Se o pai de Ted responde apenas às palavras do filho, reflete de volta apenas o conteúdo ao
dizer: "Bem, você terminou o trabalho." Ao ouvir suas palavras repetidas como por um
papagaio, Ted sente que foi ouvido num nível, mas certamente não se sente compreendido
em termos do que aquela experiência significa para ele. Seus sentimentos com relação ao
projeto são consideravelmente mais importantes do que o significado literal de suas
palavras. Mas a resposta do pai deixa os sentimentos de Ted intocados.
Se, porém, o pai de Ted ouvir a mensagem total de seu filho, será sensível tanto à
mensagem verbal quanto à não-verbal. Demonstrará sua compreensão se disser: "Embora
esteja terminado, você está completamente desanimado." Nesse caso, ele capta todo o
conteúdo do mundo de Ted; seu filho, por sua vez, sente o calor da compreensão humana.
Quando você é empático, não procura mudar os sentimentos da criança. Simplesmente tenta
aprender como ela sente a parte

122

do elefante, por assim dizer. Você não procura ver por que ela sente dessa maneira, apenas
tenta perceber todas as nuanças de seus sentimentos naquele momento. Você consegue ver
como a criança vê, sentir como a criança sente.
A empatia é o quinto ingrediente da segurança psicológica.
Como o homem é um ser social, ele procura superar a solidão criando a intimidade
psicológica. Para isso, porém, ele deve saber que será ouvido empaticamente. Os seres
humanos são criaturas sensíveis e para que tenham um respeito próprio autêntico precisam
que seus sentimentos sejam aceitos e compreendidos.
Como parte do processo de socialização, a criança aprende que nem todos os sentimentos
podem ser transformados em ações, como dissemos no capítulo anterior. Mas aprender que
pode revelar suas reações íntimas, e que as pessoas importantes na sua vida compreenderão,
ajuda a criança a aceitar o que realmente é – um ser humano, com todos os tipos de
emoções.
Você já pensou que pode conhecer todas as estatísticas e todos os fatos relacionados com
uma criança, e ainda assim não a conhecer realmente – ou seja, como pessoa – enquanto
não compreender o ponto de vista dela? Você não a conhece enquanto não compreende a
maneira que ela tem de organizar pessoalmente o que lhe acontece. Você não pode
conhecê-la enquanto não penetra no seu mundo interior, privado. É na arena dos
sentimentos que os seres humanos vivem, respiram e morrem psicologicamente. Quando
fechamos a porta aos sentimentos, tornamos impossível a vida, o crescimento e a essência
da individualidade. Quando fechamos a porta ao entendimento empático, acabamos com a
intimidade, a segurança e o amor.
Vejamos uma situação típica tratada primeiro de maneira que se enfraqueça a segurança e,
em seguida, de modo que ela seja estimulada:
Karen, uma menina de três anos, fica com medo do barulho supersônico de um avião e
corre chorando para a mãe.
123

Reação típica:
Sua mãe diz: "Ora, minha filha, é apenas um barulho supersônico feito por um avião. Você
não precisa ter medo."
Essa tentativa de tranqüilizar a criança diz, em essência: "Não tenha esse sentimento de
medo. Não há necessidade de ter medo do barulho dos aviões." Evidentemente a mãe de
Karen tenta acabar com o medo por meio de uma explicação lógica. Mas os barulhos muito
fortes são realmente assustadores para as crianças pequenas, qualquer que seja a sua causa.
A lógica acaba com a empatia. E Karen não se sente compreendida. As explicações são
mais úteis depois de ter-se lidado com os sentimentos. No momento dos sentimentos fortes,
a primeira necessidade é de compreensão. As explicações devem ficar para depois.

Reação empática:
A mãe de Karen abraça a filha e diz: "Meu Deus, foi um barulhão. É terrível!"
Nesse breve momento, a mãe de Karen entra no mundo atemorizado da filha e mostra que a
compreende. A resposta empática diz a Karen, primeiro: "Mamãe está comigo; ela sabe
como me sinto." Quando a criança sabe que seu medo é compreendido, ela é mais capaz de
ouvir a razão lógica para esse som.
A empatia é ouvir com o coração e não com a cabeça. Se a resposta empática é dita em tom
frio, neutro, a criança não se sente compreendida.
Você provavelmente já relatou uma experiência a outra pessoa, que respondeu muito
naturalmente: "É, deve ter sido difícil." Você não se sentiu compreendido. Se, por outro
lado, essa pessoa disser: "É, deve ter sido difícil!", como se realmente pensasse assim (seu
tom e a expressão de seu rosto lhe mostram que ela realmente "está" com você), então você
se sente compreendido. O tom de

124

voz e os músculos indicam se a outra pessoa entrou no seu mundo com compaixão e
compreensão, ou se simplesmente disse alguma coisa. Os tons dão as chaves quanto à
sinceridade do entendimento. (Voltaremos ao assunto no Capítulo 14.)

Pré-requisitos para a empatia


A verdadeira empatia é o casamento das atitudes com a habilidade. Esta última implica a
capacidade de penetrar no mundo da outra pessoa com compreensão. O pai ou a mãe, que
se sente relativamente tranqüilo no íntimo, tem mais facilidade para entrar no mundo de seu
filho do que se estivesse envolvido em conflitos intensos.
"Eu mal consigo ouvir meus filhos", diz o sr. G., "porque há muito barulho dentro de mim.
Todas as vezes que falam comigo, eu fico envolvido com minhas próprias reações íntimas."
Esse pai deve controlar as suas emoções antes, para poder ser realmente empático com seus
filhos. Ele precisa ser capaz de soltar os seus próprios sentimentos para estar com os filhos.
A empatia vem mais facilmente quando somos sensíveis aos tons de voz e às inflexões, às
posturas corporais, aos gestos e às expressões faciais. Muitas pessoas não prestam atenção a
esses indícios; não estão habituadas à expressão não-verbal. Mas o psicólogo Albert
Mehrabian afirma que apenas 7% de uma mensagem é transmitida pelas palavras, enquanto
o resto é expresso pelo tom e pelos músculos.
A sensibilidade à expressão corporal é essencial à empatia.

Ela pode ser aumentada pela prática e pelo esforço.


A sua possibilidade de ser empático é afetada pela sua atitude, ou seja, pelo papel que você
desempenha como pai ou mãe. A empatia vem mais facilmente quando esse papel é visto
como o de um estimulador, com uma grande margem de confiança na capacidade de auto-
direção de seu filho. A empatia é mais difícil

125

quando você acredita que deve dirigir e guiar os filhos; quando você acha que sempre sabe
mais.
Com muita freqüência, em lugar de tentar compreender, nós argumentamos, ou ralhamos,
ou pressionamos, para que as crianças organizem suas reações tal como nós mesmos
teríamos feito se estivéssemos no lugar delas. Mas a questão é que nós não somos os nossos
filhos. Eles têm as suas próprias maneiras de organizar as experiências, e essa
individualidade deve ser respeitada. Uma atitude que tolera as diferenças e respeita a
integridade da outra pessoa torna mais fácil a empatia.
Finalmente, a sua atitude para com as emoções, em geral, é muito importante. Se você tem
medo delas, será difícil, talvez impossível, ser totalmente empático. A empatia implica
ouvir e aceitar os sentimentos como realidades autênticas e não como "tolices". Ser sincero
com os seus próprios sentimentos e recusar-se a julgá-los ajudará você a dar segurança
empática aos seus filhos.

Vantagens da empatia
A empatia é uma prova vigorosa de interesse. Quando você deixa de lado,
temporariamente, o seu ponto de vista para estar com seu filho, você demonstra um respeito
fundamental por ele, tratando-o como um indivíduo à parte, cujo ponto de vista pessoal tem
importância. A empatia diz: "A maneira pela qual você vê as coisas é importante para mim.
Vale o meu tempo e esforço para estar com você em seus sentimentos. Eu realmente quero
compreender como você é, porque eu me importo."
A empatia permite que seu filho se considere um comunicador competente. Ele aprende que
pode comunicar-se com as pessoas que lhe são importantes. E o sucesso na comunicação é
importante para o respeito próprio. A empatia tem importância fundamental para que as
linhas de comunicação fiquem abertas. As crianças deixam de falar quando se sentem
sempre incompreendidas.

126

Um dos padrões encontrados nos lares de crianças dotadas de elevada auto-estima é uma
grande dose de conversa espontânea e despreocupada. Essas crianças se sentem seguras
para expressar sentimentos e opiniões. Embora as outras pessoas nem sempre concordem
com elas, suas opiniões pessoais são respeitadas. Nada interrompe mais uma conversa do
que o conhecimento de que as nossas opiniões não serão respeitadas ou compreendidas.
Não há dúvida de que
a empatia comunica o amor.

Ela estimula a proximidade tema, a intimidade e elimina a solidão.


Assim como a empatia aproxima seu filho de você, também aproxima você dele. Quando
nos colocamos no lugar de outra pessoa, quando realmente conseguimos captar o seu ponto
de vista, repentinamente acontece algo: o comportamento dessa pessoa passa a ter sentido.
E, então, é difícil ficar com raiva ou aborrecido.

A empatia ajuda a colocar o julgamento de lado.

O relato da sra. N. é um exemplo vivo do papel da empatia na criação da intimidade e na


libertação dos pais quanto aos julgamentos irritados. "Gladys estava sempre implicando
com a irmã mais nova, que tem muito mais força do que ela. Procurei ressaltar suas
qualidades e compreender, mas ela não se modificou. Quando a estava colocando na cama,
certa noite, ela começou a queixar-se novamente da irmã e tentei ouvi-la com toda a minha
compreensão. Logo depois, ela começou a falar dos companheiros de escola.”
"Mamãe", disse ela, "na escola é como aqui em casa. Todas as outras crianças são mais
fortes do que eu em quase tudo [o que era verdade] e sempre vencem. Eu sou a última. Elas
são melhores até com as palavras. O que elas dizem às vezes me magoa tanto, que fico
sufocada e não consigo dizer nada.”
"Enquanto ela falava, percebi como era o seu mundo e isso partiu o meu coração. Em toda
parte ela estava com crianças que

127

se sentiam superiores a ela. Imediatamente a sua implicância com Anne passou a ter
sentido. Em casa, era o único lugar onde tinha uma possibilidade de igualar a situação. Não
era de espantar que fosse incansável. Quando pude realmente compreender, não tive raiva.
Senti apenas compaixão e carinho e resolvi tomar algumas medidas para lhe dar maior
espaço para respirar."
Incompreendida, a criança se sente posta de lado e a intimidade desaparece. Elas concluem
que "Meus pais não compreendem. Eles não se importam – talvez eu não seja digna de que
se importem". Ao contrário, sempre que alguém, criança ou adulto, se sente profundamente
compreendido, sente-se também amado, pois

a compreensão é a linguagem do amor.

(Ver Capítulo 14 para novos detalhes sobre o preço da falta da empatia.)


A segurança nunca é completa se não há empatia entre pais e filhos, embora o
entendimento contínuo não seja essencial. O entendimento periódico, porém, permite à
criança dizer: "Pelo menos em algumas ocasiões meus pais compreendem o que é ser como
sou."
Verifique a sua atitude em relação a esta questão importante: através de que olhos você vê?
Se você verificar que habitualmente vê apenas o seu ponto de vista, provavelmente não
estará dando aos seus filhos o amor necessário. Se pelo menos, ocasionalmente, você pode
ver o mundo de acordo com o ponto de vista deles, é mais provável que seu amor se
evidencie. Lembre-se dos cegos e do elefante. Não diga ao seu filho que você compreende:
mostre isso pela empatia. Assim, você estará provando seu amor.

13 A SEGURANÇA DO CRESCIMENTO INDIVIDUAL

A mudança misteriosa
Linda, de quatro anos, surpreendeu sua mãe ao lhe pedir uma chupeta, uma mamadeira e
fraldas, antes de ir para a cama. Mas assim mesmo a sra. L. atendeu ao pedido. Quando foi
apanhar as fraldas, Linda disse: "Ah, acho que não preciso de fraldas." Com isso, deixou de
lado a chupeta e foi para a cama levando apenas a mamadeira.
Linda estava verificando a sua "conta corrente de segurança psicológica". A reação da mãe
dizia: "Você está crescendo de uma maneira certa. Se quiser retroceder, respeitarei as suas
necessidades." Provando que Linda tinha liberdade de crescer ao seu modo, a sra. L.
proporcionou-lhe outro ingrediente da segurança psicológica – a liberdade de crescer de
forma única. Com essa garantia, Linda não precisava dos símbolos de conforto do bebê: a
mamadeira era o suficiente.
A sra. L. poderia ter dito: "Meu Deus, Linda! Você está grande demais para essas coisas de
bebê. Tenha juízo e vá deitar-se." Essas palavras teriam significado: "Retroceder é errado.
Endireite-se e cresça certo (da maneira que deve crescer!)".

Confiança no crescimento
Muitas pessoas receiam que a regressão temporária detenha o crescimento. Achamos que as
crianças jamais conseguirão crescer

130

se não estiverem avançando. Por mais estranho que pareça, temos confiança na capacidade
das plantas de crescerem. Colocamos a semente num clima propício e acreditamos no
potencial que lhe permite desenvolver-se no seu próprio tempo, a seu modo. Atrasos no
crescimento, ou algumas folhas murchas, não nos preocupam. Se alguma coisa nos parece
errada, examinamos as condições que cercam a planta. Mas não a puxamos, nem tentamos
distender as suas folhas.
Às vezes temos menos fé na capacidade de crescimento de nossos filhos do que na de
nossas plantas. Pressionando, insistindo e proibindo, procuramos forçá-los a crescer.
Quando não há progresso, voltamos nossa atenção para as crianças e não para o clima que
as envolve. Esquecemos que, como a semente,

cada criança tem seu ritmo de crescimento.

Nós, em geral, forçamos a criança a andar, porque temos certeza de que com o tempo ela
andará sozinha. Aceitamos que volte a engatinhar, depois de ter dado os primeiros passos
incertos. Mas, num dado momento, muitas pessoas perdem a confiança e lá vem o "você
está muito grande para essa bobagem." Cada retrocesso nos provoca decepção,
preocupação, ou pressão. Essa atitude reduz a segurança e o auto-respeito.
Toda criança tem um esquema temporal interno de crescimento – um padrão que lhe é
específico. E essa especificidade deve ser respeitada.

Crescimento: caminho em ziguezague


O crescimento não é uma progressão pronta, para frente e para cima. É um caminho
sinuoso: três passos à frente, dois para trás, um para os lados, uns poucos momentos
parados antes de outro salto à frente. E pena que exista o padrão de ziguezague porque

131

nós nos preocuparíamos menos se tivéssemos, a cada dia, novas indicações de progresso.
Um princípio fundamental sobre o crescimento, em todas as suas fases, é que ele avança
para o novo e regride para o velho. Ele vai e vem, como a maré.

O crescimento é um movimento de expansão e contração.

Segurança versus crescimento


Como observou Abraham Maslow(1), todos nós sofremos duas pressões. Uma é a da
segurança do conhecido; a outra é a atração ao novo. Cada fase de crescimento exige,
continuamente, que a criança deixe para trás o que lhe é familiar. Crescer é abrir mão do
velho.
(1) Abraham Maslow, Toward Psychology of Being, D. van Nostrand, Nova York, 1964,
cap. 4.
E a pobre da criança tem de abrir mão de uma coisa atrás da outra, numa rápida seqüência:
do seio, da mamadeira, do dedo ou da chupeta, e das fraldas; do engatinhar, das comidas
amassadas e de ter o que quer no momento em que quer. Tem que deixar o apego à mãe, o
santuário da família, a segurança dos seus semelhantes. Tem que equilibrar dependência e
independência, submissão e domínio, guardar e partilhar.
Assim como há um interesse pela nova etapa, também a lembrança carinhosa do colo
materno se faz sempre sentir. Até mesmo os adultos gostam, de vez em quando, de regredir
à dependência total e ao cuidado passivo. Não é motivo de espanto, portanto, que a
hesitação e a regressão se combinem com a expansão e o crescimento. O recuo pode ser um
pressuposto necessário a um novo avanço.

132

Primeiro a segurança
Dessas duas pressões – segurança e crescimento – a segurança vem em primeiro lugar. Sem
ela, as crianças desistem de explorar. Jenny fica fascinada pelas cores e consistência dos
produtos do mercado. Olha para os lados e não vê mais a mãe. Todo o interesse pela
exploração do mercado desaparece, e ela corre em busca da segurança da mãe.
Em todos os jardins-de-infância as crianças que se familiarizam com o ambiente e
estabelecem um relacionamento carinhoso com os professores conseguem abandonar as
saias maternas. As crianças precisam da segurança em primeiro lugar; depois, então, é que
se aventuram para o desconhecido.
Todo o crescimento implica uma incerteza. "Como será isso?", "Será perigoso?", "Haverá
problemas se eu fizer isso?". Caminhar na direção do desconhecido pode transformar-se em
ansiedade. A criança que se sente segura em poder recuar precisa de muito menos coragem
para aventurar-se, porque seu caminho de volta não foi bloqueado.

A opção do recuo sem desonra torna a criança mais capaz de enfrentar o desconhecido.
Ajudando o crescimento a surgir
Isso quer dizer que você deve adotar uma atitude passiva e não fazer nada em relação ao
crescimento? Não, absolutamente. Introduza novas experiências atraentes quando parecer
que a criança está preparada. Estimule-a, gentilmente, a enfrentar situações novas. Mas, ao
mesmo tempo, respeite a sua preferência no caso de ela rejeitar ou recuar. Forçar o
crescimento apenas faz com que a criança se apegue ainda mais ao que é antigo. A
incapacidade de respeitar as preferências e os retrocessos demonstra a falta de

133

confiança na capacidade de crescimento e na individualidade. O respeito ao padrão de


crescimento da criança, e à sua necessidade de segurança, é prova concreta de amor.
É mais fácil confiar na capacidade de crescimento da criança, se você teve, na infância, a
confiança dos outros. Algumas pessoas não tiveram essa sorte, mas insistem em confiar no
padrão de desenvolvimento de seus filhos. Muitas outras, porém, são incapazes de adquirir
confiança apenas porque assim querem. Se for esse o seu caso, procure outros que têm fé
em você. (Todo marido precisa da confiança da esposa, e toda esposa precisa da confiança
do marido. Numerosos casais estão de tal modo voltados para as suas atividades externas,
que não se dedicam a esse estimulo mútuo. E, se isso acontece, também não estimulam os
filhos.)
O conhecimento dos fatos relacionados com o desenvolvimento da criança permite que
você aja em função de um plano geral desse crescimento. Isso ajuda você a ver o
comportamento de hoje em função das tarefas que, a longo prazo, toda criança deve
completar. Ajuda você a evitar o aumento das oscilações.

O impacto da liberdade de crescer com individualidade


O respeito pelos padrões individuais de crescimento de seu filho diz: "Acredito em sua
maneira especial de crescer. Você não deixa de ser aceitável por se desenvolver dessa
maneira." Com isso, a criança convence-se de que não há nada de errado em ser como é.

Clima de amor
Embora tenhamos de examinar separadamente os ingredientes para o estímulo do amor,
eles, na realidade, se combinam para

134

formar uma atmosfera psicológica de reflexos positivos. Sete ingredientes básicos servem
para formar o AMOR; essa palavra de quatro letras que compreende a enorme diferença
entre a ternura do respeito próprio e a solidão do ódio a si mesmo.
Um ingrediente adicional, que dá o toque final no clima de amor, é a maneira de disciplinar
seus filhos. Lembre-se, porém, que o tipo de disciplina usado acrescenta uma dimensão
importante à segurança que você oferece.
Os encontros seguros traduzem o amor em termos que qualquer criança pode sentir,
independentemente de idade, sexo, temperamento, inteligência ou capacidade. E esses
encontros jamais podem ser falsificados. Envolvida por um clima de segurança, a criança
só pode concluir que
"Sou uma pessoa à parte, um indivíduo.
Sei que tenho valor e dignidade porque meus pais gostam de mim, me compreendem e me
respeitam como pessoa. Não preciso ser uma cópia para ser respeitado pelas pessoas
importantes que me cercam.
Sou querido, mesmo quando meu comportamento tem que ser limitado.”

Essas são as afirmações da auto-estima adequada.


Porque a sensação de ser amado é importante para a saúde emocional e para o respeito
próprio, compete a cada um de nós reexaminar o clima que proporcionamos. Somente
quando estabelecemos encontros pessoais seguros é que nosso filho se sente confirmado.
Então, você pode lhe oferecer o dom, que não tem preço, não apenas da vida biológica, mas
da paz interior e da integridade.

Terceira parte
SENTIMENTOS NEGATIVOS E AUTO-ESTIMA

14 COMO TRATAR OS SENTIMENTOS DA CRIANÇA

O grande paradoxo
Em geral, costumamos tratar os sentimentos das crianças exatamente da maneira que nos
desagrada. E esse paradoxo é levado em conta apenas por alguns de nós.
Quando você partilha os seus sentimentos pessoais, não busca julgamentos, lógica, razões
ou conselhos. Você não quer que seus sentimentos sejam postos de lado, negados, ou que
não sejam levados a sério. No entanto, observe estas reações típicas às emoções das
crianças:

"Mamãe! John acaba de me convidar para a Festa da Primavera! Estou tão emocionada que
mal posso me agüentar!", explode Katie.
"Eu não lhe disse, querida, que não precisava se preocupar? Toda aquela agitação da
semana passada foi pura perda de energia!", responde a mãe com um sorriso.
(A mãe de Katie lhe havia dito que suas preocupações não tinham fundamento – fato que a
jovem tem agora de reconhecer e do qual não deseja ser lembrada.)

***

"Eu preferia não ter um irmão: ele não presta para nada!", queixa-se Hugh.

138

"Hugh! Isso não é coisa que se diga! Se alguma coisa acontecesse ao seu irmão, você se
arrependeria amargamente por ter tido esses pensamentos", repreende sua mãe.
(A mãe de Hugh apenas julgou e envergonhou o filho, em lugar de ajudá-lo a superar o
acesso violento de ciúmes que ele está enfrentando.)

***
"Odeio a escola! Tudo aquilo parece tão chato e sem valor – as coisas que aprendemos na
aula são inúteis", diz Crystal.
"Minha filha, uma boa instrução básica ajudará você a ter o emprego que desejar mais
tarde", diz seu pai.
(O sr. T. diz a Crystal que seus sentimentos de tédio e desinteresse não são pertinentes. Ele
parece acreditar que uma explicação lógica e firme pode neutralizar os sentimentos; mas
nada está mais longe da verdade.)

Todos esses adultos tinham boas intenções e todos não tinham, certamente, consciência de
que a sua reação foi um "tampão no sentimento". Mas basta você se colocar no lugar dos
jovens que ouviram essas reações para perceber o efeito delas. E o patético é que não temos
consciência de que tais respostas são, a longo prazo, destrutivas.
Independentemente de idade, sexo, raça ou condição de vida, o que leva as pessoas a se
abrirem em relação aos seus sentimentos é a busca de compreensão. Contudo, quando as
crianças querem dividir conosco suas emoções, nós, tipicamente, fazemos recomendações
sobre o que elas devem ou não sentir.

Quando lidamos com emoções, raramente damos o que nós mesmos desejamos.

139

Por que os sentimentos são um problema


Por que lidar com os sentimentos de forma construtiva representa um problema tão sério?
Muitos de nós tiveram seus sentimentos manipulados pelos métodos tradicionais
predominantes da nossa cultura e, como resposta, lidamos com os nossos filhos do mesmo
modo. Observe que, quando você manifesta uma emoção negativa, recorre freqüentemente
às razões, lógica, julgamento, conselho, reafirmação ou à negativa.
Apesar de os sentimentos negativos serem um dos fatos da vida, ensina-se que não se deve
tê-los. Convencemo-nos de que somos menos dignos, ou menos amadurecidos, se tais
sentimentos aparecem em nós. Mas as pessoas não podem conviver dia após dia sem
conflitos, e os conflitos provocam sentimentos.
Poucas pessoas se dão conta de que a maneira mais rápida de livrar-se das emoções
negativas (e a única maneira de fazer com que não se manifestem por meio de sintomas
doentios) é estimular a sua expressão.

Os sentimentos negativos expressos e aceitos perdem o seu poder destrutivo.

Além disso, os pais não foram instruídos quanto às habilidades necessárias para a liberação
das emoções negativas. Não é de espantar que muitas pessoas se desorientem ao lidar com
sentimentos, principalmente com os negativos.

Sentimentos provocam modificações corporais


Os sentimentos são importantes para a sobrevivência: eles mobilizam o corpo para a ação.
Sob a tensão das emoções fortes, certas glândulas entram imediatamente em ação e ocorrem
modificações psicológicas importantes. O ritmo cardíaco intensifica-se; o sangue centrado
no sistema digestivo é desviado para os
140

músculos maiores; o açúcar do fígado é bombeado para a corrente sangüínea, a fim de


proporcionar mais energia; a adrenalina é liberada; as taxas de coagulação do sangue
aumentam; a respiração é mais rápida; as glândulas do suor são ativadas; os músculos
maiores ficam tensos, prontos para a ação. Em suma, o corpo prepara-se para lutar ou fugir.
As emoções nos transformam em pessoas quimicamente diferentes.
Em tais momentos, se alguém nos pedir que tenhamos calma, de nada adiantará. Embora
possamos atender exteriormente, lá dentro a agitação continua. Nossos ouvidos ouvem o
pedido, mas as nossas glândulas não. Para trabalhar construtivamente com as emoções é
necessário reconhecer que essas modificações fisiológicas são provocadas por sentimentos,
e que estes não são contidos de acordo com as ordens. Na verdade, se nos mandam parar de
sentir, isso apenas aumenta a nossa frustração e as glândulas trabalham de forma ainda mais
vigorosa.
Você deve procurar se lembrar de um momento em que esteve realmente perturbado e que,
em lugar de dizer a si próprio que não devia sentir daquela maneira, praticou algum tipo de
ação relacionada com os seus sentimentos. Talvez tenha esfregado o chão da cozinha com
um sentimento de vingança, disputado uma vigorosa partida de tênis, ou arrancado ervas do
jardim, ou ainda mandado para o céu a bola de golfe. Talvez você tenha desabafado os seus
sentimentos para um ouvinte compreensivo, ou simplesmente tenha chorado bastante. O
resultado? Alívio.
Quando os sentimentos são expressos por meio de uma vigorosa ação física, liberada por
meio da argila, da arte, do drama, da música, ou das palavras, a energia que envolve a
emoção é descarregada. O corpo volta, então, ao seu estado anterior de equilíbrio.

A expressão dos sentimentos descarrega a energia emocional.

141

O preço dos métodos tradicionais


Quando os sentimentos negativos são reprimidos, o corpo continua tenso. Quando as
pressões se acumulam em volume suficiente, a energia é descarregada de várias formas. As
emoções recalcadas podem voltar-se contra a própria pessoa (dores de cabeça,
sonambulismo, hiperatividade, roer unhas, bater com a cabeça, enfermidade
psicossomática) ou podem ser dirigidas para outras pessoas e para a sociedade.
A criança pode, ou não, usar sua capacidade mental nessas ocasiões, dependendo da sua
liberdade emocional. A repressão age como uma represa que reduz o rio da inteligência a
um simples regato. Há jovens cujo QI aumentou de 60 a 100 pontos com a remoção dos
bloqueios emocionais. As crianças não podem absorver o que está escrito na página
impressa quando sua atenção está voltada para dentro delas mesmas.
As energias consumidas na repressão não podem ser usadas para finalidades construtivas. A
constante agitação interior leva ao cansaço crônico e diminui a resistência à enfermidade
física. Observe a freqüência com que suas doenças se manifestam depois de um período de
tensão emocional. Uma outra desvantagem é que o controle exercido pela repressão é feito
indiscriminadamente; ela não só prende as emoções negativas, como também bloqueia as
emoções positivas. A criança reprimida é, com freqüência, controlada, distante e fria.
Você poderá dizer: "Mas veja a criança-modelo. Ela reprime seus sentimentos 'maus' e
ainda assim continua sendo'boa'." Mas não é do comportamento-modelo que estamos
falando, e sim do comportamento saudável, positivo. A criança-modelo age como se
estivesse lendo um livro de boas maneiras. Seu "bom" comportamento não surge
espontaneamente de um fluxo interior de alegria e contentamento.

142

O impacto da repressão sobre a auto-estima


Como se não bastassem essas desvantagens, a repressão danifica a auto-estima. Nossas
maneiras tradicionais de lidar com as emoções negativas nos afastam de nossos filhos.
Essas maneiras mostram a eles que algumas partes reais de seu ser são inaceitáveis. Por
uma questão de auto-respeito, as crianças podem tentar ocultar tais sentimentos de si
mesmas, bloqueando-os das suas consciências. Nesse caso, tornam-se alienadas da
plenitude de sua humanidade – perdem contato com quem realmente são.
Quando a criança não nega a si mesma os sentimentos proibidos, mas apenas os esconde de
outras pessoas, conclui: "Devo ser uma pessoa terrível para ter esses maus sentimentos." E
lá se vai o auto-respeito.
Os métodos tradicionais de lidar com os sentimentos negativos têm muitas desvantagens
para que continuem sendo usados. Existe uma alternativa construtiva.

Lidar com os sentimentos construtivamente


Lidar com os sentimentos negativos de maneira construtiva é um problema que interessa a
todos os que convivem com crianças. Ao ler este capítulo, várias perguntas, provavelmente,
lhe ocorrerão – perguntas pertinentes, legítimas, que podem pressioná-lo tão fortemente, a
ponto de não lhe permitir a absorção deste material preliminar e necessário.
Para não nos desviarmos dos nossos objetivos, vamos examinar primeiro a receita para
manejar os sentimentos negativos de maneira construtiva. Em seguida, esclareceremos as
dúvidas que você poderá ter ao ler a receita, tais como: se os sentimentos devem ser sempre
limitados; os seus possíveis receios quanto à sua aceitação; que vantagens há em aceitá-los;
as armadilhas comuns no uso dessa abordagem; e, finalmente, como agir

143

de maneira reparadora, se até agora você vinha usando métodos não-construtivos.


Eis a fórmula para tratar os sentimentos de maneira construtiva: quando surgirem as
emoções – sejam positivas ou negativas –, você estará trabalhando de forma saudável se
ouvir a criança empaticamente, se aceitar seus sentimentos e se lhe proporcionar válvulas
de escape aceitáveis.
No Capítulo 12 examinamos o significado da empatia, a importância do tom de voz e o fato
de que a mensagem total captada pela criança é constituída de mensagens verbais e não-
verbais. Antes de poder aceitar os sentimentos, você deve ser capaz de ouvi-los. (Talvez lhe
seja útil reler o Capítulo 12 para reativar o seu entendimento da empatia).
Centenas de artigos e de autoridades insistem para que os pais ouçam os seus filhos; e os
pais, obedientemente, os ouvem. Escutam as palavras dos filhos e ficam de boca fechada
achando que, com isso, estão seguindo as instruções, porque só conhecem uma forma de
ouvir – ouvir passivamente. Mas, se falarmos com essas crianças, ouviremos a mesma
queixa: "Meus pais nunca me ouvem." Por que essa discrepância? Estarão os jovens
deformando os fatos?
Não. O que eles querem é ser ouvidos com atenção – muito embora talvez não sejam
capazes de verbalizar esse desejo. Quando falam, eles, como todos nós, querem que seu
ponto de vista seja entendido. Mas não sabem se nós ouvimos – se compreendemos
perfeitamente – a menos que provemos essa compreensão através de uma forma muito
especial de ouvir – ouvir de maneira ativa(1).
(1) Agradeço a Carl Rogers essa expressão.
Para manejar construtivamente os sentimentos devemos estabelecer uma clara distinção
entre ouvir de maneira passiva e ouvir de maneira ativa. Lembre-se:

A prova do entendimento vem apenas através da atenção ativa.

144

Ouvir ativamente é:

1. estar sensivelmente atento às mensagens verbal e não-verbal da criança, e

2. refletir-lhe de volta, empaticamente, a mensagem total.


Quando a criança se comunica, deseja uma prova concreta de que a sua mensagem foi
recebida. A diferença crucial está em ouvir de maneira passiva ou ativa.
Para verificar o grau de compreensão que você oferece, grave, ou recomponha de memória,
alguns diálogos com seu filho no qual os sentimentos são expressos. Examine essa
gravação e note quatro coisas:

1. Quem fala mais?

2. Como você reage às mensagens de seu filho? Você usa os tradicionais "tampões do
sentimento"? (Julgamentos, Argumentação, Tentativa de Animar, Negativa);

3. Você apenas ouve calado, ou reflete de volta, de maneira empática e atual, a mensagem
total?

4. Como você se sentiria se as suas mensagens fossem recebidas da mesma forma que você
recebeu as de seu filho?
Se na gravação você verifica que agarrou as suas pás verbais e tentou enterrar os
sentimentos de seu filho ao estilo tradicional, não desanime. Essas reações podem ser
eliminadas. Você pode passar a lidar construtivamente com os sentimentos negativos para
libertar seu filho de suas muletas. E então ele não precisará recorrer à repressão ou aos
sintomas.
Ouça a conversa dos outros. Veja se pode identificar suas reações mútuas. Você
provavelmente se surpreenderá ao ver com que freqüência, quando duas pessoas
conversam, nenhuma ouve ativamente a outra. Cada pessoa ocupa-se em mandar a sua
própria mensagem, mas nenhuma delas prova ter compreendido o ponto de vista da outra.

145
Se na sua gravação você não falou, ou falou pouco, estava apenas ouvindo passivamente, e
seu filho não tem nenhuma garantia de que você compreendeu realmente como ele se
sentia. Teste esse ponto perguntando a você mesmo quanto se sentiria compreendido ao ter
suas mensagens tratadas dessa maneira. Se usou um gravador, preste bastante atenção ao
seu tom de voz. Ele pode representar a diferença entre simplesmente classificar a
mensagem de um jovem, ou unir-se a ele no mesmo comprimento de onda.
Nós não nos sentimos realmente compreendidos se as nossas emoções são classificadas ou
catalogadas. O entendimento intelectual não é o que buscamos. Queremos uma
compreensão carinhosa vinda do coração. O rótulo frio e objetivo ensina o jovem a levar os
seus sentimentos a outros lugares.

Sentimentos aceitos
Aceitar os sentimentos significa permitir que seu filho sinta a sua própria emoção sem ser
julgado. Isso é mais fácil quando você se recusa a julgar as suas próprias emoções e quando
vê seus filhos como pessoas totalmente distintas de você. (Ver Capítulo 11.) A aceitação
dificilmente pode ser fingida: para ser útil ela tem que ser autêntica.
O que importa na aceitação de emoções é libertar a mente das categorias "bom-mau". Sem
isso, você fica preso aos "Não Farás". Embora tal pensamento possa fazer sentido com
relação às ações, é inadequado para os sentimentos. As emoções existem, e você tem que
manejá-las como realidades que são.

Oferecer saídas aceitáveis


Deixe que as crianças de oito anos, ou mais velhas, expressem seus sentimentos. Seja um
ouvinte ativo e empático. As crianças

146

menores nem sempre conseguem expressar, em palavras, o que sentem, principalmente


quando enfrentam emoções fortes. Responda, então, as mensagens corporais delas,
traduzindo-as em palavras.
Alison tenta pegar um pedaço de doce que está na geladeira. Sua mãe agarra-lhe as
mãozinhas e fecha rapidamente a porta. Alison fica rígida, vermelha, fecha as mãos e grita:
"Aaaaaiiii", com toda força. A sra. R. repete, com intensidade: "0000h! Você não quer que
a mamãe te segure. Isso deixa Alison furiosa, furiosa." (Nesse momento, a mãe transforma
em palavras a linguagem corporal da filha, provando que compreende os seus sentimentos.)
Alison olha para a mãe, concorda secamente com a cabeça e reage: "Mamãe má, mamãe
má, má", saindo da cozinha.
Às vezes as emoções da criança precisam ser desviadas para outras atividades,
especialmente quando são intensas. Proporcione saídas que não prejudiquem outras
pessoas, nem danifiquem coisas de valor. Ofereça-lhe tinta, papel e lápis, argila, bonecas ou
alvos substitutivos (animais empalhados, um brinquedo barato, um saco de pancadas, ou
travesseiro). Haverá momentos, é claro, em que você se encontrará numa situação em que
não poderá recorrer a esses escoadouros, como numa loja, por exemplo. Projete, então, um
reflexo verbal dos sentimentos de seu filho, imponha limites ao seu comportamento e lhe dê
uma oportunidade de desabafar quando chegar em casa. (Voltaremos logo a falar da
limitação dos sentimentos.)
A mãe de Gary trouxe-o para casa, depois de ter brincado ao ar livre dando pontapés e
gritando. Ela lhe disse, empaticamente: "Você está com raiva; você não quer ir à mercearia
comigo. Você gostaria de bater na mamãe. A mamãe malvada que obriga você a fazer o que
não quer".
Nota: Lembre-se de que ouvir ativamente é ouvir o ponto de vista da outra pessoa. Isso não
implica concordar ou não com esse

147

ponto de vista. No exemplo, a mãe de Gary mostra que compreende que naquele momento
seu filho a vê como malvada porque ela o está afastando da brincadeira. Refletindo os
sentimentos dele, a mãe não está concordando com essa atitude. Ela acha que tem direito a
levá-lo à mercearia. Mas deixa que o filho saiba que não tem de pensar igual a ela -
permite-lhe ter sentimentos próprios, mesmo que sejam totalmente diferentes dos seus.
Gary tentou dar um soco. A sra. L. jogou um travesseiro no chão, entre eles, e disse: "Não
posso deixar você me bater, mas faça de conta que esse travesseiro sou eu. Mostre-me,
Gary, o que você gostaria de fazer."
Gary pisou e chutou o travesseiro. Inclinando-se sobre ele, deu-lhe murros; depois, agarrou-
o e jogou-o contra a parede.
"É bom bater nessa mamãe aí. Bata, chute, jogue contra a parede! Você não quer mesmo vir
comigo!"
Aos poucos, a raiva de Gary foi desaparecendo; deu um último pontapé no travesseiro e foi
ao seu quarto buscar o ursinho antes de acompanhar a mãe até a mercearia.
A mãe de Gary ajudou-o a expressar seus sentimentos, primeiro colocando-os em palavras
e, em seguida, oferecendo um escoadouro que permitiu ao menino desabafar suas emoções
sem prejudicar ninguém. Ele pôde manter seu respeito próprio como pessoa, sem deixar de
se sentir menos importante por causa de suas reações violentas.
Às vezes as crianças precisam liberar sentimentos quando não temos tempo de estar com
elas. Freqüentemente é possível mantê-las ocupadas até que possamos dedicar-lhes a nossa
atenção.
Billy estava brigando com outro menino pequeno durante o recreio. A professora separou-
os exatamente no momento em que a campainha tocou. Ela sabia que Billy era um vulcão
de sentimentos fortes e que provavelmente agitaria todos os outros meninos, se ela não o
ajudasse a liberar seus sentimentos construtivamente. Embora quisesse ajudá-lo tinha,
porém, que cuidar das outras crianças.

148

Ao entrarem na sala de aula ela o levou para um canto, dizendo: "Sei que você está muito
aborrecido, Billy. Gostaria de desenhar o que está sentindo?”
"Claro que sim", disse Billy.
Quando as outras crianças já estavam tranqüilamente distraídas com outra atividade, ela
dirigiu-se novamente a Billy e perguntou: "Gostaria de mostrar o seu desenho?"
Billy entregou-lhe um desenho de uma galinha muito grande olhando para uma galinha
muito pequena.
"Você quer me explicar o desenho?", pediu ela.
"Sim!", respondeu ele enfaticamente. "Isto (apontando para a galinha grande) sou eu, e isto
(mostrando a galinha pequena) é você!”
"Ah, então você gostaria de ser maior e mais forte do que eu!", disse a professora,
refletindo o sentimento de Billy.
"É claro! Você chegou exatamente na hora em que eu estava ganhando. Eu gostaria de
separar você na hora em que estivesse ganhando uma briga. Você então veria como é
bom!" (Pausa). "Mas o que os outros garotos estão fazendo?" E Billy ficou tranqüilo o resto
da manhã.
A expressão inofensiva de seus sentimentos liberou Billy para voltar pacificamente às
atividades da turma e evitou novo comportamento inadequado. Também o ajudou a manter
seu auto-respeito.
Nem todos os sentimentos negativos podem ser liberados por meio de um desenho, uma
frase ou um movimento de cabeça. Às vezes é necessário muito mais tempo para esgotá-
los, especialmente quando são produto de um longo acúmulo de sentimentos. O tempo
necessário para a liberação das emoções recalcadas depende do volume do sentimento
reprimido e da segurança que a criança tem para poder expressá-las.
Como pai, você não é um terapeuta; pode, porém, criar um clima terapêutico, ajudando seus
filhos a expressar sentimentos à medida que se desenvolvem. (Se os sentimentos reprimidos
e acumulados parecem excessivos, ou se você não se acha capaz de enfrentá-los, busque
assistência especializada.)

149

O simples fato de liberar emoções hoje não significa que amanhã não surjam outras que
necessitem ser liberadas também. As crianças enfrentam, diariamente, situações que
provocam seus sentimentos mais fortes. Permitir que eles sejam expressos à medida que
ocorrem, evita acumulações que, literalmente, afetam a vida das crianças.

Limitação dos sentimentos "Vou dizer àquela babá que não gosto dela", disse Lana à mãe
que estava se preparando para sair à noite.
"Você realmente não gosta dela! É bom saber o que você sente, mas nossa babá não
concordaria com isso", advertiu a mãe. "Por favor, não diga nada a ela. Conversaremos
sobre isso amanhã e veremos como resolver a situação.”

***

"Mamãe, hoje fracassei totalmente na escola", disse Edite no momento em que a mãe ia
saindo para o cabeleireiro.
"Edite, eu quero realmente saber como foi, mas se eu não sair imediatamente perco a minha
hora. Volto às quatro e conversarei com você todo o tempo que quiser.”

***

Comendo num restaurante com a família, Bobby teve, subitamente, necessidade de


expressar sua raiva. "Meu filho", disse o pai, "você está muito agitado e quero que saiba
que concordo com você, mas temos de esperar até sairmos daqui. O lugar não é apropriado.
Vamos terminar de comer em quinze minutos.”

***
Nos exemplos acima, os pais estão sufocando a expressão dos sentimentos negativos de
seus filhos? Não, eles os estão ajudando

150

a enfrentar limites realistas. Até mesmo a expressão dos sentimentos deve ser limitada a
determinadas:

pessoas – às que são capazes de entendimento empático;


horas – ocasiões que sejam adequadas, e lugares – na privacidade do lar.

Sabendo que terá uma saída para as suas emoções, a criança poderá manter um controle
temporário.
Às vezes há ocasiões em que nem mesmo você tem condições de ouvir empaticamente.
Você pode ter outros compromissos a cumprir no momento, ou estar muito cansado,
agitado, preocupado ou ansioso, para dedicar toda a atenção ao seu filho.

Nunca tente ajudar a criança a liberar sentimentos quando você está sob pressões interiores
ou exteriores que não lhe permitam ouvir realmente o que ela tem a dizer.

Nada é pior do que a empatia fingida. Ela enfraquece a confiança – essa pedra fundamental
das relações estimulantes.
Se seu filho precisa ser ouvido, e não é possível dedicar-lhe atenção naquele momento, fixe
um limite. Você pode dizer: "Sei que você precisa conversar agora mesmo, mas estou
muito agitado para ouvir. Assim que eu estiver mais calmo, tentarei ajudar você e os seus
sentimentos." Essa promessa deve ser cumprida o mais depressa possível. Para ajudar a
criança a enfrentar realisticamente os sentimentos é preciso mostrar-lhes que a liberação
tem que ocorrer dentro dos limites das pessoas, do tempo e dos lugares adequados.

Medos relacionados com sentimentos


Geralmente estamos tão certos de que o melhor é reprimir ou dominar os sentimentos
negativos, que receamos a sua expressão, ou mesmo a sua aceitação.

151

Disse a sra. P.: "Mas se eu deixar meus filhos expressarem seus sentimentos eles levarão
horas. Na verdade, apenas ficarão piores. Não vejo nenhum sentido em estimular as suas
lamentações.”
"Concordo", disse o sr. R., "eu costumava chamar a atenção da minha filhinha para coisas
agradáveis quando ela chorava. Eu dizia:'Barby, já vai passar', ou então: 'seja corajosa'.
Depois, li alguma coisa sobre a aceitação dos sentimentos, e na primeira vez que ela levou
um tombo eu disse: 'Meu Deus, isso realmente doeu.' E ela chorou mais do que nunca.
Refletir os seus sentimentos apenas a perturbou mais do que quando eu procurava fazê-la
esquecer-se deles.”
"O senhor tem razão!", concordou a sra. W. "Outro dia fiquei terrivelmente magoada com a
observação grosseira de uma vizinha, depois de uma manhã frustrante. Uma amiga me
telefonou mais tarde e mencionei despreocupadamente o fato. Ela foi tão empática que, sem
saber, eu comecei a chorar como uma criança. Sua compreensão apenas me fez sentir pior."
Essas reações à liberação dos sentimentos são muito comuns. Mas vamos examinar melhor
a situação.
Se durante meses o sr. R. havia sufocado ou procurado distrair os sentimentos de mágoa de
sua filha, a súbita permissão para que eles se manifestassem pode ter provocado o desabafo,
não apenas dos sentimentos daquele momento, mas de muitos outros reprimidos no
passado. Não é de surpreender que ela tenha chorado muito!
No caso da sra. W., as frustrações sofridas pela manhã foram agravadas pela observação
grosseira da vizinha. A sra. W. disse que a empatia apenas fez com que se sentisse pior.
Seria mais exato dizer "A compreensão me impossibilitou de manter meus sentimentos sob
controle." Esses sentimentos já existiam – a empatia apenas estimulou a sua expressão.

A compreensão nunca agrava os sentimentos; ela apenas permite que eles sejam revelados.

152

Como pai ou mãe consciente você deve perguntar a si mesmo: "Quais são as alternativas
que permitem a meu filho expressar seus sentimentos?" De uma maneira ou de outra, as
emoções se manifestam.
O medo de que os sentimentos se agravem ao serem expressos tem certa validade quando
deixamos de observá-los por um longo período. A situação pode ser comparada a abrir um
furúnculo. Quando o médico corta a camada superior da pele, o material inflamado e o
sangue dão à área uma aparência pior. Mas o pus tem de ser retirado, e sob ele está o tecido
róseo, sadio.
O mesmo acontece com os sentimentos negativos. Quando liberados, podem parecer, à
primeira vista, piores. Quando os sentimentos originais são aceitos, podem surgir outros
mais fortes, mais intensos, e isso pode levar você a achar que teria sido melhor deixá-los
em paz. Mas apenas a expressão e a aceitação das emoções impedem que elas causem
algum dano. Só expondo-as é que você realmente se livra delas.
Ao liberar as emoções negativas, seja apenas um ouvinte ativo. Evite a tentação de sondar
as razões e as causas. Veja a si próprio como um "libertador de sentimento" e não como um
"verificador de fatos", ou "juiz de evidências".
Advertência: Se, quando os sentimentos mais intensos se manifestam, você formula
julgamentos para a criança, as portas da comunicação fecham-se imediatamente. Esteja
atento contra a aceitação limitada. Você deve estar preparado para aceitar o pior.
A maioria das crianças descobre rapidamente até onde pode expressar-se. Mas se você
aceitar apenas os sentimentos comuns suas crianças terão de enfrentar sozinhas as suas
emoções intensas. O resultado é uma baixa auto-estima (elas sabem o que está escondido
no seu interior), a auto-alienação (negam tais sentimentos até para si mesmas), ou a
liberação disfarçada.
Outra restrição que muitas pessoas fazem com relação a deixar que as crianças expressem
os sentimentos negativos refere-se à possibilidade de que elas tentem transformar tais
sentimentos em

153
atos. As crianças menores podem tentar exatamente isso. Se você disser para uma criança
de três anos: "Você realmente quer bater no seu irmão", ela concordará entusiasmada e
tentará quebrar a cabeça do irmão. Como seus controles são limitados, é necessário impor
limites ao comportamento das crianças, antes de responder aos seus sentimentos,
oferecendo-lhe, em seguida, uma válvula de escape aceitável.
Transmitir às crianças que elas podem se comportar de maneira irresponsável não as
prepara para uma convivência tranqüila na sociedade. Parte do processo de
amadurecimento consiste em aprender a controlar um certo comportamento que pode
prejudicar aos outros. Quando ensinamos às crianças as maneiras de lidar construtivamente
com os sentimentos transmitimos a elas que estes só podem ser expressos de maneira que
não prejudiquem a elas mesmas, aos outros ou a objetos de valor.

Vantagens da liberação dos sentimentos


A aceitação dos sentimentos negativos proporciona um alívio emocional, evita a repressão
e ensina a criança que ela não deixa de ter valor devido aos seus sentimentos. Ela pode
continuar a ser o que é, sinceramente, e aceitar o modo de ser dos outros.
A liberação dos sentimentos ajuda os jovens a ver seus problemas de maneira mais realista,
e não através da névoa das emoções fortes. Por exemplo, Peggy, uma adolescente de 16
anos, critica seriamente a sua professora.
A mãe responde, empaticamente: "Você acha que ela é intolerável!”
"Isso mesmo. Ela distribui todos esses deveres difíceis e acha que não temos outra coisa a
fazer senão o que ela passa. Será que ela não sabe que tenho mais cinco professores que
também marcam deveres de casa difíceis? Que mulher estúpida.”

154

"A falta de consideração dela realmente irrita você, não?", acrescenta a mãe de Peggy.
"Sim. É claro que reconheço que ela não é a única a passar muitos deveres, mas, não sei por
quê, com os outros professores não me importo tanto.”
"Há alguma coisa com a Dona Y. que torna mais difícil tolerá-la.”
"É isso mesmo", concorda Peggy. Pensa durante alguns minutos e acrescenta,
pensativamente: "Eu acho que não gosto dela porque ela ensina matemática, e não gosto
dessa matéria. Quando os outros professores passam muitos deveres, sei que posso fazê-los
sem muito esforço; mas matemática – bem, eu não entendo o que estamos fazendo; é como
escalar uma muralha – cada centímetro é uma luta!”
"Não é tanto a Dona Y., mas a própria matemática. Simplesmente é uma matéria difícil!”
"É. Você sabe, mamãe, talvez eu esteja precisando de umas aulas particulares. Estou
ficando atrasada. A professora não é ruim; eu é que não gosto dessa matéria."
A manifestação de seus sentimentos e a compreensão encontrada ajudaram Peggy a definir
o seu verdadeiro problema. Com isso, ela pôde encontrar sozinha a solução, o que lhe
aumentou o sentimento de competência.
A criança que está interiormente sobrecarregada explode à menor provocação; os pequenos
obstáculos lhe parecem gigantescos, e ela perde o senso de perspectiva. Uma criança não
pode se dar bem com os outros quando trava uma batalha constante consigo mesma.
Todas as vantagens estão do lado do entendimento empático e da liberação dos sentimentos
negativos por meio de saídas aceitáveis. Essa abordagem reflete-se na sua saúde física e
emocional, bem como na sua competência intelectual e social. Ajuda a criança a dizer:
"Tenho sentimentos de todos os tipos e mesmo assim sou valorizada. Meus pais me ajudam
a enfrentar esses sentimentos; eles não me abandonam à minha própria sorte.”

155

Comunicar os sentimentos
Para estimular seu filho, o pai, ou a mãe, deve apenas ouvir e refletir? Nunca poderá
manifestar seu ponto de vista?
A comunicação é uma rua de mão dupla. Tanto os pais como os filhos precisam transmitir
algo. O segredo, porém, está na seqüência. Se apenas ouvir não resolve a questão, os pais
precisam conversar. Mas tentar transmitir sua mensagem quando a criança está perturbada é
como tentar colar o papel de parede num aposento cheio de vapor. O papel simplesmente
não adere. Enquanto houver fumaça, ele não irá aderir. O mesmo acontece com os
sentimentos. Seus filhos não podem lhe ouvir quando estão emocionalmente agitados.
Freqüentemente, quando vemos uma criança muito emocionada, corremos ao seu encontro
com nossas mensagens; mas as palavras não são ouvidas. Há momentos em que é muito
adequado ensinar, persuadir, usar a lógica ou partilhar as reações (não os julgamentos!), e
mesmo procurar tranqüilizar. Mas o segredo está na oportunidade. A regra é: Deixe
primeiro que os sentimentos sejam expressos.
Um recurso que talvez lhe seja útil é ter em mente que você verá essa criança amanhã.
Procure guardar hoje as suas mensagens: apenas ouça ativamente. Se você as transmitir no
dia seguinte, haverá maior probabilidade de serem aceitas. Se esse prazo lhe parece
demasiado longo, procure esperar pelo menos trinta minutos.
Recordando o que foi dito no Capítulo 9, os seus sentimentos, transmitidos como "reações-
eu" e não como "julgamentos-você", aumentam as probabilidades de que seu filho ouça o
que você tem a dizer, em lugar de adotar uma atitude defensiva, ou simplesmente não ouvir.
As idéias que você comunica (depois da liberação dos sentimentos da criança) poderão ser
aceitas se forem oferecidas com o

156

respeito sincero. O sr. O. diz: "Meu filho, você pensou na possibilidade de...", ou "Minha
experiência foi que..." Essa abordagem tem menos probabilidade de provocar resistências,
ou antagonizar, do que se ele dissesse: "Bem, se você não tivesse feito isto e aquilo, não
estaria nesta situação", ou "O que você deve fazer é..." ou ainda: "Bem, é óbvio que você
devia..."
Quando a criança tem consciência do problema, tudo o que você pode fazer (depois de ter
ouvido atentamente) é ajudá-la a examinar as várias alternativas, oferecer possibilidades, ou
comunicar experiências que lhe foram úteis no passado. Em última análise é o jovem que
irá colocar em prática as soluções. Quanto mais você ajudá-lo a ter idéias próprias, mais
estará estimulando a sua independência e auto-respeito. Encher as crianças com as jóias da
sabedoria apenas provoca nelas uma resistência às soluções que você possa vir a sugerir.
(Se você for parte da situação que causou a perturbação, use a abordagem democrática para
enfrentar o conflito.)

Armadilhas comuns
Ao lidar com os sentimentos você deve estar atento para certos perigos comuns. Um deles é
a tentação de acusar a criança por sentimentos que ela revelou anteriormente.
A mãe de Margaret ouviu-a falar do ciúme que tinha da irmã, certa manhã, com grande
compreensão. Dois dias depois, ficou furiosa porque Margaret esqueceu, repetidamente, de
realizar as tarefas que lhe cabiam na casa. Explodiu, então: "Você não faz as suas
obrigações e tem a petulância de sentir ciúme de sua irmã, que nunca esquece as dela!"
Quando os sentimentos revelados pelos filhos se transformam em armas nas mãos dos pais,
a criança não irá mais se manifestar.
Uma reação comum à necessidade de ouvir os sentimentos é: "Isso toma muito tempo." Na
verdade, podem ser necessários apenas

157

alguns minutos, como vimos no caso de Billy, que desenhou suas reações para a professora
do jardim-de-infância.
Às vezes, é realmente necessário um certo tempo. Disse a sra. E.: "Na semana passada
ouvi, durante uma hora bem contada, minha filha Glória falar de seus sentimentos. Na tarde
seguinte, ouvi novamente e ela desenhou muita coisa no papel. Somente no terceiro dia de
conversas e desenhos as suas pressões interiores desapareceram."
Se o tempo gasto para ouvir a criança empaticamente parece excessivo, considere as horas
que você passa enfrentando o comportamento negativo. Como disse a sra. V., "Eu me sinto
como se estivesse caçando moscas durante todo o dia. Digo: 'Pare com isso', e os meninos
deixam de fazer aquilo para começar outra coisa errada cinco minutos depois. Param de
beliscar e começam a socar. Há dias em que isso acontece o tempo todo".
A sra. V. funcionava em "regime de caçar moscas" porque enfrentava constantemente os
atos negativos; ela nunca se ocupou dos sentimentos negativos.

Uma regra básica do comportamento humano é que os sentimentos negativos surgem antes
dos atos negativos.

Se Sally tem febre, e a mãe apenas coloca um saco de gelo na sua cabeça, somos tentados a
dizer: "Mas minha senhora, não vê que está tratando apenas dos sintomas? Se quer curar a
febre, terá que verificar a causa!" Mas, como não temos consciência de que as emoções
negativas são os "germes" que levam aos atos negativos, adotamos a atitude do "saco de
gelo".

Focalizamos a ação e ignoramos os sentimentos que a causaram

Pense em você mesmo. Você não é rude senão quando tem algum aborrecimento
íntimo.Você não bate, nem censura, nem explode, enquanto certas pressões não se
acumulam interiormente.

158

As crianças funcionam exatamente segundo esse princípio. Beliscam ou batem, choram ou


se preocupam, choram ou respondem mal, quando experimentam certos sentimentos.
Logicamente, portanto, para eliminar o comportamento indesejável, temos que lidar
primeiro com os sentimentos. As bolsas de gelo não bastam para tratar do comportamento
negativo. (Se você já conhece esse princípio básico, pode compreender que grande parte do
comportamento é prevenida quando as pressões interiores são liberadas antes de serem
transformadas em comportamento inaceitável.)
Tudo sobre a necessidade de ouvir ativamente e de canalizar os sentimentos não adiantará
nada se você não usar esse conhecimento. As intenções não substituem a prática diária.

Trabalho compensatório
O que você pode fazer se, ao tentar compreender seu filho, inadvertidamente retorna ao
"tampão do sentimento"? Seja sincero. Diga-lhe sinceramente que está tentando adotar um
novo comportamento, ou que é difícil para você lidar com certos sentimentos porque
aprendeu que eram inaceitáveis. (Isso coloca a responsabilidade no devido lugar – na sua
formação – e não em seu filho.) Conquiste a ajuda dele. Você pode até organizar um jogo
familiar – "Caça às Rolhas". Faça com que todos se empenhem em encontrar esses
elementos alienantes: julgamentos, negativas, argumentação inoportuna, tentativas de fazer
esquecer e conselhos. Você se surpreenderá ao ver como a distância entre as pessoas
diminuirá. As crianças têm, em geral, grande interesse em ajudar os pais a aprender. Todos
se beneficiam com o maior entendimento.
Mesmo que em muitas ocasiões você não entenda as mensagens de seu filho, o fato de
continuar insistindo mostrará a ele que você se preocupa tanto, que continua tentando.
As crianças – particularmente as mais velhas – podem relutar em atender a essa abordagem,
a princípio. Disse Ken: "Quando meu pai começou a falar dessa maneira nova, fiquei
pensando no

159

que ele estaria querendo. Imaginei que se tratava da mesma coisa, com uma aparência nova:
um pouco de compreensão e depois, pronto, de volta aos velhos discursos. Eu não
acreditava que o velho pudesse mudar. Agora ele parece compreender, pelo menos às
vezes, como eu me sinto. E parou de me dar conselhos inúteis. Estou começando a achar
que ele realmente se interessa. Engraçado, eu pensava que não."
Se seu filho passou 12 ou 16 anos ouvindo você dizer que os sentimentos dele não tinham
importância, precisará de tempo para ajustar-se à sua mudança. Você talvez tenha que
conquistar, com a sua sinceridade, a confiança de seu filho.
Deixe seus filhos saberem que você tem uma nova meta, no que diz respeito aos
sentimentos. Isso é apenas parte de uma atitude sincera. Eles não ficarão, então,
imaginando coisas: "Por que essa súbita mudança?"
Há muita coisa a aprender sobre os sentimentos negativos, mas lidar construtivamente com
eles evita tantos problemas que vale a pena colocar seu conhecimento em prática.
Duas emoções em particular – raiva e ciúme – oferecem tanta dificuldade para pais e filhos
que devem ser examinadas separadamente. Elas se assemelham porque ambas disfarçam
outras emoções. Para manejá-las com eficiência é preciso vê-las como códigos que na
realidade são.

15 COMO DECIFRAR O CÓDIGO DA RAIVA

A raiva vem depois


A sra. N. foi fazer compras numa loja, junto com seu filho de quatro anos, quando de
repente deu por falta dele. Desesperada, procurou-o em meio à multidão, enquanto o medo
crescia nela ao se lembrar de um recente rapto em sua cidade.
Finalmente o encontra atrás de um balcão, brincando despreocupadamente com alguns
papéis. A mãe o levanta do chão e lhe dá uma palmada no traseiro, dizendo: "Menino
levado! Você sabe que tem que ficar perto de mim! Se você se afastar mais uma vez vai
levar uma surra de verdade, está ouvindo?"
A sra. N. está com raiva, mas esse sentimento é secundário. Sua emoção mais forte era o
medo.

***

O sr. E. apressa-se a limpar a garagem antes que seus parentes cheguem para visitá-lo. Tão
logo ele joga alguma coisa fora, seu filho de seis anos a apanha de volta. A frustração do sr.
W. cresce. De repente ele explode: "Chega, Bobby! Já estou cheio de você!"
A frustração desse pai transformou-se em raiva e por isso explodiu com o filho.

***

162

Durante um coquetel, a sra. E. percebe que seu marido está dando uma atenção especial a
uma outra mulher muito mais jovem e mais bonita do que ela. Quando ele volta para junto
da esposa ela lhe diz ironicamente: "O que houve, Romeu? A Julieta jogou você fora do
balcão?"
Ameaçada e ciumenta, a sra. E. disfarçou em sarcasmo as suas reações primárias e agrediu
verbalmente o marido.

***

O sr.T. volta para casa exausto. Ao abrir a porta, seus dois filhos o recebem pedindo, em
voz alta, um aumento de mesada. "Só no que vocês pensam é em dinheiro!", grita ele.
O cansaço transformou-se rapidamente em hostilidade.

***

Ricky se comporta mal na frente de outras pessoas, e o constrangimento de sua mãe cresce.
Incapaz de tolerar mais, ela lhe diz secamente: "Vá para seu quarto, menino, e fique lá até
ser capaz de comportar-se melhor!”
"Não vou, sua velha bruxa!", responde ele.
O constrangimento transformou-se em raiva, e a humilhação, em fúria.
Repetidamente nós, seres humanos, transformamos sentimentos primários em raiva. Não
importa que sejam sentimentos de preocupação, culpa, decepção, rejeição, injustiça,
choque, incerteza ou confusão. E lançamos essa segunda emoção sobre as pessoas que nos
cercam.

Raramente a raiva vem em primeiro lugar.


163

A raiva é um código
Sabendo que a raiva cobre uma emoção anterior, você pode enfrentá-la de maneira mais
eficiente, tanto em você mesmo como em seus filhos. Vista como um código, ela se torna
menos ameaçadora. Se você não tiver consciência desse fato poderá reagir diretamente, e
isso apenas lançará lenha à fogueira.
A mãe de Bobby diz "não" a um pedido para mais uma volta no carrossel. A argumentação
dela, de que é hora de ir para casa, não diminui o desejo do menino. Frustrado e impotente
de conseguir o que quer, Bobby grita: "Você é malvada. Não gosto de você, velha feia!"
Os insultos verbais são apenas uma forma de hostilidade. São menos agressivos do que
bater, mas servem aos mesmos propósitos.
Se a mãe de Bobby compreender somente a fúria do menino, poderá ficar com raiva
também e dar-lhe um tapa ou passar-lhe um sermão. Por outro lado, se ela perceber a
frustração do filho (quer o desejo dele seja ou não justo no seu ponto de vista),
provavelmente não irá piorar a situação, somando a sua raiva à do filho.

Decifrando o código "Quando minha filha me xingou, na noite passada, procurei refletir-lhe
os seus sentimentos, dizendo: Carolyn, você está muito aborrecida comigo", disse a sra. H.
"Claro que estou! Por que eu tenho que ir dormir às oito horas e Jimmy fica acordado até às
nove horas? Ele tem todos os privilégios, só porque é mais velho. Não tenho culpa por ter
nascido depois!"
Invariavelmente, quando podemos aceitar a raiva, ouvindo ativamente, as próprias crianças
nos levam aos sentimentos subjacentes. O código é decifrado e podemos chegar à essência
da questão. Neste exemplo, Carolyn diz à mãe que sua hostilidade é provocada pelo
sentimento de estar sendo injustiçada.

164

"É uma injustiça terrível não ter os mesmos direitos, e ela nada pode fazer, pois é
impossível ficar mais velha do que o irmão", refletiu a mãe.
"É isso mesmo", concordou a menina.
"E você fica com raiva porque seu pai e eu permitimos isso", acrescentou a sra. H.
"Claro que fico. A culpa é sua por eu ter nascido depois. É evidente que, se você tem mais
de um filho, alguém deve ser o segundo; mas eu não gosto de ser a mais nova.”
"Há, realmente, muitas desvantagens em ser mais novo.”
"Sem dúvida!", disse Carolyn mais tranqüila. "Mas há momentos em que é bom, porque
não tenho que fazer tantas coisas como o Jimmy.”
"Então às vezes você acha vantajoso ser mais nova", comentou a mãe.
"É, acho que gosto das vantagens, mas não das desvantagens", disse Carolyn sorrindo.
Quando os sentimentos foram colocados em palavras e aceitos, a pressão que os cercava foi
liberada e a causa da hostilidade veio à tona. Não tendo que defender sua posição, Carolyn
compreendeu que, apesar de tudo, tinha algumas vantagens. Além disso, a empatia fez com
que ela não se sentisse menos valorizada devido a seu desejo perfeitamente normal.

A raiva é normal
Em geral nos ensinam que a raiva é "má" e não devia existir. E nós transmitimos às
crianças que esse sentimento é inaceitável. Elas, por sua vez, sentem-se menos valorizadas
porque em determinados momentos ficam com raiva.
A raiva é mais um fato da vida – uma das muitas emoções a que os seres humanos estão
sujeitos.
A hostilidade mais difícil de ser tolerada é a que se volta contra nós mesmos.
Compreendemos as irritações contra os amigos, os

165

irmãos e irmãs, contra situações, e talvez até mesmo contra professores; mas, de alguma
forma, achamos que nós deveríamos estar isentos.
Mas a nossa condição de pais nos obriga, em muitos casos, a provocar a frustração nos
nossos filhos. Do nosso ponto de vista, as restrições que determinamos fazem sentido. Mas
para as crianças pode não parecer assim. Se só entendermos a "nossa parte do elefante",
então a raiva delas nos parecerá injustificada. Depende, portanto, do ponto de vista adotado.
Você não precisa modificar sua posição, mas será capaz de compreender também o ponto
de vista de seu filho?
Um exemplo de como as crianças pequenas vêem os pais nos foi dado por um grupo de
meninos de quatro anos, muito inteligentes. Seu assunto favorito era "Como Conviver com
as Mães!" As crianças têm tantas razões para se irritarem conosco, em algumas ocasiões,
que se não o demonstram é porque estão, provavelmente, disfarçando esse sentimento. Do
ponto de vista da criança é difícil conviver conosco – até mesmo com os melhores de nós.
Portanto, se seu filho disser: "Não gosto de você", "Você é malvada", ou "Eu queria ter
outra mãe (ou pai)", não se aborreça e procure acompanhar os sentimentos dele. Ele
acabará revelando-lhe o código e então você poderá lidar com os verdadeiros problemas –
as emoções primárias.

Causas da raiva
Todos os sentimentos negativos podem transformar-se em raiva: mas, em cada fase da vida,
há situações particulares que podem provocá-la mais do que outras.
Para a criança muito pequena a hostilidade está relacionada com as necessidades físicas e
emocionais não-satisfeitas. A dor de um estômago vazio, a irritação de uma fralda molhada,
ou a necessidade de carinho fazem com que o bebê chore pedindo ajuda.

166

Se suas necessidades forem satisfeitas com razoável rapidez, ele não terá que enfrentar uma
frustração muito grande. Se as frustrações infantis forem mantidas no mínimo, o número de
momentos de raiva será, evidentemente, reduzido. A criança não passará grande parte do
seu dia sentindo que está lhe faltando alguma coisa.
A busca de poder, domínio e independência pela criança em idade pré-escolar provoca
colisões frontais com as pessoas à sua volta e com o seu ambiente. A vida tem, para ela,
milhares de frustrações.
Como as crianças pequenas precisam de intensa atividade muscular, as limitações físicas
representam, para elas, uma frustração real. Quando Berta era pequena, o castigo que sua
mãe lhe impunha era deixá-la sentada numa cadeira durante meia hora. Com o corpo
ansiando por exercícios vigorosos, Berta se sentia muito frustrada. Sua mãe a considerava
muito teimosa. "Ela sai da cadeira e imediatamente faz alguma coisa que sabe muito bem
que não deve fazer." Sua mãe não compreendia que a forma de castigo adotada servia
apenas para recarregar a "bateria emocional" de Berta com maiores doses de hostilidade.
Não é de surpreender, portanto, que ela saísse do castigo disposta a ir à forra.
Para reduzir os acessos de raiva elimine o máximo de frustrações possível, nos momentos
em que seus filhos estiverem passando pelos ajustes psicológicos resultantes de sua fase de
crescimento, ou de circunstâncias externas. Crie um ambiente adequado às necessidades
deles para diminuir os conflitos. Evite isolar uma criança com raiva, a não ser que ela
prefira ficar sozinha. Mandar a criança para o quarto gera um sentimento de rejeição que
apenas agrava os sentimentos negativos. O objetivo é reduzir as cargas emocionais e não
aumentá-las.
Isso não significa que a frustração seja, por si só, prejudicial às crianças. O segredo está no
volume de frustração enfrentado pela criança, em que fase e com que freqüência essa
frustração se torna parte de sua vida. A dose certa, na ocasião adequada, aumenta a

167

tolerância à frustração, dando condições à criança para enfrentá-la. O bebê, por exemplo, é
menos capaz de enfrentar os atrasos na hora da mamadeira do que a criança de um ano; as
pressões da criança de dois anos tornam-na menos capaz de enfrentar a frustração do que a
que tem três anos. A criança que vive com excesso de frustração em todos os momentos
torna-se muito mais sensível: basta um leve arranhão para fazê-la berrar.
Em todas as idades, a hostilidade pode ser motivada por padrões pouco realistas, disciplina
destrutiva, encontros ameaçadores, competição excessiva e constante comparação com
outros.
É impossível eliminar todas as situações que provocam raiva, mas você pode procurar
reduzir a quantidade delas. Haverá muitas ocasiões em que a criança ficará com raiva. Você
deve, então, ajudá-la a expressar essa raiva de forma direta. E para isso você deve ouvi-la
com uma compreensão empática e uma atenção ativa, aceitando a emoção e canalizando a
raiva para escoadouros seguros.

Lidando com a própria raiva


O primeiro passo para enfrentar com eficiência a hostilidade é aceitar a existência desse
sentimento em você mesmo. Envergonhar-se de suas animosidades, ou negá-las, torna
quase impossível enfrentar as raivas de seu filho. Os impulsos agressivos dele mexem com
os sentimentos proibidos existentes em você.
A segunda coisa a fazer, no caso de raiva, é vê-la como ela é: um código que indica a
presença de uma emoção anterior. Da próxima vez que ficar com raiva, procure a emoção
subjacente. Identifique o sentimento preliminar e comunique-o, em lugar de comunicar o
código. Em seguida, enfrente a causa de sua raiva. É difícil encontrar soluções para
emoções disfarçadas. Esse hábito faz de você um modelo positivo para seus filhos. Além
disso, a comunicação de sentimentos primários causa menos danos à auto-estima

168

do que violentas agressões verbais. A raiva atemoriza as crianças; a comunicação de


emoções primárias reduz os seus temores.
Quando você partilha desses primeiros sentimentos transmite reações do tipo "eu", e não
"julgamentos dos outros". (Ver Capítulo 9.) Invariavelmente as expressões de raiva são
séries de julgamentos que destroem o auto-respeito. Examine as suas reações com relação a
isso. Anote algumas das coisas que costuma dizer quando está com raiva, e veja com que
freqüência elas se enquadram nessa categoria. Uma advertência: dizer "Estou com raiva"
não é uma reação do tipo "eu" porque não revela os seus sentimentos subjacentes. Dizer
isso apenas disfarça o que realmente está acontecendo dentro de você.
Em muitos grupos de encontro pessoal, o agressor se afirma manifestando sinceramente a
sua ira. (Embora essa manifestação possa aliviá-lo, deixa a sua vítima insatisfeita, ou ainda
mais na defensiva.) Quando você sabe que a raiva é uma espécie de vapor exalado por
outros sentimentos perturbados, ser totalmente sincero significa transmitir a sua emoção
básica, ou seja, a sua primeira emoção.

Sinais de raiva
As crianças pequenas geralmente mostram diretamente a sua raiva. Na idade pré-escolar
elas mordem, dão pontapés, se sacodem, gritam, cospem ou dão beliscões, e não há dúvidas
de que estão com raiva. Quando elas estão perturbadas, podem até mesmo ter um ataque de
raiva.
A maneira como você enfrenta esses ataques pode prejudicar o seu esforço de relacionar-se
construtivamente com seus filhos. Os ataques são apenas gritos que significam "Perdi todo
o controle! Estou extremamente frustrado!" É evidente que algumas crianças usam os
ataques como uma maneira de controlar o ambiente; aprenderam que gritar e dar pontapés
lhes proporciona o que

169

querem. Se isso estiver acontecendo em sua família, só há uma forma de solucionar a


situação: mantenha-se firme, coloque algodão nos ouvidos, se necessário, e deixe seu filho
fora das situações em público nas quais ele queira ter os seus acessos para tentar impor a
sua vontade. Quando ele compreender que você não vai ceder, provavelmente desistirá.
Mas esteja preparado para enfrentar todos os recursos dele, até que se convença totalmente
de que você mudou de tática. Mas, se você não ensinou ao seu filho que ele pode fazer o
que quiser quando berra e se joga no chão, então a "birra" é uma indicação de que ele não
se sente capaz de enfrentar as situações.
Os pais de Paul não sabem que as "birras" disfarçam a perda de controle. Consideram-na
como um comportamento inadequado e, em conseqüência, o castigam fisicamente. Quais os
resultados desse tratamento?
Coloque-se por um momento no lugar de Paul. Primeiro ele fica totalmente frustrado por
uma situação que não pode controlar. (Aos quatro anos seus controles ainda são mal
desenvolvidos.) No momento preciso em que ele está sobrecarregado de emoções que não
pode dominar, recebe uma grande palmada. Passa a ter, então, vários sentimentos novos
para enfrentar: mágoa com a palmada, frustração de não ser compreendido, ressentimento
por não ter a ajuda dos pais, impotência para se vingar diretamente e medo de novo castigo.
Resultado: mais sentimentos negativos do que antes.
"Mas", diz o pai dele, "quando eu lhe dou uma palmada ele pára com a 'birra'
imediatamente!" Claro, o sintoma desaparece, mas por quê? Devido ao medo.
Superficialmente a palmada parece eficaz. Mas o que acontece com todos os sentimentos
que provocaram a "birra"? E o que Paul faz com todos os sentimentos novos provocados
pela palmada? Pode reprimi-los, mas eles acabarão por se manifestar por meio de muitos
outros modos pelos quais os sentimentos recalcados se fazem sentir. Paul recebe uma lição
sobre como é "Melhor Reprimir do que Expressar".

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Se você tem qualquer dúvida sobre a conveniência de dar palmadas para acabar com
ataques de raiva, pergunte a si mesmo quais seriam seus sentimentos se, num momento em
que tivesse perdido totalmente o controle, a pessoa mais importante de sua vida batesse em
você. Você sabe como se sentiria; as crianças têm a mesma reação. (Alguns pais se acham
no direito de ter ataques de raiva e de bater, mas nem sonhariam em permitir que os filhos
tivessem as mesmas reações.)
Quando você sabe o que os ataques de raiva ou "birras" significam – a comunicação de uma
frustração extrema – é evidente que a agressão física, da sua parte, será a atitude menos
proveitosa. Nessas ocasiões a criança precisa de uma assistência construtiva – deve ser
ouvida ativamente, e seus sentimentos devem ser dirigidos para escoadouros seguros.
Lembre-se que quando você fecha a porta à expressão direta da raiva – por meio dos
escoadouros aceitáveis – você literalmente insiste na repressão, com todas as suas
desvantagens.

Sinais indiretos de raiva


A implicância constante, os mexericos e o sarcasmo são manifestações indiretas de
animosidade acumulada. Na maioria das famílias essas atitudes são mais seguras do que a
expressão direta. A criança tem o álibi perfeito: "Ora, eu não quis dizer nada com isso."
Quando a criança receia expressar a raiva diretamente, encontra alvos substitutivos. A raiva
de Brian contra a mãe foi liberada por meio da indignação contra seu professor. Gerald
reprimia as hostilidades contra seu irmão e as liberava contra os meninos da vizinhança.
Gretchen liberava a sua sendo cruel com os animais. Bill enfrentava a agressão contra os
pais contrariando os valores deles. Os pais gostavam de decisão, e ele se especializava no
adiamento; eles pregavam a cortesia, ele cultivava a grosseria; eles queriam que escrevesse
semanalmente quando estava no colégio,

171

mas ele não o fazia. Outros, ainda, encontram a liberação associando-se a grupos que
"odeiam".
Muitas crianças voltam a hostilidade contra si mesmas, apresentando sintomas de asma,
vômitos, acidentes constantes e medos exagerados. A criança "boa" demais e extremamente
tímida mascara, muitas vezes, agressões fortes que aprendeu a considerar inaceitáveis.
A criança tímida evita o envolvimento com os outros para que seu segredo não seja
revelado.
A criança que aprendeu que a hostilidade provoca desaprovação teme os seus impulsos
agressivos. As crianças de menos de seis anos acreditam que os desejos agressivos – de que
o bebê desapareça, por exemplo – se transformarão em fatos. Podem, então, ser
excessivamente boas para negar, a si mesmas e aos outros, a existência desse desejo. A
diferença entre a realidade e a fantasia é imprecisa para a criança pequena. Mesmo quando
ela coloca seus desejos agressivos em ação, acredita que são "maus". Você precisa ensinar,
de forma ativa, a diferença entre sentimentos hostis e ações hostis.
A depressão é outro sinal indireto da raiva. Ela resulta da raiva forte e não manifestada
contra alguma pessoa ou situação; da culpa em relação à raiva, e da repressão. Esse
processo ocorre no subconsciente, e a pessoa só percebe que se sente deprimida. A tristeza,
freqüentemente, é um disfarce da raiva.
Se seu filho usa meios indiretos para expressar hostilidade, isso mostra que ele se sente
inseguro para fazer isso de maneira direta. Cabe a você ajudá-lo a encontrar saídas
socialmente aceitáveis para a expressão direta.
Enfrentar, de maneira construtiva, a raiva de seu filho é ajudá-lo a aceitar todas as partes de
si mesmo sem julgamento negativo. E isso constitui a base do respeito próprio.

16 COMO DESMASCARAR O CIÚME

O "resfriado comum"
Tentar eliminar todo o ciúme é como tentar impedir que a criança pegue um resfriado
comum. É impossível. O ciúme é parte integrante da vida.
Todos nós sofremos os seus efeitos e sabemos que o ciúme gera sentimentos e
comportamentos que causam angústia. Nossa experiência pessoal e a incapacidade de nossa
cultura em aceitar os sentimentos negativos geralmente fazem com que ensinemos aos
nossos filhos que o ciúme é errado. As crianças, apesar de nossos melhores sermões,
continuam a ter ciúme, embora possam sentir-se culpadas e menos dignas com isso. Muitas
vezes não conseguimos ver que o ciúme é apenas uma máscara.

O que diz o ciúme


O que uma outra pessoa deve ter para que você sinta ciúmes dela? Maiores habilidades,
atração ou autoconfiança? Ser mais aceita, ter posição ou dinheiro? Na realidade, o que
provoca esse sentimento não tem importância. O essencial é que

o ciúme surge quando nos sentimos em desvantagem.

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Quando você se sente perfeitamente seguro nas áreas que considera importantes, o ciúme
não existe. Essa emoção disfarça a sua convicção de não ter sorte. É um sinal de alarme
dizendo "Eu me sinto ameaçado, enganado, inseguro, excluído". Pode dizer também
"Tenho medo de partilhar uma pessoa porque posso perdê-la", ou mesmo "Eu não gosto de
mim mesmo".
Intenso e generalizado, ou moderado e ocasional, o ciúme faz com que você se sinta muito
deprimido para ser feliz. Não importa se a desvantagem é real ou imaginária. O ciúme é
real para a pessoa que o sente.

Por que as crianças sentem ciúme


A própria natureza da vida em família traz desvantagens intrínsecas para irmãos e irmãs.
Toda criança quer amor e atenção exclusivos dos pais; ela quer ser a mais amada. Esse
desejo torna o ciúme inevitável nas famílias.
Basta você imaginar que vive numa sociedade que permite a poligamia para perceber o
sofrimento de seus filhos. Nessas culturas, a rivalidade entre as esposas constitui um
problema sério. Todos os recursos são usados para conseguir a condição de favorita.
Suponha que você é uma mulher vivendo nessa sociedade. Não gostaria de ocupar o lugar
número um, ou pelo menos ter, de vez em quando, a confirmação de que ainda ocupa um
lugar de destaque na afeição de seu marido? Você não procuraria oportunidades para
alfinetar as suas rivais e criar-lhes problemas? Possivelmente você preferiria livrar-se
desses espinhos na sua vida.
As crianças estão exatamente nessa posição. Bobby vê a mãe passar longas horas cuidando
do novo bebê, e o ciúme começa a atormentá-lo. Jane, que tem cabelos encaracolados, vê a
mãe amarrar, todas as noites, os cabelos de sua irmã, que os tem lisos, e gostaria de ter
alguma desculpa para receber a mesma atenção. Sallly nota que sua irmã faz rapidamente
os deveres de casa, enquanto ela leva muito tempo.

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Toda criança, de certo modo, vive à sombra dos outros na família, sentindo-se em
desvantagem em algumas coisas. Mesmo o filho único não é poupado desse sentimento,
tendo ciúme de outras crianças fora da família, e desejando, talvez, ter irmãos e irmãs. E
pode ter inveja das atenções que seus pais dispensam a outras crianças.
O ciúme é tão normal que, mesmo quando irmãos e irmãs se respeitam mutuamente, podem
não se sentir seguros para revelar seus verdadeiros sentimentos. Por outro lado, se o ciúme
é o tema principal da vida da criança, ela sofrerá. Qualquer uma dessas situações - a falta
total de ciúme ou a sua presença constante - significa que a criança precisa de auxílio.
O objetivo não é eliminar totalmente a presença do ciúme, mas reduzir as situações que o
provocam e trabalhar com o sentimento quando ele aparece.
Vantagens das rivalidades
Pode parecer que a rivalidade entre crianças não traz benefícios. No entanto, irmãos e irmãs
ensinam, uns aos outros, a enfrentar uma das realidades da vida: não se pode ter atenção
exclusiva, nem todas as vantagens. É uma lição dura, especialmente para a criança pequena.
Ela tem de aprender que o amor não é como um bolo: amor dividido não significa menos
amor.
Irmãos e irmãs ajudam a criança a aprender como dar e receber dentro do círculo familiar.
Oferecem experiências valiosas em comunicação e concessão - lições que o filho único só
irá aprender, em grande parte, fora da família. Se as rivalidades forem tratadas de maneira
construtiva, as crianças aprenderão que o valor dos outros não lhes diminui o valor próprio
como pessoas.
As rivalidades familiares normais diminuem a egocentricidade infantil e desenvolvem
forças e recursos interiores. Por mais incômodas que sejam, elas proporcionam experiências
no convívio com os outros.

176

Reduzindo o ciúme
Assim como no caso de raiva, é prudente reduzir o número de ocasiões em que a criança
possa se sentir em desvantagem. Em primeiro lugar, e o que é mais importante, deve-se
ajudar a criança a desenvolver a auto-estima, pois assim reduzimos a sua convicção de que
é infeliz. A confiança em si mesma funciona como uma proteção contra o sentimento de ser
o último. A criança convencida de seu valor está menos ameaçada pelo valor das outras.
Pode dividir o amor de seus pais porque sabe que ocupa um lugar sólido no coração deles.
A criança que se sente inadequada e não tem consciência de seu valor é um alvo fácil para o
ciúme na maioria dos casos. Sem ter fé em si mesma ela se sente diminuída a todo
momento. Tem de agarrar o que pode e procura oportunidades para depreciar os outros.
Não pode tolerar a divisão de tempo e de atenção.
Toda criança convive melhor com as outras – até mesmo com seus irmãos e irmãs – quando
gosta de si mesma.

A criança que tem respeito próprio sente ciúme com menos freqüência.

Ela pode sentir um pouco de ciúme, mas a sua experiência positiva e a fé em si mesma
fazem com que esse sentimento dure pouco.
Trabalhe com cada criança para que ela possa desenvolver seus interesses e talentos
especiais. Trate cada uma delas como a um indivíduo à parte. Responsabilizar uma criança
pelo mau comportamento de outra apenas provoca sentimentos intensos. Disse Sid:
"Quando meu irmão amassou o carro, Papai tomou as chaves de nós dois. Eu nem mesmo
estava com Skip na hora do acidente. É como se papai achasse que, se Skip amassou o
carro, eu também tive culpa. É sempre assim: ele nos trata como se não fôssemos pessoas
diferentes.”

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Os encontros autênticos são um antídoto para o ciúme. Brian está aborrecido por não ter
sido escolhido capitão de seu time, mas a decepção é diminuída quando seu pai planeja
passar momentos especiais sozinho com ele. Henry se sente infeliz por não ser tão alto e
forte quanto o irmão, mas sabe que os pais o amam, apesar de seu tamanho e de sua força.
Dificilmente temos o mesmo sentimento em relação a cada filho, e nem sempre os tratamos
da mesma maneira. Se, porém, um filho recebe sempre um tratamento preferencial,
estaremos aprofundando os ressentimentos dos menos favorecidos.
Se constantemente você prefere um de seus filhos, procure descobrir a causa desse
favoritismo. Os menos favorecidos têm traços de que você não gosta? (Lembre-se: o traço
que você menos aprecia num filho é, com freqüência, o mesmo que você rejeita em si.)
Compreender essa qualidade em você mesmo – e aceitá-la – irá ajudá-lo a aceitar melhor o
seu filho.
Como já vimos, o pai pode preferir um dos filhos como uma compensação para as suas
próprias necessidades não-satisfeitas e, com isso, pressiona indevidamente a criança. Esse
tratamento provoca um ciúme intenso nos outros irmãos e irmãs que não sofrem a mesma
pressão.
Quando o ciúme existe, examine a situação de sua família e verifique se você realmente
oferece mais vantagens a um filho do que a outros. Há, por exemplo, a tendência em
transformar a filha mais velha numa espécie de mãe assistente. E, se você não lhe oferecer
compensações por isso, ela poderá desenvolver um forte ressentimento contra os irmãos e
irmãs mais novos, por terem uma posição de menos responsabilidade na família. Ana foi
incumbida de fiscalizar o comportamento de seus irmãos e irmãs mais novos. Quando eles
se comportavam mal, era responsabilizada. Ana sentia-se em clara desvantagem.
O tratamento desigual, baseado na idade ("Quando você tiver dez anos poderá ficar
acordado até tarde como Bill"), é aceito

178

com mais facilidade pela criança do que a desigualdade motivada pelo sexo ("As meninas
não devem ser brutas, isso não é próprio delas"). Quando o tratamento é diferente devido à
idade, a criança pelo menos sabe que terá uma oportunidade no futuro. Mas quando o
tratamento é injusto devido ao sexo a criança se sente presa numa armadilha. Poderá, nesse
caso, ressentir-se de seu sexo e rejeitá-lo.
A maneira mais segura de provocar o ciúme é a comparação. Como o ciúme vem do
sentimento de ser "menos que" o outro, as comparações apenas aumentam a fogueira.
"Não compreendo por que você não estuda como a sua irmã. Eu nunca tenho que dizer isso
a ela.”
"Ken não joga fora o dinheiro dele como você faz. Como economizou a mesada, tem o seu
próprio carro. Mas você não faz nada com o seu dinheiro!"
Observações como estas – comuns em milhares de famílias – são um veneno mortal. Elas
provocam ciúme, ressentimento e inadequação. Mostram à criança que ela é inferior a
alguma outra. Para compreender a situação, pense no que você sentiria se o seu chefe
dissesse: "Por que você não apresenta seus relatórios em tempo, como John? Ele nunca se
atrasa." Mesmo que você se modifique, não irá gostar que alguém lhe seja apontado como
modelo. Se lhe fizerem tal observação, você provavelmente ficará satisfeito quando John
fracassar. Você poderá até mesmo procurar uma oportunidade para colocá-lo em má
situação com o chefe.
Mesmo que você nunca use essas palavras comparativas com seus filhos, se pensar nesses
termos eles serão transmitidos de maneira não-verbal. Como as comparações são freqüentes
em nossa cultura, precisamos nos lembrar sempre de que "Cada criança é única; não adianta
compará-la com outra".

Comparações servem apenas para reduzir a auto-estima e estimular sentimentos de


inadequação.

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Muitas crianças fazem as suas próprias comparações sem precisar de nós para isso. Na
verdade, ensinar às crianças a não se compararem com outras é um grande desafio.
Para diminuir as rivalidades, mostre diretamente à criança como você se sente (com as
reações do tipo "Eu"). Evite mencionar exemplos brilhantes do comportamento de outras
pessoas.
Construir a auto-estima, evitar o tratamento preferencial e injusto, recusar-se a usar a
criança para satisfazer suas próprias necessidades insatisfeitas, e evitar comparações, são
algumas das medidas para evitar os ciúmes desnecessários.

A atmosfera familiar influi no ciúme


O clima que existe em qualquer família afeta a rivalidade contida nela.
A família de George vivia muito bem. Seus pais respeitavam-se e ajudavam-se
mutuamente. Uma atmosfera tranqüila, na qual as pessoas eram mais importantes do que as
coisas, evitava muitos atritos. Como grupo, participavam juntos de muitas atividades; no
entanto, todos tinham liberdade para participar sozinhos de outras coisas; todos se sentiam à
vontade para convidar estranhos. A família de George estabeleceu, de forma cooperativa, as
suas regras sobre o respeito às necessidades de cada pessoa. Naturalmente George tinha
uma atitude aberta, sentia-se valorizado e raramente tinha ciúme de seus irmãos e irmãs.
Em contraste, Pauline vinha de uma família muito disciplinada, em que apenas as
necessidades do pai tinham prioridade. Ela observou que, por mais que sua mãe se
empenhasse, o pai nunca estava satisfeito. O ambiente doméstico era marcado pela
desconfiança, pela ânsia de perfeição, de bens materiais e de posições, e as crianças
recebiam estímulos ativos para competirem entre si. Viviam numa comparação diária, com
pouco carinho ou humor. Tinham que lutar pelas migalhas de afeição que sobravam. O
clima geral da família era tal que ninguém gostava de ninguém.

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Não é de surpreender que Pauline considerasse o fato de ser menina como uma
desvantagem, ou que os ciúmes fossem intensos em sua família. Sentindo-se
profundamente inadequada, vivia na suspeita de que todos eram melhores do que ela.
Estava pronta a brigar pela menor coisa.
A maneira como vivemos com nossos maridos e nossas mulheres, a divisão da
responsabilidade e como satisfazemos as nossas necessidades afetam o moral da família e
os ciúmes. Uma família tranqüila, receptiva, cooperativa diminui o número de
oportunidades que as crianças têm de se sentirem em desvantagem.

Momentos explosivos
Certos períodos na vida de toda criança tornam o ciúme mais presente. Tendo isso em
mente, você pode estar pronto para ajudar.
Sabemos todos que um bebê novo sempre provoca ciúmes em outras crianças. Por mais que
elas se interessem pela sua chegada, acabam sentindo-se um tanto deslocadas depois que a
novidade desaparece, ou o bebê se transforma em alguma coisa que lhe é pessoalmente
desagradável.
Podemos esperar o aumento do ciúme cada vez que a criança deve enfrentar uma nova fase
de seu desenvolvimento, pois nessa hora ela se sentirá menos segura de si. A insegurança
interior deixa-a mais sensível com relação às vantagens que acha que os outros têm, apesar
dos fatos.
Os acontecimentos externos também podem provocar insegurança e tornar mais provável o
ciúme. Entrar para a escola, adaptar-se a um professor novo, separar-se dos amigos que se
mudam, mudar para uma comunidade nova, enfrentar matérias difíceis, ajustar-se à
separação, morte ou divórcio na família – qualquer pressão nova pode provocar explosões
nas crianças.
O ciúme é mais intenso entre filhos do mesmo sexo e com pouca diferença de idade. Tom e
Dick, de quatro e cinco anos, são

181

ambos muito apegados à mãe. Seus conflitos são mais intensos do que se Tom tivesse
quatro e Dick, quinze anos.
Quando a criança sofre pressões interiores ou exteriores que possam ameaçar sua
adequação, você deve ajudá-la com o apoio empático.

Lidar com o ciúme de maneira construtiva


Mesmo quando você reduz o número de situações que criam ciúme, ele ainda pode surgir
em várias ocasiões. Sua tarefa não é decidir se seu filho deve ou não ter esse sentimento,
mas enfrentá-lo junto com ele.
O ciúme é particularmente impermeável à argumentação e à lógica. Como dissemos no
Capítulo 14, a maneira mais construtiva de reduzir os sentimentos negativos de qualquer
tipo é estimular a sua expressão – em palavras, desenhos, pinturas, música, argila, jogo
dramático – ao mesmo tempo em que se ouvem e se aceitam sinceramente tais sentimentos,
do ponto de vista da criança. A criança ciumenta tem fome de compreensão empática.
O ciúme que nos parece ilógico é o mais difícil de ser aceito. Sabemos, porém, a partir de
nossas próprias experiências, que os sentimentos nem sempre são lógicos. A convicção da
criança de que está sendo deixada "de fora" ou enganada pode não corresponder aos fatos.
Mas isso não tem importância. A questão é que ela se sente infeliz nesse momento. E você
deve ajudá-la a enfrentar o que ela está sentindo nessa ocasião, pois do contrário ela poderá
concluir que "Meus pais não compreendem".
Veja estas explosões típicas de ciúme que ocorrem, de tempos em tempos, na maioria das
famílias:
"Você faz mais pelo Teddy do que por mim!", exclama Gene.
"Ora, Gene, isso é um absurdo!", responde o pai. "Eu não te levo para passear todas as
tardes de sábado? Não comprei uma bicicleta para você no Natal? E você não vai acampar
no verão?

182

Isso custa dinheiro e não gastamos tanto assim com Teddy, ainda. Na verdade, você recebe
mais coisas do que ele. Por isso, pare com essa implicância."
O pai de Gene bombardeou-o com fatos para mostrar-lhe que ele não tinha razões lógicas
para seus sentimentos. Como o pai pode aceitar um sentimento irracional que não se
harmoniza com a realidade? Os sentimentos podem ser irracionais, mas quando você os
aceita como legítimos – porque eles existem – a criança define as questões reais e se torna
mais realista em suas reações. Tentar acabar com o ciúme pela argumentação apenas
reforça o sentimento de infelicidade da criança.
Como o pai de Gene pode enfrentar os sentimentos do filho de maneira mais construtiva?
"Você faz mais pelo Teddy do que por mim!", exclama Gene. "Parece que você está se
sentindo prejudicado", responde o pai, tentando penetrar nos sentimentos do filho.
"Sim, todas as noites você deixa ele ficar sentado no seu colo e lê aquelas histórias idiotas",
retruca Gene. (Como os seus sentimentos foram aceitos, Gene deixa o pai perceber o que
realmente o está aborrecendo.)
"Você não gosta que eu trate o Teddy dessa maneira", reflete o pai.
"Ora, por que deveria gostar? Só porque ele é pequeno recebe toda essa atenção como se
fosse um personagem privilegiado aqui, ou coisa parecida!”
(Seria tentador lembrar a Gene, a essa altura, que ele recebeu o mesmo tratamento quando
era pequeno, mas tal mensagem interromperia a comunicação. Lembrar-lhe alguma coisa
que recebeu há cinco anos não tem importância para os seus sentimentos do momento.
Observe como uma empatia maior faz aflorar a verdadeira questão.)
"É difícil para você dividir a minha atenção com o Teddy", diz o pai.

183

"É sim, papai", responde Gene calmamente. "Eu sei que você passa todas as tardes de
sábado comigo, mas isso acontece apenas uma vez por semana. Teddy tem a sua atenção
todas as noites.”
"Você gostaria que eu dedicasse a você um pouco mais do meu tempo, não é?”
"É sim. Talvez sábado à tarde eu saísse com Bob e o pai dele, nós dois poderíamos passar
uma meia hora juntos todas as noites, depois que Ted fosse dormir, para jogar damas. Eu
não quero que você leia histórias pra mim como se eu fosse uma criancinha, mas gostaria
de jogar uma ou duas partidas de damas."
A empatia ajudou o pai de Gene a chegar à verdadeira causa do problema; ajudou o menino
a superar a idéia irracional de que seu pai fazia mais para o irmão do que para ele. Gene
pôde levar em conta as limitações de tempo do pai e, juntos, chegaram a uma solução que
atenderia à sua necessidade de ter a companhia do pai com mais freqüência.
No exemplo seguinte, a mãe ajuda a filha a expressar seu ciúme, tanto em palavras como
em atos:
"Odeio Jane", gritou Bonnie certa noite. "Uma de nós duas terá de ir embora.”
"Você não pode tolerar mais a sua irmã", disse empaticamente a mãe.
"Não, não posso não. Ela é teimosa; por mais que lhe bata, ela não chora. (Bonnie deixa o
código da raiva e tira a máscara do ciúme para revelar os sentimentos de frustração e
inadequação.)
"Você gostaria de ser forte para se desforrar.”
"Claro! Mas não há como. Ela sempre será mais forte do que eu.”
"Você acha que nunca poderá ir à forra com ela.”
"Isso mesmo, mamãe", disse Bonnie, mais calma. "Não consigo ir à forra com ela, por isso
quero que ela desapareça.”
"Essa lhe parece a única solução – livrar-se dela", repetiu a mãe.
"É sim, mas sei que você não fará isso." (E reconhece, assim, que o seu desejo não é
realista. É um desejo normal para alguém

184

que sempre se sentirá em posição de inferioridade; mas, sem precisar de qualquer


argumentação da mãe, Bonnie tem consciência dos fatos. A compreensão empática que
recebe da mãe lhe aumenta a probabilidade de poder enfrentar a realidade de fato.)
"Não", responde a mãe. "Não posso mandá-la embora, mas você pode fingir que esta
boneca é a Janet e fazer o que quiser com ela." (A mãe estabeleceu os limites do
comportamento, mas ofereceu a Bonnie um canal aceitável para os sentimentos intensos
que precisavam ser expressos.)
Com isso, Bonnie começou a bater com a boneca no chão, a pular em cima dela, gritando:
"Sua estúpida, coisa forte e grande! Agora você não é tão forte; veja agora quem é forte!
Você é pequena e fraca e eu vou fazer picadinho de você! Estúpida, fraca, chorona!"
Furiosa, Bonnie bateu na boneca, gritando repetidamente "Você é a pequena! Tome isto e
mais isto!"
Enquanto a mãe continuava a dar-lhe apoio, colocando seus sentimentos em palavras,
Bonnie dava vazão à sua fúria. Depois, olhou para a mãe e disse: "Estou cansada. Vou
dormir."
Sem saber se todos os sentimentos de estar em desvantagem haviam sido liberados por
Bonnie, sua mãe preparou-se para ter novas conversas sobre o assunto. Na manhã seguinte,
porém, a filha estava de bom humor, oferecendo-se até mesmo para passar manteiga na
torrada da irmã. A tempestade estava superada; o sentimento se havia liberado de tal forma
que a afeição que Bonnie também sentia pôde manifestar-se. Poderá haver outras ocasiões
em que ela se revolte contra a força da irmã, mas a mãe poderá ajudá-la a enfrentar esses
sentimentos quando surgirem.
Proporcionando um escoadouro seguro e ouvindo empaticamente a filha, a mãe de Bonnie
ajudou-a construtivamente a enfrentar seus sentimentos. Não sugeriu soluções, não
argumentou, não fez julgamentos. Simplesmente colocou-se ao lado da filha e tentou
compreender como ela via o mundo. Bonnie não se sentiu "má" devido ao ciúme e à raiva.
Seus sentimentos negativos dissiparam-se depois de expressos e aceitos como reais para
ela.

185

Muitas crianças têm menos dotes naturais do que os irmãos ou irmãs. É natural que essa
desvantagem lhes provoque sentimentos negativos. A compreensão empática pode ajudá-
las a aceitar o inevitável.
Muitas vezes um dos filhos recebe tratamento especial por causa de sua idade ou de uma
circunstância específica.Você pode, nesse caso, diminuir o ciúme proporcionando aos
outros um privilégio correspondente; se isso não for possível, ajude-os a aceitar o fato mais
facilmente, compreendendo como se sentem.
A empatia diz: "Você não é menos amado, nem tem menos valor, devido aos seus
sentimentos. Eu compreenderei e tentarei ajudá-lo a enfrentar esses sentimentos." A recusa
em aceitar os sentimentos de ciúme faz com que as crianças se sintam culpadas, menos
amadas e indignas. A falta de aceitação dos sentimentos é sempre prejudicial à auto-estima.

Sinais de ciúme
Com freqüência, a criança não revela diretamente os sentimentos que se escondem atrás do
ciúme. Ela não diz: "Tenho medo de dividir você com outro", ou "Sinto-me excluído". Na
verdade, a criança pode nem mesmo ter uma idéia clara do seu problema.
Ela fala, quase sempre, em código. Ela nos agride com ressonantes julgamentos do tipo
"você" (Talvez porque modele seu modo de expressar-se pelo nosso!), dizendo: "Você não
me ama", ou "Você sempre faz a vontade de Carla."
Como não reconhecemos o código, reagimos à mensagem literal das palavras. Dizemos:
"Ora, querida, é claro que gosto de você", ou "Isso não é verdade! Eu me esforço para ser
justa com Carla e com você". Mas, como o sentimento subjacente não foi ouvido, nossas
explicações não impressionam. Elas não atingem a discriminação sentida pela criança
naquele instante.
Quase sempre, a única indicação de que a criança se sente infeliz é a sua aparência de
aborrecimento e de que está pronta a

186
brigar por qualquer coisa. Ou pode começar a implicar com um irmão mais novo. Nós,
seres humanos, funcionamos por um sistema de guinchos. Quando nos sentimos por baixo,
tentamos puxar também para baixo os que nos cercam – em particular os que estão muito
acima e que nos incomodam com isso. É como se achássemos que, rebaixando os outros,
nós subimos.
Outro sinal de ciúme pode ser um súbito aumento de dependência. Marta, de seis anos,
revelou seus verdadeiros sentimentos para com seu irmãozinho novo, voltando a molhar a
cama à noite, a chupar o dedo e a pedir colo.
Um indício sutil de ciúme pode ser um aumento na exigência de coisas. Quando a criança
começa, de repente, a pedir mais e mais coisas, talvez esteja precisando não de mais
brinquedos, e sim de mais tempo – de mais atenção concentrada.
Muitas crianças que se sentem prejudicadas começam a se comportar mal, subitamente.
Peter aumenta o volume da televisão até ficar insuportável, sempre que o pai ajuda o irmão
mais novo com os seus deveres da escola. É a sua maneira infantil de dizer: "Eu também
quero atenção!”
"Ao participar do preparo dos deveres do irmão, mostrando-lhe como resolver um
problema, Peter acabou com o seu comportamento irregular. Ele começou a demonstrar um
orgulho sincero pelo progresso do irmão", disse o pai, "e toda a sua atitude modificou-se."
(Ele sentiu, é claro, que tinha uma importante contribuição a dar; que tinha importância!
Não havia, portanto, razão para ciúme.)
Direta ou indiretamente, as crianças nos dizem quando se sentem infelizes. Reagir
diretamente ao código nem sempre é útil. Nossa tarefa mais importante é proporcionar-lhes
empatia. Toda criança precisa sentir-se compreendida, incluída e importante. Quando ela
tem certeza disso, não usa recursos duvidosos para acabar com suas desvantagens. Sente-se
feliz e confiante de não estar sendo enganada.

Quarta parte

CRESCIMENTO MENTAL E AUTO-ESTIMA

17 MOTIVAÇÃO, INTELIGÊNCIA E CRIATIVIDADE

O impulso interior
Estrangeira em nosso planeta, toda criança nasce curiosa. Ela interage livremente com
aquilo que descobre à sua volta, sem a influência de idéias preconcebidas. Manipula,
experimenta e explora. A criança cuja curiosidade é aceita como válida recebe a luz verde
para aprender.
Aos três ou quatro anos a criança normal é praticamente uma caixa de perguntas ambulante.
"Por que a grama é verde?", "O que prende as nuvens?", "Por que o fogo é quente?", "Você
vê quando está morto?", "Para onde vai o vento quando pára de ventar?", "Deus é casado?",
"Por quê?" Aos cinco anos, a maioria das crianças já adotou as atitudes básicas ditadas pelo
aprendizado – atitudes condicionadas pela reação dos pais para com as suas primeiras
explorações.

As crianças aprendem se é seguro aprender.

Infelizmente algumas crianças aprendem muito cedo a não aprender. Como isso acontece?
Tommy vira seu novo carrinho de cabeça para baixo e torce-lhe as rodas. Ouve: "Não,
Tommy, os carrinhos andam assim." Ele se sente fascinado pelas embalagens coloridas e
vistosas dos produtos da mercearia. "Pare com isso, Tommy, tire as mãos daí!" Estende

190

a mão para uma estranha criatura do jardim. "Não, Tommy! Isso é uma lagarta, não ponha a
mão nela!" Repetidamente Tommy é desestimulado a investigar e/ou usar de maneira
diferente as coisas que encontra. As dúvidas lhe criam problemas; ele aprende que não é
muito seguro explorar.
Por uma questão de segurança, as investigações de Tommy devem ser, em certos casos,
limitadas; mas a freqüência excessiva dessas limitações é desnecessária. Sua necessidade de
descobrir não encontra apoio, e ele elimina a curiosidade para evitar a desaprovação.
O que há de errado se Tommy resolve experimentar o carrinho de cabeça pra baixo? Ele
não pode fazer o que quer na mercearia, mas será que seus pais não podem lhe dar coisas
para tocar e cheirar? Não poderão deixar que ele pegue a lagarta para descobrir
pessoalmente como é, e lavar as mãos depois?
As perguntas de Tommy são muitas vezes respondidas com um aborrecido "Vá lá para fora
brincar e não me amole." Ele é, literalmente, estimulado a não perguntar. Recebe aprovação
quando é passivo, conformado e quieto. Aprende a colocar de lado as suas indagações.
Pela manhã a mãe lhe diz: "Deixe-me amarrar o cordão do seu sapato, eu faço isso mais
depressa." (Temos de correr todas as manhãs?) Se fizerem tudo para ele, Tommy pode
perder a confiança em si mesmo. Sempre que é forçada a escolher entre a autoconfiança e a
aprovação, a criança pode preferir abrir mão de seus recursos pessoais. O amor tem
prioridade para os pequeninos.
Quando as crianças entram para a escola, já têm atrás de si cinco ou seis anos de
aprendizado – aprendizado esse que influencia, fundamentalmente, toda a sua atitude para
com o estudo. Quando a curiosidade é tabu, o entusiasmo pelo aprendizado morre.
A indagação e a experimentação do desconhecido formam a base do progresso em todos os
campos. Se essas qualidades, que existem em todas as crianças recém-nascidas normais,
forem

191

eliminadas, o progresso da raça humana literalmente cessará. Cada pai e cada professor é
responsável pela manutenção da curiosidade na criança. Todas as crianças devem saber que
perguntar compensa. Ela não deve se sentir diminuída porque deseja saber.

O que estimula o aprendizado


As crianças não só precisam de uma atmosfera que estimule a curiosidade e a exploração,
como também precisam de amplos contatos com uma grande variedade de experiências. Há
muitas evidências de que um estímulo variado, nos primeiros anos de vida, afeta o
desenvolvimento intelectual. Toda criança precisa do máximo de experiência direta
possível. Só dessa maneira ela pode chegar a conhecer o seu ambiente pessoalmente.
Nós, mulheres, gostamos de ler ou de ouvir falar sobre um novo tecido no mercado, mas
nada equivale a ver, pesar e usar realmente o produto. A experiência direta nos diz muito
mais do que a informação de segunda mão. Quanto mais experiências diretas a criança
tiver, melhor conhecerá o seu mundo, o que lhe dará maior confiança e segurança.
O progresso escolar está relacionado com os contatos diretos. Quando Bobby, nascido e
criado na cidade, viu a palavra "vaca" em seu livro de leitura, não tinha associações
anteriores para relacionar com os símbolos negros das letras na página. Disseram-lhe que
era um animal que tinha determinada aparência e mostraram-lhe uma foto da vaca. Seu
cérebro recebeu a impressão da vaca por meio da experiência de outras pessoas e olhando
uma ilustração numa página.
Quando Nelson, nascido e criado numa fazenda, viu os símbolos que representavam "vaca",
associou-os a muitas coisas que já conhecia. Havia tocado, sentido o cheiro e ouvido as
vacas. Sabia como comiam e como sacudiam a cauda; tinha visto vacas dando leite e
amamentando os bezerros. Seu cérebro havia recebido

192

impressões sobre as vacas diretamente através de seus próprios olhos, ouvidos, nariz e
mãos. Muitas conexões neurais haviam sido estabelecidas para dar ao menino significado
pessoal ao símbolo impresso.
Um ambiente pobre na primeira infância resulta em diferentes graus de retardamento
mental. O estímulo exercido desde cedo cria uma rede mais ampla de associações que irão
ter relação com os símbolos abstratos utilizados nas escolas com tanta intensidade.
Juntamente com o contato direto e amplo, a criança precisa praticar a tradução de sua
experiência em palavras. O menino pode ter muito estímulo e ser incapaz de verbalizar suas
reações. As escolas dão, evidentemente, muita ênfase à palavra falada e à escrita. Uma boa
prática no lar desenvolve uma habilidade muito valorizada na escola.

Um ambiente lingüístico pobre prejudica o progresso escolar.

Podemos estimular a criança a falar através dos nossos exemplos e do nosso respeito às
suas idéias e sentimentos. A comunicação realmente aberta só floresce num clima de
segurança.
Além disso, a criança precisa praticar desde cedo a solução de problemas. As experiências
com animais demonstraram que os que estiveram, desde os primeiros anos de vida, em
contato com ambientes que solucionavam adequadamente os problemas eram mais capazes
de enfrentar e resolver problemas do que os que não tiveram a mesma oportunidade.
Qual o significado que isso tem para você e seu filho? Significa que você estimula o
crescimento intelectual dele quando lhe transmite ricas experiências em primeira mão no
princípio da vida e quando o incentiva a falar sobre o que viu e fez, e sobre o que sentiu.
Ajude-o a encontrar respostas para as perguntas que faz. Deixe-o enfrentar os problemas
sozinho, ficando ao seu lado, pronto para lhe dar apoio; e ainda estimule-o a encontrar as
suas próprias soluções.

193

A mãe de Buddy estava preparando uma salada para o jantar enquanto o filho a observava.
"Qu'é isso?", perguntou o menino de três anos de idade.
"É um abacate", disse a mãe, lentamente. "Você consegue dizer abacate?"
Buddy tentou: "A-ba-ca-do".
"Olhe para minha boca, Buddy. A-ba-ca-te", e repetiram juntos a palavra, até que Buddy
aprendeu.
"Pra que serve?", perguntou ele novamente.
(A mãe poderia ter pensado: "Que burro! Eu não colocaria na salada se não fosse para
comer!". Mas a pergunta não é burra. Ele já tinha visto canudinhos em milkshakes e não
eram para ser comidos. Tinha visto salsa usada apenas como enfeite.) A mãe apóia a
curiosidade de Buddy, dizendo: "Serve para comer. Não comemos este pedaço", mostrou a
casca, "nem este", mostrou o caroço. "Você sabe por que não comemos a casca nem o
caroço?"
Buddy pegou um pedaço da casca e mordeu; pegou o caroço e apalpou. "Muito duro",
disse.
"Sim. Agora, experimente esta parte", disse a mãe, dando-lhe um pedaço da polpa do
abacate.
"Ah, é mole!", disse ele com desprezo.
"Quer provar? Que tal cheirar um pouquinho? Experimente espremê-lo com os dedos.”
"Gosto do macio, mas não do gosto", disse Buddy. "Não tem cheiro.”
"Não, não tem cheiro como o abacaxi ou o limão. Antes eu também não gostava, mas agora
gosto. Às vezes colocamos abacate na salada, quando gostamos. Da próxima vez que
formos à casa de Tia Mary eu vou te mostrar a árvore do abacate. Os abacates nascem em
árvores, assim como as laranjas do nosso quintal. Agora vamos colocar o caroço num vaso
com água para ver o que acontece."
A mãe de Buddy estimulou diretamente a atitude do filho em direção ao aprendizado. Sua
reação aceitou a curiosidade da criança;

194

ela ajudou-a a conhecer diretamente um objeto estranho através de todos os seus sentidos.
Estimulou a conversa sobre esse objeto e respeitou as reações pessoais do filho. Juntos, os
dois partilharam de uma experiência de aprendizado.
Certo dia, Warren deu um grito de frustração quando seu carro ficou preso numa pedra.
Não conseguia tirá-lo puxando para a frente. A mãe poderia ter levantado o carro e
removido a pedra, mas teria perdido uma excelente oportunidade de deixar o filho provar a
sua capacidade de resolver problemas. Mas não o abandonou.
Disse-lhe: "Parece que o carro está preso e não sai ao ser empurrado. Como você poderia
tirá-lo daí?"
O menino de cinco anos examinou a situação, espiou por baixo do carro e saiu correndo em
busca de sua pá. Cavou em volta da pedra e puxou-a da roda. O carro foi libertado.
"Foi interessante", disse a mãe mais tarde. "Eu teria levantado o carro ou puxado para trás,
mas ele pensou em cavar para tirar a pedra. Achei que a minha solução era mais fácil, mas
pareceu-me importante deixar que ele usasse sua própria imaginação para resolver o
problema."
Ambas as mães estimularam o aprendizado de seus filhos. Se for constante, o seu apoio se
refletirá no desenvolvimento intelectual.

Dentro dos limites da segurança, as crianças precisam da interação com as coisas do seu
ambiente, sem interferência.
Os princípios básicos são: respeite a curiosidade da criança e o seu desejo de explorar;
procure saídas aceitáveis para a sua vontade de conhecer. A auto-estima é fortalecida
quando a sua atitude e o seu comportamento dizem à criança: "A sua curiosidade é
importante. Eu ajudarei você a conhecer e a compreender.”

O que é a inteligência?
"Meu Deus, como Bill é inteligente!" Essas palavras soam como música para os ouvidos
dos pais orgulhosos. Geralmente

195

quando dizemos isso, referimo-nos à facilidade que a criança tem de aprender. E em geral
pensamos em termos da capacidade de aprendizado abstrato, exigida pela escola. Há,
porém, muitas formas de inteligência.
Bill pode ser rápido no uso de símbolos matemáticos e ter apenas uma habilidade média na
leitura. Marta pode ter pouca capacidade de aprender nos livros, mas sua sensibilidade em
lidar com os outros torna-a socialmente capaz. Ted pode sair-se mal na escola e ser
musicalmente bem dotado. Mesmo um QI (quociente de inteligência) tem diferentes
significados para diferentes crianças.
Libby, Jean, Harry e Mack têm, todos, um QI de 126, e apesar disso suas capacidades são
diferentes. A boa memória de Libby aumenta o seu QI: ela se sai bem nas matérias em que
a memória é uma vantagem. A sua capacidade de raciocínio, porém, não passa da média, e
ela precisa se empenhar mais nas matérias que exigem tal capacidade. Ao contrário de
Libby, o QI de Jean é influenciado pela sua grande capacidade de raciocínio e
compreensão. Ela, no entanto, não tem muito talento para o trabalho que exige memória.
Harry, por sua vez, é excepcionalmente dotado e seu potencial é muito superior ao das duas
meninas. Seu QI é reduzido pelos seus bloqueios emocionais. Mack, ao contrário dos outros
três, vem de um ambiente culturalmente deficiente. Seu QI tem, portanto, um significado
diferente do QI das outras crianças.
O QI, apenas, não deve servir de base, pois o crescimento mental é mais rápido em
determinados períodos do que em outros. Muitos fatores, como a saúde física, o grau de
amizade entre a criança e o examinador, os contatos culturais, influem no desempenho do
teste.

196

Richards(1) estudou o desenvolvimento de um menino durante um período de sete anos


para ver se havia uma relação entre seu QI e as suas experiências de vida. Sem dúvida,
quando o ambiente tanto no lar do menino como na escola era mais tranqüilizador (emitia
reflexos positivos), seu QI aumentava para 140; quando era menos estimulante, o QI
baixava para 117. O clima psicológico que cerca qualquer criança exerce uma forte
influência sobre o seu funcionamento mental.
(1) T. W. Richards, "Mental Test Performance as a Reflection of the Child's Current Life
Situation, A Methodological Study", Child Development, XXII (1951), pp. 221-33.
Um QI nada mais é do que um índice da capacidade geral existente, naquele momento, para
enfrentar abstrações mentais (palavras, números, conceitos). Como as escolas se
concentram na manipulação de abstrações, o QI é necessariamente útil aos seus objetivos.
Em si mesmo, porém, ele pouco revela sobre a capacidade de lidar com abstrações. É
necessário examinar cada subteste para se saber onde estão os pontos fortes e os pontos
fracos da pessoa. É preciso examinar o desempenho como um todo para determinar se os
pontos registrados refletem a verdadeira capacidade ou se o potencial do examinado está
sendo subestimado.
Os pais, particularmente os de alta classe média, mencionam quase sempre os QIs de seus
filhos como se tivessem algum significado inato. Infelizmente, em certas comunidades,
esses pontos são uma marca de status para os pais.
(Em termos da adaptação e da felicidade de seus filhos, esses pais seriam muito mais
realistas se se preocupassem com os quocientes de auto-estima! Não se deve desprezar a
capacidade de lidar com abstrações, mas isso não assegura que a criança funcionará
plenamente como um ser humano completo.)
Um QI elevado não significa, necessariamente, um desempenho ou uma motivação
elevados. As notas escolares são, com mais freqüência, um reflexo da motivação, e não da
capacidade inata. Como disse um orientador escolar: "Não se trata tanto de uma questão de
inteligência da criança, mas do que ela faz com a inteligência que tem." Com um QI de
120, Olga passa à frente de Perry, que tem 165 de QI. A grande curiosidade e o desejo de
aprender levam-na a usar sua capacidade, ao passo que Perry devaneia e se preocupa com o
que os outros pensam dele. A

197

auto-confiança possibilita à criança um bom desempenho; e crianças brilhantes têm, às


vezes, problemas de auto-estima insuficiente.
Os testes de QI não medem a capacidade criativa, a liderança, a motivação, a imaginação, o
talento artístico ou musical. Isso não significa que sejam inúteis, mas apenas que devem ser
vistos pelo que realmente são.

A inteligência é fixa?
Acreditava-se, antigamente, que a inteligência era fixa e não podia ser modificada. Hoje
sabemos que não é assim.
O QI das crianças adotadas está mais próximo do QI de seus pais adotivos do que de seus
pais naturais. Em bairros culturalmente adiantados, cerca de 25% a 30% das crianças
registram 125 ou mais em seus testes de QI. Em áreas onde as crianças estão em
desvantagem cultural, apenas 6% delas alcançam esse índice. (Esses resultados devem-se
em parte ao fato de que os testes de QI refletem os contatos com livros, conversas e certos
tipos de aparelhos.) Quando as crianças que estavam em desvantagem passam a contar com
experiências enriquecedoras, seus índices de QI sobem acentuadamente.
Um estudo a longo prazo, feito com 300 crianças pelo Fels Research Institute, do Antioch
College, mostrou que os QIs flutuam consideravelmente. Muitos desses QIs diminuíram de
maneira constante durante os primeiros anos de vida das crianças, quando estas ainda
dependiam dos pais. E mais da metade das crianças começaram a ter índices mais altos ao
chegarem à escola e ao enfrentarem o desafio de contar consigo mesmas.
Há muitas evidências de que a inteligência, tal como é medida pelos testes de QI, não é
fixa. Os pais podem contribuir muito para aumentar a capacidade mental dos filhos, uma
vez que influem marcadamente sobre o desejo que eles têm de aprender.
198

Obstáculos ao aprendizado
Até mesmo quando a curiosidade é estimulada num ambiente também estimulante, muitas
crianças não usam a capacidade que têm. As causas podem estar numa fonte, ou numa
combinação de fontes.
Deficiências físicas podem dificultar o aprendizado: dificuldade de audição ou visão,
problemas neurológicos, desequilíbrios hormonais ou lento amadurecimento físico afetam a
eficiência ou a rapidez do aprendizado da criança.
Sempre que existe um problema com a capacidade de aprender, a possibilidade de defeitos
físicos deve ser a primeira coisa a ser verificada. Muitas vezes descobre-se que uma
criança, considerada como de aprendizado lento, sofre, na verdade, de uma anormalidade
física.
Muitos problemas de aprendizado são conseqüência de problemas emocionais.

O crescimento intelectual não ocorre em separado do crescimento emocional; os dois estão


interligados.

A criança cujas necessidades emocionais não são satisfeitas tem menos probabilidade de
conseguir êxito na escola. O homem com fome não tem motivação para aprender nos livros.
Ele tem, primeiro, que matar sua fome para depois concentrar-se no estudo. Como já
dissemos, a criança que está convencida de ser um fracasso tem pouca motivação para
tentar. E a criança com um acúmulo de repressão não tem muita energia para enfrentar os
desafios da escola.
Os pais dizem, freqüentemente: "Gostaria de saber como motivar meu filho." Lembre-se:
uma auto-estima elevada é a principal mola da motivação. A convicção da criança: "Eu
tenho capacidade! Eu posso fazer! Eu tenho alguma coisa a oferecer!" depende de seu
vigor. Os desafios são interessantes quando você acha que pode enfrentá-los. Quando não
pode, o interesse desaparece

199

rapidamente. Como disse Emerson: "A autoconfiança é o primeiro segredo do sucesso."


Observe constantemente as expectativas que você tem em relação ao seu filho. A causa
mais comum do bloqueio ao aprendizado, particularmente em crianças de famílias da classe
média, vem da pressão indevida que sofrem para atingir certas metas que estão além de sua
capacidade. Essas crianças aprendem a falhar.
"Por que você tirou oito e não dez em estudos sociais?" é uma acusação enfrentada por
muitas crianças de classe média. Um dos valores mais firmes dessa classe é o desejo de
progresso rápido. Desde o Sputnik, as pressões acadêmicas nos Estados Unidos
aumentaram, prolongando-se até os níveis iniciais de aprendizagem. A ordem é melhorar,
melhorar, melhorar! Impensadamente e de forma não-proposital, muitos pais bem-
intencionados comunicam aos filhos que eles serão mais amados e mais dignos se forem os
primeiros da classe.
Lembre-se: o excesso de ambição é recebido pela criança como uma falta de aceitação.
Expectativas muito altas significam decepções grandes. E as decepções prejudicam a auto-
estima. Elas acabam com a energia, e a criança nem mesmo procura ligar o seu interesse.
Outro obstáculo ao crescimento intelectual é uma disciplina tolerante, protetora ou rígida
demais. Os pais dominadores aumentam a hostilidade, a dependência e a inadequação –
sentimentos que bloqueiam o funcionamento intelectual. Pais excessivamente protetores, ou
pais que se recusam a estabelecer limitações, fazem com que as crianças se sintam
inadequadas e não amadas. Essas atitudes são negativas para a auto-estima, o que por sua
vez afeta a motivação de aprender.
A disciplina democrática desenvolve o crescimento intelectual, estimulando a participação,
o raciocínio, o pensamento criativo e a responsabilidade. A divisão do poder no
estabelecimento de regras tem um papel importante no estímulo à competência mental. O
estudo de Coleman mostrou que o maior fator para motivar

200

a criança a aprender é o seu sentimento de que "Eu tenho um certo controle do meu
destino". A disciplina democrática permite à criança fazer essa afirmação.
A pesquisa do Fels Research Institute mostrou que as crianças cujos QIs continuavam a
aumentar com o tempo também intensificaram a sua autoconfiança. Elas tinham confiança,
a certeza de serem amadas, estavam à vontade com os outros, eram menos excitáveis e
pensavam de maneira mais original. Em suma, apresentavam as características de uma
elevada auto-estima.
As crianças que eram dependentes, menos seguras de serem amadas, menos capazes de
participar de projetos próprios, e que precisavam de muita atenção, apresentaram QIs mais
baixos. Eram crianças que fugiam da responsabilidade, cujas características descrevem a
baixa auto-estima.
Uma auto-estima elevada afeta acentuadamente o modo pelo qual a criança utiliza as
habilidades de que dispõe.
Outro obstáculo ao aprendizado surge quando as linhas de comunicação estão obstruídas,
ou fechadas. As pesquisas mostram que as crianças que se saem bem em testes mentais e
nos trabalhos escolares vêm, em geral, de famílias em que há muita comunicação. Quando
pais e filhos interessam-se carinhosamente pelas atividades mútuas, e quando os filhos se
sentem seguros em partilhar suas idéias e seus sentimentos, o crescimento intelectual é
estimulado.
Nas famílias em que a comunicação é reservada, tensa e codificada não há estímulo
recíproco de opinião e reflexão. A capacidade mental diminui, deforma-se ou não se
desenvolve nessa atmosfera.
Ao examinar os obstáculos do aprendizado, não devemos desconhecer a importância das
boas escolas, dos professores influentes e dos currículos flexíveis, ligados aos interesses das
crianças. As crianças autoconfiantes e motivadas podem perder o estímulo de aprender
quando se vêem em salas de aula muito cheias, com maus

201

professores que usam técnicas inadequadas. Além disso, quando as crianças têm uma
participação ativa no planejamento do currículo, de acordo com seus interesses, elas reagem
de maneira muito diferente do que quando são tratadas como simples recipientes vazios
onde se despeja o conhecimento velho dos manuais.
A aula de estudos sociais do sr. S. ocupava-se especialmente de uma questão específica da
comunidade. Os alunos planejaram pessoalmente a abordagem a ser adotada na coleta de
dados e entrevistaram as pessoas adequadas em sua cidade. As sessões para discutir os
dados recolhidos resultaram numa série de recomendações que foram apresentadas à
câmara municipal. E muitas de suas sugestões foram colocadas em prática. "A taxa de
ausências em minha classe caiu para zero quando experimentamos essa abordagem", disse
o sr. S. "E os estudantes, que antes não manifestavam muita habilidade, passaram a ler
como nunca. Toda a classe pareceu reviver." Na verdade, quando os professores examinam
um material que tem importância pessoal para os alunos é quase impossível afastá-los dele.
A experiência direta e o aprendizado participativo são muito mais eficientes do que o
conhecimento fornecido apenas pelos livros.
E o que é muito mais importante: esse tipo de experiência educacional diz ao aluno: "Seus
interesses são importantes. Vamos examiná-los na sala de aula e trabalhar com eles.
Acreditamos que você está interessado em aprender e tem competência para enfrentar os
problemas verdadeiros. Queremos que você participe ativamente na solução desses
problemas." Que impulso nos sentimentos de valor próprio!
Trabalho em equipe, ensino em grupo, aulas abertas, aprendizado programado, projetos e
pesquisas independentes na área de interesse da criança estão se impondo ao ensino formal
que predominou nas salas de aula durante gerações. Apesar desse progresso, ainda temos
muito a avançar na educação, até superarmos a abordagem do tipo "Agora, ouçam" no qual
os professores decidem

202

o que, quando e como as crianças aprenderão. Talvez não esteja longe o dia em que os
professores terão liberdade de ser pessoas de imaginação, que estimulem a curiosidade
natural das crianças.

Maneiras de estimular o aprendizado


Nós somos os primeiros professores de leitura, de arte e de música de nossos filhos.
Quando os colocamos em contato pela primeira vez com um novo meio de comunicação, o
interesse primordial da criança é se familiarizar com ele. Quer seja um livro, a argila ou um
instrumento, a criança aprecia o encontro em si, sem pensar em atingir nenhuma meta.
Vicky, de dois anos, segura seu livro de pano de cabeça para baixo, examina suas figuras e
em seguida leva-o à boca. Ela está obtendo informações em primeira mão sobre alguma
coisa nova. Mais tarde ela poderá ouvir a história que o livro conta.
Mike entrega à professora um borrão marrom em seu papel para que ela o admire. "Você
gostaria de me falar sobre o desenho?", pergunta ela. (Evita deliberadamente perguntar "O
que é?" Essa pergunta focaliza o produto e faz com que a criança sinta que deveria ter
produzido alguma outra coisa.)
"Claro", diz Mike. "É uma tartaruga debaixo do barro". Inicialmente, Mike havia
desenhado uma tartaruga primitiva, para descobrir, em seguida, ao misturar as cores com o
pincel, que tudo estava ficando marrom. Sem receio, ele usou a descoberta de que o
vermelho, o azul e o amarelo formam o marrom, para dar uma morada à tartaruga. Ele
dominava a situação.
Todo produto da criança deve ser aceito e respeitado como uma interação específica dessa
criança com o meio utilizado, ou como sua maneira de ver as coisas. A exatidão não tem
importância, mas sim o prazer encontrado em se expressar.
203

Ler para as crianças, antes que elas mesmas possam fazê-lo, aumenta seu interesse pelos
livros. Adapte a história ao nível de interesse da criança e sua capacidade de atenção. Há
diminuição do interesse quando a criança não pode interromper, fazer perguntas e
manifestar seus sentimentos. Chegar ao fim da história não é o objetivo: o estímulo à
conversa tem maior valor. Aceite as reações pessoais da criança, pois assim estará
alimentando as atitudes positivas.
Leve as crianças à biblioteca quando ainda pequenas, inscreva-as nas turmas que vão ouvir
histórias, e tão logo possam assinar seus nomes inscreva-as como leitoras para que possam
retirar livros. As crianças precisam ver você ler, falar e gostar de livros. Os livros usados
como passatempo nas horas em que você fica com seu filho, ou como recursos para alienar-
se da vida, não contribuem para os seus objetivos.
Passatempos, artesanatos, ferramentas e jardins delas mesmas ajudam as crianças a
aprender mais sobre o seu mundo. Deixe sempre uma margem para a experimentação e a
descoberta. O material de referência (um globo, dicionário, atlas, enciclopédia) deve ficar
ao alcance da mão e constitui uma fonte importante para o desenvolvimento intelectual.
O preparo de mapas de lugares conhecidos pelas crianças e as brincadeiras com eles ajudam
a tornar a geografia real. Uma família que se mudava com freqüência mantinha um registro
dos lugares onde havia morado, acompanhado de mapas de suas viagens. "Passamos muitas
horas divertidas fazendo isso, juntos", disse o pai, "o que provocou toda a espécie de
perguntas que acabaram levando os meninos a leituras independentes e a projetos de
iniciativa própria."
Quando Paul fazia uma pergunta, o pai sempre dizia: "Vamos olhar", e não "Vá olhar".
Cooperar na procura das respostas, até que o hábito de consultar livros de referência esteja
bem formado, torna mais atraente o aprendizado.

204

Os quadros de avisos familiares, usados para a exposição de obras de arte, de coleções ou


de histórias, aumenta o interesse pelo aprendizado e estimula a criatividade. Dão à criança
um reconhecimento e um sentimento de importância. (Armários de cozinha e portas de
geladeira constituem excelentes quadros de avisos, caso você não tenha muito espaço.)
Discos e música de qualquer tipo enriquecem a vida das crianças. A invenção de
instrumentos próprios, de canções e de formas livres de dança estimula a criatividade.
A televisão é uma fonte de disputas em muitas famílias. Usada indiscriminadamente, ou
como babá, ela estimula a passividade e atua contra a participação criativa. Mas, sendo
seletiva, você pode encontrar programas que valem a pena. Mesmo quando o programa não
é muito bom, você pode aproveitá-lo, levando as crianças a imaginar o que poderia ser
melhorado nele.
Como dissemos, o processo democrático é adequado à seleção de programas, mas você não
deve achar que está prejudicando a auto-estima de seus filhos se vetar alguns deles. Nós
não convidaríamos assassinos e bandidos a virem à nossa casa diariamente para distrair as
crianças. E, embora os maus percam, uma dose diária de violência não é construtiva. A
criança deve ter uma margem de participação na escolha de seus programas, mas, se ela
deseja ver sempre espetáculos de violência, isso pode ser uma indicação de que tem
sentimentos hostis que precisam ser liberados de outras maneiras (ouvindo-a ativamente,
fazendo-a trabalhar com argila, participar de esportes ativos, sacos de pancada e até mesmo
dando-lhe orientação). Se a criança insiste em ver continuamente televisão, essa preferência
pode indicar que as relações sociais não lhe estão trazendo muita satisfação. Muitas
crianças deixam espontaneamente a televisão quando lhes é sugerido um jogo familiar ou
uma hora de leitura.
As marionetes levam o teatro à sua casa e ajudam as crianças a enfrentar seus sentimentos
de maneira socialmente aceitável. Feitas

205

em casa – com sacos de papel, meias velhas com o rosto desenhado nelas, ou elaboradas
com a técnica de papel machê – são quase sempre preferíveis às adquiridas
comercialmente.
Escrever e contar histórias de maneira criativa proporciona horas de carinhoso convívio
familiar. Escreva uma história infantil para seu filho, leia-a em voz alta e incentive-o a
desenhar as ilustrações. Isso apóia a necessidade de realização e reconhecimento. "Os
contos instantâneos" (inventar uma história com dois minutos de duração sobre três coisas
totalmente diferentes – um canguru, uma casca de banana e um cubo de gelo) liberam a
manifestação da imaginação criativa.
As viagens de qualquer tipo oferecem muitas oportunidades para novas descobertas e
conversas. Devem ser planejadas de acordo com a capacidade de atenção e o nível de
interesse da criança. As excursões que acabam em sermões disciplinares não atingem o seu
objetivo. A exploração e o conhecimento deixam de ser, nessas circunstâncias, divertidos.
As viagens nunca devem ultrapassar o limite de tolerância da criança e os limites de
paciência dos pais.
Estas idéias são apenas algumas das maneiras de estimular as crianças intelectualmente.
Mas lembre-se: o modo como você se relaciona com seus filhos, durante essas experiências
em comum, é a chave para fazer com que eles queiram repeti-las. Se forem transformadas
em momentos de crítica e pressão, elas passarão a ser temidas. Transforme-as em
oportunidades para uma aproximação carinhosa e respeitosa, pois assim elas serão
apreciadas pelos seus filhos. O amor estimulante provoca crescimento mental. O clima é
fundamental.
Por mais importantes que essas experiências movimentadas sejam, toda criança necessita de
algum tempo para ficar a sós – momentos de liberdade, em que nada está planejado. O
estímulo externo pode ser tão constante que a criança não tem tempo de desenvolver os
recursos interiores. Muitos pais, reconhecendo a

206

importância desses contatos ricos em experiências, bombardeiam os filhos com lições e


excursões. E o fazem seguindo o princípio de que, se um pouco é bom, muito é melhor.
Um estudo realizado com pessoas altamente dotadas mostrou que muitas delas passavam
grande parte do tempo sozinhas, sem estarem sujeitas a estímulos constantes dos outros.
Um equilíbrio entre o estímulo e o tempo livre é o melhor – um excesso de qualquer uma
das duas coisas pode ser prejudicial.
Criatividade
A maioria dos pais deseja que seus filhos sejam criativos. Mas o que significa criatividade?
Como é a criança criativa? Como estimular a criatividade nas crianças?
A pessoa criativa é a que cria coisas novas e vê as coisas de maneira diferente. A criança
muito inteligente não é, necessariamente, muito criativa. Ela pode ser uma boa imitadora ou
uma manipuladora de símbolos e ainda assim não ser criativa. Por outro lado, a pessoa que
tem apenas uma capacidade média para aprender com livros pode ser um cozinheiro, uma
costureira, um entalhador, um músico, um pintor ou um decorador de grande criatividade.
As maneiras originais de ver e de reagir à vida são dons que toda criança normal tem, em
graus variados. Muita gente pensa na criatividade em termos de grandes obras de arte,
música, literatura ou ciência. Esquecemos, com freqüência, que a criatividade que se
manifesta em menores proporções também é tão autêntica quanto a que encontra expressão
em grande estilo.
Quase todos nós podemos lembrar de alguém que não passará à história como um gênio
criativo, mas que usa sua individualidade para acrescentar novidades à sua vida cotidiana.
Quais as características que distinguem as crianças criativas das que não o são?

207

As crianças criativas tendem a ser independentes, imunes às pressões do grupo ou ao


conformismo, e desinteressadas do que os outros pensam delas. Conservam a capacidade de
duvidar e questionar e de ver as coisas sob um ângulo novo. São flexíveis, imaginativas,
espontâneas e brincalhonas, na abordagem dos problemas. São muito receptivas aos seus
sentidos; têm a tendência de ver, sentir e absorver mais tudo que as cerca. Os jovens
criativos são igualmente abertos ao que acontece dentro e fora de si mesmos. Em suma, são
muito sensíveis tanto ao seu mundo interior como ao mundo exterior.
Essas crianças estão dispostas a correr o risco de ouvir a sua intuição e de tentar o que é
novo. É preciso um certo grau de confiança e de segurança para enfrentar o que não está
organizado, o que é complexo, incoerente, desconhecido e paradoxal. As crianças criativas
não se preocupam demais com a arrumação ou a rapidez e se aborrecem facilmente com a
rotina.
Frank Barron, que realizou amplas pesquisas sobre a criatividade, dividiu-a em dois tipos: a
que vem do inconsciente reprimido e a que flui livremente de um inconsciente sem cadeias.
A pessoa que cria a partir da repressão, repete, monotonamente, produções semelhantes.
São saídas para as repressões e desejos pessoais. A pessoa que cria livremente expressa sua
singularidade com a variedade, e cada produto seu é novo e diferente.
A poesia de John apresenta muitas imagens vivas e ritmos marcantes, mas ela repete
interminavelmente os mesmos temas. Os versos de Arnold nascem de suas reações pessoais
às várias experiências: um tributo aos raios de luz que são filtrados pelas árvores da
floresta, uma dança de girinos, as angústias de uma causa perdida, a música produzida pelas
ondas espumantes. Aberto a tudo o que o cerca e ao que há em seu íntimo, ele reage com a
mesma variedade. Sua criatividade não é perturbada por problemas psicológicos.

207

Como você pode estimular a criatividade nas crianças?


Quando sabem que a sua individualidade é respeitada, as crianças são mais propensas a
utilizá-la. As reações obtidas nas suas primeiras tentativas de ser original determinam se
tais impulsos florescem ou não.

A criatividade precisa de um clima de segurança sem julgamentos e de liberdade de


expressão.

Se você valorizar o conformismo, o pensamento estereotipado, a ordem constante e a


obediência, provavelmente não estimulará a criatividade. Suas atitudes e valores serão
sentidos pelas crianças que reagirão de acordo. Você pode tolerar a imperfeição e o
fracasso? Se puder, é mais provável que seu filho experimente idéias novas se souber,
antecipadamente, que a aprovação não depende do resultado de sua iniciativa.

Criatividade e auto-estima
A relação entre uma auto-estima elevada e a criatividade livre é muito forte. Pela sua
própria natureza, a criatividade é um ato de inconformismo. Ela diz: "Vejo as coisas ao meu
jeito e estou disposto a mostrar a você o mundo privado de minhas percepções." E é
necessário ter autoconfiança para tornar pública uma reação pessoal.
Os estudos mostram que a criança livremente criativa tem elevada autoconfiança,
maturidade, calma e independência. Tem a capacidade de manter-se concentrada por longos
períodos e de absorver-se em seus projetos.
Essas constatações não são de surpreender porque a criança cujas experiências lhe
mostraram que é amada e valorizada de forma incondicional tem liberdade para ouvir os
seus desejos íntimos. Ela confia em suas reações pessoais e em sua intuição. Sua fé em si
mesma apóia a necessidade de demonstrar as suas idéias

209

originais. Suas energias – que não são desperdiçadas na autodefesa – estão livres para criar
o novo. Ela não acredita que o valor pessoal esteja ameaçado em cada produção.
Sendo socialmente mais independente e interiormente mais tranqüila, ela é menos limitada
pela opinião dos outros. As pressões do grupo têm menos probabilidade de condicionar as
suas expressões. A elevada auto-estima dessa criança liberta-a para jogar com todo um
repertório de possibilidades, confiante em poder escolher as de maior mérito. Ela pode
manifestar suas idéias e opiniões. Para ser criativa, a criança deve confiar em suas
percepções e em sua capacidade de expressá-las. A criança dotada de uma auto-estima
elevada tem esse tipo de confiança.
A criança com uma baixa auto-estima pode ter idéias próprias, mas sendo socialmente
dependente é mais provável que as coloque de lado em busca da segurança. Ela é mais
sensível à crítica porque já se julgou negativamente. Prefere, portanto, trabalhar sob a
direção de outros. Evita as decisões criativas e independentes, a responsabilidade e a
liderança. Não quer chamar atenção, pois isso apenas lhe traz novas críticas. A competição
é uma ameaça, e ela prefere sufocar seu talento. A conformidade é menos arriscada do que
a criatividade. A satisfação de suas necessidades psicológicas tem prioridade sobre a
aventura do desconhecido. De fato, o desconhecido ameaça a criança que tem uma baixa
auto-estima. Ela não espera ter êxito enfrentando-o – já lhe bastam os fracassos registrados.
Embora seja importante para a criança com uma auto-estima insuficiente obter cada vez
mais reflexos positivos, sua falta de autoconfiança age como um obstáculo a isso. Ela tem
altos objetivos, mas pouca esperança de sucesso. Projetando uma imagem de inadequação,
convence os outros de que não tem valor pelo próprio comportamento que adota. A criação
da auto-estima nas crianças estimula ativamente seu desenvolvimento intelectual,
motivação e expressão criativa. (É interessante notar que o clima psicológico que gera a
criança livremente criativa e produtiva é

210

constituído justamente dos mesmos ingredientes que compõem o clima do amor – ver a
Segunda Parte.) O jovem com autoconfiança se lança ao desenvolvimento de seu potencial
e talento específicos. Os encontros autênticos, os padrões razoáveis, os contatos
enriquecedores e a disciplina democrática asseguram o aprendizado e a criatividade. O
desejo de conhecer, que toda criança possui, deve ser apoiado, e ela deve ter certeza de que
os erros não são catastróficos. Quando as crianças vivem com pais que lhes proporcionam
essa atmosfera, elas crescem em todas as direções.
Como pai interessado, você deve apoiar ativamente os movimentos educacionais que lutam
pela eliminação das práticas escolares restritivas: comparação das notas obtidas pelas
crianças da mesma classe, ensino uniforme, salas de aula superlotadas e uso excessivo de
atividades dirigidas pelo professor. As crianças levam para a sala de aula sentimentos,
anseios e atitudes próprias. Muitos pais e professores precisam se conscientizar do papel da
auto-estima na vida delas. A educação deve ocupar-se das emoções e atitudes próprias das
crianças, ou não estará se ocupando da criança como um todo. E toda educação começa no
berço.
Pais e professores devem trabalhar juntos para ajudar a criança a desenvolver todas as
partes de si mesma, de modo que seja livre para aprender e criar. Só o respeito à sua total
originalidade permite à criança o desenvolvimento da própria capacidade individual.

Quinta parte

SEXO E AUTO-ESTIMA

18 O CASAMENTO DO SEXO COM O AMOR

O significado da educação sexual


Se a educação sexual envolvesse apenas os fatos relacionados com a reprodução, nossas
responsabilidades poderiam ser resolvidas com uma simples conversa entre pai e filho, ou
entre mãe e filha, ou com um bom livro. Isso, porém, não acontece, pois os fatos raramente
evitam os problemas. Na verdade, são

as atitudes em relação ao sexo e a si mesmos que determinam o modo como os jovens


lidam com o sexo.

E, para muitas pessoas, a parte mais difícil da educação sexual está exatamente nisso. Por
que o sexo constitui esse problema, e como podemos ensinar atitudes saudáveis?

Por que o sexo é um problema


Embora vivamos no século XXI, a crença, originária de séculos passados, de que o sexo é
algo mau e sujo permanece na mente de muitas pessoas. Podemos não admitir
conscientemente essa idéia antiquada, mas agimos como se a admitíssemos.
Nos séculos XV e XVI os prazeres terrenos eram considerados pecaminosos. O sexo era
visto como necessário à continuação da espécie, mas o prazer por ele proporcionado era
considerado

214

publicamente como obra do diabo; o sexo simbolizava a queda do homem. Até mesmo
entre pessoas casadas ele não era visto como uma força positiva, e só evidenciava a parte
animal inserida no homem. E, para a mulher, gostar de sexo significava ser imoral, ou
mesmo depravada! O sexo era secreto, e a repressão e a hipocrisia predominavam.
Aos poucos, o assunto foi sendo abordado de forma mais aberta, e o sexo recebe hoje uma
atenção exagerada, o que representa, sem dúvida, uma reação contra a maneira sigilosa com
que foi tratado no passado. Atualmente o sexo nos é imposto como recreação em todas as
direções e continuamente nos anúncios, cinema, romances, arte e moda.
Alguns pais, reagindo contra a sua própria formação puritana, julgam-se esclarecidos ao
darem às suas filhas a pílula e apenas isso. No entanto, muitos jovens que tentaram o
caminho do sexo como diversão acharam-no frustrante. Uma nova moral está surgindo e
com ela a luta para se encarar o sexo sob uma perspectiva nova.
O sexo merece o seu devido lugar enquanto impulso criativo e necessidade vital, do qual se
deve falar abertamente. É, porém, uma força que também deve ser respeitada. Pode
constituir-se numa arma para controle e exploração. Ou pode estar relacionado com amor,
responsabilidade e dedicação. Usado indevidamente, o sexo destrói as relações humanas;
usado de maneira responsável, pode ser estimulante e enriquecedor.

Atitudes saudáveis relativas ao sexo


Todo ser humano normal tem sentimentos sexuais. Uma atitude positiva em relação ao sexo
representa a aceitação dessas necessidades como vitais e adequadas. Significa que os
sentimentos sensuais não são considerados vergonhosos. Uma atitude

215

saudável é a aceitação tranqüila pelo jovem de seu sexo e de seu papel sexual.
A maneira como o jovem enfrenta seus desejos sexuais está ligada a todas as suas
experiências de vida e amor. E suas atitudes são formadas desde o nascimento. Para que
possamos ensinar atitudes positivas para com o sexo, devemos ter consciência das várias
fontes que afetam a atitude da criança.

Sexo e amor
A necessidade de acasalar e procriar é considerada, há muito tempo, como instintiva. As
experiências de Harry Harlow com macacos, porém, sugerem que os chamados instintos
podem, na verdade, ser aprendidos. Os macacos criados longe das mães mostraram pouco
ou nenhum interesse em acasalar-se quando adultos e rejeitaram os filhos tidos em
conseqüência de inseminação artificial.
Há evidências de que o vigor do impulso sexual adulto e o desejo de procriar sejam
condicionados pelas experiências de carinho, de afagos e de toques que recebemos no
começo da vida. Parece que o ser humano, para dar amor algum dia, tem de recebê-lo
primeiro.
Todas as vezes que você acaricia, embala, afaga, dá banho ou alimenta o seu bebê, você
está lhe proporcionando experiências de receber amor. A maneira pela qual ele é afagado e
tratado afeta a sensação de prazer, ou falta de prazer, que ele recebe e influi na sua futura
capacidade de estabelecer intimidade. A ternura e o respeito pelo corpo e pelas
necessidades do bebê são os primeiros contatos que a criança tem com o amor e, portanto,
com a educação sexual.
Quando você proporciona à criança encontros autênticos (confiança, amor, não-julgamento,
empatia, individualidade, atenção

216

concentrada) está ensinando que a intimidade psicológica e o envolvimento pessoal não


devem ser temidos. Você mostra que se abrir psicologicamente a pessoas importantes na
sua vida é estimulante, e não perigoso. Você dá lições silenciosas de amor – lições que são
parte integrante da educação sexual construtiva. A criança que é censurada quando tenta
aproximar-se acha que os contatos estreitos são arriscados demais. Ela pode preferir a
alienação e o sexo físico à vulnerabilidade da verdadeira intimidade psicológica. Se assim
for, ela estará destinada a relações não-autênticas, pois um fato predominante é claro: a
intimidade física não é um atalho para a intimidade psicológica. Em si mesma, a relação
sexual não elimina a solidão e a alienação. Contudo, muitas pessoas (jovens e velhas)
pensam que sim. E ficam invariavelmente decepcionadas.
O contato sexual é sempre mais satisfatório quando envolve carinho, entendimento,
aproximação e sensibilidade aos interesses do outro. Como Edmund Bergier disse, "O sexo
tem melhor gosto quando combinado com amor carinhoso. É uma experiência que não tem
qualquer relação com atitudes morais"(1).
(1) Bergier Edmund, Divorce Won´t Help & Row, 1948, p. 226.
O amor, quando profundo, significa envolvimento. Quando a liberação sexual ocorre no
contexto da confiança, dedicação e segurança, seu prazer tem um significado maior. A
criança que viveu num clima de amor é mais capaz de colocar os seus sentimentos sexuais
dentro desse contexto. Ela se interessa menos pelo sexo como recreação.

Sexo e sentimentos negativos


Ajudar um jovem a expressar sentimentos negativos afeta as suas futuras relações sexuais.
Como já vimos, a repressão das

217

emoções negativas é também a repressão das positivas, ou seja, do sentimento de amor. O


indivíduo que está na defensiva não baixa a guarda quando vai para a cama. Sua vida
sexual não apresenta a qualidade da espontaneidade e continua sendo principalmente física.
A pessoa que reprime os sentimentos pode usar o sexo como uma válvula de escape. O
truque típico de Jack para se vingar da esposa, quando há desentendimentos entre eles, é
chegar ao clímax sexual antes dela, deixando-a frustrada e irritada. É uma desforra
poderosa, embora inconsciente. Quando os casais receiam solucionar seus conflitos
inevitáveis através da expressão franca de suas reações, a interrupção das comunicações
reflete-se também no seu ajustamento sexual. A impotência e a frieza podem ser resultantes
de atitudes doentias em relação ao sexo, mas também podem ser sintomas de sentimentos
negativos reprimidos e de obstáculos nas linhas de comunicação.
Quando os pais de um jovem resolvem seus atritos através do diálogo franco e quando o
ajudam a liberar suas emoções negativas, há uma educação sexual positiva. O jovem
aprende que o confronto não elimina a dedicação e o amor. E não tem de liberar suas
repressões, vindas de outras áreas de sua vida, disfarçando-as através dos desajustamentos
sexuais.
Evidentemente, as discussões intensas prolongadas e destrutivas entre os pais podem
intimidar e amedrontar a criança. Podem ensinar-lhe que o casamento é terrível e que deve
ser evitado.
As crianças percebem o tipo de relacionamento que há entre os pais e criam impressões
sobre as relações amorosas a partir do que vêem no lar, dia após dia. Como resultado dessas
experiências, podem concluir: "O casamento é bom", ou "O casamento é destrutivo".

218

O sexo e o corpo
Toda criança adota atitudes para com seu corpo e suas várias partes. E essas atitudes
condicionam a visão que tem do sexo. O modo como você se sente em relação ao seu corpo
é transmitido aos seus filhos. Se você acha que os órgãos destinados à eliminação e à
reprodução são sujos ou vergonhosos, seus filhos provavelmente terão reações semelhantes.
Pammie tinha apenas três anos, mas dizia sempre: "Tenho que cobrir minha vergonha", ao
vestir as calcinhas depois de ir ao banheiro. Em pouco tempo ela descobriu que certas
partes de seu corpo eram sujas e era melhor não olhar para elas.
Onde Pammie aprendeu isso? Ninguém lhe disse que os corpos eram vergonhosos. Tudo
aconteceu de maneira indireta: a expressão do rosto de sua mãe quando mudava as fraldas
da menina; seu nojo quando Pammie lhe mostrou, com orgulho, o penico com a sua
primeira produção; as pancadas na mão quando ela tentava examinar sua vulva; os risinhos
das crianças mais velhas quando uma menina de dois anos tirou o calção na praia; o "Pare
com isso!", quando se abaixava para ver o cachorro urinar. Essas reações, e outras,
mostraram a Pammie que os corpos tinham partes inaceitáveis, que a evacuação era suja e
que certas conversas eram rigorosamente sigilosas.
Todas as vezes que você dá banho, veste ou ensina seu filho a usar o banheiro, as atitudes
que tem para com o corpo dele são tão significativas quanto as respostas que você dá às
perguntas específicas sobre corpo, nascimento de crianças e sexo. A educação sexual é
ensinada tanto de forma verbal como não-verbal.
A maneira como você trata as primeiras explorações corporais de seu filho tem um efeito
marcante sobre as atitudes dele para com o próprio corpo. No dia em que o bebê da sra. G.
descobriu suas mãos e passou a manhã a examiná-las, ela sorriu ao ver o espanto que a
deliciosa descoberta causava na criança. Naquela

219

noite ela contou o caso ao marido, com satisfação. Mas na manhã em que o menino
descobriu o pênis e tentou examiná-lo ela ficou tensa e disse ao marido que o filho deles
havia chegado "àquela" fase.
Toda criança quer explorar cada parte de seu corpo, sob todos os ângulos. Essas
investigações constituem prova de sua curiosidade alerta e são parte da autodescoberta.
Quando você trata as explorações de uma certa área como aceitáveis mas se perturba com
outras, você está ensinando que determinadas partes do corpo são tabu.
Mais cedo ou mais tarde as crianças descobrem seus órgãos genitais e, também, que eles
proporcionam sensações agradáveis. Todas elas se dedicam à auto-exploração e a certas
formas de exploração mútua ou de jogos sexuais.
E o que você faz quando isso acontece? As suas reações falam às crianças. Você franze a
testa, envergonha-se ou as ameaça? Ou você fala o nome das partes do corpo e discute as
diferenças entre meninos e meninas? Você diz: "Sim, essas partes proporcionam sensações
agradáveis, mas você não deve brincar assim com outras crianças." Você considera
perigosa e precoce a manipulação genital feita pelo seu filho pequeno?
A palavra "masturbação" é emocionalmente pesada para muitos pais. Alguns adultos ainda
hoje acreditam, erroneamente, que a masturbação provoca enfermidades mentais,
retardamento e delinqüência. Não há qualquer verdade nessa crença; a masturbação não
causa nada disso. É certo que as pessoas mentalmente enfermas, retardadas e delinqüentes
praticam a masturbação, mas essa automanipulação não é a causa de seus problemas. Os
problemas existem primeiro; a automanipulação vem depois.
A masturbação é uma ocorrência praticamente universal durante as três fases de
desenvolvimento normal das pessoas. Quando muito pequena, a criança saudável e alerta
apalpa e investiga as suas áreas genitais com a mesma curiosidade com que enfia o

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dedo no ouvido, ou acaricia o ursinho, ou puxa o rabo do gato. Como os terminais nervosos
ali situados são muito sensíveis, a criança sente naturalmente uma sensação agradável e
generalizada. Mas esse sentimento não é a mesma sensação intensa e excitante do adulto
maduro. Você não pode impedir essa descoberta inicial, mas se tratá-la de maneira
imprudente a criança concluirá que os órgãos genitais, e os sentimentos que despertam, são
maus e errados.
O segundo período de brincadeira genital ocorre entre os três e cinco anos, quando as
crianças se apegam emocionalmente ao progenitor do sexo oposto. As crianças satisfazem,
pela automanipulação, alguns dos seus sentimentos sexuais dessa fase. Como os meninos
têm um órgão mais visível para eliminação, que é agradável tocar, eles brincam mais
freqüentemente consigo mesmos do que as meninas.
"O que eu faço quando meu filho de quatro anos segura o pênis em público? Se o deixar à
vontade para fazê-lo sempre que desejar, ele poderá ser rejeitado pelos outros", disse a sra.
W.
Isso é certo, sem dúvida. Você ajuda seu filho a aprender as normas da sociedade dizendo-
lhe que se quiser segurar o pênis terá de ser na privacidade do lar. Diga: "Você sabe que há
certas coisas que não fazemos na frente dos outros, e há outras coisas que só fazemos na
privacidade de nossa família. Não andamos pela rua sem roupas, mas podemos fazer isso
em casa se quisermos. Se você quer segurar seu pênis, espere até chegar em casa."
Aos três ou quatro anos, a criança sabe que existem dois sexos, e que é menino ou menina.
Sua curiosidade sobre as diferenças entre os corpos e as maneiras de urinar não tem maior
significado do que seu interesse em ver que galinhas e gatos comem de maneira diferente.
Muitos jardins-de-infância esclarecidos permitem que as crianças vejam outras, do sexo
oposto, urinando. Para isso possuem um

221

banheiro comum para meninos e meninas, sem portas nos cubículos. Essa prática não fez
com que as crianças se tornassem sexualmente precoces, nem tornou mais intensivo o jogo
sexual. Em lugar disso, estimulou a aceitação das diferenças de sexo e eliminou as
exibições furtivas para satisfazer a curiosidade. Depois de algumas semanas desaparece o
interesse de ver a outra criança urinar, assim como não há interesse em vê-la beber água.
O terceiro período de automanipulação ocorre na adolescência, quando a atividade
específica das glândulas sexuais se faz sentir. Como as saídas diretas da expressão sexual
só estarão ao alcance deles quando forem mais velhos, os adolescentes voltam-se para a
masturbação para lidar com a nova intensidade de seus sentimentos.
Um certo jogo genital, portanto, é parte do desenvolvimento normal. Você deve evitar
qualquer sugestão de que a masturbação é suja, faz a criança adoecer, provoca loucura,
impotência, ou que é sinal de fraqueza moral.
Você só deve se preocupar se a masturbação for prolongada e excessiva. Quando isso
acontece significa que as relações com os outros podem estar trazendo à criança tão pouca
satisfação que ela é forçada a voltar-se para si mesma.
A masturbação pode servir para aliviar tensões. Quando excessiva, ela indica que o jovem é
infeliz ou está sofrendo pressões demais. Pode indicar que ele tem poucos envolvimentos
significativos em sua vida. Suas tensões podem, também, ser provocadas pela contenção de
sentimentos negativos, expectativas pouco realistas, competição excessiva, sentimento de
inadequação, tédio ou solidão, ou por uma disciplina rigorosa ou tolerante demais. É quase
sempre acompanhada de outros sinais de insatisfação.
Devemos tratar da causa e não do sintoma – e a masturbação excessiva é apenas um
sintoma. Quanto mais tranqüilo, receptivo e estimulante o clima que você oferece ao jovem,
menos tensões

222

interiores ele retém. Crianças satisfeitas, participantes, têm muito menos probabilidade de
recorrer à masturbação para ter satisfação na vida. Os prazeres da automanipulação
raramente superam a alegria de sentir-se amado e digno. A masturbação proporciona
apenas um alívio temporário e solitário, que não pode competir com a profunda satisfação
de um envolvimento significativo com os outros.
A masturbação moderada em certas fases é, portanto, comum; se for excessiva, significa
que você precisa examinar o clima que cerca a criança e fazer com que ela tenha
experiências estimulantes para a auto-estima.
O auto-respeito se nutre com a aceitação sincera do corpo e das sensações sexuais, embora
tais sentimentos não devam ser expressos indiscriminadamente. Mesmo que as atitudes e o
ensinamento fornecidos por você sejam positivos, as crianças podem assimilar atitudes
negativas por influência de outras fontes. Tudo o que você pode fazer é proporcionar
conhecimentos positivos e mostrar que existem outras atitudes. Lembre-se: a criança que
possui uma auto-estima elevada tem menos probabilidade de absorver essas atitudes
negativas.
Sexo e identificação do seu papel
Nada é mais devastador para a criança do que a crença de que tem o sexo errado. Achar que
o seu sexo não é o melhor destrói o auto-respeito, já que a criança nada pode fazer para
modificá-lo. E isso pode interferir na identificação positiva com o seu papel sexual.
O sr. G. estava certo de que seu primeiro filho seria um homem; planejou todo tipo de
atividades que os dois fariam juntos. Quando o menino tão desejado acabou sendo uma
menina, ele ficou arrasado. Embora ela tivesse recebido o nome de Elaine, o sr.

223

G. chamava-a de "Bud" e a apresentava, por brincadeira, como "seu filho". Elaine nunca se
sentiu segura de si. A solução que encontrou foi tornar-se uma menina masculinizada. Sua
baixa auto-estima, a falta de identificação feminina e a raiva contra a rejeição disfarçada
pelo pai afetaram, de maneira clara, sua adaptação total ao casamento.
Se você está desapontado com o sexo de seu filho, examine-se interiormente para encontrar
a razão disso. Você deve tomar medidas ativas para corrigir tal rejeição, pois do contrário
seu filho se sentirá inaceito num nível muito básico. Parte da auto-estima elevada de
qualquer menino ou menina é o sentimento de "Estou contente de ser menino", ou "Estou
contente de ser menina". E seu filho não poderá estar contente se você também não estiver.

O sexo e o relacionamento com os pais


A atitude de toda menina em relação aos meninos é condicionada pela sua relação com o
pai. E a maneira como o menino vê as meninas é afetada pelo relacionamento que ele tem
com a mãe.
Dominado pela mãe, Henry evitava cair nas garras de outra mulher, pois para ele as
mulheres significavam, necessariamente, a dominação. Nunca se casou; considerava o sexo
como um meio de controlar as mulheres em sua interminável tentativa de vingar-se da mãe.
O ódio que Gertrude tinha do pai generalizou-se numa aversão a todos os homens. Embora
tivesse se casado, tornou a vida do marido um inferno. Seu casamento só não se dissolveu
porque ela escolheu um homem que tinha profunda necessidade de ser punido.
Os sentimentos cordiais entre filho e o progenitor do sexo oposto contribuem para o
ajustamento da criança às relações com o outro sexo, e para seu futuro ajustamento sexual.

224

Sexo e tarefas do desenvolvimento


Adultos emocionalmente imaturos não lidam com seus sentimentos de maneira
amadurecida. E os sentimentos sexuais não constituem exceção. Todas as vezes que seu
filho conclui uma das tarefas da individualidade, ele avança no sentido da maturidade
emocional. Ajudá-lo nas fases normais do crescimento constitui uma educação sexual
positiva. Uma tarefa não-concluída ou realizada num clima de culpa contribui para a
imaturidade e para um funcionamento sexual menos adequado. Toda pessoa participa com
todo o seu ser da comunicação íntima contida na sexualidade adulta. E isso condiciona o
nosso comportamento.

Sexo e disciplina
Como a disciplina se ocupa do relacionamento mútuo dos membros da família no que se
refere à satisfação de suas necessidades, o tipo de disciplina a que as crianças estão sujeitas
afetará suas reações às necessidades – inclusive às sexuais – dos outros e de si mesmas. Um
jovem dominado pode usar o sexo como instrumento de controle; as relações sexuais se
assemelharão mais a um estupro inconsciente do que a um contato mutuamente agradável.
Ou, se o jovem for oprimido pelo autoritarismo, poderá tornar-se um capacho sexual.
A tolerância excessiva fez com que Larry só pensasse em suas próprias necessidades. Ele
não mantinha um relacionamento constante com ninguém. Não era culpa sua se as moças
interpretavam como amor a sua necessidade de auto-satisfação. Finalmente, quando se
casou, sua mulher passou a tolerar o egoísmo dele mas vingava-se com truques desonestos.
O leito matrimonial tornou-se uma arena de manobras e contramanobras, vitórias egoístas e
derrotas dolorosas.

225

A disciplina democrática dá aos jovens um padrão de respeito mútuo, que é transferido para
sua vida sexual. Essa disciplina estimula a dedicação e o envolvimento que se transformam
num modo total de vida. Torna-se, portanto, uma força poderosa a favor da educação
sexual.

Sexo e auto-imagem
Como já vimos, a imagem que a criança faz de si mesma influi no seu comportamento,
inclusive na maneira de se comportar sexualmente.
Les sentia-se profundamente inadequado como homem. Suas atividades de Don Juan eram
uma tentativa de provar a sua virilidade para si mesmo e para os outros. Seu principal
interesse, ao namorar uma moça, era levá-la para a cama para verificar as suas proezas
sexuais. Como homem casado, não conseguia ser fiel porque tinha de recolher,
continuamente, evidências novas de que era bastante másculo.
A inadequação de Tom estendeu-se à sua vida sexual. Para manter a coerência interna, ele
tinha que se comportar como um incompetente sexual.
Nancy era muito atraente e inteligente, mas achava que tinha pouca coisa a oferecer. Aos
16 anos já tivera uma série de casos. Numa sessão de orientação em grupo ela falou de sua
promiscuidade. "Tudo o que tenho a oferecer a um rapaz é o meu corpo. O sexo é um
seguro para se ter um namorado; significa que eu não ficarei de fora." Não acreditando que
a sua pessoa era digna de respeito, ela não acreditava que seu corpo também o merecesse.
A franqueza de Nancy estimulou outra moça do grupo a ser sincera. Margaret disse: "Eu
não faço parte de coisa alguma. Durante toda a minha vida sempre quis participar. O sexo é
o meu bilhete de entrada. Quem se importa com a reputação? Afinal ela não nos faz
companhia se ficamos de lado!”

226

"Sei que ando com um grupo que não é bom, mas pelo menos eles são como eu",
reconhecia June. "Somos todos rejeitados e temos isso em comum. É claro que eu gostaria
de entrar em contato com outro tipo de jovens, mas quando o faço não sei nem mesmo
como falar. Eles são tão seguros de si. Sinto-me mais arrasada do que nunca. Eu jamais
conseguiria me enquadrar em seus círculos, por isso para que tentar?" A falta de respeito
próprio de June refletia-se nas suas companhias e em seu comportamento.
"Acho que a minha razão para dormir com todo rapaz com quem saio nada tem a ver com
sexo ou namoro, ou desejo de fazer parte de um grupo", disse Bonnie. "Acho que faço isso
para me vingar de minha mãe. Ela me controlou com muito rigor desde que eu era pequena.
Não gosto tanto assim de sexo. Mas essa é uma área que ela não pode controlar. Além
disso, francamente, é engraçado excitar um rapaz. Dá uma sensação de poder, e isso me
agrada."
Sexo imediato e indiscriminado leva a relações superficiais, reafirma a não-participação e a
alienação.
O sexo indiscriminado é o desejo de prazer sem a pressão do compromisso ou dos conflitos.
A pessoa que quer apenas a satisfação própria, mas nenhuma responsabilidade, se
aproximará de outras com os mesmos interesses. A pessoa emocionalmente madura não
busca um relacionamento superficial. Na verdade, quem procura estabelecer relações
responsáveis está dizendo: "Tenho alguma coisa a oferecer e posso enfrentar uma ligação a
longo prazo."
O sexo indiscriminado é uma tentativa de evitar a maturidade. É a maneira óbvia de fugir
das tensões inerentes a todo compromisso. A responsabilidade para com o outro é que
distingue o homem do animal no sexo maduro. Quem procura apenas a si mesmo não pode
chegar a uma auto-realização.
Os jovens sexualmente promíscuos procuram, com isso, resolver problemas fundamentais
que não têm relação direta com o

227

sexo. Sua vida raramente leva às satisfações plenas que buscam. Pateticamente, seus
sintomas os levam a becos sem saída que invariavelmente criam novos e complicados
problemas.
A promiscuidade, portanto, pode ter várias causas: necessidades emocionais, reações
negativas contra os valores dos pais, controle excessivo ou muita tolerância. É claro que
pode resultar também do exemplo dos pais.
A promiscuidade nos rapazes é, em geral, aprovada pela sociedade. "Rapazes são rapazes",
é o que se diz.
Nossa cultura tem a convicção de que os rapazes têm direito a alguns excessos. Muitos pais
se orgulham, secretamente, das explorações sexuais de seu filho, acreditando que elas são
produto da sua própria virilidade. Mas a promiscuidade masculina nada tem a ver com a
masculinidade; na verdade, ela pode significar exatamente o contrário. O Don Juan tem de
concentrar-se nas conquistas para afugentar as dúvidas sobre sua capacidade sexual.
Com exceção dos fatores psicológicos (necessidades emocionais não-satisfeitas), a
promiscuidade masculina em adolescentes é, provavelmente, uma função da intensidade do
impulso sexual masculino, juntamente com as pressões culturais que retardam a idade do
casamento. Nas moças, é mais um fator de necessidades psicológicas (não sexuais)
insatisfeitas.
A realidade do forte impulso sexual nos rapazes contribuiu muito para a aceitação geral,
pela sociedade, de um comportamento sexual duplo. As pílulas anticoncepcionais, os
antibióticos e a revolução na moral levaram alguns pais a aceitar esse padrão para suas
filhas. Outros sentiram-se desorientados sobre a margem de atividade sexual antes do
casamento que devem permitir.
O casamento precoce pode parecer uma solução para o problema. Mas as estatísticas
mostram uma elevada incidência de divórcios entre casais adolescentes. Sem dúvida alguns
divórcios são motivados pelo fato de que o casamento foi feito apenas para dar uma
situação legal a um filho já concebido. Mas muitos outros casamentos de jovens falham por
outras causas.

228

Provavelmente uma das principais causas do divórcio é o tato de o adolescente estar ainda
desenvolvendo seu potencial e estabelecendo seu senso de identidade. A companheira que
parece adequada a um jovem, aos 17 anos, pode ser totalmente insatisfatória quando ele
chega à maturidade plena. Portanto, os casamentos precoces não constituem a solução
simples que aparentam à primeira vista.
A idéia de que os impulsos sexuais não podem ser controlados ou liberados por meio de
uma participação ativa e vigorosa nos esportes e outras atividades não é correta. A
atividade sexual indiscriminada não é a única solução para os jovens.

As evidências mostram que a melhor proteção contra o comportamento sexual


indiscriminado, quando o instinto animal se faz sentir vigoroso no adolescente – quando os
impulsos sexuais são intensos –, é um elevado grau de valor pessoal.

O sentimento do próprio valor protege o adolescente contra a tentação de vender-se barato e


diminui o interesse pelo comportamento sexual irresponsável. O jovem que gosta de si
mesmo busca relações totais que alimentem sua auto-estima, em lugar das relações sem
significação, que são prejudiciais. A fé em si mesmo deixa o jovem menos temeroso de
assumir um compromisso – ele sabe que pode lidar com isso. E tem maior liberdade de
adotar uma posição firme em relação às questões morais. E, como já vimos, seu auto-
respeito leva-o a buscar outras pessoas que adotem as mesmas posições.
O jovem com uma auto-estima insuficiente teve experiências negativas com o amor e,
tendo sofrido, prefere agora ligações passageiras que não representem compromisso,
responsabilidade e participação. Esse jovem pode vir a casar-se, mas em geral escolhe uma
pessoa que também evita a intimidade psicológica. Ele não pode crescer e florescer,
evidentemente, sem uma intimidade

229

autêntica, mas prefere a insatisfação ao perigo, já constatado, que a proximidade representa.


A criação da auto-estima é fundamental para um programa positivo de educação sexual,
pois o auto-respeito é a base do casamento saudável e estimulante.

O que eles devem saber


Juntamente com a aceitação de si mesmo e de seus sentimentos, todo jovem precisa de
informações específicas sobre o processo de reprodução. Quase todas as bibliotecas têm
livros próprios para determinados níveis de idade que apresentam os fatos da reprodução.
Examinando-os você terá uma idéia de como e do que dizer a uma criança. Os fatos
específicos, porém, devem ser apresentados quando as perguntas específicas forem feitas.
Evite dar mais informações do que a solicitada pela criança. Detalhes excessivos, em idade
imprópria, apenas confundem e podem ser absorvidos de maneira incorreta.
Antes da adolescência, toda criança deve conhecer o que é a reprodução e a parte que nela
desempenham o homem e a mulher. Ela deve saber como são originadas as crianças
(concepção), como crescem durante a gravidez (gestação) e como nascem (parto). Deve
compreender os fatos básicos da hereditariedade, menstruação e polução noturna.
As crianças devem aprender que o parto é perfeitamente normal. Muitos jovens, em
particular as moças, têm muito medo dessa função humana normal por terem ouvido
histórias exageradas, ou lido relatos dramáticos, de partos difíceis e dolorosos.
"Minha mãe me disse que ter um filho foi a pior experiência de sua vida", declarou Beth.
Tais afirmações podem fazer com que as Beths (há muitas) se sintam culpadas ou se
considerem más pelo sofrimento que causaram às suas mães, e que, por sua vez, tenham
receio de se tornarem mães.

230

As mães que tiveram problemas com o parto devem informar às suas filhas que isso
constitui a exceção, e não a regra. Os rapazes também precisam dessa informação, para que
não transmitam receios exagerados nas suas relações com as suas mulheres, ou se
preocupem com a dor que possam vir a causar-lhes.
Ao falar de sexo com os jovens, diga-lhes que os sentimentos sexuais provavelmente serão
fortes. Os jovens precisam de preparo antecipado. Devem saber que a expressão sexual
madura significa a responsabilidade pessoal para com a integridade da outra pessoa.
Precisam saber que só assim o sexo pode ser realmente estimulante. O sexo ocasional causa
sofrimento a alguém, porque quase sempre um dos dois se envolve emocionalmente. Os
encontros destituídos de significação raramente são construtivos.
Ouvir as idéias e observar as atitudes do jovem, antes de apresentar-lhe os fatos, ajuda a
esclarecer concepções errôneas aprendidas com os outros, ou produzidas pela sua própria
imaginação.
Mostre a diferença entre as necessidades sexuais do homem e as da mulher. Ambos os
sexos devem compreender que o homem se excita muito mais depressa do que a mulher, e
que seus sentimentos não estão necessariamente relacionados com o amor. Como os
desejos sexuais de uma moça estão mais freqüentemente associados ao amor romântico, ela
pode interpretar as propostas recebidas nesse sentido como manifestação de amor. O que
para Harry pode ser uma aventura de uma só noite, para Marge pode representar um
compromisso sério. O coração de muitas jovens foi partido porque elas não tinham
conhecimento dessa diferença fundamental entre os sexos.
As moças devem saber que os rapazes recebem estímulo sexual pelo que vêem; portanto,
elas precisam evitar o uso de roupas provocativas, poses sedutoras e atitudes encorajadoras
para chamar a atenção dos rapazes que estão tentando lidar com os seus sentimentos de
maneira responsável. Por outro lado, as meninas devem compreender que não constitui um
insulto levar uma

231

"cantada" e, pelas mesmas razões, não será um insulto para o rapaz se elas recusarem.
"Bem", comentou Ginny, "eu disse 'não' e Greg nunca mais me convidou para sair." Ginny
deve pensar que, se Greg a convidou para sair apenas para ter uma satisfação sexual,
provavelmente não voltaria a convidá-la depois de atingidos os seus objetivos.
As moças devem saber que muitos rapazes não estão interessados em ter relações
duradouras com garotas promíscuas. Os compromissos sérios e profundos baseiam-se na
confiança, e a promiscuidade destrói essa confiança. O rapaz que está apaixonado de fato
não rejeita uma moça simplesmente porque ela se recusa a manter com ele relações sexuais.
Se ele for sério, continuará com o namoro até que ambos estejam preparados para assumir a
responsabilidade do casamento. Se a moça permanecer firme nos seus padrões, terá maior
respeito de seu namorado, que a verá como uma pessoa com coragem para defender suas
convicções. Poucos rapazes mantêm um interesse permanente por uma conquista fácil.
Nossa sociedade defende a filosofia de "levar agora e pagar depois". Como pai você deve
procurar neutralizar essa atitude através do ensino e do exemplo. Os jovens precisam
compreender que o pagamento posterior é quase sempre muito pesado.
Em algumas ocasiões o jovem deve tomar uma posição quanto ao controle de seus
sentimentos sexuais. Você precisa deixar claro ao seu filho que ele tem o poder de escolher
para onde quer ir e como quer viver a sua vida. A decisão final está nas mãos dele.
Os jovens precisam pensar antecipadamente nas conseqüências de seus atos, tanto com
relação a si próprios como para com os outros. A previsão sobre como enfrentar situações
difíceis prepara os jovens de modo que não sejam pegos de surpresa, ou pelo calor da
emoção.
A maneira como você administra a sua vida – se tem um comportamento responsável e vive
de acordo com um código moral –

232

influencia seus filhos. Quando você sabe claramente o que quer e age de acordo com as
suas convicções, está oferecendo aos seus filhos modelos convincentes. Os adolescentes,
como já vimos, estão particularmente interessados em estabelecer um sistema de valores
significativo e precisam de adultos fortes e dedicados. Eles percebem rapidamente a
hipocrisia. Todo adolescente precisa de uma filosofia positiva para lidar com o sexo de
maneira adequada. Os fortes laços afetivos entre pais e filhos dão a estes últimos a
segurança necessária para serem fiéis aos seus ideais.

Como apresentar os fatos


O ideal seria que as crianças fossem informadas dos fatos sobre a reprodução por pais que
encaram o sexo de forma natural. Do ponto de vista prático, porém, muitas pessoas se
sentem ainda um pouco constrangidas em falar no assunto. O importante não é se você se
sente à vontade ou não, mas se você pode ser franco sobre o que sente.
As crianças percebem rapidamente as atitudes. "Minha mãe me contou tudo sobre os fatos
da vida", disse Cindy, de 12 anos. "Ela falou de todos os detalhes sem piscar, mas eu
percebi que não estava sendo fácil para ela! Ficava corada com certas palavras e parecia
estar engolindo um purgante."
Lembre-se: a confiança é vital; portanto, ponha as cartas na mesa, francamente. Diga:
"Gostaria de responder às suas perguntas sobre sexo sem ficar confuso, mas francamente,
não posso. Quando eu era jovem não se podia tocar nesse assunto, e não me sinto à vontade
com ele. Responderei às perguntas que puder, mesmo com dificuldade, e lhe darei livros
que explicam outros detalhes. Espero que você possa falar mais naturalmente sobre esse
assunto com seus filhos, quando for pai".
A sinceridade sobre as dificuldades de falar a respeito de sexo – se houver – deixa claro que
o assunto é legítimo, mas que a

233

formação que você teve é responsável pelo seu constrangimento. Essa atitude representa
um ponto importante numa educação sexual positiva.
Você pode reduzir o seu desconforto pessoal ao adotar um vocabulário funcional e
adequado. A familiaridade com os termos relacionados com a reprodução torna mais fácil a
discussão. Se certas palavras estiverem carregadas de emoção repita-as muitas vezes. Você
ficará surpreso ao ver quanto isso ajuda.
A leitura de uns quatro ou cinco livros sobre educação sexual para crianças da idade de seu
filho poderá ajudá-lo a expor melhor o assunto. Melhor ainda será ler esses livros em voz
alta para você mesmo. Seus ouvidos podem habituar-se a essas palavras e idéias "difíceis".
Apresente os fatos de maneira precisa. Você não pode iniciar o assunto com contos de fada
ou com meias palavras, quando seu filho tem quatro anos, e depois dar-lhe uma exposição
completa quando ele tiver 13 anos. Assim você destrói a confiança, e a curiosidade não
espera a sua conveniência. Você tem que decidir quem deve ser o professor de seu filho:
você mesmo ou outra criança.
Algumas pessoas podem achar que, por mais que leiam ou pratiquem, jamais conseguirão
falar naturalmente sobre sexo. Diga então: "Gostaria de falar sobre esse assunto com você,
mas devido à minha formação isso não me é possível. Mas você pode falar com..." E
marque uma entrevista para seu filho com um médico, enfermeira, orientador educacional,
sacerdote ou amigo. Uma palavra de advertência: não suponha que a profissão torna mais
fácil a uma pessoa falar tranqüilamente sobre sexo. Nenhuma profissão assegura atitudes
calmas e positivas em relação ao assunto. Fale com essa pessoa e sinta, pessoalmente, o seu
"quociente de facilidade" no assunto.
Aos três ou quatro anos, a maioria das crianças pergunta de onde vêm os bebês. Se não
tiverem feito essa pergunta, levante a questão quando tiverem no máximo cinco anos, num
momento

234

oportuno: comentando o nascimento de um bebê nas vizinhanças, contando uma história,


explicando uma cena apresentada na televisão, ou comentando como um animal doméstico
deu cria. Pergunte: "Você sabe como os bebês nascem?" Ou traga para casa um livro sobre
sexo destinado a crianças em idade pré-escolar, tal como traz livros sobre outros assuntos,
para serem lidos em voz alta. Reserve bastante tempo para perguntas e discussões. Adquira
o hábito de deixar os livros sobre educação sexual ao alcance de seu filho durante toda a
infância, embora você possa preferir fazer pessoalmente a primeira exposição sobre o
assunto.

O apoio necessário
A criança, precoce ou não, aproveitará o apoio e a conversa franca sobre o seu crescimento.
A pressão das observações das outras crianças diminuirá se seu filho souber que as pessoas
sofrem grandes variações nas fases de crescimento. As crianças que se desenvolvem mais
devagar irão se beneficiar muito com o desenvolvimento de habilidades específicas. A
competência compensa o "fracasso" de um corpo franzino, ou de crescimento lento.
Apesar da consciência e das habilidades, a criança poderá se lamentar sobre seu
desenvolvimento se este estiver visivelmente em desacordo com o de seus companheiros.
Se você ouvir seu filho de maneira ativa, empática, poderá ajudá-lo a aceitar uma situação
que ele não pode mudar. Evite a lógica e os discursos como alternativa. As divergências no
desenvolvimento ocorrem habitualmente na época em que a criança precisa sentir-se igual
às outras. Saber que você compreende o seu sofrimento é o maior apoio que ela poderá ter
no mundo.
Os adolescentes precisam de oportunidades para falar de seus sentimentos – inclusive de
suas atitudes e receios sobre o sexo – com outros adolescentes. Essas conversas, porém, não
serão francas (e portanto menos produtivas) se não estiverem presentes os

235

sete ingredientes do encontro verdadeiro. Os adolescentes precisam do apoio do grupo; usar


as conversas sobre esse assunto para poder compartilhar com outros os sentimentos sexuais
é mais saudável do que se preocupar com eles sozinho. Os adolescentes têm mais liberdade
de expressar seus verdadeiros sentimentos se o líder adulto não for seu pai ou sua mãe, e se
tiver habilidade em facilitar a comunicação franca e sincera.
A esta altura, você já poderá avaliar a enorme variedade de fatores que afetam a maneira
como o jovem lida com a sua sexualidade. Cada um desses fatores desempenha um papel
importante na educação sexual que ele recebe. Todos os aspectos da vida da criança
determinam as possibilidades futuras de unir, de forma responsável e dedicada, o sexo com
o amor, em suas atitudes e comportamento.

19 CONCLUSÃO

Esperamos que a essa altura você já tenha uma nova apreciação da natureza humana e da
importância da auto-estima na vida de toda criança. Essa consciência, porém, poderá criar-
lhe um sentimento de culpa. Se assim for, continue a ler esta conclusão.
Lembre-se: os seres humanos adaptam-se e ajustam-se até mesmo aos ambientes
psicológicos mais desfavoráveis. A tendência para um desenvolvimento sadio floresce até
mesmo nas pessoas que tiveram poucos estímulos psicológicos e que já estão em idade
avançada.
Tudo o que você fez até agora provavelmente foi baseado nas intenções sinceras de
proporcionar bem-estar aos seus filhos. Qualquer falha no desempenho de sua função de
pai, ou de mãe, é resultante da falta de treinamento e de informação a que não teve acesso.
Culpar a si próprio, a seu marido ou à sua mulher, a seus pais, ou às circunstâncias da vida,
só serve para dificultar o seu progresso. Você pode considerar as suas deficiências como
oportunidades para superá-las, ou limitar-se a bater no peito com remorsos. Minha
esperança é que você se sinta como um ser humano que ainda está no processo de
desenvolver o seu potencial inexplorado. Você pode começar hoje e retificar as deficiências
que existem. Se a tarefa lhe parece grande demais, busque assistência especializada.
O processo de desenvolvimento deve ser iniciado dentro de você mesmo. Todos os passos
dados no sentido de atender às suas

238
próprias necessidades e aceitar a você mesmo representam um investimento no bem-estar
de sua família. Na parte final deste livro você encontrará uma lista que reúne todas as idéias
básicas expostas. Consulte-a freqüentemente, para reforçar os aspectos essenciais que
devem sempre estar em mente.
Lembre-se: você não tem que ser perfeito. Como disse Lincoln, "Procure o que está errado,
e certamente você o encontrará". Possivelmente você cometeu alguns erros na educação de
seus filhos, mas pode indicar um pai que não o tenha feito? Se você acha que conhece
algum pai que nunca errou é porque não está a par de todos os fatos relacionados com ele.
Qualquer um de nós pode dar o melhor de si a cada dia, mas "o melhor" nunca será
perfeito. E as crianças se dão muito bem com pais que são plenamente humanos e que
falham aqui e ali.
Examine o clima em que seus filhos vivem agora. Esqueça o passado e ocupe-se do
presente, no ponto em que você e seus filhos se encontram no momento. Se você tiver
dúvidas quanto aos efeitos de suas atitudes, suas conversas, ou suas expectativas sobre o
auto-respeito de seus filhos, coloque-se no lugar deles. Terá, então, uma indicação sobre a
qualidade de espelho que você é. Lembre-se: nenhuma criança precisa de espelhos
positivos em todos os momentos de sua vida.
Seus filhos terão mais probabilidade de efetuar o que prometem num clima que lhes
permita crescer no momento adequado, à sua própria maneira. Seu filho precisa de
compreensão ativa quando atravessa o difícil caminho da dependência para a
independência. Se lhe forem dados os elementos necessários, ele só terá como alternativa
gostar de si próprio.
Lembre-se: a criança saudável é verdadeira consigo mesma, o que lhe assegura a
integridade pessoal. Ela faz o que pode com o que tem, e isso lhe dá uma paz interior. A
criança doentia vive segundo padrões emprestados. Em choque consigo mesma, ela disfarça
suas partes inaceitáveis e julga a si própria e aos outros de acordo com isso. Todos nós
damos respostas diárias à pergunta:

239

"Posso deixar que meu filho seja sincero consigo mesmo?" Há uma canção popular norte-
americana que diz: "Eu não posso estar bem com alguém se não estou bem comigo
mesmo." Isso é uma versão moderna do que disse Shakespeare: "Acima de tudo, seja
sincero consigo mesmo e, tão certo como a noite sucede o dia, não poderá ser falso com
ninguém."
Aristóteles conhecia a verdade que a psicologia confirma hoje. Há mais de dois mil anos,
ele disse:

"Felicidade é Auto-satisfação”

Viver com seu filho, de modo que ele se sinta profunda e tranqüilamente satisfeito de ser
quem é, significa dar a ele um legado sem preço: a força para enfrentar as tensões, a
coragem para tornar-se uma pessoa dedicada, responsável, produtiva e criativa - alguém
plenamente humano. E então o investimento pessoal que você aplicou em amor, tempo,
energia e dinheiro frutificará interminavelmente no tempo. Ajudar seu filho a gostar de si
mesmo é o maior presente que você pode lhe dar. É manifestar A-M-O-R da maneira mais
profunda.
Se você precisa de um programa prático para aumentar a sua auto-estima, leia Celebrate
Your Self, de Dorothy Corkille Briggs, Doubleday, 1977.

RELAÇÃO DAS IDÉIAS BÁSICAS

Apresentamos aqui a essência das idéias mencionadas neste livro. Esta relação tem sido útil
para os pais, em minhas aulas, servindo como uma rápida revisão dos ensinamentos
ministrados. Você também pode utilizá-la como guia para aumentar a sua eficiência.
A base da saúde emocional

1. O que o seu filho sente em relação a si mesmo afeta seu modo de viver.

2. Uma auto-estima elevada baseia-se na convicção que seu filho tem de ser amado e
valorizado.

3. Seu filho precisa saber que ele é importante justamente porque existe.

4. Ele precisa sentir-se competente para lidar consigo mesmo e com o ambiente que o
cerca. Precisa sentir que tem alguma coisa para oferecer aos outros.

5. Uma auto-estima elevada não é pretensão; é a tranqüila aceitação de seu filho em ser
quem é.

Os espelhos criam auto-imagens

1. Toda criança tem o potencial de gostar de si mesma.

242

2. Seu filho aprende a ver a si mesmo tal qual as pessoas importantes que o cercam o vêem.

3. Ele constrói a sua auto-imagem a partir das palavras, da linguagem corporal, das atitudes
e dos julgamentos dos outros.

4. Ele julga a si mesmo de acordo com as observações que faz de si, em comparação com
os outros, e das reações dos outros para com ele.

5. Uma auto-estima elevada resulta de experiências positivas com a vida e com o amor.

A influência dos espelhos no comportamento

1. O comportamento de seu filho corresponde à sua auto-imagem.

2. Ele pode sentir-se confiante numa área e não em outras; a maneira como ele age dá a
você as indicações sobre como ele se sente: se forte (auto-afirmações positivas) ou fraco
(auto-afirmações negativas).
3. Caso seu filho se considere inadequado, esperará sempre o fracasso e agirá de acordo
com essa expectativa. A segurança pessoal, porém, lhe dá a coragem e a energia para
enfrentar as dificuldades. Ela lhe concede a esperança de vencer, e ele passa a agir de
acordo com essa esperança.

4. A fé em si mesmo faz com que seu filho se relacione melhor com os outros. Terá, nesse
caso, maior probabilidade de ser feliz.

O preço dos espelhos deformados

1. Seu filho busca o auto-respeito.

2. Se ele se sentir inadequado poderá se submeter a uma vida apagada e retraída, ou erguer
várias defesas para manter sua auto-estima.

243

3. As defesas neuróticas são construídas em torno da convicção de que "Eu não sou amado
e não tenho valor".

4. Quando as defesas afastam os outros, a criança anula a sua necessidade de reflexos


positivos.

5. Os reflexos positivos que você emite fazem com que o seu filho evite caminhos que o
afastam da plenitude da vida.

A armadilha dos reflexos negativos

1. Em geral, a imagem que seu filho tem de si mesmo muda constantemente.

2. Se ele acreditar que não vale nada, recusará admitir as mensagens positivas sobre a sua
competência para manter a sua coerência interior.

3. Uma auto-estima insuficiente e rígida resulta de muitos fatores negativos que imperam
durante um longo período.

4. As atitudes negativas podem ser modificadas e transformadas numa auto-estima elevada,


se você der a seu filho um clima estimulante de aceitação e experiências de êxito.

Polimento dos espelhos dos pais

1. Todos nós vemos nossos filhos através dos filtros da inexperiência, de padrões
emprestados, de tarefas não-concluídas, de necessidades não-satisfeitas e de valores
culturais.

2. Os filtros transformam-se nas expectativas pelas quais você mede seu filho; e
influenciam a sua maneira de tratá-lo.
3. Se as suas expectativas não se ajustam ao seu filho durante a fase de crescimento você
provavelmente se decepcionará com ele.

4. Se seu filho sentir que quase sempre não corresponde aos padrões que você aprova,
perderá o respeito por si mesmo.

244

5. As expectativas que você tem em relação ao seu filho provavelmente serão mais justas se
forem baseadas no real desenvolvimento dele, na observação atenta e na sensibilidade
quanto às pressões sofridas no passado e no presente.

6. Verifique constantemente as suas expectativas; elas podem escapar facilmente ao seu


controle.

7. Quanto mais realizado você for como pessoa, menores pressões pouco realistas fará
sobre seu filho.

8. O que você faz consigo mesmo fará também com seu filho. Portanto, o aumento da sua
auto-aceitação lhe permitirá aceitar mais o seu filho.

O encontro autêntico

1. Toda criança precisa de atenção concentrada – de encontro autêntico – para se sentir


amada.

2. O amor não é transmitido, necessariamente, pela afeição física, pela constante negação
das necessidades dos pais, pela proteção excessiva, ou por expectativas elevadas, tempo e
presente.

3. Seu filho poderá ver o seu distanciamento constante – preocupação com o passado, o
futuro, as previsões e as tarefas – como falta de amor. Ele só poderá se sentir merecedor de
amor se você reservar tempo para estar plenamente com ele.

4. Adquira o hábito de ser aberto para a maravilha que é seu filho, aqui e agora. Examine
freqüentemente o nível da atenção concentrada que você lhe dedica.

A segurança da confiança

1. A confiança é o ingrediente mais importante de um clima psicologicamente seguro.

245

2. Seu filho deve ser capaz de contar com você para ajudá-lo amigavelmente na satisfação
de suas necessidades.
3. As palavras que você disser devem corresponder à sua linguagem corporal para que seu
filho tenha confiança em você.

4. Ele precisa que você se abra com ele sobre os seus sentimentos, suas reservas e suas
ambivalências.

5. Seu filho precisa ver você como um ser humano; seja verdadeiro com ele. Isso o ajudará
a aceitar sua própria humanidade, dando-lhe um modelo que lhe permitirá assimilar todas
as partes de si mesmo. E então ele não se alienará dos outros ou de si mesmo.

A segurança do não-julgamento

1. O segundo ingrediente da segurança é a ausência de julgamentos.

2. Dirija as suas "reações-eu" para o comportamento; não atribua os julgamentos do "tipo-


você" à pessoa de seu filho.

3. Quando seu filho vê a si mesmo como um ser à parte de seus atos, tem mais condições de
criar um auto-respeito sólido.

A segurança de ser amado

1. Amar o que seu filho tem de especial, embora seu comportamento possa não ser
aceitável, é o terceiro ingrediente da segurança psicológica.

2. Recuse-se a ver apenas a singularidade de seu filho; trate-o com o mesmo respeito que
você deseja para si; focalize as suas qualidades positivas; evite identificá-lo com os seus
atos; e procure valorizar a você mesmo. Desse modo o seu amor se revelará.

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3. Quando seu filho se sente amado, ele busca metas mais realistas, aceita os outros tal
como são, aprende com maior eficiência, usa sua criatividade e gosta de si mesmo.

A segurança de possuir sentimentos

1. O quarto ingrediente da segurança psicológica consiste em permitir que a criança seja


"dona" de seus sentimentos, sem que você deixe de aceitá-la por isso.

2. Você respeita a individualidade quando evita pedir ao seu filho que tenha as mesmas
reações e sentimentos que você.

3. Ofereça muitas experiências aos seus filhos, mas trate com respeito as suas reações.
Evite impor as lições que não são apreciadas por eles.

4. Planeje ativamente as diferenças entre seus filhos, tanto nas expectativas quanto nas
atividades familiares.
5. O respeito às suas diferenças e à sua singularidade estimula a auto-estima de seu filho.

A segurança da empatia

1. A empatia é o entendimento do ponto de vista de seu filho, sem julgamento,


concordância ou discordância. Esteja atento à linguagem corporal, pois é mais sincera do
que as palavras.

2. A empatia, para ser autêntica, tem que vir do coração.

3. Quando seu filho se mostra preocupado, deseja secretamente a compreensão empática;


ele precisa mais dela do que de explicações, argumentação ou garantias.

4. Se você vê o seu papel de progenitor como o de um educador, se você respeita a


integridade de seu filho, se você está em contato com os seus próprios sentimentos e sente-
se bem com eles, a empatia virá facilmente.

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5. A empatia evita a alienação; é uma poderosa prova de amor. E estimula ativamente o


amor que seu filho tem por você.

A segurança do crescimento individual

1. O sexto ingrediente da segurança psicológica é a liberdade de crescer de forma única.

2. O crescimento se faz em etapas e sofre, às vezes, regressões e paralisações.

3. Cada criança tem seu próprio ritmo de crescimento.

4. Quando seu filho se sente seguro para recuar, está livre para crescer.

5. Os sete ingredientes do encontro autêntico se interligam para formar o clima do amor.


Eles asseguram que a criança sentirá o interesse dos pais por ela; e então desenvolverá um
auto-respeito sincero em todas as direções.

Como tratar os sentimentos das crianças

1. Em geral, não tratamos os sentimentos das crianças da mesma maneira como


gostaríamos que os nossos fossem tratados.

2 As crianças possuem todos os tipos de sentimentos com os quais a tradição nos ensinou a
não entrar em contato diretamente.

3. Tentar superar os sentimentos negativos através da argumentação, julgamento, negação,


conselho, reafirmação ou diversão afasta-nos da criança. Essas atitudes obrigam-na a
pensar menos em si mesma e a reprimir ou disfarçar suas verdadeiras emoções.

4. Os sentimentos reprimidos não desaparecem; eles agem contra a saúde física, emocional
e intelectual.

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5. O poder dos sentimentos se evapora quando as emoções são aceitas com entendimento e
canalizadas para escoadouros aceitáveis.

6. Seu filho precisa que você o ouça ativamente e não passivamente.

7. Para livrar-se das ações negativas, livre-se dos sentimentos negativos primeiro; eles são a
causa.

8. Talvez seja necessário limitar as ações, mas a expressão dos sentimentos só deve ser
limitada em termos de quem, quando e onde são realizadas.

Como decifrar o código da raiva

1. Os sentimentos normais de raiva mascaram um sentimento anterior.

2. Quando você aceita a raiva ouvindo ativamente, seu filho acaba lhe revelando as
emoções subjacentes. Canalize seus sentimentos para saídas seguras.

3. Os momentos de raiva podem ser reduzidos, mas não totalmente eliminados. Se seu filho
se irrita freqüentemente, verifique se as suas necessidades físicas e emocionais estão sendo
satisfeitas; se ele está enfrentando frustrações demais; se faz exercícios suficientes.
Verifique as expectativas que você mantém, o tipo de disciplina, competição, comparações
e tensões familiares. Observe também se você está proporcionando a seu filho doses
suficientes de encontros autênticos.

4. Se você enfrentar as suas próprias hostilidades, poderá ajudar seu filho a enfrentar as
dele.

5. Transmita os seus primeiros sentimentos como "reações-do-tipo-eu".

6. A maior parte dos acessos de raiva são um sinal de perda de controle e frustração
extrema, e não um comportamento infantil.

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7. Os sinais indiretos de raiva são a implicância constante, a maledicência, o sarcasmo, a


agressão disfarçada, os ataques aos valores adultos, os acidentes constantes, os temores
pouco realistas, o comportamento-modelo, a depressão e os sintomas psicossomáticos.

8. A aceitação da raiva que seu filho manifesta evita que ele use válvulas de escape
indiretas ou a repressão. Permite-lhe aceitar a sua humanidade total.

Como desmascarar o ciúme

1. O ciúme é um sentimento normal nas famílias, principalmente porque toda criança deseja
ser a favorita.

2. O ciúme mascara o sentimento real ou imaginário que seu filho tem de estar em
desvantagem.

3. As pressões interiores ou exteriores podem diminuir o sentimento de adequação de seu


filho; ele poderá, então, sentir ciúme.

4. Com uma auto-estima elevada seu filho terá maior segurança interior que o protegerá
contra o ciúme intenso e freqüente.

5. O ciúme surge quando há favoritismo, comparações ou falta de respeito pela


individualidade. Evite usar a criança para satisfazer as necessidades insatisfeitas que você
tem. Uma atmosfera familiar tranqüila, baseada na cooperação e na disciplina democrática,
reduz a freqüência do ciúme.

6. Os sinais indiretos de ciúme são: um súbito aumento de dependência, regressão,


exigências de coisas materiais e intensificação do mau comportamento.

7. Quando há ciúme, ajude seu filho a expressá-lo ouvindo-o ativamente. O sentimento que
ele experimenta é real, mesmo que os fatos não o justifiquem.

8. Ajude seu filho a sentir-se compreendido, incluído e importante; dessa forma ele não se
sentirá enganado.

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Motivação, inteligência e criatividade

1. Seu filho nasce curioso e com a tendência a confiar em si mesmo.

2. Apóie as suas explorações, curiosidades e tentativas de autoconfiança, se quiser que ele


seja intelectualmente estimulado, e deixe que ele use sua criatividade. Ele deve saber que
tem direito a indagar e a descobrir.

3. Você estimula a inteligência de seu filho proporcionando-lhe: experiências ricas e de


primeira mão, amplos contatos lingüísticos, experiências bem-sucedidas na solução de
problemas, e exemplos familiares e atitudes que valorizam o aprendizado e a
independência.

4. O crescimento intelectual de seu filho é afetado por: deficiências físicas, necessidades


emocionais insatisfeitas, sentimentos reprimidos, pressão indevida em favor de metas
pouco realistas, disciplina não-democrática, linhas de comunicação obstruídas, salas de aula
superlotadas, professores inadequados e técnicas de ensino deficientes.

5. Um clima de encontros autênticos motiva seu filho a aprender e a capitalizar as suas


particularidades inatas. Há uma relação direta entre a criatividade livre e a auto-estima
elevada.

O casamento do sexo com o amor

1. A educação sexual significa muito mais do que apenas o ensino dos fatos da reprodução.
Ela compreende o estímulo a atitudes saudáveis em relação ao corpo, aos sentimentos, aos
papéis sexuais e ao eu.

2. As atitudes para com o sexo são influenciadas pelos modos de afagar, alimentar, vestir,
banhar e ensinar a usar o banheiro; pelos progressos nas tarefas de desenvolvimento; pela
maneira de lidar com os sentimentos negativos; pelos tipos

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de modelos oferecidos; pelos valores que as crianças vêem adotados; pelo tipo de disciplina
usado; bem como pelas influências vindas de fora.

3. As suas atitudes em relação ao sexo são contagiosas. Seja franco sobre qualquer
constrangimento que tenha. Coloque a responsabilidade no devido lugar: na educação que
você recebeu e não no assunto.

4. Apresente os fatos da reprodução quando seu filho fizer perguntas. Se ele não as fizer,
aborde você mesmo o assunto. As primeiras informações devem ser dadas, no máximo, até
os cinco anos. Deixe ao alcance de seu filho livros de educação sexual apropriados a cada
fase de seu desenvolvimento.

5. O ajustamento sexual positivo é mais fácil se seu filho for emocionalmente amadurecido.

6. A auto-estima afeta diretamente o comportamento sexual. Um respeito próprio sólido


permite ao seu filho realizar um casamento enriquecedor, responsável, dedicado, com uma
pessoa que tenha o mesmo respeito próprio. Um casal assim terá mais condições de
alimentar a autoconfiança em seus próprios filhos.

Como você demonstra amor aos seus filhos? Se eles vivem com expectativas realistas,
encontros autênticos, cooperação nas tarefas da individualidade, aceitação compreensiva de
todos os sentimentos mesmo quando você limita os atos, e disciplina democrática, eles se
sentirão amados. E esse sentimento é a base de uma auto-estima elevada. Com essa sólida
base interior, o potencial se expandirá, seus filhos serão motivados, criativos e terão um
objetivo na vida. Eles se relacionarão bem com os outros, terão paz interior, resistência às
tensões e maior oportunidade de realizar um casamento feliz. Eles próprios serão pais
estimulantes.
Esperamos, a esta altura, que você esteja convencido da importância de saber tudo o que for
possível sobre a tarefa mais importante do mundo – a parentalidade.

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