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Número 5 – Abril 2011 

Judiccaël Perro
oy

Miguel Carva
alhinho 

Alan
n Rawstho
orne 

Guita
arra Clássica     
 
Editorial: 
Na  sua  entrevista,  Judicaël  Perroy  refere  como  acha  extraordinário  ver  que  existem  cada  vez 
mais  crianças  dedicadas  à  música  clássica.  Os  efeitos  positivos  no  desenvolvimento  cerebral 
das  crianças  encontram‐se  amplamente  estudados  e  muitos  de  nós  já  ouvimos  falar  sobre  o 
efeito Mozart (nome que poderá suscitar incorrectas interpretações dado que muitas pessoas 
pensam que se deverá ouvir apenas música de W. A. Mozart).  
 
O  que  mais  poderá  fascinar  será  como  nos  dias  de  hoje,  apesar  de  todas  as  distracções 
possíveis  e  imaginárias,  encontramos  jovens  plenamente  dedicados  ao  estudo  da  música.  As 
horas passam muito mais rapidamente quando nos encontramos embrenhados em distracções 
que nos induzem a um estado hipnótico, estado alfa, actividades como ver televisão ou jogar 
computador. Tal como em toda a educação, a facilidade não pode estar presente. O carácter 
individual  do  estudo  musical  reclama  uma  atenção  e  exclusividade  por  parte  do  músico.  O 
músico não deverá favorecer a comodidade de um passatempo em detrimento de uma relação, 
de afecto e constante pesquisa, com a sua arte. 
 
Pedro Rodrigues 
 
 
Estará  o  meio  artístico  português  sentenciado?  Para  quem  ainda  se  encontra  em  negação,  a 
resposta é inequivocamente sim. A Holanda, um dos expoentes  máximos da  cultura europeia 
verá o seu orçamento para as artes reduzido em cerca de 25% o que levou milhares de músicos 
às  ruas  em  protesto  em  Outubro  de  2010.  Não  estamos  mais  no  campo  do  desconhecido.  O 
caminho  que  será  tomado  no  futuro  no  que  às  artes  diz  respeito  é  mais  do  que  previsível,  é 
uma certeza. Estaremos preparados para tal cenário? 
 
Portugal  não  estando  só  na  cauda  da  Europa  geograficamente  mas  também  social  e 
economicamente,  terá  forçosamente  de  evoluir  ideias  e  conceitos  em  prol  da  sua 
sobrevivência.  Parafraseando  António  Pinho  Vargas  em  Música  e  Poder,  é  o  momento  das 
respostas individuais criativas, independentemente do destino do património artístico. 
 

João Henriques 

Índice: 
Entrevista a Judicaël Perroy                                                                                                   4 
Entrevista a Miguel Carvalhinho                                               13 
Estratégias de estudo                             17 
Novas Gravações                              62 
Páginas com Música                              64  
 
 
Equipa:  Marcos  Vinícius  Araújo,  João  Henriques,  Tiago  Cassola  Marques, 
Pedro Rodrigues, Manuel Tavares 

Guitarra Clássica       
 
Entrrevista a Judicaël Pe
erroy 
Por Pedro Rod drigues 
 

Revistta  Guitarra  Clássica 


C –  Go
ostava  que  fa
alasse  um  po
ouco  sobre  o  seu  início  na
a  guitarra,  os  seus 
princiipais professorres e os princiipais ensinamentos que retirou de cada u
um deles.  

erroy ‐  Comecei a estuda
 Judicaël Pe ar guitarra qu
uando 
tinha  7  anos  mas  inicialmentee  queria  esstudar 
acordeão  por  razões  que  não  sei  bem  expliccar.  O 
m  pouco  dee  guitarra  como 
meu  pai  tocava  um
amador,  mas  um  amador 
a esclarecido  no
o  que 
respeita  a 
a música  clássica.  E  foi  portanto  ele
e  que 
me  impulssionou  a  esttudar  guitarrra  e  me  insccreveu 
no conservvatório do centro de Parris. Apesar d
de não 
estar  particularmente  motivado  n
nos  primeiro
os  seis 
meses,  alguma 
a coisa  acontecceu  e  con
nsegui 
perceber  perfeitamen
nte  como  tudo  funcionava  na 
guitarra.  É 
É algo  que  não  sei  exp
plicar  muito
o  bem 
como  aco
onteceu  maas  consegui  tocar  todas  as 
músicas do livro em leitura à primeira vista. E te
er esta 
capacidade  indiccava  que  era 
e bastantee  dotado  para  a 
guitarra. Na alturra tinha um  professor m
mediano, que
e aliás não to
ocava guitarra clássica, o
o meu 
pai procurou um novo professsor, alguém mais compe
etente e foi ffalar com Ro
oberto Aussel após 
oncerto. E os primeiros eestudos a sério começaraam aos 9 ano
um co os pois estud
dei com ele e
e com 
Delia  Estrada  durante 
d doiss  anos.  Co
omo  era  ne
ecessário  qu
ue  tivesse  um  diplom
ma  do 
conseervatório,  esstudei  posteeriormente  com 
c Raymon
nd  Gratien  que 
q foi  o  meeu  professorr  mais 
importante pois eestudei com ele entre oss 11 e os 15 anos. Foi com ele igualm
mente que fizz mais 
progrressos.  

Após  bastantes  hesitações  decidi,  verd


dadeiramentte,  fazer  da  guitarra  a  minha  pro
ofissão 
quando  tinha  20‐21  anos.  Heesitei  bastan
nte  pois  quando  era  mais  novo,  fui  bastante  exxposto 
(no seentido em que em Françça, na altura que era maiis novo não h
havia muitass crianças pro
odígio 
em  guitarra) 
g e  to
odas  as  pesssoas  pensavaam  que  eu  iria  obrigato
oriamente  seer  guitarristaa  e  eu 
não ttinha tantas certezas assim. E tudo issto foi bastan
nte pesado ee só decidi reealmente ap
pós ter 
parad
do durante o
os 17 e os 19
9 anos. E só aapós ter reto
omado aos 2
20 anos é qu
ue tomei a de
ecisão 
de  me 
m tornar  profissional 
p e  fui  paraa  a  École  Normale 
N dee  Musique  e  para  o  CNSM 
C
(Consservatoire National de M
Musique de  Paris) onde  estudei com
m Alberto Po
once. Este pe
eríodo 

Guita
arra Clássica     
 
de  aulas  correu  de  modo  relativamente  difícil  pois  tive  dificuldade  em  ajustar‐me  às  aulas. 
Tinha  um  imenso  respeito  por Ponce  enquanto  professor,  alguém  que  é  muito  dedicado  aos 
seus alunos mas aquilo que me queria ensinar não se adequava de todo a mim e foram aulas 
muito difíceis. Após este período de estudo, fiz poucos concursos, fiz o GFA em 1997 e a partir 
desse momento comecei a ter bastantes concertos o que também motivou que fizesse poucos 
concursos  em  comparação  com  muitas  pessoas. Devo  ter  feito  7  concursos  tendo  começado 
em concursos internacionais aos 14 anos. Nessa idade ganhei o segundo prémio, pois aos 14 
anos  já  tinha  as  mesmas  capacidades  técnicas  que  actualmente  possuo.  Musicalmente 
diferente como seria de esperar mas tecnicamente era bastante semelhante ao que sou hoje.  

RGC – Em entrevistas mais antigas, refere frequentemente o piano como instrumento de referência. Que 
outros músicos considera que influenciaram a sua maneira de pensar a música? 

JP  ‐  Quando  era  mais  novo  nunca  ouvi  outra  música  sem  ser  a  erudita  e  até  aos  13‐14  anos  ouvi 
unicamente música para guitarra clássica. A partir dos 14 anos comecei a ouvir outras coisas, comecei 
com as cassetes que existiam em casa dos meus pais e consistiam em Polonaises de Chopin tocadas por 
Maurizio Pollini e obras de Granados interpretadas por Alicia de Larocha. Fui de certo modo influenciado 
pelo meu pai que ouvia bastantes vezes os Impromptus de Schubert por Brendel e assim fiquei também 
eu imerso nesta música.  

Na  altura  em  que  parei  de  estudar  guitarra,  por  coincidência,  fui  ver  um  concerto  do  pianista  Nikita 
Magaloff que estava a fazer a integral de Chopin e partir desse momento comecei a ouvir cada vez mais 
este  instrumento.  No  que  respeita  aos  intérpretes  não  diria  que  me  influenciaram,  mas  sim  que 
marcaram, pois não tenho a pretensão de dizer que tenho a influência de tais músicos na maneira como 
toco. Muito especificamente, existem quatro: Pollini que devo ter visto em concerto pelo menos umas 
vinte vezes; Brendel que vi igualmente em diversas ocasiões; Richter que vi apenas uma vez em 1995 e 
finalmente Rudolf Serkin que conheci através dos seus discos de Beethoven. Após ter ganho o concurso 
Bartoli, a primeira coisa que fiz foi comprar a integral das sonatas de Beethoven.  

RGC – E o que admira mais em cada um desses músicos?  
JP – É bastante difícil definir. Evidentemente, após alguma reflexão chegamos à conclusão que existe um 
ponto comum: a ausência de compromisso perante o repertório há muito estandardizado, algo que o 
piano  permite  com  alguma  facilidade  pois  o  seu  repertório  é  de  facto  enorme.  E  cada  um  desses 
músicos tem as suas características: destaco em Brendel a maneira como cada interpretação é estudada 
e  aprofundada,  mesmo  que  tenha  gravado  várias  vezes  as  mesmas  obras,  cada  gravação  apresenta 
sempre novidade e frescura e é algo que acho admirável, tal como o facto de ser alguém que escreveu 
bastante  sobre  a  música,  análise,  interpretação  e  a  sua  profissão.  Em  Richter,  que  é  o  meu  pianista 
favorito,  admiro  as  suas  escolhas  radicais.  Tem  uma  quantidade  de  repertório  alucinante,  maior  que 
qualquer  outro  pianista.  O  facto  de  tomar  riscos  em  concerto  e  há  mais  do  que  essa  ausência  de 
compromisso: quando o vi ao vivo, tocava no escuro e com alguém ao lado que lhe virava as páginas. 

Guitarra Clássica       
 
Não  víamos  as  mãos  e  como  não  as  víamos,  tínhamos  a  capacidade  de  ouvir  muito  melhor.  Para  ele 
havia  esta  necessidade  de  concentração  na  audição  por  parte  do  público.  Em  Pollini  salientaria  a 
perfeição  técnica  mas  esta  perfeição  não  é  um  objectivo  em  si,  como  se  nota  nos  concertos  onde 
sentimos  uma  urgência  em  comunicar.  Sinto,  no  entanto,  que  acabo  por  ter  uma  maior  ligação  com 
Brendel.  

RGC – Quais os factores que o motivam a escolher determinadas obras e qual o seu método de estudo e 
aproximação às peças?  
JP – É um método muito lento e está a tornar‐se cada vez mais lento (o que é um pouco inquietante). Há 
muitas obras que gosto muito e à medida que as vou trabalhando dou‐me conta que "não, não é isto 
que quero fazer". Como agora não tenho de fazer concursos, não tenho imposições. Há imensas obras 
que  gosto  de  ouvir  e  que  gostaria  de  tocar,  mas  uma  vez  que  para  tocar  bem  as  peças  preciso  de  as 
trabalhar muito, eu tenho de gostar muito delas o que acaba por limitar a minha escolha. Por exemplo, 
a sonata de Tedesco, é uma peça que gosto muito e que trabalho frequentemente com os meus alunos. 
Já a comecei a estudar 3‐4 vezes porque tinha evidentemente vontade mas de cada vez que a estudava 
perdia o interesse pela obra.  

Como  sou  alguém  bastante  ocupado  com  concertos  e  aulas,  preciso  de  uma  enorme  motivação  para 
encetar  o  estudo  de  uma  obra  nova.  Por  exemplo,  um  amigo  transcreveu  a  partita  de  Bach  (Tristan 
Manoukian – Partita nº2) e essa obra sim, tive uma grande vontade de estudar pois era algo que gostava 
mesmo muito. Uma peça que comecei por tocar e depois deixei, seja por achar que não era capaz de a 
tocar bem ou porque não tinha inspiração suficiente, foi a Introdução e Capricho de Regondi. Portanto, 
o mais importante agora é considerar que as obras valem realmente a pena.  

RGC – E foi esse o critério para o novo disco que irá sair brevemente editado pela Naxos?  

JP – Os dois discos anteriores a solo foram discos com programa tipo recital, diversas obras sem uma 
verdadeira ligação entre elas. O próximo disco, com obras de Bach, não surgiu com esse propósito de ter 
uma coerência temática porque é algo que já foi feito. Não reivindico o facto de tocar bem Bach, não 
tenho essa pretensão, aliás quando me pedem para falar da música de Bach sinto‐me completamente 
incapaz de o fazer. Mas, é uma música que sempre esteve comigo e sem me dar conta apercebo‐me que 
quando  tinha  16  anos,  bastante  isolado  a  nível  guitarrístico,  já  tocava  duas  suites  (uma  para  alaúde, 
outra para violoncelo e a Chaconne).  

A  vontade  de  tocar  a  música  de  Bach  esteve  portanto  sempre  presente  e  para  este  novo  disco,  esta 
escolha, muito pessoal, foi aceite pela Naxos especialmente graças à Partita nº2. A suite BWV 997 foi a 
primeira peça de Bach que estudei seriamente, aprendi‐a quando tinha 13 anos. Para este trabalho tive 
de  a  reaprender  após  um  hiato  de  mais  de  20  anos  e  evidentemente  surgiram  muitas  alterações  tal 
como  o  grau  de  exigência  e  trabalho  que  se  modificou  substancialmente.  É  sobretudo  um  projecto 
pessoal e tal fará com que toque bastante Bach, não sendo no entanto uma reivindicação, é obviamente 

Guitarra Clássica       
 
um dos grandes compositores de sempre e o prazer que retiro das suas obras é suficiente para justificar 
esta escolha.  

RGC  –  Em  outros  artigos  seus  menciona  frequentemente  a  música  de  Bach  e  a  problemática  que  dela 
surge. Nomeadamente o Prelúdio, Fuga & Allegro BWV 998.  
JP  –  Sim,  comecei  a  tocar  essa  obra  há  cerca  de  4  anos.  De  vez  em  quando  retiro‐a  do  repertório  e 
depois volto a tocá‐la e isso é algo que acontece com alguma frequência. Não sei porque tal acontece, 
pois tenho a sensação que a trabalhei bem e tenho a obra tecnicamente bem dominada. Há no entanto 
sempre algo que não me agrada e acho que esse é um problema que acontece com muitas pessoas, não 
apenas  em  Bach  mas  em  toda  a  música  (talvez  particularmente  evidente  em  Bach).  Há  um  equilíbrio 
hiper‐complicado entre o rigor e a vertente mais lírica e podemos sempre pensar na frase "tocar Bach 
como Chopin e Chopin como Bach" pois Chopin é um compositor muito clássico, longe da imagem ultra‐
romântica que temos actualmente.  

A música de Bach, por seu lado, tem muita sensualidade e penso que esse equilíbrio é realmente difícil 
de atingir. Convém dizer que estudei parcamente as disciplinas de análise e contraponto e a capacidade 
de  análise  que  possuo  surgiu  de  modo  instintivo.  Desenvolveu‐se  muito  com  a  audição  de  discos  e  a 
verdade  é  que  aprendemos  muito  de  análise  e  solfejo  ao  ouvir.  É  muito  difícil  fazer  a  ligação  entre 
aquilo  que  estudamos  e  o  que  tocamos  e  parece‐me  urgente  a  necessidade  de  criar  a  disciplina  de 
"estudos de interpretação". Por exemplo, analisar boas interpretações e ver quais os pontos que fazem 
com  que  gravação  X  ou  Y  se  destaque  das  outras.  Tal  permitiria  uma  ligação  entre  a  análise  e  a 
interpretação  e  é  algo  sobre  o  qual  tenho  vindo  a  pensar  recentemente  e  faço‐o  regularmente  com 
alunos, ouvindo diferentes versões da mesma obra. Em França, e em mais países, temos a análise de um 
lado e o instrumento de outro e estes dois nunca estão conectados e é frequente ver pessoas que são 
muito  boas  em  análise  e  que  quando  tocam  fazem  erros  típicos  de  pessoas  que  não  têm  uma  boa 
capacidade de análise.  

RGC  –  É  curioso  notar  como  existe  muitas  vezes  uma  sobrecarga  de  disciplinas  teóricas  sem  uma 
verdadeira aplicação prática na disciplina principal. 
 JP  –  É  um  facto.  E  consideremos  ainda  o  facto  de  muitas  vezes  os  guitarristas  trabalharem 
paralelamente  ao  curso,  todos  estes  elementos  que  "roubam"  tempo  são  flagrantes  sobretudo  nesta 
altura  em  que  surgem  guitarristas  muito  bons  cada  vez  mais  novos.  Tenho  alunos  que  tiveram  muito 
sucesso por volta dos seus 20 anos e por outro lado tenho outros alunos que são muito bons também 
mas  que  com  23‐24  anos  têm  a  impressão  de  já  estarem  completamente  ultrapassados  e  "velhos".  É 
algo  que  compreendo  mas  não  deixo  de  achar  absurdo  pois  quando  alguém  toca  bem,  simplesmente 
toca bem seja qual for a sua idade e aos 23‐24 anos temos uma vida inteira para continuar a evoluir. 
Contudo, estes alunos têm a impressão de estar atrasados porque com esta idade não ganharam o GFA 
por exemplo.  

É preciso notar que nem todas as pessoas que tocam bem vão ganhar este tipo de concurso e é por isso 
que é importante desenvolver outros caminhos. Para além disso, o facto de ganhar concursos ou fazer 

Guitarra Clássica       
 
conceertos não garaante que uma pessoa contin
nue a evoluir musicalmentee. Há imensass pessoas que fazem 
muito
os concertos p mos sempre a noção que algo dentro deelas já morreu
por ano e tem u. O essenciall passa 
por deesenvolver o interesse e a ssua maneira d
de se exprimirr através da m
música.  

RGC –– Dessa consta
ante procura d
de desenvolvimento surge o
o duo com Jérrémy Jouve? 

onheci Jérémyy quando ele  tinha 19 ano
JP – SSim, é muito  importante reeferir isso.  Co os e eu teria 2
25. Na 
alturaa  já  tocava  muitíssimo 
m m  e  tornámo‐nos  amigos  antes  de  term
bem mos  decidido  fazer  o  duo..  Certa 
alturaa  tive  vontade  de  fazer  música 
m de  câm
mara,  por  um
ma  necessidad
de  de  pesquiisa,  para  não
o  estar 
sempre a viajar sozzinho e por vo
ontade de parrtilha musical.. Evidentemen
nte, não é fáccil encontrar aalguém 
com  quem  nos  entendamos  e 
e que  simultaneamente  gostemos 
g com
mo  instrumen
ntista,  alguém
m  que 
estimule a criatividade musical m
mutuamente.  

E assim propus a Jérémy que fizzéssemos estee duo, algum  tempo antes de ele ganhaar o GFA. Ape
esar de 
eu serr mais velho, ele tinha basttante mais experiência que
e eu a nível daa música de cââmara, uma vez que 
tive apenas raras eexperiências n
neste campo.  Temos uma  maneira semeelhante de veer a música, m
mesmo 
se exiistem diferençças consideráveis entre nós, por exemplo o Jérémy, o
ouve imensos estilos de mú
úsica e 
ovisa  bem,  musicalmente  aberto  (fez  música 
impro m indianaa)  enquanto  eu,  faço  exclusivamente  música 
m
clássicca e ouço excclusivamente m ma decisão minha o facto d
música clássicca. Não foi um de ouvir apenaas este 
génerro musical, maas foi este gén
nero que me m
motivou e que
e presentemeente desperta interesse.  

Ao  níível  do  repeertório  a  solo


o  temos  tam
mbém  as  nosssas  diferençças,  Jérémy  ttem  um  pro
ograma 
actualmente dedicaado à música espanhola e aacaba de gravvar uma parte da integral de Rodrigo e Rodrigo 
é um  compositor q meus gostos e que não toco
que não se enquadra nos m o. Assim, somos muito dife
erentes 
em deeterminados aaspectos mass existe uma u
uniformidade  de opiniões ssobre a músicca e mesmo quando 
não teemos a mesm
ma opinião con
nseguimos sem
mpre compree
ender a escolh
ha do outro.  

RGC –– Quais são oss próximos pro
ojectos do vossso duo?  

 JP –  Existe o projeecto de gravar um disco co
om música de
e compositorees franceses.  Tristan Mano
oukian, 
que  fez  a  traanscrição  de  Bach,  transccreveu 
recentemen
nte  a  Suiite  Bergamasque. 
Teremos  César 
C Franckk  (francês  à 
à sua 
maneira…)  e uma transcrição de Rave
el. Será 
uma gravaçção que farem
mos para a Naxxos. 

Guita
arra Clássica     
 
RGC  –  A  sociologia  é  uma  das  suas  grandes  paixões.  Sente  que  a  situação  de  crise  económica  tem 
paralelo com uma crise cultural?  

JP  –  É  muito  difícil  comparar  as  histórias  das  diversas  culturas.  É  certo  que  há  cerca  de  uma/duas 
centenas de anos, a cultura pertencia a 0,1% da população. Existe actualmente o fenómeno da cultura 
de massa mas simultaneamente temos sempre tendência a pensar que no passado era bastante melhor. 
O que tenho a certeza é que quando dou aulas a alunos jovens, que estão a começar a estudar guitarra, 
parece‐me sempre milagroso como estes jovens de 10‐11 se interessam por música erudita uma vez que 
esta é muito pouco valorizada. É algo que me impressiona sempre, como se a necessidade de cultura do 
Homem, não pudesse ser apagada, independentemente da necessidade, da crise, do desemprego ou da 
necessidade de fazer mais dinheiro.  

Como disse, durante algum tempo imaginei a minha vida sem música, mas penso que a vida sem Arte, 
sem  cultura,  ficaria  desprovida  de  sentido.  Sobra  certamente  o  Amor  mas  falta‐lhe  uma  vertente 
espiritual  (e  não  sou  crente)  que  apenas  a  Arte  poderá  dar.  Acredito  que  a  mais  forte  espiritualidade 
reside na cultura e é algo vital. Se nos contentarmos meramente com comida, dormir e por aí fora, se 
perdermos a componente cultural da nossa existência não seremos diferentes dos animais. O Amor, é 
difícil saber o que é, existem definições complicadas mas muitos animais vivem em casal para sempre e 
isso acaba por ser amor também. Ao fim ao cabo, a Cultura é uma produção exclusivamente do Homem 
e é uma necessidade, infelizmente pouco valorizada no momento presente. 

RGC  –  Enquanto  professor  (e  um  dos  professores  mais  pretendidos  actualmente)  o  que  procura 
especificamente nos seus futuros alunos?  

JP  –  É  complicado  de  definir.  Tenho  a  sorte  de,  desde há 9‐10  anos,  ter  alunos  muito  bons  à  partida. 
Quer  isto  dizer  que  chegam  com  um  nível  já  muito  alto  o  que  como  é  evidente,  torna  mais  fácil  o 
trabalho futuro. Actualmente, tenho também a sorte de poder escolher e é um pouco difícil de dizer o 
que motiva a selecção. Mas, gosto que os valores que tenho na vida musical sejam semelhantes aos dos 
futuros alunos. Se um aluno quer apenas ser muito famoso e tocar coisas de um gosto duvidoso aí tenho 
a  certeza  de  não  querer  trabalhar  com  ele.  Procuro  alguém  que  seja  realmente  dedicado  à  Arte,  que 
tenha  necessidade  da  Música  para  se  exprimir,  que  tenha  necessidade  de  viver  a  Música  que  seja 
relativamente similar à minha.  

Depois deste período de aulas, cada um terá o seu próprio percurso e vejo isso nos alunos que tenho 
pois  todos  fazem  percursos  incrivelmente  diferentes,  e  dentro  desses  percursos,  vejo  que  a  minha 
influência é relativamente fraca o que é muito bom, pois o percurso deve pertencer exclusivamente às 
pessoas.  Poderão  ser  pessoas  com  objectivos  comuns:  melhorar  ou  trabalhar  determinados  aspectos 
mas no fundo ficarão sempre eles mesmos. 

RGC – E quais são aqueles que considera como os seus principais ensinamentos?  

Guitarra Clássica       
 
JP  –  Fico  muito  contente  se  sentir  que  os  alunos  são  felizes  enquanto  estão  a  fazer  música  ou  que 
eventualmente  vão  continuar  a  fazer  música  durante  muito  tempo,  sempre  com  esta  felicidade 
presente. Tal felicidade poderá tomar formas diferentes pois nem todos serão concertistas, como por 
exemplo  Gabriel  [Bianco]  ou Florian  [Larousse],  mas  se  todos  chegarem  a  esta  relação  positiva  com  a 
música,  seja  com  um  concerto  por  ano  ou  por  ser  um  professor  entusiasta  que  faz  com  que  os  seus 
alunos gostem de música, ou músicos de ensembles maiores. Em resumo, quando as pessoas estão vivas 
no que respeita a música, posso dizer que cumpri a minha missão quanto ao que deveria acrescentar à 
vida de cada um dos alunos. É preciso compreender que não tenho espaço para todos os alunos mas há 
espaço para que cada aluno encontre o seu caminho.  

Durante  um  curso  que  leccionei  inserido  num  festival  e  cursos  de  outros  instrumentos,  havia  muitos 
violinistas  entre  15  e  18  anos,  mais  novos  que  os  guitarristas,  que  queriam  estudar  exclusivamente 
concertos.  Durante  esse  curso,  foi‐lhes  pedido  que  fizessem  música  de  câmara  com  outros 
instrumentos,  algo  que  não  tinham  muita  vontade,  de  tal  modo  que  sabotaram  o  concerto  final  e 
tocaram mal de propósito. Apercebi‐me que dentro destes 300‐400 alunos que estudavam unicamente 
concertos, apenas um número restrito irá realmente tocar ao longo da sua vida estas obras e é pena que 
não desenvolvam outros aspectos para além deste. E é isso que gostava de expandir no trabalho com os 
meus alunos, que possam gostar de música de câmara, que possam gostar de ensinar, que possam estar 
vivos  com  a  Música.  Evidentemente,  sinto‐me  muito  feliz  com  o  facto  de  ensinar  e  sinto  que  há  uma 
comunicação e retorno maior durante as aulas do que por exemplo durante um concerto, onde toda a 
gente diz que foi muito bem no final, onde não é possível saber exactamente o que as pessoas pensam, 
que  é  algo  que  acho  meio  frustrante:  perceber  que  há  pessoas  que  gostam  dos  concertos  por  razões 
absurdas  como  tocar  rápido.  Durante  as  aulas  temos  a  noção  do  que  a  pessoa  ouviu  e  compreendeu 
pois houve um verdadeiro intercâmbio de comunicação. 

RGC – Como utilizador frequente das novas tecnologias de comunicação, quais as principais vantagens e 
desvantagens que destaca deste enorme mundo?  

JP – No campo da música, há imensas possibilidades. Se, eu fiz poucos concursos e nunca parti para o 
estrangeiro para estudar, tal se deve ao facto de na minha altura ser bastante mais complicado e caro 
viajar.  Nesse  sentido  é  de  invejar  a  comunicação  possível  actualmente,  comunicação  entre  alunos  e 
comunicação também possível com determinados professores. Tenho alunos de diversos países graças a 
este  poder  de  correspondência.  Do  mesmo  modo,  determinados  aspectos  mais  pueris,  como  por 
exemplo a questão do ataque à esquerda vs ataque à direita, desapareceram pois as pessoas viajaram 
muito e consequentemente evoluíram.  

Enquanto cada um estava isolado no seu canto ou país, referíamo‐nos a escolas de uma pessoa, "Escola 
Lagoya",  "Escola  Carlevaro",  "Escola  Ponce"  e  por  aí  fora.  A  partir  do  momento  em  que  viajamos 
apercebemo‐nos  que  há  coisas  interessantes  um  pouco  por  todo  o  lado  e  isso  foi  muito  positivo. 
Naturalmente, o verdadeiro problema coloca‐se na indústria discográfica, mesmo que tal não afecte do 
mesmo modo os músicos clássicos que não são os principais motivos de venda das editoras. Ao gravar 

Guitarra Clássica       
 
para a Naxos, fiquei muito contente naturalmente mas pensei que foi muito bom gravar para eles antes 
que  deixassem  de  fazer  discos.  Os  1500  discos  que  comprei,  perfazem  uma  bela  soma  mas  se  os 
comprasse actualmente seria muito mais barato. E este desconto dos preços é demonstrativo da perda 
de valores que damos à música. Comprei uma integral de piano, 100 discos por 90 euros, e cada disco é 
realmente  incrível.  É  fantástica  esta  possibilidade  mas  ao  mesmo  tempo  é  perigoso  pois  podemos 
pensar:  "Por  quê  comprar  um  disco  a  15  euros  quando  posso  comprar  100  a  um  euro  cada?"  A 
globalização faz com existam muitos guitarristas que estejam constantemente em tournée mas de igual 
modo  faz  com  que  muito  poucos  sejam  realmente  conhecidos,  não  só  em  guitarra  mas  em  todos  os 
instrumentos.  O  que  torna  impossível  que  exista  um  novo  Karajan,  Rostropovich,  etc,  pessoas  que  se 
tornam conhecidas apenas pela música.  

Actualmente,  existe  uma  razão  paralela  à  música  para  que  os  intérpretes  sejam  conhecidos.  Por 
exemplo,  Lang‐Lang  é  um  representante  do  novo  poderio  asiático,  Helène  Grimaud  apoia  os  lobos,  e 
cada  um  tem  algo  que  para  além  da  música  faz  com  que  tenha  destaque  através  do  media.  Antes 
existiam pessoas como Horowitz, Rubinstein, Rampal, Lagoya, que eram muito conhecidos unicamente 
por aquilo que faziam musicalmente.  

RGC – Mas é preciso considerar a força que o marketing tem…  

JP  –  Sem  dúvida  que  há  um  marketing  muito  forte.  Li  recentemente  uma  entrevista  de  uma  pianista 
chinesa que ganhou diversos concursos e nesta entrevista falou de Lang‐Lang e menciona como muitas 
histórias  em  torno  deste  pianista  não  correspondem  propriamente  à  verdade.  É  verdade  que  o 
marketing joga uma carta muito importante mas não deixo de o constatar sem sentir alguma pena. É 
óptimo  que  se  queira  dar  cultura  a  todas  as  pessoas  mas  observo  que  em  vez  de  levarmos,  ou 
levantarmos o nível cultural das pessoas, estamos constantemente a baixar o nível da cultura para que 
corresponda à média das pessoas.  

É  algo  que  não  posso  fazer  na  minha  vida.  Vivo  confortavelmente,  tenho  os  alunos  que  quero,  os 
concertos, portanto não tenho razões para me deixar controlar por um determinado marketing. Estou 
num  contexto  onde  uma  vez  que  não  morro  de  fome,  não  tenho  razões  para  fazer  coisas  que  não 
correspondem com a minha forma de ser. Naturalmente, é preciso pensar que nem todas as pessoas se 
encontram  nesta  situação,  que  cada  um  de  nós  tem  os  seus  próprios  motivos,  e  a  verdade  é  que 
infelizmente  pode  ser  muito  lucrativo.  Certas  pessoas  fazem  certas coisas  para  serem  conhecidas,  é  a 
sua escolha. Se vivemos correctamente não há grandes razões para criticar.  

RGC  –  No  entanto  a  escolha  que  uma  pessoa  faz  no  sentido  de  querer  mais  ou  menos  mediatismo  e 
exposição acaba por influenciar a sua maneira de pensar a música.  

Guitarra Clássica       
 
JP – Claro. Peensemos no m
músico erudito
o mais 
conhecido, 
c peenso  que  pod
demos  dizer  que 
q foi 
Pavarotti. Algguém que já eera muito conh
hecido 
como 
c cantor  de  ópera  ee  que  mais  para 
p a 
frente se torn
f nou ainda maiis conhecido aa fazer 
esses eventos
e s de nível fracco. Ele afirmavva que 
se divertia a f
s oncertos, portanto é 
fazer esses co
um 
u direito  seeu,  mas  se  no
os  perguntarm
mos  se 
este tipo de c
e concertos levaava mais gente
e a ver 

e ouvir  óperaa,  acabo  por  não  ter  a  cerrteza  e 
não 
n estou  co
onvencido  qu
ue  as  pessoaas  que 
compravam o
c os bilhetes paara ver "Pavarrotti  & 
bilhetes para  ópera. 
Friends" fosseem comprar b
Tal sucede igu
T m o violinista  André 
ualmente com
Rieu, 
R que  háá  uns  anos  atrás  foi,  so
ozinho, 
re
esponsável  po
or  20%  das  vendas  de  música 
m
eruditta em França.. As pessoas q
que compram
m estes 
discoss  não  vão  depois  ver  conccertos  ao  vivo
o  de  formaçõ
ões  eruditas.  Por  muito  qu
ue  se  diga  qu
ue  trás 
novoss  públicos  à  música 
m clássicca,  tal  não  é  verdade. 
v Que
em  trouxe  as  pessoas  à  música  foi  Bern
nstein, 
atravéés dos seus programas de ttelevisão, Gleenn Gould e outros grandess comunicado
ores. É preciso
o notar 
que m
muitas vezes o
o músico clásssico quer guarrdar qualquerr coisa de mággico à sua volta como se trratasse 
de  um
m  mundo  heermeticamente  fechado.  Estive  recen m  cruzeiro  ee  algumas  pessoas 
ntemente  num
disserram‐me  que  para  músico  clássico  era  muito  simpáático  e  achavva  isso  algo  iimpressionante.  Há 
portanto essa noçãão transmitida pela televisão de que o  músico clássicco é um génio, incompree
endido, 
torturrado, etc. etc. quando na reealidade são p
pessoas que têm talento e sensibilidade mas sobretud
do que 
trabalham e que accima de tudo  são pessoas n
normais. Mass muitos gostaam de transm
mitir esta imaggem de 
magiaa à semelhançça do que aco
ontece por exeemplo com oss cientistas: teemos sempre  presente a id
deia do 
cientista louco de ccabelos espetaados quando são sobretudo trabalhadorres incansáveiis. 

RGC –– Qual a sua im
mpressão sobre a vida mussical portuguesa?  

JP – D
Devo dizer qu muito mal apesar de ter visitado algumas vezes Portu
ue conheço m ugal. Como to
odas as 
pesso
oas,  conheço  a  pianista  Maaria  João  Pirees.  No  que  re
espeita  a  guitaarra,  é  um  po
ouco  mais  diffícil  de 
falar,  evidentemen
nte  conheço‐te  a  ti  e  tivee  a  possibilid
dade  de  conh
hecer  músico
os  portuguese
es  que 
estudaram em França. Recordo  que a primeiira vez que esstive em Portugal, no festival de Sernan
ncelhe, 
assisti a um concerrto de guitarra portuguesa  e este concerto teve muitto mais públicco que qualqu
uer um 
dos  outros 
o concerttos  de  guitarrra,  tinha  iguaalmente  um  público 
p bastante  mais  joveem  e  um  ambiente 
mais ccaloroso. Estaa relação próxxima com a m ular foi algo que me 
música de caráácter mais tradicional/popu
marco
ou bastante pois tem um accolhimento qu
ue não vemoss em todos os países.

Guita
arra Clássica     
 
Entrrevista a M
Miguel Carvalhinho

Por JJoão Henrriques 
Revistta  Guitarra  Clássica 
C –  Ca
aro  Miguel,  obrigado  po
or  ter  aceita
ado  o  nosso  convite.  Falle‐nos 
sobree o seu trajeccto como mú
úsico.  
Miguel  Carvaalhinho  ‐ Obrrigado  pelo co
onvite. 
Eu  comeceii  a  estudar  gguitarra  clássica  no 
Conservatório  de  Castelo
o  Branco  em  1983, 
em 1986 enttrei na classe  do professor Carlos 
Gouveia,  e  a 
a par  das  disciplinas  teóriccas  do 
curso,  fiz  o  exame  de  5
5º  grau.  Entre
etanto 
como  havia  uma  orquestra  de  cord
das  no 
Conservatório,  fizemos  o
o  concerto  em 
e Ré 
Maior de Vivvaldi sob a dirrecção do pro
ofessor 
António  dee  Oliveira  ee  Silva  e  com  a 
participação
o  da  profeessora  Luísaa  de 
Vasconcelos,  duas  personalidades 
importantes  no  meio  musical  porttuguês 
nomeadameente  na  área  da  música  baarroca. 
Simultaneam
mente  realizeei  a  licenciatu
ura  de 
professores  do  ensino  b
básico  varian
nte  de 
português 
p in
nglês  na  Esscola  Superio
or  de 
Educcação de Casttelo Branco.  

Frequ
uentei  ainda  cursos 
c de  Veerão  com  o  professor 
p José
é  Diniz.  Quan
ndo  conheci  o
o  professor  Alberto 
A
Poncee nos cursos d
do Estoril, em 1991, fiquei m
muito impressionado com a sua forma impar de ver m
música 
e partticularmente aa guitarra. Intterpelei‐o no ssentido de saber se poderiaa estudar em Paris com ele
e. Deu‐
me indicações sobrre o programaa que teria dee estudar e, no ano seguintte, em 1993, d
depois da ediçção do 
referido  curso,  fui  para  Paris  onde 
o entrei  no 
n Conservato
oire  d’Aubervvilliers  La  Cou
urneuve.  Doiss  anos 
depoiis fiz o exame do “Prix” e fiq
quei a fazer o “Perfectionnement” no mesmo conservvatório.  

Tenteei  ainda  entraar  no  “Conservatoire  Natio


onal  Supérieu ue  de  Paris”  mas,  depois  de  ter 
ur  de  Musiqu
chegaado à final, nãão fui aceite.  Frequentei então, durante
e dois anos, aa “École Norm
male de Musiq
que de 
Paris  – 6éme annéée” sempre co
om o professo
or Alberto Ponce. Regresseei a Portugal eem 1998 e de
esde aí 
que teenho trabalhaado em diverssas escolas. Há oito anos co
omecei a classse de Guitarraa na Escola Su
uperior 
de Arttes Aplicadas  do Instituto P
Politécnico dee Castelo Bran
nco, e desde eentão que reaalizei o Mestraado na 
Univeersidade da Esstremadura em
m Espanha on
nde concluí o D
Doutoramento no passado mês de Feverreiro. 

RGC –– Sendo docen
nte na Escola
a Superior de  Artes Aplicad
das do Institutto Politécnico de Castelo B
Branco, 
qual éé o seu parecer no que diz  respeito ao eensino e desempenho artísstico da guitarrra em Portug
gal e o 
que see poderia fazeer para melho
orar a qualidad
de destas dua
as vertentes? 

Guita
arra Clássica     
 
MC ‐  Penso que esste instrumen
nto tem uma  grande aceitaação no públiico em geral  devido talvezz à sua 
versattilidade. Assim
m, o número  de interessad
dos em aprender a tocar guitarra é conssiderável. Porr outro 
lado,  a  presença  na 
n Internet  da 
d guitarra,  quer 
q a  nível  de 
d partituras,,  quer  a  nível  de  prestaçõ
ões  no 
YouTu
ube  é  enormee.  Eu  costumo  dizer  que  nos  enta  noventa  do  século  paassado,  em  Castelo 
n anos  oite C
Brancco,  não  tocávvamos  o  quee  queríamos  mas  sim  as  partituras  qu
ue  apareciam
m  trazidas  que
er  por 
professores quer pela frequênciaa de alunos nos cursos que
e aconteciam.  

Juntando estes dois factores pen
nso que o dessafio para o prrofessor de Gu
uitarra Clássicca é importantte. Por 
um  laado  terá  que  adequar  o  programa  à  no
ova  realidade  que  é  ter  ob uase  todos  os  dias, 
bras  novas  qu
bastando  para  isso
o  consultar  a  internet.  Porr  outro  lado  ter 
t alunos  cad
da  vez  mais  iinformados  so
obre  o 
“mundo  global”  da 
d Guitarra  Clássica. 
C O  prrofessor  tem  que  ter  a  competência 
c para  aceitar  novas 
partituras,  e  ter  a  capacidade  de 
d as  executaar  à  primeira  vista,  ou  num  curto  espaaço  de  tempo
o,  para 
satisfaazer a curiosidade do alun
no em relação
o à obra. Teráá ainda que teer uma visão  bastante abe
erta do 
mund
do da guitarra para estar acctualizado em relação ao qu
ue se passa naa actualidade,, tendo a posttura de 
quem
m não sabe tud
do o que se paassa mas está interessado e
em saber…  

Em reelação ao desempenho artíístico penso q
que é bastantte melhor porrque há cada  vez mais alun
nos de 
nível  superior  em  Portugal.  A  oferta 
o das  insttituições  de  ensino 
e superio
or  tem  qualid
dade  e  a  oferrta  dos 
Conseervatórios  e  outras 
o Escolaas  de  Música  também.  De
epois  há  todaas  as  actividaades  como  fe
estivais 
organ
nizados com in
nstrumentistaas nacionais o nais ou cursoss, que vão accontecendo durante 
ou internacion
todo o
o ano. Esta dinâmica faz co
om que a Guittarra Clássica sseja um instru uma boa divulgação 
umento com u
e aceiitação.   

plementação  do  processo  de  Bolonha  nas  universidades 


RGC  –  Qual  é  a  sua  opinião  sobre  a  imp
portuguesas? Justiffica‐se esta m
mudança?  
 MC – O prrocesso de Bo
olonha, 
na  sua  essência,  é  muito 
positivo  p
pois  cria  umaa  rede 
europeia  de ensino sup
perior. 
Eu  vivi,  com  alguma 
a
amargura, o drama de  tentar 
que  reeconhecessem
m  as 
habilitaçõ
ões  obtidass  no 
estrangeirro  para  poder 
trabalhar  no  meu  paíss.  Com 
este  modelo
o  de  créditos  ECTS’s 
torna  tudo mais fáácil, a mobilidade deixa de  ter tanta burrocracia e crittérios menos  claros na avaaliação 
dos  diplomas. 
d Com
mo  aspecto  positivo 
p há  ain dade  que  se  torna  mais  aapetecível.  A  Escola 
nda  a  mobilid
Superrior  de  Artes  Aplicadas  reecebe  todos  anos  alunos  estrangeiros  e  vê  alunos  seus  partirem  por 
períod u  dois  semesttres  para  insttituições  estraangeiras  com  protocolo.  Esstes  alunos  quando 
dos  de  um  ou

Guita
arra Clássica     
 
voltam
m  à  sua  esco
ola  vêm  mais  ricos  com  ou
utras  experiê
ências  que  são
o  creditadas  no  seu  diplo
oma.  O 
aspeccto  que  me  parece  menos  positivo  é  a  redução
o  da  licenciattura  para  três  anos.  Parra  um 
instru
umentista  é  pouco 
p tempo  de  trabalho  a  nível  supe
erior.  No  enttanto,  se  enccararmos  a  po
ossível 
realizaação  de  um  mestrado,  qu
ue  será  inevitável  para  qu
uem  quiser  ingressar  no  ensino  ou  te
er  uma 
formaação  sólida  paara  fazer  carrreira  artística,  esse  tempo
o  passa  para  cinco 
c anos  e  não  três.  O  ensino 
superrior tem agoraa um desafio  importante q ecer mestrados com temas interessante
que será ofere es que 
m  os  alunos  a  continuar  na  escola  ou 
aliciem o atrair  outros,  detentorres  de  uma  licenciatura  noutra 
n
uição nacional ou estrangeira.  
institu

 RGC  –  Com  a  situ


uação  grave  que  Portugall  enfrenta  nesste  momento
o,  que  previsã
ão  faz  para  o 
o meio 
artístiico  portuguêss?  Serão  os  mecenas  e  as 
a privatizaçõ belecimentos  de  ensino  a  única 
ões  dos  estab
esperança para o m
meio artístico??  

MC  – 
– Em  tempos  de  crise  o  meio 
m o  sofre  sempre  muito  poiis  exerce  uma  actividade  que  é 
artístico
consid
derada supérfflua. Quando o cinto apertaa cortamos prrimeiro no supérfluo… Seria muito impo
ortante 
quem governa tivesse outraa visão: Consid
que q derar a música e a arte em geral como u
um bem de prrimeira 
necesssidade,  tão  importante  como  o  “pãão  para  a  boca”. 
b Todas  as  formas  de  organizaação  e 
financciamento das instituições d
dependeriam d
deste sinal qu
ue o governo q
quiser dar.    

RGC –– De que modo
o veria a asceensão de uma associação na
acional de guiitarra em Porttugal? 

ue já existe. Poderia 
MC –  Penso que seeria muito bem‐vinda uma associação que ajudasse àà dinâmica qu
ser um
m grupo impo
ortante para reeivindicar os d
direitos dos guitarristas e aao mesmo tem
mpo potenciarr todas 
as acttividades que se realizam a nível nacionaal.  

RGC  –  Durante 
D a  sua  formação  ccomo  músico
o  quais 
foram ass suas principa
ais influênciass musicais?  
A influências  são  tão  variadas  e  tantaas  que 
 MC  –  As 
enumeráá‐las será fastiidioso. Diria eem traços geraais que 
a  músicaa  barroca  mee  influenciou  e  foi  determinante 
no início do meu perccurso enquantto instrumenttista. É 
claro que
e me emocion
no com os lieeder de Schub
bert ou 
Schuman
nn ou com a ccomplexa estrrutura das ob
bras de 
Mahler  ou  M.M.Ponce  ou 
o com  as  propostas  inovaadoras 
da  Música  Contem nfluenciado  pela  Música  C
mporânea.  Deepois  a  outross  níveis  fui  in Country,  Blue  Grass, 
Rock,  Jazz  Rock  e  Jazz. 
J Neste  capítulo  surgeem  nomes  com
mo  Neil  Youn d  Mac,  Chick  Corea, 
ng,  Fleetwood
Williee Nelson, Petee Seeger, John
n Cougar Melleencamp, entrre outros. Maiis recentemen
nte, devido ao
o tema 
do meeu doutorameento e a projeectos que tenh
ho desenvolviido, redescobri a magia e o
o encanto da m
música 
portuguesa  de  raizz,  nomeadam
mente  a  músicca  de  tradição  oral  da  min
nha  região  e  o  fado.  Estass  duas 
influêências estiveraam sempre presentes mas ssó agora conssigo perceber a sua dimensãão.  

Guita
arra Clássica     
 
RGC –– Que conselho deixaria parra os futuros g
guitarristas po
ortugueses? 
PA – O
O conselho qu
ue deixo é que trabalhem m
muito. Só trab
balhando no liimite se abrem
m novas portaas e se 
m os degraus  para atingir o
sobem o seu melhor  nível. Depois  de se ter chegado ao máxiimo de si próp
prio se 
perceebe que há sem
mpre muito m
mais para atin o para a vida. Outro 
ngir, o que torrna a nossa arrte um desafio
conseelho que deixo
o é que se acrredite no trabalho de quem
m nos orienta. É essencial confiar no proffessor, 
onfiança  e  gaarantir  o  total  empenho  de 
só  asssim  se  pode  merecer  a  co d quem  trabalha  connoscco.  Por 
último nto  a  tudo  o  que  se  passsa  na  música  em  geral  e  na  guitarra  em  particular  para 
o,  estar  aten
desen mais exigentes connosco próprios e com  o que 
nvolver um saaudável espíritto crítico quee nos torne m
nos ro
odeia.  

RGC –– Que projecto ojectos para o futuro?  
os musicais levva a cabo nesste momento ee quais os proj
 MC  ––  O  meu  le
ema  é 
experiimentar  o  maior 
númerro de situaçõe
es que 
estão  ao  alcancce  da 
Guitarrra.  

Tenho  sempre  prep


parado 
um  repertório  para 
concerrto a solo, inccluindo 
compo
osições  pró
óprias. 
Depoiss  em  músicca  de 
câmara  tenho  um  prrojecto 
q
que  gravou  um  CD  o 
o ano 
passado,  o  Ninho,,  com  influên
ncias  da  música  de  tradiçção  oral  da  Beira 
B Baixa,  ee  que  continu
ua  em 
digresssão.  

Graveei  este  ano  co


om  a  Cantoraa  Cristina  Maria  e  o  mestrre  da  guitarraa  portuguesa  Custódio  Casstelo  o 
tema  “Melífico” no
o CD Percursu do, desde enttão, nos conceertos de apreesentação. Participo 
us participand
em  co
oncertos  com
m  Custódio  Caastelo  no  âm
mbito  do  CD  Tempus 
T e  em o  clarinetista  Pedro 
m  duo  com  o
Ladeirra.  

Estou também a traabalhar num duo com Pian
no para aprese
entar um repeertório variado que vai da m
música 
clássicca  até  ao  sééculo  XX.  Deepois  há  doiss  projectos,  que 
q estão  prreparados  paara  quando  houver 
h
solicittações, que sãão dois Quinttetos de Bocccherini com o  Quarteto Capela e o trio  com a violoncelista 
Mariaa José Falcão ee a cantora Maria Salazar.

RGC –– Caro Miguel, em nome d
da Revista Guiitarra Clássica
a, o nosso obrrigado pela su
ua disponibilid
dade e 
votos de muito suceesso.  

Guita
arra Clássica     
 
ESTRATÉGIAS DE ESTUDO UTILIZADAS POR DOIS GUITARRISTAS NA PREPARAÇÃO PARA A 
EXECUÇÃO MUSICAL DA ELEGY DE ALAN RAWSTHORNE.  

Marcos Vinícius Araújo 

RESUMO 

Através  da  análise  das  atividades  inseridas  nos processos  de  estudo  de  dois  experientes 
guitarristas professores universitários, o presente  trabalho investiga as estratégias de estudo 
utilizadas  na  preparação  da  execução  musical  da  Elegy  (1971)  de  Alan  Rawsthorne.  A 
construção  da  execução  musical,  quando  vista  como  atividade  de  solução  de  problemas 
(problem solving activity), através da utilização consciente de estratégias de estudo, pode ser 
otimizada em termos de qualidade e quantidade de estudo. A elaboração  do modelo analítico, 
a  partir  das  bases  teóricas  expostas  no  presente  trabalho,  permitiu  a  identificação  das 
estratégias  de  estudo  utilizadas  pelos  violonistas,  bem  como  o  enfoque  dado  por  cada  um  a 
essas. 

Palavras‐chaves: Execução musical – Estratégias de estudo – Elegy (1971). 

ABSTRACT 

By  analyzing  the  activities  included  in  the  study  processes  of  two  experienced  classical 
guitarist’s  academics,  this  paper  investigates  the  study  strategies  used  in  the  preparation  of 
the  musical  performance  of  Elegy  (1971)  by  Alan  Rawsthorne.  The  construction  of  musical 
performance,  when  viewed  as  an  activity  of  problem  solving  (problem  solving  activity), 
through  the  conscious  use  of  practice  strategies,  can  be  optimized  in  terms  of  quality  and 
quantity  of  study.  The  elaboration  of  the  analytical  model,  based  on  the  theoretical  basis 
outlined in this study, permitted the identification of practice strategies used by guitarists as 
well as the emphasis given by each of these. 

Key‐words: Musical performance – Practice strategies – Elegy (1971) 

INTRODUÇÃO 

Guitarra Clássica       
 
Com  o  intuito  de  melhor  compreender  o  processo  de  construção  da  execução  musical  e,  a 
partir  disso,  alimentar  os  processos  de  ensino  e  aprendizagem  de  outros  estudantes,  o 
conhecimento  tácito  no  aprender  a  executar  uma  obra  necessita  ser  explicitado.  Nesse 
contexto,  o  presente  artigo1  é  uma  investigação  das  estratégias  de  estudo  utilizadas  na 
preparação de uma obra nunca antes estudada por dois guitarristas. A obra selecionada foi a 
Elegy  (1971),  de  Alan  Rawsthorne.  Os  modelos  analíticos  construídos  à  luz  do  referencial 
teórico adotado permitiram a identificação, classificação e discussão das estratégias utilizadas, 
tentando  responder  as  seguintes  questões:  Como  os  guitarristas  relatam  seu  estudo?  Como 
eles  concebem  a  preparação  de  uma  obra  por  eles  nunca  antes  estudada?  Quais  são  as 
estratégias  de  estudo  utilizadas  na  preparação  de  uma  obra  desconhecida?  Qual  o  enfoque 
dado a cada estratégia?  

2  ESTRATÉGIAS DE ESTUDO 

Segundo  Gabrielsson,  o  planejamento  da  execução  instrumental  está  diretamente 


relacionado com “como formar representações mentais da música, testar planejamentos para 
a  execução  e  estratégias  para  o  estudo  eficiente”  (2003,  p.  236)  2.  As  estratégias  de  estudo, 
uma  das  temáticas  abordadas  pela  linha  de  pesquisa  do  planejamento  da  execução 
instrumental, constituem um caminho para se alcançar o nível de excelência instrumental que, 
durante  muito  tempo,  esteve  associado  a  um  dom  divino  ou  talento  nato  (SLOBODA,  2004). 
Autores  como  Hallan  (1995,  2001),  Jorgensen  (2004),  Chaffin  (2004)  e  Lemieux  (2004), 
mostraram  que  a  utilização  flexível  de  estratégias  de  estudo  é  uma  das  características  de 
músicos de excelência. 

Considerando a importância da temática das estratégias de estudo, sendo apontada como um 
fator decisivo para atingir um nível de excelência instrumental, a investigação das estratégias 
de  estudo  utilizadas  por  músicos  experientes  com  nível  profissional  pode  proporcionar 
caminhos mais seguros durante o estudo, sem que o tempo seja desperdiçado, por exemplo, 
com meras repetições exaustivas de alguns trechos problemáticos de uma obra. As pesquisas 
dentro  dessa  temática  também  podem  influenciar  positivamente  a  qualidade  do  ensino  do 
instrumento, visto que as estratégias de estudo “podem ser utilizadas como parâmetro para o 
ensino [...] por estarem baseadas na vivência e na experiência prática de especialistas (músicos 
profissionais, professores e pedagogos do instrumento)” (BARROS, 2008, p. 109).  
                                                            
1
 O presente artigo é parte da dissertação de mestrado intitulada “Estratégias de estudo utilizadas por 
dois violonistas na preparação para a execução musical da Elegy de Alan Rawsthorne” (Araújo, 2010) 
2
 “How to form mental representations of the music, devise performance plans and strategies for 
efficient practice” (Gabrielsson, 2003, p. 236). 

Guitarra Clássica       
 
No  presente  artigo,  estratégias  de  estudo  são  consideradas  como  “o  conjunto  de  táticas  e 
técnicas empregadas durante a prática do instrumento com o intuito de alcançar um objetivo 
específico”  (BARROS  2008,  p.  105).  Nielsen  esclarece  que  “uma  atividade  na  prática 
instrumental  só  pode  ser  considerada  como  estratégia  se  levar  a  alcançar  as  metas 
estabelecidas,  pois  as  estratégias  são  definidas  como  um  processo  intencional  e  direcionado 
para  atingir  determinado  objetivo”  (1999,  p.276).  Portanto,  foram  investigados  somente  os 
procedimentos diretamente relacionados com o objectivo do aprendizado da obra, através da 
análise  das  declarações  dos  guitarristas  a  cerca  das  próprias  actividades  realizadas  na 
construção  da  execução  musical,  identificando,  analisando  e  discutindo  as  estratégias  de 
estudo.  

METODOLOGIA DA PESQUISA 

3 PROCESSO DE COLETA E ANÁLISE DOS DADOS 

Adotei a técnica da entrevista semi‐estruturada, a qual utiliza perguntas pré‐concebidas como 
em uma entrevista estruturada. Entretanto, o entrevistador fica mais livre para aprofundar e 
ampliar  as  respostas,  proporcionando  um  maior  direcionamento  para  o  tema.  Esse  tipo  de 
procedimento  metodológico  faz  com  que  o  entrevistado  se  sinta  mais  à  vontade  para  falar, 
onde  respostas  espontâneas  podem  ser  decisivas  no  resultado  da  pesquisa,  trazendo  a 
perspectiva  do  entrevistado  em  relação  às  estratégias  de  estudo.  Este  tipo  de  entrevista 
também “colabora muito na investigação dos aspectos afetivos e valorativos dos informantes 
que determinam significados pessoais de suas atitudes e comportamentos” (BONI, 2005, p. 8). 
Assim, podem‐se obter informações profundas a respeito das práticas de estudo comumente 
empregadas  pelos  guitarristas.  Inicialmente  foram  colocadas  as  mesmas  perguntas  para  os 
sujeitos,  e,  a  partir  de  cada  resposta,  outras  questões  emergiram,  gerando  assim  outros 
questionamentos.  

A  utilização  dos  diários  de  estudo  serviu  para  complementar  as  informações  obtidas  na 
entrevista e em questionários, que também foram enviados via e‐mail. Neles foram indicados 
todos os procedimentos realizados durante o estudo da obra, bem como a duração e a data.  

Um roteiro concebido na fase inicial da pesquisa permitiu a abordagem de aspectos pontuais 
da  temática.  Esse  roteiro  tomou  por  base  os  tipos  de  estratégias  de  estudo  identificadas  no 
modelo  analítico.  A  seção  de  entrevista  foi  registrada  em  áudio,  e  os  diários  de  estudo 
enviados pelos guitarristas foram recebidos também através de e‐mail. 

Guitarra Clássica       
 
 

4 CONSTRUÇÃO DO MODELO ANALÍTICO 

As  estratégias  de  estudo  apresentadas  por  pesquisas  empíricas  nessa  temática  (HALLAM, 
1995a,  1995b,  1997a,  1997b;  JORGENSEN,  2004;  CHAFFIN  et  al.,  2002;  WILLIAMON  e 
VALENTINE  2002;  PROVOST,  1992)  foram  tomadas  como  modelo  analítico  para  a  condução 
desse  trabalho.  Elas  serviram  tanto  como  parâmetro  para  a  elaboração  dos  roteiros  que 
guiaram a sessão de entrevista e a formulação dos questionários, assim como para a coleta dos 

dados. As estratégias obtidas para o modelo analítico foram as seguintes: 

• Estudo através de repetições: caracterizado pela repetição de trechos selecionados 
ou da obra inteira durante o estudo. Existem evidências de que os músicos menos experientes 
adotam  essa  estratégia  de  uma  forma  pouco  reflexiva,  constantemente  tocando  a  obra  do 
início ao fim nas suas seções de estudo (HALLAM, 1997). As repetições, quando utilizadas com 
objetivos  claros  podem  ser  muito  úteis.  Elas  podem  contribuir,  por  exemplo,  para  a 
memorização de um trecho, para o aumento gradativo do andamento (com metrônomo), ou 
para a resolução de uma passagem difícil.  
• Estudo  através  de  seções  musicais:  é  caracterizado  pela  divisão  do  estudo  para 
trabalhar  trechos  curtos,  intercalando‐os  com  a  execução  de  partes  maiores.  Chaffin  et  al. 
(2002)  observaram  que  pianistas  profissionais  utilizam  o  estudo  de  seções  no  início  do 
processo de aprendizagem. Essas seções musicais podem ou não estar de acordo com a visão 
do compositor (JORGENSEN, 2004). Pesquisas igualmente indicam que quanto mais complexa 
a  obra  menores  são  as  seções  escolhidas  (CHAFFIN  et  al.,  2002,  WILLIAMON,  VALENTINE, 
2002).   
• Estudo  de  passagens  difíceis:  Jorgensen  (2004)  sugere  o  estudo  das  passagens 
difíceis de duas formas: utilizando exercícios e estudos musicais  que trabalhem determinado 
aspecto  técnico‐musical  problemático,  ou  o  estudo  das  partes  difíceis  repetidamente  e 
intensivamente até que a dificuldade seja vencida. Em contrapartida, Fernández (2000) propõe 
um conceito diferente para o termo “passagem”: 
 

O que é então uma passagem? Não deve de maneira alguma ser confundido 
com  um  mero  local  onde  habitualmente  ocorre  um  erro.  Esse  local  é 
necessariamente  parte  de  um  gesto  musical  mais  amplo,  é  parte  de  um 
contexto,  e  está  integrado  a  ele.  Nada  seria  mais  contraproducente  que 
estudar  somente  o  local  onde  o  erro  habitualmente  ocorre;  é  necessário 
estudar todo o gesto, pela razão elementar de que desejamos fazer música, 
e  a  única  maneira  de  aprender  a  fazê‐la  é  fazê‐la  em  cada  momento  de 
nossa aprendizagem (FERNÁNDEZ, 2000, p. 41). 

Guitarra Clássica       
 
 

A  idéia  de  vencer  uma  dificuldade  através  de  estudos  geralmente  não  funciona  quando 
colocamos  essa  dificuldade  em  seu  contexto  real.  Da  mesma  forma  que  Fernández  (2000), 
David  Russel  em  outras  palavras  aponta  a  importância  de  se  conferir  unidade  às  passagens 
difíceis: 

Se há uma passagem extremamente difícil, buscar produzir uma mensagem 
unitária. Não importa se não se toca todas as notas, o importante é dotá‐las 
de sentido, tocar com precisão rítmica e com consciência da direcionalidade 
(CONTRERAS, 1998, p. 4). 

• Estudo de mãos separadas: O estudo de mãos separadas é uma estratégia bastante 

utilizada  por  pianistas  de  nível  avançado  (CHAFFIN  et  al.,  2002).  Provost  (1992)  aponta  a 
necessidade de o violonista saber separadamente o dedilhado de mão direita e a digitação da 
mão  esquerda  para  a  memorização  de  um  trecho,  assim  como  para  otimizar  a  identificação 
dos  problemas  de  cunho  mecânico.  Essa  estratégia  pode  contribuir  ainda  para  um 
aperfeiçoamento na coordenação entre as mãos. Isso poderá ajudar no controle dos níveis de 
força empreendidos em cada mão em passagens complexas (por exemplo, trecho polifônico, 
em  dinâmica  forte,  e  andamento  elevado).  A  dinâmica  é  um  elemento  controlado  somente 
pela mão direita do guitarrista, e a dificuldade pode residir na aplicação de força excessiva na 
mão  esquerda,  causando  defeitos  na  mobilidade  e  precisão  necessária  para  a  resolução  do 
trecho.  Outro  aspecto  da  execução  musical  que  poderá  ser  resolvido  trata‐se  da  articulação. 
Melodias  com  execução  non‐legato  formam  um  exemplo  de  aplicação  dessa  estratégia  de 
estudo, onde somente o ato de pressionar e soltar as cordas com a mão esquerda já contribui 
para o dito efeito.  
• Estudo  em  andamentos  distintos:  Músicos  profissionais  se  utilizaram  dessa 
abordagem nos estudos de Hallan (1995) e Chaffin et al (2002). Consiste em estudar a obra ou 
trechos  aplicando  diferentes  andamentos  com  o  objetivo  principal  de  adquirir  fluência  na 
execução com o andamento final. Jorgensen (2004) aponta como estratégias: o estudo gradual 
do  andamento,  aumentando  o  andamento  aos  poucos;  o  estudo  alternado  dos  andamentos 
lento  e  rápido,  comentando  que  a  utilização  dessa  estratégia  pode  fazer  com  que  o 
andamento  final  seja  alcançado  em  menos  tempo;  e  o  estudo  no  andamento  final  desde  o 
início da aprendizagem. Sobre o estudo alternado de andamentos, BARROS acredita que  
 

[...] seja uma das estratégias que apresenta grande probabilidade de que a 
música  aprendida  também  assimile  um  número  maior  de  falhas cometidas 
durante a execução [...], pois nas fases iniciais do processo de aprendizagem 

Guitarra Clássica       
 
o  músico 
m ainda  não  dominou
u  todos  os  desafios 
d enco
ontrados  na  música 
m
(BARRROS, 2008, p
p. 162).  

• Estudo  com  metrô


ônomo:  Com
mumente  utilizado  paraa  aumentar  o  andamen
nto,  o 
ônomo  se  to
metrô orna  um  ótiimo  aliado  após 
a o  intérprete  ter  do do  o  conteúdo  da 
ominado  tod
obra  (ritmos,  diggitações,  deedilhados,  articulação,  etc.). 
e O  insttrumentista  vai  aumentando 
gradaativamente o
os andamenttos nas seçõees de estudo
o, até chegarr ao tempo final.  
• Estudo  de  digitaçõe dilhados:  A  digitação  dee  uma  obra  violonística  é  um 
es  e/ou  ded
fator  decisivo  naa  interpretaçção.  Isso  po
orque  a  possibilidade  dee  se  tocar  u
uma  mesmaa  nota 
(mesma  altura)  em  pelo  menos  quaatro  posiçõe
es  distintas  da  escala  gera  diferrentes 
possibilidades  paara  uma  messma  passageem  (execução  com  mais  legato,  articulações  disstintas 
para  diferentes vvozes no caso de uma ob
bra polifônicca, variação  do timbre, eetc.). O exem
mplo a 
m mesmo fraggmento. 3 
seguiir ilustra duas possibilidaades para um

Exemplo 1 – Duas
D possibilid
dades para a ex
xecução da meesma passagem
m

A  partir  desse  pequeno 


p exeemplo,  ondee  foram  mostradas  som
mente  duas  possibilidades  de 
digitaação  (existem
m  outras),  podemos, 
p m
mesmo  sem  tocá‐lo,  já  prever 
p a  difeerença  de  timbre 
entree  as  duas,  já  que  a  seggunda  digitaação  é  realizada  somen
nte  sobre  a  quarta  cord
da  do 
instru
umento. Essaa corda, assim como a q exta, possui  material diferente das o
quinta e a se outras 
três  que 
q são  de  náilon  e,  po
ortanto,  prop
porciona  um
ma  sonoridad
de  distinta.  Nesse  trabalho,  o 
termo
o “digitação”” designa a u
utilização do
os dedos da  mão esquerda (1, 2, 3 e 4), e “dedilhado” 
os deedos da mão direita (poleegar, indicador, médio e anular).   

A  esccolha  da  diggitação  está  relacionada  a  diversos  fatores,  enttre  os  quais  se  encontraam  “a 
dificu
uldade técnicca da obra,  as caracteríssticas individ
duais (anatom
mia das mão
os, nível técn
nico e 
sonoridade  do  in
nstrumento),,  estilo  da  obra 
o erpretação  (ffraseado,  arrticulação,  timbre, 
e  a  inte

                                                            
3
 Os n
números repreesentam os deedos da mão eesquerda, e os que estão ciirculados as cordas em que
e se 
devem
m tocar as nottas. 

Guita
arra Clássica     
 
etc.)”  (WOLFF,  2001).  Importantes  violonistas  e  professores  discorreram  sobre  a  estreita 
relação  entre  a  digitação  e  os  dois  últimos  fatores.  Eduardo  Fernandez  (2000),  por  exemplo, 
menciona que:       

É  necessário  que  a  busca  de  uma  digitação  seja  extremamente  rigorosa  e, 
que  tenhamos  a  paciência  de  buscar  todas  as  variáveis  imagináveis,  tendo 
sempre  em  conta  a  relação  inseparável  entre  a  digitação  e  o  resultado 
musical.  [...]  digitar  é  já  interpretar,  não  é simplesmente  buscar  a  maneira 
mais fácil de tocar as notas. [...] [...] [caso contrário] nossas idéias musicais 
correm  o  risco  de  ficar  afogadas  dentro  de  um  modo  de  digitação 
estabelecido quase que ao acaso (FERNANDEZ, 2000, p.15).  

A  busca  de  todas  as  variáveis  imagináveis  é  salientada  por  Fernandez  (2000)  como  o 
procedimento ideal para então podermos escolher a digitação que mais estará de acordo com 
as  características  de  determinada  peça  musical.  No  entanto,  vale‐se  lembrar  de  que  nem 
sempre  existirão  muitas  variáveis,  pois  “passagens  tecnicamente  complexas  como,  por 
exemplo, trechos contrapontísticos a várias vozes oferecem freqüentemente não mais do que 
uma ou duas opções de digitação” (WOLFF, 2001, p.1).  

David Russel (1998) igualmente aconselha realizar a digitação de uma obra “buscando sempre 
a fluidez no fraseado. Deve‐se tocar a frase em questão por partes, e ver onde se pode cortar o 
som e onde não se pode, para estabelecer a digitação mais adequada” (CONTRERAS, 1998, p. 
4). No contexto pianístico, Barros adiciona:  

A  escolha  do  dedilhado  é  fundamental,  pois  é  mais  difícil  recondicionar  a 


mente  a  um  novo  dedilhado  que  aprendê‐lo  no  início  do  processo  de 
estudo. Assim, pianistas experientes geralmente fazem suas decisões sobre 
o  dedilhado  considerando  a  antecipação  das  decisões  interpretativas,  a 
facilitação  do  trabalho  técnico,  o  conforto  da  execução,  além  de  suas 
características físicas, como o tamanho da mão e dos dedos (BARROS, 2008. 
p. 169). 

A  escolha  das  digitações  e  dedilhados  deve,  segundo  instrumentistas  experientes,  estar 


relacionada com as intenções interpretativas, que, desde os estágios iniciais de aprendizado de 
uma obra, devem ser antecipadas.   

.  Estudo  mental:  “Visualização”  foi  o  nome  dado  por  Leimer  (1932)  ao  processo  de 
estudo  visual  da  obra  musical  e  da  mentalização  da  execução,  apenas  imaginando  como  a 
música irá soar e como será a sensação física ao tocar somente olhando a partitura. Assim, o 
estudo mental é realizado sem o instrumento. É caracterizado pela imaginação do ato de tocar 
o instrumento, audição interna das próprias intenções interpretativas, ou até mesmo por um 
ensaio  imaginário  dos  movimentos  do  corpo  empregados  numa  performance.  Jorgensen 

Guitarra Clássica       
 
(2004) salienta que “não há execução sem atividade cognitiva, significando que a performance 
é inevitavelmente uma combinação entre esforço mental e físico”.  

•  Estudo de técnica pura e atividades de aquecimento: Penso que a execução musical 
transcende  os  aspectos  motores,  mas  ainda  assim  depende  desses  para  concretizá‐la.  O 
estudo da técnica pura é caracterizado pela utilização de exercícios, tais como arpejos, escalas, 
ligados  de  mão  esquerda,  traslados,  exercícios  com  dedos  fixos,  etc.  Jorgensen  (2004) 
recomenda  que  antes  de  utilizar  esses  tipos  de  exercícios  como  aquecimento,  o  músico 
deveria se questionar a finalidade da utilização de determinado exercício, e se existem outros 
exercícios  mais  apropriados  para  determinada  situação  particular.  Ele  ainda  ressalta  que  os 
exercícios  podem  trazer  benefícios,  mas  precisam  ter  foco  direcionado  e  ser  empregados 
somente  se  contribuírem  para  solucionar  dificuldades  técnico‐musicais  de  um  determinado 
repertório.  Ainda  que  Provost  tenha  afirmado  que  “os  maiores  concertistas  demandam  bem 
pouco  tempo  para  o  estudo  da  técnica”  (1992,  p.53),  não  foram  encontrados  estudos 
relevantes acerca da eficácia dessa prática, apesar de David Russel recomendar simplesmente 
ser “necessário dedicar uma parte do dia à técnica” (CONTRERAS, 1998, p. 3).  
• Memorização:  A  memorização  foi  o  primeiro  elemento  da  construção  da  execução 
musical a ser pesquisado, no início do século XX. Os estudos já citados da psicóloga americana 
Grace  Rubin‐Rabson  confirmaram  os  resultados  provindos  da  pesquisa  pioneira  de  Sandor 
Kovacs,  entre  eles,  “que  a  memorização  é  melhor  quando  um  pré‐estudo  analítico  é 
empreendido antes do estudo; quando a prática é distribuída ao longo do tempo; quando as 
mãos  são  aprendidas  separadamente;  quando  algum  ensaio  mental  ocorre  no  desenrolar  da 
agenda de prática e quando a obra é aprendida em seções curtas” (SANTIAGO, 2001, p. 173). 
Pesquisas  posteriores  ampliaram  as  informações,  e  os  estudos  de  Hallam  (1995,  1997a, 
1997b),  Jorgensen  (2004),  e  Chaffin  et  al.  (2002)  revelaram  que  tanto  músicos  profissionais 
quanto iniciantes memorizaram as obras através de processos automatizados, visualizando as 
notas, baseando‐se na memória auditiva da música, ou através da memória motora cinestésica 
(associada  ao  movimento).  Além  disso,  os  músicos  profissionais  também  utilizaram  alguma 
análise da estrutura da música para ajudar nesse processo (WILLIAMON e VALENTINE, 2002). 
Há indícios de que o tempo atribuído para a memorização está relacionado com a experiência 
do intérprete com o estilo de determinada obra.   
• Fixação de metas e objetivos: metas são necessárias para se alcançar o aprendizado 
e  desenvolvimento.  Essas  podem  estar  relacionadas  com  os  mais  diversos  aspectos  da 
interpretação  e  execução  musical.  Jorgensen  (2004)  recomenda  incluir  as  intenções 
expressivas nos objetivos para as sessões de prática, salientando que essas “são imbuídas de 
mais  ou  menos  idéias  musicais  conscientes  ou  mensagens  comunicativas  a  serem 

Guitarra Clássica       
 
desenvolvidas  e  incorporadas  na  performance”4(2004,  p.89).  O  autor  menciona  que  alguns 
instrumentistas  deixam  suas  intenções  expressivas  serem  guiadas  pelo  trabalho  técnico.  Já 
Nielsen (2001) encontrou o desenvolvimento de um plano de performance, através da fixação 
dos  objetivos  somente  após  o  domínio  das  dificuldades  técnicas  da  obra.  Embora  existam 
várias situações para a formulação de metas e objetivos, a utilização dessas vai depender das 
características  de  cada  músico,  bem  como  da  natureza  da  obra.  Jorgensen  deixa  uma 
recomendação geral: “no início da sessão, formular algumas de suas intenções gerais com essa 
sessão  (quaisquer  que  sejam  elas)  o  mais  claro  e  preciso  possível.  O  que  você  quer 
especificamente desenvolver ou dominar?” 5(2004, p.89) 
• Estudo  através  de  gravações  da  própria  execução:  Concordando  com  Juslin,  o 
registro da própria gravação poderá informar com precisão se as intenções expressivas estão 
ou  não  sendo  realizadas  pelo  executante  (WILLIAMON,  2004,  p.249).  Jorgensen  (2004)  ao 
sugerir entender como os movimentos corporais podem influenciar a percepção da audiência 
durante  uma  apresentação  confirma  a  utilidade  da  estratégia  da  gravação  da  própria 
execução.  Daniel    adiciona  que  “além  da  auto‐avaliação,  o  aluno  poderá  obter  uma  maior 
independência, visto que ele geralmente precisa dos comentários do professor para avaliar seu 
desenvolvimento musical” (2001, p.96).  
• Estratégias  para  motivação  para  o  estudo:  Segundo  Provost  (1992),  algumas  ações 

podem contribuir para o aumento da motivação para o estudo. São elas: exercícios brandos, 
podendo  ser  através  de  uma  corrida  no  parque,  uma  leve  caminhada,  alongamentos  ou 
qualquer  outro  tipo  de  exercício  que  aumente  o  fluxo  sanguíneo;  ouvir  uma  gravação  do 
artista  favorito  ou  uma  peça  que  se  está  aprendendo,  como  inspiração  e  motivação  para  a 
prática;  e  ainda  deixar  o  estojo  do  violão  aberto,  explicando  que  o  problema  sempre  é 
começar. Para o autor, o estojo aberto pode funcionar como um forte convite para a prática. 
Praticar é estar energizando. Não precisar abrir o estojo para estudar pode ser uma motivação. 
• Estratégias  para  preparação  de  uma  apresentação:  Uma  apresentação  musical 
comumente envolve preocupações com os mais diversos erros. Esses podem ser, por exemplo, 
lapsos  de  memória,  ansiedade  e  nervosismo.  Jorgensen  sugere  considerar  a  perspectiva  do 
público durante a prática como estratégia. O autor explica:  
Instrumentistas  experientes  têm  colocado  que  levam  em  consideração  a 
perspectiva  do  público  quando  desenvolvem  suas  idéias  expressivas,  e 
trabalham deliberadamente na comunicação de idéias musicais nos estágios 

                                                            
4
 Which is comprised of more or less conscious musical ideas or communicative messages to be 
developed and incorporated into performance.  
5
At  the  beginning  of  a  session,  formulate  some  of  your  overall  intentions  for  the  practice  session 
(whatever these may be) as clearly and precisely as possible. What do you specifically want to develop? 

Guitarra Clássica       
 
finais  de  estudo  de  uma  peça.  Muitos  têm  igualmente  reportado  que 
imaginam  como  o  público  poderá  perceber  a  performance  numa  grande 
diversidade de ambientes acústicos (2004 p.95)6 

A  partir  das  informações  acima,  o  autor  trouxe  as  seguintes  estratégias:  trabalhar 
deliberadamente sobre a comunicação de idéias musicais nos estágios finais da aprendizagem, 
sendo  que  as  intenções  expressivas  devem  ser  analisadas  e  trabalhadas  desde  os  estágios 
iniciais de estudo; e estudar e ensaiar o comportamento de palco, tentando entender como os 
movimentos  do  corpo  influenciam  na  percepção  do  ouvinte  durante  uma  apresentação 
pública. O autor sugere que os movimentos corporais estejam de acordo com as intenções da 
mensagem musical.  

• Análise  da  estrutura  da  obra  musical:  Jorgensen  (2004,  p.  92)  apresenta  a  análise 

detalhada  da  partitura  como  estratégia  para  a  prevenção  de  erros.  A  análise  da  partitura, 
estando  ela  ou  não  provinda  de  teorias  formais,  pode  proporcionar  algumas  ferramentas  ao 
instrumentista para a identificação de aspectos importantes da música, muitas vezes, difíceis 
de serem encontrados auditivamente ou numa análise superficial. 
 

A  análise  das  estratégias  de  estudo  utilizadas  pelos  sujeitos  foi  realizada  em  duas  etapas:  a 
identificação,  classificação  e  a  discussão.  A  identificação  foi  realizada  a  partir  do  cruzamento 
dos  dados  provindos  dos  diários  de  estudo,  além  da  entrevista  com  o  modelo  analítico.  Isso 
proporcionou  as  informações  necessárias  para  a  identificação  das  estratégias  e  a  posterior 
classificação.    Na  segunda  etapa,  foi  realizada  uma  discussão  a  cerca  da  utilização  dessas 
estratégias  por  parte  dos  violonistas,  sendo  salientadas  as  ações  mais  significativas  na 
preparação da obra. O processo de análise das estratégias utilizadas encontra‐se no seguinte 
diagrama: 

                                                                                  

 
ENTREVISTA 
IDENTIFICAÇÃO/ 
MODELO 
ANALÍTICO  CLASSIFICAÇÃO 
DIÁRIOS DE 
 
ESTUDO  DAS ESTRATÉGIAS

                                                            
6
  Experienced  performers  have  reported  taking  the  audience’s  perspective  into  account  when 
developing their expressive ideas and working deliberately on the communication of musical ideas in the 
final stages of practice on a piece. Many have also reported imagining how the audience will perceive 
the performance in a range of different acoustical environments.  

Guitarra Clássica       
 
 

  DISCUSSÃO 

Figura 1 - Processo de análise das estratégias de estudo utilizadas.


 

5  A OBRA ESTUDADA: Elegy (1971), de Alan Rawsthorne 

O  compositor  Alan  Rawsthorne  nasceu  em  Lancashire,  Inglaterra,  no  ano  1905.  Iniciou  seus 
estudos na Royal Manchester School of Music em 1925, onde teve classes de composição com 
o Dr. Thomas Keighley, violoncello com Carl Fuchs, e piano com Frank Merrick. Os estudos ao 
piano  intensificaram‐se  quando  Rawsthorne  iniciou  na  classe  do  pianista  alemão  Egon  Petri, 
com  o  qual  estuda  até  o  ano  1929.  Após  o  retorno para  a  Inglaterra  em  1932,  ele  assume  o 
posto  de  professor  no  Dartington  Hall  School  of  Dance  and  Mime,  diga‐se  de  passagem,  o 
único  posto  permanente  ocupado.  Ele  deixa  a  cidade  de  Dartington  em  1934,  fixando 
residência em Londres a partir de então.  

Seu reconhecimento como compositor ocorreu a partir dos trinta e três anos. A primeira obra 
a  receber  algum  tipo  de  reconhecimento  foi  “Theme  and  variation  for  two  violins”,  e  a 
primeira  performance  de  seus  Symphonic  Studies  na  International  Society  of  Contemporary 
Music,  evento  realizado  em  Varsóvia,  Polônia  também  constitui  um  marco  inicial  de  sua 
carreira.  A  partir  daí,  ele  passa  a  receber  várias  encomendas  de  obras,  escrevendo  diversos 
arranjos.  Outras  obras  de  destaque  são  o  Concerto  para  Piano  n.2,  talvez  sua  obra  mais 
conhecida, o Concerto para Violoncelo, comissionado pela Royal Philarmonic Society, e “Street 
Corner  Overture”  (1944).  Entre  seus  trabalhos,  destacaram‐se  sinfonias,  concertos  para 
instrumentos  de  sopro,  música  de  câmara  e  obras  corais,  além  de  vinte  e  seis  trilhas  para 
filmes.  

Em 1971, ano de sua morte, Alan Rawsthorne deu  início ao que vem a ser a sua única peça 
para guitarra, a Elegy, editada em 1975, e finalizada pelo violonista britânico Julian Bream. A 
obra possui uma macro‐forma ternária (A B A’), sendo as três partes baseadas na mesma série 
dodecafônica original:  

Guitarra Clássica       
 
 

Exxemplo 2 – Eleggy, c.1 – c.6. Séérie dodecafôn


nica

Atravvés da perceepção do ritm
mo, contorno
o melódico e
e das ligaduras longas, p
percebe‐se aa série 
dividaa em três en
ntidades rítm
mico‐melódicaas distintas, aqui chamad
das motivos A, B e C.  

Exemp
plo 3 - Elegy, Motivo
M A

Cham
mo  a  atenção
o  para  o  deeslocamento  da  nota  fá  bequadro  (c.2, 
( 4º  tempo,  Ex.  2)  para 
p o 
motivvo  A,  já  quee  podemos  perceber  qu
ue  essa  notaa  pertence  ao  motivo  B
B.  Sendo  issso  um 
proceedimento reccorrente em
m obras seriaiis inglesas de
essa época, o
o motivo B n
na frase apre
esenta 
a  notta  fá  bequad
dro  como  um
ma  anacrusee  que  preparra  esse  motiivo,  indicado
o  pela  ligadu
ura  de 
frase. Já o motivo
o gerador (m
motto) A, com a nota fá  bequadro in
nserida, pod
de ser identifficado 
atravvés da contin
nuação da an
nálise.  

Exemplo 4 – Elegy, Motivo


M B

Exemplo 5 – Elegy, Motivo


M C

Guita
arra Clássica     
 
 A primeira partee da obra esttá subdividaa em três pequenas seçõ
ões menoress: “Andante  molto 
serioso” (c.1 – 23
3), “Pochiss.  più mosso”  (c. 24 – 31), e o “Ancorra più mosso
o” (c. 33 – 54
4). No 
“Andante  molto  serioso”,  a  série  dodecafônica  (Exxemplo  2)  é 
é apresentad
da  três  veze
es  em 
o  (c.7  –  10),  os  motivos  A e  B 
seqüêência  com  trratamentos  distintos.  Naa  primeira  apresentação
apareecem em um
ma textura p
polifônica a ttrês e duas vvozes respecctivamente,  com a ordem
m dos 
intervvalos modificados, e com
m ritmos distintos em re
elação à apreesentação orriginal. No m
motivo 
B,  a  última  nota  é  modificad
da  (Sol  ao  in
nvés  de  Ré  bequadro). 
b M
Mesmo  assim,  o  intervaalo  de 
semittom descend
dente entre  as notas lá b
bemol e sol ssustentam aa sensação original flutuaante e 
não  conclusiva  do 
d motivo.  A 
A mesma  nota  sol  é  trransportada  para  a  vozz  inferior,  on
nde  é 
apressentado o motivo C, iguaalmente mod
dificado e orn
namentado:

Exemplo 6 - Elegy,
E Motivo A modificado

Exemplo 7 – Elegy, Motivo B modificado

E
Exemplo 8 - Elegy
E Motivo C na voz inferioor

Na  seegunda  apreesentação  daa  série,  entrre  os  c.11  e  c.14,  o  mottivo  A  aparece  com  o  mesmo 
m
conto
orno  melódico  do  que  na  apariçãão  anterior  (c.7),  porém
m,  uma  quaarta  justa  acima, 
a
acom
mpanhada  po
or  acordes,  e  nserção  das  duas  primeiras  notas  do  e  si,  com  ritmo 
e com  a  rein
mais  curto na rep
petição desssas. Os motivvos B e C se
e apresentam
m uma quartta justa acim
ma em 
relaçãão à apresen
ntação origin
nal.  

Guita
arra Clássica     
 
 

Exemplo 9 - Elegy Motivo A transposto

Exemplo 10 - Elegy Motivo


M B

 
Exemplo 11 - Elegy Motivo
M C

Entree os compasssos 15 e 19,  a série aparece pela últiima vez com
mpleta nessa  seção musiccal. Os 
motivvos A e B são apresentados como no original, co
om modificaações irrelevvantes no disscurso 
(apen
nas  uma  bordadura  infeerior  no  motivo  A  e  aco
ordes  de  co
olorido  tímbrrico  entre  os  três 
motivvos).  A  senssação  de  reepouso  ao  fiim  da  apressentação  daa  série  é  proporcionadaa  pela 
alteraação do mottivo C, começçando pela n
nota si. Saliento a mudan
nça de registtro da últimaa nota 
sol su
ustenido, reaalizada oitavaa acima:  

Exemplo 12 - Elegy Motivo


M C

hiss. Più Mosso”: O trataamento maiss livre dado  à série nessa seção mussical, em con
“Poch njunto 
com  a  escrita  em  ritmos  irrregulares  alternados,  produzem 
p em
m  conjunto  uma  espéccie  de 
indeccisão. Os mo
otivos apareccem intercalaados com diversos mateeriais melódicos evocativvos da 
série,, através da mistura de fragmentos d
dos intervalo
os constituinttes. A série, portanto, ap
parece 
modificada  atravvés  da  expan
nsão,  com  rittmo  aumenttado.  As  nottas  do  motivvo  A  aparece
em  na 
em veermelho, as de B em azu
ul, e C em am
marelo: 

Guita
arra Clássica     
 
 

Exemplo 13 - Elegy Pochiss. Più Mosso. Motivos A, B e C

“Ancora Più Mosso”: As sensações de angústia e incerteza, ou de algo que ainda está longe de 
acabar, são expressas através de afastamentos da série original nessa seção, além da própria 
indicação  do  andamento  (sempre  acelerando).  Percebem‐se  apenas  fragmentos  dos  motivos 
da série distribuídos até o compasso 47, modificados melodicamente e ritmicamente (ex. 14 e 
15). 

Exemplo 14 - Elegy Motivos A (vermelho) e B (azul)

A  partir  do  compasso  47,  a  série  é  apresentada  com  a  mesma  textura  polifônica  da  seção 
musical  do  Pochíss.  Piú  Mosso  (Ex.  14).  Chamo  a  atenção  para  a  dificuldade  desse  trecho, 
sendo ele um ponto relevante de aplicação de estratégias de estudo. Uma possibilidade seria o 
motivo  A  aumentado  (c.  47  –  50)  ser  salientado  em  termos  de  intensidade  ou  timbre,  em 
relação  às  outras  notas.  Ainda  que  a  própria  escrita  já  se  incline  para  essa  percepção,  o 
violonista deverá ter um cuidado para que as notas graves desse motivo não sejam executadas 
com indiferença, justamente por elas formarem um dos motivos geradores (motto):  

Guitarra Clássica       
 
 

Exemplo 15 – Elegy Motivos A (vermelho), B (azul) e C (amarelo) em diversas aparições.

As  estratégias  de  estudo  por  mim  aplicadas  para  esse  trecho  foram  o  estudo  de  dinâmicas 
distintas  para  as  notas  do  motivo  gerador  A  aumentado,  estudo  de  timbres  distintos,  e  o 
estudo através da execução separada das vozes, algumas vezes cantando o motivo A e tocando 
as vozes superiores, e vice‐versa.  

“Allegro  di  bravura  e  rubato”:  essa  longa  seção  musical  é  motórica,  dotada  de  poucas 
respirações,  num  movimento  fluído  de  semicolcheias.  Esse  trecho  apresenta  dificuldades 
técnico‐motoras  em  virtude  da  articulação  proposta  na  edição,  dotada  de  ligados,  em 
andamento  rápido,  sendo  uma  possível  fonte  de  aplicação  de  determinadas  estratégias  de 
estudo. Quando estudei essa seção, um dos critérios estilísticos que adotei para executá‐la foi 
não modificar as articulações contidas na edição, e as estratégias de estudo que utilizei foram: 
o estudo da técnica de ligados, preferencialmente em momentos do dia em que não estivesse 
estudando a obra. O estudo através de repetições também foi utilizado, onde pequenas frases 
eram repetidas até o completo domínio dessas. Nos primeiros momentos, as repetições foram 
realizadas com o objetivo de não cometer erros técnicos, procurando uma execução musical 
clara.  Posteriormente,  as  repetições  foram  necessárias  para  tentar  atingir  o  meu  ideal  de 
caráter  para  determinados  trechos,  sendo  a  dinâmica,  expressão,  timbres  e  rubato  os 
principais elementos norteadores. Também utilizei a estratégia do estudo invertido de seções 
musicais,  iniciando  a  prática  muitas  vezes  pelos  últimos  compassos  da  referida  seção.  Isso 
contribuiu  para  uma  memorização  homogênea  de  toda  a  parte,  evitando  que  os  primeiros 
compassos fossem mais estudados que os últimos.  

Guitarra Clássica       
 
Abaixo  apresento  algumas  aparições  dos  motivos  A  (vermelho),  B  (azul),  e  C  (amarelo)  em 
diversos procedimentos, principalmente em aumentação (Ex. 19), transposição (Ex.16, 17 e 21) 
e inversão (Ex.16, 17): 

Exemplo 16 – Elegy Motivo A em diminuição rítmica, transposição e inversão

Exemplo 17 - Elegy Allegro di bravura e rubato. Motivo A

 
Exemplo 18 ‐ Elegy Fragmentos do motivo B em reiteração 

Guitarra Clássica       
 
 

Exemplo 19 – Elegy Motivos A e B em aumentação. Os intervalos de quartas em amarelo são característicos do


motivo C.

Exemplo 20 - Elegy Motivo A em aumentação e diminuição. Motivo B em aumentação.

Guitarra Clássica       
 
 

Exemplo 21 - Elegy Motivo C em transposição.

A  Seção  A’  (“dos  harmônicos”)  foi  composta  por  Julian  Bream,  pois,  conforme  já  dito 
anteriormente, o compositor faleceu compassos antes do início dessa seção. A reexposição de 
parte do Andante molto serioso aparece em harmônicos oitavados: 

Exemplo 22 - Elegy Parte do Andante molto serioso reexposto em harmônicos. c.132 – c.135

Na seqüência, é reexposto parte do Ancora Piú Mosso (c.136 – c.148):  

Guitarra Clássica       
 
 
Exemplo 23 - Elegy, c. 136 – C. 148. Reexposição parcial do Ancora Piu Mosso

A  partir  do  compasso  148,  há  a  construção  de  material  novo  em  harmônicos,  constituindo 
outro  provável  ponto  relevante  de  aplicação  de  estratégias  de  estudo.  A  dificuldade  dos 
harmônicos oitavados em fusas reside na precisão rítmica, pois o braço ou mão direita deverá 
se  movimentar  rapidamente  por  locais  precisos  da  região  sobre  aguda  do  braço  do 
instrumento,  enquanto  a  mão  esquerda  também  se  movimenta.  O  estudo  separado  dos 
harmônicos,  através  de  repetições,  variações  de  andamento,  variações  rítmicas,  e  dinâmicas 
distintas constituíram o meu conjunto de estratégias para o domínio desse trecho. Os motivos 
A, B e C aparecem com modificações, alterações rítmicas e transposições: 

Exemplo 24 - Elegy, c. 149 – 153. Material novo em harmônicos. Motivos A (vermelho), B (azul) e C (amarelo).

Guitarra Clássica       
 
 

Exemplo25 - Elegy, c154 – c. 157. Motivos A (vermelho) e C (amarelo) em inversão

A breve análise apresentada possibilita uma visão da organização da obra, e de como os três 
motivos  que  constituem  a  série  dodecafônica  foram  tratados  pelo  compositor  ao  longo  das 
seções musicais. 

  6  Os participantes da pesquisa 

Os dois sujeitos selecionados possuem trajetórias e características distintas em relação as suas 
carreiras.  Isso  proporcionou  resultados  contrastantes  não  só  de  estratégias  de  estudo 
utilizadas,  mas  igualmente  no  que  diz  respeito  ao  enfoque  da  utilização  dessas.  Por  uma 
questão  ética,  bem  como  solicitação  dos  próprios  participantes,  seus  respectivos  nomes  não 
serão citados no corpo do trabalho, sendo então chamados de Sujeito 1 (S1) e Sujeito 2 (S2).   

  6.1 Análise das estratégias de estudo utilizadas pelo Sujeito 1 

A partitura da Elegy de Alan Rawsthorne foi entregue ao S1 precisamente no dia 21 de julho de 
2009,  ocasião  da  primeira  e  única  sessão  de  entrevista  (Anexo  3).  Nessa  sessão  foram 
requeridos dados biográficos relevantes e informações a cerca do seu processo de preparação 
de uma obra, que puderam ser cruzadas com os dados dos diários de estudo. Após um total de 
treze sessões de estudo até a gravação, o processo de estudo de S1 encontra‐se resumido na 
tabela de atividades realizadas: 

Guitarra Clássica       
 
DATA  DURAÇÃO  ATIVIDADES REALIZADAS 

    Leitura do andante e pochiss. Più mosso. 

     

    Digitação  dos  compassos  7,  12,  últimas  notas 


dos compassos 13 e 16. 
02/08/2009  45 minutos 
 

Leitura do compasso 1 ao 33. 

Repetição do Ancora più mosso 

Leitura do Allegro di bravura rubato 

    Leitura  do  Allegro  di  bravura  e  rubato. 


Semínima = 90 bpm 
   
 
   
Leitura  do  Allegro  di  bravura  e  rubato. 
06/08/2009  50 minutos  Semínima = 100 bpm 

Leitura do compasso 90 ao fim. 

     

    Leitura  do  Allegro  di  bravura  e  rubato. 


Semínima = 80 a 100 
13/08/2009  1 hora 
 

Leitura da parte A. 

     

14/08/2009 30 minutos  Leitura completa. 

15/08/2009 30 minutos  Leitura completa. 

Guitarra Clássica       
 
    Leitura do Allegro di bravura e rubato. Rápido. 

     

    Leitura completa. 

20/08/2009  40 minutos   

Limpeza da parte B. 

Leitura da parte A’. 

    Leitura  do  Allegro  di  bravura  e  rubato. 


Semínima=100 bpm. 
   
 
   
Estudo da peça completa.  
21/08/2009  1 hora 
 

Estudo parte A’. 

Estudo de B e A’. 

Estudo das partes A e A’. 

     

    Estudo das partes B e A’ sem partitura. 

23/08/2009  1 hora   

Execução da peça inteira. 

    Leitura completa. 

     

01/09/2009  20 minutos  Estudo da parte A solfejando junto. 

Estudo de limpeza da parte B. 

Guitarra Clássica       
 
    Leitura completa. 

28/09/2009  1 hora   

Estudo das seções musicais separadamente. 

    Toca a peça inteira de memória. 

     

    Estuda trechos separadamente 

     

16/01/2010  1 hora  Toca algumas vezes as partes A e A’ cantando 


a melodia. 

Toca  o  Allegro  di  bravura  e  rubato  sem 


metrônomo,  mas  em  velocidades  alternadas 
entre 110 e 120 bpm. 

    Assiste  a  um  vídeo  da  internet  da  execução 


peça. 
   
 
18/01/2010 1 hora 
Estuda  a  peça  com  a  partitura  buscando 
    memorizar  corretamente  algumas  partes  que 
    não  estavam  bem,  tais  como  os  harmônicos 
dos compassos 132 ao fim. 
   
 
   
Diminui  a  dinâmica  de  toda  a  obra,  por  achar 
    que  está  tocando  de  uma  forma  muito 
agressiva. 

    Aquecimentos e gravação da própria execução 
musical da Elegy em vídeo. 
19/01/2010 30 minutos 

Tabela 1. Resumo do processo de estudo de S1

Guitarra Clássica       
 
6.1.1  Classificação  

Segue a Tabela com as estratégias de estudo utilizadas por S1 para a resolução dos problemas 
encontrados  em  seu  processo  de  estudo.  Os  comentários  provindos  dos  diários  de  estudo  a 
cerca dos problemas também são apresentados: 

  PROBLEMA/DIFICULDADE     

  ESTRATÉGIA DE ESTUDO  COMENTÁRIOS 

  Estudo da passagem difícil;   

     

  Mudança de articulação;  “No c. 7 tem um ré que não 
faz  parte  da  melodia,  mas, 
    por características do violão, 
Compasso 7  Repetição  do  trecho  sempre  soa  como  sendo 
inúmeras vezes;  melódico.  Ainda  não  estou 
satisfeito com isso.” 
 

Estudo  de  dinâmicas 


distintas para a nota ré.  

    “Na  parte  rápida  os  ligados 


nem  sempre  saem  bem,  é 
    difícil  ser  ritmicamente 
    preciso com tantos ligados e 
é  uma  falta  de  costume 
    minha  em  particular  usar 
tanto  esse  recurso.  Neste 
  Estudo  em  andamentos 
caso  achei  importante  fazê‐
distintos; 
  los  por  uma  questão 
  estilística.”  
Allegro  di  bravura  e  rubato: 
Execução  da  articulação    “Variava  entre  os 
proposta  na  edição  em  andamentos subitamente.” 
andamento rápido.    
 ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ 
    
“Em  uma  das  últimas 
  Estudo  através  de  seções  sessões tirei um tempo para 
musicais.  fazer  um  pouco  de  ligados 
  ascendentes e descendentes, 
 
com  exercícios  improvisados 
 
imitando  a  parte  rápida  da 

Guitarra Clássica       
 
‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐     peça.” 

  ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐ ‐    

    “Usei  o  metrônomo 
principalmente  para  manter 
    uma  regularidade  de  ritmo 
    em todo o Allegro, para não 
correr.”  
  Estudo da técnica de ligados 
ascendentes  e   
Allegro  di  bravura  e  rubato:  descendentes. 
Execução  da  articulação 
proposta  na  edição  em   
andamento rápido. 
 

Estudo com metrônomo. 

    “No  12  o  problema  era  com 


o  ligado  do  Bb  para  o  Eb, 
  Alteração  de  aspectos  mas  achei  melhor  acatar  a 
interpretativos  para  decisão  do  Bream  para 
Compasso 12  solucionar  problema  de  manter o acorde soando por 
execução  mais tempo.” 

  Alteração  de  aspectos  “No 13 era o sol solto. Tenho 


interpretativos  para  feito assim mesmo, mas não 
Compasso 13  solucionar  problema  de  descarto  a  possibilidade  de 
execução  mudar.” 

  Estudo de dinâmicas   
distintas entre o motivo A 
  (forte) e o acorde  “O c. 16 é utópico como está 
(pianíssimo, segundo plano). escrito,  simplesmente  não 
Compasso 16  há  como  deixar  soando 
Estudo da passagem difícil  tudo.” 

Guitarra Clássica       
 
  Estudo através de repetições   
dos trechos; 
   
 
   
Variações súbitas de 
  andamento;   

Trecho em harmônicos (c. 132    “Os  harmônicos  do  final 


– 135).  também  são  uma  grande 
Variações de dinâmica;  dificuldade  da  peça.  É 
Harmônicos (c. 149)  dificílimo fazer com que eles 
  tenham  equilíbrio  dinâmico 
Harmônicos (c. 151) 
Estudo  através  de  seções  e tímbrico”. 
Harmônicos (c. 154)  musicais. 

Estudo da passagem difícil.  

Mudanças no 
posicionamento da mão 
direita.  

Tabela 3: Estratégias de estudo utilizadas por S1 

6.1.2   Discussão 

As ações de S1 durante o estudo da obra confirmaram seu depoimento a respeito do próprio 
processo de preparação de uma obra nunca antes estudada, salvo uma pequena divergência a 
respeito da memorização. Em sua primeira sessão de estudo, ele baseia sua memorização na 
memória  conceitual  (também  conhecida  como  memória  declarativa  ou  analítica),  de  uma 
forma intuitiva, visto que passou 45 minutos sem utilizar o instrumento, apenas realizando o 
que chamou de “análise superficial”, memorização de trechos recorrentes, caráter das partes e 
macro‐forma, tudo isso colaborando para um profundo entendimento das relações cognitivas 
que  irão  sedimentar  o  conteúdo  na  memória  de  forma  mais  eficiente.  Segundo  Barros,  “a 
memória conceitual tem sido a mais estudada por pesquisas empíricas, sendo, também, a mais 
destacada  nas  entrevistas,  as  quais  denotam  que  esse  é  o  tipo  de  memória  com  resultados 
mais  eficazes  para  a  retenção  do  conteúdo  musical”  (2008,  p.118).  Ainda,  parte  da  sua 
penúltima  sessão  de  estudo  (18/01/2009)  foi  destinada  à  memorização  de  trechos  e  a  outra 

Guitarra Clássica       
 
leitura sem o instrumento, onde um dos objetivos precisamente foi a memorização de algumas 
passagens recorrentes. Abaixo o fragmento da entrevista e a contradicente anotação em diário 
de estudo: 

  –  Então  tocando  durante  o  estudo,  tu  não  faz  nada  específico  no  violão  com  o  intuito  de 
Eu 
memorizar. Isso ocorre naturalmente durante o estudo né? 
 
 
 
S1 – “Naturalmente. Eu não sei como memorizar.”  
 
 
 
Eu – Tu não separas isso né..por exemplo, hoje é memorização? 
 

 
18/01/2010: “Estudei a peça com a partitura buscando memorizar corretamente as partes que 
não estavam bem”. 
 

A  divergência  encontrada,  entretanto,  ocorreu  em  função  de  uma  pausa  de  três  meses  sem 
estudar a Elegy, entre os dias 28/09/2009 e 16/01/2010 estando, portanto, a necessidade de 
memorizar  alguns  trechos  relacionada  com  a  proximidade  à  data  da  gravação,  realizada  três 
dias após (19/01/2010). Esse dado demonstra que a despeito de S1 relatar não se preocupar 
com  o  aspecto  da  memorização  da  obra  em  sua  rotina  de  estudos,  o  processo  de 
armazenamento  do  conteúdo  estudado  permitiu  a  ele  conseguir  resgatar  a  obra  em  apenas 
uma  sessão  de  prática.  Sobre  o  processo  de  memorização  de  uma  música,  Barros  (2008) 
sintetiza:  

A memorização de uma música é feita através de sua representação mental 
armazenada  na  memória  de  longo  prazo,  a  qual  o  músico  utiliza  quando 
executa.  Diferentes  tipos  de  estratégias  podem  contribuir  para  o 
desenvolvimento  da  representação  mental  da  música,  a  exemplo  das 
informações coletadas pelo armazenamento sensório (memória tátil, visual 
e  auditiva  da  música)  as  quais  são  essenciais  nas  primeiras  etapas  de 
memorização (p.121) 

Duas observações qualitativas emergem a partir disso: a primeira, que as estratégias utilizadas 
por S1 em seu processo de estudo estiveram, de alguma forma, direcionadas à capacidade de 
armazenamento  do  conteúdo  aprendido  na  memória  de  longo  prazo,  tipo  de  memória  vital 
para  a  memorização  de  uma  música  (GINSBORG,  apud  WILLIAMON,  2004,  p.  126).  Segundo, 
que esse processo permitiu a S1, mesmo após três meses sem praticar a obra, ir diretamente 
aos trechos que necessitavam mais trabalho. S1 relata as atividades realizadas: 

Guitarra Clássica       
 
Neste  dia  fiz  uma  revisão  da  leitura  constatando  que  algumas  notas  já 
estavam deturpadas pela memória. Assisti a um vídeo no youtube da peça 
gravada  de  uma  forma  bastante  amadora.  Estudei  a  peça  com  a  partitura 
buscando  memorizar  corretamente  as  partes  que  não  estavam  bem. 
Consegui  fazer  funcionar  melhor  os  harmônicos  da  parte  A2,  dando  um 
pouco mais de liberdade no ritmo e diminuindo o ataque das notas. Talvez 
eu  tenha  diminuído  um  pouco  toda  a  dinâmica,  percebi  que  a  minha 
maneira de tocar estava agressiva demais para a Elegy. 

O  enfoque  da  utilização  da  estratégia  de  estudo  de  exercícios  de  técnica  converge 
absolutamente com aquele sugerido por Jorgensen (apud Williamon, 2004), o qual recomenda 
uma atitude reflexiva quanto à utilização desses. S1 realizou o estudo da técnica de ligados ao 
final de uma das sessões, em virtude da articulação da seção musical do Allegro di bravura e 
rubato, quase toda com ligados de mão esquerda em andamento rápido.  

Em seu total de dez horas e cinco minutos de estudo da obra, houve constatação de poucas 
atividades  sem  o  instrumento:  a  apreciação  de  um  vídeo  da  execução  musical  da  obra 
disponível na internet e audição da gravação de Julian Bream; e uma “leitura superficial sem o 
instrumento”, tendo como objetivos “a observação de trechos recorrentes, caráter das partes 
e a forma da peça”. Ainda que S1 tenha mencionado somente esses objetivos, essa leitura foi o 
elemento  chave  para  S1  fundamentar  todo  o  desenvolvimento  da  interpretação  da  obra, 
debruçada  na  experiência  e  vivência  com  o  repertório  das  obras  dessa  época  dedicadas  a 
Juliam  Bream.  Esse  processo  nos  remete  à  idéia  dada  por  Heinrich  Neuhaus  (1973)  sobre 
imagem artística de uma composição musical, que nada mais é do que todas as informações 
que  se  apresentam  em  nosso  pensamento  ao  simplesmente  ouvirmos  falar  em  uma 
determinada  peça,  ou  ao  abrir  a  partitura,  antes  mesmo  de  se  pegar  o  instrumento.  Essas 
informações  podem  ser,  por  exemplo,  a  idéia  de  como  a  música  realmente  deve  soar,  com 
todos  os  seus  elementos  da  interpretação  musical  (dinâmica,  fraseado,  articulação,  rubatos, 
etc.), uma estrutura formal específica, alguma informação sobre o compositor ou o contexto 
histórico  da  obra,  seu  conteúdo  emocional  ou  poético,  entre  outros.  A  leitura  igualmente 
demonstrou seu enfoque da utilização da estratégia do estudo mental, conforme a definição 
exposta no modelo analítico, onde estudo mental também é caracterizado audição interna das 
próprias intenções interpretativas.   

Assim,  S1  não  mencionou  realizar  considerações  analíticas  quanto  a  forma,  frases  e 
parâmetros musicais diversos em seus diários de estudo.  A utilização da estratégia de estudo 
através  de  seções  musicais  foi  recorrente,  corroborando  uma  divisão  da  obra  sem  a 
preocupação  de  estar  em  acordo  com  alguma  teoria  formal  para  a  identificação  da  divisão 
proposta  pelo  compositor.  As  repetições  utilizadas  foram  todas  realizadas  posteriormente  à 
identificação  dos  problemas  dos  trechos,  proporcionando  assim  que  tais  repetições  somente 

Guitarra Clássica       
 
ocorressem com objetivos claros. A identificação dos problemas se deu durante a fase inicial 
do estudo, por ele chamada de “leitura”.  

Quanto aos andamentos, S1 utilizou a estratégia do estudo alternado dos andamentos.  Essa 
estratégia só foi utilizada após a assimilação do conteúdo musical e da definição de digitações 
e dedilhados na fase inicial (“leitura”). S1 o fez dessa forma para não correr o risco de estudar 
algo  errado  em  andamento  rápido,  impedindo  a  fixação  de  movimentos  incorretos.  O 
metrônomo  só  foi  utilizado  na  seção  rápida  da  música,  com  o  objetivo  da  elevação  do 
andamento. Para isso, ele variou subitamente entre os andamentos por ele estipulados.  

Momentos  antes  da  gravação  da  execução  da  obra,  S1  realizou  atividades  brandas  de 
aquecimento.    Essas  atividades  incluíram  escalas  curtas,  execução  de  fragmentos  de  outras 
obras,  bem  como  de  partes  do  Allegro  di  bravura  e  rubato  da  Elegy.  Nesses  instantes  pré‐
gravação  ele  não  tocou  a  peça  do  início  ao  fim,  mas  sim,  somente  algumas  partes,  com  o 
objetivo único de aquecimento. No vídeo, percebi que a obra não foi tocada de memória, e, 
por  isso,  as  estratégias  para  a  memorização  não  puderam  ser  minuciosamente  analisadas. 
Quando perguntado sobre sua própria execução da Elegy, S1 comenta ter gostado da própria 
execução,  e  que  considera  a  obra  pronta.  Ele  considerou  ainda  que  alguns  pequenos  erros 
durante a gravação poderiam ter sido evitados com um pouco mais de prática. De acordo com 
o seu retrospecto, imagino que não seria demandado mais do que uma semana pra isso, já que 
os erros na sua execução foram pouco relevantes.  

6.2 Análise das estratégias de estudo utilizadas pelo Sujeito 2 

A partitura da obra foi entregue ao S2 precisamente no dia 02 de agosto de 2009, ocasião da 
primeira  e  única  sessão  de  entrevista  (Anexo  4)  .  Nessa  sessão  foram  requeridos  dados 
biográficos relevantes e informações a cerca do seu processo de preparação de uma obra, que 
puderam  ser  cruzadas  com  os  dados  dos  diários  de  estudo.  Por  motivos  de  força  maior,  foi 
somente no dia 27 de novembro de 2009 que S2 deu início ao seu estudo da Elegy.  

Após um total de dez sessões de estudo, a tabela abaixo resume as ações de S2 durante todo 
seu processo de estudo da Elegy: 

Guitarra Clássica       
 
DATA  DURAÇÃO  ATIVIDADES REALIZADAS 

    Leitura  geral  da  obra,  tocando‐a  duas  vezes 


em seqüência muito lentamente. 
   
 
   
Divisão da obra em partes. 
27/11/2009  1 hora 
 

Fixação de objetivos para a próxima sessão de 
estudo. 

Considerações analíticas. 

     

    Leitura detalhada do Andante molto serioso. 

     

    Leitura  detalhada  do  Pochiss.  Piu  mosso  e 


Ancora Piu mosso.  
   
 
   
Considerações analíticas. 
   
 
07/12/2009  1 hora 
Mudança  de  digitações  e  articulações  na 
segunda parte do Allegro di bravura e rubato. 

Estudo  de  acordes  e  passagens  do  Allegro  di 


bravura e rubato. 

Fixação de objetivos para as próximas sessões 
de estudo 

    Toca  a  peça  lentamente  até  o  compasso  54, 


revisando  dedilhados  definidos  nas  seções  de 
    estudo anteriores. 
     

Guitarra Clássica       
 
    Estuda  a  primeira  parte  do  Allegro  di  bravura 
e rubato, modificando digitações. 
   
 
   
Toca  três  vezes  a  segunda  parte  do  Allegro  di 
09/12/2010  1 hora  bravura e rubato. 

Fixa  objetivos  para  a  próxima  sessão  de 


estudo. 

    Toca a primeira parte da peça (c. 1‐54) 

     

11/12/2009  1 hora  Estuda o Allegro di bravura e rubato, tocando 


e  parando  em  algumas  partes  que  não  soam 
bem enquanto toca.  

Testa dedilhados distintos.  

    Estuda a segunda parte do Allegro di bravura e 
rubato. Muda digitações nessa parte.  
   
Estuda  a  relação  entre  os  andamentos  em 
26/01/2010   toda a peça. 
     
28/01/2010  2 horas  Estudo lento dos harmônicos da obra  

     

    Toca o Allegro inteiro. 

02/02/2010  1 hora   

Modifica  os  andamentos  das  seções  musicais 


em  função  do  andamento  pré‐estabelecido 
para  as  seções  constituintes  da  parte  A  da 
peça.  

Guitarra Clássica       
 
     

    Toca  o  Allegro  di  bravura  e  rubato  muito 


lentamente,  aumentando  o  andamento  aos 
04/02/2010  1 hora  poucos até a semínima = 75 bpm.  

    Assiste  a  um  vídeo  da  execução  da  obra  na 


internet. 
05/02/2010  20 minutos 

    Estuda  o  Allegro  di  bravura  e  rubato  em 


andamentos distintos. 
   
 
06/02/2010  2 horas 
Toca repetindo pequenas partes  do Allegro di 
bravura e rubato. 

Tabela 3 – Resumo das atividades realizadas por S2

6.2.1 Classificação 
A seguir, apresento a tabela com os problemas e dificuldades de S2 e as estratégias de 
estudo utilizadas na resolução desses: 

     

PROBLEMA/DIFICULDADE  ESTRATÉGIA DE ESTUDO  COMENTÁRIOS 

     

     

Trecho em harmônicos (c. 132  Estudo em andamento lento.  
– 154) 
  ‐ 
 
 

  Estudo com metrônomo.   

Escala em fusas (c. 157)    ‐ 

Estudo  através  de 


repetições.  

Guitarra Clássica       
 
     

    Toquei  uma  vez  sem 


metrônomo  e  logo  em 
  Fixação  de  objetivos  para  a  seguida  coloquei  em  75. 
próxima sessão de estudo.  Alguns minutos depois – 80, 
 
  depois  82,  84,  85  e, 
  finalmente,  86,  sempre  do 
  início ao fim (c. 55‐ 131). Ta 
 
começando a ficar bom.  
 
 
 
Estudo com metrônomo. 
Allegro  di  bravura  e  rubato: 
Por ter estudo há dois atrás, 
Execução  da  articulação   
me  senti  mais  em  casa 
proposta  na  edição  em 
  tocando.  Havia  mudado 
andamento rápido. 
algumas  digitações  e 
Estudo  em  andamentos  mexido  em  alguns  ligados, 
distintos.   para  deixar  as  frases  mais 
fluentes e claras 
 
 
 
Está  soando  muito  bem, 
 
mas  em  razão  das 
Mudança  das  articulações  redigitações. 
indicadas,  bem  como  de 
 
digitações e dedilhados.  

  

  Mudança  de  articulação  e   


digitação.  
   
 
  Havia  mexido  nas  escalas 
Estudo com metrônomo.  cromáticas  (digitações  e 
C. 123 – 124 (escala cromática  ligados). Manterei assim, só 
descendente)    preciso estudar mais. 
Estudo  através  de 
repetições.  

Guitarra Clássica       
 
    Minha  impressão  hoje,  é 
que  dependendo  do 
    andamento  que  fizer  no 
    Allegro,  ele  poderia  ser  em 
até  90  a  semínima”. 
    “Pochiss.  Piu  mosso‐  ficou 
bem  assim,  mas  deve  ser 
   
definido  de  acordo  com  o 
    que vem antes (andante) e o 
que  vem  depois  (ancora  p. 
    m).”  

     

    Hoje  ficou  evidente  que, 


apesar  de  não  aparecer  na 
   
partitura  a  mudança  de 
  Estudo  da  relação  de  andamento,  o  Allegro  não 
proporcionalidade  entre  os  está  mais  ali.  Creio  que 
Definição dos andamentos das  andamentos  das  seções  volto  para  o  andamento 
seções musicais da obra  musicais.   inicial,  ou  próximo  dele.  Os 
harmônicos oitavados, além 
  da  escala  em  fusa  deixam 
evidente  que  a  variação  do 
Estudo com metrônomo. 
retorno  ao  tema  não  está 
no  andamento,  mas  sim, 
nas s em fusa e harmônicos 

Tabela 4: Estratégias de estudo utilizadas por S2

6.2.2  Discussão 
O tempo  total de  preparação da obra por parte de S2 foi  dez  horas e vinte minutos.  
Atividades  realizadas  sem  o  instrumento  foram  relevantes  durante  o  processo,  e  entre  elas 
destacaram‐se: a leitura sem o violão, de uma forma não sistemática, fazendo‐o em momentos 
que  S2  julgava  oportuno;  pesquisa  na  internet  sobre  a  obra  e  o  compositor;  e  audição  da 
gravação,  sendo  esses  dois  últimos  realizados  um  pouco  antes  da  gravação  da  própria 
execução  musical  e  dias  após,  respectivamente.  Sobre  tais  atividades,  Jorgensen  (2004) 
sugere:  

Balancear  estudo  com  e  sem  o  instrumento  numa  sessão  ou  em  um 
determinado  período  de  tempo.  Com  foco,  o  estudo  sem  o  instrumento 
proporcionará  mais  tempo  para  o  ensaio  mental  e  reflexão,  prevenindo 
igualmente a sobrecarga dos músculos. No montante total, esse não se trata 
de um tempo desperdiçado, mas de fato, o oposto.  

Guitarra Clássica       
 
 

Os  depoimentos  de  S2  a  respeito  da  própria  prática  revelaram  que  as  leituras  sem  o 
instrumento não foram realizadas com objetivos pontuais, ao contrário da sua “leitura geral da 
obra”.  Essa  foi  realizada  com  o  violão,  e  teve  como  objetivo  a  percepção  dos  principais 
elementos musicais constituintes (frases, dinâmicas, articulações, mudanças de caráter, etc.).  
Percebi  a  necessidade  de  S2  estar  se  relacionando  constantemente  com  a  obra  durante  seu 
processo, o que ocorreu através da estratégia das leituras sem o instrumento.  

Observei a inexistência de atividades de preparação para o estudo nos diários de S2, ainda que 
ele  as  tenha  destacado  como  comum  em  sua  prática  (Anexo  3).  Jorgensen  (2004),  vendo  a 
prática como uma atividade de auto‐ensino, considera fundamental o estágio de observação e 
avaliação dos próprios procedimentos durante o estudo. A natureza reflexiva do processo de 
estudo de S2 foi revelada na estratégia de fixação de objetivos, contribuindo assim para uma 
abordagem  cíclica  e  contínua  da  prática.  Os  objetivos  para  as  próximas  sessões  de  estudo 
foram  fixados  através  de  uma  auto‐percepção  dos  seus  pontos  fortes  e  fracos  perante  aos 
elementos problemáticos da peça, característica encontrada em músicos profissionais (Hallan, 
1995,  1997a,  1997b).  Os  objetivos  declarados  nos  diários  de  estudo  estiveram  relacionados 
com  as  intenções  interpretativas  de  S2,  que  foram  surgindo  à  medida  que  a  percepção  do 
discurso musical melhorava.  

As estratégias de repetição foram utilizadas em função de dois objetivos distintos: primeiro, já 
a  partir  da  segunda  sessão  de  estudo  (07/12/2009),  as  repetições  serviram  para  melhorar  a 
sonoridade  de  alguns  acordes  e  passagens;  segundo,  com  o  propósito  da  memorização  dos 
trechos, foi somente após o estabelecimento das digitações, dedilhados e articulações que elas 
entraram  em  cena.  Apesar  de  o  aspecto  da  memorização  não  ter  sido  analisado 
minuciosamente, justamente pelo fato de S2 não ter tocado a obra de cor, pude constatar que 
o  violonista  não  utilizou  uma  forma  de  memorizar,  apesar  de  admitir  a  existência  de  um 
processo:  

Dependendo  da  linguagem  tem  peças  que  são  muito  fáceis  de  decorar,  e 
tem  outras  que  são  muito  difíceis.  E  aí  tu  tem  que  estudar..bom,  então 
agora  eu  vou  entrar  nesse  processo  de  memorização.  E  aí  tu  precisa  usar 
vários  elementos  pra  ir  memorizando  ela,  né.  [...]  Então  eu  pego  o  violão, 
saio tocando e percebo bah, mas eu não decorei isso tche. Aí eu volto com a 
partitura, olho de novo, penso na harmonia, penso no que tem antes e no 
que  tem  depois.  Penso  nas  notas,  penso  na  armadura,  penso  em  várias 
coisas.  Às  vezes  tu  precisa  pensar  em  várias  coisas  mesmo  pra  tu  poder 
realmente tocar aquilo de cor.  

Guitarra Clássica       
 
A estratégia do estudo de seções musicais foi utilizada, sendo mais tempo dedicado ao estudo 
do Allegro di bravura e rubato. Essa seção foi dividida em várias partes, sendo essas estudadas 
separadamente. Logo na primeira vez que o violonista foi estudar a referida seção, no segundo 
dia de estudo (07/12/2009), ele praticou somente sua segunda parte. As seções musicais para 
o  estudo  não  foram  escolhidas  de  acordo  com  um  planejamento  prévio,  sendo  essas 
praticadas sem ordem estabelecida. Isso ocasionou um desequilíbrio em relação ao tempo de 
prática dedicado a cada uma das partes da obra. Os diários de estudo de S2 mostraram que a 
primeira parte da obra (c.1 a 54) foi estudada durante três dias7∙.  Já para o Allegro di bravura e 
rubato foram dedicados oito dias de prática.  O estudo da terceira parte da obra (c.132 ao fim) 
foi  realizado  somente  na  6ª  sessão  (28/01/2010)  através  da  estratégia  de  estudo  em 
andamento lento. Sobre essa terceira parte da Elegy, ressalto, portanto, que não foi tocada no 
andamento estipulado por S2.  

S2 realizou diversas considerações analíticas em seus diários, demonstrando uma preocupação 
com  o  entendimento  da  organização  da  obra  como  um  todo,  tentando  desvelar  os 
andamentos  através  de  uma  relação  de  dependência  entre  eles,  e  observar  as  mudanças  de 
caráter entre as seções musicais. O andamento foi o aspecto mais mencionado em seus diários 
de  estudo,  e  a  estratégia  de  estudo  com  o  metrônomo  foi  fundamental,  mesmo  após  a 
definição  dos  andamentos  para  as  seções  musicais,  realizada  na  sétima  sessão  de  prática 
(02/02/2010).  

Optando  por  não  ouvir  qualquer  gravação  da  obra,  fazendo  isso  somente  às  vésperas  da 
gravação da própria execução em vídeo (penúltima sessão de estudo, 05/02/2010), ele assim o 
fez para evitar qualquer tipo de influência das gravações. Sobre a questão da obra não ser tão 
difundida no repertório, S2 menciona: 

Então entendi outras coisas. Por exemplo: porque a Elegy “não pegou”? Em 
outras  palavras,  porque  uma  peça  tão  interessante  não  é  daquelas  que 
muitos passam a tocar? Ora... como poderia ser... está no mesmo disco das 
5 Bagatelas,  nada mais do que isso.  E tem o Berkeley. Como em um bom 
disco que seja brilhante, com o lançamento de várias obras novas, originais, 
algumas  se  sobressaem,  outras  passamos  por  cima.  Creio  não  ser  um 
problema da obra em si, mas da força das outras.   

                                                            
7
 O que não significa que não tenha sido tocada em outras sessões de estudo.  

Guitarra Clássica       
 
CONCLUSÃO 

Através  da  análise  das  atividades  inseridas  nos  processos  de  estudo  de  dois  experientes 
guitarristas professores universitários, concluo que a construção da execução musical, quando 
vista como atividade de solução de problemas (problem solving activity), através da utilização 
consciente de estratégias de estudo, pode ser otimizada em termos de qualidade e quantidade 
de estudo. A construção do modelo analítico, a partir das bases teóricas expostas no presente 
trabalho,  permitiu  a  identificação  das  estratégias  de  estudo  utilizadas  pelos  violonistas,  bem 
como  o  enfoque  dado  por  cada  um  a  essas.  Os  resultados,  da  mesma  forma,  mostraram  a 
importância  da  pesquisa  empírica  para  a  área  de  práticas  interpretativas,  visto  que  a 
observação e análise de alguns itens realizados durante a fase de aprendizado mostraram‐se 
diferentes  do  que  foi  informado  pelo  relato  verbal  dos  sujeitos  na  entrevista,  à  exemplo  da 
memorização por parte de S1.  

Com uma abordagem pragmática, constatei que todas as ações realizadas por S1 durante seu 
processo de estudo estiveram diretamente relacionadas com o objetivo final de tocar a obra, 
salvo  a  apreciação  de  um  vídeo  da  execução  da  obra  na  internet,  e  a  rápida  e  consistente 
“análise superficial sem o instrumento”  8.  Já S2 utilizou além de estratégias para a execução 
da  música,  algumas  atividades  empreendidas  para  a  melhor  compreensão  da  construção  da 
obra. Exemplos dessas atividades foram as considerações analíticas realizadas durante todo o 
seu  processo  de  estudo,  e  a  preocupação  com  a  definição  dos  andamentos  das  seções 
musicais.  

Apesar  das  diferentes  perspectivas  na  construção  da  execução  musical,  foram 
encontradas algumas estratégias de estudo comuns, as quais são apresentadas abaixo:  

•  Leitura  sem  o  instrumento:  chamada  por  S1  como  “análise  superficial”,  foi  essa 
atividade que permitiu ao instrumentista formar uma imagem artística da obra, identificando 
as seções musicais, frases, dinâmicas, caráter, andamentos, e notas melódicas e harmônicas. 
Observo o pouco tempo empreendido por S1 nessa que foi a principal atividade norteadora de 
sua  interpretação  (somente  a  primeira  sessão  de  prática,  com  duração  total  de  45  minutos, 
entre outras atividades). S2 também utilizou a leitura sem o instrumento. Diferentemente de 
S1, ele a realizou ao longo de todo o processo de estudo, apesar de não mencionado em seus 
diários.9 Ele comentou que essa atividade não foi sistemática em seu processo, sendo realizada 

                                                            
8
 O termo “superficial” foi utilizado por S1, e denota análise de superfície.   
9
 Apontado em questionário respondido via e‐mail em 16/03/2010.  

Guitarra Clássica       
 
com  o  intuito  de  manter  uma  relação  estreita  com  a  obra,  estando  assim  a  pensar 
constantemente em algum aspecto da peça.  
•  Estudo através de seções musicais: essa estratégia de estudo foi utilizada pelos dois 
violonistas, porém, de maneiras distintas em termos de quantidade de prática e tamanho de 
cada  seção  musical.  O  Allegro  di  bravura  e  rubato  foi  divido  somente  em  duas  seções  para 
estudo por parte de S1 (c.55 – c.89 /c.90 – c.131). Já S2 dividiu essa seção em dois momentos: 
nos estágios iniciais de prática, a divisão foi realizada em duas partes, como S1 o fez em todo 
seu processo.  Já para os últimos dias de estudo, S2 realizou a divisão da referida seção musical 
em partes ainda menores (ver tabela 4). A respeito da quantidade de tempo gasto na prática, 
os  gráficos  abaixo  demonstram  a  ênfase  dada  a  cada  seção  musical  por  parte  dos  sujeitos, 
através do número de atividades realizadas em cada uma: 
 
 

Figura 3 – S1. Distribuição da quantidade de atividades realizadas em cada seção musical

Guitarra Clássica       
 
 

Figura 4 – S2. Distribuição da quantidade de atividades realizadas em cada seção musical

A análise comparativa dos gráficos gerados a partir da quantidade de atividades realizadas em 
cada  seção  musical  permitiu  identificar  o  equilíbrio  na  distribuição  das  atividades  realizadas 
por parte de S1. A seção do Allegro di bravura e rubato demandou mais ações em virtude de 
seu  tamanho  e  características,  com  passagens  virtuosísticas  e  articulação  de  difícil  execução 
em  andamento  rápido.  No  processo  de  S2,  constata‐se  o  desequilíbrio  na  quantidade  de 
atividades  empreendidas  entre  as  seções  do  Allegro  di  bravura  e  rubato  e  a  seção  A’  (seção 
musical final).  

• Estudo através de repetições: As repetições realizadas por S1 estiveram relacionadas 
com  a  resolução  de  passagens  difíceis,  as  quais  foram  realizadas  inúmeras  vezes  até  o 
completo domínio dessas, e com o processo por ele intitulado “limpeza” das seções musicais 
da  obra,  com  o  objetivo  da  execução  musical  clara  e  sem  erros.  S2  utilizou  a  estratégia  de 
repetições  somente  para  pequenas  passagens,  entre  elas  os  harmônicos  da  seção  musical 
final,  e  trechos  desafiadores  do  Allegro.  Além  disso,  S2  repetiu  diversas  vezes  essa  seção 
musical com o intuito de alcançar o andamento por ele objetivado.  
• Estudo  com  metrônomo:  Apesar  do  fato  de  os  dois  sujeitos  terem  utilizado  o 
metrônomo em seus processos de estudo, saliento aqui a diferença de abordagem em relação 
a  sua  utilização.  Enquanto  S1  o  utilizou  para  manter  uma  regularidade  rítmica  somente  na 
seção do Allegro di bravura e rubato, variando subitamente entre os andamentos, S2 utilizou o 
metrônomo  como  um  moderador  de  andamentos,  com  objetivo  de  estabelecer  uma  relação 
entre os andamentos das seções musicais.  

Guitarra Clássica       
 
• Estudo  através  de  andamentos  distintos:  Os  andamentos  praticados  por  S1na  seção 
do  Allegro  di  bravura  e  rubato  estiveram  entre  80bpm  e  120bpm,  andamento  no  qual  foi 
gravada a referida seção, sendo sua abordagem sempre crescente na medida em que os dias 
passaram.  Saliento  que  S1  não  mencionou  ter  utilizado  essa  estratégia  de  estudo  para  as 
outras seções musicais. Por outro lado, S2 utiliza a estratégia na obra inteira, variando entre 
diversos andamentos (semínima entre 65bpm e 90bpm). Apesar de S2 ter mencionado que o 
andamento  da  seção  musical  do  Allegro  poderia  ser  90bpm,  ele  o  gravou  aproximadamente 
em 80bpm.  
• Estudo de passagens difíceis: As passagens consideradas difíceis por S1 e S2 coincidem 
apenas em relação aos harmônicos oitavados da seção musical final da obra: 
 
 

PASSAGENS DIFÍCEIS S1  PASSAGENS DIFÍCEIS S2 

c. 7  ‐ 

c. 12  ‐ 

c. 13  ‐ 

c. 16  ‐ 

‐  c. 95 – c. 98 

‐  c. 120 – c. 124 

c. 132 – c. 135  c. 132 – c. 135 

c. 149  c. 149 

c. 151  c. 151 

c. 154  c. 154 

Tabela 5 – Passagens consideradas difíceis por parte de S1 e S2

S1  mencionou  a  existência  de  oito  passagens  com  algum  tipo  de  problemática  técnica  ou 
interpretativa,  enquanto  S2,  apenas  seis.    Nenhuma  passagem  difícil  foi  apontada  por  S1  na 
seção musical do Allegro di bravura e rubato, apesar de ter sido a seção mais praticada pelo 
violonista.  S2  anotou  duas  passagens  difíceis  da  referida  seção  musical,  não  apontando 

Guitarra Clássica       
 
qualquer problema nas seções anteriores ao Allegro di bravura e rubato.  

Quanto  às  estratégias  não  comuns  aos  dois  sujeitos,  o  estudo  de  timbres  distintos  para  a 
execução do compasso 12 realizado por S1, sendo a única estratégia utilizada que não consta 
no  modelo  analítico  construído.  Apesar  de  S1  ter  acatado  a  digitação  proposta  na  partitura, 
constatei a preocupação com a igualdade de timbres entre as notas harmônicas e melódicas 
da  passagem,  problema  resolvido  com  a  referida  estratégia.  A  abordagem  de  estudo  de  S1 
também  compreendeu  o  estudo  da  técnica  de  ligados,  e  atividades  de  aquecimento  como 
preparação  para  a  execução  final  da  obra,  tais  como  escalas  curtas,  e  a  execução  de 
fragmentos da seção musical do Allegro di bravura e rubato. Para S2, as estratégias de análise 
da estrutura da obra, fixação de objetivos e estudo de dedilhados e digitações distintas foram 
relevantes,  contribuindo  paulatinamente  para  a  compreensão  e  organização  da  Elegy.  
Acredito  que  isso  deve  estar  de  alguma  forma  relacionado  ao  fato  de  S2  ser,  além  de 
violonista, compositor.  

Através da biografia dos sujeitos da pesquisa, e da análise de todas as informações provindas 
dos  diários  de  estudo,  entrevista  e  questionários,  constatei  que  a  utilização  das  estratégias, 
bem  como  o  enfoque  dado  a  cada  uma  delas  também  está  relacionada,  dentre  outras 
questões,  com  as  características  pessoais  de  cada  instrumentista,  construídas  através  da 
vivência  e  experiência  na  área.  S1  encarou  as  estratégias  de  estudo  como  táticas  e  técnicas 
empregadas nas sessões de prática  com o intuito final de tocar a obra, num processo pouco 
declarativo,  por  não  ter  apontado  em  seus  diários de  estudo  pensamentos  ou  dúvidas  sobre 
qual estratégia utilizar. Isso demonstra que, além de S1 já possuir um repertório de estratégias 
armazenadas  para  as  diversas  situações  e  dificuldades  apresentadas  pela  obra,  ele  soube 
exatamente quando utilizá‐las. S2, por outro lado, não realizou depoimentos que remetessem 
à  identificação  de  estratégias  pré‐concebidas.  As  estratégias  utilizadas  por  S2  durante  seu 
processo  de  estudo  apareciam  na  medida  em  que  sua  percepção  do  discurso  musical  ia 
melhorando,  sobretudo  através  da  análise  da  estrutura  da  obra.  As  modificações  nas 
articulações  da  seção  do  Allegro  di  bravura  e  rubato  também  demonstraram  que  o  objetivo 
principal  de  S2  na  construção  da  execução  musical  da  Elegy  foi  “seguir  a  percepção  do 
desenho da música, o contorno das frases, e a direção das linhas melódicas”.  

Saliento ainda que nenhum dos guitarristas comentou sobre o significado do termo elegia, que 
dá  título  à  música,  nem  mesmo  da  concepção  retórica  de  tristeza,  sofrimento  ou  caráter 
fúnebre, expostos nos legatos em semitom e escalas descendentes cromáticas. Também três 
estratégias  do  modelo  analítico  não  foram  mencionadas  em  nenhum  momento  durante  o 
processo:  o  estudo  de  mãos  separadas  (CHAFFIN,  2002;  PROVOST,  1992),  estudo  mental 

Guitarra Clássica       
 
(GIESEKING  E  LEIMER,  1972;  JORGENSEN,  2004),  e  o  estudo  através  de  gravações  da  própria 
execução  (JUSLIN,  2004;  JORGENSEN,  2004;  DANIEL,  2001).  O  estudo  de  mãos  separadas, 
apesar de abundante nas pesquisas com pianistas, pode contribuir na prática guitarrística para 
a identificação e o desmembramento de problemas técnicos motores, coordenação e relação 
de força empregada entre as mãos, entre outros.  

Assim,  as  estratégias  de  estudo  podem  constituir  um  caminho  para  a  otimização  da 
performance, e uma conseqüente melhoria qualitativa no campo das práticas interpretativas. 
Como  demonstrado,  a  utilização  e  enfoque  dado  às  estratégias  irão  depender  do  nível  e 
diferenças  individuais  de  cada  intérprete,  construídos  ao  longo  de  suas  carreiras  através  da 
experiência  na  área.  As  estratégias  de  estudo,  no  contexto  da  execução  instrumental, 
promovem  subsídios  práticos  para  o  violonista  resolver  diversos  problemas  técnicos  e 
interpretativos de uma obra, além de igualmente contribuírem para uma melhoria no ensino 
do  instrumento.  Quanto  maior  o  repertório  de  estratégias  de  estudo  que  um  professor 
possuir, mais caminhos poderá oferecer ao seu aluno para a resolução dos diversos problemas 
que permeiam a interpretação e execução musicais.   

   

Guitarra Clássica       
 
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Guitarra Clássica       
 
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Guitarra Clássica       
 
Novvas Gravaçções 
SOLO  DUO:  MATTEO 
M M
MELA  &  LORENZO 
L MICHEL ‐  FERDINA
AND  REBA
AY  – 
GUITAR SONA ATAS  
Por Tiago Casssola Marq
ques 
 

“Este  disco  tenta 


t reparaar  uma  injustiça 
hisstórica.”  Com
m  esta  citaçção  assaz  fo
orte  e 
en
nigmática,  ab
bre‐se  o  bo
ooklet  deste  novo 
dissco,  premiaado  pelas  revistas  italianas 
Am
madeus e Mu
usica, ambass com 5 estre
elas. 

Vo
olta a este esspaço uma m
monografia,  desta 
vez sobre um ccompositor m
menos conhe
ecido, 
maas  que  o  tem
mpo  dirá  co
om  justiça  o  lugar 
qu
ue  merece  na 
n nossa  histtória  da  música  e 
paarticularmentte na históriaa da guitarraa.  

Ferdinand  Rebay  (1880‐1953


3),  composito
or  nascido  em 
e Viena,  é  possuidor  de  uma  vastaa  obra 
para guitarra, graande parte dela desconhecida ou porr editar, que vai desde so
onatas e variiações 
para  guitarra solo
o até pequen
nas ou grand
des formações em duos, trios ou sep
ptetos geralm
mente 
com  outros  insttrumentos  de 
d sopro.  As 
A suas  obras  são  reveeladoras  de  uma  inequ
uívoca 
qualid ositiva, onde se denotam influências de Brahms, W
dade compo Wagner ou R
Richard Strau
uss no 
tratamento da to
onalidade, nu
um estilo póss‐Romântico. Embora po
or vezes anaccrónico, dado
o que, 
apareentemente,  não  pretend
de  fazer  quaalquer  aproxximação  à  música 
m da  seegunda  esco
ola  de 
o  ao  lado  daa  densidade  de  Castelnuovo‐
Vienaa,  no  reperttório  guitarrrístico  poderremos  pô‐lo
Tedesco, Ponce,  ou Villa‐Lobos, com as d
devidas distââncias às carracterísticas  da música d
de raiz 
mânica.  As  su
germ uas  obras  são  revelado
oras  de  umaa  forte  inspiração  meló
ódica,  equilíb
brio  e 
engenho  no  trataamento  das  vozes,  num
ma  escritura  quase  camerística,  de  fo
ormas  clássicas,  e 
um  interessante  conhecimeento  idiomáttico  da  partte  instrumeental.  A  fam
miliaridade  com 
c a 
músicca vocal, corral e instrum
mental, provaavelmente é  um legado d
dos estudos  no Conservatório 
da  caapital  austríaaca.  Aluno  de 
d Fuchs  e  de 
d Mandyczzevski,  a  este  último  se  deve  a  profunda 
admiração pela m do praticamente uma fo
música de Scchubert, send onte inesgotáável de inspiiração 
para as suas composições em
m forma de vaariações sobre temas do imortal com
mpositor de liieder. 

m neste disco
Assim o encontram
mos duas das seis sonatass para guitarrra solo compostas por R
Rebay, 
as  Va
ariações  sob
bre  um  tema
a  de  Schubeert,  e  ainda  um  curioso  Grande  Duo
o  para  Guita
arra  e 
Quintt‐bassgitarree. Se pouco cconhecimentto existisse  em relação àà música de  Ferdinand R
Rebay, 

Guita
arra Clássica     
 
já  os  intérpretes  têm  vindo  a  fomentar  uma  carreira  de  altíssimo  nível  pelos  mais  famosos 
palcos  internacionais.  Seja  em  duo  ou  a  solo,  as  interpretações  de  Mela  &  Micheli  têm  sido 
agraciadas com óptimas críticas aos seus concertos e às suas inúmeras gravações. Imprimindo 
uma  carreira  pautada  pela  descoberta  e  interpretação  de  música  mais  invulgar  ou  pouco 
conhecida e por interpretações muito expressivas e virtuosísticas, deste duo, sem desvalorizar 
a  qualidade  de  Matteo  Mela,  sobressai  individualmente  Lorenzo  Micheli,  afirmando‐se  cada 
vez mais como uma personalidade incontornável da nova geração de guitarristas italianos com 
projecção  internacional.  Repartindo  a  interpretação  das  sonatas  a  solo,  os  dois  virtuosos 
juntam‐se  no  Grande  Duo.  Também  neste  disco  os  dois  intérpretes  correspondem  às 
expectativas.  Fraseados  muito  claros  e  equilibrados,  virtuosismo  e  elegância  nas  passagens 
mais densas, expressividade e compreensão perfeita do discurso musical fazem da sua audição 
um enorme prazer pela descoberta desta música ainda desconhecida. 

Gravado entre 2007 e 2008 e acabado de editar pela Stradivarius, apresenta‐se com um design 
ligeiro  e  interessante.  O  som  da  captação  é  excelente,  notando‐se  todas  as  nuances 
pretendidas  pela  execução  primorosa  dos  dois  guitarristas.  Este  disco  junta‐se  a  outros 
grandes discos de uma extraordinária colecção de 20 volumes da editora italiana. 

Pela  interpretação  sempre  fiável  ou  pelo  prazer  de  ouvir  música  nova,  este  é  um  belo  disco 
que sem dúvida vale a pena ter, e que pode ser encontrado numa loja da vossa confiança ou 
através  da  www.amazon.com/Ferdinand‐Rebay‐Guitar‐Sonatas/dp/B003V9EIH8  ($8.99),  a  um 
preço atraente.   

Ferdinand Rebay – Guitar sonatas 

Solo Duo: Matteo Mela & Lorenzo Micheli, guitars 

Obras: Grosses Duo für Gitarre und Quint‐Bassgitarre (Lorenzo Micheli, guitar; Matteo Mella, 
Quint‐Bassgitarre); Variationen über Schuberts Wiegenlied (Lorenzo Micheli); Sonate in A moll 
für Gitarre‐solo (Matteo Mela); Sonate in D moll für Gitarre (Lorenzo Micheli) – t.t. 68’43” 

Stradivarius, STR 33859  

   

Guitarra Clássica       
 
Págiinas com Música 

 
Trêss meninas–– Manuel Tavares

Sobrre a obra: 
"Estass três pequenas peças surggiram em altuuras temporaiss distintas quee não sei preccisar, com o teempo decidi 
que seeria interessa
ante agrupá‐la
as numa só ob
bra porque o  seu carácter  assim o parece permitir. A
As pequenas 
peçass tornaram‐se assim em and
damentos con
ntrastantes qu
ue respeitam a
a velha fórmu
ula rápido ‐ len
nto ‐ rápido. 
A prim
meira peça toma assim a fo
forma de uma
a espécie de prelúdio barroco com um sa
abor grave e iintrodutório 
que  a 
a tonalidade  de 
d Ré menor  tão  bem  emp
presta  à  guita
arra.  Para  o seegundo  andamento  escolh
hi  uma  peça 
com u
um tema lírico
o, quase mela
ancólico, mas  que vai busca
ar traços lumiinosos à tona
alidade de Lá M
Maior. Para 
último
o  andamento
o  volto  a  Ré  menor 
m e  prop
ponho  uma  da nas  que  vai  buscar  o  seu 
ança  com  inffluências  latin
movim
mento  a  pequ
uenas  célulass  rítmicas  quee  acentuam  o 
o vigor  e  coeesão  estrutura
al  da  peça.  Apenas 
A uma 
destas pequenas peças não posssuía originalm
mente um nom
me feminino (a
a primeira qu
ue rebaptizei ccom o nome 
mé em homena
Salom agem à minha
a filha) daí o n as." 
nome da obra,, Três menina

Manu
uel Tavares 
 

Manuel  Tavvares  nasce eu  no 


P
Porto.  Commeçou  os  seus 
e
estudos  muusicais  na  Escola 
E
P
Profissional  de  Música  do 
P
Porto  onde  estudou  gu uitarra 
c
com  Christo opher  Lyall,  Paula 
M
Marques  e  AAugusto  Paccheco. 
E 1996  iniciou  o  cursso  de 
Em 
L
Licenciatura  em  Ensino  da 
M
Música  na  Universidad de  de 
A
Aveiro,  na  áárea  específica  de 
g
guitarra,  sob b  a  orientaçãão  de 
Paulo  Vaz  de  Carvvalho. 
Conncluiu  a  Liccenciatura  sob s a 
orientaçção  de  Jozzef  Zsapka,  com 
quemm  estudou  mais 
m dois  an
nos  após  finalizar  o  cu pou  em  várrias  master  class. 
urso.  Particip
Conjuugou  o  estudo  de  guittarra  com m  a  a
actividade  de  doccente. 
Em 2009 concluiu u o mestrado o em perform mance (música de câmara) na Univeersidade de A Aveiro 
sob  a 
a orientação  da  Professoora  Helena  Marinho 
M e  co
o‐orientaçãoo  do  Professsor João  Ped dro  De 
Alvarrenga  (componente  teeórica)  e  do  guitarristta  Odair  Assad 
A (comp ponente  práática). 
Leccioona actualm
mente no Con nservatório dde Música de e Ovar. Deseenvolve igualmente activvidade 
no caampo da mússica antiga ccomo executante de vihu uela e guitarrra latina em  várias formaações.

Guita
arra Clássica     
 
Salomé
Allegro Manuel Tavares

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© Manuel Tavares
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© Manuel Tavares
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