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Universidade Católica do Salvador

Superintendência de Pesquisa e Pós-Graduação


Mestrado em Políticas Sociais e Cidadania
Trabalho e Questão Social
Professora: Dr. Angela Borges
Semestre: 02/2010

NEOLIBERALISMO E PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO


DOCENTE
Virgílio Alberto S. Pinto1

RESUMO: O artigo pretende discutir a reestruturação produtiva do sistema


capitalista mundial, suas relações com a reforma educacional neoliberal a partir
da década de 1990 no Brasil e atuais condições de trabalho dos docentes de
escolas públicas brasileiras em decorrência dessas reformas, tendo como
referência, uma revisão bibliográfica que demonstram um contexto de
reestruturação do trabalho docente. Entende-se que a reestruturação produtiva
assistida de forma mais ostensiva nas duas últimas décadas, impôs à
educação escolar, novos paradigmas oriundos do mundo do trabalho, sob a
lógica do mercado, com relação aos seus objetivos, refletindo em mudanças
nas formas de concepção, gestão e organização do trabalho na escola. O
conjunto de mudanças gestadas nos subterrâneos do mercado, que
fundamentou as reformas educacionais mais recentes têm resultado em
intensificação do trabalho docente, promovendo um processo de precarização
da atividade laboral docente, conseqüentemente, em maiores desgastes e
insatisfação por parte desses trabalhadores.

Palavras-chave: Neoliberalismo. Reestruturação Produtiva. Trabalho docente.


Educação e trabalho. Profissão docente.

ABSTRACT: The article discusses the productive restructuring of the global


capitalist system, its relations with the neoliberal educational reform from the
1990s in Brazil and current working conditions of teachers in public schools in
Brazil as a result of these reforms, having as reference, a review which show a
context of restructuring the teaching work. It is understood that the restructuring
process assisted in more overt in the last two decades, he brought to school
education, new paradigms from the world of work, under the logic of the market
with respect to their goals, reflecting changes in the forms of design,
management and organization of work at school. The changing gestated in the
underground market, which funded the recent educational reforms have caused
the intensification of teachers' work, promoting a process of impoverishment of
the teacher labor activity, consequently increasing weariness and dissatisfaction
on the part of those workers.

1
Mestrando em Políticas Sociais e Cidadania pela Universidade Católica do Salvador.
2

Keywords: Neoliberalism. Productive Restructuring. Teaching. Education and


work. Teaching profession.

Introdução

O século XX foi palco de mudanças profundas na forma e conteúdo


capitalista, seja no seu espaço de produção, no chão de fábrica, seja na sua
esfera política. Na primeira quadra daquele século, o mundo capitalista
introduziu mudanças organizacionais no seu processo gerencial e produtivo
resultando num novo paradigma denominado fordismo/taylorismo, proposto por
Taylor adotando na produção de mercadorias o controle do trabalho que até
então envolvia a definição das tarefas, jornada de trabalho, normas para evitar
distração ou diminuição do ritmo de trabalho impondo uma dinâmica no sistema
industrial com a produção em série com mudanças na forma de produção e nas
relações capital e trabalho, quando da adoção dessas teses, por Henry Ford,
na primeira metade do século XX, em Detroit, EUA, ao colocar em prática as
teorias de Taylor, lançando a produção em série.
Tal estrutura combinada com possibilitou ao sistema capitalista uma taxa
de lucro elevada, garantindo a reprodução do capital e desenvolvimento
econômico com altas taxas de crescimento do PIB nos países centrais e alguns
países periféricos, principalmente no pós-guerra, apesar de surtos de crises
localizadas, gestadas pela natureza cíclica de crise do sistema. A exemplo
disso, Marcio Pochmann (2001. P. 36) afirma que o Brasil foi um dos países
com maior crescimento do PIB, entre as economias capitalistas entre as
décadas de 1890 e 1980, com um crescimento médio em quase 7% a partir da
segunda metade do século XX.
Esse período da economia mundial entre as décadas de 1930 e 1970,
marcado pela hegemonia política e econômica dos Estados Unidos, no bloco
capitalista, ficou conhecido como a era de ouro do capitalismo mundial. A partir
da década de 1970, grandes transformações na economia capitalista mundial
ocorreram e tiveram grande impacto no mundo. É aqui que ocorre uma ruptura
no tecido sociopolítico e econômico do sistema capitalista mundial que será
denominado pelo pensamento acadêmico de reestruturação produtiva e que irá
transformar todas as esferas da totalidade histórica.
3

Nessa quadra da história, as contradições sistêmicas capitalistas se


impõem como que num efeito dominó em sucessivos fatos que criam as
condições de ruptura com o modelo fordista impondo uma reestruturação
produtiva a partir de uma crise estrutural do capital iniciada nos anos 70, que
Antunes (2000, p. 29-30) entende está fundada em alterações na taxa de lucro
global, na retração do consumo, concentração de capital com grandes fusões
empresariais, crise fiscal com arrefecimento do welfare state, etc.
Tal crise tem entre seus vários fundamentos a desqualificação do
trabalho e um elevado desenvolvimento da maquinaria, criando uma
contradição que comprometeria as elevadas taxas de lucratividade até então.
As fragilidades deste modelo vão aparecer quando eclodem as crises de
demanda e do Estado de Bem estar, mostrando sua incapacidade para
responder aos desafios colocados por ambas. Esse revés no setor produtivo
implicou na mudança de paradigma estrutural na sociedade capitalista mundial,
criando a necessidade de outro padrão de produção e um novo trabalhador.
Aqui está a gênese do novo modelo produtivo denominado toyotismo fundado
na demanda de flexibilização do trabalho e da superestrutura que fundamenta
o Estado capitalista.
Nesse contexto reacende a teoria liberal da gênese do capitalismo sob a
forma do ‘neo’, criando a onda neoliberal enquanto teoria política e econômica
que assume o debate contra a crise sistêmica, defendendo o equilíbrio
macroeconômico, a eficiência e a competitividade.
É essa tese que vai dá o rumo da reforma do Estado e, principalmente
da educação, com o argumento de que a “nova” ordem econômica exige um
novo homem, um novo trabalhador, portanto uma nova qualificação, colocando
a estrutura da educação a serviço da formação desse novo trabalhador, o que
implica numa mudança de paradigma docente, principalmente da escola
pública, com políticas de gênese mercadológica que precariza o fazer laboral
do professor.

NEOLIBERALISMO, REFORMA EDUCACIONAL E PRECARIZAÇÃO DO


TRABALHO DOCENTE

O mundo do capital produtivo e financeiro impôs uma reforma ao


Estado-Providência que abarcou todos os setores da esfera pública,
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principalmente as políticas sociais como educação. Nesse cenário, os EUA e o


mundo europeu também vem rearticulando seu sistema educacional com
orientações neoliberais baseadas na eficiência e equidade, marcadamente por
uma preocupação mais orçamentária que social, mais econômica que humana
– ou para um grupo específico e pequeno de humanos.
O Brasil, enquanto economia capitalista periférica, não está fora desta
reestruturação do sistema socioeconômico mundial.
A partir da década de 1990, o impulso ideológico do toyotismo
atingiu, com mais vigor, o empreendimento capitalista no Brasil, no
bojo do complexo de reestruturação capitalista e do ajuste neoliberal
propiciado pelos governos Collor e Cardoso. A intensificação da
concorrência e a proliferação dos valores de mercado contribuíram
para a adoção da nova forma de exploração da força de trabalho e de
organização da produção capitalista no Brasil. (ALVES, 2007, p.
158).

No bojo dessa reestruturação do sistema capitalista no Brasil está a


educação pública, que, ao apresentar problemas estruturais espelhados nos
resultados acadêmicos baixíssimos dos educando, é alvo das reformas
neoliberais.
Tal mudança no paradigma educacional mundial foi forjada no interior do
Banco Mundial por uma elite de especialistas preocupada em alinhar a
educação aos ditames do sistema produtivo e financeiro mundial que busca
instaurar um debate propositivo em escala mundial sobre a reorganização do
sistema educacional dos países capitalistas:
O primeiro desses eventos é a “Conferência Mundial sobre Educação
para Todos” realizada em Jomtien, Tailândia, de 5 a 9 de março de
1990, que inaugurou um grande projeto de educação em nível
mundial, para a década que se iniciava, financiada pelas agências
UNESCO, UNICEF, PNUD e Banco Mundial. A Conferência de
Jomtien apresentou uma “visão para o decênio de 1990” e tinha como
principal eixo a idéia da “satisfação das necessidades básicas de
aprendizagem”. (FRIGOTTO e CIAVATTA, 2003, p. 97-98).

A Conferência Mundial sobre Educação para Todos realizada em


Jomtien, Tailândia apontava os caminhos que o capital financeiro deveria tomar
em relação aos problemas da educação:
Será necessário um aumento substancial, a longo prazo, dos
recursos destinados à educação básica. A comunidade mundial,
incluindo os organismos e instituições intergovernamentais, têm a
responsabilidade urgente de atenuar as limitações que impedem
algumas nações de alcançar a meta da educação para todos. Este
esforço implicará, necessariamente, a adoção de medidas que
aumentem os orçamentos nacionais dos países mais pobres, ou
ajudem a aliviar o fardo das pesadas dívidas que os afligem.
5

Credores e devedores devem procurar fórmulas inovadoras e


eqüitativas para reduzir este fardo, uma vez que a capacidade de
muitos países em desenvolvimento de responder efetivamente à
educação e a outras necessidades básicas será extremamente
ampliada ao se resolver o problema da dívida. (ONU, 2008).

A preocupação dos participantes da Conferência Mundial sobre


Educação para Todos realizada em Jomtien está fundada no caos instaurado
na educação mundial, com sua “qualidade” incompatível com os reclames da
reestruturação produtiva do capital. Eric HOBSBAWN corrobora com esse
debate ao analisar com profundidade a sociedade capitalista ocidental em sua
obra a Era dos Extremos: O breve século XX, destacando de forma singular as
implicações sobre o menosprezo para com a educação, nos países
subdesenvolvidos ou em desenvolvimento:
“(...) A educação primária, isto é, a alfabetização básica, era
na verdade a aspiração de todos os governos, tanto assim que no fim
da década de 1980 só os Estados mais honestos e desvalidos
admitiam ter até metade de sua população analfabeta, e só dez –
todos, com exceção do Afeganistão, na África – estavam dispostos a
admitir que menos de 20% de sua população sabia ler e escrever. E a
alfabetização fez um progresso sensacional, não menos nos países
revolucionários sob governo comunista, cujas realizações neste
aspecto foram de fato as mais impressionantes, mesmo quando as
afirmações de ter ‘liquidado’ o analfabetismo num período
implausivelmente curto eram às vezes otimistas. Contudo, se a
alfabetização em massa era geral ou não, a demanda de vagas na
educação secundária e sobretudo superior multiplicou-se em ritmo
extraordinário. E o mesmo se deu com o número de pessoas que
tinham tido ou estavam tendo” (HOBSBAWN, 1995, p. 289/290).

Esse quadro tenebroso de ausência de escolarização e fracasso escolar


inaugurou o paradigma de avaliação ou medição da qualidade da educação,
buscando dimensionar as metas estabelecidas nos acordos internacionais,
baseados na eficiência, eficácia e equidade da educação.
Essa idéia de medir os resultados da educação pública baseada na
eficiência e eficácia tem origem na ciência econômica, usada para medir, aferir
a qualidade dos investimentos nos diversos ramos da economia privada. Tal
proposição foi introduzida no campo educacional a partir do ideário neoliberal
de reestruturação do Estado que tem na educação um viés de produtividade e
no cidadão um consumidor dos serviços públicos enquanto produtos.
Para Belmiro Gil Cabrito, a origem “a avaliação no sentido de melhorar a
qualidade desenvolveu-se nos meandros da economia e da finança, e a ela
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não será estranho a necessidade de medir em termos econômicos a


rentabilidade do investimento aplicado”.(CABRITO, p. 179).
Entretanto, a avaliação no âmbito da educação pública sempre pautou a
dimensão aluno. Avaliava-se, apenas o rendimento acadêmico dos alunos. A
partir da reestruturação do sistema educacional com a Constituição de 1988 e
a LDB 9394/96 uma nova perspectiva avaliativa se impôs pelo princípio da
“qualidade”.
Então a avaliação vai ser pautada pelos resultados negativos da
educação pública que não atendem à nova ordem econômica mundial
globalizada onde a competitividade do sistema produtivo entre nações é fator
determinante de estabilidade e crescimento econômico.
A reforma educacional na década de 1990, ganha força com o ideário
neoliberal, imperativo no governo de FHC, baseado na concepção de
“qualidade total”. Para Maria Malta Campos, os organismos multilaterais
(Banco Munidial, Fundo Monetário Internacional), influenciam nas reformas
educacionais na América Latina pautando a implantação de sistemas
educacionais fundados nos princípios da “qualidade total”.
“(...) elas também são parte integrante das reformas
educacionais desenvolvidas nos países latinos americanos,
influenciadas pelos acordos e convênios firmados com agências
multilaterais, os quais trazem em suas cláusulas a previsão de projetos
de monitoramento e avaliação das políticas implantadas nas redes
escolares públicas, com a preocupação de estimar as relações de
custo-benefício dessas intervenções e subsidiar a continuidade das
reformas”. (CAMPOS, 2000, p. 07).
Se for verdade que o sistema educacional está fundado na ideologia
dominante, o ideário de qualidade da educação desenvolvida no interior desse
sistema estará também articulado nos seus fundamentos. Sobre tal relação
entre avaliação e interesses ideológicos reformistas, Marília Fonseca apresenta
a indicação da política de avaliação pensada pelo Banco Mundial para
educação publica brasileira:
O MEC negociava com o Banco Mundial outro acordo para o
desenvolvimento da educação fundamental nos estados do Nordeste (Projeto
Nordeste), cuja execução dar-se-ia na década de 1990. No plano das ações,
este acordo dava continuidade ao Projeto EDURURAL, encerrado em 1987.
Uma das propostas do Banco era dar seguimento ao processo de avaliação
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externa desenvolvido nos projetos anteriores, desta feita, alcançando o


desempenho do aluno, dos professores e da rede escolar. A proposta acordada
entre o MEC e o Banco era estender a avaliação à totalidade do sistema
educacional. De fato, as experiências avaliativas efetuadas nos âmbito dos
acordos internacionais deram suporte aos projetos nacionais de avaliação que
se consolidariam na década de 1990 e que se constituiriam a principal
referência para a qualidade educacional. (FONSECA, 2009., p. 165).
Observamos que a autora aponta três dimensões a serem avaliadas,
segundo o Banco Mundial: a dimensão aluno, a dimensão professor e a
dimensão rede escolar. Todas elas contempladas no arcabouço da reforma e
em curso na conjuntura atual.
Quando destacamos tais elementos não nos posicionamos contrários à
avaliação, queremos desvelar a sua lógica. A que se pretende avaliar tais
dimensões? Em detrimento da qualidade do ensino e das escolas? Sob que
ótica?
Novamente nos deparamos com a questão da qualidade. É aí que
abrimos um debate propositivo acerca do tipo de qualidade que esta pensada
para a escola pública brasileira. Se o conceito de qualidade está alicerçado nos
fundamentos da reforma como pontuamos aqui, então nos cabe buscar
entender o pensa o Banco Mundial. Inquirirmos se o que os executivos dos
organismos internacionais ligados ao capitalismo financeiro pensam sobre
educação é o que necessitam os alunos, professores e pais de alunos das
nossas escolas públicas. Sobre essa questão, analisando o Comunicado da
Comissão das Comunidades Européias ao Conselho e ao Parlamento Europeu
sobre a eficiência e equidade da educação e formação de professores,
observamos que tais preocupações estão intimamente ligadas às exigências do
mercado mundial que é competitivo.
O conselho Europeu da Primavera de 2006 definiu os dois desafios que
se colocam aos sistemas de educação e formação, ao concluir que são
factores determinantes para o desenvolvimento do potencial de
competitividade da EU alongo prazo e para a coesão social. Afirmou
ainda que é necessário acelerar os processos de reforma para garantir
a existência de sistemas de educação e formação de grande qualidade
e simultaneamente eficientes e equitativos. Estes aspectos são
fundamentais para o crescimento e o emprego e no método aberto de
8

coordenação aplicado à inclusão social e à proteção social. (UNIÃO


EUROPÉIA - U.E, 2006., p. 02).
Nesse diálogo fica claro que se impõe outro paradigma de
educação. Não cabe reproduzir conteúdos como se treinássemos pessoas para
uma única ação. O contraponto da ação flexível, polivalente, gerencial exige
uma subjetividade, exige-se tomada de decisão no interior do processo
produtivo.
Então se reclama outro modelo de qualidade. Contudo há que se
preparar essa nova subjetividade com cuidado para que o novo trabalhador
sirva ao velho sistema produtivo que se multifaceta. A qualidade da educação é
outra. Não é só ler e escrever e contar. Esse mundo globalizado necessita de
outras habilidades e competências. Então deve se reformar o sistema
educativo buscando modelar a construção da visão de homem, educação,
mundo e sociedade ao seu interesse. Os ajustes organizacionais dos sistemas
educacionais seguem a lógica da do sistema produtivo, pois tal sistema
depende da educação básica para “qualificar” a sua mão de obra. Há de se
perguntar: Que tipo de educação?
Sobre essa questão, Frigotto afirma:
Trata-se de uma educação e formação que desenvolva
habilidades básicas no plano do conhecimento, das atitudes e dos
valores, produzindo competências para a gestão da qualidade, para a
produtividade e competitividade e, consequentemente, para a
“empregabilidade”. Todos estes parâmetros devem ser definidos no
mundo produtivo, e, portanto os intelectuais coletivos confiáveis deste
novo conformismo são os organismos internacionais (Banco Mundial,
OIT) e os organismos vinculados ao mundo produtivo de cada país.
(FRIGOTTO, 1998. p.45).

Sobre esses princípios de qualidade baseado na competência, que vão delineado o


novo modelo de educação no mundo inteiro, esse mesmo autor cita a preocupação da CEPAL,
já em 1990, em reformar os sistemas educacionais sob os princíos da cidadania e da
competitividade:
Ainda em 1990, a CEPAL publicou Transformación productiva con
equidad, que enfatizava a urgência da implementação de mudanças
educacionais em termos de conhecimentos e habilidades específicas,
demandadas pela reestruturação produtiva. Em 1992, a CEPAL volta
a publicar outro documento sobre o tema, Educación y conocimiento:
eje de la ttransformación productiva con equidad, vinculando
educação, conhecimento e desenvolvimento nos países da América
Latina e do Caribe. A urgência era de uma ampla reforma dos
sistemas educacionais para a capacitação profissional e o
aproveitamento da produção científico-tecnológica ou, em outros
termos, dos objetivos “cidadania e competividade”, critérios
inspiradores de políticas de “eqüidade e eficiência” e diretrizes de
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reforma educacional de “integração nacional e descentralização”


(FRIGOTTO, 1998. p. 98).

Se a qualidade da educação na reforma estatal em curso move-se na


lógica da produção e do consumo, então cabe questionar: Onde entra a lógica
da formação e avaliação do professor? Observamos que ambas estão
enquadradas na mesma lógica, a do capital. Essa lógica foi a bússola das
reformas européias:
Com um de nós já tive oportunidade de mostrar (Neto-
Mendes, 1999), a orientação das políticas educativas para o mercado
foi desenvolvida nos anos 80, em Inglaterra, sob a governação de
Margaret Thatcher. Dando corpo a uma matéria complexa e que tem
suscitado os mais vivos debates. (NETO-MENDES, 2003).

Esse autor traz alguns constructos que segundo ele caracterizam esse
paradigma mercadológico na educação:
(...) o mercado da educação caracteriza-se por apresentar
quatro pilares fundamentais que ajudam também à sua compreensão:
i) liberdade de escolha da escola por parte dos pais (“parental
choice") incrementadora, como se disse antes, da concorrência entre
escolas; ii) promoção da diversidade da oferta escolar, baseada na
ideia de que “quem escolhe deve possuir uma pluralidade
suficientemente ampla de opções no acto da escolha" (Neto-Mendes,
1999: 43); iii) autonomia das escolas, assistindo-se a uma retórica de
defesa do governo local das escolas por oposição a uma outra forma
de descentralização, em Inglaterra, que dava às autoridades locais de
educação (as LEA, “local education authorities") margens
significativas de decisão, isto é, trata-se de uma autonomia de escola
associada a uma recentralização das políticas educativas; iv) cortes
nas despesas com a educação, por outras palavras, é a crise
económica dos anos 70 e 80 um dos “pretextos invocados para
questionar o peso preponderante do Estado na orientação do sistema
educativo, pedra de toque para o avanço alternativo do mercado"
(Neto-Mendes, 1999: 48). (Neto-Mendes, Costa y Ventura, 2003,p. 3).

Observamos que há uma questão de fundo que é imperativa para


entendermos o contexto da educação e o paradigma que se impõe para as
escolas públicas. O professor requerido é o dos moldes da empresa capitalista
que visa o lucro e nessa política os alunos são os clientes.
A retórica neoliberal resume este modelo na palavra qualidade. Dita
como se fosse uma palavra mágica que representasse uma que idéia definitiva,
do tipo Oitava maravilha do universo: a excelência do ensino e da pesquisa,
professores competentes, domínio de conteúdos, científicos substantivos de
alto nível e de conhecimentos instrumentais, pesquisas de ponta capazes de
gerar tecnologias competitivas na aldeia global, alunos aptos a ingressarem no
mercado internacional etc.
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Se a gestão e qualidade da educação são pautadas pelos ditames do


mercado, logo, cabe aos professores operacionalizarem tal objetivo. Aqui um
novo paradigma de trabalho docente se impõe pela reforma neoliberal no Brasil
a partir da década de 1990, com o governo de Fernando Henrique Cardoso:
O projeto de educação básica do Governo Cardoso afirma-se sob a
lógica unidimensional do mercado, explicitando-se tanto no âmbito
organizativo quanto no do pensamento pedagógico. Como as idéias
de um projeto de desenvolvimento “nacional popular” e autônomo
passaram a ser ridicularizadas, também o foi a perspectiva de uma
educação básica omnilateral, politécnica ou tecnológica. (FRIGOTTO,
1998. p. 98).

Esse governo adota a lógica capitalista de “redução de gastos e


maximização de lucro”, instaurando uma competição entre os entes federativos
pelo número de alunos, pois as escolas se transformam em “empresas”.
Contudo, a regulação das políticas educacionais destaca fatores que indicam
isso, dentre eles a centralidade atribuída à administração escolar nos
programas de reforma, elegendo a escola como núcleo do planejamento e da
gestão; o financiamento per capita, com a criação do Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério
(FUNDEF), por meio da Lei n. 9.424/96; a regularidade e a ampliação dos
exames nacionais de avaliação (SAEB, ENEM, ENC), bem como a avaliação
institucional e os mecanismos de gestão escolares que insistem na
participação da comunidade. Essa nova regulação repercute diretamente na
composição, estrutura e gestão das redes públicas de ensino. Trazem medidas
que alteram a configuração das redes nos seus aspectos físicos e
organizacionais e que têm se assentado nos conceitos de produtividade,
eficácia, excelência e eficiência, importando, mais uma vez, das teorias
administrativas as orientações para o campo pedagógico.
Essa mudanças colocam os professores na centralidade de todas as
questões do processo educacional enquanto principal agente da reforma:
Muito se tem discutido sobre a centralidade dos professores,
nos programas governamentais, como agentes responsáveis pela
mudança nos contextos de reforma. (...) São, em geral, considerados
os principais responsáveis pelo desempenho dos alunos, da escola e
do sistema. Diante desse quadro, os professores vêem-se, muitas
vezes, constrangidos a tomarem para si a responsabilidade pelo êxito
ou insucesso dos programas. (OLIVEIRA, 2004, p. 1132).

Há uma questão de fundo nesse debate que é a estrutura da carreira


docente, principalmente na educação básica, que não se constitui em objeto de
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mudança no bojo da reforma educacional brasileira, mesmo com a implantação


do Piso Salarial Profissional Nacional – Lei nº 11.738, de 16/7/2008. Apesar de
garantir a base salarial inicial, essa lei foi objeto de contestação no Supremo
Tribunal Federal, da obrigatoriedade de um terço da jornada dos educadores
para atividades de estudo e planejamento escolar, por parte de vários
governadores, alegando inconstitucionalidade da lei. Apesar do STF garantir a
constitucionalidade, negou a ampliação da jornada de planejamento dos
professores. Ora, se a reforma da educação amplia as responsabilidades dos
educadores e educadoras para com o processo de gestão administrativa e
pedagógica e com o sucesso “dos programas”, então há uma clara precarização
profissional.
Admitir tal fato significar aprofundar o debate sobre os novos paradigmas
que envolvem a carreira docente na educação básica. Sobre essa questão,
Dalila Andrade Oliveira traz para o debate as novas demandas e dilemas que
estão postas para os professores ao afirmar que:
O professor, diante das variadas funções que a escola pública
assume, tem de responder a exigências que estão além de sua
formação. Muitas vezes esses profissionais são obrigados a
desempenhar funções de agente público, assistente social, enfermeiro,
psicólogo, entre outras. Tais exigências contribuem para um
sentimento de desprofissionalização, de perda de identidade
profissional, da constatação de que ensinar às vezes não é o mais
importante. (OLIVEIRA, 2004, p. 1132).

O processo histórico que transformou o modelo produtivo capitalista,


através das reformas educacionais, trouxe outra realidade para o trabalho
docente, onde a sala de aula não é mais o único lócus do saber, transmitido ou
reconstruído:
O trabalho docente não é definido mais apenas como
atividade em sala de aula, ele agora compreende a gestão da escola
no que se refere à dedicação dos professores ao planejamento, à
elaboração de projetos, à discussão coletiva do currículo e da
avaliação. O trabalho docente amplia o seu âmbito de compreensão
e, conseqüentemente, as análises a seu respeito tendem a se
complexificar. Mudam também os enfoques teórico-metodológicos.
(idem. p. 1132).

Para entender essa precarização precisamos retornar à gênese


política da reforma da educação brasileira, buscando os princípios do sistema
produtivo no bojo das ações do governo de FHC. Sobre tal busca, Gaudêncio
FRIGOTTO e Maria CIAVATTA retratam claramente que os princípios do
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individualismo, da fragmentação e de uma educação dual, estaão contido na


diretriz pedagógica do novo modelo de educação, gestado sob os marcos do
ideário desregulamentador, privatista adotado pelo MEC sob a égide de
Fernando Henrique Cardoso:

A dimensão talvez mais profunda e de conseqüências mais


graves situa-se no fato de que o Governo Fernando H. Cardoso, por
intermédio do Ministério da Educação, adotou o pensamento
pedagógico empresarial e as diretrizes dos organismos e das
agências internacionais e regionais, dominantemente a serviço desse
pensamento como diretriz e concepção educacional do Estado. Trata-
se de uma perspectiva pedagógica individualista, dualista e
fragmentária coerente com o ideário da desregulamentação,
flexibilização e privatização e com o desmonte dos direitos sociais
ordenados por uma perspectiva de compromisso social coletivo. Não
é casual que a ideologia das competências e da empregabilidade
esteja no centro dos parâmetros e das diretrizes educacionais e dos
mecanismos de avaliação. (FRIGOTTO e CIAVATTA, 2003, p. 108).

A pedagogia da competência que é “cantado” em prosa e verso pelos


arautos do pensamento neoliberal repetido pela mídia como algo positivo para
a educação, tem se naturalizado no seio dos educadores, num processo de
“naturalização” de um pensamento maléfico para a formação do povo e para a
estrutura do trabalho docente. Essa máxima da competência é o ideário que o
mercado anseia e que está em curso no país a partir de várias medidas
adotadas pelo MEC e que tem como ordem do dia a avaliação de desempenho
escolas e do trabalho docente como forma de medir se as políticas adotadas
estão sendo implementadas:
Maria H. Guimarães Castro, secretária da Secretaria de
Ensino Superior (SESU) do Ministério da Educação (MEC) e diretora
do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP),
responsável pela Avaliação Nacional do Ensino Superior (Lei nº
9.131, o “Provão”), pelo Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) e
pelo Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB),9
explicita claramente que as competências que devem ser avaliadas
são aquelas que os empresários indicam como desejáveis.
(FRIGOTTO e CIAVATTA, p. 108).

É na avaliação que a precarização do professor se materializa de forma


mais explicita, pois transfere a responsabilidade do sucesso ou fracasso
escolar para esses profissionais pelo formato avaliativo baseado nos resultados
escolares. Não nos posicionamos contrários a avaliação do trabalho docente,
más a sua forma e conteúdo quando se detem nos resultados e não no
processo pedagógico que humano e rico de cultura. O ente federativo o faz
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como faz o mercado, busca apenas o resultado. Resultado de uma prova, a


certificação, resultado do IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação
Básica) aferido pela quantificação dos resultados da prova Brasil e dos índices
de aprovação e reprovação estabelecidos no Censo Escolar.
Os fatores que levam uma escola a ter um índice maior que outra não
aparece nem é importante na lógica do mercado. Todas são avaliadas de
forma padronizada, seja das áreas populares, seja do centro da cidade, sejam
públicas ou privadas, federal, estadual ou municipal. Mesmo que o
financiamento em cada rede não seja equânime. É a lógica da padronização e
do resultado em detrimento do processo.
Essa proposta está em curso em vários Estados, como São Paulo,
Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Bahia, etc. Não importa o partido, se PSDB,
PT ou outra agremiação partidária, pode verificar mudanças na foma, más o
conteúdo é neoliberal. O caso do Estado de São Paulo, por exemplo, difere um
pouco da proposta do Governo da Bahia apenas num ponto, aquele oferece um
“bônus” aos professores onde houver melhora nos índices de desenvolvimento
da escola. No caso baiano, alem de elementos presentes no plano paulista
como assiduidade, prova de conhecimento, etc., o bônus é substittuido pela
vantagem de 15% no salário base com a adição da avaliação institucional
desenvolvida pelo Ministério da Educação, alem de outra avaliação escolar
aplicada pela própria Secretaria de Estado:
Art. 1º - Os professores e coordenadores pedagógicos integrantes do
quadro efetivo do Magistério Público do Ensino Fundamental e Médio
do Estado da Bahia deverão submeter-se a processo de avaliação de
desempenho disciplinado neste Decreto, para efeito de promoção nos
graus da carreira.
Parágrafo único - O processo de avaliação será realizado anualmente
sob a coordenação da Secretaria da Educação, que observará as
diretrizes estabelecidas pelo Órgão Central de Recursos Humanos da
Secretaria da Administração, sendo constituído das seguintes etapas:
I - Avaliação Individual, constituída dos seguintes componentes:
a) Assiduidade;
b) Prova de Conhecimentos Específicos e Pedagógicos;
II - Avaliação Institucional, constituída dos seguintes componentes:
a) Indicadores Nacionais adotados pelo Ministério da Educação
-MEC;
b) Avaliação de Desenvolvimento da Unidade Escolar adotada pela
Secretaria da Educação do Estado da Bahia. (BAHIA, 2010)

Observamos que não há uma política de valorização salarial em curso, e


essa avaliação imposta pelo decreto transfere exclusivamente para o conjunto
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dos professores a responsabilidade pelo desempenho dos alunos como se as


questões socioeconômicas e culturais da sociedade não interferissem no
desempenho acadêmico dos alunos. Também não se leva em conta as
dificuldades de aprendizagem combinadas com o desaparelhamento das
escolas.
Se somarmos a esses fatores, a jornada de mais de 40 horas de aulas
praticadas pelos professores para “melhorarem” os salários, então o quadro
profissional é de precarização total, tal qual a precarização do trabalho em
outras atividades no sistema produtivo capitalista.

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