Os patamares da consciéncia
Existem trés patamares
do “eu”, que correspon-
dem a outros tantos pa-
tamares de consciéncia,
diz Antonio Damasio: 0
proto-eu, o eu nuclear
@ 0 eu autobiografico. O
proto-eu é uma coleccéo
de imagens (de padrées
de activacao neural) que
mapeiam os estados
fisicos e fisiolégicos do
corpo a cada instante,
dando origem aquilo que
Damasio chama “sen-
timentos primordiais”,
indispensaveis a regula-
Ao e a manutengao da
vida. O proto-eu surge no
tronco cerebral, a parte
mais “arcaica” do cérebro
em termos evolutivos — e
nao é ainda consciente.
Os peixes, até os insec-
tos, possuem provavel-
mente um “proto-eu”.
O nivel de cu seguinte,
o eu nuclear, surge de
cada vez que um ob-
jecto no mundo exterior
interage com o proto-
eu. Gera-se assim uma
sequéncia de imagens
que podem ser visuais,
auditivas, sentimentos
primordiais, etc., e que
descrevem a relagao
do organismo com esse
objecto. 0 eu nuclear da
origem a consciéncia
nuclear, um estado de
consciéncia de base que
éa cada instante reno-
vado pelas alteracées
que se verificam no
proto-eu. A consciéncia
26 +17 Ousbeo2010 « Publica
nuclear é assim um fluxo
ininterrupto de imagens
de todo o tipo, vindas do
interior e do exterior do
corpo. E uma consciéncia
apenas do “aqui e agora”,
quase sem meméria do
passado e sem qualquer
antecipacao do futuro.
Os mamiferos (sem
duvida), os répteis e as
aves (talvez), diz Anténio
Damasio, possuem ape-
nas este nivel de cons-
ciéncia nuclear. O mesmo
acontece com certos
doentes neurolégicos.
O ultimo patamar da
consciéncia — 0 estado
de consciéncia plena, tal
como os seres humanos
normalmente a conhece-
mos e a sentimos quando
estamos acordados, cor-
responde ao eu autobio-
grafico. Surge quando
objectos da nossa bio-
grafia geram impulsos
de eu nuclear, criando
um auténtico filme da
nossa vida. E essa cons-
ciéncia autobiografica
que nos confere a nossa
identidade, que faz com
que saibamos que somos
nés os donos do nosso
organismo. Obviamente,
requer 0 acesso A nossa
meméria, néo apenas
para sabermos quem
somos mas também para
nos projectarmos no fu-
turo. AG.
produzir um mapa que ésentimento. B €at
‘que me parece que esta o grande segredo
de eriar uma consciéneia sentida endo uma
consciencia de autémato.
Disse que os mecanismos cerebrais que
‘propde agora para a emergéncia da cons
ciéncia sio diferentes...
‘sim, Ha uma dezena de anos, julgava que o
‘mecanismo com que se constroi oeu nuclear
requeriaa participagio do cortex cerebral fa
parte mais evoluida do cérebro, que desem-
penha as fungées cognitivas]. Agora, penso
{que tronco cerebral consegue perfeitamen-
te fazer isso sozinhio.
Isso no quer dizer que o cortex cerebral
tenha ido para as urtigas. Continua a haver
‘uma interacgiio entre o cértex cerebral e0
tronco cerebral. Mas a visio de um cortex
cerebral a fazer tudo parece-me extraordi
nariamente errada,
"Nao posso dizer que alguma vez tenha
acreditado completamente nisso, mas em:
‘bora tenha tido sempre a suspeita de que
hhavia coisas muito importantes para estudar
no tronco cerebral, parecia-me sempre que
9 processo podia ser explicado quase com:
pletamente ao nivel do cortex.
Contudo, jd no ano 2000, lembromme de
ter escrito tim trabalho que apresentamos
nna Nature e no qual transparecia cada vez
mais que o subedrcex tinha de ter um gran:
de papel. No fundo, demorou dez anos a
amadurecer essas elas ¢ er novos di
‘Quanto ao eu autoblografico, sempre pen-
sei que dependia sobretudo do cértex cere:
bral e continuo a pensé-lo, mas hoje acho
que depende sobretudo de uma tegido mul:
to particular do cortex ~ 0 cértex postero-
‘medial ou PMC - ede uma interaccao, que
‘agora me parece vislumbrar, entre o cortex
eo tronco cerebral. Isto é muito diferente
de aqui que eu tinkapropost hua de
Quando fala em subcortex, trata-se de que
estruturas?
Do tronco cerebral e do talamo. 0 talamo,
tal como o apresento no meu livro, € um
sistema intermédio, porque para chegar do
‘ronco cerebral 30 cOrtex cerebral é preciso
passar pelo tilamo. O cortex cerebral tem