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(2007)
NÃO SE MORRE DE AMOR DEBAIXO DESSE SOL TODO
Sossega, nega, não se morre de amor nos trópicos. A morte amorosa é uma
invenção dos que hibernam como ursos da Sibéria ou cinzentos donzelos
alemães...
O tio tenta uma filosofia de consolação para a amiga que sofre e pena entre a
Augusta e a Angélica, pena como se num inferno verde de fitzcarráldica fábula
babilônica labiríntica, a menina sofre tanto, mas tanto, que avoa nas asas da
hipérbole-helicóptera.
Te juega, nega, aqui não se morre dessas coisas. Se o jovem Werther aqui
fosse nascido, até choraria um tanto o seu infortúnio, mas já já algum
vagabundo passaria na sua casa e eles iam tomar um ele & ela (caldinho com
cachaça) na Várzea ou no Pina, freguesia do Recife, iam tirar uma onda na
barraca de Jesus ou no seu Rainha, na mesma cidadela invicta, iam tomar uma
com Franciel, pura ingresia da Bahia, lá nas beiradas do mercado de São
Joaquim, na frente daqueles garajaus com bodes pretos e galinhas idem, além
dos gabirus na lama dos currulepes que ali dançam aos pés dos bêbados,
seres com ou sem asas para trabalhos ao vento, como reza o manual de
zoologia daquele cego portenho.
Sossega, preta, roga uma praga neste peste e pronto, cai de novo na lama
milagrosa do hedonismo. E se a vida atropelar, de nuevo outra vez, na mesma
curva, anota a placa, lindinha, e arrisca o número no jogo do bicho.
“Redentora e fecunda Miss C., não é a primeira nem a última vez que lhe
escrevo esses lacrimosos garranchos, provas da minha vida de m... ah, de
merda mesmo, pronto, falei o que todo mundo aqui já sabe desde que provei o
mingau da inconveniência de haver nascido... Ah, Miss C., não busco mais a
cura, preciso apenas de uma resposta, à guisa de uma aposta aqui entre as
balzacas do bairro dos Aflitos. Gloriosa Miss C., qual a coisa mais difícil dessa
vida: 1) Parar de fumar?; 2)parar de beber?; 3)parar de amar? Ansiosa pela
sua luz, Madá do MADA.
RESPOSTA:
RESPOSTA:
Estimada consulente, para a sua sorte grande, eu vejo aqui nas minhas
cartas que isso é presepada de um tarado vivo, porque tarado do além é bicho
lerdo e preguiçoso para estas malasartes. Vejo mais: isso é munganga de um
tarado de Caridade, aquele bravo município ali na estrada de Canindé(CE).
Confesso ainda: eu morro é de inveja de ti, pois aqui não tem aparecido nem
para o sal, num baixa nem um daqueles ET´s de Quixadá, terra da minha
comadre Raquel de Queiroz. Ora pro nobis. Cariño, da sempre tua Miss
C.Solitários.
Uma biografia guardada como velhas fotos numa caixa de sapato dum
armário edipiano perdido. E se dói, mais um uísque caubói!
“Peréio, eu te odeio”, como no título do filme do Allan Sieber, que vem por ai,
que venga! Peréio, o amor e o ódio, nunca alguma coisa de intermédio, pilar
da ponte do tédio entre um e o outro, como no poema que recita na noite, à
beira dos buracos da existência, salve salve Sá-Carneiro! Merda no amor,
azar na sinuca, cadê aquela linda moça?
“Foi como montar um quebra cabeça sem imagem pra copiar - olhar, sei
lá...”, diz Pinky Wainer, a autora da façanha de fazer dos guardados desse
grande homem um grande livro. Sem essa de o homem, o mito, a lenda viva.
Peréio tira onda também disso tudo. Nós bebemos, não temos esses
problemas de nos autoesculhambarmos sob o o mesmo teto da taberna.
Mas pelo menos que tenha uma sinuca. Pra gente nos entretrer com os
buracos da existência. Garçon!, o uísque e o seu duplo, como sempre,
muito gelo, muito gelo, copo longo, mas sem metáforas, faz favor!
Como é bom tirar uma sesta, abaixar a cortina e dar um risinho safado
para o capital que se esborracha lá fora; como é bom, mesmo para um falido,
ajeitar os travesseiros –de palha ou de pena de ganso- e cerrar os olhos para
sonhos pequenos. Uma sesta à sombra da toda-poderosa Federação das
Indústrias do Estado de São Paulo, a Fiesp, aqui perto do meu esconderijo;
uma sesta com as janelas abertas na rua da Aurora, a rua mais linda do
mundo, de onde avista-se Beberibes, Capibaribes, Áfricas, Tongas e
Polinésias...
A minha sesta ibérica, como na origem do costume, lá no Juazeiro e
Crato. Como é bom tirar uma sesta com uma nega enroscada aos pés, sono
leve de conchinha, colherzinha e quetais. Mas os dois precisam estar no
espírito da sesta. Uma alma em desassosego acaba com qualquer sesta,
sesta-de-favor não vale, sesta, siesta, carece de savoir faire... Um gato ali
pelas nossas costelas –opa!, um felino de carne e osso, um bichano- que
delícia.
Numa sesta não vale sonhos épicos, apenas sonhos pequenos,
daqueles que a gente realiza num piscar de olhos. Ou simplesmente deixa para
lá. Ridículo correr desembestadamente atrás de sonhos. Sonhos são filmes
grátis, que vemos deitadinhos, sem o barulho ridículo de pipoca ou de gente.
“Ei, morena linda que passa, vamos ao cinema?” Ai trago ela para a
sesta. Cinema é travesseiro e pezinho colado.
Os sonhos são feitos pelos cineastas mortos, jeito de ocupar-lhes no
purgatório. Coisa da aliança espúria de Deus e do Diabo.
Sesta: modo de usar. Quanto dura uma sesta? O ideal é que não se faça
o uso do despertador, que não seja um curta-metragem, que seja um filme que
se durma nele inteirinho, que se beije o olho de quem dormir primeiro, como
sempre guardo as minhas mulheres, até com uma rezinha baixinho para nunca
acorda-las e sempre protege-las, ô Deus guarde essa costela colada à minha e
que esse suorzinho seja o superbonder possível, a resina mais grudenta, que
nos livre do fim, amém. Mas o amor acaba, meu filho, sopra um anjo pousado
no ombro de Paulo Mendes Campos, que me diz baixinho, sossega, menino,
esse coração.
A sesta com a bênção das mulheres e da minha mãe. “Meu filho, durma
pelo menos uma meia horinha depois do almoço”. Minha mãe chorava, no dia
em que fui embora, mas nada dizia além da receita da sesta. Mulher de
coragem: deixar aquele graveto, só o couro e o osso, ganhar a estrada apenas
com uma rede que ela botou no fundo da mala...
Como eu queria achar de novo essa rede e tirar a maior das sestas, mas
troquei por alguma coisa, vício, comida, sei lá, entre uns desalmados de um
cortiço do Recife, num sótão ali na Barão de São Borja. Até quando a usei, era
uma rede que balançava lágrimas e meus chinelos sempre acordavam boiando
de manhã.
ELOGIO DA MAQUIAGEM
Há muito tempo, muito tempo mesmo, muito antes dos nossos avós, já
havia a polêmica: a mulher deveria recorrer ou não aos recursos artificiais para
embelezar-se, livrar-se dos pés de galinha e travar a peleja contra a foice do
tempo, como já dizia Shakespeare?
É deveras uma das questões mais enrugadas da humanidade, que
agora alcança o seu momento máximo, em tempos de Botox e até transplante
de rosto, em episódios extremados. Em meados do século XIX, o poeta
Charles Baudelaire, gênio dos gênios, já fazia um chamado para que as
fêmeas superassem as “imposições” da natureza.
“A mulher tem o direito, aliás, ela está até mesmo cumprindo uma
espécie de dever, quando se dedica a parecer mágica e sobrenatural”, pregava
no seu breve ensaio “Elogio à maquiagem”. Segundo o francês, um dos
inventores do que chamamos hoje de modernidade, não importava qual fosse o
truque feminino, o que valia era o seu efeito irresistível.
Ovídio, mais das antigas ainda, como sempre me lembra Miss Soledad,
também gastou o latim com a polêmica da cosmética.
Estariam o velho Charles e o escriba romano mortos de felizes nos
tempos que correm?
E vocês, meus amores, que acham? Opiniões serão bem-vindas. E fica
ai em BG, Marina morena, um plá direto da rede do glorioso Caymmi, com
barulhinho das ondas ao fundo...
E para complicar mais ainda as coisas por estas bandas, sampleio um
velho catecismo de devoções, adonde se lê, crônica de costumbres:
Nada de acreditar nessa historinha de “você já é bonita com o que Deus
lhe deu!” Dorival, saravá meu pai!, é uma beleza de homem, sábio, mas esse
verso, aqui neste momento, não soa bem aos ouvidos. Pinte esse rosto que eu
gosto e que é só seu. Com todos aqueles lápis que lhe fazem uma criança
brincando de colorir o desejo tenha ou não tenha um belo cavaleiro no seu
horizonte.
DO MANUAL DE CIVILIDADE PARA USO DAS MENINAS NA ESCOLA*
[com ajuda espírita, influência, plágio e sample livre de Pierre Louys, soprado
ao escriba por lindas ninfomaníacas em flor]
Não diga: "É uma menina que se masturba até quase morrer."
Diga: "É uma sentimental."
Não diga: "Ela deixa-se enrabar por todos aqueles que a masturbam."
Diga: "Ela flerta um pouco."
Não diga: "Ele fode muito bem as menininhas, mas não sabe enrabá-las."
Diga:" É um simplório."
A ressaca era tão monstruosa que os mortos riam de mim do outro lado do
muro do cemitério. Seguramente, depois daquelas noites brancas, eu estava
mais morto do que eles todos. Arrastava a carcaça, suava frio e doía
justamente naquele lugar do coração que nunca vai ser preenchido, como no
poema do velho Charles, there is a place in the heart that/ will never be filled.
Esse ai estragou a vida mas ela teima em segui-lo, dizia a voz dum morto
franzino do outro lado do muro da Cardeal Arcoverde. A vida gosta das suas
piadas e ri dos seus passos. E eles se divertem juntos lambendo o rés do chão
e os pés de lindas garotas.
Esse ai dormiu ao lado de uma bela bunda, mas as pernas não encaixaram à
perfeição, como dantes. Ele notou que ela já não tinha mais aquele sorriso
capaz de incendiar de manhã o calendário. Estava chateada. Aquela viagem ao
fim da noite a tirou do prumo: vinho barato, do pó ao pó, Jack Daniels ,
palavras desagradáveis que saem do inferno da gengiva sem dente, Nick
Cave espalhando convicções e navalhas pela casa.
A ASMA DO AMOR
Do cinema lindo & phoda de existir e de como uma mulher pode encantar nos
detalhes de nós dois. Quando ela pede pra gente virar os olhos ou fechá-los
bem fechados. Só enquanto troca a calcinha, vupt, o barulhinho do elástico,
mesmo com toda intimidade desse mundo, às vezes intimidade de anos, vale,
vale. Só enquanto troca o sutiã, biquíni, parte de cima, ajeita a parte de baixo,
areia do doce balanço da beira dos mares, só enquanto tira uma toalha do
banho, primeira viagem, só enquanto está lindamente menstruada e quer
guardar-se, embora saiba que atravessamos com amor e gosto todo o seu mar
vermelho e ainda mais mares aparecessem a cada mês. “Feche os olhos”, diz.
“Vira o rosto”, safadeza-se, diva sob seguras telhas. Só para manter o
suspense do cinesmascope debaixo do mesmo teto. “Pronto, pode olhar”. Ai
ela ressurge mais linda ainda, cabelinhos molhados, com aqueles cremes
todos da Lancôme ou com simples sabonetes Dove ou aqueles de nove em
cada dez estrelas de Hollywood, Lux, deluxe, eu morro nesses lapsos de
tempo, elipses do desejo, frações de segundo que são eternas de olhos
fechados para quem meus olhos na terra, que há de comê-los inté os aros dos
óculos e as safenas, mais abriram e justificaram seu brilho castanho mesmo
em dias de torpor e existência de pára-brisas lusco-fusco.
Que filme, rapazes e raparigas! Coisa fina, de chorar, de sorrir, mas isso
acontece, simples como na vida, como na cachaça, como manifesto de criança,
como quem sabe que às vezes dá um branco na existência, como aquele da
fita, o interlúdio, o entreato, a hora em que morre a fama e fica o homem, lá no
seu caramujo, no ostracismo de Itapissuma, para voltar depois, mais louco
ainda, ô, mais fortes são os poderes de Sísifo.
Tive sim, outro grande amor antes do seu... É assim mesmo a letra? Mas na
última sessão que vi o que mais me comoveu foi o amigo Junio Barreto, o mais
doloroso e lindo dos sambistas contemporâneos, cantando baixinho aquela que
diz mais ou menos assim... vocês me corrijam se errei no verso, sou péssimo
para cantar a palo seco: “É impossível nesta primavera, eu sei/ Impossível, pois
longe estarei/ Mas pensando em nosso amor, amor sincero/ Ai! se eu tivesse
autonomia/ Se eu pudesse gritaria/ Não vou, não quero/ Escravizaram assim
um pobre coração/É necessário a nova abolição/ Pra trazer de volta a minha
liberdade/ Se eu pudesse gritaria, amor/ Se eu pudesse brigaria, amor/ Não
vou, não quero...”
SÓ A LAMA CURA
Caray, quando tu desce la de riba, nem sempre quem desce é de cima, tomada
bãe, bain, baseado, peitinho, peitinho no drum´m´roll, quase bebida, vinho
branquis ou champãe, sorriso de quem não carece e só dá colo pra-la de
Edipis e de-mãe, eu fico passex e digo assim, vem cá meu bem, só não trabaio
com futuro pq pra mim tudo zennnnnnnnnnn, qual besouro contra o vidro,
onomatopéia, vrummm, ai ladrão de coração, tu tem perna mas tá longe de
uma centopéia... paroh ali e cabou-se a parábola, bien, bem, fudeus, pra que
mais ale´m?, pra que dê-erres, pra que degraus que agora só rebobinam a fita
cassete perdida, se bem que..., a mina é de ouro, a serra é pelada, a lua tá
cheia e o garimpeiro passeia no que reluz das idéia gaviônica, da febre do rato,
da peste bubônica, pronto, essas coisa!
Isso é uma boa prova de melhora do mundo. Muitos homens sofrendo por
amor. Drinque caubói na mão, olhar ao longe, um Leonardo Cohen, um
Gainsbourg ou um brega de Odair, como canta o inimitável Torturra, dos
Abimonistas –“até meu carro já não tem velocidade,/ pois ele sente saudade de
quando andava com você/. Meu telefone que sabia quase tudo, de repente
ficou mudo, e mais nada quer dizer./ O meu relógio sempre certo trabalhou,
depois que ficou sabendo, nada mais ele marcou/. Se eu soubesse que eu iria
lhe perder, não teria acostumado minhas coisas com você”.
Se tiver chifre no meio, melhor ainda.Só o chifre nos humaniza, nos tira a
banca, derrete o ego de macho como a pedra dos uísques mais sofridos,
pedras do granizo das tempestades envelhecidas em barris de Shakespeare!
E não é toda maneira de amar que vale a pena, como diz aquela péssima
canção, tô fora. Só há um tipo de amor: o amor-rolimã, amor que deixa os
joelhos e os cotovelos à mercê de pontos, muitos pontos, escoriações, rombos
na carne, braços na tipóia, gesso com o nome dela, desalmada, como as
quedas daquele brinquedo pré-skate, muito antes da invenção do patinete, o
supostamente ingênuo carrinho de rolimã.
O amor sanguinho novo, viejo Arnaldo Baptista, sangue que desce pela perna,
joelho, batata, pé, dedos, e lá embaixo escreve o nome da peste na calçada,
assim, bem derramado... O amor rolimã é sempre ladeira abaixo, rolamento
oleado, viagem vertical, buraco, o japão da dor sem fim... Dói aqui, ó, pontada
no estômago, como um boxeur que adivinha o golpe, que prescreve a corda e
a coreografia do nocaute. Faísca nas rodinhas, rolamentos na pista, o incêndio
das horas, a descida mais assassina, sai do meio, lá vai, lá vamos, lá vai, até
quando?
LÁGRIMAS SUBTERRÂNEAS
MIOJO SENTIMENTAL
Das tragédias masculinas a cegueira pelo futebol sempre foi a mais grega e
incompreensível por parte das mulheres.
Não há miséria maior para a alma masculina do que o apego aos onze
semelhantes que o defendem na mais épica das batalhas. O grito fanhoso de
gol que vem de lá dos porões de todos os canteiros de obras, do fundo da mais
suja das pensões de Santa Cecília, São Paulo, ou do sótão onde morei na
Barão de São Borja, no Recife de todas as dores de amores emparedadas.
TOLI-TOLÁ
Como tenho pelo menos 5.475 luas de boemia nestas pradarias nocturnas,
ouvi a saudação Toli-Tolá um trilhão de vezes, sempre com aquele sorriso de
calmaria e bondade. Nosso primeiro encontro foi no Riveira, clássico dos
clássicos, onde bebia a Rebordosa, ali na esquina da Consola com a Paulista,
infelizmente cerrado, jaz. Estava na companhia luxo-sabedoria-e-riqueza de
Luciana Araújo, uma amiga linda e amante do cinema cujos lábios valem pela
coleção completa, encadernada em couro de leopardo, da Cahiers du Cinema -
com DVD de Vivre Sa Vie de brinde. Que saudade de Anna Karina!
Que a terra lhe seja leve, Toli-Tolá, que os homens brochas aqui de baixo
herdem a paudurescência dos seus animados marcianitos erectus. Amém. E
que você, amigo, viaje loucamente agora pelo espaço como um astronauta que
rejeita a volta.
Sim, nada como o som e a fúria de uma mulher em plena febre amorosa.
Nada segura. Mas nós também, enquanto Marcolas do amor, chegamos fácil
ao grau 9 da maluquice obsessiva _grau 9 foi o álibi usado pela defesa de
Suzane Richthofen, que teria matado os pais por amor doentio ao namorado_
sacando nossas peixeiras morais, tocando o terror no percussivo barracão de
zinco.
O nosso medo diante de um possível chifre, por exemplo, nos faz virar
Coriscos, cegos belzebus, passionais MC´s sem rumo. Aí o termômetro bate 9
fácil. O amor é assim mesmo, depois nos acostumamos, e vemos como ser
trocado por outro nos torna mais humanos, perdemos aquela empáfia de
machos invictos e escrotos. Repito o velho mantra: só um chifre humaniza um
canalha.
Chegar à casa dos 9 é... ser traído por um amigo. Mas vem cá, meu
camarada, você queria que a moça fosse dar para inimigos? Veja o lado bom
das coisas.Relaxa, acontece, abafa o caso e pega de volta essa bela cria da
tua costela, ela vai voltar mais gostosa e safada ainda, com direito a narrativas
incendiárias.
Chegar ao grau 9 é... ouvir as piores notícias daqueles lindos lábios, né
velho Marçal Aquino? Como por exemplo: a emoção acabou, nosso romance
esfriou... Você merece alguém melhor... Estou confusa, estou cafusa, bla, bla,
bla, conta outra.
Chegar ao grau 9 é... ouvir ali,na lata, que o outro é o rei do tantra, que é
o outro domina todos os bambuais do kama-sutra, que o cara é o sexo mais
selvagem desta babilônia, a transa mais homérica, o monstro sagrado da
alcova.
Homem não suporta ouvir esse tipo de prosa. Ai fere de jeito o tal do
orgulho macho, a fúria domina... Ah, quanta bobeira, sossega, traz um
calmante, um suco de maracujá, traz um copo de água com açúcar para o
cidadão, Catatau, traz uma garapa, uma vodka pura, uma salineira
encouraçada de responsa.
Chegar ao grau 9 é... beber todas (quando a vida dói, drinque caubói!),
chorar no ombro do garçom todas as mágoas, nadar no seco, ver a lua na
sarjeta, e bater à porta dela de madruga, eu te amo, porra, abre-te sésama!
Bater, bater e não ter resposta, ouvir apenas os gritos e susurros do outro lado.
Ai é 9.9 na escala cornífera, uma fração de segundo para uma besteira, para
um daqueles crimes que só o criminalista Troncoso Peres, o Shakespeare dos
grandes casos do gênero, nos livraria do inferno.
Calma, garotão, acontece. Homem que é homem chega ao grau 9 e não
comete violências. A receita é simples para abaixar a febre: tome um grande
porre, ao som de Leonard Cohen, Odair ou Chico Buarque, e risque o nome
dela dos seus alfarrábios, como na balada sangrenta de Orlando Silva: "Risque
...... meu nome do seu caderno/ Pois não suporto o inferno/ Do nosso amor
fracassado/ Deixe ........ que eu siga novos caminhos/ Em busca de outros
carinhos/ Matemos nosso passado..."
Vixi, isso é que é dolor, não aquilo que cultivo no jardim semi-árido lá de
casa!
NO REINO DA CARENÇOLÂNDIA
O macho carançolandês não passa meia hora separado, não vive sequer o luto
amoroso da resoluta que aplicou-lhe um conga no meio da bunda - a padoca
mole e farta que dantes já prescrevia o chute. Ele vai lá e agarra a primeira que
passa, nem que seja um manequim de gesso, como ocorreu ao meu amigo
Sizenando, aquele mesmo que trabalhava como galhudo-mor nas crônicas de
Rubem Braga.
A COMILANÇA
Nada mais bonito do que uma mulher que come bem, com gosto,
paladar nas alturas, lindamente derramada sobre um prato de comida, comida
com sustança. Os olhinhos brilham, a prosa desliza entre a língua, os dentes,
sonhos, o céu da boca. Ela toma uma caipirinha, a gente desce mais uma,
sábado à tarde, nossa doce vida, nossos planos, mesmo na velha medida do
possível.
Pior é que não é mais tão fácil assim encontrar esse tipo de criatura.
Como ficou chato esse mundo em que a maioria das mulheres não come mais
com gosto, talher firme entre os dedos finos, mãos feitas sob medida para um
banquete nada platônico.
Época chata essa. As mulheres não comem mais, ou, no mínimo, dão
um trabalho desgraçado para engolir, na nossa companhia, alguma folhinha
pálida de alface. E haja rúcula!
A gente não sabe mais o que vem a ser o prazer de observar a amada
degustando, quase de forma desesperada, uma massa, um cuscuz
marroquino/nordestino, um cabrito, um ossobuco, um barreado, um bife à
milanesa, um torresmo decente, uma costela no bafo.
Foi embora aquela felicidade demonstrada por Clark Gable no filme ''Os
Desajustados'', quando ele observa, morto de feliz, Marilyn Monroe devorando
um prato. E elogia a atitude da moça, loa bem merecida.
Além do prazer de vê-las comendo, pesquisas recentes mostram que as
mulheres com taxas baixíssimas de colesterol costumam ser mais nervosas,
dão mais trabalho em casa ou na rua, barraco à vista, dê-erres sem fim... Nada
mais oportuno para convencê-las a voltar a comer, reiniciá-las nesse crime
perfeito.
Às fogazzas, aos pastéis, aos cabritos assados e cozidos, ao sanduíche
de mortadela, ao lombo, de lamber os lábios, ao chambaril, ao churrasco de
domingo para orgulho do cunhado, que capricha na carne e sabe a arte de
gelar uma cerva de primeira. E aquela fava, meu Deus, com charque, enquanto
derrete a manteiga de garrafa, último tango do agreste...
O importante é reabrir o apetite das moças, pois, repito, senhoras e senhores,
homem que é homem não sabe sequer _nem procura saber_ a diferença entre
estria e celulite.
FLAGRANTE DELITO
Nada como um gay nas nossas pobres existências sobre a terra, essa
passagenzinha de nada, velho e bom Allan Kardec, meu camarada.
Sim, um gay de verdade, com toda a sua riqueza & almodovares
corazones.
Agora falando mais sério ainda: um gay é tudo em nossas pobres &
toscas vidas.
Duas ou três coisas que deveríamos saber mesmo sobre eles: toda
grande mulher tem um gay como principal e inseparável amigo; festa sem gay
não decola, não emplaca, não orna; o mundo sem estas alegres criaturas seria
chato pacas.
Festa sem gay não tem liga, nossas mulheres sem eles não são as
mesmas malucas.
São sentenças bíblicas. Deveriam constar de lei federal, nas tábuas de
Moisés, em todos os testamentos. Você já viu uma festa sem gay animada?
A pista não pega fogo, as mulheres não têm com quem tricotar sobre o
modelito da perua de vermelho... Seja forró, o velho e flamejante roque, música
eletrônica ou um sambinha esquema novo na laje da gostosa.
Seja em Nova York, Moça Bonita, Crato, Aratama, Floripa, seja ouvindo
a Nhocuné Soul na vila homônina da ZL paulistana.
A mesma lição da festa perfeita vale para a amizade das nossas
gazelas. Mulher sem um amigo gay nos arredores não tem graça. Com um gay
como melhor amigo, ela fica mais inteligente, mais bem-humorada, mas
faceira, acerta a roupa que veste, endoida o cabelo pra sair da rotina, melhora
tudo, incluindo as filosofias e mumunhas de alcova.
E você, cabrón, enquanto a amada vai ver o filme-cabeça com a biba
amiga, ainda pode ficar em casa curtindo tranqüilamente aquele Santos x São
Paulo, aquele Sport x Corinthians, aquele Grêmio x Boca, aquele Fla X Galo,
aquele Fogão x Goiás, aquele Icasa x Porto pela terceirona...
Ora, nada melhor para nos livrar daquele filme iraniano, paquistanês,
taiwanês, tibetano...
Uma beleza, uma mão-na-roda essa parelha. Sem esquecer, claro, que
você, cabrón, também terá um grande amigo, normalmente brilhante, para
quebrar um pouco a rotina da testosterona à milanesa do boteco, pra sair um
pouco daquela prosa oleosa de macho, saco.
E você ainda pode aquendá-lo, vez por outra, com uma graça do tipo
“amigo gay para mim é homem eu só... ". Bem, deixa pra lá, meu bom rapaz,
vou nessa, valeu, a gente se fala.
QUANDO AS MULHERES ACORDAM*
Existem aquelas que não estão nem ai, estas são raras, acordam e te
presenteiam com aquele sorriso, como se tivessem sonhado com a
possibilidade do nirvana ao teu lado, cria da tua costela, como canta o outro
Chico, uma beleza de menina!
Outros te mandam embora antes da aurora, para dormir o sono dos justos, o
sono que livra de pesos na consciência e possíveis laços imediatos.
Certíssimas.
Existem aquelas que acordam e põem logo uma música, uma música de
acordo com o clima. Se tem sol, rock´n´roll, se faz frio, jazz, algo cool... Se o
dia está cinza, toca aquela, que diz assim, como não quer nada, uma porrada,
“ah insensatez, que você fez, coração mais sem cuidado...”
Nada mais lindo e misterioso do que uma mulher acordando, seus gestos, a
dramaturgia, o arranque para a vida ou a inércia nos teus braços.
Os barulhos de uma mulher acordando, a música dos ossos se espreguiçando,
os gerúndios tantos das ações e silêncios, o chuveiro ao longe a nos dizer
tantos desejos e coisas, meu Deus, aquela água já escorre linda e faz pocinhas
líricas nas saboneteiras...
sim, minha menina, pode tirar a calcinha, meu amor, eu disse, ela implorava,
pois o costume e o combinado era não tirar quase nunca, o caminho era pelos
cantinhos, os aceiros, os cantinhos da existência, os acostamentos das dores
do mundo & seus derredores posssíveis, explorá-los todos, cada beiradinha de
vida, como numa floresta, as pocinhas d´água e desejo e ainda o suor que caía
como chuva guardada na copa das árvores dos seus cabelos, como aqueles
pingos da chuva mesmo que ficam guardados nas folhas das folhas da relva,
chove, meu amor, derrama tudo dos guardados, das nuvens escuras dos
nuestros obscurantismos, tira a calcinha como quem tira o juízo, como quem
deixa o passado guardado com o chapeleiro de alice e viaja no reino do vai-
sem-volta como aquelas noites em que eu roubava flores para usted no mais
vagabundo quiosque e fodíamos sem cabeças a atrapalhar nuestras bidas...
cabeças demais só atrapalham nuestras belas phodas... não temos cobertores
para tantos pensamentos... tira a calcinha, amor, mas somente esta noche, eu
deixo, hoje tudo pode, juro, escuta, tira, me beija enquanto os céus batucam
jazz-granizo sobre o teto quente do futuro.
EL FUEGO NO RÁDIO
Os sonhos de las siestas são os novos filmes feitos pelos cineastas mortos,
maneira del diablo ocupar-lhes no inferno. O bom é que todos eles, de ressaca
de las fuzarcas, pegam sobras de películas de don luis buñuel e dão o truque
no demo, que cai feito um pateño, para nuestra suerte, por supuesto, bons
filmes a todos e lembrem-se: a vida não tem reverso muito menos portas
antipânico.
Quis o destino, este virtuoso maestro do óbvio, que o velho e negro gato
fosse esquecido no sótão da casa pelos donos sem memória. Ali sobrou
também um rato, o mesmo que agora avança sobre a ratoeira armada cuja isca
é um corte de queijo atacado pelos vermes. O gato, com o seu apuradíssimo
senso de justiça, impede a morte do inimigo histórico. Não é justo morrer por
um pedaço de queijo apodrecido. Para salvá-lo da morte injusta, o gato foi
obrigado, porém, como determina a ordem natural das coisas, a devorar o rato.
DE UM BREVE TEOREMA
Nem me venha miss Friaca, Ingmar Bergman está morto e não caio mais no
conto sartreano, há tempos assassinei aquele anão perverso, o marido de dona
Simone... e mudei de mala-e-cuia, mystery train, pra Guadalajara, adonde Elvis
já me esperava naquele bar que fedia a mijo, limão e coragem, nem me venha
Jean-Paul, você não me pega mais com a sua velha cartilha sem-saída, estoy
careca mas meus longos cabelos renascem no vento quando sonho com um
novo road-movie no deserto, nem venha me fazer usar gola rulê e acreditar no
frio d´alma, adiós nouvelle vague, cá em Guadalaraja os homens não têm
tempo para frescuras do naipe, faz sol, e Lourdes y Felipe me ensinam os
segredos do peyote e do agave.
A ARTE DE PEDIR*
ah, vamos esquecer por uma semana nosso sol de bolso, como João Cabral
chamava a aspirina, como Paulo Henriques Britto batizou o milagroso
antidepressivo, remate de males do cocoruto, vamos esquecer por uma
semana as cartelas, as receitas, as tarjas negras, vamos ver o que acontece,
vamos dar um bom dia tristeza, vamos nos tornar lindamente melancólicos ao
lusco-fusco, vamos deixar q a espessa neblina encubra o pára-brisa, vamos
tentar..., e se der merda, e se a gente não segurar a onda, a gente enche a
cara, noite na taverna, a gente volta correndo pra casa e faz dos lençóis uma
cabana, uma barraca de praia no escuro, a gente se agarra como se fosse
mesmo o fim do mundo, e daí?, posso querer os seus zolhinhos com aquele
velho spleen?!
A ARTE DA CANTADA PERMANENTE
Uma mulher ainda sem nome, pernas não tão grandes pero alongadas
por lindas botas, ojos cortados com navalha buñuelística...
Esta mujer está por perto, sinto que bafeja a nuca de todos os homens
de la calle.
Talvez em sonho, talvez em desejo envelhecido em barris de bálsamo.
Traz marcas no corpo de agulhas de fábricas coreanas e um tatuagem
mal-feita de Bolívar.
O nome de um filho também tatuado em perfeita caligrafia de um pai que
se perdeu na selva escura de Cochabamba.
[Juan, eis o batismo do chico].
Não, ela não está triste, mesmo ouvindo uma canção desesperada de La
Lupe com fiozinhos brancos enterrados no ouvido.
“Teatro, tu és puro teatro...”
Agora ela ouve Johnny Cash ladeira arriba.
Cry,
Cry,
Cry...
Não?
Sabia, minha menina, que teu avô morreu sem acreditar que o homem foi a la
luna?Com este cavalo gigante posso te levar para conhecê-la,
independentemente de quaisquer sospechas!
Domingo é um bom dia para irmos a la luna, mas tem que ir de vestido novo e
lacinho no cabelo, Veridiana. Te arruma e vamos simbora que Chivas, nuestro
caballo, relincha impaciente lá fuera.
DA PONTUAÇÃO AMOROSA...
PÁLPEBRAS MOLHADAS
...deixo você dormir profundamente, com muito gosto, e beijo seus zolhinhos só
pra ver se alcanço os sonhos possíveis depois do pára-brisa ou da tormenta,
colo, quero alcançá-los, mas chove perdigotos no cinesmascope, neblina na
tela, avisto quase nada de Alice brincando numa neve alvissareira do rock, nem
o chapeleiro aparece para dormir de touca, cafungo apenas outros sonhos de
seu cangote mais lindo, donde marcha-ré, slow-motion de maré ao
contrário,como lençóis artificiais de fellini, retorna minha menina, talvez no
sonho que aluguei da balada do mar salgado, um sofista que caminhava como
Moisés en la calle, volta para a manteiga de lata aviación dos desejos ou para
o último tango com manteiga de garrafa, vem menina, talvez sem bilhete de
vuelta, amém, o retorno de quem nunca devia ter partido, mas se for amor que
fique até gastar o bigode de nietzsche, vixe, infindável vassoura de
faxinas cujas árvores ainda choram o cabo das possíveis assepsias
moralistas... ah, nega, esqueça essas filosofias baratas e madeirísticas e vamu
fuder de verdade.
***
***
Magnífica Gurua - aspirina e ponstan digital -, desde outubro passado
sofro pelo amor de um homem. O conheci neste mar que não tem cabelo que é
a internet. Ele é maravilhoso e eu o amo. Já lhe disse infinitas vezes. Mas o
mancebo - que é escriba de mancheia, razão pela qual roubou meu coração
vulnerável - não me dá ouvidos. Não me crê. Ou crê e não me retribui o amor.
Diz que me quer. Mas nada faz. Embora seja conhecedor de teu famoso
conselho sobre amores platônicos, não concretiza a trepada homérica. De
homérica, só eu, Penélope eterna, à espera, tramando e destramando os
pontos desta paixão.
Que fazer? Há esperanças? Haverá luz na escuridão de meu Caritó?
L. V., Rua da Ladeira da Ribeira, Natal
Resposta:
Querida Penélope, como toda musa de ladeira, saberás esperar a
estrela da manhã, que não tarda, pois o tempo para os amantes é sempre
nada, coisa-alguma, beirinha-de-dias e auroras alvissareiras, folhinhas no
calendário, dias que correm aos pés do Coração de Jesus das edições
Paulinas. Mira o fundo das tuas xícaras de café e verás, como cigana das
margens do Potengi, o mancebo em desalinho, talvez atordoado, ostra viva
escondida na casca de uma promessa de amor. Qual o Câmara Cascudo da
tua terra, piolho de cabarés e desordens líricas solenemente aceitas pela
mulher amada, talvez o moço esteja a essa hora no frege da vida, tão-somente
para suportar o fardo do trabalho e enganar, distraído para a sorte, o peso dos
dias. Aceita, pois, o afago carinhoso desta dama envelhecida em barris de
bálsamo que vos fala. Estico a vista e enxergo, no horizonte da tua janela e no
desconforto dos cotovelos da espera, a caatinga em flor, mais florida que os
jardins de Swan. Sempre às ordens, neste Caritó e suas cinzas das horas, tua
Miss C.S.
<Escreva você também para Miss Corações Solitários. Sua missiva
será encaminhada urgentemente para a tenda da nuestra cigana exilada>.
PORQUE A ALMA PRENDE FOGO QUANDO DEIXA DE AMAR
DORES DO MUNDO
Uma mulher ainda sem nome, pernas não tão grandes pero alongadas
por lindas botas em couro de lagartos vulcânicos, ojos cortados com navalha
de cão andaluz...
Esta mujer está por perto e é capaz de fazer boiar na travessia
melancólica dos seus zolhinhos até mesmo o mais babilonizado dos cavaleiros
deste pueblo.
Se o desejo envelhecido dos kabrones por esta chica destilasse de uma
hora para outra... daria no melhor uísque cowboy do fim dos mundos.
Ela traz marcas de agulhas, fabriquetas coreanas de confecções, e uma
tatuagem de Bolívar na costas.
O nome de um filho também tatuado pelo próprio pai que se perdeu na
selva escura de Cochabamba.
Juan, eis o batismo do chico.
Não, ela não está triste, mesmo ouvindo uma canción desesperada de
La Lupe.
“Teatro, tu és puro teatro... falsidade ensaiada, estudiado simulacro”.
Agora ela ouve Johnny Cash ladeira acima, como num trote de uma bela
égua que foge do barulho dos fogos de artifício:
“Cry,Cry,Cry...”
(...)
Uma guarânia...
Quem não tem na família ou no grupo de amigos uma mulher que bebe
e tira a roupa atire o primeiro sutiã neste cronista.
É um clássico.
É uma das cenas mais lindas e chapantes da admirável e nada bucólica
paisagem humana.
Porque não é nada simples, amigos.
Não é safadeza propriamente dita, não é aparecimento, não é um ato
contra a moral e os bons costumes.
É o grau zero e máximo da beleza, meu caro Jommard Muniz de Brito.
Está mais para o sagrado, mas isso também é pouco, não explica
direito.
É bonito, pronto, nada decifra, me devore como uma loba em pele de
gata em teto de zinco quente.
É como se batesse um miserável calorzão da existência a pedisse o
mais natural dos gestos de uma fêmea.
É como uma índia a caminho do afluente amazônico mais próximo.
Como Iracema a se banhar na gruta de Ubajara para refrescar-se e
pensar um pouquinho na vida. Pense na falta de preocupação naquele tempo!
Nem pensava que no futuro ia dar tanta dor de cabeça aos jovens nas
questões vestibulandas alencarinas. “Me erra, não me interpreta”, cismaria a
bela índia.
É agora, uma mulher que bebeu mais uma dose vai tirar a roupa. Porque
a gente pressente, a terra gira mais avexada, o olho prescreve o belo episódio,
blow up, depois daquele strip. Momento sublime movido a fome de viver e
álcool.
E quando sobe na mesa é mais lindo ainda.
E a cara do marido tentando apagar aquele incêndio iluminado?
Um Deus nos acuda.
Quando a mulher tem filhos, só se ouve o sussurro do menino agoniado
do juízo, no meio do burburinho, da confusão, do banzé: “Mãe é doida mesmo!”
Porque ver a mãe pelada no meio da festa dura para o resto da vida.
Não tem divã nem macumba que curem mais o juízo. Mais mil anos de análise,
como diz meu amigo Adão Iturrusgarai, agora habitante dos Buenos Aires.
Para quem não é filho ou marido é quase invisível, de tão sagrado, o
corpo de uma mulher que tira a roupa na frente do mundo todo e de todo
mundo.
E normalmente a mulher que tira a roupa é uma pudica, veste-se mais
comportada do que Maria Antonieta.
É um longo e demorado strip-tease. Se brincar ainda usa combinações,
anáguas,
Só sei que é lindo demais o tresloucado gesto. Tenho uma amiga que é
duas cachaças, com umbu ou caju de tira-gosto, e uma peça de roupa que
avoa longe lá no bar do Sargento do Pátio de São Pedro.
Os cafuçus ficam só na botica, na espreita, na tocaia grande, pense,
meu caro Rodin, pense!
Melhor ainda é a mulher que tira a roupa cantando uma música cafona,
como as lobas, deusas e ninfetas do livro de Thiago de Góes. “Esta noite, eu
vou fazer de conta que sou livre. Eu vou viver a vida que ele vive, e depois eu
posso até morrer”, canta a desalmada, um clássico de Diana, a mitológica.
Como é lindo uma mulher que bebe e tira a roupa em público, noves
fora qualquer moralismo, como é lindo, e priu, e pronto!
CINEMA
Amigas, não há mais dúvidas: quanto mais beira o verossímil, com gritos
lancinantes na noite, como assimilamos do cinema, mais fingido é o tal do
orgasmo. Nunca é condizente com a nossa performance e suor. Os melhores e
mais recompensadores orgasmos guardam o bom preceito da educação dos
gemidos.
Por mais megalomaníaco que seja Vossa Senhoria, recomendo que não
acredite naquelas algazarras, feiras amorosas, sacolões do sexo, capazes de
fazer os vizinhos pularem da cama só de inveja. Aquela gritaria toda, meu caro,
só vale para provocar um problema dos mais graves. Deixará o casal que mora
do outro lado da parede em pé de guerra, uma vez que a mulher, atenta à lição
de gozo comparado, vai exigir mais, muito mais, mais e mais, e mais um
pouquinho ainda, do seu colega de prédio ou de rua. E o pior é que os gritos
lancinantes só costumam ocorrer quando o gozo não passa de teatro, puro
teatro, falsidade ensaiada, estudiado simulacro, como canta a deusa La Lupe.
O gozo desesperado costuma ter origens variadas (falar nisso, por que
ninguém cita mais W. Reich, meu ídolo da lira dos 20 anos?!). O gozo
desesperado, falava eu, costuma ser resultado de algum curso mais digerido
de teatro amador, formação em escola com viés jesuítica, leitura errada dos
Actors Stúdio, dietas à base de alcachofra, audiências tardias das
onomatopéias do Led Zeppelin ou falta de homem propriamente dita.
As melhores gazelas educam cedo os gemidos. Em vez de gritos que
parecem mais apropriados para momentos de sequestro-relâmpago, a boa
moça sussurra e balbucia safadezas no cangote do amado. Mais vale um dos
3.000 verbetes catalogados no Dicionário do Palavrão, do mestre
pernambucano Mário Souto Maior, do que os decibéis selvagens.
As melhores não se desesperam. Já imaginou Ava Gardner em
desespero? Nem com Frank Sinatra, a quem enlouqueceu todos os sentidos. E
não me venha dizer que isso seja frigidez, frescura ou algo da linha cool.
Uma coisa é a gritaria, quase um SOS, incêndio do Joelma, 11 de
Setembro ou sinistro urbano do gênero. Outra é a gemedeira gostosa, fungada
sentida, fogo nas entranhas, calor na bacurinha, quase um decassílabo a cada
descida, lirismo sem fôlego, asma do amor.
una estranha palabra nos une en la calle, no leito e na via láctea de hoy por
delante. Ainda não sei qual a trilha sonora da nuestra noubellita amorosa ou
ficosa, de ficare, ficaraón [ficar + tataruón, la cona na linda melodia del
guarany] como diria meu maestro em portuñol selbarre, don Douglas Diegues.
ficar de ficare, nueba mueda de los chicos y chicas de las boates que não
combina com un viejo como yo, bem, como estaba a dizer, una palavra muy
bela, a mais encantadora de las castanholitas que batem entre la lengua e el
palato, um vocábulo de responsa, quase uma sonata numa só palabra, una
palabra que hay lido carmencita de las alterosas rogada en mi sofazito da cor
dos nuevos biños das beiras do rioja, una palabra que achou en um poema do
Tuca, libreto muy belo do argentino, digo, do boedaníssimo spleen de Boedo,
Baudelaire de bandoneón de todas lãs manos de un polvo, a quem tive el
prazer de conhecerlo en um seqüestro de escribas y poetas de boinas en
puerto de las galiñas, nueba Holanda del brasil. una palabra que guarda la luna
refletida como no noir de david goodis, “puedo sentir el ruído del água”, me
sopra Casas, son las dos de la mañana y mi corazón chacoalha na pista de la
ilusión enquanto tu bailas no praga, en la calle de turiassu, san Pablo, un tenro
hoqueyroll que me encanta, com um sorriso que é capaz de tirar leite e
comoción da mais inanimada das bidas de un pobre paralelepípedo esquecido
sob pneus e pés sem rumo...
se” de “se” de cullo és ruella, por supuesto, não hay banda non hay banda y
don estebito a esta altura sobe no palco nuevo do PRAGA, el ctg del rokenrô,
se não fosse o diablo desta fiebre da selva amorosa yo estaria bem dentro, te
procurando, chica, no googlezito de mis gafas, mis anteojos pára-brisas, mis
lunetas de camiñoneiro perdido nos entornos de um bielorizonte llorado como
en la canción de roy orbison.
São cinco e meia de la mañana. Estoy lá embaixo, subsolo do deseo, japon del
amor y otras desordens que mexem com as leis cósmicas. Nem venga com
essa de media-nuebe, agora soy tu submarino, tu barquinho de la banheira do
ata-me de Pedro Almodóvar Caballero, teu auto da barca del infierno, derra-me
hablar com ella ao infinitum de los saloons de las depilaciones, daqui so saio
com un rio em mi boca, napa y ojos marejados de tus mares nada pacíficos, tus
mares nada dantes, teus árticos geraes, teus rios doces, jequitinhonhas y todos
los pistoleiros dos seus leitos e margens das margens dos corajosos hombres
que se arriscam. Eis a minha hora, dá-me o último cigarro, só eu
egoisticamente metido, beiços, lengua, ojos e oiças en tu incomparable coña
donde me vingo de mi bidas secas y de todas las miragens além muito além
dos pára-brisas semi-áridos.
la lluvia chegou atrasada para molhar nuestros sueños e después correr pela
calle sob una canción caubói y cachaçosa do Vanguart...
E quando imaginávamos que estava tudo acabado, que amor não mais
havia, que tinha ido tudo para as cucuias, que o fogo estava morto como no
engenho de Zé Lins, que o amor era apenas uma assombração do Recife
Antigo...
Quando já dizíamos, a uma só voz, aquela crônica triste de Paulo
Mendes Campos: “Às vezes o amor acaba como se fora melhor nunca ter
existido; mas pode acabar com doçura e esperança; uma palavra, muda ou
articulada, e acaba o amor; na verdade; o álcool; de manhã, de tarde, de noite;
na floração excessiva da primavera; no abuso do verão; na dissonância do
outono; no conforto do inverno; em todos os lugares o amor acaba; a qualquer
hora o amor acaba; por qualquer motivo o amor acaba...”
Quando já separávamos, olhos marejados, os livros e os discos...
Quando mirávamos, no mesmo instante, a nossa foto feliz no porta-
retratos...
Quando não tínhamos nem mais ânimo para as clássicas D.R´s –
discussões de relação argh, vixi, oxe, abram os pára-quedas, abram os
saquinhos de vômito.
Ave, palavra, até o gato, nervoso, sem saber com quem ficaria,
quebrava coisas dentro de casa, danô-se; o papagaio blasfemava, ô diabo
verde teimoso!
Estava na cara, naquela zoologia amorosa: aqueles pombinhos já eram.
O cheiro do fim tomara todos os cômodos, a rua, o quarteirão, o bairro, a
cidade, o mundo...
Quando só restava cantar uma música de fossa... “Aquela aliança você
pode empenhar ou derreter...”
Quando só restava a impressão de que eu já vou tarde...
Quando só restava Leonardo Cohen no ipod...
Sim, o quadro era triste, não se tratava de hipérbole ou demão de tintas
gregas.
Mas de tanta inércia, poça do amor parado, de tanta inércia faltava até
força para que houvesse a separação física, faltava força para arrumar as
malas, pegar as escovas, saco.
Quando os pombinhos estavam chamuscados como num choque no
poste de luz...
Quando já éramos conduzidos ao taxidermista, ela grita, lá do quarto:
"Quando só o silêncio os unia àquela altura..."
Linda, ela sopra o verso de Murilo Mendes para me ajudar a dar tintas
finais a mais uma singela e bendita crônica que garante a embriaguez dos
nossos salineiros corazones e o leitinho morno para adormecer as crianças.
A mulher que cheira a maré, quem sabe, ainda o espera no Hellcife sob a
bocarra dos tubarões. Um Corto Maltese na balada do mar salgado a essa
hora, samba de tiro certeiro. No meio do sertão de pedras-de-peixes, fósseis da
chapada do Araripe, os mais antigos mares sob os nossos pés. Subo do Vale
do Kariri rumo ao sol de Exu, malasartes, sinto o cheiro de todas as chacinas
portuguesas, urubus apostólicos dançam o gira vestidos a caráter com as
batinas do Santo Ophício, miragem da estrada quente.
(...)
Pena que não tenho mais cabelo, mesmo assim ponho pescoço e cabeça para
fora da janela para me sentir num road-movie de quinta, mesmo que a delirante
cortinazinha azul do ônibus insista em não me deixar a ver sequer as nuvens
dos meus óculos, mundo treme na estrutura metálica que sustenta as janelas
d´alma, assombrações d´amores emparedados na metrópole.
rezei para você me querer, rezei para você não me querer, agora assobio na
rua, ciente de que o coração de um vira-lata sempre ressuscita na primeira
curva, logo assim que cruza a solidão enferrujada da linha do trem.
que diabos,isso, chego em casa e recebo a notícia: morreu meu amigo celson
franco. caralho.depois de uma certa idade ter que se acostumar a essa velha
da foice que passa a ceifar os nossos. porra! nao me acostumo nunca com
isso. ja tinha morrido de chorar no Deserto Feliz, o filme, que so vi ontem, e
agora me acabando aqui, de novo. voces nao têm nada a ver com essas
historias, mas escrever sempre é dividí-las de alguma forma. celson, mi amigo
de dividir casa, aceita a minha lágrima no seu mais celestial dos uísques.te
amo. e da vida nada se leva a não ser o amor dos amigos, como dizia uma
certa película de frank capra.beijo.
DEVOCIÓN
Quero que tu entres em minha casa com bola e tudo e me faça coisas
inacreditáveis e pendure a calcinha na torneira do banheiro como uma bandeira
do homem que pisou na lua pela primeira vez a bordo do Apolo 9 e eu vou
beber cada pinguinho da tua calcinha lavada como quem bebe um champanhe
de mosteiro e o esquema tu já sabes: casa comida roupa lavada e um milhão
de beijinhos nas costas e nas pintas ate adormecê-la.
TERAPIA DA FEIRA
Nada melhor que uma mulher que acabou de chegar da feira. Sacola na
mão, fome de viver, sorriso de princesa.
Os vendedores de frutas, peixes e verduras são mestres na arte de
reconhecer talentos e animar as moças com os seus adjetivos. Adjetivos às
pencas, elogios às dúzias, mimos, dizeres, samba exaltação, graças,
gracinhas, gracejos.
Meia hora de uma mulher na feira vale mais do que um mês de análise,
do que a onda de orientalismos tantos do mercado, carmas-colas, do que a
yoga, do que o mestre japonês das agulhas, do que uma banheira de sais, do
que um dia no shopping com um supercartão de crédito sem limites.
Nem mesmo quando as mulheres estão acompanhadas, os feirantes
dão sossego. Esperam você, cara de marido, se distanciar um pouco, dois, três
passos, e tome flertes e agrados na baciada.
''Olha a manga, gostosa!'', bradam, administrando com malícia a vírgula
e o duplo sentido na ponta da língua.
“Ovo e uva boa!”, arriscam para as elegantes damas de preto.
“Essa é modelo!”, capricham para as gazelas saltitantes. “Gisele!”,
gritam em uníssono.
É a boa guerra dos mascates. Eles vão no ponto, exatos como
neurocirurgiões do desejo.
Em dias de chuva, mandam ver de acordo com o meteorologista: ''Essa
é enxuta até debaixo d'água'', alardeiam.
Um bom feirante reduz até os efeitos de uma TPM, de uma dívida nunca
paga, de uma culpa que corrói o juízo, de um regime ainda sem resultados.
Nada como incentivar o caminho da feira mais próxima da sua casa para
as mulheres.
Nos sacolões, então, os adjetivos saem a grosso e a varejo, na bacia ou
nos caixotes.
Os feirantes não mentem jamais. Eles sabem, mais do que ninguém,
que em toda mulher, seja quem for, existe um traço ou um aspecto de beleza.
Afinal de contas, mulher é metonímia, parte pelo todo, você passa a
apreciá-la por uma boca, um pé, uma orelha, uma mão, uma omoplata, um belo
ilíaco ressaltado, uma saboneteira, uma marca sulcada de vacina, um corte no
joelhinho esquerdo, uma cicatriz de artes de infância, uma bela bunda faceira,
uma falsa magra, um umbiguinho de fora, aquele tom cinza dos cotovelos da
espera...
Na passarela dos feirantes, a insegurança feminina, mesmo naqueles
dias em que o cabelo acorda brigando com as leis do cosmo, dissolve-se em
segundos, num suspiro, na velocidade de um pastel, na ligeireza de um caldo-
de-cana.
I LOVE CASSAVETES
OU LUA NA SARJETA
*Trecho de Caballeros Solitários Rumo ao Sol Poente (ed.do bispo), livro nuevo
deste escriba paraguayo e muambeiro del amor e de la suerte, lançamento
sexta-feira, 16/11, na programação da Balada Literária -Mercearia São Pedro,
rua rodésia 34, vila madalena, das 19h até o último comancheiro vivo!
lá dentro, léguas submarinas, uma aventura ainda maior do que a tua, pobre e
amado julio verne, segredos e algas com infinitas variações degustivas, mas
sem frescuras, com gosto, muito gosto, devoção, decência, loucura, a lingüinha
de cima segue contra vento e maré entre plantas carnívoras, verdes mares
bravios, enquanto isso cardumes delirantes se deslocam até o juízo da moça,
provocando-lhe um estrago nos miolos enquanto outra língua avança, tanto
pode ser de rapaz como de outra rapariga, os mistérios marinhos ao infinito,
comum de dois, ali mais embaixo, como se voltássemos para o princípio, um
coralzinho levemente mais áspero, quase arrecifes, experimente agora um
dedo mais profundo, deixe o grelhinho a balançar como no trapézio do cérebro,
outros peixes iluminados irão se esconder por um tempo, descanso no céu da
boca do(a) dono(a) da língua, ai que preguiça, dirão os pestes, uma vez que as
arraias hedonistas já intercedem, chamando-os para a festa aqui embaixo,
pedagogia do gozo, clamam, desçam dessa boca-istmo, golfo, aos vossos
lugares, os mares da moça, o preparo do gozo etc, e o moço ou a gazela da
língua, enquanto sobem um pouco e respiram, avistam, rentes às suas
comovidas retinas, os sargaços na areia entre os ilíacos, ossinhos-âncoras,
como rochas que dividem as praias de angra, os sargaços são os pêlos mais
lindos na areia do ventre como esculturas do acaso –obra de paulo bruscky-,
seus mistérios marinhos e um mar de histórias e coisas, ali embaixo náufrago e
pirata, ali, mulher, sou teu robinson crusoé e outros tantos perdidos nas tuas
encantadas e misteriosas islas adonde escuto os vinis do pixies batendo com
as ondas nas rochas vulcânicas.
Nada como um gay nas nossas pobres existências sobre a terra, essa
passagenzinha de nada, velho e bom Kardec.
Sim, um gay de verdade, com toda a sua riqueza de alma.
Agora falando sério: um gay é tudo em nossas vidas.
Duas ou três coisas que deveríamos saber mesmo sobre eles: toda
grande mulher tem um gay como principal e inseparável amigo; festa sem gay
não decola, não emplaca, não orna; o mundo sem estas alegres criaturas teria
muito menos delicadeza e graça. Festa sem gay não tem liga, nossas mulheres
sem eles não são as mesmas...
São sentenças bíblicas. Deveriam constar de lei federal, nas tábuas de
Moisés, em todos os testamentos.
Você já viu uma festa sem gay animada? Também não.
A pista não pega fogo, as mulheres não têm com quem fuxicar sobre o
modelito da perua mais próxima... Seja forró, o velho e amado roque, música
eletrônica ou um sambinha esquema novo.
Seja em NY, Recife ou Crato.
A mesma lição da festa perfeita vale para a amizade das nossas
gazelas. Mulher sem um amigo gay nos arredores não tem graça. Com um gay
como melhor amigo, ela fica mais inteligente, mais bem-humorada, mas
faceira, acerta a roupa que veste, pinta o cabelo pra sair da rotina, o diabo,
coisa marlinda...
E você, cabrón, enquanto a amada vai ver o filme-cabeça com a biba
amiga, ainda pode ficar em casa curtindo tranqüilamente aquele trágico Grêmio
x Corinthians...
TRESNOITAR-SE
LSDeus, sempre, vide bula, remate de males, expansão de mares nunca
dantes, avalovaras, gullivers,conrads... a volta ao nada em oitenta parafusos
(frouxos!). um gato que anda na ponta dos pés, viagem ao redor do rabo, e que
eu penso o gato sê-la, a bailarina fantasma de arnaldo baptista -seu corpo
decente quanto nu chega enfim aos braços meus.
“só pode ser amor o que eu estou sentido", faixa cinco, a mesma bolacha,
o velho choro da carnaúba sob a agulha, 45 rotações nostálgicas... e a mágoa
entre o pote e o scratch cachoalha um delay no juízo.
Nobody knows,. sai chão, sai medo, quem estará na garupa?, a vida
engana na curva do velho Chico ou do rio sujo do compay Terron, não havia
nada lás, jacarés nas nuvens nadam, boquiabertas sestas entregues aos
pelicanos bucais.
LSDeus, o gato de novo se arrasta tão elegante sobre o taco que eu
penso na linda ninfo que me vem, promoção de outros deuses, agora penso na
miss vagaba, corações sem vulvas, promoção para os que acreditam nos
sabiás que madrugam acordando os despertadores baratos dos pobres dessa
floresta negra –Nel mezzo del camim de nostra vita – doravante denominada
Chivas Las Vegas, como a banda de Alex Antunes.
(Louvado seja Deus/ que nos deus o rock´n´roll/ clonando Cristo/ através
do sangue do Santo Sudário/ Ciclone...”)
LSDeus rogai por nós que recorremos a vós nesse vale de lágrimas, onde
só as carcaças a nadarem bovinamente são vistas aqui de mis gafas. Um
jovem cão arranha o teto ou terá tocado outra vez “the end” do doors? Q
velharia tosca, amiga sombra, é apenas uma sobrinha de nada de ácido no
juízo nostálgica de outra sobrinha de nada que persegue o outro quartinho (se
muito) que corre atrás daquela “presa” do zaca no sonar das antiga, que
remete aos quadradrinhos com desenhos druidas que já viraram estrume no
juízo e lá eu planto lindos cogumelos onde meu amor irá finalmente ter o seu
jardim suspenso.
no cinema já chorei muito com boas ou más películas, mas em casa nunca
derramei tantas cachoeiras guardadas (viva humberto mauro, cinema é
chororôrorôôô...!) cinema é chorar os choros-algibeiras do perigo das horas, é
chorar o carlão reichenbach do genial reformatório de moças sodomizadas por
jesus cristo, amém, é llorar como na canción de roy orbison, cinema é perder-
se sem lente de contato e sem soro para guardar los ojos de cuervos, cinema
é... morrer de chorar com the straight story, lynch, minha dívida com o
cinemascope, que tive que pagá-la com telecine-cult-gato-gambiarra-barbieri, a
história real, david, q filme, nuestros abuellitos, nuestros futuros, quem dera,
atravessando um desierto de quaisquer interiores, de quaisquer rasos das
catarinas, em busca de borrar uma mágoa que ninguém sabia direito de onde
partira, família, marrecos nos céus de todas as miras de nuestros almoços de
domingo, e aquele senhor dos seus 70 em riba dum cortador de grama,
tratozito de estradas mais perdidas do que nunca, um épico com sustança,
como o próprio david nunca tinha sido capaz , o maior filme sobre irmãos
desde o documentário bíblico de caim e de abel, sangre que corre nas mesmas
veias, hemodiálise de rios e fronteiras, elogio-mor aos filhos e aos gametas
perdidos, lynch como o mais audiovisual dostoievsky possible.
DIÁRIO DO ENTORPECIMENTO
flores depois do baile, ainda na calle... enrosco no taco, mais um tango para
gastar a manteiga que seria dos futuros croissants... ela aumenta o sonic youth
para competir com o sabiá histérico que bica os farelos da manhã de
domingo... mi corazon, pobre involuntário, recita algo como a canção do beco
de william blake, doces sorrisos da noite balançam sobre meu terno deleite da
pista, a vida-bicicleta, aros e rodas, pede sussurando com jeitinho, implora: se
parar cai, mi viejo safado, se vais envelhecer q seja sem nenhuma dignidade,
as flores na garrafa torta de vinho guardam nosso sono de costelas-araldite,
sueños-super-bonder, peixinhos vermelhos, betas do mangue q virou
calçamento, rumble fish no aquário da melhor das nuestras noches desde que
anaxágoras, esse proparoxítono das antigas, descobriu as fases de la luna
caliente, dorme meu anjo que teu vira-lata, perro callejero, vigia as fronteiras da
suposta realidade suposta.
a teus pés, toda hora, todo devoto que se preze, feitio de oração, pezinhos 36,
37, 38, conforme confiro aqui gravado em lito no cimento fresco da calçada,
conforme machucado aqui no meu peito quando me pisavas com raiva e
desejo, “seu coiso, não vês que te quero”... Começo a beijar pelo solo pátrio,
nem que o chão esteja quente como no Crato, como em Teresina, onde o papa
João Paulo II foi fazer aquela graça e queimou a língua, donzela bela que
inspira a lira, a loa e a larica, meu docinho de coco aliterado no último, meu
quebra-queixo, minha tapioca com nata, minha carne de sol dormida no leite,
minha manteiga de garrafa, minha nega, contigo me derreto como no nosso
último tango do agreste.
UM CAUBÓI NO ESPAÇO
“mira, num pido mucho, solamente tu mano, teneria como um sapito que
duerme asi contento.”
(veja, não peço muito, apenas tua mão, tê-la como um sapinho que dorme
assim satisfeito).
miro cortazar na coyote, a revista, regalo do amigo losnak, q gente fina, grande
abraço, viejo, mira, mina, o avião treme, o teste da turbulência, regresso de
londrina, londrix, no céu, no céu, no céu, é na turbulência, como eu ia te
dizeno, é na turbulência que um ex-acrófobo de nascença se descobre um
destemido, mira, yo soy fernão brega gaivota, mira, mina, a turbulência
hierarquiza as perdições de um corazón ou estarei viajando uma vez mais
entre nuvens de doces algodo~es?
é na turbulência que se sabe das coisas, é donde as afinidades eletivas
grudam como nossas costelas em noites-araldite, o avião treme, play again,
beatles, i wanna hold your hand... bis! repete mil vezes o estribilho clichetoso
do amor e da suerte.
Diante de cartas e mais cartas de leitores, baixou de novo uma Miss Corações
Solitários neste escriba que vos sopra o cangote. Miss C.S. é uma cigana da
Andaluzia que hoje se divide entre um quintal do Capibaribe e uma choupana,
para lá de ecologicamente correta, na Serra do Araripe, na divisa do Exu com o
Crato. Com a sua poderosa entidade, M.C.S. socorre machos & fêmeas à beira
de um ataque de nervos... ou simplesmente portadores do inapagável fogo nas
entranhas. Às missivas, pois, aqui histericamente resumidas:
Poderosa Miss C.S., fui vergonhosamente traído por minha mulher, tipo
flagrante delito, o que fazer? (Devoto da Gaia Ciência, Cajazeiras, PB )
Resposta: Amigo incoformado, deixo aqui, como filosofia de consolação,
a sabedoria de um pára-choque que acaba de me abalroar: “Chifre foi feito pra
homem, boi usa de enxerido”. Sem mais, M.C.S.
sim,e agora, agradeço a quem,meu deus, pára tudo, rezo virado para donde,
donzela bela que me inspira a lira?, miro que horizonte possível de deuses
incas nessa hora?, q faço com tantos mistérios?, quantos rosários à nossa
senhora da pequena morte? -como diz minha amiga clarah. pra que lado fica
Meca nesse momento, SP, interior, noite, bem cá dentro, corta, tela escura, 8
graus de miopia e astigmatismo, q fiz para tanto gozo, iluminação e sorte?, não
lembro de tantas boas ações desse naipe, não ajudei aos mais pobres, não
doei um centavo,não tentei salvar o planeta, gastei água até demais nos
banhos pensando nela mesma... que faço, velho e bom Moisés, respeito as
tábuas sagradas ou atravesso o mar vermelho antes mesmo da TPM?, que
faço, amigos, se não há adjetivos que lambuzem minhas palavras como maçãs
carameladas antes de subir na roda gigante?, sim, mas agora, como perguntei
naquele mesmo instante à nobre rapariga, para quem oro, para quem mando
ex-votos com caras de “ai meu deus!”? sim, pra ela mesma eu agradeço,
devoto, mas não é possível que não exista um deus por trás daquilo tudo, uma
santa dos shortinhos encarnados, um profeta de sofisticadas safadezas,
um kurt cobain beatificado, alguma alteza, um elvis cantando mistery train para
embalar nossos sonhos, um santo agostinho –“livrai-me das tentações, Senhor,
mas não hoje!”-, algo havia ali de sagrado naquele momento ou já estávamos
no melhor dos infernos mesmo?