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Sociedades de Reabilitação Urbana e modelos de cidade:

A imagem de cidade projectada pelo Masterplan para a Baixa do Porto


(Autor: David Afonso M. Pinho)
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1. As Sociedades de Reabilitação Urbana (SRU) arrendatários devem ser ponderados; e) Os


promotores privados devem ser
As Sociedades de Reabilitação Urbana economicamente incentivados; f) O processo
(SRU) aparecem como a mais recente deve ser célere.
estratégia de reabilitação dos centros históricos
degradados e foram instituídas pelo Decreto- Não obstante o dito carácter excepcional
1
Lei nº 104/2004 , de 7 de Maio. Tratam-se de destas sociedades, estas rapidamente se
sociedades de capitais exclusivamente públicos, impuseram no panorama nacional existindo
podendo algumas delas constituírem-se a título neste momento várias cidades que já
excepcional e apenas em caso de interesse adoptaram ou estão em fase de adopção deste
público sob a figura jurídica de sociedades modelo de intervenção urbana: Coimbra,
anónimas de capitais públicos repartidos entre Lisboa (contribui com três), Porto, Fátima,
o estado central e o município. Neste caso, Viseu, Évora, Vila Real de Santo António, Vila
estamos perante uma sociedade gerida por Nova de Gaia, Sintra, Leiria, Covilhã, Oeiras,
uma administração nomeada pelos poderes Torres Novas, Cadaval, Seia e outras ainda por
públicos, dotada de capitais públicos, com uma vir. Perante tal proliferação será de perguntar
missão que resulta de um consenso e mandato se a excepção não correrá o risco de se tornar
2 3
político, mas que é de direito privado . Em todo na regra . Acresce ainda dizer as autarquias que
o caso, a grande maioria das SRU’s constituídas assim o entendam, podem levar a cabo
até ao momento optaram por não se processos de reabilitação apoiados nesta
constituírem enquanto sociedades anónimas. legislação sem que para isso tenham de
formalizar SRU´s, pelo que é previsível que a
Seja lá qual for o caso, o diploma sublinha influência desta lei vá muito para além das
o carácter excepcional do regime jurídico das SRU’s existentes ou que venham a existir.
SRU’s que só é aplicável nas «áreas críticas de
recuperação e reconversão urbanística” A que é que se propõem estas novas
(ACRRU), constituídas sobretudo zonas urbanas sociedades? Em primeiro lugar, reabilitar áreas
históricas (ZUH). A prevalência deste regime urbanas classificadas como zonas históricas em
excepcional depende da obediência a certos plano municipal de ordenamento do território
princípios: a) A responsabilidade da reabilitação centrando-se, sobretudo, na requalificação do
urbana cabe aos municípios; b) Os municípios parque habitacional tendo em vista o
podem constituir sociedades de reabilitação repovoamento dos centros urbanos. Em
urbana para as quais transferem poderes de segundo lugar, desenvolver e promover áreas
autoridade e polícia administrativa; c) Todo o de negócio como complemento à função
procedimento de reabilitação urbana deve ser habitacional e como factor de atracção de
controlado pelos poderes públicos; d) Os novos habitantes e de mais investimentos. Em
direitos e obrigações dos proprietários e terceiro lugar, revitalizar o espaço público,
melhorando as acessibilidades, infra-estruturas
1
Há quem encontre semelhanças entre o nosso Decreto-Lei e mobiliário urbano. Em quarto lugar,
nº 104/2004, de 7 de Maio e as legislações espanhola e dinamizar o turismo, cultura e lazer.
francesa (Metello, 2008, pp24 – 28) o que poderá indiciar
que esta tendência não seja meramente local.
2
Ao abrigo deste estatuto as SRU’s podem adjudicar obras 3
e contratar técnicos, por exemplo, sem terem de se sujeitar O Masterplan da Portovivo SRU propõe, inclusive, a
a todos os trâmites administrativos que normalmente criação de uma Associação Nacional de Sociedades de
envolvem estas acções. Reabilitação Urbana.

1
Entende-se por reabilitação urbana o contornos das Zonas de Intervenção Prioritária
«processo de transformação do solo (ZIP) deve ser precedido de um diagnóstico que
urbanizado, compreendendo a execução de identifique as características da estrutura
obras de construção, reconstrução, alteração, urbana, do edificado e situação cadastral das
ampliação, demolição e conservação de áreas de intervenção, por uma lado, e, por
edifícios, tal como definidas no regime jurídico outro lado, que identifique as principais
da urbanização e da edificação, com o objectivo dinâmicas económicas, sociais e do mercado
de melhorar as suas condições de uso, imobiliário. Este diagnóstico deve ser ainda
conservando o seu carácter fundamental, bem enquadrado num contexto mais vasto,
como o conjunto de operações urbanísticas e abrangendo os concelhos limítrofes, a região
de loteamento e obras de urbanização que onde se encontra o concelho, chegando à
visem a recuperação de zonas históricas e de escala do território nacional e até mesmo
áreas críticas de recuperação e reconversão internacional. Para além do diagnóstico, os
urbanística» (Silva, 2007, p.14). Esta concepção estudos de base podem igualmente sugerir
é restritiva, acantonando a reabilitação urbana estratégias de intervenção que podem englobar
no conjunto de procedimentos de intervenção diversos aspectos desde da definição das
física sobre o edificado e é apenas para este tipologias da habitação a desenvolver, até à
sentido que a legislação nos remete. No identificação dos potenciais parceiros,
entanto, a política das SRU’s vai passando pela definição dos mercados-alvo e
invariavelmente para lá desta delimitação legal das necessidades a nível da infra-estrutura.
e parece a assumir uma outra concepção de Estes estudos de base assumem diversas
reabilitação urbana no seu lato sensu: «A formas, sendo algumas vezes da
reabilitação urbana consiste numa política responsabilidade das próprias SRU’s, outras
urbana que procura a requalificação da cidade vezes de entidades externas contratadas para
existente, desenvolvendo estratégias de esse fim.
intervenção múltiplas, que dão origem a um
conjunto de acções coerentes e de forma
programada, destinadas a potenciar os valores
2. A Sociedade de Reabilitação Urbana –
sócio-económicos, ambientais e funcionais de
Portovivo S.A.
determinadas áreas urbanas, com a finalidade
de elevar a qualidade de vida das populações No caso da cidade do Porto, em finais de
residentes, melhorando as condições físicas do 2004 foi constituída a Portovivo, SRU –
seu parque edificado, os níveis de Sociedade de Reabilitação da Baixa Portuense,
4
habitabilidade e de dotação em equipamentos S.A. com a missão de «promover a reabilitação
e reconversão do património degradado da
comunitários, infra-estruturas, instalações e
Área Crítica de Recuperação e Reconversão
espaços de uso público» (Silva, 2007, p.15). A Urbanística do concelho do Porto». Trata-se de
legitimação desta concepção alargada de uma sociedade anónima de capitais
reabilitação urbana não será feita por via de exclusivamente públicos (60% INH e 40% CMP),
diploma legal, mas através de um documento constituída por uma pequena equipa de
de natureza diversa e sem força de lei que nem técnicos recrutados nas condições do artº 20º
sequer é previsto na redacção do decreto dos seus estatutos («Podem exercer funções na
Porto Vivo, em comissão de serviço,
104/2004 que são os chamados estudos de
destacamento ou requisição, funcionários do
base. Estado e dos institutos públicos, das autarquias
locais, bem como trabalhadores de quaisquer
Os estudos de base são um instrumento empresas públicas ou privadas, que manterão
preliminar que justificam a delimitação das todos os direitos inerentes ao seu quadro de
áreas de intervenção prioritária, a metodologia origem, nos termos da lei aplicável») oriundos
e os meios a convocar para esse fim. São, da Comissão de Coordenação de
portanto, simultaneamente instrumentos
4
Estatutos publicados na IIIª série do Diário da República,
normativos e de diagnóstico. O desenho dos de 23 de Março de 2005

2
Desenvolvimento da Região Norte (CCDRN), da designado por conselho consultivo, composto
Fundação para o Desenvolvimento da Zona por pessoas de sabedoria e experiência
Histórica do Porto (FDZHP) e da Câmara especialmente relevante e cuja audição pelo
Municipal do Porto . Dentro desta missão atrás conselho de administração possa contribuir
referida são atribuídas à Portovivo, nos termos para a plena realização do objecto e dos fins
da lei, as seguintes competências: sociais.» Este órgão veio a ser constituído,
contando com nomes como Agostinho Barrias
a) Seleccionar os investidores com base (empresário proprietário dos cafés Majestic e
em, critérios determinados Guarany), António Condé Pinto (director-geral
previamente, nomeadamente: a da Unihsnor - União dos Industriais de Hotelaria
idoneidade, a capacidade financeira, a e Similares do Norte de Portugal), Artur Santos
capacidade técnica, a qualidade dos Silva (Presidente do Conselho de Administração
projectos de reabilitação, preços e do BPI e homem de cultura que esteve, por
prazos; algum tempo, ligado à Porto2001, Capital
Europeia da Cultura), Germano Silva
b) Celebrar com as entidades (historiador da cidade e jornalista), Hélder
seleccionadas e demais entidades Pacheco (escritor autor de várias obras sobre a
envolvidas nos projectos de cidade do Porto), Novais Barbosa (Reitor da UP
reabilitação e de reconversão do entre 1998 e 2006), José Marques dos Santos
património todos os contratos (Reitor da UP desde 2006), Luís Braga da Cruz
necessários à execução dos mesmos; (catedrático e ex-presidente da Comissão de
Coordenação e Desenvolvimento Regional do
c) Acompanhar a execução dos projectos Norte), Luís Oliveira Ramos (historiador e Reitor
5
e fiscalizar o cumprimento dos prazos da UP nos anos de 1982 a 1985), Siza Vieira ,
e padrões de construção; Daniel Bessa e Valente de Oliveira e outros.

d) Diligenciar pela criação de infra- O conselho consultivo é constituído por


estruturas adequadas e de elevados personalidades locais, os chamados notáveis. É
níveis de mobilidade e de segurança de notar que não se trata de um conselho de
de pessoas e bens; técnicos, mas do escol da cidade, uma espécie
de conselho de «homens bons» oriundos de
diversos quadrantes partidários. Uma caixa de
e) Praticar uma política de comunicação
ressonância que funciona como instância
adequada às exigências colocadas pelo
legitimadora da acção da sociedade de
cumprimento do dever de informar;
reabilitação urbana. De algum modo, tem por
objectivo garantir o vínculo com a cidade, aliás,
f) Implementar procedimentos que com uma certa cidade. Não se tratando de um
reduzam os prazos e os custos nas órgão com poder executivo, o seu único poder
tramitações a que estejam obrigados é o de emitir opinião, mas não deixa por esse
os investidores; motivo de possuir alguma relevância. De uma
forma geral, excepto no caso do Mercado do
g) Propor os regimes fiscais e parafiscais Bolhão, o CC tem validado a política de
especiais que se mostrem adequados à reabilitação da Portovivo, contribuindo
execução dos projectos de reabilitação decisivamente para a eficácia do discurso do
e reconversão do património; consenso.

h) Proceder à elaboração de normas no


âmbito da sua exclusiva competência.
3. O Masterplan e imagem de cidade

Estas competências já se encontram 3.1. Um documento de consensos…


inscritas na lei e não vão muito para além de
uma concepção restrita e material de
reabilitação urbana. O único ponto que
representa uma inovação, é a criação de um 5
Este cinco quarteirões-piloto localizam-se áreas
conselho consultivo: «A Porto Vivo poderá ter territoriais homogéneas: Aliados, Sé/Vitória, Infante, Carlos
um órgão consultivo, não vinculativo, Alberto, República e Poveiros/S. Lázaro.

3
Em Outubro de 2003 nomeou uma feito de normas e vínculos, é antes um
comissão instaladora presidida pelo economista documento de enquadramento para as acções
Joaquim Branco, a qual tratou de encomendar futuras que baseado em regras e objectivos
um plano estratégico à Faculdade de claros, capitaliza a necessidade de debelar
Engenharia da Universidade do Porto. O Estudo problemas, transformando-os em
Estratégico para o Enquadramento de oportunidades de investimento e acções
Intervenções de Reabilitação Urbana da Baixa concretas de resolução dos mesmos. Este é pois
do Porto (estudo levado a cabo sobe um documento cultural, preparado e
coordenação da Engª Breda Vazquez) foi desenhado através da participação de inúmeros
apresentado em 2004. Este documento define actores sociais, económicos, operadores,
dentro da ACRRU as ZIP, bem como uma série agentes públicos e privados.» (Masterplan,
6
de cinco quarteirões-piloto sobre os quais 2005).
deviam incidir numa primeira fase as operações
de reabilitação. Esta delimitação resulta de um Trata-se de um documento que pela sua
diagnóstico e obedece a um conjunto de retórica se arroga de carácter consensual. Já o
critérios estratégicos que serão adoptados por tínhamos visto aquando da constituição do
um outro documento também ele de carácter Conselho Consultivo e vemo-lo agora aqui. A
estratégico mas de maior abrangência. filosofia e objectivos gerais remetem-nos para
o conceito de Intervenção Integrada
Em Dezembro de 2005, foi apresentado o Participativa e Concertada (p.1) e para um
7
Masterplan que define o enquadramento e conjunto de descritores normativos que nos
orientação do processo de reabilitação urbana dizem o que deve vir a ser o processo de
da Baixa Portuense, onde se definem os reabilitação: as metodologias devem ser
objectivos e as metas a atingir, a estratégia e os «flexíveis, práticas e suficientemente abertas»;
instrumentos operativos. Tratando-se de um os instrumentos devem ser assimiláveis por
documento nuclear em todo o processo de todos os agentes envolvidos; a intervenção
reabilitação física, económica e social, dever baseada na «aceitação mútua dos
definindo as metas a médio e longo prazo para direitos legítimos de intervenção e defesa de
a cidade importa analisar criticamente a interesses por parte de todos os agentes,
imagem de cidade aí projectada, bem como os partilhando responsabilidade», através de um
pressupostos que orientaram a arquitectura do «processo de participação e da promoção da
documento. capacidade de negociação» e da «abertura a
todas as possibilidades e opiniões dentro das
Um aspecto curioso neste documento é regras gerais da concertação e da tolerância
que, legalmente, a SRU não estaria obrigada a estabelecidas na sociedade. E o documento
desenvolvê-lo. O conteúdo do texto vai muito insiste: «diálogo mútuo», «uma luta
para além da transposição da legislação. Este permanente e consistente na compatibilização
documento é declaradamente ambicioso: «O das diferentes conveniências», «esforço de
Masterplan não é […] um plano estratégico concertação», «participação da população»,
6
«trabalhar em conjunto», «aprendizagem
A Porto Vivo acabou por deixar cair esta intenção,
alterando o cronograma inicialmente previsto.
mútua», culminando numa fórmula
8
rousseauniana: «um contrato social entre a
7
Este documento foi desenvolvido pela HWCA –
comunidade que constitui a cidade e o
Arquitectura, Design e Multimédia Lda que terá
desenvolvido igualmente a estratégia para a revitalização individuo, bem como entre a cidade e a sua
do Barreiro antigo e para a SRU de Coimbra, mas da qual administração». Lendo as duas primeiras
não se conhece nenhum outro trabalho e pela Gestluz –
Consultores. Esta última, para além da colaboração no páginas quase seriamos tentados a esquecer
desenvolvimento do Masterplan, também ajudou a que a constituição das SRU’s implica a
desenvolver os conceitos Loja da Reabilitação e Gestor de
Área Urbana. Em todo o caso, o documento saiu sem
qualquer ficha técnica que permita identificar os seus
8
autores. Todos os sublinhados são da nossa responsabilidade.

4
10
delegação de poderes que habitualmente de intervenção preferível o quarteirão , que
cabem às autarquias com todas as pode, a pretexto de resolver o problema da
consequências que daí advêm em termos de escala de intervenção, encerrar dentro de si
limitação do controlo democrático o qual fica uma determinada ideia de cidade. De facto, a
praticamente reduzido ao direito de veto em sustentabilidade económica da reabilitação –
9
sede de Assembleia Municipal , para além de leia-se: a sua capacidade de atrair investimento
que estamos perante um «contrato social» com privado – depende da possibilidade das
um certo sabor hobbesiano, já que o artigos operações de promoção imobiliária ocorrerem
20º e 21º do Decreto 104/2004 que erige as sobre um conjunto edificado e não sobre
SRU´s e que, afinal de contas, justifica a edifícios avulso, socorrendo-se de operações de
existência deste plano estratégico, não deixa reparcelamento que pressupõem a
qualquer margem para dúvidas: «Na falta de reorganização da cidade em “pacotes” mais
acordo de todos os proprietários sobre a atractivos para os investidores. Todavia, este
reabilitação […], a SRU toma directamente a retorno à cidade-quarteirão orientado pela
seu cargo a tarefa de reabilitação do edifício ou necessidade circunstancial de se facilitar a
de parte deste» e «Caso tal se revele intervenção física com o objectivo de potenciar
necessário, a SRU procederá à expropriação dos a sua atractibilidade económica face aos
imóveis ou fracções a reabilitar nos termos do grandes investidores (neste contexto, o
Código das Expropriações…». conceito “empresa-quarteirão” tem sido
teorizado como uma hipótese de trabalho),
coincide com um modelo de cidade que
procura reinterpretar a sua morfologia no
3.2. O quarteirão como unidade de
sentido de um urbanismo de proximidade. Este
intervenção urbana
modelo de cidade representa uma das
Mas a verdade é que o chamado tendências emergentes da cidade pós-
Masterplan é mais abrangente no seu objecto industrial, que procura reavivar (se é que elas
se comparado com o corpo da lei e com o alguma vez existiram) as relações de
próprio Estudo Estratégico para o proximidade e de vizinhança através de um
Enquadramento de Intervenções de reordenamento que ligue num raio de 10
Reabilitação Urbana da Baixa do Porto minutos a pé a residência, o trabalho e o lazer
desenvolvido pela FEUP. Coloca-se num âmbito (Krier, 1999), uma cidade de quarteirões,
mais alargado, já que se identifica com uma portanto.
concepção de reabilitação urbana integrada,
É claro que a partir daqui já não estamos a
estabelecendo uma estratégia
falar de uma reabilitação urbana no seu sentido
multidimensional que envolve todas as
restrito, mas de um processo complexo com
dimensões da vida urbana e não apenas o
inevitáveis componentes de ordem económica,
edificado. De certo modo, a lei já faz apelo, de
social e cultural. É nesta perspectiva que Milão
uma forma implícita, a esta
(2006) procura cruzar a problemática da
multidimensionalidade ao eleger como unidade
regeneração urbana com o conceito de cidade
criativa, tendo como referência a realidade das
Sociedades de Reabilitação Urbana. Analisa oito
9
Um dos aspectos que suscitaram maiores reservas
políticas à aprovação dos estatutos da SRU e que terá, 10
Artigo 14º do Decreto nº 104/2004: «A unidade de
inclusive, motivado a reprovação da sua primeira versão intervenção corresponderá, regra geral, a um quarteirão,
pela Assembleia Municipal do Porto. Impasse que só foi pátio ou rua, podendo em casos de particular interesse
ultrapassado através da anexação de um acordo parassocial público corresponder a um edifício.» Este artigo tem
garantindo que no prazo de três anos a Câmara seria sócia suscitado críticas por parte de alguns especialistas em
reabilitação do património que vêm aqui uma porta aberta
maioritária da SRU e que todos os documentos respeitantes
para a destruição dos métodos construtivos tradicionais e
à sociedade (incluindo orçamento e contas) seriam para a descaracterização do skyline da cidade, já que a
entregues ao Executivo e à Assembleia Municipal. tendência tem sido a de homogeneizar a cércea dos
edifícios.

5
paisagens urbanas em transformação (Dublin, Património da Humanidade” e a rede de
11
Bruxelas, Berlim, Barcelona, Londres, equipamentos já existentes ; E) Qualificação
Copenhaga, Viena e Amesterdão), estudando do domínio público como suporte de
de que modo as estratégias de reabilitação convivências, assumindo-se como transversal e
urbana abordam diferentes unidades unificador de todas as linhas de intervenção
morfológicas (quarteirões ou conjuntos de atrás descritas e que deverá acontecer ao nível
quarteirões, pátios, ruas e edifícios das infra-estruturas de apoio aos diferentes
emblemáticos) a partir do seu potencial de sectores, da reabilitação dos espaços urbanos
regeneração cultural, social e económico, de existentes e da criação de novos espaços que
onde conclui que a relação entre a cultura privilegiem o peão e o transporte público com
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contemporânea e desenho urbano, resume-se destaque para o metro e eléctrico ; F) Acções
a três processos solidários de transformação estratégicas de carácter excepcional e
urbana: gentrificação, regeneração cultural e transversal (como o caso do Mercado do
urbana. Bolhão e da Frente Ribeirinha). Com a
prossecução da linha de acção definida por
estes vectores, pretende-se que a cidade do
Porto se assuma como um caso europeu de
3.3. Princípios de actuação, objectivos e meios
Revitalização Urbana, Social e Económica. Aliás,
de operacionalização
o documento fala mesmo em «Europeização do
É precisamente nesta linha que se processo da Baixa do Porto» como uma mais
posiciona a estratégia do Masterplan. Foram valia para a cidade e para o país, em que «o
identificados no documento quatro princípios processo de revitalização urbana da Baixa deve
de actuação: 1) Sustentabilidade, onde se potenciar a sua competitividade».
tomam como referências o Relatório Bruntland,
O modelo de operacionalização proposto
o modelo “Triple Bottom Line” que
assenta sobretudo na constituição de parcerias
compreende os domínios económico,
público/privado: a) Parceria para a Baixa
ambiental e social e a Agenda Local 21; 2)
Tecnológica que faça da Baixa um local de
Identidade, por onde se procura explorar as
residência para estudantes e comunidade
características do sítio, das gentes e da história
científica; b) Parceria para a Baixa Energética e
local; 3) Criatividade, vista como o motor de
uma economia emergente; 4) Integração, ou
11
seja, interligação e articulação dos princípios «A transformação das estruturas da economia mundial,
marcada pelo ruir das cidades industriais, pelo aumento do
atrás enunciados. consumo e pelo alargamento das práticas de lazer, levou
muitas cidades dominadas por economias industriais ou
Os vectores de desenvolvimentos agrícolas a reconverterem-se. Neste contexto, as chamadas
‘cidades históricas’ encontraram no genius loci um trunfo
enunciados no programa são seis: A) Re- para fazer face à erosão do seu tecido económico e à perda
habitação da Baixa do Porto através da de competitividade.» (Peixoto, 2000)
promoção da instalação de jovens e de famílias 12
A este propósito, Matos (2007): «A análise sobre os
no centro da cidade, estando este vector aspectos que devem constituir as principais prioridades de
dependente sobretudo da alteração da Lei das intervenção na Baixa do Porto, na óptica do segmento de
procura inquirido, leva-nos a concluir, que se tratam dos
Rendas; B) Desenvolvimento e promoção do atributos geralmente mais relevantes na escolha do local
negócio na Baixa do Porto como oportunidade de residência destacando-se, particularmente, os níveis de
segurança, a boa qualidade ambiental e a
para afirmação da Baixa na cidade e da cidade acessibilidade/fluidez do tráfego. Esta constatação permite-
na região, explorando a promoção de áreas de nos salientar que, se aquilo que se pretende é uma
revitalização do mercado habitacional, que vise uma
negócio ligadas à criatividade, à ciência e ao melhoria de qualidade, não só do espaço do alojamento,
ambiente; C) Revitalização do comércio mas particularmente, de todo o espaço envolvente à casa,
apostando na sua identidade local e no será necessário inverter a imagem depreciativa, a que estão
associados os atributos que mais influenciam a decisão da
aperfeiçoamento dos serviços de interacção escolha de um local de residência.» Estas conclusões
com o cliente; D) Dinamização do turismo, persistem em dois inquéritos levados a cabo com oito anos
de intervalo.
cultura e lazer cultivando o factor “Porto –

6
Ambiental que vise o aumento do padrão de O plano é bastante detalhado
conforto e que diferencie a Baixa pelas abarcando a totalidade das áreas de
vantagens ambientais fornecidas; c) Parceria desenvolvimento urbano. Quando procura
para a Baixa Social e Económica que recrie a operacionalizar as medidas, perde-se num
centralidade da Baixa enquanto local de labirinto de medidas para as áreas do negócio,
utilização colectiva e diversificada; d) Parceria comércio, turismo, cultura e lazer.
para a Baixa da Mobilidade que contribua para Contabilizámos cerca de trinta e cinco medidas,
o aumento da capacidade de circulação, para a sem contar as submedidas que cada uma delas
diminuição da carga de tráfego automóvel e implica. Propomo-nos a apresentar apenas
para a promoção de circuitos pedonais; e) alguns exemplos ilustrativos, já que neste
Parceria para a Reabilitação Física que trabalho não cabe a análise detalhada deste
possibilite a manutenção e incremento do item. Assim, para a promoção do turismo
sector residencial, a reutilização do património propõem-se 14 Rotas Turísticas (chega-se ao
edificado e requalificação do espaço público. ponto de referenciar 116 (!) nomes de
Para além destas parcerias, o Masterplan personalidades das artes, ciências, arquitectura
elenca ainda um conjunto de financiamentos, e etc. cuja ligação à cidade poderia justificar o
incentivos e programas dirigidos ao domínio desenho dessas rotas). No que diz respeito ao
público (Fundos Comunitários), ao mercado comércio, propõe-se que se invista em áreas de
empresarial (apoios as jovens empresários, negócio emergentes como o comércio justo, os
constituição de um Fundo de Capital de Risco negócios verdes e as novas estéticas (usos
para apoio a empresas, escritórios a custos híbridos dos espaços comercias tradicionais),
controlados, etc.) e aos promotores e bem como no comércio de luxo (o documento
proprietários (Sistema de Informação fornece uma lista de 42 marcas de luxo a
13
Multicritério do Porto , benefícios fiscais vários captar: Gucci, Prada, Versage, Escada e por aí
e incentivos bancários). Por último, é de fora) e temático (vinho do Porto, ourivesaria e
destacar ainda a introdução de um novo agente alfarrabistas e livreiros), não enjeitando sequer
no terreno (já a partir de Janeiro de 2009), o a tarefa de indicar as localizações mais
Gestor de Área Urbana: «Ao Gestor de Área favoráveis para cada uma destas áreas! Na
Urbana cabem funções de informação, promoção do negócio, propõe-se a
aconselhamento e acompanhamento de aproximação da cidade à universidade e ao
utentes e agentes de desenvolvimento, de sector tecnológico através da construção de um
estabelecimento de plataformas de “Pavilhão da Ciência/Centro do Futuro” no
concertação entre agentes, de indução de Campo 24 de Agosto («Partindo da ideia de
projectos, de monitorização das intervenções e edificar um espaço e logística multi-funcional,
das políticas tendo em vista analisar mudanças de atributos formais de beleza e diferença,
ou sugerir correcções, de gestão da pretende-se atrair investimento, actividades de
manutenção do espaço público, etc» investigação, acontecimentos e massa crítica de
(Masterplan, 2005). todos os pontos do país e também de origem
externa, proporcionar a circulação de saber e
produtos e a sua apropriação numa lógica de
enquadramento económico,
3.4. Plano Operacional para a Promoção do
desenvolvimentista, social e urbano»
Negócio, Comércio e Turismo, Cultura e Lazer
(Masterplan, 2005, vol. II, p. 41), o qual se
articularia com um Parque da Inovação a
instalar nas imediações (Rua das Doze Casas).
13
O SIM-Porto é um sistema inovador em Portugal que
procura estimular a reabilitação do edificado degradado
através da concessão de créditos que podem ser traduzidos
em capacidade construtiva fora da ACRRU, caso o promotor 3.5. Caracterização sumária do Masterplan
ou proprietário reabilite património dentro dessa área.
Estes créditos podem ser livremente transaccionados e não
têm qualquer prazo de validade.

7
1. O plano estratégico não elege um observar nos documentos estratégicos que são
único sector estratégico, optando por todos elaborados à escala de quarteirão.
aqueles que são veiculados pelos modelos de
regeneração urbana dominantes nos últimos 5. Apesar do que foi dito no ponto
anos: as industrias criativas, o sector anterior, as parcerias com os privados são
tecnológico, o património, o ambiente, o fundamentais e sem elas não há reabilitação. O
turismo e o comércio. Daqui só se estranha a trabalho da SRU é o de orientar, regulamentar,
exclusão do desporto, que já é hoje um sector fiscalizar e estimular a participação do sector
estratégico da cidade, nem que seja em termos privado. Sobretudo, daqueles que têm poder
de projecção de imagem desta no resto do financeiro para intervir à escala de quarteirão.
mundo.
6. O quarteirão é a peça chave. A
2. O objectivo de fundo é reabilitar o intervenção sobre um conjunto de edifícios
edificado, repovoar o miolo da cidade com atrai investidores mais robustos. Mas a vivência
jovens e famílias de classe média-alta e em quarteirão também potencia a renovação
inaugurar um novo ciclo de pujança económica. nos modos de se viver na cidade e da economia
Exactamente o mesmo objectivo de qualquer urbana.
outra cidade concorrente.

3. A escala geográfica do documento é


4. Notas finais
sobretudo a da Baixa e da Cidade. Fala-se na
necessidade da Baixa se afirmar na Cidade e da Não é fácil conseguir uma imagem
Cidade liderar a Região. Aliás, o Masterplan vê nítida da cidade pretendida pelo Masterplan.
a envolvente apenas como o espaço de Quando tudo é prioritário, nada é prioritário.
afirmação e domínio da cidade e em momento Pressente-se que o objectivo final tem qualquer
algum se propõe a estabelecer ligações com as coisa de utópico: uma cidade património, líder
14
cidades vizinhas numa lógica de rede . O de uma região, povoada de jovens criativos,
território nacional e a Europa esporadicamente capazes de gerar riqueza pela sua própria
são referidos como territórios de afirmação da iniciativa e inteligência.
cidade. A não ser no caso do turismo cuja lógica
a isso obriga. No entanto, não estamos perante uma
redução da cidade histórica a uma mera
4. Da mesma maneira que no jargão alegoria, a uma cidade postal, reduzida à
jurídico se fala em Nullum crimen sine lege condição de cenário pitoresco. Descontando o
(Não há crime sem lei), quase se podia dizer excesso de optimismo e compulsão normativa
deste plano estratégico que não há dimensão do documento sobre alguns aspectos, parece
alguma da vida urbana que não esteja nele que, no essencial, vai ao encontro de uma certa
contida. Reconhece a multi-dimensionalidade vivência urbana, em que as funções aparecem
do trabalho de reabilitação urbana, que não se mescladas: «a autenticidade de um centro
reduz efectivamente à reabilitação física do histórico pode constituir um dos mais
edificado, mas procura pormenorizar, zonar importantes recursos para um novo processo
actividades económicas, regulamentar usos do de desenvolvimento, sustentado na nova
espaço. Esta tendência também é possível economia dos tempos livres, mas também em
novos sistemas integrados de uso (…) onde
residência e produção podem finalmente
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Esta distorção foi corrigida no recente Estudo conviver, nas possibilidades abertas pelas novas
Macroeconómico – Desenvolvimento de um Cluster de
Indústrias Criativas na Região do Norte promovido pela
formas de produção do chamado terceário
Fundação de Serralves em parceria com a Junta avançado.» (Aguiar, 1999).
Metropolitana do Porto, a Casa da Música e a SRU –
Sociedade de Reabilitação Urbana da Baixa Portuense,
Apesar de não haver uma
onde o Porto aparece inscrito numa rede cidades que
constituem uma região criativa. concentração excessiva no tema do património,

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a estratégia definida depende sempre da apontam todas para o mesmo modelo de
rentabilização dos traços distintivos da cidade cidade.
histórica e da capacidade de introduzir novos
factores de diferenciação. O apelo às indústrias
criativas, a novas formas de turismo, aos
negócios ligados às tecnologias de ponta, à
arquitectura contemporânea como factor de
posicionamento internacional faz todo o
sentido do ponto de vista estratégico. O único
problema é que são estratégias de tipo
globetrotter, aplicadas um pouco por todo o
lado, estando as cidades a competir com as
mesmas armas. Neste contexto, a imagem do
centro histórico é o elemento que pode
desequilibrar porque é o único elemento não
reproduzível. Por esse motivo é que surpreende
que o Masterplan tão detalhado em alguns
aspectos, não seja normativo no que diz
respeito à preservação da integridade desse BIBLIOGRAFIA
património.
AAVV (2004). Estudo Estratégico para o Enquadramento de
Esta estratégia baseada nas parcerias Intervenções de Reabilitação Urbana da Baixa do Porto.
público-privado para projectos de larga escala Porto: FEUP

(o quarteirão), a tentação da gentrificação e o AAVV (2008). Estudo Macroeconómico – Desenvolvimento


aumento da relevância do turismo na economia de um Cluster de Indústrias Criativas na Região do Norte.
das cidades (que justifica o aumento da Porto: Fundação de Serralves
vigilância do espaço público e a promoção de
15 AGUIAR, José (1999). A cidade do futuro já existe hoje.
mega-eventos ) pressupõe, por um lado, uma Algumas notas sobre reabilitação urbana. ATIC Magazine,
desregulação selectiva que no Porto se traduz nº24, Novembro. Lisboa: ATIC
numa simplificação na instrução dos processos
KRIER, Léon (1999) . Arquitectura. Escolha ou fatalidade.
licenciamento mas também num aligeirar no Lisboa: Estar
grau de exigência na preservação do
património que conduz a uma política urbana MATOS, Fátima (2007). Reabilitação urbana da Baixa
Portuense – Qualidade Habitacional. Revista da Faculdade
do fachadismo (já que o miolo dos quarteirões
de Letras, série Geografia, volume I, pp. 33-54. Porto: FLUP
pode ser limpo para aí se construir segundo as
normas de conforto contemporâneo), mas, por METELLO, Francisco C. (2008). Manual da Reabilitação
outro lado, pode implicar um certo Urbana. Legislação anotada e comentada. Coimbra:
Almedina
empreendedorismo estatal através da
construção de equipamentos emblemáticos e MILÃO, Susana (2006). A “Cidade Criativa” e os modelos de
na promoção de eventos de massas. Estas regeneração urbana. Para uma análise crítica das
Sociedades de Reabilitação Urbana. Porto: FEUP (Tese de
práticas são cada vez mais características de
Mestrado policopiada)
um urbanismo global (Queirós, 2007) e de uma
forma de se fazer cidade. Assim, quando o QUEIRÓS, João (2007). The role of culture in urban
Masterplan parece apontar para uma cidade regeneration policies: research notes drawn from Porto’s
case. First International Conference of Young Urban
multidimensional e plural, na verdade segue
Researchers, 11 e 12 de Junho. Lisboa: CIES
uma linhagem de políticas urbanas que
PEIXOTO, Paulo (2000). Património mundial como
fundamento de uma comunidade humana e como recurso
15 das indústrias culturais urbanas. Oficina do CES, 155.
Recentemente foram instaladas câmaras de
Coimbra: CES
videovigilância na Ribeira e a autarquia tem promovido
eventos como a Red Bull Air Race)

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PORTOVIVO – Sociedade de Reabilitação Urbana (2005).
Masterplan (síntese executiva). Revitalização Urbana e
Social da Baixa do Porto. Porto: Porto Vivo, SRU

PORTOVIVO – Sociedade de Reabilitação Urbana (Abril


2005). Proposta de Masterplan para a Revitalização Urbana
e Social da Baixa do Porto. Porto: Porto Vivo, SRU
(consultável no site: www.portovivosru.pt)

SILVA, Hugo. M. (2007). Estudo das metodologias de


reabilitação urbana em zonas históricas – Sociedades de
Reabilitação Urbana. Lisboa: Instituto Superior Técnico (IST)

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