Ao pequenino pedestre medrosamente ilhado nas vias,
Ao mendigo errante que por mim passou, À menina-moça descendo de madrugada de uma favela, Ao velho aposentado subindo, tremendo, o ônibus, À comerciária apressada e embelezada já na segunda-feira, Ao último motorista ainda ajuizado, fechado e xingado todos os dias, Ao cachorrinho de ralo pêlo marrom e olhos aterrorizados com os tiros e explosões da cidade nua, Ao estudante paraplégico que caiu do alto da escada ao sair da aula, Àquela mãe que perdeu o filho aidético e a esperança no viver, Aos esposos amantes que repentinamente ficaram sós e perdidos, À criança fugindo desesperada dos seus grandes agressores, Ao pequenino ser chorando de fome no colo da mãe também, Ao policial nervoso e cansado das ruas loucas dos guetos e favelas sem saber se o amanhã virá, Ao viciado de todas as drogas e porcarias, fissurado pelo pipocar de seu sangue e de suas células, Ao preso da realidade das grades e da verdade de sua inocência, Ao ciclista de tênis e bicicleta importados deitado eternamente no asfalto, Ao pai, à mãe, aos irmãos, aos tios, aos avós dos seqüestrados de sua liberdade, Ao seqüestrado, de dias e noites infinitas, de medos de inédita intensidade, de angústia seca e teimosa, Aos sem-terra, de cérebros, pulmões e intestinos esfacelados pelos modernos projéteis da estupidez dos déspotas e da bandidagem gargalhante, Ao funcionário vagueante, tentando fugir da fúria neoliberal, Aos desempregados enganados e já descartados pelo sistema, Ofereço a minha indignação, a minha dor, a minha lágrima, a minha mão, o meu ombro, a minha voz, o meu grito, o meu sangue, a minha força, o meu furor, ......