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Luís Wanderley Gazoto

Procurador Regional da República


Mestre em Direito (UnB), doutorando em Sociologia (UnB), Criminologia e Direito Penal
(UPO-Sevilha)
gazoto@prr1.mpf.gov.br

Atenção ao Populismo Penal


Se realizarmos um estudo histórico-evolutivo da legislação penal brasileira,
veremos que, não obstante as particularidades do nosso «quase-liberalismo», o sistema penal
que foi criado no Brasil com o Código Criminal de 1830 representou, relativamente à arcaica
legislação portuguesa das Ordenações Filipinas, um grande avanço na direção de um direito
penal justo e racional. Sessenta anos mais tarde, com a proclamação da República, muito
embora tenha sido forte a influência das ideias do positivismo comteano no Governo, o
Código Penal republicano (1890), discutido e aprovado pelo Congresso Nacional,
preservando o caráter liberal do nosso direito penal, manteve a tendência de diminuição do
rigor das penas, relativamente à legislação revogada. Entretanto, essa tendência se inverteu
com o Código Penal do Estado Novo (1940), aprovado sem discussão parlamentar, por um
governo ditatorial, influenciado por algumas ideias do positivismo criminológico.
Ultrapassado o período da ditadura militar (1964-1985), era de se esperar que fosse retomado
o processo de abrandamento e humanização das penas, porém, mesmo após a Constituição
Federal de 1988, as sanções estão, cada vez mais e mais, rigorosas: algumas penas de reclusão
dobraram, octuplicaram, duodecuplicaram …

Pesquisas dão conta de que esse fenômeno punitivista vem ocorrendo em


todo mundo ocidental. Perguntadas as razões, surgem algumas teses, dentre elas: 1) “nada
mais normal” – alguns diriam –, pois, se o povo é punitivista (e também há pesquisas que o
comprovam), e o Poder Legislativo deve representar o pensamento popular, leis mais duras
seriam consequência da democracia (Democracy at Work); ou 2) pode ser que seja uma
resposta às complexidades trazidas pelas rápidas mudanças do mundo
contemporâneo e seus «perigos». Tais teses são bastante discutidas e podem ser
fortemente refutadas – o povo não tem boa percepção dos riscos reais, pode ser facilmente
manipulado ou influenciado, pesquisas de opinião podem ser mal formuladas ou dirigidas etc.
–, mas uma terceira hipótese merece maior aproximação: o populismo penal.
Atualmente, denomina-se «populista» todo o movimento ou doutrina que
faz apelo de maneira exclusiva (ou quase) ao «povo» ou às «massas». Nesse contexto, se
insere o «populismo penal», que é o emprego do populismo dentro do direito penal, mediante
ações governamentais irracionais, puramente emotivas, de apelo popular, muitas vezes
falaciosas, outras tantas maliciosas, as quais supostamente pretendem atender à consciência
coletiva. O populismo penal tem como referência ético-política as representações sociais
punitivas, que podem influenciar o poder legislativo, por duas maneiras principais: uma, na
qual o parlamento pode estar, sinceramente, envolvido pela ideia punitiva – a isso denomino
«populismo penal radical»; outra, na qual parlamentares podem estar se aproveitando de uma
situação momentânea de clamor público por maior rigor penal, para angariar notoriedade,
prestígio ou obter outros créditos políticos – situação a que denomino «populismo penal
falacioso ou oportunista».

Em pesquisa que realizei no Poder Legislativo brasileiro, mormente das leis


criminais aprovadas no período de 1940 a junho de 2009, bem como dos projetos de leis
criminais mais recentes do Congresso Nacional, encontrei: 1) o apelo exagerado, puramente
retórico, do valor ético-moral da proteção estatal ao interesse em questão, mas sem nenhuma
referência a critérios de proporcionalidade; 2) exposições dos motivos (manifestos) dos
projetos de leis que quase sempre trazem como argumento a necessidade da repressão,
justificada pela superveniência da gravidade do fato, e a utilidade da pena, como meio
dissuasório/preventivo; não obstante, sem a apresentação de dados empíricos que possam
sustentar suas posições; 3) não poucas vezes, os parlamentares deixaram expresso que suas
preocupações decorrem de leituras de jornais e influência da mídia, em geral; 4) em projetos
que envolvem o tema proteção de menores, mulheres, idosos e minorias é prática comum a
criação de medidas extrapenais meramente programáticas, provavelmente ineficazes, mas
que, concretamente, somente aumentam penas e incidências de aplicação de leis penais; tais
projetos têm tido como autoras indiretas entidades e associações representativas de interesses
desses segmentos sociais, tais como o Comitê Latino-Americano de Defesa dos Direitos da
Mulher e o Fórum de Entidades Negras do Rio Grande do Sul; 5) mais recentemente, houve
uma maior focalização nos temas dos crimes praticados na direção de veículo automotor –
mormente quando há embriaguez –, bem como na pedofilia, corrupção e infrações de
menores; fatos que sempre ocorreram, mas que tiveram forte presença na mídia dos últimos
anos; 6) vários (muitos) projetos penalizantes são de autoria de parlamentares oriundos de
profissões ligadas à repressão criminal: policiais civis e militares e membros do Ministério
Público.

Por isso, considerando a realidade histórica das últimas sete décadas, é


possível a conclusão de que entramos em uma espiral punitiva que não encontra freios nos
princípios mais caros ao direito penal – proporcionalidade e racionalidade –, preteridos em
nome de uma política penal populista/funcionalista, com a qual se esvazia quase todo o
conteúdo ético do magistério punitivo do Estado.

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