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ALBA ZALUAR Da ravolta ao erlme 3. AN. POLEMiC4 eS. i Ani a ~ cooronachoneTonn apn B79 revsho ernvon nod gio ORO DE ARIE foot AONE Waa Senne eqeoningho none tone got apps same ner nes aang sao eae eee eee ont Wate Seance etna te pe 3 ee agen Ison es-6.014822 dos sits Paes ‘EorToRa MoDeRNALTDA nus Pate ela, 158 Beene sbbalie: Sma cor sat vena Mane 9500-10 90500 ‘ete aoa ‘a Inpro Ho Bras Introdugao, Parte 3 A violéncia e a ordem: trés modelos, muitas histérias A ordem tribal: a violncia € de todos... ‘A guerra cos guerreiros inbais, 11; A negociagéo dentro da tribo, 14; Os negociadores tribals, 16; A violencia tribal no mundo de hoje, 20 A otdem senhorial: a violncia de poucos contra os demais 0 feudalismo ¢ 0 dominio da terra, 25; Auséncia de lei e violen ia, 26; Os guerreiros e a morte, 28; Robin Hood e os nobres 1a ‘drdes, 29; A Justiga c a ordem piblica, 34; Brusas e diabos, ‘ordem senhorial hoje, 35 A ordem pablica: a violéncia do Estado contra a violéncia de todos " © universalismo e os dirsitas naturals, 39, Os direitos as liber- ». Lempiso, aces [A Ausixcta p& ORpEM Popiica & A Vion £Ncia PO CANCACO! ‘coplurodos peta valante de Congaceiros copturodos pel Alogaat 6- Cobra Verde; 7° Feitigo. fino Ma ipe. Foto. Como os outros cangaceiros, Lampigo formou seu propfio bands ¢ também inanguroy um estilo nove no cangago. Como nio tisha. famf lia rica para sustentd-lo ¢ a guerra envolvia entéo 0s coiteiros (que ¢s- condiam os cangaceiros), 2 policia 2 as volantes, ficava diffeil perma- necer muito tempo num s6 lugar. Ele e seu bando viviam mesmo do saque a vilas, Fazendas © pequenes cidades. Durante esses ataques, fa- ziam prisioncitos pelos quais de~ pois exigiamn resgate. Agiam como seqilestradores. Eram mais violen- tos e cruéis ¢ deixaram fama de per- vversos, em parte devido & perseg! ‘0 implacfvel da poticia em diver- as fases da existéncia dos bandos. Nao respeitavam as mogas © mata ues, ferred por last Baiano, em je 7 de janeiro de 1932 (in Aglaé Lima de Oliveira, Lampiéo, rei do cangoro). vam com requintes de crueldade. ‘Um dos cantadores deixou esta im- pressgo em seus poemas: Lampiso é um bandido de muita perversidade, no lugar onde ele passa Etagrdo © assacsing e também deflorador, {fe2 do rifle um seu amigo. E desaragado e periuro, 4 mais sujo que o monturo ‘que de nada tem valor. Mas os cangaceiros também tinham fama de ser alegres, de B0s- 75 ‘Da REVOLTA Ao Crime S.A. tarde festas ¢ de namorar. Lampiao cra um grande dangarino e um na- morador contumaz. Financiava Muitas festas com 0 dinheiro que foubava. Numa das fases mais tran- iiilas do bando, quando estavam em Juazeiro, no Coaré, Lampizo e Seus homens fizeram a misica “Mulher rendeira”, até hoje canta- 42, pois havia bons misicos e 6ti mos dangarinos no bando. Essa cangio tinha muitos versos, além dos que chegaram até nds: O18, muié rendera, 18, muié rends, tw me ensina a fazer renda que eu te ensino a namora, ‘As mogas de Vila-Bela 880 pobres mas tém ago. Passam o dia na janela namorando Lampiso. E, para festejar Maria Bonita, a mulher de Lampiao, esta misica fala do cotidiano do bando, sempre fugindo da polite Acorda, Maria Bonita, levanta, vem fazé café, © dia ja ver raiando © 2 puliga jd esté de pe, 0s Jovens & 0 Cancaco Por terem prestigio ¢ fama, especialmente junto as mulheres, € oferecer meios alternativos de enti- quecimento e poder, os cangaceiros exerceram certo fascinio sobre os Jovens pobres do serto nordestino, Muitos procuravam os bandos para Juntar-se a cles, quase sempre ale- gando que queriam vingar algum parente molestado pela policia ou pelas volantes cagadoras de canga- ceiros. De fato, tanto a policia quan to as volantes eram cruéis € violen- tas com a familia dos coiteiros, aqueles fazendeiros © moradores que ajudavam os cangaceiros. Ou- tros, muito jovens como Volta. Seca, juntavam-se aos bandos pelo espirito de aventura e pela falta de alternativas num sert&o empobreci- do pelas grandes secas da virada do século. Outros ainda, como o can- gaceiro Azulio, por ter conflitos ‘com seus familiares, Em diversas ocasides, o pré: prio Lampio, depois de conversar com 08 garotos que o procuravam, convencia-os a voltar para casa ¢ tentar resolver pacificamente seus conflitos com os vizinhos e os fa. miliares. A esses jovens Lampigo teria falado longamente sobre 0 so- frimento e a dureza da Vida de can- zaceiro, revelando que ele mesmo, se The dessem oportunidade, muda. ria de vida. Seus inimigos, seden- tos de vinganga, nunca permitiram que isso acontecesse. Eram muitos. Lampiio, que era conserva. dor ¢ admirava os fazendeiros po derosos, varios dos quais seus ami ‘80s, queria ser fazendciro também, Mas nem mesmo o Padre Cicer que era muito respeitado por Lam- pido, péde manter sua promessa de apoiar 0 “rei dos cangaceiros” caso ele deixasse a vida de crimes e vio- encias. Deu-the a patente de “capi- 76 A AUSENCIA DE OnpEM POBLICA E 4 VIOLENCIA DO Cx tio" da Guarda Nacional, mas teve de voltar ates na defesa que fizera pela regeneragao de Lampii. Du- ante algum tempo, este cumpriu 0 que prometera 20 padre © no co- meteu crimes. Depois, desiludido, voltou & mesma vida Muitos jovens pobres acaba- am entrando para 0 bando e af logo perderam a vida. Quantos, nto se sabe ao certo, A maioria permaneceu anénima, apenas um corpo a mais, encontrado depois de uma peleja. Os meninos eram apreciados pelos cangaceiros por causa de sua agilidade e também porque, por se~ rem quase criangas, despertavam menos suspeitas na policia. Eram eles os enviados como olheiros as vilas antes da chegada ou da inva- sio do bando (Chandler, 1981) Eram eles os escothidos para infil- trar-se no campo inimigo © agir como espides (Oliveira, 1970). Como era tradicional no sertio di- vidido peta guerra entre familias, esses jovens também cantavam: Meu fuzil é bom, ‘minha faca também 6. Nao nasci para semente, tou as ordens, coroné, Sem se importar com a mor- te, esses jovens ofereciam-se em sacrificio numa luta em que qual- quer coisa poderia ser considerada insulto pessoal. A vinganga pela honra ofendida, mais do que a re- volta contra a pobreza, era 0 que os Ievava & morte. Justiga era confun- dida com vinganga. A Poticia, as VoLaNTEs EA Viowencia A acdo injusta ¢ cruel da poti- cia e da volante ajudava a eriar © clima de desforra. Os coiteiros, que ajudavam os cangaceiros, torna ram-se 0 principal alvo da ago po- licial, Essa ajuda constava do for- necimento de mantimentos, da co- branga de resgates ou “taxas” para no serem molestados e da guarida ‘20 bando em suas terras. Os canga- ceiros, de fato, precisavam muito dos coiteiros e pagavam generosa- mente os servigos prestados. Mui- tos deles tornaram-se amigos leais de Lampido ¢ de seu bando no auge de seu poder. Nesse perfodo, eles dominavam extensa regiao que co- bria varios estados nordestinos. Aos amigos o capitio Virgulino Ferreira entregava os famosos “pas- ses” assinados por ele, Outros vali- am-se da posi¢ao de fugitives do cangaceiro para tirar vantagem, cobrando de fazendeiros e comerci- antes, em nome de Lampido, altas somas em dinheiro que ele nio ha- via pedido, ‘A policia, entretanto, fazia uma diferenga entre os coiteiros po- derosos, de familias de coronéis muito influentes e ricas, ¢ os coit ros mais humildes. Os primeiros cram poupados das investidas poli- ciais, porque os governantes € os politicos precisavam de seus votos. Carregavam imunidade (ou impuni- dade). Os mais humildes, que nao tinham esse poder, passaram a so- fret perseguigdo sistemstica. Eram presos, torturados, mortos, tinham 77 De Revouta 40 Crise S.A. asmmulheres de suas familias vioten- tadas, além de serem extorquidos de seus bens. Nao foi A toa que muitos pa- rentes desses coiteiros se tornaram cangaceitos, para vingar tanta in- jostiga, engrossando 0 caldo da oléncia, Nao foi a toa também que 98 parentes das vitimas dos canga- ceiros, muitos igualmente jovens, 3e ofereceram as volantes ¢ & poli- cia para combater os cangaceiros até a morte. A semente, em que to- dos se transformaram, era a se- mente da violencia que, na cadeia intermindvel da vinganga contra 05 inimigos, sempre alimenta mais vioténcia, Lampido morreu no esconde- Fijo de Angica em 1938, depois que um comerejante que the forne- cia mantimentos foi torturads © contott onde ele estava. Ele e seus cormpankeicas foram decapitados © as cabegas expostas ao publica, na tentativa de provar a tese do crim noso nato, agora superada. Até hhoje encontram-se_embalsamadas no Museu Nina Rodrigues, na Bahia. Com sua morte e a de Co- risco, 0 Gitimo de seu bando a mor- rer, 0 eangago acabou no Brasil. 0s caiteiros poderosos, que fica- ram ainda mais sicos por ajudar os cangaceiros ou vender sua prote- ‘Ho a outros, permaneceram impu- nes. Dos fornecedores de armas € munig6es aos bandos, comercian- tes que enriqueceram com a guer- +8, pouco se sabe. Seus nomes nun- ca foram objeto de investigagao policial, nem suas atividades co- merciais consideradas crivues. Invustiga E Wrouencta No CAMPO HOME No campo, ainda hoje, a vie- encia institucional se dé basics. ‘mente em tomno da posse e da pro- priedade da rerra, Esse processo de lutas violentas vem demonstrar mais uma vex. que no importa ape- nas 0 que esté escrito na lei, Tara bém o funcionamento da Justiga e © comportamento efetivo da polt- cia tém resultados fundamentais, Muiitos laveadores brasileiros perderam 0 acesso a terra por dois processas sigulténeos, Um, pela agdo dos grileiros, que as registra vain em Seu ROME NOS CarIGrios. Esses grileiros ou aproveitavam-se da ingeniuidade dos tavradores ov usavam @ influ€ncia de seus ami- ‘gos poderosos, aproprisndo-se de terras que vinham sendo ocupadas hhavia moitos anos pelos posseiros. Depois os expulsavam violenta- mefte, 2s vezes com ajtida poli- cial. Essa aco policial fere 0 di reito que os Javradores tém, pela Tei do usucapiéo, & terra que culti- vam hé mais de 25 anos, © otro, pela perda das socas © moradias que os grandes propri etérios Ihes permitiam fer dentro de suas ferras, transformando-os em boias-frias. Esses laveadores viraram assalariados que moram em vilas miseraveis ¢ nao tem ‘mais terra para plantar. Viajam de caminhdo pata as fazendas na época das colheitas para traba- thar, ficando parte do ano sem emprego, hostilizados nas cidades sicas do interior 78 A Austnicis os, Oworm POmiica € & Wearencra 00 CANGRGO ‘© movimento organizado des- ses lavradores assalariados. bem ‘como dos posseiros, tem encontrado muita resisténcia entre o$ que 0s ert- ‘ganam e no reconhecem seus dire tos. Muitos de seus lideres, em di versas regides do pats, t@m sido as- sassinados pot pistoleiros erm raza0 ide sua Juta pela justiga © por uma Sociedade melhor. Mas 0 julgamen: toe acondenagao de seus assassinos term sido cada vez mais comuns, gr3- as a pressio de partidos politicos, “Srganizagbes celigiasas e da impren- porta-vores da opinido publica indignada diance desse flagrante MosiesosBo de rabalhaderes sem tere setembra de 1995. desrespeito fei, Igualmemte, alguns Javradores exaltados também tem sido julgados ¢ condenados pela morte de policiais. E claro que, nes- ses casos, ido tem sido necessaria a pressdo da opinido publica para que ‘9s culpados sejam condenados. ‘Apesar de tudo, a alternativa para conter a violéncia continua endo a esperanga de um Judiciério independente, no qual as disputas possam ser resolvidas consideran- do-se os direitos de cada parte, sem jmportar o tamanho da propriedade, ‘nivel de renda, de educagio, 2 cor da pele e 3 posigao social. (MST) no Pont! de Poranoponema (SP em 79 Caso DE Poticia: A VADIAGEM A abolig20 da escravatura em 1888 ¢ a proclamagio da Repibl ‘ca em 1889 mudaram a vida das ci dades brasileitas, Foram criados ‘novos problemas para manter a or- dem piblica. As cidades brasilei Fas comegaram a crescer muito esse periodo € a populagio se di- versificava cada vez mais. Além dos ex-escravos (forros e libertos) gue se mudaram do campo para a cidade, levas de imigrantes vindos da Europa foram morar nas princi- pais cidades brasileiras, especial- mente em Sao Paulo. Os conflitos decorrentes da vida na cidade e das novas Ocupagdes industriais au- mentaram rapidamente. Nas principais cidades bre Ieiras, Recife, Salvador, So Paulo € Rio de Janeiro, artestos, aprendi- 2es ® pequenos comerciantes convi- viam com operdrios pouco qualifi- cados, desocupados, mendigos pessoas que viviam de expedientes diversos, inclusive do jogo e da prostituigao. No Rio de Janeiro es- tava 0 maior contingente de opers- ios, devido as grandes fabricas ins- EA DESORDEM taladas na cidade. Contudo hav um grande nimero de desemprega- dos € 08 trabalhiadores néo haviam herdado o tipo de organizagao pro- fissional dos artesios de cidades européias (Carvalho, 1987). Mas desenvolveram organizagdes vici- nais que, mesmo mais desagrega- das, mostraram no decorrer da his- t6ria republicana seu potencial de participagao politica e cultural (Zatuar, 1985). Foram 05 candidatos a desocu- pados, 08 ociosos sem renda (Cha- Joub, 1986) que ocuparam quase toda a atencao dos chefes de polfcia durante a virada do século. Eram considerados um perigo para a or- dem piiblica e uma ameaga moral & sociedade, Daf serem presos por va- diagem, desordem ou embriaguez, és contravengdes descritas no Cé- ig0 Penal de 1890 que encheram as prisdes brasileiras nessa época, Muitos desses personagens do novo cendrio urbano foram “presos para averiguagées", ou seja, por mera suspeita. Nao havia prova de que finham cometido al- 80 Caso ve Poticy gum crime (Oliveira, 1985). Por isso nunca foram processados judi- cialmente. A pristo secvia apenas para controli-los, moralizé-los ou, segundo alguns historiadores, obrig4-los a trabalhar nas fazendas nordestinas onde no havia mais brago escravo (Huggins, 1985). Por isso as estatisticas sobre 08 detidos nessas cidades, alguns colocados nas casas de detengo ou prisdes sem nenhuma acusagio concreta, so muito altas; havia muito mais detidos “para averigua- 80” do que presos com base num proceso. Em Sio Paulo, entre 1892 @ 1916, 05 detidos por contraven- ‘ges ou para averiguagées corres- pondiam a 83,8% do total, enquan- 10 05 presos sob acusagio de ter co- metido crimes somavam apenas 16,2%. E o que € mais importante: enquanto os brasileiros (em geral negros e mulatos) eram logo tacha- dos de vadios, os estrangeiros con- tinuavam sendo considerados bons trabalhadores e iam presos por de- sordem (Fausto, 1984), Desde 0 Cédigo Penal do Im- pério, a vadiagem © a mendicancia J eram objeto de punigao, cons tuindo os chamados “crimes poli- iais”. Ap6s 1888, foi posta em di cussdo uma “lei de repressao ociosidade”. Por essa lei, todos os ociosos deveriam ser levados @ co- Tonias agricolas para cumprir penas de até trés anos. No Cédigo Penal republicano de 1890 aparece a de- nominagao “contravengdes”, cons deradas delitos menos graves do que o crime (Mattos, 1993). Vadia- ‘gem e desordem eram as principais. A VADIAGEALE A DrsonDEnt ‘Vadios eram considerados os men- digos, os desocupados, os jogado- res, 08 capoeiras ¢ todos aqueles ‘que cxercessem atividades ado re- conhecidas oficialmente, Desordei ros cram 08 que promoviam arrua- ‘gas, brigavam coletivamente ou se ‘comportavam de modo inadequado ‘em pibtico. Em geral, estes se mis- turavam aos presos por embriaguez. Por que havia tdo grande pre~ ‘ocupagdo com as contraveng6es no inicio do século? © Crescimento URBANO No Rio de Janeiro, moravam 274.972 pessoas em 1872.¢ 522.65 em 1890. Em doze anos a popula- go quase dobrou © continuo a crescer rapidamente, chegando a 811.443 em 1906, Na época da pro- clamagao da Repablica (1889), 0 Rio era a nica cidade brasileira com mais de 500 mil habitantes, pois Sao Paulo tinha apenas 64 mil. Com a migracao de escravos liber- tos, em 1890.0 Rio abrigava 34% de negros e mulatos, 0 maior contin- gente em toda a regiio Sudeste ‘Mas o némero de imigrantes estran- geiros:também era muito alto — 156.202 —, entre os quais 106.461 ‘eram portugueses chegados a0 Bra- sil durante a década de 1880. Os Portugueses representavam um quinto da populagao da cidade (Chaloub, 1986). Em So Paulo, o crescimento na virada do século foi ainda mais espetacular, A cidade triplica seu tamanho entre 1890 e 1900 e dupli- ca entre 1900 ¢ 1910. De 64.934 8] Da Revoura 40 Crinte S. Ax habitantes em 1890, passa a ter 239.820 em 1900 ¢ 579.820 em 1916. Sao Paulo comegava a indus trializar-se e @ receber trabalhado- 18s vindos do campo ou do interior do pais, mas principalmente imi- grantes da Europa (Carone, 1972). (tras na exquina do Fubar Bodars com Avenida Sao Jo8o, cidade de S80 Paulo, em 1900. ‘Nas cidades também se mis- turavam pessoas com diversas ocu- pagdes, idades, rendimentos, local de moradia, assim como pessoas com familia ¢ sem famflia. Os imi- ‘granites eram quase Sempre homens Jovens solteiros, misitos vindos da mesma aldeia (Fausto, 1984). Os ex-escravos, embora muitos pen- serio contrério, também tinham or- ganizagio familiar e fortes grupos e solidariedade baseados na naco € no grupo religioso (Moura, 1983). ‘Aqui desenvolveram novas soli riedades vicinais, marcadas pela criaglio de associagdes recreativas de varios tipos, onde a participagio € voluntéria e no devida ao nasci- mento ou & obrigagio (Zaluar, y 1985). E todos trouxeram para a ci. dade diferentes maneiras de traba- Inar, de se comportar socialmente, de sedivertir e de resolver conflitos, além de diferentes solidariedades Desde logo, 08 empregos nas empresas e nas novas fébricas eram mais reduzidos do que o mimero de tr leceu-se a competi gio entre os bra: fos (em geral negros € mulatos) € 05 es- trangeiros. Cada gru- po defendi podia. Estrangeiros de diferentes nacio- nalidades passaram a controlar certos tipos. de atividades — como garrafeiros ¢ jomaleiros —e a ter a preferéncia dos em- pregadores estabelecidos no comér- ‘cia ¢ na inddstria (Chaloub, 1986). Por isso os negros forros preferiam ir para o Rio de Janeiro. Em Sio Paulo, a competigao com os imi grantes era ainda mais dificil. ‘A populagio aumentava répi- doe havia rmuitos recém-chegados. As habitagdes comegaram a escas- sear. Em todas as cidades surgiram 05 cortigos, ou casas coletivas, con- siderados pouco higiénicos. Os go- vernos republicanos queriam fazer de sua capital — 0 Rio de Janeico — um modelo de cidade moderna e higiénica. Reformas urbanas foram realizadas para limpar 0 centro da cidade dos cortigos ¢ obrigar 0 povo a se comportar urbanamente. 82 caso Com 0 “bota-abaixo” dos cortiges, as favelas comegaram a aparecer € a erescer depressa (Moura, 1983). As Leis £0 Controle SociaL Na Republica fizeram-se leis para tudo, proibindo muito, Nao se podia cuspir nas ruas nem urinar fora dos mict6rios. Era proibido soltar pipa, vender bilhete de Jote- ria, jogar, fazer samba ou acixar animais soltos na rua. Nem fazer hortas se podia! Comegavam as leis que nunca “pegaram” porque nin- ‘guém as cumpria (Carvalho, 1987). Acrescemte-se a isso 0 fato de {que os processos judiciais que de- veriam se seguir sempre que as nor- mas penais fossem infringidas nao se limitavam a estas. Também as srormas que se referiam ao compor- tamento adequado a certas catego i s, fais como mulher, mae , criada, empregado, pai de famitia etc., entravam no proces- soe afetavam as decisdes. Ou seja © comportamento sccial inadequa- do era usado nos processos para condenar ov ndo, para aumentar ou diminuir 9 pena. Isso acontecia quer no Rio de Janeiro, capital da Repiiblica e importante centro co- mercial e industrial de entéo, ques ‘em Sio Paulo, um centro comercial ¢ industrial emergente. Por causa disso, o testemunho de outras pessoas sobre 0 acusado tornava-se importante. Mas 0 valor do testemunho nao era igual para qualquer pessoa. Pessoas pobres mal sabiam escrever € ficavam amedrontadas diante de uma engre- 8 pe Poutcu: A VapIacEs £4 DEsORDEM nagem — Judiciério — que deseo- heciam. Falavam outra Kngwa seus testemunhos, interrompidos or perguintas, eram traduzidos pelo delegado ou pelo juiz para um es- crivao, O que até hoje ficou regis- trado nao correspande a0 que foi realmente dito por aquelas pessoas, pois 0 cédigo hermético da lingua- fdica formalista, que elas desconheciam, esta presente. O tes- temunho de pessoas de posses, com bons empregos, boas relagGes, mnes- mo em forma de carta, tinha maior efeito (Fausto, 1984). Num crime de muita reper- cussio ocorrido no Rio de Janeiro da primeira década deste século, uma rixa entre um portugues € unt brasileiro foi resolvida violenta- mente com a morte do portugués. No inquérito policial e na impren- sa, apesar do que afirmavam os co- legas de ambos, o brasiteito € apce- sentado como “cinico, provocador ¢ violento”, enquanto 0 portugués & “amtigo declarado do trabalho”, pelo testemunho de scus compatri- otas bem-estabelecidos no comér- cio da cidade (Chaloub, 1986). © depoimento do acusado, se guindo a tradig0 inquisitorial, per- seguia a confissio. Ele nio podia ficar silencioso, mas o que dizia em sua defesa na fase do inquérite po- licial nfo era levado em considera- glo. $60 que dizia em seu desfavor passaria a constar como prova do processo. Diante do juiz, ele deve- ria sobretudo responder as pergun- tas de modo a ajustar os fatos a ver- so da defesa (Fausto, 1984). A verdade dos fatos ficava cada vez 3

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