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vento e dos grilos que calam os carros, abrigando a luz da lua da artificialidade laranja
dos postes, brilhando teimosamente para ningum. Esse terreno sou eu, podado pela
cidade.
J no sei h quanto tempo estou aqui, o tempo parece no existir quando ignorado.
Daqui tenho outra perspectiva, a rua, a rvore, os apartamentos, os quais enxergo todos
os dias sem v-los, me parecem outros, o vigilante com seu apito em riste vigia sem
notar que est sendo vigiado. Madrugadas assim sempre fizeram parte de mim, alis,
apenas sou na madrugada, vou mais longe: s me sinto parte afetiva e moral de uma dita
humanidade na solido e nesses momentos de extrema individuao. na distncia que
me aproximo das pessoas, na solido que me encontro com o humano que h em mim.
Talvez a vida no seja para ser vivida, apenas assistida. Toda vez que tento ser o
protagonista as coisas deixam de ter sentido. Assisto ento. O tempo passa, as marcas
aparecem sem que eu note. Talvez eu tenha parado no tempo, menino arredio que
sempre fui, ando escondido em rosto de homem para poder olhar sossegado, sem causar
espanto, sem tirar o manto.
Volto rua acompanhado por carrapichos na cala, moro h duas quadras daqui, a
tenso latente e preciso aflorar meus instintos, no sou mais invisvel, sou alvo. H um
jeito certo de se portar na madrugada, uma certa linguagem corporal, uma firmeza no
olhar, a madrugada no aceita forasteiros. Principalmente agora que fui delatado pelo
latido feroz e flagrante do co que me ameaa na segurana de sua grade, encarno ento
a indiferena desse gato preto que imprudentemente rasga os sacos de lixo, alheio ao
barulho, afinal a madrugada o protege e ele assim como eu parte da fauna que habita
madrugadas como essa.
Publicado originalmente na Carta Potiguar em 22/08/2014
http://www.cartapotiguar.com.br/2014/08/22/madrugada/