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DUCAGAO € TE IVAN ILLICH SOCIEDADE SEM ESCOLAS MPO PRESENTE © EDUCAGKO E TEMPO PRESENTE ‘* EDUCACKO F TEMPO Copyright © 1970, 1971 by Ivan Ilich ‘Titulo do original inglés: DescHooLine Soctery Harper & Row, Publishers, Ine. Um volume da Série Perspectivae Mundiais (World Perspectives) Planejada ¢ oditada por Ruth Nanda Anshen Consetho Eaitorial de Perspectivas Mundiais: est enna cok Wares Meare Ere ON Yong a teadugto portugues ‘Sites Vanes La Ron Pre tas, 100 Peto Bra! Printed in Brazil Perspectivas Mundi Introdugio 17 Por que devemos desinstalar a escola 21 Fenomenologia da escola 57 A ritualizacio do progresso 69 © espectro institucional 95 Concordineias irracionais 113 Teias de aprendizagem 123 Renascimento do homem epimeteu 169 = © sentido da série 7 1. Por que devemos desinstalar a escola “Muitos estudantes, especialmente os mais pobres, pereebem intuitivamente 0 que a escola faz por Ties. Bla os escolariza para confundir proceso com substancia. Alcancado isto, uma nova légica entra em jogo: quanto mais Jonga a escolaridade, me- Thores. os resultados; ou, entéo, a graduacdo leva ‘ao sucesso. O aluno é, desse modo, ‘eescolarizado> ‘a confundir ensino com aprendizagem, ‘obtengio de graus com educacio, diploma com competéncia, fluéncia no falar com capacidade de dizer algo novo, Sua imaginagio «escolarizada> a aceitar servigo em vez de valor, Identifica erroneamente cuidar da satide com tratamento médico, melhoria Ga vida comupitéria com assisténcia social, segu- vanga com protecio policial, seguranga nacional com aparato militar, trabalho produtivo com con- corréncia desleal. Saide, aprendizagem, dignidade, independéncia e faculdade criativa sto definidas como sendo um pouguinho mais que o produto das instituigdes que dizem servir a estes fins; e sua promogiio esté em conceder maiores recursos para a administragio de hospitais, escolas e outras ins- tituigdes semelhantes. 21 Zam Nossa mundividéncia e linguagem. Para. isso, escolhi a escola como paradigma. E s6 abordare; indiretamente outras institui Estado: a familia-consumidora, 0 partido, o exe. Cito, a igreja, os meios de comunicacio. Minha and. Hise do secreto currfeulo escolar poderé evidencia Inns Caucasto publica tiraria proveito da desesco. larizagdo da sociedade; da mesma forma que a vida familiar, a politica, a seguranca, @ {6 ¢ as comu- nicagées tirariam proveito de proceso andlogo, Gemego minha andlise, neste primeiro ensaio, ten- tando mostrar 0 que’ a desescolarizagio de’ uma Sociedade escolarizada Signi seré mais fécil Nio apenas a educacio, mas também a propria ealidade social tornou-se escolarizada, Dé quase na 4 na mesma proporcio, sendo as veues favorivel as favelas, * que estio no poder, & So on subversio. A confianga no tratamento ins- titueional torna suspeita toda ¢ qualquer realiza- so independente. O progressive subdesenvolvimen- {? da autoconfianga © da confianga na comunidade < mais acentuado em Westchester do aque no Nor- deste do Brasil. Em toda parte, nig apenas a edu- Saito, mas @ sociedade como um todo precisa ser sdesescolarizada>, i 0k ine" Eraliaton, 28 Departamentos de bem-estar reivindieam um mono- lio profissional, politico e financeiro sobre a ima- ginagio social, estabelecendo padrées para o que é proveitoso ¢ 0 que 6 possivel. Este monopélio esté na Taiz da modernizacio da pobreza. Qualquer sim- ples necessidade, para a qual foi encontrada res- posta institucional, permite a invengio de nova classe de pobres ¢ nova definiguo de pobreza. No México, hé dez anos atrés, era normal nascer ¢ morrer em sua propria casa e ser enterrado pelos amigos. Apenas os ctiidados pela alma eram assu- midos pela igreja institucional. Agora, comecar ou terminar a vida em casa é sinal de pobreza ou de especial privilégio. Agonia e morte passaram A ad- ministragio institucional de médicos e agéncias funerdtrias. ‘Tendo uma sociedade transformado as necessidades basieas em demandas por mercadorias cientifica- mente produzidas, define-se a pobreza por padrée: que 0s teenocratas podem mudar a bel-prazer. A pobreza se aplica Aqueles que ficaram aquém de algum ideal de consumo propagandizado. No Mé- xico, pobres sio os que nfo freqientaram trés anos de escola; em Nova York, os que nao freqtientaram doze anos. Os pobres sempre foram socialmente importantes. A erescente confianca nos cuidados institucionais adiciona nova dimensio & sua impoténcia: impo- téncia psicolégica, ineapacidade de defender-se, Os camponeses dos altos Andes sio explorados pelos donos da terra e pelos negociantes; e, uma vez es- tabelecidos em Lima, passam a depender também de chefes politicos e sio desqualificados por causa da falta de escolarizacéo. A pobreza moderna com- bina a falta de poder sobre as circunstancias com 24 a perda de forea pessoal. Esta modernizacio da pobreza 6 um fenémeno universal e esté na raiz do subdesenvolvimento contempordneo. Manifesta-se, obviamente, de formas diferentes nos paises rieos e pobres. % mais fortemente sentida nas cidades norte-ame- ricanas. Em nenhum outro lugar a pobreza é obje- to de cuidados mais dispendiosos. Em parte ne- nhuma também 0 tratamento da pobreza produz tanta dependéncia, angistia, frustracio e ulterio- res demandas. E em parte nenhuma ficou tio evi- dente que a pobreza — uma vez modernizada tornou-se imune a um simples tratamento em déla- res, Requer uma revolucHo institucional. Hoje em dia, nos Estados Unidos, os negros ¢ mes- mo os migrantes podem aspirar a um nfvel de aten- dimento profissional inimagindvel hé duas geragées passadas, 0 que parece ridiculo & maioria das pes- soas do Terceiro Mundo. Por exemplo, 08 pobres, nos Estados Unidos, podem contar com um funcio- nério que providencia a volta de seus filhos , Um magistrado da Corte Suprema, William 0. Douglas, observou que «a Gnica maneira de esta- belecer uma instituicio 6 financiando-as, O coro Vario que se segue também é verdadeiro. Somente tirando os délares das institnigées que atualmente cuidam da sade, educagio e bem-estar, pode ser sustado 0 progressivo empobrecimento que resulta de seus destrutivos efeitos colaterais, Devemos ter isto em mente quando avaliamos os Programas de ajuda federal, Para ilustrar, de 1965 @ 1968 foram gastos nas escolas dos Estados Uni- dos mais de trés bilhées de délares para compen- Sar as desvantagens que afetavam a seis milhdes de criangas. Conhecido como Titulo Um (Title One), foi o programa compensatério em educa- Go mais caro que j4 se realizou em qualquer Parte do mundo, ainda que nfio se conseguisse pereeber significativa melhoria na aprendizagem dessas criancas «em desvantagem>. Comparadas com seus colegas, provindos de familias de renda média, permaneceram mais atrasados ainda. Co- mo se isso fosse pouco, durante a execucio do Programa, profissionais descobriram mais dez mi- Thées de eriancas que estavam em condigdes eco- nomicas e educacionais desvantajosas. Existem ago- Ya mais razdes para solicitar mais verbas federais. 26 Esse total fracasso no incremento da educacio dos pobres, apesar das atengdes bem dispendiosas, pode ser explicado de trés formas: a) trés bilhdes de délares sio insuficientes para melhorar o rendimento, em quantidade mensurével, de seis milhées de crianeas; ou b) © dinheiro foi incompetentemente gasto: eram necessirios, e teriam resolvido o caso, diferentes curriculos, melhor administracio, ulterior concen- tracio das verbas sobre a crianca pobre e mais Pesquisas; ou ©) a desvantagem educacional nio pode ser sanada confiando na educacio ministrada nas escol A primeira forma é verdadeira na medida em que este dinheiro tiver sido aplieado pelo orcamento escolar. O dinheiro, na realidade, foi para as esco- las que possufam mais criancas cem desvantagem>, mas nio era gasto com as eriancas pobres como tal. Essas criancas para as quais foi destinado o dinheiro eram apenas metade dos componentes das escolas que tiveram seus oreamentos aumentados pelos subsidios federais. O dinheiro foi gasto, por- tanto, com inspetores, ensino e selecio vocacional bem como com edtieaciio. ‘Todas esas fungées luem-se inextricavelmente em instalagées, eurricu- los, professores, administradores e outros compo- nentes-chave dessas escolas ¢, portanto, de seus ‘orcamentos. Essas verbas extras fizeram com que as escolas Provessem desproporcionalmente as necessidades das criancas relativamente mais rieas que também estavam fosse um objetivo inquestionével para todos, retardado ape- mas por uma caréneia temporéria de recursos, A dupla decepcao da intensa escolaridade, como se verifica nos Estados Unidos — e como é prometida na América Latina — complementa-se uma & ou- tra, Os norte-americanos pobres estiio sendo des- mantelados pelos doze anos de escolaridade cuja falta estigmatiza os latino-americanos pobres co- 30 ‘mo irremediavelmente atrasados. Nem na América do Norte nem na América Latina obtém os pobres a igualdade através da escolarizagio obrigatéria. ‘Mas em ambas as regiées a simples existéncia de escolas desencoraja e incapacita os pobres de assu- mirem 0 controle da prépria aprendizagem, Em todo o mundo a escola tem um efeito anti-eduea- cional sobre a sociedade: reconhece-se a escola como 4 instituicdio especializada em educagio, Os fracas- Sos da escola siio tidos, pela maioria, como prova de que a educacio é tarefa muito dispendiosa, mui- to complexa, sempre misteriosa e muitas vezes qua- se impossivel. A escola se apropria de dinheiro das pessoas ¢ da boa vontade disponfvel, para entio desencorajar outras instituicdes a que assumam tarefas educa- tivas. O trabalho, o lazer, a polftica, a vida na cidade e mesmo a vida familiar dependem da esco- a, por causa dos habitos ¢ conhecimentos que pres- supGem, em vez de converterem-se nos meios de educacio. E ainda, tanto as escolas como as outras instituiedes que dela dependem atingem custos vultosos, Nos Estados Unidos 0 custo «per capita» da esco- larizacio subiu quase tanto quanto o atendimento médieo. Mas a intensificacio do atendimento, tanto escolar quanto médico, andou a passos com 0 de- clinio de resultados. Os gastos médicos com pessoas acima de 45 anos duplicaram varias yezes num Periodo de 40 anos, ao passo que a esperanca de vida aumentou apenas 3%. O aumento de gastos escolares produziu resultados mais estranhos ain- da; caso contririo nfo teria ocorrido ao Presidente ‘Nixon prometer, nesta primavera, que toda erianca 81 teria, em breve, o «direito de ler», antes de deixar a escola, Nos Estados Unidos seriam necessirios 80 bilhdes de délares para assegurar o que os educadores chamam de igual tratamento para todos, na escola priméria e secundaria. Isto é mais que 0 dobro dos 36 bilhdes que sio gastos agora, As projecdes de Custos, feitas, independentemente, pelo Departame to de Satide, Educacio e Bem-Fstar e pela U1 versidade da Florida indieam que para 1974 as cifras eorrespondentes serio de 107 bilhdes contra 45 bilhdes projetados agora; e estas cifras omitem totalmente os vultosos custos do que se chama ), entregue a cada cidadio ao nascer, Para favorecer os pobres que provavelmen- te no usariam cedo seus subsidios anuais, pode- ria haver uma cléusula dispondo que haveria cer- tas vantagens para os usuarios tardios dos sabiam comunicar-se em espa- mhol. Nenhum programa escolar teria obtido esses resultados. At Os instrutores tornam-se escassos por causa da erenca no valor dos registros. 0 certificado cons- titui uma forma de manipulacio mercadolégica 6 plausivel apenas a uma mente escolarizada. A majoria dos professores de artes e comércio sio menos hébeis, menos inventivos e menos comunica- tivos que os melhores arteséios ¢ comereiantes. A maioria dos professores de espanhol e francés que lecionam no secundario nao falam a lingua téo bem quanto seus alunos o fariam depois de meio ano de adequado treinamento, Experiéncias feitas por Angel Quintero, em Porto Rico, mostram que mui- tos adolescentes, se tiverem incentivos adequados, programas e acesso a instrumentos, sio muito mais eficientes para introduzir seus colegas nas explo- racées cientificas das plantas, estrelas, matéria na descoberta de como e por que um motor ou rédio funciona do que a maioria dos professores escolares. Se abrirmos 0 «mercado», as oportunidades de aprendizagem-treino podem ser vastamente multi- plicadas. Isso depende de conjugar professor cer- to com o aluno certo quando bem motivado por um programa inteligente, sem o constrangimento de um curriculo. ‘A instrucio livre e competitiva é uma_blasfémia subyersiva para o educador ortodoxo. Dissocia a aquisigio de habilidades da edueaco chumana> que as escolas associam intimamente e por isso favore- ce uma aprendizagem néio-licenciada, bem como um ensino nfio-licenciado, por motivos inexprimivei ‘Est em voga atualmente uma proposigio que pa- rece, & primeira vista, ser muito ajuizada, Foi elaborada por Christopher Jencks, do Center for 42. the Study of Public Policy, ¢ endossada pelo Office of Beonomic Opportunity. Advoga que os «direitos» educacionais ou os subsidios educacionais sejam en- tregues aos pais ou alunos para que os gastem nas escolas de sua escolha, Esses direitos individuais poderiam significar importante passo na direcio certa, Precisamos de uma garantia para 0 direito de cada cidadio & parte igual dos recursos educa- cionais oriundos dos impostos, o direito de fiscali- zar esta parte, o direito de mover uma acho quan- do negada, & uma forma de garantia contra a taxa- cio regressiva. A proposi¢gio de Jencks comeca, porém, com uma declaracio sinistra, de que os conservadores, libe- rais ¢ radicais, todos se queixaram, em uma época ‘on outra, que o sistema educacional americano dé muito pouco incentivo aos educadores profissionais para que eles possam fornecer’ A maioria das crian- cas uma educagio de alta qualidade, A proposi cho condena a si prépria ao advogar subsidios edu- cacionais que deverfio ser gastos em escolarizagio, 0 mesmo que dar a um coxo um par de muletas reeomendar-Ihe que 86 as use amarradas uma na outra. Como a proposicao para subsidios edu- cacionais se apresenta agora, ela favorece 0 jogo, nfio 36 dos edueadores profissionais, mas também dos racistas, dos promotores de escolas religiosas ¢ de outros, cujos interesses sfio socialmente segrega- cionistas. Enfim, restringir os «direitos» educacio- nais para uso exclusivo nas escolas favorece 0 jogo de todos 0s que querem continuar vivendo numa sociedade em que 0 progresso social esté vincula- do nfo a um comprovado conhecimento, mas a uma genealogia de aprendizagem pela qual se supde seja este adquirido, Esta discriminagio em favor das 43, escolas que predomina nas explanagées de Jencks elo refinanciamento educacional pode desacreditar um dos principios mais necessdrios para a reforma do ensino: a devolucéo ao educando ou ao seu tutor mais préximo da iniciativa e responsabilidade fic nanceira pela sua aprendizagem, A desescolarizacio da sociedade implica um reco- nhecimento da dupla natureza da aprendizagem. Insistir apenas na instrucdo prética seria um de. sastre; igual énfase deve ser posta em outras espé- cies de aprendizagem. Se as escolas sio o lugar errado para se aprender uma habilidade, so o lugar mais errado ainda para se obter educacio, A escola realiza ‘mal ambas as tarefas; em parte porque nio sabe distinguir as duas. A’ escola é ineficiente no ensino de habilidades, principalmente, porque é curricular, Na maioria das escolas, um programa que vise a fomentar uma habilidade esti sempre Vineulado a outra tarefa que é irrelevante. A his. téria esté ligada ao progresso na matemética; 4 nssisténcia &s aulas, a0 direito de usar 0 campo de jogos, A escola é ainda menos eficiente na concatenacio das circunstancias que incentivam 0 uso franco e explorador das habilidades adquiridas, para o qual Teservo 0 termo «educagéo liberal». A’ principal ra- zo disso 6 que a escola obrigatéria e a escola. rizacdo tornam-se um fim em si mesm foreada na companhia de professores, que paga o duvidoso privilégio de poder continuar nessa com. panhia. Assim como o ensino de habilidades deve Ser liberto de cerceamentos curriculares, assim deve & educagio liberal estar dissociada da freqiiéneia obrigatoria. Tanto a aprendizagem de habilidades quanto a edueacio do senso inventive e criative 44 podem ser favorecidos por disposig6es institucio- nais, mas sio de natureza diversa e muitas vezes posta, A maior parte das habilidades sio adquiridas © aperfeigoadas por exereicios priiticos, porque im- plica 0 dominio de um proceder definido ¢ previsto. © ensino do habilidades pode basear-se, por isso, na simulacio de circunstdncias em que serfi usada, Mas a educacio do uso das habilidades eriativas ¢ inventivas nfio pode basear-se em exercfcios préi- ticos. A educacho pode ser 0 resultado de uma ins trugio, mas de um tipo de instrucio totalmente dis. “tinto de treino prético. Deriva de uma relagio en. tre colegas que jf possuem algumas das chaves ue dio acesso & informactio memorizada e acumu- Jada ‘na e pela comunidade, Baseia-se no esforco critico de todos os que usam estas memérias cria- tivamente, Baseia-se na surpresa da pergunta ines- erada que abre novas portas “para o pesquisador © seu colega, © instrutor de habilidades se apsia num conjunto de circunstineias que permitem ao aprendiz desen- volver respostas-padriio, A funcio do orientador educacional ou do mestre esti em ajudar a que 0s aprendizes facam este encontro para que a apren- dizagem possa ocorrer. Junta algumas pessoas com outras, partindo de suas préprias questées nfo re- solvidas. No maximo, ajuda o aluno a formular sua perplexidade, pois somente uma clara formu- lagio do problema Ihe dara a possibilidade de en- contrar seu companheiro, levado como ele, neste momento, a investigar 0 mesmo assunto no mes- mo contexto, Reunir colegas para fins educacionais parece, & pri- meira vista, mais dificil que encontrar instrutores 45 de habilidades e parceiros de um jogo. Uma das razdes 6 0 profundo medo que a escola implantou em nés, um medo que nos torna severos. A troca néio-autorizada de habilidades — mesmo de habili- dades indesejadas — & mais vidvel e por isso pa- rece menos perigosa do que a ilimitada oportuni- dade de reunir pessoas que compartilham um ins teresse que para elas, neste momento, é social, in- telectual e emocionalmente importante. © professor brasileiro Paulo Freire sabe disso por experiéneia. Descobriu que qualquer pessoa adulta Pode comecar a ler em questio de 40 horas, se as primeiras palavras que decifrar estiverem car- regadas de significado para ela. Paulo Freire faz com que 0s se desloquem para algum lugarejo e descubram palavras que tradu- zam assuntos importantes e atuais, como sejam, © acesso a um acude ou as dividas para com o patriio, A noite os moradores se retinem para dis- cutir esas palavras-chave. Comecam a perceber que cada palavra permanece no quadro-negro mes- mo depois que o som dela haja desaparecido, As letras continuam a revelar a realidade e a torné-la manejavel como um problema. Constatei muitas ve- zes como os participantes dessas discussées eres- ciam em consciéneia social enquanto aprendiam a Jer e @ escrever. Parecia que tomavam a realidade em suas mios quando escreviam-na no papel. Lembro-me de um homem que se queixava do pou- €0 peso do lapis: era dificil manejé-lo porque no esava tanto quanto uma p4; lembro-me também de outro que no caminho para o trabalho parou com seus companheiros @ escreveu no cho, com a enxada, a palavra que haviam discutido: Agua. 46 Os cencontros educacionais» entre pessoas que fo- ram devidamente escolarizadas 6 outro assunto, mas 0s que nfo precisam dessa ajuda sio minoria, mesmo dentre os leitores de jornais sérios. A maio- ria no poderaé e nem deverd reunir-se para dis- cutir um «slogan», uma palavra ow um quadro. A idéia, porém, é a mesma: poderfo reunir-se em torno a um problema escolhido e definido por eles Mesmos. A aprendizagem criativa e pesquisadora Tequer que os participantes todos estejam igual- mente perplexos perante os mesmos termos ou pro- blemas. Grandes universidades tentam inutilmente aleangar esta aprendizagem multiplieando os cur- Sos; mas geralmente fracassam porque estio pre- 80s a curriculos, estruturas de curso e adminis- tragio buroerdtica, Nas escolas, inclusive nas uni- versidades, gasta-se a maioria dos recursos tentan- do comprar o tempo e a-motivacéo de um nimero Timitado de pessoas para que elas assumam deter- minados problemas e os resolvam segundo um pro- grama ritualmente definido, A mais radical alter- nativa para a escola seria uma rede ou um sis- tema de servicos que desse a cada homem a mes- ma oportunidade de partilhar seus interesses com outros motivados pelos mesmos interesses. Para esclarecer, tomemos um exemplo: como po- deria funcionar um encontro intelectual em Nova York, Qualquer pessoa, em qualquer momento e por um preco minimo, poderia identifiear-se em um computador dando-the enderego, niimero de tele- fone e indicando 0 livro, artigo, filme ou gravagio sobre os quais gostaria de discutir com um par- ceiro qualquer. Dentro de poucos dias poderia rece- ber pelo correio uma lista de outras pessoas que, Tecentemente, tomaram a mesma iniciativa, Com esta lista poderia combinar, por telefone, um en- aT contro com pessoas que, a principio, se tornariam conhecidas apenas pelo fato de terem procurado um diflogo sobre 0 mesmo assunto. Congregar pessoas de acordo com seus interesses sobre determinado assunto € muitissimo facil. Per- mite a identificagio simplesmente base do mituo desejo de discutir uma afirmacio feita por uma ter- eeira pessoa, e deixa a iniciativa de combinar 0 encontro ao individuo, Levantam-se normalmente trés objegdes contra essa minha sugestio, que ain- da esté em estruturacéo, Vou apresentéi-las nfo 36 para esclarecer a teoria subjacente A sugestio — porque elas ilustram a arraigada resisténcia & de- sescolarizacio da educacio e A separacio da apren- dizagem do controle social — mas também por- que podem ajudar a sugerir recursos existentes © que nio sio atualmente usados para fins de aprendizagem. A primeira objegio é: Por que a auto-identifica- cio no pode ser baseada também numa idéia ou num tema? Certamente, esses termos subjetivos também poderiam ser usados num sistema de computador. Os partidos politicos, as igrejas, sin- icatos, clubes, associacGes de vizinhos e socieda- des profissionais j4 organizaram suas atividades educacionais dessa maneira e, na realidade, atuam ‘como escolas. Congregam pessoas para examinar certos «temas»; estes sio tratados em cursos, semi nfirios e currieulos em que os presumiveis . Estavam decepciona- dos porque isto fora interpretado como exigéncia para menos e néo para mais educacdo. Lembrei- me da resisténcia que Karl Marx opés a um item do programa Gotha que — ha cem anos — queria proibir o trabalho de criancas, Opés-se porque achava que a educagio dos jovens s6 podia dar-se no trabalho, Se o melhor fruto do trabalho humano for a edueacio que dele provém e a oportunida~ de que di 20 homem de iniciar a educagio de ou- tros, entiio a alienacio da sociedade moderna no sentido pedagégico 6 ainda pior que sua alienacio econdmica. 53. © maior obstéculo para chegar a uma sociedade ‘que realmente eduque foi muito bem definido por um amigo meu, negro, em Chicago. Disse-me que nossa imaginacio estava . Permitimos que o Estado ausculte as deficiéncias educacionais universais de seus cidadios e crie uma reparticéo especializada para traté-las. Partilha- mos, portanto, da iluséo de que é possivel distin- guir entre o que 6 educacio necesséria para os outros e 0 que nio 6; exatamente como as gera- ‘Ges passadas que faziam leis para definir 0 que era sagrado ¢ 0 que era profano. Durkheim dizia que 0 fato de se dividir a realida- de social em dois campos foi 2 verdadeira essén- cia da religido antiga. Hé, dizia ele, religides sem © sobrenatural ¢ religiées sem deuses, mas nenhu- ma que nio subdivida 0 mundo em coisas, tempos pessoas que so sagrados e outros que, conse- aiientemente, sio profanos. A constatagio de Dur- Kheim pode ser aplicada A sociologia de educacio, pois a escola é também, numa perspectiva bem semelhante, absolutamente divis6ria, ‘A simples existéncia da escolaridade obrigatéria divide qualquer sociedade em dois campos: certos perfodos de tempo, processos, servicos e profissées siio ou

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