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Capitulo 3 Partitocracia e reforma partiddria brasileira Sumario: 3.1 Instrumentos da partitocracia - 3.1.1 O voto obrigat6rio - 3.1.2 Distribuicdo de cargos na Administracao Publica - 3.2 Financiamento puiblico dos partidos - 3.3 Cldusula de exclusdo ou de barreira - 3.4 A breve vida da verticalizacdo - 3.5 Fidelidade partidéria - 3.5.1 A fidelidade no exercicio do mandato: o controle concomitante da moralidade - 3.5.2 Democracia, autonomia e fidelidade partiddrias no Brasil - 3.5.3 A fidelidade partidéria sem mandato imperativo 3.1 Instrumentos da partitocracia 3.1.1 O voto obrigatério Embora haja discordancia de muitos,’ a obrigatoriedade do voto € um dos mais eficazes instrumentos de sustentacio e fortalecimento da partitocracia, pois, nao obstante se possa sustentar que se 0 voto nao fosse obrigatdrio a proporcao dos dados aos partidos e aos candidatos seria a mesma, é€ de se aceitar que, em “*Embora muitas vezes evocado no contexto italiano, o voto obrigatério € um instrumento débil (nao existindo sangSes) nas maos da Panttocracia. E indubitavel que 2 alta percentage de votantes € a sua estabilidade no tempo podem construir, aos olhos dos dirigentes de partido, uma prova de que o sistema partidério ndo perde legitimidade. Mas, sendo assim, o recente crescimento do abstencionismo, mesmo na Itlia, hd de ser avaliado como principio de nao- legitimacdo da Partitocracia, em situagdes claramente definidas e com sinais bastante especi- ficos (referendum, eleicoes regionais, etc.) (BOBBIO et al. Diciondrio..., op. cit., p. 906). 164 | Femando Gustwvo Knoer sendo obrigatorio, grande parte da sociedade civil, principalmente a que somente vota para nao sofrer as san¢Ges legais decorrentes da abstenc4o, nao manifestaria sua vontade. E neste particular nao haveria apenas uma diferenca quantitativa, e sim qualitativa, pois o voto destes mais distanciados da participacdo politica, e de regra menos informados, ¢ motivado pelos apelos da propaganda de campanha, que nem sempre expressa a real condicao do partido/ candidato. E, em sintese, um voto que, dado sem vontade, encontra- se a disposicéo da manipulacdo publicitdria, jf que proferido por quem ndo se dedicou com perfunctoriedade na formacdo da vontade que manifesta. Deste modo, os partidos que tiverem melhores condicdes de apresentar uma boa propaganda, e boa propaganda € a que consegue ser mais convincente, receberao mais votos, e serdo cada vez mais fortalecidos. - Em projec4o, o voto obxigatdrio pode ser apontado como uma das causas da configuracdo do cendrio politico a partir de poucos, mas grandes, partidos. No Brasil, hd propostas de emenda 4 Constituic&o voltadas & introdugdo do voto facultativo. 3.1.2 Distribuicdo de cargos na Administracao Publica Embora recorrentemente tratada pela doutrina como um dos instrumentos da partitocracia, a distribuic4o de cargos da estrutura burocrdtica estatal pautada na adesdo ao partido € muito mais uma caracteristica desta. A par de ser, evidentemente, um instrumento de reforco do poderio partiddrio, na medida em que a adesdo a seus quadros pode ser utilizada como condicionante para a nomeac4o a.um cargo piiblico, é de se ver também que a imposicao da prévia filiac4o partiddria soa como requisito de coeréncia das diretrizes governamentais que, antes, foram fixadas em nivel partiddrio. Nao se pode olvidar que nas propostas de campanha encontram-se jé delineadas as diretrizes governamentais que deverao ser postas em. prdticas no caso de éxito eleitoral. Nessa linha, a exigéncia de prévia filiac4o, mormente quando reforcada pela exigéncia de fidelidade Bases e perspectivas da reforma politica brasileira partidaria, soa como instrumento de preservacao da coeréncia, até mesmo ideoldgica, no exercicio do poder. Nao € sem sentido que Anna Oppo assinala que a exigéncia de filiacao para distribuicao de cargos na estrutura burocrdtica do Estado reforca-se na mesma propor¢4o em que se agiganta 0 modelo de Estado Social, levando a Administracdo Publica a ser cada vez mais intervencionista € fomentadora.* Neste sentido, “é importante sublinhar que sao duas as varidveis que influem para que este instrumento seja mais ou menos eficaz. Antes de mais nada, quanto mais vasto for o 4mbito de intervencio do Estado nos setores social e econémico, tanto mais numerosas serao as posicdes disponiveis para os partidos ¢ e quanto mais débeis forem as institui¢des, tanto mais facil sera para os partidos intervir € colonizd-las). Por isso, um Estado inter- vencionista e instituicdes débeis, como, por exemplo, um aparelho burocrdtico mantido a mercé do Governo, so um terreno favoravel @ Partitocracia e as suas atividades de expansio e fortalecimento”.* Porém, a ascens4o da tecnocracia tem feito sobrepujar, em nome da valorizacdo da competéncia e do profissionalismo, a exigéncia de prévia filiacdo, tornando-se cada vez mais comum a aceitacao de nomeacées que ndo adotem por critério a filiagao partiddria, mormente para cargos em que © conhecimento técnico seja imprescindivel. Portanto, nao sendo mais tao comum que a filiacdo partiddria sobrepuje o valor da apurada forma¢ao técnica, como requisito para a ocupacdo de cargos puiblicos, salta em evidéncia que € “o grau de combinacao entre ambas as coisas que determina a existéncia de uma Partitocracia voraz e ramificada”.* Outro elemento de fortalecimento da partitocracia, presente em varias democracias ocidentais, a exemplo da brasileira, € a vedacdo legal a candidaturas independentes. TBOBBIO et al. Diciondrio..., op. cit. p. 907. Frise-se que o uso desta terminologia apega-se 2 doutrina administrativista que, 2 exemplo de Maria Sylvia Zanella Di Pietro, separa as funcdes ‘da Administracao Publica em servicos piiblicos, poder de policia, intervencao e fomento (D1 PIETRO, Maria Sylvia. Direito administrativo. 10. ed. Sto Paulo: Atlas, 1999. p. 54). 5 BOBBIO et al. Diciondirio.... op. cit, p. 907. + BOBBIO et al. Diciondrio..., op. cit. p. 907. | 165 166 | Femando Gustavo Knoerr A estes motivos, deve-se ainda acrescentar como causa da decadéncia dos partidos de quadros o papel dos meios de comunicacdo, que diluiu a influéncia local dos partidos, tomando mais sofisticada e mais custosa a propaganda partiddria. Como assinala Marcelo Caetano, “hoje em dia, com os novos meios de comunica¢4o e de técnica de propaganda, a politica local perdeu muito da sua influéncia nos partidos, avultando nestes a preponderancia dos problemas nacionais e internacionais. Daj, e do facto de ser muito cara a acdo partiddria nas eleicdes e na informacdo, o declinio dos pequenos partidos forgados, para subsistir, a viver como satélites de algum dos grandes”. 3.2 Financiamento publico dos partidos E comum alinhar-se no mesmo grau de importancia para a sustenta¢4o da partitocracia o figanciamento publico dos partidos. Este reforco 4 partitocracia € encontrado em grau maximo nas hipsteses em que os recursos séo carreados diretamente aos cofres do partido, sem que este tenha de destind-los a atividades especificas, como propaganda, campanhas de interesse publico. Ha, em sintese, plena liberdade do partido no uso destes recursos. Sem o controle rigoroso do destino destas quantias, o financiamento publico acaba por servir ao fortalecimento da estrutura burocratica partiddria, mormente de seus dirigentes, reforcando ndo apenas a partitocracia, mas o caudilhismo. “O sustentdculo financeiro do Estado aos partidos reduz consideravelmente 0 risco de derrapagem; resta, € claro, o problema do enriquecimento pessoal.”* 3.3 Cldusula de exclus4o ou de barreira Se o maior problema do sistema majoritério, como aponta Giovanni Sartori,’ encontra-se na possibilidade de manipulac4o, * CAETANO, op. cit., p. 381. © SEILER, op. cit, p. 27. 7 SARTORI. Engenbaria..., op. cit., p. 23-34. Bases e perpectvas da sefonma pottica brasieira | 167 o defeito mais comum dos sistemas proporcionais encontra-s¢ na proliferacdo de partidos, cuja solucZo tem sido buscada na atribuicéo de pesos distintos aos votos dados ao partido e aos votos dados ao candidato (sistema imperfeitamente proporcional, como 0 apelida Giovanni Sartori) ou no estabelecimento de limites minimos para o ntimero de votos atribuidos ao partido, a chamada Sperrklausel (clausula de barreira) da experiéncia alema. Na Alemanha, 0 limite foi fixado originalmente em 5%, sendo adotado por outros paises parametros varidveis, que vao desde 1% em Israel (aumentado em 1992 para 1,5%), passando por 4% na Espanha, 3% na Argentina e até 10%, nas eleicdes de 1983 e 1991 da Turquia ou acima de 15% como interpoladamente a utilizou a Grécia, no uso da chamada “proporcionalidade reforcada”. No Brasil, a Carta de 1967, além de proibir coligacdes partiddrias (art. 149, VID, exigia, para que pudesse existir partido politico, o apoio de “dez por cento do eleitorado que haja votado na tiltima eleicdo geral para a Camara dos Deputados, distribuidos em dois tercos dos Estados, com o minimo de sete por cento em. cada um deles, bem assim dez por cento de deputados em pelo menos um terco dos Estados, e dez por cento de senadores” (art. 149, VII). 7 Essas marcas foram reduzidas pela Emenda Constitucional n° 01/69, para “cinco por cento do eleitorado que haja votado na viltima eleico geral para a Camara dos Deputados, distribufdos em pelo menos sete Estados, com o minimo de sete por cento em. cada um deles” (art. 152, VID. A Emenda n° 11, de 1978, as diminuiu para “5% do eleitorado que haja votado na ultima eleicao geral para a Camara dos Deputados, distribuidos, pelo menos, por nove Estados, com minimo de 3% em cada um deles”. Em nivel infraconstitucional, o Decreto-Lei n° 8.835, de 24.01.1946, art. 5°, com o Cédigo Eleitoral de 1950 (Lei n° 1.164, de 24.07.1950) — cujo art. 148, em seu pardgrafo tinico, mandava cancelar o registro de partido que nao conseguisse eleger ao menos um representante para o Congresso Nacional, ou que nao obtivesse ao menos 50 mil votos—e também com a “Emenda Constitucional” n? 11/85, que vedou representacdo ao partido com vota¢4o inferior 5% do eleitorado, distribuido, pelo menos, por nove Estados, com © minimo de 3% em cada um deles. 168 | Ferando Gustavo Koen ACF de 1988 ndo previu clausula de exclusdo,* e tampouco a Lei Organica dos Partidos Politicos (Lei n* 9.096, de 19 de setembro de 1995), que se limita a gizar no artigo 13 as condic¢Ges de funcio- namento parlamentar do partido”? A priori, nao ha como dizer-se se a cldusula de excluséo serd mais ou menos eficaz em func4o tao somente do percentual em que foi fixada. Outros fatores devem ser considerados, tais como os atinentes aos indices de abstenc4o e a obrigatoriedade do voto, pois, em paises em que estes indices sejam baixos e 0 *E nem a admite, segundo diccdo do Supremo Tribunal Federal, em decisdo assim ementada: “Partidos politicos. Indicagdo de candidatos. Pressupostos. Inconstitucionalidade, Exsusgem conflitantes com a Constituic’o Federal os preceitos dos pardgrafos 1° e 2° do artigo 5° da Lei n. 8713/93, no que vincularam a indicacdo de candidatos a presidente e vice-presidente da Republica, Governador, Vice-Govemnador e Senador 2 certo desempenho do partido no pleito que a antecedeu e, portanto, dados fiticos conhecidos. A Carta de 1988 nao repetiu a restricao contida no artigo 152 da preterita, geconhecendo, assim, a representacao dos diversos segmentos sociais, inclusive os que se formam dentre as minorias” (Supremo Tribunal Federal. ADIN n? 958-RJ. Relator: Ministro Marco Aurélio, Julgamento: 11.05.94. Tribunal Pleno. Didrio de Justica da Unido 25.08.95, p. 26021, Ementario v. 01797-01, p. 00077). * 0 entendimento esposado pelo STF segue no sentido de afirmar a constitucionalidade deste dispositivo, como assentado na decisio assim ementada: “Medida cautelar em aco direta de inconstitucionalidade. Suspei¢o de Ministro da Corte: descabimento. Partidos politicos. Lei n. 9096, de 19 de novembro de 1995. Argilico de inconstitucionalidade do art. 13 e das expressoes a ele referidas no inciso Il do an. 41, no caput dos ans. 48 e 49 e ainda no inciso TI do art. 57, todos da Lei n. 9096/95. 1. Manifestacdo de Ministro desta Corte, de lege ferenda, acerca de aperfeioamento do processo eleitoral, ndo enseja declaragao de suspeicao. Descabimento de sua argilicdio em sede de controle concentrado. Nao conhecimento. 2, 0 artigo 13 da Lei n. 9.096, de 19 de novembro de 1995, que exclui do funcionamento parlamentar © partido politico que em cada eleicdo para a Camara dos Deputados, nao obtenha 0 apoio de no minimo cinco por cento dos votos validos distribuidos em, pelo menos, um tergo dos Estados, com um mfnimo de dois por cento do total de cada um deles, no ofende o principio consagrado no artigo 17, seus incisos e pardgrafos, da Constituicdo Federal. 3. Os parimetros tracados pelos dispositivos impugnados constituem-se em mecanismos de protecto para a propria convivencia partiddria, nao podendo a abstracao da igualdade chegar ao ponto do estabelecimento de verdadeira balbirdia na realizacdo democratica do proceso eleitoral. 4. (Os limites legais impostos e definidos nas normas atacadas nao esto no conceito do artigo 13 da Lei n® 9096/95, mas sim no do prdprio artigo 17, seus incisos e pardgrafos, da Constituicao Federal, sobretudo 20 assentar 0 inciso IV desse artigo, que o funcionamento parlamentar ficard condicionado ao que disciplinar a lei. 5. A norma contida no artigo 13 da Lei n* 9.096/95 no € atentat6ria 20 principio da igualdade; qualquer partido, grande ou pequeno, desde que habilitado perante a Justica Eleitoral, pode participar da disputa eleitoral, em igualdade de condigdes, ressalvados o rateio dos recursos do fundo pantidério e a utilizagao do horério gratuito de rédio e televisio — o chamado “direito de antena” —, ressalvas essas que 0 comando constitucional inscrito no artigo 17, §3°, também reserva 2 legislacdo ordindria a sua regulamentacio. 6, Pedido de medida liminar indeferido” (Supremo Tribunal Federal. ADIMC 1354-DF. Relator: Ministro Mauricio Corréa. Julgamento: 07.02.96. Tribunal Pleno. Diario de Justia da Unido 25.05.01, p. 00009, Ementério v. 02032-01, p. 00197). Bases ¢ perspectivas da reforma politica brasileira voto seja obrigatério, uma cléusula de 5% pode ser considerada extremamente alta, podendo, de outro lado, ser considerada completamente ineficaz nos casos em que 0 voto seja facultativo e sejam registrados altos indices de abstengao. Na histéria constitucional brasileira, a cl4usula de barreira destaca-se como marca de regime antidemocratico, nao sendo outra a raz4o pela qual o Supremo Tribunal Federal a repeliu na decisao proferida na ADI n° 1351-3/DF, concluindo pela inconstitu- cionalidade do artigo 13 da Lei n° 9.096/95, quando prevé os critérios definidos do funcionamento parlamentar. Merece destaque trecho do voto do Ministro Eros Grau: “A lei, de modo obliquo, reduz a representatividade dos deputados eleitos por determinados partidos, como que cassando nao apenas parcela de seus deveres de representac4o, mas ainda — 0 que € mais grave — parcela dos direitos politicos dos cidadaos e das cidadds que os elegeram. Para ela, o voto direto a que respeita o artigo 14 da Constituicao do Brasil ndo tem valor igual para todos. Uma lei com sabor de totalitarismo. Bem ao gosto dos que apoiaram a cassacao de mandatos e de registro de partido politico; bem ao gosto dos que, ao tempo da ditadura, contra ela ndo assumiram nenhum $esto sendo o de apontar com o dedo. Nao-apenas silenciaram, delataram... Uma lei tao adversa a totalidade que a Constituicao é, tao adversa a esta totalidade que © mesmo partido politico pelo qual poderd ter sido eleito o Chefe do Poder Executivo serd, sob a incidéncia de suas regras, menos representativo do que os demais partidos no ambito interno do Parlamento. Multipla e desabridamente inconstitucional, essa lei afronta o principio da igualdade de chances ou oportunidades, corolério do principio da igualdade. Pois € evidente que seria imttil assegurar-se a igualdade de condi¢ées na disputa eleitoral se no se assegurasse a igualdade de condigdes no exercicio de seus mandatos pelos eleitos”.’° '© STR. ADI n* 1.351-3/DF. Relator: Ministro Marco Aurélio. Requerente: Partido Comunista do Brasil — PC do B e outros. Requeridos: Presidente da Repuiblica e Congresso Nacional. | 169 170 | Femando Gustavo Knoer 3.4 A breve vida da verticalizacao Outro ponto sensivel na busca do fino equilibrio entre autonomia e coeréncia partiddria surge na busca de harmonizar © comportamento do partido em todo o territério nacional, na busca da plena efetividade do previsto pelo artigo 17, I, da CF, quando exige dos partidos politicos ac4o em cardter nacional e, desta forma, nao lhes impde a obrigacdo de se fazerem presentes em todos os Estados € Municipios, o que sequer seria razodvel ou financeiramente possivel, mas os obriga a atuar em prol do interesse nacional, de modo a nao patrocinar o sectarismo regional. No intuito de imprimir uniformidade a acdo nacional dos partidos politicos, foi introduzido o instituto da verticalizacao através da Resolucdo do TSE n® 20.993/02, editada a pretexto de interpretar o artigo 6° da Lei n® 9.504/97, interessando o disposto pelo artigo 4°, §1°: “Art. 4° E facultado aes partidos politicos, dentro da mesma circunscric4o, celebrar coligacées para eleicio majoritéria, para proporcional, ou para ambas, podendo, neste tiltimo caso, formar-se mais de uma coligacdo para a eleicdo proporcional entre os partidos politicos que integram a coligac4o para o pleito majoritdrio. §1° Os partidos politicos que lancarem, isoladamente ou em coligacao, candidato eleicdo de presidente da Republica nao poderao formar coligacées para eleicao de governador/a de Estado ou do Distrito Federal, senador/a, deputado/a federal e deputado/a estadual ou distrital com partido politico que tenha, isoladamente ou em alianga diversa, lancado candidato/a & eleicdo presidencial”. A busca da coeréncia partiddria em plano nacional foi, contudo, eliminada pela promulgacdo da Emenda Constitucional n® 52, que, revogando o contido na resolucdo, deu ao artigo 17, §1°, da CF a seguinte redacdo: “§1° E assegurada aos partidos politicos autonomia para definir sua estrutura interna, organizacao e funcionamento e para adotar os critérios de escolha e o regime de suas coligac6es eleitorais, sem obrigatoriedade de vinculacao entre as candidaturas em 4mbito nacional, estadual, distrital ou municipal, devendo seus estatutos estabelecer normas de disciplina e fidelidade partiddria’. ‘Bases © perspectivas da reforma poltica brasileira | 171 3.5 Fidelidade partiddria 3.5.1 A fidelidade no exercicio do mandato: o controle concomitante da moralidade Superada a andlise do controle de moralidade na motivacao da entrega do mandato, impée-se agora analisd-lo, em seu efetivo exercicio, sendo resultado direto de toda construcao hist6rica do conceito de mandato a indispensabilidade do controle, seja nas formas tradicionais do mandato livre e do mandato imperativo, albergados no seio de um modelo politico de Estado Social ou de Estado Liberal, seja ainda mais na contemporaneidade, em que os partidos politicos assumem 0 evidente papel de resistencia aos constantes ataques que a soberania, mormente dos paises periféricos, vem sofrendo. Deve-se ter claro, e esta € a premissa maior, que até mesmo com o melhor dos controles, caso esta no¢ao fosse factivel, o governo ndo seria isento de objecdes, sendo sempre de se admitir um certo grau de defectibilidade. Contudo, seguindo 0 oportuno alerta de James Madison, a repeticdo desses erros, a ignorancia dos apelos dos eleitores, “privaria a instituicao daquele respeito que o tempo confere e sem o qual talvez nem mesmo 0 melhor e mais livre dos governos manteria a indispensavel estabilidade. Se € verdade que todos eles dependem da opiniao publica, nao o é menos que a constancia do ponto de vista de cada individuo e a influéncia pratica sobre sua conduta dependem muito do ntimero de pessoas que ele julga participarem desse mesmo ponto de vista”."* 3.5.2 Democracia, autonomia e fidelidade partiddarias no Brasil Mais do que chancelarem toda a construcao historica acerca dos partidos politicos, assim como da democracia representativa, os partidos politicos brasileiros sao 0 auténtico resultado de tudo que a experiéncia alienigena pode ensinar. " MADISON, op. cit., p. 408. 172 | Femando Gustavo Knoerr Do ponto de vista constitucional, o problema somente foi examinado na regra de 1969 (que valeu até 1985 EC n’ 25), quando foi estabelecida a sancéo de perda de mandato por infidelidade partidéria aos membros das Casas Legislativas, mediante a represen- tacdo do préprio partido e decisao da Justica Eleitoral. Assegurada ampla defesa, a punicdo era aplicdvel aos membros desses colégios, nas hipdteses em que, (i) por atitudes ou votos, se opusessem as diretrizes estabelecidas pelos rgaos de direc4o partidaria, ou (ii) no caso de auto-exclusao dos quadros do partido que os elegera. Em nivel infraconstitucional, o Cédigo Eleitoral de 1950, ao tratar da violacao dos deveres partiddrios, nao examinava a situacdo dos filiados, mas da violacdo praticada por drgao do partido, aplicando a sangdo unica de dissolu¢do, com o conse- qliente cancelamento do seu registro, a um diretério que se tornasse “respons4vel por violacéo do programa ou dos estatutos do seu partido politico, ou por desgespeito a qualquer das suas delibe- ragées regularmente tomadas”. As Leis Organicas dos Partidos Politicos de 1965, de 1971 de 1979, distinguiam entre a situacao semelhante a anteriormente descrita e as violac6es individuais dos deveres partiddrios, sendo até mesmo semelhantes na redacdo, ao preverem que os filiados ao partido que faltassem a seus deveres de disciplina, ao respeito a principios programdticos, 4 probidade no exercicio de mandatos ou funcoes partiddrias estavam sujeitos as penalidades de: a) adverténcia; b) suspensao por 3 a 12 meses; ©) destituicao de fungao em 6rgaos partiddrios; d) expulsao. Na LOPP de 1965, permitiu-se a aplicacao pelo voto de 2/3 dos membros do drgéo competente, reduzida esta margem para maioria absoluta a partir de 1971, da pena de perda do mandato, resguardada a possibilidade de se invocar a reviséo pela Justica Eleitoral, com efeito suspensivo. Esta invocacdo seria procedida ex officio nos casos de deciséo absolutoria. Paralelamente, persistia a dissolucdo de diretorio nas hipoteses de: I - violacdo do estatuto, do programa e da ética partiddria, bem como de desrespeito a qualquer deliberacao regularmente tomada pelos 6rgaos superiores do partido; Il — impossibilidade de resolver-se grave divergéncia entre os membros do diretorio; € Ill — md gestdo financeira. Bates ¢pespecivas da refoma poltica basin | 173 Coma estrutura que a Lei Organica dos Partidos Politicos (Lei n? 9.096, de 19 de setembro de 1995) previu em seu artigo 4°, e com muito mais énfase 0 art. 17, caput, da CF, os partidos politicos passaram a ser concebidos, no dizer de Favila Ribeiro, como uma “democracia em miniatura”. Uma democracia que comporta certa critica na afronta a isonomia, traduzida na dispensa de tratamento assaz rigoroso aos filiados do partido, mas elastecido quando trata dos integrantes da bancada. Tal constatacdo pode ser confirmada na previsao do artigo 22, pardgrafo unico, da LOPP, que prevé cancelamento automatico de filiacdo daquele que, em se filiando a outro partido, nado o comunicar ao juiz da respectiva zona eleitoral no dia imediato ao da nova filiacdo. Frise-se: ambas as filiacSes serao canceladas. Neste particular, comenta Favila Ribeiro que o desproporcional tigorismo fulcra-se na “implicita presun¢ao de ma-fé, uma vez que s4o declaradas nulas ambas as filiagdes”."¢ E de se considerar, ab initio, que este desligamento nao poderia ser imposto de oficio, eis que, ante seu nitido cardter sancio- natorio, somente poderia decorrer da conclusdo de um processo, tal como delineado por garantias constitucionais. Bastaria, ademais, cancelar-se apenas uma das filiacSes: a anterior, sendo claro que a posterior € resultante da mais atual manifestacdo de vontade do novel filiado, devendo, por este motivo, permanecer intocada. © RIBEIRO, op. cit, p. 327. © De fato, neste particular 0 Tribunal Superior Eleitoral tem-se mostrado bastante rigoroso, servindo de exemplo o precedente dos autos de Recurso Especial Eleitoral n* 18.736, relatado pelo Ministro Waldemar Zveiter e publicado em sesso em 07.11.00, segundo 0 qual nao basta a comunicaclo da desfiliacdo 20 DiretGrio Regional, ¢ necessério que esta seja realizada perante o Diret6rio Municipal, sob pena de nao sunir efeitos para o registro de candidatura 2 vereador. Afirmou 0 Ministro que “Tendo em vista a comunicacdo feita pelo Recortido, 20 DiretGrio Regional do PFL, néo ter resultado no seu efetivo desligamento do quadro de filiados do Diret6rio Municipal do Partido, persistindo a sua condigo de duplamente filiado, E de se aplicer a supracitada jurisprudéncia®. A jurisprudéncia referida € a seguinte: “Recurso especial. Registro de candidatura. Filiacdo partidaria. Duplicidade. Lei 9096/95, art. 22, §tinico. Aquele que se filia a outro partido deve comunicar 20 partido ao qual era anteriormente filiado e ao juiz de sva respectiva zona eleitoral 0 cancelamento de sua filiaclo no dia imediato 20 da nova filiacdo sob pena de restar caracterizada a dupla filiacdo. Diante da verificacéo da dupla filiacdo pantidéria pela falta de comunicagao oporuna, indefere-se 0 pedido de registro de candidatura (Lei 9.096/95, Ant. 22, pardgrafo vinico). Precedentes. Recurso nao conhecido” (Tribunal Superior Eleitoral. RESPE n® 16.410-PR, Publicado em Sess&o 12.09.00). ™ RIBEIRO, op. cit., p. 327. 174 | Femando Gusavo Knoer Ao integrante da bancada partiddria nao se reserva o mesmo. rigor punitivo, pois 0 art. 26 da Lei n° 9.096/95, ao prever a perda automdatica da funcdo ou cargo que esteja sendo exercido pelo parlamentar, no rgio legislativo, por haver abandonado o partido vinculado em seu diploma eletivo, nao impoe a perda da filiacao ao novo partido. Assevera ainda Favila Ribeiro que, se por um lado a mudanca de legenda inabilita o parlamentar a se expressar em nome do partido que renegou, pois “ao trocar de legenda o parlamentar, esse fato deve ser equivalente 4 perda da contemporanea filiacao, e assim tendo que ser declarada e, por essa via, logicamente, dar- se-ia a privacdo do mandato eletivo, por nao subsistir @ filiagdo, por ser pressuposto essencial @ persisténcia do direito a elegibilidade, vale dizer, a nao ser fulminado por sanc4o que 0 afete com inele- gibilidade, levado a indagar-se qual a sanc4o eabivel, igual ou diferente da que se aplica.ao filiado?”* © Constituinte brasileiro, ao teor do §1° do art. 17 da CF, houve por bem remeter 4 normacdo interna de cada partido o tratamento da fidelidade partiddria, o que tem recebido criticas de alguns e encémios de outros politicos e doutrinadores. O fato de a Constituicdo delegar & normatividade interna do partido a questdo da fidelidade partiddria, obriga-o a necessa- riamente disciplind-la, sob pena de cassacdo de seu registro provisdrio" ou de negac4o de pedido de registro definitivo,’” nao se 4 RIBEIRO, op. cit., p. 330. ' Neste sentido, o precedente do Tribunal Superior Eleitoral, relatado no processo de Registro e Cancelamento de Partido n* 219/DF, proferido em 12.03.1991 e relatado pelo Ministro Célio Borja, que decidiu: “Partido politico. Partido social trabalhista - PST. Registro definitivo. Extingo do partido social cristio — PSC. Alegacio de descumprimento na incorporacao aos seus estatutos das nomas de fidelidade e disciplina partidarias. (RES. n. 16.357, de 29.03.1990). Reiterado 0 entendimento jurisprudencial desta Corte que admite a extincdo dos efeitos dos registros somente aos partidos com organizacdo proviscria, nao importando © cancelamento de registro do partido quando nao incorporados aos estatutos as normas em questio. (LOPP, art. 12). Julgado improcedente” (Tribunal Superior Eleitoral. Didtio de Justica da Unido, 29.4.91, p. 5244. Revista de Jurisprudéncta do Tribunal Superior Eleitoral, Brasiia, v. 3, p. 400. . ID. Neste sentido ja decidiu o Tribunal Superior Eleitoral em julgado proferido no RECAP n° 174/ DF, relatado pelo Ministro Celio Borja, assim ementado: “Partido politico. Registro definitivo do partido social cristo — PSC. Pedido deferido sob a condicao da incorporacdo aos seus estatutos das normas de fidelidade e disciplina partiddrias. Aprovada pelas Convencoes ‘Bases e perspectivas da reforma politica brasileira. «| 175, limitando a assinalar mera faculdade de, em querendo, exercer sua competéncia normativa também sobre este assunto. Esta conclusao segue autorizada com énfase ainda maior pela jd aludida previsao do artigo 15 da LOPP. Note-se que 0 partido deve disciplind-la, mas o modo pelo qual o fard estd integrado na sua competéncia privativa, abrangida que se encontra pela autonomia partidéria constitucionalmente consagrada.'* O elenco das sanc6es a serem aplicadas aos transgressores das diretrizes partiddrias também se encontra na Lei Organica dos Partidos Politicos, espuriamente, no entender de Favila Ribeiro, pois ao prevé-lo “o legislador ordindrio esbulhou uma 4rea de normatividade que lhe estava interditada, subtraindo preceituacées colocadas 4 discric4o das organizac6es partiddrias, a estas deixando, nesse tocante, com escassa disponibilidade inédita. Assim o fez, estabelecendo modalidades de sancGes disciplinares, que haviam sido colocadas pela Constituicéo Federal como assuntos de economia interna de cada partido, e mormente porque estava fazendo apenas com superficial alcance, para permitir que a questdo da fidelidade partiddria fosse apropriadamente tratada nas inst4ncias normativas partiddrias. Por exemplo, podem ser apontadas as seguintes hipsteses: ‘desligamento tempordrio da bancada’, ‘suspensao do direito de voto nas reunides internas’, ‘perda de todas as prerrogativas, cargos e funcdes que exerca em. decorréncia da representacdo e da propor¢ao partiddria’ (tudo “Municipais, Regionais e Nacional, no prazo de 180 dias a contar da publicacao da presente decisdo” (Tribunal Superior Eleitoral. Didrio de Justica da Unido 10.05.90, p. 3982, Revista de Jurisprudéncia do Tribunal Superior Eleitoral, Brasfia, v. 1, p. 470. t. I. 4 Neste sentido o precedente do Tribunal Superior Eleitoral: “Em face do novo texto consti- tucional, a exigéncia da lei, no que conceme 4 aprovacao em face do novo texto constitu- ional, a exigéncia da lei, no que conceme 3 aprovacdo dos Estarutos Partidarios pela maioria das Convengées Estaduais e Municipais (art. 20, da LOPP e Resolucao n. 10.785, de 15.02.80, ar. 26, §3%, abineas ‘a’, ‘b’ e ‘c’). Est revogada, por ser incompativel com o principio da autonomia dos partidos politicos para definirem sua estrutura interna, organizacdo ¢ funcionamento (CF. an. 17, §1°). Precedente: Acdrdao n, 12120, de 29.10.91" (Tribunal Superior Eleitoral. Processo n. 17990-DF. Relator: Ministro Septilveda Pertence. Julgamento: 2492. Didrio de Justica da Unido 06.05.92, p. 6090, Revista de Jurisprudéncia do Tribunal Superior Eleitoral, Brasilia, v. 4, p. 398. t. ID. 176 Femando Gustave Knoert menos enfrentar a matéria em 0 seu exato alcance, quando nada disso cabia no contexto da lei, por ser matéria reservada 4 normacao partidéria)”? 4o assiste, contudo, integral raz4o a Favila Ribeiro, pois este ato do legislador ordindrio teve por intuito fornecer especial reforco de legalidade as penalidades aplicadas pelos partidos, sendo de se ver que, na falta desta previsdo, seria profundamente questiondvel a aplicacdo, por estes, de qualquer espécie de punicdo, jé que, na coeréncia da previsdo constitucional, “ninguém sera obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa sendo em virtude de lei” (art. 5°, II, da CF). Com esta previsdo, o sistema juridico brasileiro deu aos partidos politicos a prerrogativa de autoexecutoriedade de seus atos, permitindo-lhes a aplicagdo de restrigGes, sangGes, sem a participacao do Poder Judiciario, que somente poderd questiond-las do ponto de vista formal, mas jamais no tocante 4 op¢4o politica feita pelo partido quando da aplicac4o ou nao da sancdo. Pode-se cogitar, neste particular, de um mérito politico. Para Fdvila Ribeiro, o legislador ordindrio “pretendeu afastar, com pura e excessiva simplicidade, a sanc4o verdadeira da perda de mandato, pondo-se em condicao de ostensiva infrin- géncia ao invocado no art. 17, §1°, da Constituicao Federal, que colocou o problema da fidelidade partidéria a ser obrigatoria e compativelmente enfrentada nos estatutos partiddrios. A matéria nao pode escapar do disciplinamento estatutdrio, por ser terreno defeso a ingeréncia da lei, caracterizando-se abuso de poder normativo, por usurpacao de competéncia reservada pela Constituicao Federal aos partidos politicos, como aspectos interesses exclusivos de suas disponibilidades estatutdrias, competéncia das quais nao se podem eximir os partidos politicos por ser matéria de sua especifica responsabilidade, e que nao pode, absolutamente, deixar de ser contemplada”.” Para este autor, a LOPP neste particular € inconstitucional. * RIBEIRO, op. cit., p. 330. » RIBEIRO, op. cit,, p. 331. Bases e perpecivas da reforma polticabrastera | 177 Também neste particular cabe discordar do ilustre doutrinador, pois a aplicagdo da sancdo de perda do mandato por infidelidade partiddria jd fora de antem&o vedada pela Constituicdo na previsao taxativa do artigo 55.” Previsdo destoante quebraria a harmonia da disciplina constitucional. Por conseqiiéncia, também nao. perderd o direito & supléncia aquele que, nesta condic4o, muda de partido.” Ademais, a LOPP limitou-se a enunciar quais podem ser as san¢cdes, nado tendo abordado aspectos processuais e nao operando, tampouco, a ligac4o entre a fattispecie (a ser prevista por cada partido, segundo sua linha ideoldgica, tragada no gozo da autonomia que a CF lhe conferiu) e a sang4o. Também nao tornou obrigatdria a adoc4o de todas as san¢gées que enuncia, pois as prevé de modo meramente exemplificativo. Preservou-se, ainda, nas mdos do préprio partido, a conveniéncia (num juizo de discricionariedade politica) de iniciar ou n4o o processo que deve culminar na aplicagao de sangAo, por este motivo. ‘Neste sentido o precedente do Tribunal Superior Eleitoral que decidiu: “Inidelidade paridaria, Perda de mandato. Argilic4o de nulidade do julgamento improcedente. (CPC, art. 249, §2°). Revogadas pela Carta de 1988 as normas infraconstitucionais dispondo sobre a perda de mandato por infidelidade partidaria (Res. n. 15.135), carece 0 recurso de pressuposto para sua admissibilidade” (Tribunal Superior Eleitoral. Recurso Especial Eleitoral n. 8535. Relator: Ministro Célio Borja, Didrio de Justica da Unido, 15.05.90, p. 1. Revista de Jurisprudéncia do Tribunal Superior Eleitoral, v. 1, p. 84. IL). No mesmo sentido a decis4o proferida pelo Ministro Roberto Ferreira Rosas: “Filiacdo partidéria. Situaco do filiado, eleito por partide e que posteriormente cancela essa filiac4o. Manutengio do mandato. Questio discutida lo MS n. 20916 do STF” (Tribunal Superior Eleitoral. Recurso Especial Eleitoral n. 8527-SP. Relator: Ministro Roberto Ferreira Rosas, Boletim Eleitoral, v. 467, p. 743. Didrio de Justica da Unido, 21.11.89, p. 1). Assim também consulta respondida pelo Ministro Roberto Ferreira Rosas: “Vereador. Fleicio por determinada legenda. Ingresso em outro partido. Nao hd perda de mandato” (Tribunal Superior Eleitoral. Consulta n* 9.948-DF. Relator: Ministro Roberto Ferreira Rosas. Didrio de Justia da Unido, 20.04.89, p. 5825. Boletim Eleitoral, v. 445, p. 797.t.D. Neste sentido manifestou-se o Supremo Tribunal Federal em decisdo cuja ementa segue, na parte que interessa: “Mandado de seguranca. Fidelidade partidéria. Suplente de deputado federal. Em que pese o principio da representaco proporcional e a representacdo parlamentar federal por intermédio dos partidos politicos, nao perde a condic4o de suplente 0 candidato diplomado pela Justica Eleitoral que, posteriormente, se desvincula do partido ou alianca Partidaria pelo qual se elegeu. A inaplicabilidade do principio da fidelidade partidéria 20s parlamentares empossados se estende, no siléncio da Constituicao e da lei, 20s respectivos suplentes. Mandado de seguranca indeferido" (Supremo Tribunal Federal. Mandado de Seguranca n* 20927-DF. Relator: Ministro Moreira Alves. Julgamento: 11.10.89. Tribunal Pleno. Didrio de Justi¢a da Unido, 15.04.94, p. 08061, Ementdrio v. 01740-01, p. 00130). 178 | Femando Gustave Knoer Claro € que a conjuntura desta regulamentacdo pode causar grave desfalque & propria aplicacdo do instituto, nao sendo dificil imaginar a hipdtese de um partido que opte por disciplinar a fidelidade partiddria de forma bastante superficial, buscando justa- mente afastar a efetividade do dispositivo constitucional. Nao parece, contudo, possivel impor-se aos partidos politicos a auto-aplicabilidade dos incisos XVII-XXI do art. 5° da CF, tao somente pelo fato de que sao associac6es civis. S4o-no, realmente, mas de uma categoria especial, merecedora de previséo apartada — como de fato existe, em virtude de seu especial relevo para 0 Estado. Em nome da autonomia partiddria est4 interditada @ inter- feréncia legislativa a edicao de normas para definir estrutura interna dos partidos politicos, a organizacdo e funcionamento, devendo em seus estatutos estabelecer normas de fidelidade e disciplina, matérias que pertencem 4 economia interna da agremiacdo, em conformidade com 0 disposto no artigo 17, §1°, da Constituicao Federal. Como enfatiza Clemerson Merlin Cléve, “Se € certo, porém, que aos pr6prios partidos compete a definicéo da respectiva estrutura interna, nao € menos certo que pode a lei, respeitada a autonomia conferida pela Constituicdo, fixar determinadas regras para efeito de compatibilizar a liberdade partidaria com outros postulados constitucionais de observancia obrigatéria. Cumpre, ento, deixar claro que a autonomia do partido imuniza a agre- miacdo da interferéncia indevida do legislador ordindrio, mas ndo impede totalmente a agremiac4o contra o atuar normativo do legislador, desde que compativel com os parametros fixados pela Constituicéo. De modo que, nao se tratando de soberania, mas de autonomia, pode, com efeito, o legislador, observado sempre o nticleo essencial do conceito, estabelecer alguns parametros para a atuacdo partidéria que servirao, inclusive, de base para a elaborac4o dos respectivos estatutos pelas agremiacdes. Nao € outro, alids, 0 caminho seguido pelo legislador brasileiro com a edicao da Lei Organica dos Partidos Politicos (Lei 9.096, de 19/09/95)". ® CLEVE, Clemerson Merlin. Fidelidade partidaria, Curitiba: Jurud, 2000. p. 20. Bases € perspectvas da reforma politica brasileira. | 179) 3.5.3 A fidelidade partiddria sem mandato imperativo Segundo John Stuart-Mill, nao seria necessdria a introduc4o de um sistema de mandato imperativo como recurso para forcar a observancia, pelo Legislador, da vontade de seu eleitorado. Tal questio, referida pelo tedrico como “uma questéo de moralidade constitucional — a ética do governo representativo”, encontraria soluc4o se os eleitores se recusarem a eleger qualquer um que nao se comprometa com seus ideais ou que, pelo menos, ndo respeita suas opinides. Quando isto ocorrer, poderao transformd-lo num porta-voz, ou compeli-lo a entregar seu mandato, caso n4o consinta agir nestas condic6es.* Uma certa modalidade, no de mandato imperativo, mas de controle e coercdo na representacdo politica, pode ser encontrada na atuacdo dos chamados grupos de press4o, como deixa claro Emest S. Griffith, ao comentar que estes grupos “usam naturalmente membros de suas préprias regides como porta-vozes. Eles fazem 0 que podem legitimamente para convencer os membros de outras regioes, da justica e da raz4o de,seus pontos de vista [...] Um sistema de dois partidos nao € suficientemente preciso para refletir © intrincadé padrao de dois pontos de vista sobre uma multiddo de assuntos”.?* No caso dos partidos politicos, nao obstante a Constituicao Federal de 1988 tenha remetido a disciplina da fidelidade parti- daria, como visto, ao tratamento pelos respectivos estatutos, as penalidades reservadas pela Lei n° 9.096/95, nos artigos 23, 24 e 25, forcosamente impdem a restricdo da punicdo ao nivel intrapartiddrio, pois somente poderdo ser aplicadas as penas de “desligamento tempordrio da bancada, suspensdo do direito de voto nas reunides internas ou perda de todas as prerrogativas, cargos e fun¢des que exerca em decorréncia da representacao e da propor¢do partiddria na respectiva casa legislativa, ao paramentar ¥ STUART-MILL, op. cit., p.122. * GRIFFITH, Emest $. O sistema americano de governo. Rio de Janeiro: Nordica, 1983. p. 70. 180 | Femando Gustave Knoerr que se opuser, pela atitude ou pelo voto, as diretrizes legitimamente estabelecidas pelos drgaos partidérios”. A doutrina eleitoralista tradicional € unanime em afirmar que a Constituicdo Federal nao permite a perda do mandato por infideli- dade partidaria, jf que reserva a aplicacdo desta penalidade apenas aos estritos casos enunciados no artigo 55. Segue-se, neste particular, o modelo alem4o, no qual “Mesmo quando o Deputado nao quiser concordar com a politica de seu partido e por isso se desligar de sua bancada partiddria, nao perde seu mandato parlamentar”.?° Nesta medida, como assinala Celso Ribeiro Bastos, a Consti- tuicdo Federal de 1988 nao opera um “retorno integral @ antiga fidelidade e disciplina partiddrias. Isto porque eram elas impostas pela Constituicdo e regulamentadas na legislacado infraconstitu- cional. No momento, a Lei Maior exige simplesmente que os esta- tutos incorporem normas de fidelidade e disciplina partiddrias, o que, necessariamente, envolve a outorga de uma certa margem discriciondria para que os partidos regulem esses institutos com maior ou menor rigor. Possibilidade existente no regime anterior, quando as regras eram todas heter6nomas”.” Contudo, a remessa da disciplina da fidelidade partiddria & regulamentacdo pelo estatuto partiddrio nao fragilizou a demo- cracia brasileira e tampouco depreciou a import4ncia do mandato. Como sublinha Clémerson Merlin Cléve, “nem por isso a natu- reza do mandato parlamentar sofreu radical deslocamento de significagao”.* Ao revés, engendrou-se a criacao de um sistema de fidelidade partiddria que conjuga a tutela da autonomia partiddria, engrandece a democracia representativa e aprimora o sistema presidencialista de governo. Trata-se de um mandato representativo, mitigado pela exigéncia de fidelidade, pois jf nao mais se pode dizer que o parla- mentar ficard adstrito tao somente aos ditames de sua consciéncia, % PETERS, Joachim. Um pais e sew povo: a Republica Federal da Alemanha se apresenta. Sulzbach: Editora Altes Schulhaus, 1984. p. 20. * BASTOS. Comentdrics..., op. cit, p. 613. % CLEVE, op. cit, p. 27. Bases © pempecvas da reforma poltica brasieiaa | 181 devendo considerar os tépicos do programa partiddrio. Nos casos em que sua liberdade de consciéncia afrontar o programa do partido, deverd o mandatdrio abster-se ou previamente desfiliar-se. Quando a Lei Organica dos Partidos Politicos pede que © parlamentar paute sua atuacdo nas “diretrizes legitimamente estabelecidas pelos rgaos partidérios” (art. 25), impde-lhe a regras democraticamente gizadas, necessariamente genéricas e abran- gentes, que jamais poderao dispor pontuadamente sobre temas especificos. Nao seria licito, por exemplo, insculpir no programa do partido a regra segundo a qual todos os integrantes de sua bancada devem ser contrdrios 4 prdtica do abortamento. Seria admissivel, contudo, que a diretriz partiddria impusesse a observAncia da regra segundo a qual o partido € contrdrio a toda forma violenta de agressdo a vida. Como assinala Arnaldo Malheiros, “por diretriz legitimamente estabelecida hd de se entender a fixacdo de uma norma de conduta, resultante da tomada de posi¢do oficial de um érgdo diretivo partiddrio convocado expressamente para esse fim, tendente a compatibilizar a atuac4o de seus representantes com as normas Pprogramaticas ou estatutdrias da agremiacao, em face de determi- nada matéria sujeita a deliberacdo parlamentar”.” Nao séré licita, porque ndo seré diretriz, a regra do programa partidario que tolha dos integrantes de sua bancada a possibilidade de opcao. A possibilidade de optar por varios caminhos, todos comportados na regra programatica. Descer-se a filigranas no tracejamento do programa parti- dario desfiguraria, em primeira mAo, a previsdo de que o partido fixa apenas diretrizes, genéricas por definicdo, constituindo-se em afronta & liberdade de atuac4o do mandatério, que seria transfor- mado em mero autémato, em “boca sem vontade” para usar a expressdo de Cleémerson Merlin Cleve.” Se a democracia contempordnea, como antes se concluiu, & construida e sustentada a partir de elementos democraticos, e sera MALHEIROS, Amaldo. Fidelidade pariddria. Bolettm Eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral de Sao Paulo, n. 5. p. 3, jan./mar. 1977. 2» CLEVE, op. cit, p. 26. 182 | Femando Gustavo Knoert mais democratico um regime quanto mais democrdticos forem os seus elementos, nao se pode tolher do integrante da bancada a possibilidade de optar, de pensar e agir de modo distinto dos demais integrantes daquela, e ainda assim estar conformado as diretrizes partidarias. Os partidos, assim como a democracia, devem sancionar a liberdade da diferenca.3! Somente os que assumem comportamento francamente contrdrio a diretriz partiddria podem ser punidos por infidelidade.” Pensar 0 contrdrio redunda transformar o mandatdrio em alguém que nao tem a minima condicao de expressar sua vontade, mas t4o somente a do partido, fazendo com que o mandato, que 20 menos em certa medida deve ser titularizado por quem o recebe na escolha das urnas, passasse a pertencer unicamente ao partido. Endossando este raciocinio, o Tribunal Superior Eleitoral editou a ResolucZo n° 12.017, de 27.11.84, asseverado que “Nao pode o Partido Politico fixar, como diretriz partiddria, a ser obser- vada por parlamentar a ele filiado, membro do Colégio Eleitoral, a obrigacdo de voto em favor de determinado candidato”. Note-se, contudo, que a andlise da diretriz pelo Poder Judicidrio nao poderd abranger a matéria de fundo, devendo se ater apenas aandlise dos requisitos formais. 5) Nesse sentido, alude René Rémond 2 uma “fragmentacdo do cenério politico” (REMOND, René. La politique n'est plus ce qu'elle était. Paris: Calmann-Lévy, 1995. p. 58). 52 © Partido Democrético Trabalhista considera 0 desligamento do partido apds a obtencto do mandato, sem prévia rentincia 20 mandato, em seu Estatuto: “Ar. 61 - E norma fundamental de fidelidade e disciplina partidérias, obrigatoria a todos 0s filiados, 0 respeito eo cumprimento do Programa, dos Estatutos e das diretrizes ¢ deliberagdes legitimamente adotadas pelo Partido. §2° - Equipara-se a violacdo de norma de fidelidade e disciplina partidérias, o desligamento de filiado que, apds obter mandato legislativo através da Legenda do PDT, abandone o partido sem renunciar a este mandato”, 5 Neste sentido, decisio do Tribunal Superior Eleitoral que foi assim ementada: *Mediéa cautelar. Efeito suspensivo a RESPE. Hipotese na qual 0 Diretério Regional do Partido editou resolucdo, estabelecendo diretrizes no sentido de excluir, das eleigbes de 2000, filiados incluidos na CPI do FUNDEF. Decisto do TRE que: 1) reconheceu a legitimidade da resolucdo do partido; 1D valorou a autonomia partiddria; IM) reconheceu que 4 matéria € interna corporis, IV) indeferiu registro de candidatura. Decisio do TRE que se ajusta 2 jurisprudéncia do TSE (AcGrdios 13.688 e 13.738). Ausente 0 requisito da plausibilidade. Medida cautelar julgada improcedente” (Tribunal Superior Eleitoral. MC n* 853-CE. Relator: Ministro Nelson ‘Azevedo Jobim. Publicado em Sessko, 29.09.00).

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