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pelee a Kdsraw te 9 Neen £6 Ldeenge ov aimee, a rece oe eee ieee ade Edade ce Comdourtut a me bat ca Tretsk Neen Wa pnriven dy Bede auos a IV. A Politica como Vocagao Coney E.. conferéncia, que pronuncio por solicitagao vossa, ir necessariamente decepcionar, sob varios aspectos. Esperais, naturalmente, que eu tome uma posi¢ao em relagio aos pro- blemas concretos do momento. Mas isto s6 ocorrera de modo formal € no fim, quando apresentarei certas questdes relacionadas com a significaglo da ago politica na totalidade do modo de vida. Na conferéncia de hoje, todas as questoes relacionadas com a diretriz ¢ 0 contetide que devemos dar 2 nossa atividade politica devem ser eliminadas, pois nada tm, a ver com a questo geral do que significa a politica como vocagao e 0 que ela pode signi- ficar. Passemos, agora, a0 nosso tema. © que entendemos por politica? © conceito é extremamente amplo e compreende quezpe de lideranca independente em acio. Fala-se da politica financeira dos bancos, Mie descontos do Reichsbank, dr polica grevista Ge um sindicato: pode-se falar da eoitce educacional de uma municipalidade, da politica do presidente de uma associagio voluntaria e, finalmente, até mesmo da politica de uma esposa prudente que busca orientar © marido. Hoje, nossas reflexdes nao se baseiam, decerto, num conceito tao amplo, Queremos compreender como politica apenas a liderang, ov a influéncia sobre a ideran| de_uma associacio politica, ¢, dai hoje, de um Estado, “Mas o que € uma associagao ‘politica’, do ponto de vista sociolégico? O que ¢_um Estado’? Sociologicamente, o Estado nao pode ser definido em termos de seus fins Dificilmente havera qualquer tarefa que uma associacao politica nao tenha tomado em suas 105, € nao ha tarefa que se possa dizer que tenha sido sempre, exclusivamente € pecu- liarmente, das associagdes designadas como politicas: hoje o Estado, ou, historicamente, as associagdes que foram predecessoras do Estado modemo. Em tltima andlise, sé podemos definir 0 Estado moderno sociologicamente em termos dos melas especii ‘08 peculiares a fora ele, como peculiares a toda associa¢io politica, ou seja, o uso dat “Todo Estado se fundamenta na forga’, disse Trotski em Brest-Litovsk. Isso é realmente cer- to, Se no existissem instinuigdes sociais que conhecessem 0 uso da violencia, entao 0 concei- to de “Estado” seria eliminado, e surgiria uma situago que poderiamos designar como “anar- quia”, no sentido especifico da palavra. E claro que a forga nao é, certamente, o meio normal, nem 0 Gnico, do Estado ~ ninguém o afirma ~ mas um meio especifico ao Estado. Hoje, as ‘Politik als Beruf", Gesammelte Poltische Schnifen (Munique, 1921), pp. 396-450. Oniginslmente, discurso pronuncitdo at Universidade de Munique, 1918, publicado em 1919 por Duncker & Humbiodt, Munique S$ __ENSALOS DE SOCIOLOGIA relagOes entre o Estado e a violencia sio especialmente intimas. No passado, as instituigdes mais variadas — a partir do cla - conheceram o uso da forga fisica como perfeitamente nor {|} mal. Hoje, porém, temos de dizer que 0 Estado € uma comunidade humana que pretende, cuted. | C@LExXito, © monapdlio do_uso legitimo da forca fisica dentro de um determinado terrt6rio. © Note-se que “territ6rio” € uma das caracteristicas do Estado. Especificamente, no momento presente, © direito de usar a forca fisica € atribuido a outras instituigdes ou pessoas apenas na medida em que o Estado o permite. © Estado & considerado como a Gnica fonte do “direito” (de usar a violéncia. Daf “palitica”, para nés, significar a participacio no poder ou a luta para 2.0), linfluir na distrbuicio de poder, seja entre Estados ou entre grupos dentro de um Estado. “sto corresponde essencialmente a0 uso comum, Quando se afirma que uma questio € politica”, quando um ministro do Gabinete ou uma autoridade é considerado como “politi- co", ou quando uma decisio € tida como *politicamente” determinada, 0 que se esté que- tendo dizer, sempre, € que os interesses na distribuiclo, manutengao ou transferéncia do poder sio decisivos para a resposta 4s questdes e para se determinar a decisio ou a esfera de atividade.da autoridade. Quem participa ativamente da politica luta pelo poder, quer co- mo um meio de servir a outros objetivos, ideais ou egoistas, quer como o “poder _pelo Poder”, ou seja, a fim de desfrutar a sensagao de prestigio atribuida pelo poder. Como as instituigdes politicas que o precederam historicamente, o Estado é uma relagio ee homens dominando homens, relacao mantida por meio da violéncia legitima (isto €, considerada como legitima). Para que o Estado exista, os dominados devem obedecer 2 autoridade alegada pelos detentores do poder. Quando e por que os homens obedecem? Sobre que justificagiio intima e sobre que meios exteriores repousa esse dominio? Hewiwerse Para comecar, em principio, hé ts justificacdes interiores, e portanto legitimacdes, basi- cas do dominio. Primeira, a autoridade do ‘ontem etemo”, isto é, dos mores santificados pelo reconheci- mento inimaginavelmente antigo e da orientagdo habitual para o conformismo. E 0 dominio racdicional” exercido pelo patriarca e pelo principe patrimonial de outrora. 4 Hi a autoridade do dom di graca (carisma) extraordindrio € pessoal, a dedicacao absolu- tamente pessoal e a confianca pessoal na revelacio, heroismo ou outras qualidades da lide- ranca individual. E 0 dominio “carismatico”, exercido pelo profeta ou, no campo da politi- ca, pelo senhor de guerra eleito, pelo governante plebiscitirio, 0 grande demagogo ou o lider do partido politico. 3. Finalmente, h4 0 dominio em virtude da “legalidade”, em virtude da fé_na_validade do uto_legal e da “competéncia” funcional, baseada em regras racionalmente criadas. ‘ESSE CaSO, espera-se obediéncia no cumprimento das obrigacdes estatutarias. Eo dominio. exercido pelo modemo “servidor do Estado” € por todos 0s portadores do poder que, sob esse aspecto, a ele se assemelham. Compreende-se que, na realidade, a obediéncia € determinada pelos motives bastante fortes do medo ¢ esperanca - medo da vinganga dos poderes magicos do detentor do poder, esperanca de recompensa neste mundo ou no outro — e, além de tudo isso, pelos mais variados interesses. Vamos falar disso. Mas ao procurat as “legitimagdes” dessa obe- digncia, encontramos esses tes tipos “puros’: “tradicional”, “carismatico” e “legal” ‘as concepcoes de legitimidade e suas justificagdes intimas so de grande significacao Para a estrutura do dominio. Na verdade, os tipos puros raramente se encontram, na reali- dade. Mas hoje no podemos tratar de variantes, transigdes e combinagdes altamente com- plexas desses tipos puros, cujos problemas pertencem “ciéncia politica”. Interessamo-nos, aqui, principalmente pelo segundo desses tipos: dominio em virtude da dedicagio, dos que ‘obedecem, ac clusivamente pessoal do “lider”. PoiS @8a€ a raiz de uma voca- do em sua expressio mais elevada fede fe sleet ois Ta de pesca may ages 0 Liddy cansanabee ,o Aen istlo co “ra sla yoco cae Sener aE aRSORrE EEE DELL SE TE IEEETEEECE ELISE TECEr eS SCE Er TauaraCeCESETEIaaaTS p Parana phy ’ - oe ee ante 8 witap artis £ APOMTICA SOMO VOCACR TT ND. come Dbinuanle mt Cater WM] wr ogtranione TOR D eA ‘A dedicagao ao carisma do profeta, ou ao lider na guerra, ou 20 grande demagogo na ecclesia ou no parlamento, significa que o lider € pessoalmente reconhecide como o lider inerentemente “chamado” dos homens. Os homens ndo_o obedecem em virtude da tradi- «to ou lei, mas porque acreditam nele. Quando é mais do que um oportunista limitaclo € presungoso, 0 lider vive para sua causa ¢ “luta pela sua obra”.! A dedicacao de seus pulos, seus seguidores, seus amigos pessoais do partido ¢ orientada para a sua pessoa € para suas qualidades. 'A lideranca carismatica surgiu em todos 0s lugares € em todas as Epocas hist6ricas. Mais destacadamente no passado, surgiuy nas duas figuras do magico e profeta, de um lado, € do senhor de guerra eleito, o lider de grupo € condottiere, do outro. A lideran¢a politica, na forma do “demagogo" livre que nasceu no solo da cidade-Fstado, € de maior interesse para nds. Como a cidade-Estado, o demagogo € peculiar ao Oriente, especialmente a cultura meditertinica. Além disso, a lideranca politica na forma do “lider partidério” parlamentar cresceu no solo do Estado constitucional, que também sé € indigena do Ocidente. Esses politicos de “vacacao", no sentido mais auténtico da palavra, s4o_em toda parte as |/ lt ‘Os meios auxi- // ‘inicas figumas decisivas nas comentes cruzadas da | pelo p liares & sua disposigao também sio altamente decisivos. Como_os. poderes politicamente don conseguem manter scu dominio? A questio é valida para qualquer tipo de dominio, portanto também para o dominio“politico em todas as suas formas, tradicionais, legais e carismaticas, ‘© dominio organizado, que demanda a administracao continua, exige que a conduta humana seja condicionada a obediéncia para com os senhores que pretendem ser os porta- dores do poder legitimo. Por outro lado, em virtude da obedliéncia, 0 dominio organizado exige 0 controle dos bens materiais que em determinado caso slo necess ios para 0 uso da violencia fisica. Assim, 0 dominio organizado exige © controle do quadro de pessoal executivo € os implementos materiais da administracdo. ‘© quadro administrative, que representa extemamente a organizacio do dominio politi co, é, certamente, como qualquer outta organizacio, limitado pela obediéncia 20 detentor do poder e nao apenas pelo conceito de legitimidade, do qual falamos acima. Ha dois Quiros meios atraentes para os interesses pessoais: a recompensa material ¢ a honraria cecal Os feudos de um vassalo, as prebendas das autoridades patrimoniais, os salrios Jos modernos servidores piiblicos, a honra dos cavaleiros, os privilégios dos estados ¢ a honra do servidor piiblico compreendem seus respectivos proventos. O temor de perdé-los € a base final ¢ decisiva para a solidariedade existente entre 0 quadro executivo € 0 detentor do poder. Ha honra € pilhagem para os seguidores, na guerra; para o séquito do dlemago- g0, ha os “despojos” — ou seja, a exploracio dos dominados, através do monopolio dos car- 0s — ¢ hé lucros e prémios 8 vaidade, politicamente determinados. Todas essas recompen- sas sao também derivadas do dominio exercido peto lider carismatico. Para manter um dominio pela forca sao necessérios certos bens mater re com uma organizagao econdmica, Todos os Estados podem ser clasificados segundo o fato de se basearem no principio de que os pr6 Figs quadros sao_donos dos_meios admi-* ristrativos, ou de que os quadros sio “separados” desses meios de administracao. Essa dis-2 tingao € vill la no mesmo sentido em que dizemos hoje que o empregado assalariado @ 0 proletirio na empresa capitalista estao “separados’ dos meios materiais de producto. O fetentor do poder deve ser capaz de contar com a obediéncia dos membros do quadro, ‘autoridades, ou quem quer que seja. Os meios administrativos podem consistir em dinhei- to, edificios, material bélico, veiculos, cavalos € muitas outras coisas. Tudo depende de o detentor do poder dirigir e organizar, ou nao, a administracao, embora delegando poder executive a servidores pessoais, autoridades contratadas, ou favoritos e pessoas de confian- pads [0 adm a aki fog ednriee ob » aperat , tal Como ocor PE Lene ghey satiny 2 Aire speed An we ee et 58 ENSAIOS DE socioLOGIA fa, que no sio os donos, isto é, que no usam os meios materiais de administragao ao seu talante, mas sio dirigidos pelo senhor. A distingo é observada em todas as organizagoes administrativas do passado. Essas associagdes politicas nas quais os meigs_materiais de administraio sio controlados io. controlac autonomamente, no todo ou em parte, pelo quadro administrativo dependente, poder ser chamadas associacdes organizadas em ‘estamentos”. O vassalo na associagio feudal, por exemplo, pagava do seu préprio bolso @ administragio e judicatura do distrito que Ihe era entregue como feudo. Ele proprio fomecia seu equipamento e provisées de guerras, € 0 mesmo faziam seus subvassalos. E claro que isto tinha conseqiiéncias para © poderio do senhor, que s6 se baseava numa relacdo de f pessoal ¢ no fato de que a legitimidade de sua possessio do feudo € a honra social do vassalo eram derivadas do senhor geral Em toda parte, porém, remontando até as mais antigas formag6es politicas, encontramos também o préprio senhor dirigindo a administracio. Ele busca tomd-la em suas maos tor- nando os homens pessoalmente dependentes dele: escravos, agregados domésticos, aten- dentes, “favoritos” pessoais e prebendarios enfeudados em dinheiro ou in natura aos seus armazéns. Busca cobrir as despesas com seus prdprios recursos, com a receita de seu patri- ménio; e busca criar um exército que seja dependente dele pessoalmente, porque é equi- pado e abastecido de seus celeiros, armazéns e arsenais. Na associ cao dos “estamentos”, 0 senhor domina com a ajuda de uma “aristocracia” auténoma e, portanto com ela divide seu dominio. © senhor que administra pessoalmente € apoiado seja pelos membros de sua Casa ou pelos plebeus. Estes so camadas sem propriedades que ndo tém honra social pr6- pra; materialmente, estio completamente presos a ele e nao encontram apoio em nenhum: poder rival préprio. Todas as formas de dominio patriarcal e patrimonial, despotismo sulta- nista € estados burocriticos pertencem a esse titimo tipo. A ordem estatal bucactitica € especialmente importante: em seu aspecto mais racional, ela € precisamente caracteristica do Estada modemo. Em toda parte, 0 desenvolvimento do Estado mademo é iniciado através da _acio do Principe. Fle abre o caminho para a expropnagio dos portadores autSnomos & “pivados" fo pader executive que estio ao seu lado, daqueles que possuem meios de adminisiracto Préprios, meios de guerra e organizag3o financeira, assim como os bens politicamente usiveis de todos os tipos. A totalidade do processo € um paralelo completo ao desenvolvi- mento_da empresa capitalista através da expropriagio gradativa dos produtores indepen- dentes. Por fim, o Estado moderno controla os meios totais de organizacio politica, que na realidade se agrupam sob um chefe tnico. Nenhuma autoridade isolada possui,, pes- soalmente, © dinheiro que paga, ou os edificios, armazéns, ferramentas e maquinas de guerra que controla. No “Estado” contemporaneo - e isso € essencial a0 conceito de Estado — a “separacdo” entre © quadro administrativo, os funcionsirios administrativos e os ibalbadares, em relacio aos meios materia taba meios materiais de organizacao adi iva, € complet Aqui comeca a maior parte da evolucio moderna e vemos com nossos proprios olhosa tentativa de estabelecer a expropriacio desse expropriador dos meios politicos e, portanto, do poder politico, A revolugao [da Alemanha, 1918] realizou, pelo menos na medida em que os lideres tomaram o lugar das autoridades estatuidas, isto: os lideres, pela usurpacao ou eleicio, con- seguiram o controle do quadro politico e do aparato dos bens materiais; e deduzem sua legitimidade ~ nao impona com que direito ~ da vontade dos governados. Se os Iideres, 2 base deste Exito pelo menos evidente, tém o direito de manter a esperanca de realizar tam- bém a expropriagio dentro das empresas capitalistas € questio diferente. A diregio das empresas capitalistas, apesar de analogias de grande alcance, segue leis diferentes das leis de administragao politica. A POLITICA COMO VocAcAo 59 Nao tomamos posicao, aqui, sobre essa questio. Descrevo apenas 0 aspecto puramente conceptual de nossa consideragao: 0 Estado modemo é uma associacdo compulséria que organiza a dominagio. Teve éxito a0 buscar monopolizar 0 uso legitimo da forga Fisica co- mo méO de dominio dentro de um territ6rio. Com essa finalidade, o Estado combinou os meios materiais de organizagio nas maos de seus lideres, ¢ expropriou todos os funciond: rios aut6nomos dos estamentos, que antes controlavam esses meios por direito préprio. O Estado tomou-lhes as posigdes € agora se coloca no lugar mais elevado. Durante esse processo de expropriagao politica, ocorrido com variado éxito em todos os paises da Terra, surgiram os “politicos profissionais”, noutro sentido. Apareceram primeiro a servico de um principe. Eram homens que, ao contrario do lider carismético, nao queriam ser senhores, mas que se colocavam a servigo dos senhores politicos. Na luta da expropria- ‘Go, eles se colocavam & disposic3o dos principes e, administrando-Ihes as politicas, ganha- vam, de um lado, a vida e, do outro, um contetido de vida ideal. E, ainda nesse caso, somente no Ocidente encontramos esse tipo de politico profissional a servigo de outros poderes além do principe. No pasado, foram o mais importante instrumento do poder do principe e seu instrumento de expropriagio politica Antes de discutirmos os “politicos profissionais” em detalhe, vamos esclarecer em todos os seus aspectos 0 estado de coisas apresentado pela sua existéncia. A politica, tal como as ini- ciativas econémicas, pode ser uma ocupagio subsididria ou uma vocagio. © homem pode dedicar-se & politica, e portanto buscar influir na distribuig3o do poder dentro de estruturas politicas € entre elas, como um politico “ocasional”. Somos todos politicos “ocasionais quando votamos ou consumamos uma expresso de intengio semelhante, como aplaudir ou protestar num comicio “politico”, ou ao pronunciar um discurso “politico”, etc. Toda a rela- a0 de muitas pessoas para com a politica se limita a isso. A politica como atividade secun- daria € praticada hoje por todos os agentes partidarios e chefes de associagdes politicas voluntirias que, em geral, s6 sio politicamente atuantes no caso de necessidade e para quem a politica nao €, material ou idealmente, “sua vida", em primeito lugar. OQ mesmo se aplica aos membros dos conselhos estatais Orgios deliberativos semelhantes que funcio- nam apenas quando convocados. Também se aplica a camadas bastante amplas dos parla- mentares que S6 s20 politic es. No passado, encontravam-se essa '§ proprietirios dos implementos milita camadas especialmente ent res, ou de bens importantes para a administragio, ou de prerrogativas pessoais, podem ser chamados “estamentos”. Uma grande parte deles estava longe de dedicar a vida, no todo ou de forma simplesmente preferencial, ou mais do que ocasionalmente, ao servigo da politica. Eles exploravam, antes, suas prerrogativas com o interesse de obter uma renda ou mesmo um lucto; € $6 se tornavam ativos no servico das associagées politicas quando o senhor dos que Ihes eram iguais em status assim 0 exigia, Nao havia diferenga no caso de alguma das forcas auxiliares que o principe langava na luta pela criagio de uma organizagio politica que ficasse exclusivamente sua disposicfo. Foi essa a natureza dos Rite von Haus aus {conse- Iheiros) e, ainda mais remotamente, de parte considerdvel de conselheiros que se reuniam na Curia e outros Grgios deliberativos dos principes. Mas essas forgas meramente ocasionais, empenhadas na politica, no eram naturalmente suficientes ao principe. Ele buscava, neces- sariamente, criar um quadro de colaboradores dedicados, total ¢ exclusivamente, a seu servi- G0; dai, a fazer disso sua principal vocacio. A estrutura da nascente organizagao politica Gindstica, e ndo apenas isso, mas também toda a articulacao da cultura, dependia, em pro- porgdes consideriveis, do problema de onde o principe recrutava agentes. Era necessiirio também um quadro para as associagdes politicas cujos membros se consti- tuiam em comunas politicamente “livres” (assim ditas) sob a aboli¢ao completa, ou a restri- ao bastante acentuada, do poder principesco. 60 ENSAIOs DE SoctOLOGtA a aa saeco rere me eer Eram “livres” ndio no sentido modemo de liberdade em relaco 20 dominio pela forga, mas no sentido de que o poder do principe legitimado pela tradigao (na maioria dos casos, santificado religiosamente) como fonte exclusiva de toda autoridade estava ausente. Essas comunidades tém sua sede hist6rica no Ocidente. Seu niicleo foi a cidade como érgio pol tico, a forma pela qual a cidade surgiu primeiro na 4rea cultural mediterranica. Em todos esses casos, como eram os politicos que fizeram da politica a sua principal vocagao? _() Ha dois modos principais pelos quais alguém pode fazer da politica a sua vocacao> viver “para’-a politica, of duce “da politica Esse contraste nao é, de forma alguma, exclusivo. Em geral, o homem faz as duas coisas, pelo menos em pensamento e, certamente, também a ambas na pritica. Quem vive “para” a politica faz dela a sua vida, num sentido interior. Desfruta a posse pura € simples do poder que exerce, ou alimenta seu equilibrio inuerios, seu sentimento intimo, pela consciéncia de que sua vida tem sentido a servigo de_uma “cat Nesse sentido intemo, todo homem sincero que vive para uma causa também vive dessa causa. A distinc2o, no caso, refere-se a um aspecto muito mais substancial da questio, ou se- ja, 0 econ6mico. Quem luta para fazer da politica uma fonte de renda permanente, vive “da” Politica como vocag4o, ao passo que quem nao age assim vive “para” a politica. Sob o domi- nio da ordem da propriedade privada, algumas — se quiserem — precondigdes muito triviais devem existir, para que uma pessoa possa viver “para” a politica, nesse sentido econémico. Em condigées nonnais, 0 politico deve ser economicamente independente da renda que a politica Ihe pode proporcionar. Isto significa, muito simplesmente, que o politico deve ser ri- co ou deve ter uma posi¢ao pessoal na vida que Ihe proporcione uma renda suficiente. Isso ocorre pelo menos em circunstancias normais. O séquito do senhor de guerra preo- cupa-se to pouco com as condigdes de uma economia normal quanto a multidao das ruas que segue 0 heréi revolucionario. Ambos vivem dos espélios, do saque, dos confiscos, contribuicdes a imposigZio de meio circulante vil e compulsério, o que em esséncia equi- vale 4 mesma coisa. Mas, necessariamente, tais fendmenos sao extraordinarios. Na vida eco- némica cotidiana, somente a riqueza pode tomar. homem eonomicamente independen- Mas isso apenas nao basta. O politico profissional deve ser também economicamente dispensavel’, isto €, sua renda nao deve depender do fato de que ele coloca, constante € pessoalmente, sua capacidade e pensamento totalmente, ou pelo menos predominante- mente, a servico da aquisicao econémica. Da forma mais incondicional, o homem que vive de sendimentos € dispensivel nesse sentido. Portanto, ele é 0 homem que recebe uma ren- da para a qual nao trabalhou. Pode ser o senhor territorial do passado ou o grande dono de tens ¢ aristocrata do presente, que recebe renda delas. Na Antigiidade e na Idade Média os que recebiam rendas dos escravos ou servos, ou. nos tempos modernos, rendas de ages ou titulos ou fontes semelhantes — so essas as pessoas que vivem de rendas. Nem o trabalhador nem_o empresirio ~ € isso deve ser bem notado — especialmente o empresirio modemo, de grande escala, € economicamente dispensavel, nesse sentido. Pois € precisamente © empresirio que esta ligado 2 sua empresa, sendo por isso indispensavel. Isso se aplica ao empresério na incistria, muito mais do que na agricultura, considerando © cariter sazonal desta, Em geral, € muito dificil a0 empresdrio ser representado em sua ‘empresa por alguma outra pessoa, mesmo temporariamente. Ele é Go indispensével quanto ‘© médico, e quanto mais destacado e ocupado for, tanto menos dispensavel serd. Por moti- vos puramente orginicos, é facil a0 advogado ser dispensivel, €, apesar disso, ele tem desempenhado um papel incomparavelmente maior, € com frequéncia mesmo dominante, como politico profissional. Nao continuaremos nesta classificagao; preferimos esclarecer algumas de suas ramificagdes. A lideranga de um Estado ou de um partido por homens que (no sentido econémico da palavra) vivem exclusivamente para a politica, € nao da politica, significa necessariamente Vem Eghede eve gue m potben vist paca Be 464 Atee ¥~ olives melvin ek pelt Tel polilira pach ate byetaneas ss ‘A pouitiea’Como Vocacao él ae swase Wier gr eT ‘um recrutamento “plutocritico” das principais camadas politicas. Na vercacle, isto ndo quer dizer que essa lideranca plutocritica significa, a0 mesmo tempo, que as camaclas politica- mente dominantes nao buscaram também viver “da” politica ¢ portanto que a camacka domi- ante nao explorari, habitualmente, seu dominio politico em favor de seu proprio interesse econdmico. Tudo isso ¢ indiscutivel, naturalmente. Jamais houve uma camada que nao tives- se, de alguma forma, vivido “da” politica. Queremos dizer apenas que o politico profissional nio precisa buscar uma remuneraco direta pelo trabalho politico, ao passo que todo politi- co sem meios deve, absolutamente, pretender essa remuneragao. Por outro lado, nao preten- demos dizer que © politico sem propriedades buscaré vantagens econmicas privadas atra- vés da politica, exclusivamente, ou mesmo predominantemente. Nem pretencemos dizer gue ele nao pensar, em primeiro lugar, “no problema”. Nada seria mais incorreto, Segundo toda a experiencia, 0 zelo pela “seguranca” econOmica de sua existéncia € consciente, ou inconscientemente, um ponto capital em toda a orientagio de vida do homem rico. O idea- lismo politico descuidado e sem reservas s6 se encontra, se nao exchusivamente pelo menos predominantemente, entre as camadas que, em virtude de sua caréncia de propriedades, es- Go completamente fora dos circulos interessados na manutencao da orem econdmica de uma determinada sociedade. Isso € vilido especialmente para as épocas extraordindrias e, portanto, revoluciondrias. Um recrutamento nio-plutocritico de politicos interessados, de lideranga e seguidores, est conjugado com a precondig2o subentendida de que uma renda regular e suficiente serd proporcionada aos que se ocupam da politica. ‘A politica pode ser conduzida “honorificamente” e portanto — como se diz habitualmente = por homens “independentes’, isto , ricos, e especialmente_pelos que vivem de rendas. 0u a lideranga politica pode ser acessivel 20s homens sem proprieddes, que necessitam de uma recompensa, © politica profissional que vive “da” politica pode _ser um “funciond- rio” exclusivamente “prebendario” ou assalariado. Nesse caso, 0 politico recebe uma renda seja de taxas e tributos sobre servigos especificos ~ gorjetas e subornos sao apenas uma variagao imegular € formalmente ilegal dessa categoria de renda — ou uma renda fixa em natureza, um salario monetrio, ou ambos. Pode assumir o cariter de um “empresirio”, co- mo 0 condottiere ou © portador de uma autorizagio para recolher impostos ou um cargo comprado, ou como o politico americano que considera seus custos como um investimento de capital que ele faz render através da exploragao de sua influéncia, Pode também receber um salirio fixo, como um jomalista, secretario de partido ou ministro de um Gabinete modero, ou autoridade politica, As concessdes feudais, as concessdes de terras e preben- das de todos os tipos foram clissicos, no passado. Com o desenvolvimento da economia monetiria, os requisitos preliminares € prebendas tommam-se, especialmente, as recompen- sas tipicas para 0 apoio aos principes, conquistadores vitoriosos ou chefes partickirios bem- sucedidos. Em troca de servigos leais, hoje, os lideres partidarios distribuem cargos de to- dos os tipos ~ nos partidos, jomnais, sociedades cooperativas, companhias de seguros, muni- cipalidades, bem como no Estado. Todas as lutas partidarias sdo lutas para o controle de, cargos, bem come lutas para metas cbjetivas. é Na Alemanha, todas as lutas entre os proponentes do Governo central ¢ local se centrali- zam na questao dos poderes que controlario os cargos, quer em Berlim, Munique, Karlsruhe ou Dresden. As restricbes na participagao da distribuicao de cargos sio mais érias para os partidos do que qualquer aco contra suas metas objetivas. Na Franga, 3 substituigio de prefeito em conseqiléncia da politica partidéria sempre foi considerada co- mo uma transformagio maior e sempre causou maiores protestos do que a modificactio do, programa governamental — que tem quase que a significacao de um mero palavrdrio. Alguns partidos, especialmente na América, desde o desaparecimento dos velhos conflitos sobre a interpretacao da constituigao, transformaram-se em simples partidos para o controle oot a al, wae eden te Arid de 62 __ENSAIOS DF socIOLOG: de cargos, distribuindo empregos e modificando seu programa material segundo as oportu- nidades de conseguir votos. Na Espanha, até recentemente, os dois grandes partidos, de uma forma convencional- mente fixa, se substitufam no poder através de “eleigdes” fabricadas na cipula, a fim de proporcionar cargos aos seus seguidores. Nos territ6rios coloniais espanhéis, nas chamadas “eleicdes”, bem como nas chamadas “tevolugdes", o que estava em jogo era sempre 0 cesto de pao do Govemo do qual os vencedores se queriam alimentar. Suiga, 08 partidos dividiram pacificamente os cargos entre si, proporcionalmente, € alguns das nossos esbogos constitucionais “revolucionarios", por exemplo © primeiro esbo- go da constituigéo badeniana, tentaram estender esse sistema até os postos ministeriais. Assim, 0 Estado © 05 cargos estatais eram considerados como simples instituigdes para a divisio em despojos. © Partido Catélico do Centro foi quem se mostrou mais entusiasmado com esse projeto. Na Badénia, o partido, como elemento de sua plataforma politica, tomou a distribuigao de cargos proporcional as crengas religiosas e, portanto, sem qualquer relacdo com 0 mérito. Essa tendéncia toma-se mais forte para todos os partidos quando o ntimero de cargos aumenta em conseqiiéncia da burocratizagao geral e quando a exigéncia de cargos aumen- ‘a porque representam um meio de vida especificamente seguro. Para seus adeptos, os par- tidos se tornam cada vez mais um meio para alcangar o fim de ser beneficiado dessa maneira, ‘A evolugio do funcionalismo moderno no sentido de se tomar uma forca de trabalho profissional e altamente especializada, através de longos anos de treinamento preparatorio, ‘opde-se a essa situagao. A burocracia_ moderna, no interesse da integridade, desenvolveu um elevado senso de honra estamental, sem 0 qual haveria fatalmente o perigo de uma comupeao terrivel e de um vulgar espirito interesseiro, E, sem essa integridade, até mesmo as fungdes puramente técnicas do aparato estatal seriam postas em risco. A significagao do aparato estatal para a economia vem 2umentando, especialmente com a crescente socializ Ao, € sua significagao aumentard ainda mais. Nos Estados Unidos, a administrac3o amadoristica, através de politicos rapaces, de acordo com o resultado das eleigdes presidenciais, teve como conseqiiéncia a substitui- ao de centenas de milhares de funciondrios, incluindo até um simples carteiro. A admi- nistragio nada sabia do servidor ptiblico profissional, que a isso dedica a sua vida; nao ‘obstante, essa administracao amadoristica foi, hd muito, limitada pela Reforma do Servico Pablico. As necessidades puramente técnicas, incontestaveis, da administragao determina- ram tal evolugio. Na Europa, 0 funcionalismo especializado, baseado na divisio do trabalho, surgiu numa evolugao gradativa de meio milhar de anos. As cidades italianas e senhorias foram.o inicio, entre as monarquias, € os estamentos dos conquistadores normandos. © passo decisivo, porém, foi dado em relagio 4 administragio das finanas do_principe. Com as reformas administrativas do Imperador Max, podemos ver como foi dificil para os servidores depor com éxito o principe, nesse setor, mesmo sob a pressio da emergéncia extrema e do domi- nio turco, A esfera das finangas era a que menos podia tolerar o diletantismo de um gover- nante ~ que, haquela €poca, era acima de tudo um cavaleiro. O desenvolvimento da técni- ca guerreira exigiu © perito € 0 oficial especializado. Nessas trés dreas — financas, guerra e direito ~ os servidores especializados nos Estados mais adiantados triunfavam claramente durante o século XVI. Com a ascendéncia do absolutismo do principe sobre os estamentos, houve simulaneamente uma abdicagao gradativa do seu Governo autocritico em favor de um corpo de servidores especializados. Esses funciondrios apenas facilitaram a vit6ria do Principe sobre os estamentos A POLITICA COMO VOCAGAO 63 © aparecimento dos “politicos destacados” se fez juntamente com a ascendéncia de um funcionalismo especializado, embora em transigoes muito menos perceptiveis. E claro que esses conselheiros realmente decisivos dos principes existiram em todas as épocas € em to- do o mundo. No Oriente, a necessidade de afastar do Sultao a responsabilidade pessoal pe- lo éxito do Governo criou a figura tipica do “Grio-Vizir’. No Ocidente, influenciada princi- palmente pelos relatorios dos legados venezianos, a diplomacia tornou-se a principio uma arte cultivada conscientemente na época de Carlos V, no tempo de Maquiavel. Os relatos dos legados venezianos eram lidos com zelo apaixonado nos circulos diplom lizados. Os adeptos dessa arte, que eram em geral educados humanisticamente, tratavam-se como iniciados treinados, semelhantes aos estadistas humanistas chineses no tiltimo perio- do dos estamentos belicosos. A necessidade de uma direcao formalmente unificada de toda politica, inclusive dos assuntos intemos, por um estadista principal, s6 surgiu de forma fi- a.com a evolugio constitucional. E claro que personalidades individuais, como os conselheiros dos principes, ou antes, na verdade, os lideres, haviam existido repetida- mente antes disso. Mas a organizacao de agéncias administrativas mesmo nos Estados mais adiantados seguiu primeiramente outros caminhos. Surgiram_as_agéncias administrativas colegiadas de cipula. Em teoria, e em proporgdes gradativamente decrescentes, na verda- de, elas se reuniam sob a presidéncia pessoal do principe, que tomava as decisdes. Esse istema colegiado levou as exposices de motivos, contra-exposigdes € ao voto racional da maioria e da minoria. Além dos funciondrios ¢ das autoridades mais elevadas, 0 principe cercava-se de pessoas de confianga puramente pessoal — 0 “Gabinete” - € através delas tomava suas decisdes, depois de examinar as resolugdes do conselho estatal, ou qualquer outro nome que tivesse a mais alta agéncia estatal. O principe, colocando-se cada vez mais na posi¢ao do diletante, buscava livrar-se do peso, nécessariamente crescente, dos servido- res especializados, usando para isso 0 sistema colegiado ¢ o Gabinete. Buscava conservar a lideranga em nivel mais elevado. Essa luta latente entre 0 funcionalismo especializado © 0 Governo autocratico existiu sempre. A situaco s6 se modificou frente aos_parlamentos ¢ as aspiragdes de poder dos lideres partidarios. Condigdes muito diferentes levaram a resultado, externamente idéntico, embora, na verdade, com algumas diferencas. Sempre que as din: tias conservavam o poder pritico nas suas maos ~ como ocorteu especialmente na Alemanha ~ 0s interesses do principe associavam-se aos interesses do funcionalismo contra o.parlamento e suas aspiragdes de poder. Os funcionirios interessavam-se também pelas posigdes de destaque, ou seja, postos ministeriais, fazendo delas um objetivo da carreira oficial. © monarca, por sua vez, interessava-se em poder nomear os ministros entre oS ser- vidores dedicados, 2 sua discri¢io. Ambos os grupos, porém, queriam ver a lideranca politi ca enfrentar o parlamento de modo unido e solidatio , dai, ver 0 sistema colegiado substi- tuido por um tinico chefe do Gabinete. Além disso, a fim de ser afastado, de modo exclu: ues pantidarios, o monarca necessitava de uma pessoa que o protegesse € assumisse a responsabilidade, ou seja, que respondesse 20 parlamento € negociasse com os partidos. Todos esses interesses funcionaram juntos € na mesma diregio: surgi um ministro para dirigir a esfera oficial de modo unificado. Quando o parlaménto predominou sobre o monarca — como na Inglaterra — 0 desenvol- vimento do poder parlamentar agiu ainda mais fortemente na direcio de uma unificagao do aparato estatal. Na Inglaterra, o “Gabinete”, tendo como “lider” o chefe do parlamento, desenvolveu-se como um_comité do partido que controla a maioria. Esse poder partidario era ignorado oficialmente, mas na verdade somente ele era politicamente decisivo. Os 6rghos colegiados oficiais, como tal, nio eram Srgios do poder dominante, 0 partido, € portanto nao poderiam ser os depositirios do verdadeiro Govemo. O partido dominante exigia uma organizacio sempre pronta, composta apenas de seus homens principais, que 64 ENSAION DE SOCIOLOGIA discutiriam confidencialmente as questdes a fim de manterem o poder entre si e serem ‘apazes de se dedicar a grande politica, fora do grupo. O Gabinete € simplesmente essa organizagao, Em sua relagio com o ptiblico, porém, especialmente 0 publico parlamentar, © partido precisava de um lider responsavel por todas as decisdes — 0 chefe do Gabinete. O. sistema inglés foi levado para o continente europeu na forma de ministérios parlamentares. Somente na América e nas democracias por ela influenciadas, um sistema bastante hetero- géneo foi contraposto a este. O sistema americano coloca o lider do partido vitorioso, eleito direta ¢ popularmente, na chefia do aparato de servidores por ele nomeados e $60 toma dependente do consentimento do “parlamento” em questdes orgamentirias e legislativas. O desenvolvimento da politica numa organizagao que exigia o treinamento na luta pelo poder, € nos métodos dessa luta, tal como o desenvolveram os modemos partidos politi- cos, determinou a separagio dos funciondrios publicos em duas categorias que, porém, nao sao rigidamente separadas, embora sejam distintas. Essas categorias so os’ funciona- rios ‘administrativos”, de um lado, e o$funcionarios “politicos”, de outro. Estes, no verda- deiro sentido da palavra, “politicos”, podem ser reconhecidos regular e extremamente pelo fato de poderem ser transferidos a qualquer momento, de serem demissiveis ou pelo menos afastados temporariamente. Sao como os prefeitos franceses ¢ funcionarios equiva- lentes de outros paises, ¢ isso contrasta agudamente com a “independéncia” dos funciond- rios com atribuigdes judiciais. Na Inglaterra, os funcionarios que, segundo convencao fixa, se afastam do cargo quando ha uma modificagao na maioria parlamentar, e dai uma modi- ficag’io no Gabinete, pertencem a esta categoria. HA entre eles, habitualmente, alguns cuja competéncia inclui o controle da “administracao interna” geral. O elemento politico consis- te, acima de tudo, na tarefa de manter a “lei e a ordem” no pais, e, portanto, da manuten- gao das relagdes de poder existentes. Na Prussia esses funciondrios, de acordo com o decreto dle Puttkamer ¢ a fim de evitar a censura, eram obrigados a “representar a politica do Governo”. E como os prefeitos da Franca, eles eram usados como um aparato oficial para influir nas eleicdes. A maioria dos funciondrios “politicos” do sistema alemao - em contraste com outros paises — eram igualmente limitados no que se refere ao acesso aos Postos que exigiam uma educacio universitaria, exames especiais e servigo preparatorio especial. Na Alemanha, somente os chefes lo aparato politico, os ministros, carecem dessa caracteristica especifica do servigo piblico modemo. Mesmo sob o regime antigo, era pos- sivel ser Ministro da Educagio da Prissia sem ter freqiientado jamais qualquer instituicao de ensino superior, mas s6 se podia ser Vortragender Rat” 4 base de um exame determi- nado. Os Dezement e Vortragender Rat especializados e treinados eram, € claro, muito melhor informados sobre os verdadeiros problemas técnicos da divisio do que seu chefe ~ por exemplo, Althoff, no Ministério da Educagao prussiano. Nao era diferente na Inglaterra, Assim, em todas as exigéncias rotineiras 0 chefe de divisio era mais poderoso do que 0 ministro, 0 que se justificava. O ministro era simplesmente o representante da constelagdo de poder politico; tinha de representar os poderosos quadros politicos ¢ tinha de analisar as propostas de seus funciondrios especializados, subordinados, ou dar-lhes a orientagio de natureza politica Afinal de contas, as coisas sto muito semelhantes numa empresa econémica privada: 0 verdadeiro “soberano” as assemibléias dé acionistas, influi to pouco na administracao quan- to_um “povo” govemado pelos funcionérios especializados. E as pessoas que decidem a politica da Empresa, a “diretoria” controlada pelo banco, dao apenas a orientagio econdmica € selecionam as pessoas para a administragio, sem serem, elas mesmas, capazes de ditigit tecnicamente a empresa. Assim, a presente estrutura do Estado revolucionario nao encerra nada de novo, em principio. Coloca o controle da administragio nas maos de diletantes absolutos que, em virtude do seu controle das metalhadoras, preferem usar os funcionsrios 9 preliss vitor s Mews tre eve penedec iva st nets. Cima (y cena Joe especializados apenas como chefes auxiliares executivos. As dificuldades do presente siste- ma estio em outros aspectos, mas essas dificuldades nao nos interessam, aqui, Vamos exa- minar, antes, a peculiaridade tipica dos politicos profissionais, clos “lideres’ bem como de seus seguidores. Sua natureza modificou-se € hoje varia muito, de um caso para outro. Vimos que no pasado os “politicos profissionais” se desenvolveram através da luta dos principes com os estamentos € que serviram aos principes. Vamos examinar rapidamente 0s principais tipos cesses politicos profissionais, Enfrentando os estamentos, 0 principe encontrou apoio nas camadas politicamente exploriveis, fora da ordem dos estamentos. Entre estas estavam, primeiro, 0 clero das Indias Ocidentais e Orientais, na China budista e no Japio, na Mong6lia lamaista, tal como nos tertit6rios cristios da Idade Média. © clero era tecnicamente ttil porque era alfabetiza- do. A importacao dos brimanes, sacerdotes politicos, lamas ¢ 0 emprego de bispos e padres como conselheiros politicos ocorreram com o objetivo de obter forcas administra vas que soubessem ler e escrever € pudessem ser usadas na luta do imperador, principe ou A, contra a aristocracia. Ao contritio do vassalo que enfrentava o senhor geral, 0 clero, especialmente o celibatario, estava fora da maquina dos interesses politicos € econ era tentado pela luta pelo poder politico, para si ou seus descendentes. Em_virtu seu_prdprio status, o clero estava “separado” dos implementos controladores da administra- io do principe Os literatos de educagio humanista compreendem a segunda dessas camada uma €poGrem que se aprendia a escrever discursos latinos € versos gregos para se poder ser conselheiro politico de um principe e, principalmente, para ser memorialista. Foi a €poca do priméir6 florescimento das escolas humanistas e das fundagdes principescas para professores de “poética’, Para nés, foi uma época transitéria, que teve influéncia bastante persistente em nosso sistema educacional, sem maiores resultados politicos, porém, No Leste da Asia, foi diferente. O mandarim chinés é, ou antes foi originalmente, quase 0 mes- mo que © humanista de nosso periodo da Renascenga: um letrado treinado humanistica- mente € testado nos monumentos lingiisticos do passado remoto. Quando lemos os disrios de Li Hung Chang vemos que seus maiores motivos de orgulho so seus poemas e o fato de ser um bom caligrafo. Esta camada, com suas convencdes desenvolvidas e modeladas pela Antigilidade chinesa, determinou todo o destino da China; € talvez nosso destino tives- se sido semelhante se os humanistas, em sua época, tivessem a menor possibilidade de conseguir influéncia semelhante. A terceira camada era a nobreza costes’. Depois que os principes conseguicam expropriar © poder politico da nobre uM estamento, atrafram os nobtes para a conte € Os U: ram em seu servico politico e diplomitico. A transformacio de nosso sistema educacional no século XVII foi, em parte, determinada pelo fato de terem os nobres da corte, como politicos profissionais, substituido os literatos humanistas e ingressadlo no servigo dos principes. A quarta categoria foi uma instituic2o especificamente. inglesa. Uma camada patricia desenvolveu-se ali, compreendida pela pequena_nabreza ¢ pelos que viviam de_rendas: sio chamados, tecnicamente, de “gentis-homens”. Essa classe inglesa representa uma camada que © principe atraia originalmente a fim de neutralizar os bardes. O principe colocava a camada na posse dos cargos de “Governo auténomo’, € mais tarde ele proprio passou 2 depender cada vez mais deles. Os gentis-homens mantinham a posse dle toclos ‘0s cargos da.administracio local, assumindo-os sem vantagens, no interesse de seu pro- prio poder social. Os gentis-homens salvaram a Inglaterra da burocratizacao que foi o des- tino de todos os Estados continentais. ‘Uma quinta camada, o jurista de formacao universititia, € peculiar ao Ocidente, especial- mente a0 continente europeu, € foi de significago decisiva para a esirutura politica do con- Houve ae cal pare g a pah am ey FO oa ms rede od Dea eee tinente. O tremendo efeito posterior do Direito Romano, transformado pelo Estado burocté. tico romano do periodo final, destaca-se principalmente pelo fato de que em toda parte a revolugao da administracao pol asf nals idos. Isso ocorreu também na Inglaterra, embora ali as grandes corporagdes nacio- le juristas tivessem dificultado a recepglo do Direito Romano. Nao ha analogia com € proceso em nenhuma Area do mundo. Todo 0 inicio do pensamento juridico racional da Escola Indiana de Mimamsa e todo o Cultivo, posterior, do pensamento juridico antigo no Isla foram incapazes de impedir que a hocao do Direito racional fosse superada pelas formas teolégicas de pensamento. Acima de tudo, © processo legal nao foi plenamente racionalizado nos casos da India e do Istamismo. Essa racionalizacao foi provocada no continente europeu apenas através do uso da velha jurispmudéncia romana pelos juristas italianos. A jurisprudéncia romana € 0 produto dé uma estrutura politica que surge da cidade-Estado para aleancar dominio mundial — um produto de natureza excepcional. O usus modemus dos tiltimos pandectistas € canonistas medievais fundiu-se as teorias do direito natural, nascida do pensamento juridico e cristo, mais tarde secularizado. Esse racionalisma juridico, teve seus grandes representantes entre a podesti italiana, os juristas criminais, na Franca (que criaram os meios formais de solapar o dominio dos seigneurs pelo poderio real), entre os canonistas e tedlogos dos concilios eclesiasticos (pensando em termos de direito natural), entre os juristas da corte e juizes académicos dos Principados continentais, entre os professores holandeses de Direito Natural ¢ os monarco- maquistas, entre os juristas criminais ¢ legislativos, entre a noblesse de robe do Parlamento francés e, finalmente, entre os juristas da época da Revolucao Francesa. | i Sem_esse racionalismo juridico, a ascensio do Estado absoluto € tio pouco_imagindvel || quanto a revolucao. Se examinarmos os protestos dos Parlamentos franceses ou os cadernos | dos Estados-Gerais franceses do século XVI ao ano de 1789, veremos em toda parte o espiti- to dos juristas. E se examinarmos a composi¢ao ocupacional dos membros da Assembléia Francesa, Encontraremos ali ~ embora os membros da Assembléia fossem eleitos através de uma franquia igual — um Gnico proletério, poucos empresdrios burgueses, mas juristas em Massa, de todos os tipos. Sem eles, a mentalidade especifica que inspirou esses intelectuais Howsl’ radicais € seus projetos seria inconcebivel. Desde a Revolugo Francesa, 0 moderne jurista e I einveesce® Modema democracia associaram-se absolutamente. E os juristas, em nosso sentido de um grupo de status independente, s6 existem também no Ocidente. Desenvolveramese desde a Idlade Média, partindo do Fursprech do processo formalista da Alemanha, sob o impacto cla racionalizagao do julgamento, A significancia do jurista na politica ocidental, desde a ascensto dos partidos, nao é aci- dental. © controle da politica pelos partidos significa, simplesmente, o controle pelos gru- Pos de interesse. Veremos, dentro em pouco, o que isto significa. O officio do advogado treinado € defender, com eficiéncia, a causa dos clientes interessados. Nisso, 0 advogado € superior a qualquer “funciondrio”, tal como a superioridade da propaganda inimiga la pro- Paganda aliada na guerra de 1914-18] nos mostra. Sem dtivida ele pode defender e vencer uma causa apoiado em argumentos logicamente fracos e que, nesse sentido, € uma causa fraca”, Nao obstante, ele a ganha porque tecnicamente faz para ela uma “argumentagio forte". Mas o advogado s6 pode defender com éxito uma causa que pode ser apoiada em argumento de forca l6gica, tratando assim "bem" uma causa “boa”. Com demasiada fre- qUiéncia 0 servidor civil como politico transforma uma causa boa sob todos os aspectos AU- ma_causa “fraca’, através dé uma argumentagao tecnicamente “fraca”. Foi is 30 O que acon- teceu conosco, Em grau bastante acentuado, a politica de hoje € na verdade conduzida em Publico por meio da palavra escrita ou falda. Pesar 0 efeito da palavra propriamente é tarefa do advogado; mas no se enquadra entre as atribuigdes do servidor publico. Este ica na direcio do Estado racional foi promovida pelos juris- I four wmretiy aulimbey mee ce dadicerd a poi yore. A POLITICA COMO VOCAGAO 67 TPIT Fe tee ee Te Ee x da Poucamerig rile aw oledacin A herte do pol iete eald v € demagogo, nem tem o objetivo de ser. Se, faz habitualmente, de forma imperfeit Segundo sua vocagio, 0 funcionario auténtico ~ € isso é decisive para a avaliagio de nosso antigo regime ~ nao se dedicara 3 politica. Deve dedicar-se, de preferé xdmi- nistrac&o” imparcial. Isso também é valido para o chamado administrador “politico”, pelo menos oficialmente, na medida em que a raison d'état, ou seja, os interesses vitais da or- dem dominante no estiverem em causa. Sine ira et studio, “sem ressentimento nem pre- conceito”, ele administrara seu cargo. Dai nao fazer precisamente 0 que o politico, o lider bem como seu séquito, tem sempre e necessariamente de fazer, ou seja, lutar. Tomar uma posicao, ser apaixonado — ira et studium € o elemento do politico e, acima de tudo, 0 elemento do lider politico. Sua conduta esta sujeita a um principio de respon: bilidade muito diferente e, na verdade, exatamente contrario ao principio do servidor ptibli- co. A honra deste esti em sua capacidade de executar conscienciosamente 3 ordem clas autoridades superiores, exatamente como se a ordem concordasse com sua convic¢do pes- soal, Isso € Valido até mesmo se a ordem Ihe parece errada e se, apesar dos protestos do servidor civil, a autoridade insiste nela, Sem essa disciplina moral e essa omissto voluntaria, no sentido mais elevado, todo 0 aparato cairia aos pedagos. A honra dq lider politico, do estadista importante, porém, esté precisamente numa _responsabiidade pessoal exclusiva pelo que ele faz, uma responsabilidade que ele nao pode € nao deve rejeitar ou transferir. E da natureza dos funcionarios de alta posic2o moral serem maus politicos e, acima de tu- do, no sentido politico da palavra, serem politicos irresponsaveis. Nesse sentido, s40 politi- cos de baixa posigio moral, como os que nés infelizmente tivemos numerosas vezes em posicdes de destaque. Foi a isso que chamamos de Beamtemherrschafi (dominio dlo servigo piblico) e realmente nenhuma mancha existe na honra de nasso funcionalismo se revel ‘mos © que esta politicamente errado no sistema, do ponto de vista do éxito. Mas voltemos mais uma vez aos tipos de figuras politicas. Desde a época do Estado constitucional, € definidamente desde que a democracia se estabeleceu, o “demagogo” tem sido 9 lider politico tipico no Ocidente. O desagradavel sa- bor da palavra nao deve levar-nos a esquecer que nao Cleone, mas Péricles, foi o primeiro a trazer o nome de demagogo. Em contraste com os cargos da antiga democracia, que eram preenchidos pela sone, Péricles chefiou a Ecclesia soberana do demos de Atenas como um estrategista supremo, retendo o tinico posto eletivo, ou sem qualquer posto. A demagogia moderna também faz uso da oratéria, em. proporgdes extremas,’ mesmo se considerarmos 5 discursos eleitorais que um modemno candidato tem de pronunciar. Mas 0 uso da palavra impressa € mais duradouro. © publicista politico, e acima de tudo o_jomnalista, é hoje o representante mais importante da espécie demagogica Dentro dos limites desta conferéncia, € impossivel até mesmo esbogar a Sociologia do jomalismo politico modemo, que sob todos os aspectos constitui um capitulo em si mes- mo. Certamente, somente uns poucos aspectos relacionados com ele cabem, aqui. Em co- mum com todos os demagogos e, incidentalmente, com o advogado (e o artista), 0 jornalis- ta também nao se enquadra numa classificaga0 social determinada. Pelo menos € isso 0 que ocorre no continente europeu, em contraste com a Inglaterra, e, também, com as con: digdes anteriores da Prissia. © jornalista pertence a uma espécie de casta de parias, que € sempre estimada pela “sociedade” em termos de seu representante eficamente mais baixo. Dai as mais estranhas nogdes sobre jomalisas ¢ seu trabalho, Nem todos compreendem que uma realizac2o jomalistica realmente boa exige pelo menos tanto “génio™ quanto qual- quer realizacio enudita, especialmente devido & necessidade de produzir imediatamente, € “de encomenda”, devido 3 necessidade de ser eficiente, na verdade, em condigdes de pro dugao totalmente diferentes. Quase nunca se reconhece que a responsabilicacle do jomalis- Ol At pobbey me deliee fo demas Opie te a obstante, ele tenta tomar-se demagogo, 0 i {ire , 68 _ENSALOS DE SocioLoGrA ta € muito maior, € que o senso de responsabilidade de todo jornalista hontado nao ‘média, em nada inferior ao To professor, mas, como a guerra mostrou, superior. Isso Ocore porque, pela natureza mesma do caso, as realizag6es jomnalisticas irresponsaveis e seus efei- tos, por vezes terriveis, sao lembrados. Ninguém acredita que a discrigo de qualquer jomnalista capaz se situa acima da média de outras pessoas, e, nao obstante, assim & As tentagdes muito mais graves, € as outras condigdes que acompanham o trabalho jomalistico no momento presente, produzem os resultados que condicionaram a forma pela qual o piblico vé a imprensa, com um misto de desdém e covardia piedosa. Nao podemos discutir aqui o que se deve fazer. Interessa- nos a questio do destino ocupacional do jornalista politico e de sua possibilidade de alcan- sar uma posicio de lideranca politica, Até agora, o jornalista s6 teve oportunidades favora- veis no Partido Social-Democrata, Dentro do partido, as posicdes editoriais tiveram, predo- minantemente, a natureza de postos oficiais, mas nao constituiram base para posigdes de lideranga. Nos partidos burgueses, no conjunto, as possibilidades de ascensio ao poder politico, através dese caminho, sio ainda piores, em comparagio com 0 que ocortia na geracio anterior. Naturalmente, todo politico consequente precisou de influir na imprensa e, dai, precisou de relagdes com a imprensa. Mas os lideres partidarios surgidos da imprensa Cons. tituiram excecao absoluta, € nao se pode contar com isso. A razio de tal fendmeno esté na indispensabilidade” do jornalista, que cresceu muito, e, acima de tudo, do jormalista sem bens e, portanto, condicionado profissionalmente, indispensabilidade essa determinada pela intensidade e ritmo muito mais intenso das operacdes jornalisticas. A necessidade de ganhar a vida-escrevendo artigos difrios ou pelo menos semanais € como um chumbo nos pés dos politicos. Conhego casos nos quais liderés naturais ficaram permanentemente para- idos em sua ascensdo ao poder, externamente e acima de tudo intemnamente, por essa compulsio. As relacdes da imprensa com os poderes dominantes no Estado € nos partidos, sob o velho regime {do Kaiser] foram as mais prejudiciais possiveis para o nivel do jornalis. mo; isso constitui, porém, um capitulo a parte. Essas condigdes foram diferentes nos paises de nossos adversirios {os Aliados}. Mas ali também, e em todos os Estados modemnos, apa- rentemente o trabalhador jornalistico ganha cada vez menos a medida que o senhor capita- lista da imprensa, do tipo de “Lorde” Northcliffe, por exemplo, ganha cada vez mais _in- fluéncia politic Até agora, porém, nossas grandes empresas jomalisticas capitalistas, que controlam espe- cialmente a “cadeia de jomais’, com “antincios classificados”, foram, regular e tipicamente, os fomentadores da indiferenca politica. Pois no se poderiam colher luicros numa politica independente; especialmente, nao se poderia obter a lucrativa benevoléncia dos poderes Politicamente dominantes, A publicidade comercial também € 0 caminho pelo qual, duran- te a guera, se procurou influir politicamente na imprensa, em grande estilo — tentativa que agora € evidentemente considerada como de continuacio desejivel. Embora possamos esperar que os grandes jomais escapem a essa pressao, a situagdo dos pequenos sera muito mais dificil. De qualquer modo, no momento, a carreira jornalistica nao €, entre nds, um caminho normal para a ascensto dos lideres. politicos, qualquer que seja a atragao que o jomalismo possa ter, sob outros aspectos, ¢ qualquer que seja a medida de influéncia, Ambito de atividade e responsabilidade especialmente politica que possa proporcionar. ‘Temos de esperar para ver. Talvez 0 jornalismo nao tenha mais essa fungdo, ou talvez o jomalismo ainda nao a tenha. Se a rentincia ao principio de anonimato significar uma modificagio nisso, € dificil de dizer. Alguns jomalistas ~ nem todos — acreditam no abando- no do anonimato por principio. O que experimentamos durante a guerra, na imprensa alema, € na “administracao” dos jomais por personalidades e escritores de talento, espec ee Cav he mpm e pare a ote dods pols winds ove een tame pene nde cantlee Cee A POLITICA COMO VOEAGAO 6 mente contratados, que sempre figuraram sob os seus nomes, mostrou infelizmente que, em alguns dos casos mais conhecidos, uma consciéncia maior da responsabilidade ndo decorreu nas proporgdes em que se esperava. Alguns dos jornais foram, sem considerags partidarias, precisamente os que se tornaram mais notoriamente sensacionalistas; abando- nando o anonimato, lutaram por maior circulacao e a conseguiram. Os dietores bem como ‘0s jomalistas do sensacionalismo ganharam fortunas, mas certamente no ganharam honca. Nada dizemos aqui contra o principio de promover vendas; a questio , na realidade, com- plexa, e fenémeno do sensacionalismo imesponsivel nao tem validade geral. Mas até agora, 0 sensacionalismo nao tem sido o caminho para a verdadeira lideranga ou para a acministragho responsavel da politica. Resta-nos ver como se desenvolverio as condicoes. ‘Nao obstante, a carreira jomalistica continua, em todas as circunstancias, um dos mais aminhos da atividade politica profissional. Nao € um caminho para todos, muito menos para_o casater fraco, especialmente. para_as pessoas que “podem manter seu equilibrio interior apenas com,uma posigo social segura. Se a vida de um jovetit enidito esté em jogo, ainda assim ele continuard murado pelas rigidas convencdes sociais, que impedem o seu deslize. Mas a vida do jomalista € um jogo absoluto sob todos os aspectos € sob condigdes que pdem 2 prova a seguranga interna da pessoa, de forma que raramente corre em qualquer outra situaglo. As experiéncias, freqiientemente amargas, da vida ocu- pacional, talvez nem sejam as piores. As exigéncias intimas que se voltam precisamente so- bre o jornalista de éxito sio especialmente dificeis. Nao é, na verdade, problema pequeno freqiientar os saldes dos poderosos em aparente pé de igualdade e, geralmente, ser lison- jeado por todos, porque se € temido, sabendo porém durante todo o tempo que, mal fechada a porta, o anfitrito talvez tenha de se justificar perante seus héspedes pela sta associagio com os “lixeiros da imprensa’. Além disso, nao € facil expressar-se ripida e con- vincentemente sobre isto € aquilo, sobre todos os imaginaveis problemas da vida — segun- do as exigéncias do “mercado” ~ e fazé-lo sem se tomar absolutamente raso € acima de tu- do sem perder a dignidade, desnudando-se, o que tem resultados impiedosos. Nao é de espantar que existam muitos jomalistas que se tomaram fracassos humanos e homens indignos. E, antes, espantoso que, apesar de tudo isso, esta camada mesma inclua um. ntimero tio grande de homens de valor e realmente auténticos, um fato que as pessoas dis- tantes da profissio dificilmente imaginam. Se 0 jornalista como tipo de politico profissional remonta a um passaclo consideriivel, a figura do funcionatio de partido pertence a uma evolug2o das titimas décadas e, em parte, somente aos anos recentes. A fim de compreender a posigio dessa figura na evolugio histé- rica, teremos de nos voltar para uma consideracio dos partidos e organizagoes particia Em todas as associagdes politicas mais ou menos amplas, ou seja, associagdes que vo além da esfera e alcance das tarefas dos pequenos distritos rurais onde os detentores do poder so eleitos periodicamente, a organizacio politica € necessariamente controlada por homens interessados._ no controle da politica. Isto equivale a dizer que um_ iimero relativa- jenfe Pequeno de homens esti primordialmente interessado na vida politica e, dai, em partihar © poder politico. Eles se proporcionam um séquito através do recrutamento livre, apresentam-se, ou a seus protegidos, como candidatos a eleicio, recolhem os meios finan- ceiros e langam-se 2 caga de votos. £ inimaginavel como, nas grandes associagdes, Ges possam funcionar sem esse padrio. Na pritica, isto significa a divisto dos cidadaos com 0 diteito de votar em elementos politicamente ativos ¢ politicamente passivos. Essa diferenga bascia-se em atitudes voluntirias, dai ser impossivel aboli-la através de medidas como © voto obrigatério, ou a “representacio dos grupos profissionais”, ou medidas seme- Ihantes que se dirigem, expressa ou praticamente, contra este estado de coisas e 0 Governo dos politicos profisionais. lideranga ativa € seu séquito reerutado livemente Os hws as elei- NV cvjews doe park 4 @ pelle cgibrtun. 69 cure JO ENSAIOS DE SOCIOLOGIA dhe astern eit") mentos necessirios & vida de qualquer partido. © séquito, e através dele, o eleitorado pas- Sivo, sao necessirios 2 eleigio do lider. Mas a estrutura dos partidos varia. medievais, como o dos guelfos e gibelinos, eram séquitos ex menté_pessoais (clientelas). Se examinarmos varios aspectos desses partidos mi Iembrar-nos-emos do bolchevismo € seus Sovietes. Vejamos, por exemplo, os Staruta della parte Guelfa, com certas disposigGes como 0 confisco dos bens dos Nobili - que original- mente incluiam todas as familias que levavam uma vida cavalheiresca ¢ que assim se quali- ficavam para tomarem-se proprietirios de fundos ~ ou ainda a supressio do direito de exercer uma fungao ou do direito de voto dos membros destas familias, ou por fim quando consideramos a estrutura dos comités inter-regionais deste partido, sua organizacao militar severa e os prémios aos delatores. Consideremos 0 bolchevismo, com a cuidadosa selecio. dos militares e, especialmente na Russia, suas organizagdes de delagdo, o desarmamento e a negativa dos direitos politicos dos “burgueses”, ou seja, do empresario, do comerciante, do homem que vive de rendas, do burocrata, dos descendentes da dinastia, dos agentes policiais, bern como a politica de confiscos. Essa analogia é ainda mais notivel quando vemos que, de um lado, a organizacio militar do partido medieval constituia um simples exército de cavaleiros organizados 4 base dos estamentos feudais existentes e que os nobres ocupavam quase todas as posigdes de man- do e, por outro lado, que os sovietes preservaram, ou, melhor, readotaram, © empresirio altamente pago, 0 salério de grupo, o sistema Taylor, a disciplina militar e da oficina, ¢ a busca de capital estrangeiro. Portanto, numa palavra, os Sovietes tiveram de aceitar nova- mente, ¢ de forma absoluta, fodas as coisas que o bolchevismo combatia como instituicoes | J burguesas de classe. Tiveram de fazé-lo para manter o Estado € a economia em funciona- lém disso, os Sovietes reinstituiram Os agentes da antiga Ochrana [policia secreta ‘aristal como 0s principais instrumentos do seu poderio estatal. Mas no caso nao temos de tratar com essas organizagdes de violencia, mas com os politicos profissionais que lutam pelo poder através de campanhas partidarias “pacificas", no mercado dos votos, Os _partidos, no sentido habitual, entre nds, eram a principio, como por exemplo na Inglaterra, simples séquitos da aristocracia. Se, por qualquer razio, um par mudava de parti- do, todos os que dependiam dele também mudavam. Até a Lei da Reforma (de 1832] as grandes familias nobres ¢, em tiltimo lugar mas no menos importante, o rei, controlavam lum niimero imenso de burgos eleitorais. Proximos desses partidos aristocriticos estavam os partidos dos notveis, que se desenvolveram em toda parte com aumento do poder dos burgueses.-Sob a lideranca espiritual da camada intelectual tipica do Ocidente, os citculos abastados e cultos se distinguiram em partidos, e os seguiram. Esses partidos foram forma- dos de acordo com os interesses de classe, as tradigdes familiares e as razdes ideolégicas, em proporgées iguais. Clérigos, professores, mestres, advogados, médicos, farmacéuticos, agricultores, présperos, industriais — na Inglaterra, toda a camada que se considerava perten- ¢ dos cavalheiros — formaram, a principio, associagdes ocasionais na maioria dos clubes politicos locais. Em épocas de intranquilidade, a pequena burguesia elevava sua voz, € de quando em vez o proletariado, se surgissem Iideres, que, entretanto, via de regra nao vinham de seu seio. Nessa fase, os partidos organizados como associagées permanentes en- tre localidades ainda no existem claramente. Somente os delegados parlamentares criam a coesio; € 05 notaveis locais sto decisivos para a eleigao dos candidatos. Os programas elei- torais se originam, em parte, na atragio eleitoral dos candidatos, em parte nas reunides dos notaveis. Ou surgem como resolugdes do grupo parlamentar. A lideranca dos clubes € uma atividade secundaria e uma empresa honorifica, segundo as exigéncias do momento. Onde nao existem clubes (como ocorre na maioria dos casos) a administrag2o informal rmais, esté nas mos das poucas. pessoas. que por ela se interes- Oparhdo X ents cake in vwe artodgres At veldvers A POLITICA COMO VoCAGAO TE sam constantemente. Somente jomalista é um politico profissional pago; somente a admi- nistragio do jornal € uma organizagio politica continua. Além do jornal, ha apenas a sessiio parlamentar. Os delegados parlamentares e os lideres partidarios no Parlamento sabem para quais personalidades locais notaveis se devem voltar quando a ago politica parece deseja- vel. Mas as associagSes permanentes dos partidos s6 existem nas grandes cidades, com moderadas contribuicdes dos membros € conferéncias € reunides publicas periddicas, nas quais 0 delegado expoe as atividades parlamentares. O partido s6 esti vivo durante periodos de eleicao ‘Os membros do Parlamento interessam-se pela possibilidade de compromissos eleitorais interlocais, pelos programas vigorosos e unificados endossados pelos amplos circulos ¢ pela agitacao unificada através de todo o pais. Em geral, esses interesses formam a fora propulsora de uma organizacao partiddria que se torna cada vez mais rigorosa. Em princi- pio, porém, a natureza de um aparato_partidério como associacio de nativeis permanece inalterada. Isso ocorre, embora uma tede de filiagdes e agentes partidarios locais esteja difundida por todo o pais, incluindo as cidades de tamanho médio. Um membro do grupo parlamentar age como o chefe do escritério central do partido e mantém correspondéncia constante com as organizagoes Tocais. Fora desse escritério central, ainda nao ha funcion’ rios pagos; pessoas perfeitamente “respeitiveis” chefiam as organizagdes locais, pela defe- réncia que, de qualquer modo, isso Ihes proporciona. Formam os “notiveis” extraparlamen- tares que exercem influéncia juntamente com a camada dos notaveis politicos que esteja no parlamento. A correspondéncia do partido, porém, preparada pelo partido, proporciona ca- da vez mais um alimento intelectual para a imprensa e para as reunides locais. Contribui- oes regulares dos membros tomam-se indispensaveis; uma parte delas deve cobrir as des- pesas com a sede. Nao ha muito, a maioria das organizagdes partidérias alemas ainda estava nessa fase de desenvolvimento. Na Franca, a primeira etapa do desenvolvimento dos partidos, pelo ménos em parte, ainda predominava, e a organizacao dos membros do parlamento era ins- tavel. No interior vamos encontrar varios notaveis locais e programas preparados pelos can- didatos ou organizados para eles pelos seus patronos em campanhas especificas pelos pos- tos eletivos. Na verdade, essas plataformas constituem adaptagdes mais ou menos locais as resolugdes e programas dos membros do parlamento. Esse sistema s6 em parte foi afetado, O néimero de politicos profissionais de tempo integral era pequeno, consistindo principal- mente nos deputados eleitos, nos poucos funcionatios da sede e nos jornalistas. Na Franga, o sistema também incluia os cagadores de empregos que tinham “postos politicos” ou, que no momento, lutassem por um. A politica era formalmente, e de modo predominante, uma atividade subsidiéria. O ntimero de delegados que se qualificavam para 0s postos ministe- Tiais era também muito limitado e, devido A sua posiclo como notaveis, também era limita- do o ntimero de candidatos a eleicao. Mas 0 ntimero daqueles que indiretamente tinham interesse no controle da politica, espe- cialmente interesse material, era_grande. Pois todas as medidas administrativas de um depar- tamento ministerial, ¢ especialmente todas as decisdes em qu de pessoal, eram toma- das em parte tendo em vista sua influéncia sobre as possibilidades eleitorais. A realizagao de cada e todo tipo de desejo era buscada através da mediagao do delegado local. De qualquer modo © ministro tinha de ouvir esse delegado, especialmente se ele pertencia & mesma maioria do ministro. Assim, todos lutavam para dispor dessa influéncia. Um_s6 deputado controlava_os_empregos e, em geral, qualquer tipo de privilégio em seu distrito eleitoral Para ser reeleito, o deputado, por sua vez, mantinha ligagbes com os notiveis locais, Ora, as formas mais modemas de_organizagdes partidarias contrastam acentuadamente com esse estado idilico no qual circufos de notaveis e, acima de tudo, os membros do par plbiclerc, 2 note aiwe 8 eo ecler uote peedl chevey Beh dle lamento dominam, Essas formas modemas sio filhas da dlemocracia, do direito de voto das massas, da necessidade de cortejare organizar as massis, e desenvolver a maior unidade de diregio e a disciplina mais rigorosa. O Governo dos notiveis ¢ a diregio pelos membros do parlamento cessa. Os politicos "profissionais” fora do parlamento tomam nas maos a organizaclo. E assim o fazem como “empresirios” - 0 chefe politico american e 0 agente eleitoral inglés sto, na verdade, empiésirios desse tipo ou como funciondrios com um sald- rio fixo, Formalmente, ocorre uma ampla democratizagao. As assembléias das membros do partido organizado passam a selecionar os candidatos € os membros delegados As assem- biéias de orcem superior. Ha, possivelmente, varias dessas conveng6es, indo até 4 conven- ¢i0 nacional do partido. Naturalmente, o poder fica, na pritica, nas maos daqueles que, dentro da organizagao, se ocupam permanentemente do trabalho. Qu entao o poder fica nas mAos daqueles de quem a organizaglo, em seus processos, depende financeira ou pes- soalmente ~ por exemplo, dos mecenas ou diretores de poderosos clubes politicos de pes- soas interessadas (Tammany Hall).* E decisivo que todo esse aparato de pessoas ~ caract risticamente chamada de “maquina” nos pafses anglo-saxdes ou antes, os que dirigem a maquina, mantenham sob controle os membros do parlamento. Esto em condigdes de im- por sua vontade em proporgdes bastante acentuadas, e isso tem significaglo especial para a selegao do lider do partido, O homem a quem a maquina segue no momento se torna o chefe, acima mesmo do lider parlamentar. Em outras palavras, a criago dessas maquinas significa 0 advento da democracia plebiscitéria. ‘Os seguidores do partido, e acima de tudo os seus funcionarios e empresdrios, esperam naturalmente uma compensigao pessoal pela vit6ria de seu chefé isto 6, cargos e outras vantagens. E decisivo que esperem tais vantagens do chefe, € fio apenas do membro do parlamento, individualmente. Esperam que o efeito demagégico da personalidade do chefe, durante a luta eleitoral do partido, aumente os votos mandatos e, com isso, o poder, , com isso, na medida do possivel, amplie as oportunidades que seus seguidores tém de encontrar as compensagées esperadas. Idealmente, uma das molas mestras é a satisfacdo de trabalhar com a dedicag&o pessoal leal por um homem, ¢ nao apenas por um programa abstrato de um partido constituido de mediocridades. Sob esse aspecto, o element miatico” de toda lideranca funciona no sistema partidario. n graus muito diferentes, esse sistema progrediu, embora em luta constante e latente com 05 notiveis locais € os membros do parlamento que lutavam pela influéncia. Isso ocor- reu nos partidos burgueses, primeiro nos Estados Unidos e, em seguida, no Partido Socia Democrata, especialmente da Alemanha. Recuos constantes ocorrem tio logo deixa de existir um lider reconhecido por todos, e, mesmo quando ele existe, as concessdes de to- dos 0s tipos tém de ser feitas 2 vaidade e aos interesses pessoais dos notaveis do partido. A maquina também pode ser colocada sob dominio dos funciondrios do partido, em cujas mios esto os assuntos regulares. Segundo a opiniio de alguns circulos social-democratas, seu partido sucumbiu a essa “burocratizagio”. Mas os “funciondrios”_submetem-se_com relativa facilidade a.uma_personalidade de lider, se ele tiver um forte atrativo demagégico. Os interesses materiais € ideais dos funcionarios esto intimamente ligados aos efeitos do poder partidirio, esperado da atrago do chefe e, além disso, interiormente é, per se, mais satisfatGrio trabalhar para um chefe. A ascensio dos lideres é muito mais dificil quando os notaveis, juntamente com os funciondrios, controlam.o partido, como ocorre habitualmente nos partidos burgueses. Pois idealmente os notaveis fazem “seu modo de vida” das peque- Sede regular do Partido Democrat do Condado de Nova York &, por extensio, dt miquina parti ria democrat nace bi ckdade, (N. do 7 Ba Tu ylalerve: A pouitica Como vocacho TB ras presidéncias ou comités que ocupam. O ressentimento contra o demage homo novus, a convicgao da superioridade da “experiéncia” do partido politico (que, na verdade, realmente € de importincia considerivel) e a preocupacio ideoldgica com 0 des- moronamento das tradigdes do velho partido — esses fatores determinam a conduta dos notaveis. Podem contar com todos os elementos tradicionalistas dentro do partido. Acima de tudo, o eleitor rural, mas também o pequeno-burgués, procura 0 nome do notivel que Ihe seja familiar. Desconfia do homem que Ihe desconhecido. Uma vez, porém, que esse homem se toma bem-sucedido, a ele se apega firmemente. Vamos examinar, através de alguns éxemplos principais, a luta das duas formas estruturais ~ dos notiveis e do partido ~ e, especialmente, a ascendéncia da forma plebiscitiria descrita por Ostrogorsky, Primeiro, a Inglaterra: ali, até 1868, a organizacao dos partidos foi quase exclusivamente uma organizacao dé notiveis. Os Tories encontravam apoio no interior, por exemplo, entre 05 pirocos anglicanos, e entre os professores primdrios, e acima de tudo entre os grandes senhores de terras. Os Whigs encontravam apoio principalmente entre pessoas como 0 pre- gador inconformista (quando havia), 0 agente do correio, o ferreito, o alfaiate, o cordoeiro ~ isto é, 08 artesios que podiam disseminar a influéncia politica porque podiam conversar com as pessoas mais freqtientemente. Na cidade, os partidos diferiam, seja devido & econo- mia, seja devido 2 religiio ou simplesmente segundo as opinides partidarias dlifundidas en- tre as familias. Mas os notaveis foram, sempre, os pilares da organizacao politica. ‘Acima de todas essas disposigoes estavam 0 Parlamento, os partidos com 0 Gabinete € 0 “lider", que era © presidente do conselho de ministros ou lider da oposigio. Esse lider tinha 20 seu lado 0 ‘whip — 0 mais importante politico profissional da organizagio partidria. A distribuigao os cargos ficava nas maos do “whip”, e, assim, o cacador de empregos tinha de procuré-lo, e ele estabelecia um acordo com os deputados dos burgos eleitorais individus Una camada de politicos profissionais comegou a desenvolver-se gradualmente nos burgos. A principio, os agentes recrutados localmente no eram remunerados: ocupavam aproxima- damente a mesma posic¢io de nosso Vertraensmiinner’ Mas, juntamente com eles, desen- volveu-se nos burgos um tipo empresarial capitalista. Era o “agente eleitoral”, cuja existéncia era inevitivel sob a moderna legisla¢o inglesa, que garantia eleigoes imparciais, Essa legisla¢do visava a controlar os custos da campanha eleitoral e conter 0 poder do dinheiro, tornando obrigat6rio ao candidato declarar os custos de sua campanha. Pois na Inglaterra 0 candidato, além de gastar a voz ~ muito mais do que ocorria anteriormente en- tre nés ina Alemanha) — gostava também de gastar dinheiro. O agente eleitoral fazia 0 can- didato pagar uma soma geral, que habitualmente significa muito para o agente, Na distri- buiglo de poder no Parlamento e no interior, entre o “lider” e os notaveis do Partido, o lider, na Inglaterra, costumava ter uma posi¢&o de muito destaque, baseada na possibilida- de de uma estratégia politica em grande estilo €, portanto, constante. Nao obstante, a influéncia do grupo parlamentar e dos notaveis do partido ainda era consideravel Era mais ou menos a organizacio do partido antigo. Era um pouco uma questio dos notiveis e um pouco uma organizacao empresarial com empregados assalariados. A partir de 1868, porém, desenvolveu-se o sistema de ‘caucus’,™ primeiro para as cleigdes locais de Birmingham e em seguida por todo o pais. Um paroco inconformista, ¢ com ele Joseph feenbro da bancada de um pando que te por incumbéncta dsciplinar seus cols levlos a eomppanecer 20s testes Imporantes, especlmente 8 Votagies, Também promove a convoecagio dos suplentes par os miembros cite aslo possim ‘comparecer 4 voto « mantém o lide infomado das opini6es ¢ itencBes dos membros da agremigao. (N. oT.) Na Inglaterra, um sistema de organizagao partiria em comités, Nos Estados Unidos, expressio significa hoje em se I, uma reunito secreta ou fechada de lideres do partido ou de congressisas para tomar delberactes sobre dire, indicar ocupantes de Caos, € linha. pari- 1 os lideres nas cas was do Congres ete. (N. do T.) d f ser ho Colas evite 74 ENsAIOS pF socioLoGiA Chamberiain, criou o sistema. Isso ocoreu quando da democratizagio do direito de voto. A fim de conquistar as massas, tornou-se necessério organizar um tremendo aparato de asso- ciagdes aparentemente demoeriticas. Foi necessario formar uma associaco eleitoral em ca- da distrito urbano para ajudar a manter a organizagio incessantemente em movimento ¢ burocratizar tudo rigidamente. Por isso, os funciondrios contratados e remunerados das comiss6es eleitorais locais aumentaram numericamente e, no todo, talvez 10% dos eleitores se organizaram nesses comités locais. Os administradores eleitos do partido tinham o dire to de escolher um assistente e eram os portadores formais da politica do partido. A forca Propulsora era o circulo local, composto principalmente dos que se interessavam pela poli ica municipal — da qual surgem sempre as melhores oportunidades materiais. Esses circulos locais foram também os primeiros a recorrer a0 mundo dls finangas, Essa maquina recém- surgida, que j4 nao era comandada pelos membros do Parlamento, teve de lutar, sem demora, com os anteriores detentores do poder e, acima de tudo, com 0 “whip”. Sendo apoiada pelas pessoas interessadas locaimente, a maquina saiu da luta tao vitoriosa que o , “whip” teve de sujeitar-se e entrar em acordo com ela. O resultado foi a centralizagio de to- | do 9 poder nas maos de uns poucos e, em tiltima andlise, da pessoa que estava ha i \do partido. Todo esse sistema surgiu no Partido Liberal, ligado & ascensao de Gladstone ao Poder. O que levou essa maquina a um triunfo Uo rapido sobre os notaveis foi a fascina- sao da demagogia “grandiosa’ de Gladstone, a firme f€ que tinham as massas na substancia ética de sua politica e, acima de tudo, sua f€ no cariter ético de sua personalidade. Tornou- se claro, sem demora, que um elemento plebiscitirio cesarista na politica — 0 ditador do campo de batalha das eleigdes ~ havia surgido. Em 1877 0 “caucus” tomou-se atuante, pela primeira vez, nas eleigdes nacionais, e com éxito brilhante, pois o resultado foi a queda de Disraeli no auge de suas grandes realizacoes, Em 1866 a maquina jé estava Go completa- mente orientada para a personalidade carismatica que, quando surgiu a questio da autono- mia municipal, toda a maquina, de alto a baixo, nao indagou se isso realmente era da com- Peténcia de Gladstone: simplemente, a uma palavra sua, seguiu-o, dizendo: Gladstone, certo ou errado, nés o seguimos. E assim a maquina abandonou seu proprio criador, Chamberlain Essa_mquina exige um pessoal considerdvel, Na Inglaterra, ha cerca de 2.000 pessoas que vivem diretamente da politica partidaria. Na verdade, os que participam da politica ati- vamente apenas como candidatos a empregos ou pessoas interessadas s40 muito mais numerosos, especialmente na politica municipal. Além das oportunidades econdmicas, o Politico no sistema do “caucus” tem ainda as oportunidades de satisfazer sua vaidade. Ser Juiz de Paz ou Membro do Parlamento est, decerto, em harmonia com a ambigo maior (€ normal); € as pessoas que sto comprovadamente de boa origem, isto é, “cavalheiros”, alcangam 0 seu objetivo. A meta mais elevada €, decerto, a nobreza, especialmente para 0 grandes mecenas financeiros. Cerca de 50% das financas do partido dependem de contri- buigdes de doadores que permanecem anénimos. E quais foram as conseqiléncias de todo esse sistema? Hoje em dia, os membros do Parlamento, com a excecao dos poucos membros do Gabinete (€ uns insurgentes), normal- mente nao sio nada mais do que homens bem disciplinados e sempre de acordo. Entre nos, No Reichstag, tinha-se pelo menos o costume de responder rrespondéncia particu- lar de seu escritério, mostrando assim que o deputado estava atuante em favor do pais. Tais atitudes ndo sio exigidas na Inglaterra; 0 membro do Parlamento deve apenas volar, nao cometer traicdo partidaria. Deve comparecer quando 0 “whip" 0 convoca, fazer o que o Gabinete ou o lider da oposicao mandar. A maquina do “caucus” no interior € quase total- mente sem principios quando existe um chefe fore que a tem completamente na mao. Com isso, o ditador plebiscitério na realidade fica acima do Parlamento. Tem, atris de si, as Hoje we Tujlelene, pide Chitadure leraade ue exmlrg ced Faq waster ewoparelactyl OA sai ee iene car nuieas ae et ese ne eet gt oad cee eel eae oui came aainiCOuTICR COMO) vocasso_78 On pada we OPS E LGpI As wen hon PER ee SoC rain meses plas Raman ntl «0 praise ee ded massas, atraidas por meio da maquina, € os membros do Parlamento sto para eles simples- mente os homens do espélio politico de seu séquito. Como ocorre a selegio desses chefes fortes? Primeiro, em termos de que capacidade sio escolhidos? Depois das qualidades da vontade — decisivas em todo 0 mundo = naturalmen- te a forca do discurso demagégico é, acima de tudo, decisiva. Seu cariter modificou-se des- de a época em que oradores como Cobden se dirigiam ao intelecto ¢ Gladstone dominava a técnica de “deixar que os fatos s6brios falem por si mesmos”. No momento presente, com freqiiénc eios puramente emocionais s40 usados — 0s meios que o Exército da Salvagio também explora a fim de comover as massas. Podemos considerar o estado de coisas existente como uma “ditadura baseada_na_exploracio da massa_emocior Nao obstante, 0 sistema altamente desenvolvido de trabalho de comissées no Parlamento inglés toma possivel e compulsivo para todo politico que pretende participar da lideranca cooperar no trabalho de comiss’io. Todos os ministros importantes, nas décadas recentes, tém esse treinamento real e efetivo como um pano-de-fundo. A pritica dos relatérios dle comissio e da critica publica dessas deliberagdes € uma condigio para o treinamento, para a selegao real dos lideres € a eliminacio dos meros demagogos. E assim na Inglaterra. O sistema do “caucus” ali, porém, tem uma forma fraca, em com- parago com a organizaglo partidaria americana, que levou o principio plebiscitirio a uma expressiio especialmente precoce e especialmente pura. Segundo a idéia de Washington, a América deveria ser uma comunidade administrada pelos “cavalheiros”. Na sua época, na América, o cavalheiro era também um proprietirio de termas ou um homem de educacio universitiria - isso, a principio. De inicio, quando os partidos comegaram a organizar-se, os membros da Camara dos Representantes pretendiam ser os lideres, tal como na Inglaterra da época governavam os notaveis. A organizago par- tidéria era bastante frouxa e continuou a sé-lo até 1824. Em algumas comunidades, onde cocorreu primeiro 0 desenvolvimento modemo, a maquina partidéria estava em elaboraclo antes mesmo da década de 1820. Mas quando Andrew Jackson foi eleito Presidente pela didato dos agricultores do Oeste ~ as velhas tradicdes foram padas, ria formal pelos principais membros do Congresso chegou a6 fim pouco depois de 1840, quando os grandes parlamentares, Calhoun e Webster, retira- ram-se da vida politica porque o Congreso havia perdido quase todo 0 seu poder em fa- vor da maquina paridaria no interior. O fato de ter a “maquina” plebiscitdria se desenvolv e 0 fato de que ali, e ali somente, 0 Executivo ~ € isso era ‘0 que realmente importava — o chefe da distribuigio de cargos, era um Presidente eleito por plebiscito. Em virtude da “separagio de poderes", ele era quase independente do Parlamento, no exercicio do seu cargo. Assim, como © prego da vit6ria, as prebendas pre- tendidas eram distribuidas precisamente na elei¢io presidencial. Através de Andrew Jackson, © “sistema de despojos” transformou-se sistematicamente em principio ¢ estabele- ‘ceram-se conclusdes. © que significa esse sistema de despojos, a entrega de cargos federais aos partidérios do candidato vitorioso, para as formagdes partidérias de hoje? Significa que partidos sem_prin- Cipios opdem-se mutuamente; sio apenas organizacdes de cacadores de empregos, elabo- rando suas plataformas que variam segundo as possibilidades de conseguir votos, modifi- do suas Cores Tui grau que, apesar de todas as analogias, nao se enconira em nenhu-, ma outra parte. Os partidos sao simplesmente e absolutamente condicionados & campanha eleitoral que é mais importante para a distribuigio de cargos: a luta pela presidéncia ¢ pelo Governo dos varios estados. Plataformas € candidatos sao escolhidos nas convencoes nacionais dos partidos sem a interferéncia dos congressistas. Dai surgirem eles das conven- es partidarias, cujos delegados st formalmente, € muito democraticamente, eleitos. Tais, cle pe Fo cw perme captabels paleo. © pete cecthet 0 creep Te — ENSAIOS DE socroLocia & . es oe E soba Bisco delegados sio determinados pelas assembléias de outros delegados que, por sua vez, de- vem seus mandatos as eleigdes “primarias", ou seja, 2 reuniio dos eleitores diretos do parti- do. Nas eleicdes primadrias os delegados ja sio eleitos em nome do candidato a lideranca nacional. Dentro dos partidos, ocorrem as lutas mais acerbas em tomo da “indicagao’ Afinal de contas, 300.000 a 400.000 nomeacdes oficiais estao nas mdos do Presidente, nomeagdes que sio executadas por ele com a aprovacao dos senadores dos diferentes est dos. Dai serem os senadores politicos poderosos. Em comparagao, porém, a Camara dos Representantes €, politicamente, bastante impotente, porque a distribuigo de cargos esta afastada dela € porque os membros do Gabinete, simples assistentes do Presidente, podem exercer 0 cargo A parte a confianca ou falta de confianga do povo. O Presidente, que é legitimado pelo povo, enfrenta a todos, inclusive 0 Congresso; € esse © resultado da “sepa- ragao de poderes” Na América, o sistema de despojos, apoiado desse modo, foi tecnicamente _possive] por- que a cultura americana, com a sua juventude, péde tolerar o controle puramente diletante. Com 300.000 ou 400.000 desses homens de partido sem outra qualificacdo a seu crédito além do fato de terem prestado bons servigos ao seu partido, esse estado de coisas nao Poderia existir, € claro, sem males enormes. Uma corrupcio um desperdicio que nao encontram paralelo s6 poderiam ser tolerados por um pais com oportunidades econdmicas ainda limitadas. Ora, o chefe politico é a figura que surge no quadro desse sistema de maquina partidéria plebiscitiria. Quem € ele? E o empresirio capitalista politico que, por conta propria e corren- do seu risco, fomece votos. Pode ter estabelecido suas primeiras relagdes como advogado ou dono de bar, ou como proprietirio de estabelecimentos semelhantes, ou talvez como credor. Langa, partindo dai, seus fios até poder “controlar” um certo nimero de votos. ‘Quando chega a esse ponto, estabelece contato com os chefes vizinhos e, com zelo, habili- dade e acima de tudo discrig&o, atrai a ateng2o dos que jé avancaram mais na carreira, ¢ com isso consegue subir. O chefe € indispensavel a organizagio do partido, € esta fica cen- tralizada em suas maos. Proporciona, substancialmente, os meios financeiros. Como os con- segue? Bem, em parte pelas contribuices dos membros e especialmente tributando os sala- tios dos funciondrios nomeados através dele e de seu partido. Além disso ha o subomo e as forjetas. Quem deseja violar com impunidade uma das muitas leis necessita da conivéncia do chef politico € tem de pagar por ela; ou, entdo, tera problemas. Mas isso apenas nao suficiente para acumular © capital nevessirio as empresas politicas. © chefe 6 indispensivel como recipiendério direto do dinheiro dos grandes magnatas financeiros, que nao entrepa- iam seu dinheiro, com finalidades eleitorais, a um funcionario assalariado de um partido, ou a ninguém mais que tivesse de dar explicagio piblica de seus negécios. O chefe, com sua discrigao judiciosa em assuntos financeiros, é 0 homem natural para os circulos capitalistas que financiam eleigées. O chefe politico tipico € um _homem absolutamente s6brio. Nao bus- ca honras sociais; © “profissional” € desprezado na “sociedade respeitivel”. Busca apenas o Poder, © poder como fonte de dinheiro, mas também o poder pelo poder. Em Contraste com 0 Tider inglés, o chefe politico americano trabalha no escuro. Nao € ouvido discursando em publico: sugere aos oradores o que eles devem dizer, cle modo cémodo. Ele, porém, conser- va-se calado. Em geral nao aceita postos, exceto o de senador. Pois como os senadores, em virtude da Constituigao, participam da distribuigao de cargos, os principais chefes freqiiente- mente fomam assento nessa Casa. A distribuigao de cargos é realizada, em primeiro lugar, de acordo com os servigos prestados ao partido. Mas também ocorre com freqiiéncia o leilao dle cargos através de ofertas de dinheiro, e ha cemtas taxas para cargos individuais. Existe, portanto, um sistema de venda de cargos que, afinal de contas, também era conhecido nas monarquias, inclusive no Estado religioso, dos séculos XVII ¢ XVII eee ace ane ae eee ee BOONE ost eat cceune 20 IK resale mterue J KPOLITICA COMO VOCAGAO 77 ST ee Tire oe PIP Oo ce re Paran pap lorteenss pI op yc nie Ale Beat O chefe no tem “principios” politicos firmes; sua atitude € totalmente carente de princ pios, ele pergunta apenas: O que conseguir votos? E, com freqiiéncia, homem de pouca ilusteacao. Mas em geral tem uma vida privada inofensiva ¢ correta. Em sua moral politica, porém, ajusta-se naturalmente aos padrOes éticos médios de conduta politica, como muitos, de nés fizemos também durante 0 periodo de acumulagio, no setor da ética econdmica.” Nao © preocupa o fato de ser socialmente desprezado como politico “profissional”. O fato de nao alcancar, pessoalmente, altos postos federais, nem desejé-los, tem a vantagem fre- qiiente de possibilitar a apresentacio de candidatos notiveis de fora do partido quando o chefe politico acredita que terio atragio para as umas. Daf no concorrerem repetidamente as mesmas velhas notabilidades do partido como no caso da Alemanha. Assim, a estrutura desses partidos sem principios, com os seus detentores do poder socialmente desprezados, ajudou homens capazes a alcancar a presidéncia - homens que, conosco, jamais teriam chegado & cGpula. Na verdade, o chefe politico tem certa resisténcia contra o elemento de fora que possa prejudicar as suas fontes de dinheiro e de poder. Nao obstante, na luta com- petitiva para conseguir a preferéncia dos eleitores, os chefes politicos freqlientemente tive- ram de condescender e aceitar candidatos conhecidos como adversarios da corrupcao. Assim, existe uma forte méquina_partidéria capitalista, organizada de forma rigorosa e total, de alto a baixo, ¢ apoiada por clubes de extraordin abilidade. Esses clubes, como ‘Tammany Hall, sio como ordens Cavalheirescas. Buscam vantagens exclusivamente através do controle politico, especialmente do Governo municipal, que € 0 objetivo mais importante na divisio do espélio. Essa estrutura de vida pantidria foi possibilitada pelo alto grau de democra- cia nos Estados Unidos — um “Novo Pais’. Essa ligacio, por sua vez, é 0 motivo pelo qual 0 sistema esti morrendo graclualmente. A América jf nao pode ser governada apenas por die tantes, Hé menos de 15 anos, quando se perguntou aos trabalhadores americanos por que se deixavam govemar pelos politicos que confessavam desprezar, a resposta foi: “Preferimos ter nos cargos pessoas nas quais podemos cuspir do que uma casta de funcionaios que cuspiri em nds, COMO COTTE Com voces”. Era“O velho ponto de vista da “democracia” americana, Mesifio @nt2o, 08 socialistas tinham idéias totalmente diferentes, e agora a situaglo ji nao é toleravel. A administracao diletante nao basta e a Reforma do Servico Pblico estabelece um niimero sempre crescente de cargos vitalicios com pensdes. A reforma se desenvolve de tal modo que os funciondrios de preparo universitario, tio incormuptiveis © capazes quanto os nossos funcionarios, ocupam os cargos. Agora mesmo cerca de 100,000 cargos deixaram de set objeto de distribuiclo depois das eleigdes. Ao invés disso, esses cargos permitem aos seus cocupantes gozar de pensdes, e baseiam-se em exigéncias qualitativas. O sistema de despojos passard assim gradualmente ao segundo plano e a natureza da lideranca partidiria provavel- ent Sent também tansfonmda mas ainda n Yio sabemos em que sentido. Na_Alemanha, até agora, as condigdes decisivas da administraclo politica foram, em esséricia, a5 seguintes: Primeiro, os parlamentos foram impotentes. Em consequiéncia, nenhum homem ¢ qualidades do lider ingressou no Parlamento de forma permanente. Quem quisesse entrar no Parlamento, que poderia realizar ali? Quando se vagava um cargo de Chancelaria, podia- se dizer ao chefe administrativo: “Tenho um homem muito capaz em meu distrito eleitoral que seria capaz de ocupar o cargo; nomeie-o”. E ele teria aceito com prazer. Mas isso era tudo o que um membro do Parlamento alemao poderia fazer para satisfazer seus instintos de poder se os tivesse. A isso devemos acrescentar a tremenda importincia do funcionalismo especializado e formado na Alemanha. Esse fator determinou a impoténcia do Parlamento. Nosso funciona- lismo nao tinha rival no mundo. Essa importincia era acompanhada do fato de qué 6s fun- cionarids prétendiam nao s6 cargos, mas também postos no Gabinete. Na Assembléia pes padi sas 7B ENSAIOS DE SOCIOLOGIA Legislativa da Baviera, quando a adogao do Governo parlamentar foi debatida no ano pas- sado, afirmou-se que, se os membros da assembléia tivessem de ser colocados nos postos de Gabinete, as pessoas de talento j4 nao buscariam a carreira oficial. Além disso, a admi- nistrago do servigo pUblico escapava sistematicamente a esse controle, tal como se vé pelas discussOes das comissdes inglesas. A administracao tomava assim impossivel aos par~ lamentos — com umas poucas excegdes — treinar chefes administrativos realmente tteis en- tre suas proprias fileiras, Um terceiro fator € 0 de que na Alemanha, em contraste com a América, tivemos par dos, com opinides puiblicas baseadas em principios, que sustentaram que seus membros, pelo menos de maneira subjetiva, representavam genuinamente Weltanschauungen. Ora, os dois mais importantes desses partidos, o Partido Catdlico do Centro e 0 Partido Social- Democrata foram, desde sua criacao, minoritdrios, e intencionalmente minoritarios. Os prin- cipais circulos do Partido do Centro no Reich jamais ocultaram sua oposicio & democracia parlamentar, pelo medo de permanecer na minoria e, com isso, enfrentar grandes dificulda- des em colocar os seus candidatos a empregados, como vinham fazendo através da press30 sobre o Governo. O Partido Social-Democrata era uma entidade minoritaria baseada em principios e opunha-se & adogio do Governo parlamentar porque nao desejava manchar-se participando na ordem politica burguesa existente. O fato de que ambos os partidos se dis- sociavam do sistema parlamentar tornou impossivel o Govemo com esse sistema. Considerando tudo isso, que aconteceu entio aos politicos profissionais na Alemanha? Nao tiveram poder, responsabilidade e s6 puderam desempenhar um papel subordinado, como notaveis. Em conseqiéncia, foram reanimados pelo instinto associativo profissional, tipico em toda parte. Era impossivel para um homem que nio pertencesse ao seu grupo ascender nos circulos dos notéveis que faziam de suas pequenas posicdes a sua propria vi- da. Poderiamos mencionar muitos nomes em cada partido, 0 Social-Democrata inclusive, que encerram tragédias de carreiras politicas porque as pessoas que tinham, qualidades de lideranga, ¢ precisamente devido a essas.qualidades, nto foram_toleradas pelos notaveis. Todos os nossas partidos seguiram essa evoluclo e se tornaram associagdes profissionais dos notiveis. Bebel, por exemplo, ainda era um lider pelo temperamento e pureza de cari- ter, por mais modesto que fosse seu intelecto. O fato de ter sido um mantir, de jamais ter traido a confianga das massas, resultou na conquista absoluta dessas massas. Nao havia poder no partido que o desafiasse seriamente. Tal lideranga chegou ao fim, depois de sua morte, € teve inicio 0 dominio dos funciondrios. Os funciondrios de sindicatos, secretarios de_partidos ¢ jomalistas chegaram ao cimo. Os instintos do funcionalismo dominaram o partido ~ um funcionalismo alamente respeitivel, de rara respeitabilidade, podemos dizer, em comparago com as condigdes em outros paises, especialmente os funciondrios sindi- cais, freqientemente corrupios, da América. Mas 0s resultados do controle pelo funcionalis- mo, que discutimos acima, também comegaram no partido. Desde a década de 1880 os partidos burgueses transformaram-se totalmente em asso- ciagdes profissionais, ou corporagdes, dé notiveis. Na verdade, ocasionalmente os parti- dos tiveram de recorrer a personalidades de fora das fileiras partidarias, com objetivos Publicitarios, para que pudessem dizer: “Temos estes ¢ estes nomes”. Na medida do pos- sivel, evitaram deixar que esses nomes disputassem elei¢’io; somente quando inevitavel, ¢ a pessoa insistia, podia candidatar-se. O mesmo espirito predominou no Parlamento. Nossos partidos parlamentares eram e so corporages. Todo discurso pronunciado no plendrio do Reichstag é censurado pelo partido, antes de ser feito. Isso € evidente na sua monotonia sem par. Somente pode falar aquele a quem é dada a palavra. Dificilmente poderemos pensar num contraste mais forte com a Inglaterra, e também — por motivos opostos — com a Franca, ee . ABGiffica COMO Vocacao 79 Ora, em conseqiiéncia do colapso enorme, habitualmente chamado Revolugao, talvez esteja em marcha uma transformagio. Talvez ~ mas nao é certo. No inicio, comecaram a surgit novos tipos de aparato partidario. Primeiro, houve os aparatos amadoristicos. Estio representados, com mais freqiéncia, pelos alunos das varias universidades, que dizem a um homem ao qual atribuem qualidades de lideranga: queremos fazer o trabalho necessd- rio para vocé. Segundo, hé os aparatos dos empresirios. Um homem ao qual sio atribuicd qualidades de lideranca é abordado por pessoas dispostas a fazer-lhe a propaganda, a uma taxa fixa para cada voto recebido. Se me perguntassem, honestamente, qual desses dois aparatos me parece mais digno de fé, do ponto dle vista puramente técnico, creio que pre~ feriria o segundo. Ambos, porém, foram bolhas de sabdo que cresceram depressa e desapa- receram também rapidamente. Os aparatos existentes transformaram-se, mas continuaram a funcionar. Os fenémenos so apenas sintomas do fato de que novos aparatos surgiriam, se houvesse lideres. Mas até mesmo a peculiaridade técnica da representacao proporcional impedia essa ascendéncia. Apenas uns poucos ditadores das multidées de rua surgiram para desaparecer novamente. E somente o séquito de uma ditadura de massa € organizado de forma rigorosamente disciplinada: dai o poder dessas minorias instaveis. Vamos supor que tudo isso se modificasse; ento, depois do que dissemos acima, com- preende-se claramente que a lideranga plebiscitéria dos partidos encerra a “falta de alma” dos séquitos, sua proletarizacao intelectual, podertamos dizer. A fim de ser um aparato titi, uma miquina no sentido americano ~ imperturbada até mesmo pela vaidade dos notaveis ow as pretens6es a opinides independentes — 0 séquito dle um desses lideres deve obede- cerlhe cegamente. A eleicio de Lincoln s6 foi possivel por esse carater da organiza: tidéria, e com Gladstone, como dissemos, ocorreu o mesmo no “caucus”, E, simplesmente, © preco pago da direcao pelos lideres. S6 hi, porém, a escolha entre a democracia com lideranca, com uma “maquina”, ¢ a_ democracia sem lider, ou seja, 0 dominio dos politicos profissionais sem vocacao, sem as qualidades carismaticas intimas que fazem o lider, e isso significa aquilo que os insurgentes de um partido habitualmente chamam de “dominio de grupo". No momento, na Alemanha, temos apenas ia forma, No futuro, a perm: néncia dessa situaco, pelo menos no Reich, é facilitada pelo fato de que o Bundesrat ascendera novamente € necessariamente limitari o poder do Reichstag ¢ com isso sua importincia como selecionador de lideres. Além disso, em sua forma presente, a represen- tagio proporcional é um fendmeno tipico da democracia sem lider. Isso ocorre mio 86 por que facilita os conchavos dos notveis para a organizagao de chapas, mas também porque no futuro dard aos grupos de interesse organizados a possibilidade de obrigar os partidos a incluir seus funciondrios na lista de candidatos, criando assim um Parlamento apolitico no qual a lideranca auténtica nao tem lugar. O Presidente do Reich s6 poderia transformar-se numa valvula de seguranca da exigéncia da lideranga se fosse eleito de forma plebiscitaria e nao pelo Parlamento. A lideranga & base do trabalho realizado poderia criar-se, € a sele- cao se faria, especialmente se, nas grandes municipalidades, o prefeito plebiscitério surgisse em cena, com 0 direito de organizar independentemente 0 seu quadro de auxiliares. Isso ‘ocorte no caso dos Estados Unidos, sempre que alguém deseja atacar seriamente a corrup- ao. E necessaria uma organizagao partidaria especial para essas eleigdes. Mas a hostilidade pequeno-burguesa de todos os partidos aos lideres, inclusive certamente o Partido Social- Democrata, deixa a formagao futura dos partidos, ¢ todas essas possibilidades, ainda na obscuridade total Portanto, nao podemos ver ainda que forma tomari o controle da politica como “voca- ao”. Muito menos podemos ver em que caminhos se abrem oportunidades para que os ialentos politicos possam ser levados a tarefas politicas satisfat6rias. Quem foi, pelas suas circunstncias materiais, obrigado a viver “da” politica, quase sempre tera de examinar a: 8 _ENSAIOS DF socioLaciA posicdes alternativas de jornalista ou funcionario do partido, como caminhos diretos tipicos. Ou poder examinar a posiclo de representante de grupos de interesse — como um sindi- cato, uma cdmara de comércio, uma associagio rural® ou uma associagao profissional,? uma junta de trabalho, uma associacio de empregadores, etc., ou ainda um cargo municipal adequado. Nada mais se pode dizer sobre esse aspecto externo: em comum com o jornalis- ta, 0 funciondrio de partido suporta a odiosa condiglo de déclassé. “Escritor assalariado”, ‘ou “orador assalariado", sempre Ihe soard infelizmente nos ouvides, mesmo quando tais palavras nao forem ditas. Quem for intimamente indefeso e incapaz de encontrar a devida resposta a si mesmo, fart melhor afastando-se dessa carreira. De qualquer modo, além das graves tentacées, € um caminho que pode levar, constantemente, a decepgdes. Que satista- bes intimas pode, entao, oferecer essa carreira e que condigdes pessoais sio pressupostas para quem nela ingressa? Em primeiro lugar, a carreira da politica proporciona uma sensago de poder. Saber que influencia homens, que participa no poder sobre eles, e, acima de tudo, o sentimento de que tem na mao uma fibra nervosa de acontecimentos historicamente importantes, pode élevar 0 politico profissional acima da rotina cotidiana, mesmo quando ele ocupa posigoes formalmente modestas. Mas a questio do momento para ele &: através de que qualidades oso esperar fazer justica a essa forca (por mais limitada que seja, no caso individual) ? Como pode ele esperar fazer justi¢a @ responsabilidade que 0 poder the impde? Com isso, ingressamos no setor das indagacdes éticas, pois ai se situa o problema: que tipo de homem se deve ser para que se possa colocar a mio no leme da historia? AS Podemos dizer que trés qualidades destacadas sao. decisivas para o politico: paixao, Ser so de responsabilidade senso de proporcoes. Isto significa ‘paixio no sentido de uma objetividade, de dedicac3o apaixonada a uma “causa”, ao deus ou deménio que € o senhor. Nao é a paixio no sentido daquela emogio {intima que meu amigo Georg Simmel costumava designar como “excitacdo estéril’, e que ¢ra peculiar a um certo tipo de intelectual russo (mas nao todos, de modo algum!). E uma excitacao que tem um papel to importante entre nossos intelectuais nesse carnaval que enfeitamos com o nome orgulhoso de “revolugio”. E um “romantismo dos que sao intelec- twalmente interessantes", que termina num vazio destituido de qualquer senso de responsa- bilidade objetiva, Na verdade, a simples paixdo, por mais auténtica que seja, nao basta. Ela ndo faz o politi- 0, a menos que a paixao como dedicagao a uma “causa” também tome a‘tesponsabilidade para com tal causa a estrela-guia da acdo. Quanto a isso, € necessario um Senso de propor- Gio. E a qualidade psicologica decisiva do politico: sua capacidade de deixar que as reali- ides atuem sobre ele com uma concentragio € uma calma intimas. Dai sua distancia em relacio 3s coisas ¢ homens. “Falta de distancia”, em si , é um dos pecados momiais do politi co. E uma daquelas qualidades que condenam a progénie de nossos intelectuais & incapaci- dade politica. O problema é, simplesmente, como fundir a paix2o célida ¢ o frio senso de proporcio numa mesma alma? A politica é feita com a cabeca, € no com outras partes do compo ou da alma. E, nfo obstante, a dedicaco a politica, se nao for um jogo intelectual fri- volo, mas uma conduta genuinamente humana, pode nascer crescer apenas da paixio, Mas aquele firme controle da alma, que distingue o politico apaixonado e o diferencia do simples diletante politico “esterilmente excitado”, 56 é possivel pelo habito ao desapego em todo 0 sentido da palavra. A “forca" da personalidade “politica” significa, em primeiro lugar, a posse das qualidades de paixio, responsabilidade e proporcio. Pomtanto, a todo dia e a toda hora, o politico tem de superar, interiormente, um inimigo bastante comum e demasiado humano: a vaidade vulgar, o inimigo mortal da dedicacio objetiva a uma causa e de qualquer distancia ~ no caso, da distancia para com o proprio eu. A POLITICA COMO VocAGho BI ‘A vaidade € uma qualidade muito generalizada ¢ talvez ninguém esteja completamente livre dela. Nos circulos académicos eruditos, a vaidade é uma espécie de moléstia ocupa- ional, mas precisamente com o intelectual, ela ~ por mais desagradvel que possa ser a sta manifestagio — é relativamente inécua, no sentido de que, geralmente, nao perturba o empreendimento cientifico. O caso € totalmente diferente.com 0 politico. Ele trabalha com 0 desejo de poder como um meio inevitivel. Portanto, o “instinto do poder”, como se diz habitualmente, pertence na verdade 2s suas qualidades nommais. O pecado contra esse expt rito altaneiro de sua vocaglo, porém, comega quando esse desejo de poder cleixar cle ser objetivo para tormar-se uma auto-embriaguez puramente pessoal, ao invés de colocar-se exclusivamente a servigo “da causa". Em Ultima andlise, h4 apenas dois tipos de pecado ‘mortal no campo da politica: a falta de objetividade e - com freqiiéncia idéntica a ela, mas nem sempre ~ a irresponsabilidade, Vaidade, a necessidade de destacar-se pessoalmente no primeiro plano da forma mais clara possivel, tenta fortemente o politico a cometer um cles- ses pecados, ou ambos. Isso ainda € mais exato no caso em que o demagogo € obrigado a contar com 0 “efeito”. Portanto, ele corre freqiientemente o risco de tornar-se um ator bem como 0 de ver com leviandade a responsabilidade das conseqiiéncias de seus atos, passan- do a interessar-se apenas pela “impressio” que causa. A falta de objetividade tenta-o a lutar pela aparéncia atraente do poder, € nao pelo poder real. Sua irresponsabilidade, porém, sugere que ele gosta do poder simplesmente pelo poder sem uma finalidacle substantiva, Embora ~ ou antes, justamente porque - 0 poder € 0 meio inevitivel, € a luta pelo poder € uma das forcas motrizes de toda a politica, nao ha deformacao mais prejudicial ca forca politica do que a ostentagZo do poder to a0 gosto dos parvenus, ¢ a intitil complacéncia no sentimento do poder, e em geral qualquer culto do poder em si. O “politico do pode pode conseguir efeitos fortes, mas na realidade seu trabalho nao leva a parte alguma € nao tem sentido. (Entre nés, também, um culto promovido com ardor procura glorificé-lo.) Nisso, 0s criticos da “politica do poder” esto absolutamente certos. Do stibito colapso intemo dos representantes tipicos dessa mentalidade, podemos ver a fraqueza ¢ impoténcia intimas que se escondem atras desse gesto jactancioso, mas totalmente vazio. E um produto de uma atitude superficialmente blasé para com o significado da conduta humana; ¢ no tem qualquer relacao com 0 conhecimento da tragédia 2 que qualquer aco, € especial mente a agio politica, esta intimamente ligada, resultado final da_acao politica mantém com freqiténcia, e as vezes regularmente, uma relacao totalmente inadequada e por vezes até mesmo paradoxal com o seu_sentido origi- nal, Isso € fundamental para toda hist6ria, ponto que nao procuraremos provar detalhac mente, aqui, Mas devido a esse fato, para que a ago tenha forga intima, 0 servico cla cau: nao deve estar ausente dela, Exatamente que causa, a servigo da qual o politico luta pelo poder ¢ usa o poder, parece uma questio de fé. © politico pode servir a finalicades nacio- nais, humanitarias, éticas, sociais, culturais, mundanas ou religiosas. © politico pode ser mantido por uma forte crenga no “progresso” ~ qualquer que seja 0 seu sentido - ou pode rejeitar friamente esse tipo de crenca. Pode pretender estar a servigo de uma “idéia” ou, rejeitando isso em principio, pode desejar servir a finalidades externas da vida cotidiana. ‘Alguma forma de fé, porém, deve sempre existir. Se assim ndo for, é absolutamente certo que a maldigio da indignidade da criatura superar até os éxitos politicos extemamente mais fortes. Com a afirmac2o acima, j& estamos empenhados na discussio do titimo problema que nos interessa, aqui: 0 ethos da politica como. “causa”. Que vocacio pode a politica realizar, independentemente de Suas fetas, dentro da economia ética total da conduta humana ~ qual € por assim dizer 0 ponto ético onde_a politica se sente A vontade? Nesse aspecto, na realidade, © choque final de Weltanschauungen, opinide mundiais entre as quais, por fim, 82 __ENSAlOs DE SOCIOLOGIA € necessirio escolher. Vamos enfrentar resolutamente esse problema, que recentemente voltou a surgir, ¢ na minha opiniao de forma muito errada. Mas primeiro vamos libertar-nos de uma falsificagao muito trivial: ou seja a de que a ética pode surgir primeiro num papel moralmente muito comprometido. Vamos examinar exem- plos. Raramente constataremos que um homem cujo amor passa de uma mulher para outra ndo sinta necessidace de legitimar isso para si mesmo, dizendo: ela nao era digna do meu amor, ou ela me decepcionou, ou qualquer outra “razao” semelhante que exista. E uma ati- tude que, com uma profunda falta de cavalheirismo, acrescenta uma suposta “legitimidade’ a0 simples fato de que ele ja no a ama e ela tem de suportar isso. Em virtude dessa “legiti- magio", o homem pretende para si um direito e, além de causar-lhe uma infelicidade, colo- ca-a em erro. O competidor amoroso bem-sucedido procede exatamente da mesma forma: ou seja, 0 adversario deve ser menos digno, pois de outro modo nao teria perdido. Nao é diferente, decerto, se depois de uma guerra vitoriosa o vencedor, numa atitude farisaica, afirma: “Venci porque estava com a razio”. Ou se alguém, sob o impacto terrivel da guerra, sofre um colapso psicoldgico, sente a necessidade de legitimar seu desgaste perante si mes- mo, dizendo: “Eu nao podia toleri-la porque tinha de combater por uma causa moralmente ma”, E 0 mesmo ocorre com os derrotados na guerra. Ao invés de procurarem, como uma mulher velha, 0 “culpado” depois da guerra ~ numa situagdo na qual a estrutura da socie- dade provocou a guerra — as pessoas de atitude madura e controlada diriam ao inimigo: “Perdemos a guerra. Vocés a ganharam. Tudo acabou, agora. Vamos discutir que conclu- soes devem ser fixadas, segundo os interesses objetivos que entram em jogo e o que é mais importante tendo em vista a responsabilidade para com o fururo que acima de tudo onera © vencedor”. Qualquer outra coisa é indigna e seri como um boomerang. Uma nagao per- doa se seus interesses tiverem sido prejudicados, mas nenhuma nagao perdoa se sua honra tiver sido ofendida, especialmente por uma hipocrisia fanatica. Cada documento novo que divulgado, depois de décadas, revive as lamentagées indignas, 0 Gdio € o desprezo, a0 invés de permitir que a guerra seja enterrada no seu término, pelo menos moralmente. Isso 86 € possivel através da objetividade e cavalheirismo, e acima de tudo somente através da dignidade. Mas jamais € possivel através de uma “ética” que na verdade significa uma falta de dignidade de ambos os lados. Ao invés de se preocupar com o interesse do politico, ou seja, Com 0 futuro e a responsabilidade para com ele, essa ética se volta para questOes poli- ticamente estéreis de culpas passadas, que nao podem ser solucionadas politicamente. Agir dessa forma € politicamente culposo, se tal culpa existe. E ignora a falsificacao inevitavel da totalidade do problema, através de interesses muito materiais: ou seja, o interesse do vence- dor no maior lucro moral ¢ material possivel; as esperangas do derrotado de negociar van- tagens através de confissdes de culpa. Se ha alguma coisa ‘vulgar’, entio, isso € vulgar, e € © resultado desse modo de explorar a “ética” como meio de “estar com a razo”. E, entio, que relagdes tém realmente a ética e a politica? Nao havera qualquer ligagao entre as duas, como jt se afirmou ocasionalmente? Ou sera verdade o oposto: que a ética da conduta politica € idéntica com a de qualquer outra conduta? Ocasionalmente, acredi- tou-se existir uma escolha exclusiva entre as duas proposigdes: uma delas deve ser a corte- ta, Mas seri verdade que qualquer ética do mundo poderia estabelecer mandamentos de contetido ideal para as relagdes erdticas, comerciais, familiares e oficiais; para as relagdes com nossa mulher, com o verdureiro, o filho, o réu? Sera realmente tio pouco importante para as exigéncias éticas & politica que esta opera com meios muito especiais, ou seja, 0 poder apoiado pela violéncia? Nao vemos que os idedlogos bolchevistas e espartacistas Provocam exatamente os mesmos resultados de qualquer ditador militarista, exatamente porque usam esse meio politico? Em que, a ndo ser nas pessoas dos detentores do poder seu diletantismo, difere 0 dominio dos conselhos de trabalhadores e soldados e o dominio A POLITICA COMO VOCAGAO 83 de qualquer detentor do poder no velho regime? De que modo difere a polémica cla maio- tia dos representantes da ética presumidamente nova da ética dos advers citica- vam, ou da ética de qualquer outro demagogo? Em sua nobre intengdo, poder-se-a dizer. Bem! Mas é dos meios que falamos aqui, ¢ os adversérios, com sinceridade completa e sub- jetiva, pretendem, da mesma forma, que suas intenc6es tiltimas sto de cariter elevado. "Quem com ferro fere com ferro serd ferido”, e a luta é a luta em toda parte. Dai a ética do Sermao da Montanha. No Sermio da Montanha vemos a ética absoluta do evangelho, que é uma questo mais séria do que o acreditam as pessoas que gostam de citar hoje tais mandamentos. Esta ética nao € brincadeira. O mesmo que se disse da causalidade na ciéncia se aplica a ela: nao é um carro que podemos parar 2 vontade; € tudo ou nada. E precisamente esse o significado do evangelho, para que dele nao resultem trivialidades. Daf, por exemplo, ter sido dito do jovem rico: “Ele se foi em meio ao sofrimento, pois tinha muitas posses”. Q mandamento do evangelista, porém, & incondicional e sem ambigiiidades: dé o que tens — absolutamente tu- do. © politico dira que essa imposicio é socialmente sem sentido, enquanto nao for realida- de em toda parte. Assim, 0 politico defende a tributac2o, a tributacdo confiscat6ria, 0 confis co puro e simples ~ numa palavra, a coagao e a regulamentac&o para todos. O manckamento Gtico, porém, no se preocupa com isso, ¢ essa despreocupacao € a sua esséncia. Ou tome- mos 0 exemplo “volta a outra face’: esse mandamento € incondicional e nao duvida da fonte da autoridade que tem a outra pessoa para golpear. Exceto para um santo, € uma ética de indignidade. Eis ai: devemos ser santos em tudo; pelo menos na intengao, devemos viver como Jesus, os apéstolos, Sa0 Francisco e outros semelhantes. Entio essa ética teri sentido e expressard um tipo de dignidade; de outra forma, tal nao acontece. Jai se disse, de acorclo com a ética ac6smica do amor, “Nao resistiu ao mal pela forga”; para o politico, a proposi- Gio inversa é que tem valor: “o mal deve ser resistido pela forga", ou seremos responsiveis pela sua vit6ria. Quem desejar seguir a ética do evangelho deve abster-se de golpes, pois eles significam a compulsdo; pode ingressar nos sindicatos da companhia. Acima de tudo, nao deve falar de “revolucao”. Afinal de contas, a ética do evangelho nao deseja ensinar que a guerra civil € a nica legitima. O pacifista que segue o evangelho se recusara a pegar em armas ou as langard por terra. Na Alemanha, era esse 0 dever ético recomendado para aca bar com a guerra e, portanto, com todas as guerras. O politico dir que a tinica forma segurat de desacreditar a guerra para todo o futuro previsivel seria uma paz do status quo. As nagoes teriam indagado, entao, “para que esta guerra?” Ea guerra teria sido argumentacla ad absurdum, © que € hoje impossivel. Para os vencedores, pelo menos para parte deles, a guerra teri sido politicamente lucrativa. E a responsabilidad disso cabe ao comportamento que nos impossibilitou qualquer resisténcia. E em conseqiiéncia da ética do absolutismo, quando o periodo de exaustio tiver pasado, a paz estaré desacreditada, nao a guerra Vejamos, finalmente, o dever_da fidelidade. Para a ética absoluta, trata-se de um valor incondicional. Dai se ter chegado A decisio de publicar todos os documentos, especialmen- te os que colocavam a culpa em nosso proprio pais. A base dessas publicacdes unilaterais, seguiram-se as confissdes de culpa — e foram unilaterais, incondicionais e sem preocupacdo com as conseqiiéncias. © politico vera que em conseqtiéncia a verdade nao foi esclarecida, e sim certamente obscurecida pelo exagero e pelo despertar das paixdes; somente uma investigagao metédica completa pelos nao-participantes poderia ser proveitosa; qualquer outra medida pode ter conseqiiéncias, para uma nagio, impossiveis de remediar durante décadas. Mas a ética absoluta simplesmente no pergunta quais as “conseqiiéncias”. Esse ponto € decisivo. Devemos ser claros quanto ao fato de que toda conduta eticamenteorientada pode s guiada por uma de duas maximas fundamentalmente ¢ irre 4 _ENSAlOs DF soctoLoaia ete ae Pe val ‘ 1 2 « Leonduta pode ser orientada para uma “ética das tltimas finalidades”, ou para uma “ética da responsabilidade’. Isto nao € dizer que uma ética das ltimas finalidades seja idéntica & intesponsabilidade, ou que a ética de responsabilidade seja idéntica a0 oportunismo sem principios. Naruralmente ninguém afirma isso, Ha, porém, um contraste abismal entre a conduta que segue a maxima de uma ética dos objetivos finais ~ isto é, em termos religio- sos, “0 cristio faz. o bem e deixa 0s resultados ao Senhor” - e a conduta que segue a maxi ma de uma responsabilidade ética, quando entio se tem de prestar conta dos resultados previsiveis dos afos cometidos. “Pode-se demonstrar a um sindicalista convicto, partiditio da ética dos objetivos finais, que seus atos resultario num aumento das oportunidades de reacio, na maior opressio de sua classe € na obstrucao de sua ascensao — sem causar nele a menor impressiio. Se uma acio de boa intengao leva a maus resultados, entao, aos olhos do agente, no ele, mas mundo, ou a estupidez dos outros homens, ou a vontade de Deus que assim os fez, € res- ponsivel pelo mal. Mas um homem que acredita numa ética da responsabilidade leva em conta precisamente_as deficiéncias médias das pessoas; como Fichte disse corretamente, ele no tem nem mesmo o direito de pressupor sua bondade e perfeicao. Nao se sente em condigdes de onerar terceiros com os resultados de suas proprias agdes, na medida em que as pode prever. Did: esses resultados so atribuidos & minha ago. Quem acredita numa ética de objetivos finais s6 se sente responsavel por fazer que a chama das intencdes puras 0 seja sufocada: por exemplo, a chama do protesto contra a injustica da ordem social. Reanim-la sempre € 0 propésito de seus atos bastante itracionais, julgados @ luz de seu possivel éxito. So atos que s6 podem ter, e s6 terlo, valor exemplar. Mesmo nesse caso © problema ainda no esté esgotado. Nenhuma ética do mundo pode fugir ao fato de que em numerosos casos a consecugio de fins “bons” esté limitada ao fato de que devemos estar dispostos a pagar o preco de usar meios moralmente dtibios, ou pe- lo menos perigosos ~ e enfrentar a possibilidade, ou mesmo a probabilidade, de ramifica- ‘oes daninhas. Nenhuma ética no mundo nos proporciona uma base para concluir quando, € em que proporcoes, a finalidade eticamente boa “justifica” os meios eticamente perigosos € suas ramificacoes. © meio decisive para a politica é a violéncia. Podemos ver as proporgdes da tensio entre meios € fins, quando considerados eticamente, pelo seguinte: como geralmente se sabe, mesmo durante a guerra os socialistas revolucionatios (facgio Zimmerwald) professava um principio que poderiamos formular contundentemente: "Se enfrentarmos a escolha entre mais alguns anos de guerra e em seguida a revolugio, e a paz agora sem revolucio, prefe- rimos mais alguns anos de guerra!” E 2 pergunta: “O que pode trazer essa revolucio?”, todo socialista dotado de conhecimentos cientificos responderia: nao podemos falar de uma tran- siglo para uma economia que, em nosso sentido, fosse chamada de socialista; ressurgiré uma economia burguesa, apenas sem os elementos feudais € os vestigios dindsticos. Para esse resultado to modesto, eles esto dispostos a enfrentar “mais alguns anos de guerra” Bem poderiamos dizer que mesmo com uma conviceo socialista muito robusta rejeitaria- mos uma finalidade que exige tais meios. Com o bolchevismo e 0 espartacismo e, em geral, com qualquer tipo de socialismo revolucionario, € precisamente 0 mesmo. E, decerto, de um ridiculo total denunciar moralmente os politicos do poder, do regime antigo, por mais justa que possa ser a rejeicdo de seus objetives. A Gtica dos fins tkimos evidentemente se desfaz. na questio ins. Na realidade, logicamente eka tem apenas a possibilidade de rejeitar toda a a que emprega meios moralmente perigosos ~ em teoria! No mundo da realidade, em geral, encontramos a experiéneia sempre renovada de, que o partidario de uma ética de fins ulti mos subitamente se transforma num profeta @uiliasia. Por exemplo, os que recentemente mecnen vur areola s Pa 1 eM ne ha Be hp Pann Ce MAE AEE OO = Gah BB REE AE EE Oe winds tourer yo) yarn a€ 4 y POLITICA COMO VOCACAO 65 pregaram 0 “amor contra a violéncia” pedem agora 0 uso da forea para o ditimo ato de vio- léncia, que levaria, entio, a um estado de coisas no qual toda a violéncia é eliminada. Da mesma forma, nossos oficiais diziam aos soldados antes de qualquer ofensiva: “Esta seri 3 tiltima: ela nos tard a vitoria e com isso a paz”. O proponente de uma ética de fins absolu- tos nao pode resistir sob a irracionalidade ética do mundo. E um “racionalista” cOsmico-€ti co. Os que conhecem Dostoievski lembrario a cena do “Grande Inquisidor’, once 0 pro- blema € exposto de modo pungente. Se fizermos qualquer concessio ao principio de que 0s fins justificam os meios, nao seri possivel aproximar uma ética dos fins tltimos ¢ uma ética da responsabilidade, ou decretar eticamente que fim deve justificar que meios. Meu colega, F. W. Forster, por quem tenho pessoalmente elevada estima, pela sua indu- bitavel sinceridade, mas a quem rejeito sem reservas como politico, acredita ser possivel contornar essa dificuldade com a simples tese: “do bem s6 vem o bem; mas do mal s6 vem ‘o.mal". Nesse caso, todo esse complexo de questdes nao existiria, Mas € espantoso que es- sa tese surja Taz 2.500 anos depois dos Upanichades. Nao sé a totalidade do curso ca his- t6ria mundial, mas qualquer exame franco da experiéncia cotidiana nos leva ao oposto. O desenvolvimento das religides em todo o mundo € determinado pelo fato de ocorrer 0 inverso. O velho problema da teodicéia consiste na questio mesma de como pode um poder, considerado como onipotente ¢ bom, ter criado um mundo irracional, de sofrimento imerecido, de injustigas impunes, de estupidez. sem esperanca, Ou esse poder nao € onipo- tente, nem bom, ou, entao, principios de compensacao € recompensa totalmente dliversos governam nossa vida ~ principios que podemos interpretar metafisicamente, ou mesmo Princfpios que escapam para sempre & nossa compreensio. Esse problema ~ a experiéncia da irracionalidade no mundo — tem sido a forga propulso- ra de toda evolugao religiosa. A doutrina indiana do carma, 0 dualismo persa, a doutrina do pecado original, a predestinagao e o deus absconditus, tudo isso nasceu de nossa experién- cia. Também os primeiros cristios sabiam muito bem que o mundo € governado_pelos deménios e quem se dedica 4 politica, ou seja, ao poder e forca como um_meio, faz. um contrato com as poténcias diabdlicas, € pela sua agio se sabe que nao é certo que o bem 56 pode vir do bem e 0 mal s6 pode vir do mal, mas que com freqtiéncia ocorre 0 inverso Quem deixar de perceber isso é, na realidade, um ingénuo em politica. 'stamos colocados em varias esferas da vida, cada qual governada por leis diferentes. A ética religiosa explicou esse fato de modos diferentes. O politeismo helénico fez sacrificios a Afrodite e Hera igualmente, a Dioniso e Apolo, € sabia que esses cleuses freqiientemente estavam em conflito entre si. A ordem de vida hindu fez de cada uma das diferentes ocupa- gdes_objeto de um_cédigo ético especifico, o Darma, segregando para sempre umas das oulras como castas, colocando-as assim numa hierarquia fixa de ordem. Para o homem nas- cido nela, no havia como fugir a isso, a menos que voltasse a nascer em outra vida. As ocupacées eram, assim, colocadas a distancias variadas dos mais altos bens religiosos de salvacao. Dessa forma, a ordem de casta permitia a possibilidade de estabelecer 0 Darma de cada casta, desde os ascetas € brimanes até os canalhas e prostitutas, de acordo com as leis imanentes e auténomas de suas respectivas ocupacdes. A guerra € a politica estavam também incluidas. A guerra esta integrada na totalidade das esferas da vida, no Bhagavad- ita, na conversacao entre Krishna e Arduna. “Faz 0 que deve ser feito”, isto é, 0 trabalho que, segundo o Darma da casta do guerreiro e suas regras, € obrigatério e que, segundo o proposito da guerra, € objetivamente necessirio. © hinduismo acredita que tal conduta nao prejudica a salvacao religiosa, mas, antes, 2 promove. Quando tinha morte de herdi, 0 guer- reito indiano ia certamente para 0 céu de Indra, tal como guerteiro teutGnico ia para o Valhalla. © heréi indiano teria desprezado 0 Nirvana tanto quanto © teut6nico teria zomba- do do paraiso cristo, com seus coros angelicais. Esta especializacao da ética permitia a éti- VT A Ebru porn ebp rah lide e 8 _ENSAIOS DE SOCIOLOGIA indiana um tratamento da politica igual a0 das outras esferas, seguindo as leis proprias da politica e até mesmo fomentando essa arte rea Um “maguiavelismo” realmente radical, no sentido popular daquela palavra, est repre- sentado classicamente na literatura indiana, no Kautaliya Arthasastra (muito anterior a Cristo, supostamente da época de Chandragupta), Em contraste com esse documento, o Principe de Maquiavel é inofensivo. Como a ética catdlica o sabe — da qual o Professor Forster se aproxi- ma nos demais aspectos — os consilia evangélica sio uma ética especial para os dotados do carisma de uma vida santa. Entre eles esti 0 monge que nao deve verter sangue nem buscar luctos, © a0 seu lado o cavaleiro de fé e © hurgués, que tm permissio para fazer as duas coisas — © priméiro_verter_singue, o segundo buscar o lucro. A graduagao da ética © sua infegracio organica na doutrina da salvacdo € menos coérente do que na India. Segundo as pressuposigdes da fé crista, 0 caso podia e tinha de ser esse. A maldade do mundo, provo- cada pelo pecado original, permitia com relativa facilidade a integragdo da violéncia na ética como um meio de disciplina contra o pecado e os hereges que colocavam em perigo a al ‘ma. As exigéncias do Sermo da Montanha, porém, uma ética acdsmica de fins uiltimos, dei- xavam implicito um direito natural de imperativos absolutos baseado na religido. Esses impe- rativos absolutos conservaram a sua forga revolucionante e entraram em cena com um vigor elementar durante quase todos os periodos de transformagio social. Produziram especial- mente as seitas pacifistas radicais, uma das quais na Pensilvinia tentou por em pritica uma politica que renunciava a violéncia para com terceiros. Tal experiéncia teve um destino tragi- co pois com a deflagracio da Guerra da Independéncia as quacres no puderam levantar-se de armas na mao pelos seus ideais, que eram os mesmos da guerra. Normalmente, 0 protestantismo, porém, legitimou de forma absoluta o Estado como insti- tuigao divina e dai a violéncia como meio. O pratestantismo legitimou especialmente _o stado autoritirio. Lutero isentou o individuo da responsabilidade ética pela guerra e tran: feriu-a para as autoridades. Obedecer &s autoridades em assuntos fora da fé jamais poderia constituir culpa. © calvinismo, por sua vez, conhecia a violncia em defesa de um principio como um meio de defender a fé; assim, conhecia a cruzada, que foi para o [sli um elemen- to de vida, desde 0 inicio. Vé-se que nao é, de forma alguma, uma descrenca modema, oriunda do culto do her6i da Renascenga, que suscita 0 problema da ética politica. Todas as religides se ocuparam dele, com diferente éxito, e depois do que dissemos no poderia ser de outro modo. E o meio especifico de legitimar a violéncia como tal, na mao das asso- ages humanas, que determina a peculiaridade de todos os problemas éticos da politic Quem contrata meios violentos para qualquer fim — e todo politico o faz — fica exposto suas conseqiiéncias especificas. Isso € especialmente vilido para o cruzado, religioso ¢ Fevoluciondrio igualmente, Tomemos confiantemente © presente como exemplo. Quem cleseja_estabelecer a justica absoluta na Terra, pela forga, necessita de adeptos, de umtia “maquina” humana. Deve proporcionar os prémios necessarios, internos e externos, a Fecompensa celestial ou material, a essa “maquina”, ou ela nao funcionara. Nas condicoes cla modema luta de classe, os prémios internos consistem na satisfacao do édio € do anseio de vinganga; acima de tudo, o ressentimento e a necessidade de um farisaismo pseudo-< co: os adversarios devem ser caluniados e acusados de heresia. As recompensas externz sto a aventura, vit6ria, pilhagem, poder e despojos. O lider e seu éxito dependem comple. tamente do funcionamento de sua maquina e, portanto, nao de seus proprios motivos Assim, ele também depende de ser ou nao o prémio permanentemente concedido aos seguidores, ou seja, aos Guardas Vermelhos, aos delatores, agitadores, dos quais o lider necessita, O que ele realmente alcanga nas condigdes de seu trabalho no esta, portanto, em suas mos, sendo-lhe porém prescrito pelos motivos de seus seguidores que, se vistos eticamente, s4o predominantemente mesquinhos. Os seguidores 56 podem ser controlados aaa ah F4E na hte dea ode weg dpe ey art antyh seed de eerpanselels 4 KPOLINIEA COMO VOcKgAO BT fara p Biff Bee OF ES eee pera TSE ceEE TEE Eres eraer EE EEEEE tEeTE ETT enquanto uma fé honesta na pessoa do lider € sua causa inspirar pelo menos parte deles provavelmente jamais na terra a maioria, Essa crenca, mesmo quando subjetivamente since: ra, realmente nao é, em grande niimero de casos, mais do que uma “legitimago” ética de anseios de vinganga, poder, pilhagem e espélios. Ndo nos enganaremos com essa verbosi- dade: a interpretacao materialista da hist6ria no é um carro que se possa tomar & vontade; ao para ange aoe ‘promotores de revolugdes. O revolucionismo emocional € seguido pela rotina tradicionalista da vida cotidiana; o lider cruzado e a propria fé desaparecem ou, 0 que € ainda mais verdadeiro, a fé se toma parte da fraseologia convencional dos filisteus politicos e dos técnicos bandusicos. Essa situagao € especialmente répida nas lutas de f, porque elas sto habitualmente levadas ou inspiradas por lideres auténticos, isto é, profetas da revolucao. Nesse caso, tal como ocore com a maquina de todo lider, uma das condi- oes para 0 éxito é a despersonalizacio € rotinizagio, em suma, a proletarizacio psiqui no interesse da disciplina. Depois de ascenderem a0 poder, os seguidores de um cruzado habitualmente degeneram muito facilmente numa camada comum de saqueadores. Quem deseja dedicar-se a politica, e especialmente a politica como vocagio, tem de compreender esses paradoxos éticos. Deve saber que € responsavel pelo qué vier a ser sob © impacto de tais paradoxos. Repito: tal pessoa se coloca 4 mercé de forgas diabdlicas envoltas na violéncia. Os grandes virtuosi do amor acésmico da humanidade ¢ bondade, sejam de Nazaré ou Assis, ou dos castelos reais da India, ndo operaram com os meios poli- ticos da violéncia. Seu reino “nao era deste mundo”, e nao obstante eles trabalharam e ain- da trabalham neste mundo. As figuras de Platon Karatajev e os santos de Dostoievski ainda continuam as suas reconstrugdes mais adequadas. Quem busca a salvagio da alma, sua e dos outros, nao, deve buscé-la no caminho da politica, pois as tarefas totalmente diferentes da politica s6 podem ser resolvidas pela violéncja. O génio ou deménio da politica vive nu- ma tensao interna com 0 deus do amor, € com o Deus Cristio expresso pela Igreja. Essa tensio pode, a qualquer momento, levar a um conflito inconciliével. Os homens sabiam disso mesmo nas épocas do dominio da igreja. Varias vezes o interdito papal foi colocacto sobre Florenca, € na 6poca isso representa uma forga muito mais poderosa para os homens ea salvacdo de sua alma do que (para falarmos com Fichte) a “fria aprovacao" do juizo éti- co kantiano. Os burgueses, porém, combateram 0 Estado clerical. E € com relagao a essas situacdes que Maquiavel, num belo trecho da Histéria de Florenca, se naio me engano, faz que um de seus herdis elogie os cidadios que colocaram a grandeza de sua cidade natal acima da salvago de suas almas. Se dissermos “futuro do socialismo”, ou “paz internacional”, ao invés de cidacle natal ou (que no momento pode ser um valor duvidoso para alguns), teremos entio 0 pro- blema tal como se apresenta agora. Tudo aquilo pelo que se luta através da ago politica operando com meios violentos ¢ seguindo uma ética da responsabilidade poe em risco a} “salvacio da alma”. Se, porém, buscarmos o bem final numa guerra de crencas, seguindo uma ética pura d6s fins absolutos, entio as metas podem ser prejudicadas ¢ desacreditadas durante geracées, pois falta a responsabilidade pelas consequiéncias, e suas forgas diabéli- cas que entram em jogo continuam desconhecidas do ator. Sio inexoriveis € produzem consequiéncias para sua ago € mesmo para seu eu interior, a que se deve sujeitar indefeso, a menos que as perceba. A frase: "O diabo é velho; envelheca para compreendé-lo!” nao se refere a idade em termos de anos cronolégicos. Jamais me permiti mencionar numa discus- sao uma referéncia a uma data num certficado de nascimento; mas o simples fato de que alguém tem 20 anos de idade e eu tenha mais de 50 ndo me deve fazer pensar que isto constitui uma realizagZo, em si, perante a qual me deva atemorizar, A idade nao € decisiva; o que € decisivo € a inflexibilidade em ver as realidades da vida, e a tar as realidades e corresponder a elas interiormente — 88 _ENsatos DF socioLocia A politica € feita, sem dtivida, com a cabega, mas certamente nao é feita apenas com a cabeca. Nisso, os proponentes de uma ética de fins tiltimos estdo certos. Nao podemos prescrever a ninguém que deva seguir uma ética de fins absolutos ou uma ética de respon- sabilidade, ou quando uma e quando a outra. $6 podemos dizer o seguinte: se nas épocas que, na opiniao da pessoa em questo, ndo so épocas de excitacao “estéril” — a excitacio nao &, afinal, a paixlo auténtica ~ se entio subitamente politicos da Weltanschauung sur- gem em massa e transmitem a palavra de ordem, “O mundo € estipido e mesquinho, eu nao”, “a responsabilidade pelas conseqtiéncias no recai sobre mim, mas sobre os outros a que sirvo e cuja estupidez ou mesquinharia devo eliminar”, entao declaro francamente que indagaria primeiro 0 grau de certeza intima que apéia essa ética de fins tiltimos. Tenho a impresstio de que em nove em cada dez casos trata-se de oradores verbosos que nao com- preendem plenamente o que esto chamando a si, mas que se embriagam com sensagdes roménticas. Do ponto de vista humano, isto nao me é muito interessante, nem me comove profundamente. Mas € profundamente comovente quando um homem maduro — nao importa se yelho ou jovem em anos — tem consciéncia de uma responsabilidade pelas con- seqiéncias de sua conduta ¢ realmente sente essa responsabilidade no coragdo e na alma. Age, entio, segundo uma ética de responsabilidade e num determinado momento chega a0 Ponto em que diz: “Eis-me aqui; nio posso fazer de outro modo”. Isso é algo genuinamen- te humano € comovente. E todos nés que no estamos espiritualmente mortos devemos compreender a possibilidade de encontrar-nos, num determinado momento, nessa posi¢io. Na medida em que isso € vilido, uma ética de fins tltimos e uma ética de responsabilidade no_sto contrastes absolutos, mas antes suplementos, que s6 em unissono_constituem um que pode ter a “vocagao para a politica” homem genuino — um home fal questo novamente dentro de dez E, agora, senhoras e senhores, voliemos anos, a contar de agora. Infelizmente, por toda uma série de razdes, temo que entio o Periodo de reacao tenha hé muito desabado sobre nés. E muito provavel que pouco do que muitos dos senhores, ¢ (confesso candidamente) eu também, desejamos e esperamos se tenha realizado; pouco — talvez nao exatamente nada, mas aquilo que pelo menos para nds parece pouco. Isto naio me esmagard, mas sem dtivida é um peso intimo compreender tal fato. Eu gostaria de poder ver, entao, o que foi feito daqueles que, entre os presentes, se consideram como politicos realmente “de principios”, e que partilham da embriaguez repre- sentada por esta revolucao. Seria bom que as coisas viessem a ser de tal modo que o Soneto 102 de Shakespeare fosse verdade: Our love was new, and then but in the spring, When I was wont to greet it with my lays; As Philomel in summer's front doth sing, And stops her pipe in gtowth of riper days.* Mas nao € esse o caso. Nao 0 florescer do verao esté a nossa frente, mas antes uma noite polar, de escuridao gelada e dureza, nao importa que grupo possa triunfar externamente agora, Onde nao ha nada, nao_s6_o Kaiser mas também o proletario perdeu seus direitos, Quando esta noite se tiver afastado lentamente, quem estari vivo entre aqueles para os quais a primavera aparentemente floresceu tio abundantemente? E o que tera sido de todos * Nowo amor ers novo e entlo apenas na primavera, (Quando eu esava acostumclo a saudé-lo com meus VersOS; Como Filomela canta no comego do verio, F deaths sua outa enqunnte crescem di is plenos. A POLITICA COMO VOCAGAO 8 v6s, entdo? Sereis amargos ou baniiusicos? Aceitareis simples e devidamente o mundo e a ocupagao? Ou a terceira € no menos freqilente possibilidade seri o vosso destino: a fuga mistica da realidade, para os que nao eram dotados para ela ou ~ como é freqiiente e desa- gradavel — para os que se empenham em seguir essa moda? Em qualquer cesses casos, cheguei & conclusto de que essas pessoas no corresponderam aos seus proprios feitos. ‘No corresponderam ao mundo como realmente é em sua rotina cotidiana. Objetiva e real- mente, no experimentaram a vocacio para a politica em seu sentido mais profundo, que julgavam ter. Teriam feito melhor em simplesmente cultivar uma fraternidade comum nas suas relacdes pessoais. E quanto ao resto — deveriam ter-se empenhado sobriamente em suas tarefas cotidianas. A politica € como a perfuragio lenta de tibuas duras. Exige tanto paixao como perspecti- va. Certamente, toda experiéncia hist6rica confirma a verdade — que o homem_nio teria alcangado © possivel se repetidas vezes nao tivesse tentado o impossivel. Mas, para isso, 0 homem deve ser um lider, e nao apenas um lider, mas também um herdi, num sentido muito s6brio da palavra, E mesmo os que nao sio lideres nem herdis deve armat-se com a fortaleza de coraco que pode enfrentar até mesmo o desmoronar de todas as esperan- Gas. Isso € necessdrio neste momento mesmo, ou os homens nao poderdo alcancar nem mesmo aquilo que é possivel hoje. Somente quem tem a vocacio da politica tera certeza de nao desmoronar quando o mundo, do seu ponto de vista, for demasiado estipido ou demasiado mesquinho para 6 qixé ele lhe deseja oferecer. Somente quem, frente a tudo is- so, pode dizer “Apesar de tudé!” tem a vocagio para a politica.

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