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ERIC HOBSBAWM Globalizacao, democracia e terrorismo Trndugao José Viegas 1 rinpresao ont Ins LETRAS, 9. A ordem publica em uma era de violéncia ‘Um dia, na década de 1970, Associagao dos Chefes de Po cia disse ao governo briténico que jé nao havia condigSes deimip dir desordens puiblicas nas ruas, como antes, sem uma noval seguranga piiblica. Poucos anos depois, creio que no comeso década de 1980, fui convidado a um coléquio em um lugar Nornega e notei que o folheto de propaganda do hotel em q realizava 0 evento — um centro de convengdes normal em. lugar turistico de belas paisagens — proclamava que es janel edificio cram a prova de balas. Na Noruega? Sim, na Nor Quero comegar esta conferéncia com esses dois incidentes. No lusive nas imagens. Nao ha diy arespeito, Esta conferéncia & sobre 0 que isso significa e sob ‘como os governos podem proporcionar protegao a vida nortl cia publica (revelada nos indices de crimin dade) é particularmente expressivo, Maso problema nao se um tinico pais. Nem se refere apenas ao terrorismo. O tem muito mais amplo. Inclui, por exemplo,a violéncia nos campo 138 futebol, outro fendmeno historicamente novo que surgi na década de 1970. ‘Como sugere minha lembranga da Noruega, é patente que parte dessa itada pela extraordindria explosao da oferta e disponibilidade global de armas destrutivas poderosas que esto ao alcance de pessoas e grupos privados. Armas baratas e portateis, que podem ser manuseadas por qual quer um, Originalmente, isso era uma conseqiiéncia da Guerra Fria, mas, como esse é um negécio lucrativo, a produgao conti- huow a aumentar. Em todas as décadas desde a de 1960, 0 nix mero de empresas que produzem essas armas vem aumentan= do, especialmente na Europa ocidental e na América do Norte, 1994, havia trezentas companhias em 52 paises no negécio das armas pequenas, 25% mais do que em meados da década de 1980. Em 2001, a estimativa jé era de quinhentas empresas. Em. uutras palavras, os Kalashnikovs, rifles de assalto ax 47, desen- yolvidos originalmente na Unido Soviética durante a Segunda Guerra Mundial, sto uma forma absolutamente terrivel dearma leve e, de acordo com o Bulletin of the Atomic Scientists, algo como 125 milhdes deles circulam hoje pelo mundo. Podem ser encomendados pela internet, pelo menos nos Estados Unidos, Kalashnikov usa. Quanto aos revélveres e as facas, quem & que sabe? Mas é evidente que a desordem publica, mesmo na forma extrema do terrorismo, nao depende de equipamentos caros ¢ de ta tecnologia, como ficou demonstrado em 11 de setembro de - Os seqiiestradores dos avides que destruiram as Torres Gé- 1eas 86 estavam armados com facas pequenas. Os grupos arma- dos mais duradouros, como o 1a e o Fra, utilizam sobretudo explosivos, alguns dos quais podem ser feitos em casa, Os perpe= Inadores do atentado de 7 de julho de 2005 em Londres produ seu proprio explosivo. E, se os informes mais recentes orem 139 corretos esse massacre custou aos seus autores apenas umas cen no total. Além das suas vidas, naturalmente. Assim, ainda que saibaros que o mundo dehoje esti mais cheio de coisas {que matam e matilam do que em qualquer outro periodo da hiss tria, esse é apenas um dos dados do problema, [Esté mais dificil manter a ordem pablica? Claramente, 08 governos eos irigentes empresariais pensam que sim. Otamanho sna Gra-Bretanha aumentou em 35% desde 41971, Para cada 10 mil cidadaos havia, ao final do século, 34 agen- tes de policia, em comparaglo com 24,4 trinta anos antes (um at mento de mais do que 40%). E nao estou sequer contando © meio ‘illo de pessoas que sc estima estarem empregadas nos offcios de seguranga, como guardas e profissoes semelhantes — setor da ‘economia que se multiplicou nos tiltimos trinta anos, desde quea Securicor sentiu-se suficientemente grande para ter suas ages cotadas na Bolsa,em 1971. No ano passado jé havia umas 2500 fit sas nessa rea. Como se abe, desindustrializagao da Gra-Breta- nnha gerou um grande ntimero de pessoas sadias para as quais con- seguir um emprego como guarda de seguranga ¢ uma das poucas: oportunidades de trabalho disponiveis. Pode-se dizer queaecono~ ‘mia, em vez de basear-se no principio de que “um ajuda 0 outro’, pode um dia basear-se na oferta maciga de empregos em que “um igia 0 outro”. Nao ¢56 0 emprego de mio-de-obr: aumenta o emprego da fora. Osespecialistasem controle de mas- sas dispdem hoje de quatro tipos principais de instrumentos para enfrentar manifestagdes violentas: quimicos (por exemplo, g48 lacrimogéneo);“cinéticos’, comoarmasde dispersio,balasdebor= jatos de dgua; ¢ tecnologias de atordoamento. Aqui esté uma lista de patses que ilustra as variagOes entre 0 enfoque tradic ional eomodemono camporeal do controle demassas. A Norue- ‘gando emprega nenhum dos quatro; Finlandia, Holanda, India e 140 ae pesados stad Uni Alemanha, Franca, Reino Unido em pequena quatro tipos prontos para a agao, fev dente quea Gri-Bretanha, que antes se orgulhava de que sua poll- cia andava completamente desarmada, ja nao vive no mesmo mundo ordeiro da Noruega ou daF ‘Como ocorreram esses desenvolvimentos? Acho que duas coisas estdo acontecendo. A primeira & reversio do que Norbert ss analisou em uma obra chamada O processo civilizador: a -ansformacio do comportamento puiblico no Ocidente a partir da-Idade Média. Ble se tornou menos violento, mais “educado’, io de uma elite restrita e depois emescalas mais amplas, Mas hoje isso jé nao é verdade. Janosacos- ‘tumamos tanto a ouvir xingamentos em pablico ¢ ao uso coletivo de linguagem deliberadamente rude e ofensiva que quase nao nos embramos de quio recente éessa alteragao, em termos compara tivos. Porra e merda hé muito tempo sdo expresses comuns entre homens especializados em atividades rudes, como soldados — embora eu nao conhesa nenhum Exército ocidental que tenha 0 mesmo repertério de obscenidades dos russos. De toda maneira, depois da guerra, quando deixei 0 Exército, onde me fami com essa pratica, voltei para um mundo de palavras mais doces. ‘Com certeza, nenhuma mulher usava esse tipo de linguagem, que 86 comesouasurgir como prética social ampla na década de 1960. Lembrem-se de que antes dessa década a palavra “puta” ainda nao faria parte da cultura impressa. A palavra “fuck” por exemplo, 86 foi incorporada a um dicionério britanico em 1965,ea um amet cano em 1969.! ‘Ao mesmo tempo, as regras e convengoes tradicionais enti ‘queceram-se. Parece claro, par exemplo, que a delingiiéneia juve- nil—entrecatorze e vinteanosdeidade—comegoua crescer det Mt proporcionalmentena segunda metade da décadade 1960. Jovens do género masculino, estimulados pela testosterona ¢ pela afi ‘magdo sexual, sempre foram turbulentos, sébretudo quando se organizam em grupos, algo que supostamente se mantinha den: ‘tro de limites por ser tolerado em ocasides especiais. Isso se apl cava também aos jovens bem-educados, como os membros do “Clube dos Vagabundos’, dos livros de P. G. Wodehouse, Lem= brem-se de que a propensdo que eles tinham para derrubar 0 capacete da cabeca dos policiais nas noites de corrida de barco levou Bertie Wooster para a cadeia de Vine Street, Mas no €ape~ nas a erosio das regras e das convengdes sociais, ¢ sim também a erosio das convengdes e das relacbes no seio da fa formaram 0s rapazes no que 0s vitorianos chamavam de perigosas”, Nao vou mais falar sobre isso nem sobre o processo ‘mais longo de barbarizacdo do século xx, que levouatéasituagoes de escindalo, quando alguns ide6logos do Ocidente chegaram a oferecer justficativas intelectuais para a pratica da tortura, mas é claro que ele pesa na balanga. segundo fenémeno, mais direto, também teve inicio na década de 1960. Trata-se da crise do tipo de Estado em que todos nos acostumamos a viver no século passado — o Estado nacional territorial. Antes desse ponto de inflexao, durante 250 anos 0 Estado vinha ampliando seus poderes, recursos, espectro de. ddades, conhecimento e controle sobre o que acontece no seu ter torio, Esse desenvolvimento ocorreu independentemente da pol tica e da ideologia: acorreu nos Estados liberais, conservadores, munistas e fascistas. Aleangou o auge nos anos dourados do tado de bem-estar” e da economia mis Guerra Mundial, Mas tudo isso estava baseado na pre rior do monopélio da lei e da justiga estatal sobre outras exemplo,o direito religioso ou o direito costum: vilido para o monopélio do uso da forca armada, No transcurso aa do século x1x, a maior parte dos Estados do Ocidente eliminou a posse ¢ 0 uso de armas (salvo para 0 uso desportivo) por parte de todos os cidadaos, exceto seus proprios agentes,emesmoa pritica dos duclos no seio da nobreza. (Os Estados Unidos tém uma p ‘40 de flagrante excecao nesse campo, entre os paises desenvolvi= dos, pois tem uma taxa crescente de homicfdios nos tiltimos dois séculos, contra uma taxa decrescente na Europ. nha, as convengdes chegaram a proibir 0 uso de facas eadagas em. lutas, por ser “antiinglés’,e criaram regras para as lutas de boxe ¢ assemelhadas —as Regras de Queensberry. Em condigoes de esta- idade social, até 0 poder oficial passow a sair desarmado em tlic. No Reino Unido, os policiais s6 andavam armados na Janda do Notte, conhecida pelo seu potencial insurrecional, mas ior. As revoltas ptiblicas, arruagas e marchas foram {festagbes cada ver mais pré-negociadas comapolicia.O prefelto de Londres, Ken Livingstone, acaba de recordar aos chineses que isso éoque acontecia no Hyde Parke na Trafalgar Square desde a época vitoriana. Isso era verdadeiro mesmo em paises que consideramos propensosa violéncia urbana,comoa Pranga,independentemente das palavras de ordem incendirias das manifestagdes de massa! Por isso a grande revolta estucantil de 1968 em Paris nfo causou praticamente nenhuma morte em nenhum dos deislados.O mes- ‘mo vale para as mobilizagdes recentes que derrubaram a nova lei de empregos para a juventude francesa, ‘i ‘Mashéoutro elemento no enfraquecimento do Estado:alleal- dade que os cidadaos Ihe devotam, assim como sua disponibili- dade para fazer o que o Estado Ihes pede, estdo erodindo, As dias guetras mundiais foram lutadas por exércitos de recrutas = ot seja, por soldados cidadaos preparados para matar e morte 10s como se diz, Isso j4 nao acontece, Duvido que dé algum direito de escolha aos seus My cidadaos nessa matéria — e mesmo vérios dos que no dio — posta fazé-lo, Esse 6, certamente, 0 caso dos Estados Unidos, que aboliram o servigo militar depois da Guerra do Vietna. Mas, de rmaneira mais discreta, isso também se aplica a disposiga0 dos cidadaos a cumprira lei— ou seja,o senso de que a lei tem uma justifieagao moral Sesentimos que ura li élegitima, ela logo lacatada, Nosacteditamos que 0s jogos de futebol realmente pre- ‘cisam de ébitros e bandeirinhas e confiamos a eles 0 exercicio deuimafungdolegitima, Sendo ofizéssemos, quanta fora seriane> cessiria para manter 0 jogo em ordem? Muitos motoristas no Aaceitarn ajustfieagao moral dascimeras decontrole develocidade ce por sso naohesitam em burlé-las.B se voces conseguirem t472r para casa algum contrabando, ninguém vai pensar mal de vocts ‘Quando a lei carece de legitimidade ¢ 0 respeito a ela depende sobretudo do medo de ser apanhado e punido, émuito mais dificil smanté-lavigente,além de ser mais caro. cho quehé pouca divide de que hoje,por varias razbes,0s cidadaos tém menos propensioa respeitaraleieas conveng6es informais do comportamento social do que antes. "Além disso, globalizaco, a vasta ampliagao da mobilidade das pessoas ea eliminagéo em grande escala dos controlesfrontel- rigos na Europa e em outras partes do mundo tornam cada vez ‘mais dificil para os governos controlar o que entra e sai dos seus territorios eo que ocorre neles. Etecnicamenteimpossivel contro= Jar mais do que uma fragao minima do contetido dos contéineres que wansitam pelos portossem reduziroritmo davida economia to mais alto de violéncia ndo-oficial do que no pasado, Pensem 5 na Irlanda do Norte nos iltimos trinta anos. Gragas a uma com binagdo da forga com arranjos técitos, a governanca efetiva ea vida normal, o que inclui os movimentos de entrada ede saida da provincia, tiveram prosseguimento apesar de uma situagao de quase guerra civil. Em todo 0 mundo os ricos ajustam-sedamea- 2 dos pobres violentos formando condominios fechados, mais visiveis em éreas de expansdo imobilidria recente, Estima-se que existem cen casos, 0 que jada em comparacéo com os 7 milhdes de familias que vivem nessas verdadeiras fortalezas nos Estados Unidos, mais da metade das quais stio comunidades “em que 0 acesso é controlado com portoes, cédigos, cartes magnéticos ¢ ‘guardas",’ Com o aumento da violéncia, essa tendéncia ver ctes- cendo rapidamente, 0 que pode ser confirmado por qualquer pessoa que tenha estado no Rio de Janciro ou na Cidade do Méxicoao longo destes anos. Haalgo que se possa fazer para con- trolar essa situagao? Duas perguntas surgem. Primeira: os problemas de ordem piiblica podem ser controlados em uma era de violéncia? A res- posta tem de ser afirmativa, embora nao se saiba ainda em que ‘medida. Avioléncia nos campos de futebol éum exemplo de como isso pode e vem sendo feito. Bla surgi como fendmeno de massas recorrente na Gra-Bretanha na década de 1960 e foi amplamente copiada em outros paises. Chegou ao ponto maximo na década de 1980, com os terriveis incidentes de Bradford ¢ as 39 mortes no estédio Heysel, em Bruxelas, durante a final da Copa da Europa entre o Liverpool ea Juventus. Falou-se muito na necessidade de ‘medidas extremas, como cartes de ide ‘mas, na verdade, desde entdo 0 “hooliganismo” reduziu-se muito na Gra-Bretanha com o emprego de métodos mais moderados, que incluem modificagses técnicas, como a venda de ingressos exclusivamente para lugares entados,circuitos fechados detelevi- 146 so, melhor inteligéncia e coordenagio, tivas—o isolamento dos hooligansjé conhecidosalém,ou melhor, emvverda ‘contengio” geral dos torcedores visitantes ta quanto fora do estédio, Paralelamente, a policia desenvolveu capacidade de concentrar-se em incidentes mais sérios, uma vez {que o controle da ordem dentro dos estidios foi transferide para os funciondrios dos clubes ocais. Todas essas coisassa0 mais caras, Gra-Bretanha. Nao vi as estimativas de gasto em dinheiro etraba- Iho para Copa do Mundo da Alemanha, no verdo de 2006. Mas fato é quea melhoria foi obtida sem as medidas extremas inicial- mente sugeridas. Nova York também é um lugar bem mais seguro do que era, como podem atestar todos como cidade era perigosa c suja nas décadas de 1970¢ 1980.Na atribuido muito maisa mudangas nas: cia zero) do que aos acréscimos feitos ao seu armamento, que jé era impressionante, Isso nos leva a segunda pergunta: qual deve ser a proporgio entre orga epersuasao,ou confianga publica nocontroledaordem piiblica? A manutencao da ordem em uma erade violénciatemsido mais dificil e mais perigosa, inclusive para os policiais, que usam armas tecnologias cada vez. mais robustas,destinadasa repelit 0s ataques fisicos,e se assemetham a cavaleiros medievais com eset» dos e armaduras. A policia sofre a tentagao de ver-se como um corpo de “guardides”, com conhecimentos profissionais especiali= zados, separada dos pol ise da imprensalliberaly¢ citicada,com ignoran apenas fora da Europa —esté cheio de aparelhos p estado dedireito esima forga (c,senecessirio for,a violencia) oque ‘a manutengao da ordem, e também de que essa atitude apoio pelo menos tacito tanto dos governios quanto da opi- depoisda tranqitilidade das décadas de 1950 ¢ 1960, reacio inicial nova situagao,com o1RA,as reves dosmineiros eos distiirbios raciais, foia deaumentara hostilidade elevar as confrontagdes a um nivel tar, mesmo na itha principal. O enfrentamento com os terroristas promovew a milita- rizagdo da policia. A orientagio de “atirar para matar” provocou diversas itimas nocentes¢, diga-se, evitaveis— a mais recente das ‘quais foi o brasileiro Jean Charles de Menezes, No entanto, feliz mente a Gri-Bretanha ainda nao chegou, como éa tendéncia no, continente europeu, ao ponto de dotar-se de esquadrdes especiais, antidistiirbios, como 0 crs da Branga. va em paz. Isso faz-com outro lado, também pode tentar alguns para o caminho da corrup- Gao. A segunda, ainda mais pertinente, é que as pessoas que com poem a ordem piiblica devem ser protegidas, endo antagonizadas enquanto 0s policiaisisolam e perseguem os“baderneiros” A forga, pode antagonizar, se nao o piblico c todo, os grandes grite pos que supostamente podem conter uma proporsio maior de negros, adolescentes de 4reas degradadas, cos, ou quem quer que seja, Seassim for feito,os riscos para aordem, aro. Um bom exemplo desse tipo de situag ‘ocorreu nos disttirbios do Carnaval de Notting Hill, na década: 1970,desencadeados poruma operagao policial derevistas pess0i destinada a deter punguistas, que afetou um nimeto excessivo pessoas ¢ foi tomada pelos circunstantes como um ataque racial dirigido contranegros. Esse éum perigo real. Duranteo tumultode Brixton, em 1981, ninguém duvida de que a policia agiu como se todos os negros fossem arruaceiros potenciais,o que exacerbou as relagdes com 0 pablico local, Felizmente, durante os problemas da Inlanda do Norte, as forgas policiais britdnicasresistiram a tentagao deconsiderar todosos irlandeses da Gra-Bretanha como membros potenciaisdo1ma.A manutengaoda ordem piiblica,sejaemumaera deviolénciaoundo,depende do equilibrioentrea forsa,aconfianga eainteligencia, Na Gri-Bretanha,em circunstincias normais, descontados os descontroles ocasionais, pode-se ter confianca, grosso modo, no equilibrio estabelecido pelo governo e pela forca publica. Mas, desde o Onze de Setembro, as circunstancias jé nao so normais. Estamos nos afogando em uma onda de ret6rica politica arespeito dos perigos terriveis ¢ desconhecidos que vém do estrangeiro— a histeria das armas de destruigdo em massa, a inadequadamente chamada “guerra contra terrorismo” ea defesa do nossoestilode vida’ —e contra inimigosexternosmal definidose seusagentes ter- ‘oristas internos.Trata-se de uma retérica que visa maisarepiar os cabelos dos cidadaos do que enfrentar 0 terror — com objetivos que deixo a voces a tarefa de identificar, pois arrepiar os cabelos ¢ criar 0 panico é exatamente 0 que os terroristas querem fazer. O ivo politico deles nao é atingido pelo ato de matar,¢ sim pela Publicidade dada aos seus atos, que quebra a moral dos cidadaos. Naépocaem quea Gra-Bretanha tinha um problema terroristareal © continuo, ou seja, as operagdes do iRa, a regra fundamental se= ‘guida pelas autoridades encarregadas da luta contra o terror ery ima publicidade aos atos de terror endo anunciar as contramedidas a serem tomadas, ‘Vamos entao livrar-nos dessa balela. A chamada “guerra cont= {rao terror” ndo é uma guerra, exceto no sentido metaforico, assim 149 como quando se fala da “guerra contra as drogas” ou da “guerra entre os sexos”, O “inimigo” nao tem condigoes de derrotar-nos nem de causar-nos danos volumosos. Recente estudo sobre o ter= rorismo global, feito pelo Departamento de Estado americano em 2005, enumera — sem contar o Iraque, que é uma guerra de ver~ dade —7500 ataques terroristas no mundo inteiro, com 6600 viti- ‘mas, 0 que sugere que a maioria dos ataques falhou. Estamos enfrentando terroristas articulados em pequenos grupos, seme= Ihantes aquelesaos quaisjé estamosacostumados ha muito tempo. ristas antigos, eles estdo dispostos a perpetrar massacres indiseri idos ¢ podem mesmo té-los como objetivo predeterminado, Com efeito, jé praticaram um massacre com milhares de mortos, alguns com centenas de mortos cada um e muitos com dezenas de vitimas fatais.A outra éa arrepiante inovacio historica dohomem= bomba, Essas mudangas sao sérias, especialmente na era da inter= net e do acesso generalizado a armas portéteis muito destrutivas Nao nego que esta ameaga seja mais séria do quea do terrorismo antigo ejustifique medidas excepcionais por parte dos que se ocu- pam de enftenté-la, Mas devo repetir que isso nao é nem pode ser ‘uma guerra, £ basicamente um problema muito sério de ordem piiblica. Mas a seguranga publica, que as pessoas chamam de “lei e ordem’, tem como salvaguarda essenci tuigdes eas auto tidades da vida civil em tempo de paz, 0 queincluia policia. Asins- titmigGes de guerra—ou seja, sobretudo as Forgas Armadas— S40) mobilizadas apenas em situagdes de guerra e nas rarissimas oca~ sides em que os servicos puiblicos entram em colapso. Mesmo em, situagdes parciais de guerra, como na Irlanda do Norte, uma longa experiéncia mostrou-nos os perigos politicos a que nos expomos: quando a manutengao da ordem ¢ feita por soldados, sem uma. forga policial regular e separada do Exército. Apesar de tudo o que 150 se tem falado sobre o terrorismo, nenhum pafs da: est em guerra nem é provavel que venhaaestar,¢ s ¢ politicas nao sao frageis a ponto de se desestal possibilidade de massacres deliberadamente indise ‘mas nao pela sua agao politica ou estratégica, Eu diria que ele & comegou na década de 1970 ¢ que nao despertou a atengao da grande imprensa porque nao afetou a Gra-Bretanha ¢ os Estados Unidos. O proprio Onze de Setembro nao logrou interromper a vida de Nova York por mais do que algumas horas, e suas conse= qiiéncias fisicas foram equacionadas com rapider e eficiéncia pelos servigos civis normais, Oterrorismo requer esforgos especiais, mas importantenio perdermos a cabega ao desenvolvé-los. Teoricamente, um pais que ‘munca perdeu a calma durante trinta anos de tumultos irlandeses indo deveria perdé-la agora. Na pratica,o perigo real do terrorismo indo esté no risco causado por alguns punhados de fanticos and- nnimos, € sim no medo irracional que suas atividades provocam € que hoje é encorajado tanto pela imprensa quanto por governos insensatos, Esse é um dos maiores perigos do nosso tempo, certa~ mente maior do que o dos pequenos grupos terroristas

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